Você está na página 1de 33

Patrícia Lemos

Regimes e Sistemas Políticos

O Estado e a Sociedade: os interesses organizados

O Estado tem vindo a assumir progressivamente, na sua relação com a sociedade,


uma crescente intervenção, quer sob a forma de orientação, quer sob a forma de
mediação. A relação do Estado com a sociedade difere consoante os modelos
ideológicos, que vão desde o abstencionismo liberal, que faz do Estado um mero
árbitro, até ao colectivismo socialista, que transforma o Estado num condutor da
vida social, observando a sociedade, passando pela visão subsidiaria do Estado,
que o subordina à sociedade e lhe atribui uma função supletiva de atuar quando
a sociedade for incapaz de o fazer por si só.
O Estado na sua função representativa da sociedade, e no seu papel de
intermediador de interesses, pode revestir várias configurações, que vão desde o
pluralismo liberal, ao monismo socialista, passando pelo moderno
neocorporativismo, consoante a organização dos interesses sociais.

1. Grupos de interesses e grupos de pressão


Interesses sociais que se constituem em grupos, a representação destes
exerce-se através de grupos sociais específicos, chamados grupos de
interesses, com formas próprias de representação social. A teoria política
dos grupos surgiu para ultrapassar a visão demasiado formalista do
estudo da política que se limitava às instituições.
Entendia-se por grupo qualquer atividade humana coletiva tendendo
numa certa direção. Existia um interesse quando se dava uma certa
atividade para um fim comum.
Por grupos de pressão entendia-se todos aqueles grupos que visavam
influenciar os decisores, fazendo-se porta-voz dos interesses que
representavam e pretendiam ser satisfeitos (ex.: lobbies americanos).
Os grupos de interesses são estruturas de articulação de interesses, que
agregam as demandas políticas da sociedade. Os membros de um grupo
de interesses teriam uma percepção comum do interesse em causa.
Grupos de Interesse Institucionais – são organizações integradas por
profissionais com funções sociais e políticas estabelecidas (ex.: partidos,
parlamentos)
Grupos de Interesses Anómicos – diversas formas de intromissão mais ou
menos espontâneas da sociedade no sistema político (ex.: manifestações)
Grupos de Interesses Associativos – grupos com estruturas especializadas
de articulação de interesses (ex.: sindicatos)
Grupos de Interesses Não Associativos – grupos que articulam interesses
informal e intermitentemente, através de indivíduos.
Grupos de Interesses Promocionais ou de Causa – têm a função de
promover e representam pequenos sectores da sociedade ou interesses
delimitados
Grupos de Interesses Protetivos ou Seccionais – visam proteger e
abrangem sectores mais vastos da sociedade ou representam interesses
mais alargados.
Patrícia Lemos

A eficiência dos grupos de pressão depende tanto das características dos


próprios grupos como das características dos governos sobre os quais
exercem a sua pressão e das características da estrutura organizativa dos
governos.

2. Grupos de Interesses e Modernização Política


Grupos de interesse são a emanação da sociedade e exprimem-se na área
política. A existência de grupos de pressão na vida política é função do
grau de modernização de uma dada sociedade. A existência de mais
oportunidades de acesso aos centros de decisão e maior participação na
tomada de decisões é sinal de estrutura pluralista de governo. Quanto
maior é o desenvolvimento político, maior é a diferenciação e a atividade
dos grupos de pressão.

3. Grupos de Interesses e Partidos Políticos


Enquanto a função dos grupos de interesses seria a articulação de
interesses, a função dos partidos políticos seria a agregação de interesses,
coligando o maior número possível de grupos. Enquanto os partidos
tinham a ver com o interesse geral, os grupos lidariam com os interesses
particulares e especiais. Os partidos políticos visam a conquista do poder,
os grupos de interesses limitam-se a pressioná-lo, para a satisfação dos
próprios interesses. Por vezes, há grupos de pressão que se transformam
em partidos, outras vezes, existem colateralismos entre partidos e grupos
de pressão.
Quando os partidos políticos controlam os grupos de interesses retiram
capacidade de formulação de solicitações pragmáticas e impõem
conteúdo ideológico à sua atividade. Quando são os grupos de interesses a
controlar os partidos, incapacitam-nos de combater interesses específicos
em programas de vasta amplitude. Quando os grupos articulam interesses
e os partidos combinam e exprimem esses interesses, com autonomia
entre ambos, os grupos articulam e transmitem as demandas da
sociedade ao sistema político, aos partidos políticos.

