Na obra “Zoológicos humanos: gente em exibição na era do imperialismo” de
Sandra Sofia Machado Koutsoukos, diversos temas sensíveis e de extrema importância surgiram, tais como: estranhamento, racismo, imperialismo, dentre outros. Nossa tarefa aqui é destacar os conceitos que surgiram ao longo do texto e ao final, articular com a noção de cultura. O primeiro que podemos dar destaque é para aquilo que seriam as aberrações para a época (século XIX) e que iam para os famosos zoológicos humanos. De acordo com texto, as ditas aberrações eram pessoas com três ou mais pernas, sem pernas, pessoas sem braços ou sem pernas e sem braços. O texto aponta também gêmeos xifópagos, isto é, que compartilham uma parte do corpo, pessoas com gigantismo, anões, portadores de microcefalia, albinismo, hipertricose (a famosa síndrome do lobisomem), a exemplo de Zip, um afro-americano que ficou apelidado como o homem-macaco e exibido em vários países etc. Pessoas com vitiligo também eram consideradas aberrações. A expressão piebald, que era como chamavam as pessoas com vitiligo, também recebeu uma definição ao longo do texto. O seu significado vem de “negros malhados”, uma alusão a raça de cavalos que tinham o mesmo desenho no pelo. Um personagem considerado um dos maiores showmans daquela época foi Phineas Taylor Barnum, que, por volta de 1870, criou uma espécie de uma nova cultura das massas, com a junção daquilo que se entendia como circo e zoológico, incorporando às atrações do circo pessoas que eram consideradas aberrações sociais, e que se restringiam a zoológicos, para visitação. Dessa forma nasceram os famosos “shows de aberrações”, ou freakshows, (como eram chamados) sendo justamente os espaços onde as pessoas que eram diferentes dos padrões da época (citadas acima) se apresentavam, às vezes tendo sido vendidas pelas suas próprias famílias, quando eram crianças, ou alugadas, visando algum tipo de lucro por parte dos membros da família. Apesar disso, alguns dos que eram considerados aberrações naquele tempo conseguiram viver, na medida do possível, como as demais pessoas, se casando, tendo filhos, viajando, estudando etc. Outro personagem de destaque foi Carl Hagenbeck, que nasceu na mesma década de Barnum, mas diferente dele, aprimorou o seu espetáculo de shows, chamado de American Museum em Nova York, tentando fazer parecer um tom mais antropológico para a coisa, classificando os seus shows como antropológico-zoológico, ressaltando que diferente das outras exibições do gênero, o espetáculo produzido por ele, ou “performances teatrais”, como ele gostava de chamar, visava uma apreciação antropológica da coisa, pois além das exibições dos humanos considerados exóticos, diferentes objetos etnográficos coletados eram postos em evidência, já que a coleção de objetos etnográficos de culturas consideradas primitivas já acontecia desde os séculos XVI e XVII. Não demorou muito até que Barnum incorporasse a ideia da valorização etnoantropológica em seus shows também, ressaltando ainda mais os estereótipos raciais. A violência sofrida por aquelas pessoas, consideradas aberrações, sejam tais violências de natureza racial, cultural, física etc., sem dúvidas alguma, produzia nos mesmos, tanto os que se apresentavam nos circos, zoológicos, teatros ou feiras, problemas psicológicos grandiosos. Em um segundo momento, com o advento da fotografia, em meados do século XIX, popularizou-se as imagens daquelas pessoas dos “espetáculos de horror” em cartões postais e fotografias para serem comercializadas. Ou seja, o lucro em cima dessas pessoas era gerado de todas as formas possíveis. Um destaque pode ser dado para as definições das subcategorias de pessoas que se apresentavam nesses espetáculos. Havia os nascidos com algum tipo de condição especial ou anomalia, como anões, gigantes, microcéfalos, ou portadores de vitiligo ou albinismo; os que tinham desenvolvido alguma anormalidade em função de doença ou acidente, como era o caso de pessoas que contraíram elefantíase, por exemplo; também os que tinham se autotransformado em atração, como pessoas que possuíam numerosas tatuagens, ou muitos furos e piercings pelo corpo e os chamados exóticos, que eram aquelas pessoas que vinham de terras distantes, possuíam outro tipo de beleza, outra língua e cultura. Nesse aspecto, é interessante como o texto traz o conceito do exótico como aquele geralmente vindo de longe, que era diferente dos demais, e por ser estranho ao senso comum era motivo de entretenimento coletivo. Nesse ponto, o texto traz a definição do que seja o poligenismo, que é a existência de diferentes linhagens para as raças humanas. Desse modo, a autora tenta explicar que o estigma do exótico se dava justamente pela falta de compreensão naquele período do humano em uma perspectiva plural. Não se pode deixar de destacar também o caso de Sara Baartman, nascida na África do Sul em 1789, e colocada em exibição anos mais tarde na Europa, mais especificamente na Inglaterra, para ser vista como uma grande aberração exótica, devido as suas proporções físicas consideradas disformes e sexualizados. Ela era chamada de Vênus Negra em alusão a vênus da mitologia romana, que possuía proporções físicas consideradas ideais e harmoniosas, segundo o padrão ocidental. A ideia de chamar de chamar Sara de Vênus negra era puramente uma questão de deboche e zombaria. Outra personagem importante que traz consigo uma importante definição no texto é Ella, considerada um ser humano gigante devido ao extremo crescimento de seus ossos. Com ela, o texto apresenta de forma mais pormenorizada a ideia de gigantismo, como uma condição rara, geralmente causada pela hiperatividade da glândula pituitária. Em suma, vale destacar que a leitura do texto é extremamente importante, sobretudo, por trazer a noção de cultura articulada ao contexto histórico daquela época, trazendo conceitos caros para nós como o “outro exótico”, seguido de sua respectiva definição, além de deixar transparecer em cada linha temas da maior relevância como o racismo; a exploração sexual e o imperialismo como prática política que impunha sua força aos povos mais vulneráveis, a partir da dominação desses povos; e também o conceito de miscigenação, que é trazido no texto, seguido de seu respectivo significado, a saber, a noção de mistura de raças, de povos e de diferentes etnias. É explorada também a percepção de estranhamento do outro (por ser peculiar e diferente do que era considerado padrão europeu), e mais do que isso, é trazido à tona as formas de cooptação desse outro, considerado estranho, exótico e aberração para produzir riqueza. Além disso, ao longo de todo o capítulo, fomos presenteados com centenas de ilustrações preciosas, que deixam ainda mais claro o tom da violência sofrida por aquelas pessoas consideradas diferentes, pelo seu exotismo ou mesmo pela sua cor.
ARTIGO - DANÇA (S) POPULAR (ES), BRINQUEDO DE GENTE GRANDE Reflexões Sobre Folclore e Cultura Popular No Ensino Superior - Paradigmas em Processos de Hibridação - ANDA 2017 - NÃO PUBLICADO