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AULA 1 – O ESTUDO DA LÍ NGUA: UMA CÍE NCÍA

TEXTOS 1 E 2

TEXTO 3

A manifestação linguística põe em confronto quatro realidades: língua, cultura, identidade, povo; na verdade, todas
irremediavelmente indissociáveis. O povo tem uma identidade, que resulta dos traços manifestados em sua cultura, a qual, por
sua vez, se forja e se expressa pela mediação das linguagens, sobretudo da linguagem verbal. Dessa forma, não há jeito de
se debruçar sobre cada um desses itens sem visualizar os outros três e os elos que os unem. Os paradigmas teóricos que
tentaram isolar língua e povo, por exemplo, ou língua e cultura, serviram a outros objetivos que não o de dar conta da real
natureza da linguagem, na sua abrangência de sistema de signos em uso, para fins de interação social. (p. 19)
ANTUNES, Irandé. Língua, texto e ensino: outra escola possível. – São Paulo: Parábola Editorial, 2009. Grifos da autora. Adaptado

A partir da leitura do texto, podemos afirmar que a língua é concreta ou abstrata? Justifique.
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TEXTO 4
“O coloquial e o adcoloquial têm situações próprias e, principalmente, aprendizagem diversa: o primeiro é transmitido no seio
da família, de pai a filhos, enquanto o segundo é adquirido na escola. Este estudo é que lhe garante a relativa uniformidade
em extensos territórios. A diferença entre eles equivale à escolha obrigatória do vestuário: a moça vai à praia, e coloca um
irresistível biquíni ; para um baile de grande gala, há de cair-lhe bem melhor um longo vestido; com um uniforme vai à aula.
Poderia trocá-los, vindo à sala de aula de biquíni??... ou valsando, no mais chique clube da cidade, com aquele uniforme
escolar??... Está corretamente vestida, desde que a roupa se adapte ao lugar; o erro vem do desajuste. Assim também, a
linguagem: o erro comete-se por deslocarmos uma para o campo da outra.”

(BACK, Eurico; MATTOS, Geraldo. Gramática construtural da Língua Portuguesa. São Paulo, FTD, 1972, vol. I, p. 28)

1
Por que o ensino de língua não é mais o mesmo? Antigamente, ele era tradicional ou inovador? Leiamos as frases abaixo.

Vovó viu a uva


A babá babou o bebê.
Maria mima muito mamãe Moema.

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FIQUE DE OLHO

Se a língua é dinâmica e seu estudo é uma ciência, podemos afirmar que a palavra em si, isolada, fora de um contexto, não
possui valor pragmático. Ou seja, o texto só é completo dentro de um contexto.

TEXTO 4

Sobre peixes e linguagem

Me ocorre frequentemente a ideia de que nós nos relacionamos com a linguagem assim como os peixes se relacionam
com a água. Fora da água, o peixe não existe: toda a sua natureza, seu desenho, seu organismo, seu modo de ser estão
indissociavelmente vinculados à água. Outros animais até conseguem sobreviver na água ou se adaptar a ela, como focas,
pinguins, sapos e salamandras, que levam uma existência anfíbia. Mas os peixes não: ser peixe é ser na água. Com os seres
humanos é a mesma coisa: não existimos fora da linguagem, não conseguimos sequer imaginar o que é não ter linguagem:
ela é tão intrínseca e essencial quanto nossas células e nosso código genético. É a partir dela que se traduz a nossa realidade.
Ser humano é ser linguagem.
Se o peixe existe na água, onde existe a linguagem? Na dimensão textual. Abrir a boca para falar, empunhar um
instrumento para grafar o que quer que seja, ativar a memória, raciocinar, sonhar, esquecer... todas essas atividades humanas
só se realizam como textos. Só tem linguagem onde tem texto. No entanto, os estudos linguísticos desprezaram esse caráter
essencialmente textual da linguagem humana, e as consequências desse desprezo, para a educação, configuram a tragédia
pedagógica que tão bem conhecemos: a redução do estudo da língua, na escola, à palavra solta e à frase isolada.
Uma palavra solta, uma frase isolada são um peixe fora d’água. O texto é o ambiente natural para qualquer palavra,
qualquer frase. Fora do texto, a palavra sufoca, a frase estrebucha e morre. E como pode o peixe vivo viver fora da água fria?
A ideia de que uma frase se sustenta sozinha é uma das inúmeras heranças que recebemos da Antiguidade clássica.
Mas sabemos que os primeiros estudos sobre a linguagem tinham um caráter eminentemente filosófico, metafísico mesmo,
pois os filósofos gregos não tinham preocupações linguísticas propriamente ditas, muito menos preocupações didáticas. Para
eles, a frase isolada refletia o funcionamento da alma e a organização do universo (se é que isso existe!). O desastre se opera
quando essa autossuficiência (suposta) da frase isolada é transferida para os estudos da língua em si mesma e, pior ainda,
para o ensino da língua. O peixe morto, que pode ser aberto e estripado para se saber o que tem lá dentro, se tornou o objeto
do ensino de línguas, quando esse objeto deveria ser o peixe vivo e bulindo, em cardume, dentro de seu ambiente natural,
líquido, aquoso: lago, lagoa, riacho, rio, praia, alto-mar — a água-texto.
O que se deve defender são os peixes vivos, e combater o peixe morto, estripado e malcheiroso, que ainda infecta o
nosso ensino de línguas, em pleno século XXI. Ensinar línguas não é pescar, mas mergulhar na água do texto e nadar entre
os peixes. Deveria ser óbvio, mas não é. A linguagem, a língua e o texto, na água vivificada pelo espírito humano, são uma
coisa só!
Marcos Bagno (Adaptado)

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