4. Grupos e Interesse Coletivo


Temos de ter em atenção a dificuldade dos grupos de interesses
conseguirem satisfazer interesses colectivos e, o facto do bem comum
dificilmente resultar da competição entre os grupos. Todos os elementos
do grupo têm um interesse comum em obter um bem colectivo que o
grupo prossegue, mas não tem interesse comum em pagar o custo desse
bem. Esse bem colectivo tem de constituir um incentivo para os membros.
Quanto maior for o grupo, maior é o custo da organização e menor é o
benefício por parte dos indivíduos. Os pequenos grupos têm maiores
incentivos para os seus membros do que os grandes grupos.
A provisão de bens públicos fornecidos pelo governo enfraquece a
liberdade económica. O Estado, com os seus serviços básicos, tem em
vista um bem comum ou bem público. O pluralismo defende a variedade e
a bondade dos grupos de pressão.
À representação geográfica contrapõe-se a representação corporativa. O
Estado, não só reconhece e legitima esta forma de representação de
Patrícia Lemos

interesses, como avaliza com a sua participação estes processos de


concertação. O Estado impulsiona e comparticipa, chegando mesmo a
dirigir o processo de corporativização da sociedade e da relação desta
com ele.

5. O Corporativismo
Nasceu como teoria da organização da sociedade e da representação
política, como solução para a questão social, e como alternativa ao modelo
da luta de classes. Contrapondo-se à concepção liberal individualista da
sociedade, afirmava a existência dos corpos intermédios, e contra a
concepção marxista e coletivista da luta de classes, defendia o
entendimento orgânico entre o capital e o trabalho e a concentração de
interesses no âmbito das corporações de patrões e trabalhadores,
recuperando dessa forma a tradição corporativa medieval.
Com o tempo, o corporativismo deixou de ser uma mera doutrina social
para assumir claramente o carácter de doutrina política, oposta ao
parlamentarismo liberal, de representação dos cidadão apenas pelos
partidos, e oposta também à ditadura que bania qualquer forma de
representação de interesses que não fosse o do capital e do trabalho. O
corporativismo seria uma alternativa ao liberalismo.
O corporativismo tanto se entendeu como corporativismo de associação
como corporativismo de Estado, consoante a iniciativa da sua criação se
atribuía à livre iniciativa da sociedade ou à criação compulsiva e
obrigatória do Estado. No primeiro caso, a representação corporativa não
eliminava nem substituía a representação política. Coexistia com ela,
podendo a representação política coincidir ou não com a representação
partidária. No segundo caso, a representação corporativa assumia-se
como própria representação política. Os grupos ou as corporações, eram
entendidas como estruturas próprias do Estado, criadas por ele,
coordenadas por ele. O corporativismo tornou-se uma doutrina
conservadora, com uma visão orgânica e organizada da sociedade,
hierarquizada, de colaboração dos interesses sociais.
Segundo o corporativismo, a sociedade não é um aglomerado de
indivíduos, mas um conjunto de grupos sociais – visão pluralista,
pluralismo social. Na base deste corporativismo está uma concepção
institucional da sociedade, que afirma a unidade da sociedade, mas com
autonomia dos grupos que a compõem. As Corporações seriam as
instituições funcionais da sociedade, que lhe daria uma estrutura vertical.

6. O Neo-Corporativismo
Quando surge, assume-se como teoria da democracia, como teoria do
Estado na sua relação com a sociedade, e muito especialmente na sua
relação com os interesses sociais organizados e, como teoria da
representação e da intermediação de interesses, a par dos partidos
políticos. Neste novo corporativismo, a representação funcional associa-
se à representação territorial, ou seja para além da participação nos
processos de decisão visa-se uma forma de articulação entre os grupos de
interesse e o Estado. É uma forma paralela de representação e de
Patrícia Lemos

concertação, eminentemente social e funcional, a par da representação e


concertação político-partidária e parlamentar, de base territorial.
Philippe Schmitter definiu o novo corporativismo, como “um sistema de
representação de interesses em que as unidades constitutivas estão
organizadas dentro de um número limitado de categorias singulares,
obrigatórias, não competitivas, hierarquicamente ordenadas e
diferenciadas funcionalmente, reconhecidas ou autorizadas pelo Estado, e
garantindo um monopólio deliberado da representação, dentro das suas
respectivas categorias em troca de se observarem certos controlos sobre
a seleção de líderes e articulação de exigências e apoios”.
Esta visão corporativista de representação de interesses contrapor-se-ia a
visão pluralista.
Philippe Schmitter definiu pluralismo como “um sistema de
representação de interesses em que as unidades constitutivas estão
organizadas dentro de um número não especifico de categorias múltiplas,
voluntárias, competitivas, não hierarquicamente ordenadas e
autodeterminadas que não são especialmente autorizadas, reconhecidas e
subsidiadas pelo Estado e que não exercem um monopólio de atividade de
representação dentre das respectivas categorias”.
Ambos esses modelos se distinguiram de um terceiro modelo também
caracterizado por Philippe Schmitter como sindicalista: “sistema de
agregação de interesses em que as unidades constitutivas são um número
ilimitado de categorias singulares, voluntárias, não competitivas, não
hierarquicamente ordenadas nem especializadas funcionalmente, nem
reconhecidas criadas ou autorizadas pelo Estado ou pelo partido, e não
exercendo um monopólio da representação mas resolvendo os seus
conflitos e alocando autoritariamente os seus valores autonomamente
sem interferência do Estado”.
O que caracteriza o modelo neo-corporativo é, em primeiro lugar, a
deslocação das decisões para organismos paraestatais, decisões essas que
se baseiam em negociação e consenso entre grupos de interesses, que
detêm o monopólio da representação nesse consenso, sendo o Estado
interlocutor ou parceiro dessa negociação, que corresponsabiliza as
associações sindicais e patronais nas decisões políticas e centraliza a
negociação.
O neo-corporativismo tem uma natureza triangular, em que o Estado
intervém para medir os conflitos de interesses. Requer um alto grau de
organização e um monopólio da representação, quer das associações
empresariais quer das sindicais. Este processo de corporativização da
relação entre a sociedade e o Estado é pedido pela necessidade de
racionalização das tomadas de decisões, de reduzir a multiplicidade dos
interesses, de conter o poder dos sindicatos e das organizações patronais.

A Crise do Estado

O Estado está hoje atravessado por uma crise interna e por crise externa. A nível
interno, nos assuntos domésticos o Estado está em expansão, devido sobretudo
aos programas de bem estar. Por isso se fala de pervasividade interna do Estado.
Simultaneamente, ao nível externo, no domínio dos negócios internacionais, o
Patrícia Lemos

Estado está em regressão ou contração, revelando-se cada vez mais fraco e


impotente.
Por isso se reclama a redução da dimensão do Estado e, ao mesmo tempo, o seu
revigoramento. Enquanto se defende que se deve cortar em certa áreas de
intervenção e da despesa do Estado, defende-se ao mesmo o reforço de outras
áreas. A redução da dimensão do Estado vai a par com a exigência de
reconstrução do poder do Estado. Limitar o Estado tornou-se um objectivo para
o tornar mais capaz e implementar políticas e legislar.

1. A Crise do Estado-Nação
O Estado-Nação tem vindo a sofrer uma erosão por cima e por baixo da
sua soberania, pela globalização e pelo desenvolvimento do localismo
político, revelando-se demasiado pequeno para enfrentar os grandes
desafios e demasiado grande para intervir na resolução dos pequenos
problemas. Assistimos a uma progressiva desidentificação do Estado com
a Nação. Esta não coincidência de Estados e Nação levou a fragmentação
de Estados, mediante a decomposição dos seus elementos constitutivos,
ou à fragmentação política de Nações. Por outro lado assistimos também a
uma tendência para a perde de soberania do Estado-Nação, por via da
crescente internacionalização da vida económica, político-militar e socio-
cultural.
 Globalização: fenómeno económico e financeiro, traduzido na
mundialização dos mercados, na internacionalização da divisão do
trabalho, na multinacionalização das empresas, acompanhados
pela circulação de pessoas, bens e capitais. A intensificação das
trocas comerciais , mundialização dos investimentos, a articulação
crescente dos sistemas produtivos, a destruição das barreiras
alfandegárias, a planetarização das interdependências, têm
provocado uma substituição da dimensão estadual-nacional dos
mercados, por uma mais vasta dimensão transnacional e
transcontinental. Os mecanismos económicos há muito que se
tornaram mundiais, não havendo capacidade dos governos
nacionais para impedir ou evitar a repercussão em cadeia dos
processos de recessão ou para um controlo exclusivo sobre as
economias dos próprios países. Há, a este nível, uma clara
diminuição da autonomia interna e da independência externa. A
concentração económica gerou, por seu lado, o aparecimento de
grandes empresas multinacionais, que se tornaram relevantes
atores da vida económica internacional, muitas das quais com
orçamentos superiores aos de muitos Estados, que atuam por cima
da capacidade interventora dos governos, condicionando-lhes a
atuação. Em suma, o Estado-Nação e a sua soberania estão hoje a
ser postos em causa por todos estes processos que lhes provoca
uma erosão “a partir de cima”. Por isso se vai falando de corrosão
do Estado e do seu enfraquecimento como escalão pertinente do
governo, da sua crise de legitimidade.
 Localismo Político: A globalização fez desenvolver
simultaneamente com a grande dimensão, também, a pequena
dimensão. A necessidade de proximidade dos cidadãos e dos seus
Patrícia Lemos

problemas desenvolveu os níveis elementares de poder e de


organização política, ou seja, o localismo político. O que se passa é
uma diferente estratificação do espaço, numa base de
concentricidade. O global e o local deixam de ser incompatíveis
para passar a ser concomitantes e coexistentes. Um pede o outro. E
quanto maior a afirmação do global, mais o local é valorizado. Um é
a consequência do outro. O Estado-Nação, apesar de ver a sua
soberania corroída, não desaparece, pelo contrário, continua a ser
um ator decisivo na cena internacional, é mesmo um factor
imprescindível da globalização e da localização. Verifica-se um
reescalamento da soberania. Há uma hierarquia de escalas: o
global está parcialmente inserido no nacional, e este no local. Há
uma interação de forças globais e nacionais.
2. A Crise do Welfare State
Entre as dimensões mais sublinhadas da crise do Estado está a crise do
Estado social.
 Origens do Estado Social: Não foram os países que primeiro
admitiram a liberdade de associação sindical os primeiros a
admitir o Estado social. A fazê-lo, não foram os países de mais
precoce industrialização, o que permite igualmente concluir o que
a introdução da proteção social não é uma reação a novas formas
de industrialização. A primeira metade do séc. XX generalizou e
alargou os sistemas de proteção social, em quase todos os países
da Europa. Com o aparecimento dos direitos sociais, chamados
direitos de terceira geração, a par com o reforço da autoridade do
Estado, formulam-se novas exigências sociais e atribui-se ao
Estado cada vez mais o papel de prestador desses direitos. O pós-
guerra viu nascer em muitos países o Welfare State, com a
promulgação dos direitos sociais da terceira geração. Nos países
mais desenvolvidos o Estado tornava-se prestador fundamental
dos novos proclamados direitos sociais. A cidadania, construída
para liberta o cidadão do Estado, era agora garantida pelo Estado.
O Estado foi assim sobrecarregado de funções sociais. Passou a
entender-se que a solidariedade social, de responsabilidade que
deveria ser da sociedade acima de tudo, era da competência do
Estado, passando a sociedade a desempenhar um papel
meramente supletivo. Perverteu-se desse modo a função do
Estado, cujo papel, em relação à sociedade deveria ser de respeito
pelo princípio da subsidiariedade. A função de solidariedade social,
primariamente da sociedade, e só supletivamente do Estado,
acabou a ser conferida ao Estado, como se ele fosse capaz de
realizar a justiça social, reconhecendo-se à sociedade uma mera
atuação de suporte ou de reforço da intervenção social. Desse
modo se desresponsabilizou a sociedade dos deveres de
solidariedade que sobre ela impendem.
 Modelos de Estado Social: Três tipos distintos de Estado-social
na Europa:
- Estado Social Liberal: o que primeiro foi instituído por liberais,
e hoje prevalece em países de forte tradição liberal (USA, UK), e
Patrícia Lemos

que assenta sobretudo em soluções de mercado. Encoraja


provisões privadas, limitando as responsabilidades publicas às
falhas graves do mercado. Encoraja os cidadãos a optar pelo
mercado privado de Welfare, enquanto o governo procura
reforças testes de rendimento. Os benefícios tendem a ser
condicionados pelo trabalho, constituindo por isso um
incentivo ao trabalho e ao crescimento do emprego.
- Estado Social Conservador: também apelidado de continental, a
que mais acertadamente poderíamos chamar Estado-social
subsidiário, por ser devedor da Doutrina Social da Igreja, e
prevalece em países católicos (Alemanha, França) e que atribui
particulares responsabilidades as famílias. A família absorve
muitos dos riscos da exclusão social. É um Welfare mais
familista, onde a segurança do bredwinner assume particular
importância. A segurança social protege particularmente os
que têm emprego seguro, com impacto na rijidificação do
mercado de trabalho, com prejuízo para os que estão fora do
mercado de trabalho, dificultando o ingresso nele, sendo
também menos favorável à emancipação da mulher.
- Estado Socialista ou Social Democrata: fortemente estatista, que
prevalece nos países nórdicos, que faz do Estado o prestador
por excelência ou exclusivo dos direitos sociais, e põe a ênfase
no pilar governamental. Favorece o indivíduo mais do que a
família, e a sua independência, diminuindo as obrigações das
famílias. Diminui a dependência do mercado e aumenta a do
Estado. Assenta em rendimentos universais garantidos,
procurando fazer face a desempregos de longa duração, e
atendendo em particular crianças, doentes e idosos. É mais
custoso, e procura maximizar o emprego e a emancipação da
mulher.
 Consequência do Estado Social: A primeira consequência do
desenvolvimento do Welfare State foi o crescimento do aparelho
de Estado, o gigantismo organizativo e burocrático, que se traduziu
em: aumento da produção legislativa, da regulação social; aumento
dos impostos e da intervenção fiscal do Estado; crescimento do
funcionalismo público; aumento da burocracia estatal. Este
aparelho de Estado motivou uma crise do poder, quer em termos
de eficácia, quer em termos de legitimidade. Crise de eficácia,
porque o Estado, aumentando nas suas funções, estruturas,
recursos e despesas, perdeu mobilidade e agilidade, vendo-se
progressivamente incapaz de responder cabalmente aos
problemas da complexificação e diferenciação da sociedade, a
todas as exigências que lhe foram sendo sucessivamente
formuladas. O aumento das despesas sociais acabou a
comprometer o desenvolvimento económico, com o aumento dos
impostos e o crescimento da dívida pública, inibindo o
investimento. Crise de legitimidade: a par desta crise de eficácia,
outra crise de legitimidade se produziu. A evolução das
expectativas e das reivindicações sociais em relação ao Estado, fez
Patrícia Lemos

aumentar a decepção do seu não cumprimento, afetando a sua


credibilidade e autoridade política. A visão demiúrgica da política
sobrecarregou o Estado de procura social.
 A Crise do Estado Social em Portugal: O modelo de Estado Social
plasmado na Constituição é um modelo fortemente estadualizado,
pois que, segundo ele, aos direitos sociais proclamados
correspondem a ações ou prestações do Estado, verdadeira
obrigações do Estado. É um modelo, inicialmente, de tendência
coletivista, que decorreu das nacionalizações de inúmeras
instituições privadas de solidariedade social, que secundariza a
sociedade e o seu papel, entendida como supletiva do Estado. A
evolução económico-social tem vindo porém a pôr em causa a
sustentabilidade deste modelo.
 Crise da Cidadania: Assistimos mais recentemente a uma nova
reformulação da cidadania, com a emergência de novos direitos,
que não poderão ser satisfeitos mais no quadro demasiado estreito
do Estado-Nação, e novos e exigem um mais vasto enquadramento
global, por um lado, e novos e mais exíguos enquadramentos sub-
nacionais ou locais, por outro. A cidadania traduz, nas sociedades
de consumo de hoje, cada vez mais, o valor da qualidade de vida,
do respeito por si próprio, pelos outros, e pela natureza. O sujeito
destes novos direitos da vida e do ambiente, de qualidade, de
participação mais intensa, de excelência, é agora sobretudo o
consumidor. Ora estes novos direitos do consumidor não
encontram satisfação no simples quadro nacional. Problemas
como o da segurança nuclear, o da segurança dos oceanos contra
os derrames petrolíferos, o do buraco do ozono, e outros, não são
resolúveis por um só Estado-Nação, mas num quadro global e
mundial. Por outro lado, a cidadania, ao deixar de ser apenas
nacional, está a deixar de ser exclusiva e incompatível com outras
cidadanias. A multiculturalidade das sociedades ocidentais desliga
definitivamente também cidadania de nacionalidade, pluralizando
as cidadanias, ou seja, configurando, por um lado, cidadanias
plurinacionais e pluriculturais e, por outro lado, cidadanias
múltiplas. As cidadanias deixam assim de se contrapor e de se
distribuir gradualisticamente, enquanto pertenças e identificações
sócio-políticas, como indicadores de desenvolvimento. A cidadania
é pois um conceito polissémico e uma realidade plurifacetada.
Cidadania quer dizer liberdade, participação igualitária,
solidariedade social, qualidade de vida. Cidadania quer também
dizer nacionalismo e patriotismo, enquanto pressupõe Estado-
Nação e a sua defesa, identificação com a comunidade nacional,
com a sua tradição cultural e os seus valores sociais.
 Crise das Relações Estado-Sociedade: O Welfare State gerou a
socialização da política e a estadualização da sociedade, a
mercantilização da política e a politização da economia,
provocando alterações na demarcação entre esfera pública e
esfera privada, originou o aparecimento de uma economia mista e
de uma política mista, com a desprivatização da economia e a
Patrícia Lemos

despublicização do Estado. O principio político da direção foi


introduzido na vida económica e a lógica do mercado no Estado. O
Welfare State significou um contrato social, um compromisso entre
a liberdade económica e a igualdade social, entre a economia de
mercado e o dirigismo estatal, entre capital e trabalho. Ora dá-se
hoje a erosão social das partes, com a complexificação e
diversificação dos interesses do trabalho e do capital, pela crise de
representação e de mediação de interesses, quer social quer
política. A crise do sindicalismo de indústria é, simultaneamente,
uma crise de agregação de interesses, uma crise de mobilização, e
uma crise de identidade das sub-culturas profissionais e laborais.

Totalitarismo e Autoritarismo:

São várias as teorias interpretativas dos modernos regimes não democráticos,


que surgem (entre as duas guerras mundiais do séc. XX) contra a democracia
parlamentar com o propósito de a superar. Entre esses regimes, tanto se
encontram regimes anti-democráticos ditos progressistas, como regimes que se
assumem como reacionários, contra o parlamentarismo e a democracia
multipartidária.

1. Teorias nacionalistas
Teorias que interpretam os modernos regimes não democráticos como
resposta às necessidades de construção ou consolidação de nações. A
Nação é entendida como antídoto do atomismo e da decadência das
sociedades demoliberais. Estes regimes surgiram solicitados pelos
processos de moderna construção dos Estados-Nações.

2. Teorias de modernização
Esta interpretação coloca os regimes não democráticos numa perspectiva
histórica mundial. As ditaduras entre guerras seriam uma etapa do
desenvolvimento político para a democracia parlamentar.
Analisando a partir do processo de nation-building, o desenvolvimento
das nações envolve um processo simultâneo de crescente produtividade
económica, de crescente mobilidade geográfica e social, de uma crescente
eficácia política na mobilização dos recursos humanos e materiais.
O desenvolvimento político, entendido como, constante aumento da
capacidade do Estado de utilizar recursos humanos e materiais do país, ao
serviço dos objectivos nacionais, esta estreitamente ligado ao
desenvolvimento 9económico e social.
O desenvolvimento político tem quatro fases fundamentais: o Estado da
unificação primitiva, o Estado da industrialização, o Estado
assistencialista (Estado assistencial) e o Estado da abundância.

3. Teorias marxistas das classes sociais


O marxismo faz destas ditaduras uma leitura em chave de luta de classes.
Unificando fascismo e nazismo numa só categoria – fascismo – considera
o fenómeno com última cartada do capitalismo, como ditadura do grande
Patrícia Lemos

capital instrumentalizando a pequena burguesia. A social-democracia


alemã passou a ser vista como social-fascismo. O fascismo era um
epifenómeno pequeno-burguês.
O fascismo era definido como a aberta ditadura dos elementos mais
reacionários, mais chauvinistas e mais imperialistas do capital financeiro
(Dimitrov). A chegada do fascismo ao poder não é uma ordinária
substituição de um governo burguês por outro, mas a mudança de uma
forma estatal do domínio da classe da burguesia – a democracia burguesa
– por outra forma, com a aberta ditadura terrorista.
O comunismo nutre-se do antifascismo, tal como o fascismo se nutria do
anti-comunismo, mas no fundo ambos combatiam a democracia burguesa
(François Furet).

4. Ernst Nolte e a guerra civil europeia


O fascismo é a resposta à ameaça da revolução russa e do bolchevismo. O
bolchevismo é a condição fundamental para o surgimento do fascismo.
Este tem, também, como característica o anti-comunismo, sendo o anti-
semitismo secundário. O fundamental do nacional socialismo é a sua
relação com o marxismo, sobretudo com o comunismo na forma que
adquiriu com o triunfo dos bolcheviques na revolução russa.
Ernst Nolte adopta um enfoque genealógico ou genético, para concluir
que é o medo do bolchevismo que alimenta o fascismo e o nazismo.
A culpa da guerra não foi do nazismo, mas do bolchevismo que o
provocou. A guerra civil europeia entre ambos explica-se pelo contraste
entre a ideologia do segundo e a contra-ideologia do primeiro. Para o
nacional socialismo, o bolchevismo foi motivo de temor e modelo a seguir,
ao mesmo tempo.

5. Teorias do totalitarismo e do autoritarismo


Apesar do nazismo e do bolchevismo terem posições diferentes perante a
Revolução Francesa, partilham da mesma filosofia iluminista da história:
o triunfo da Racionalidade e da Ciência sobre o obscurantismo.
Aquilo de diferencia as ditaduras contemporâneas das do passado é o
facto de serem ditaduras de partido. Daí que para a sua caracterização,
seja indispensável analisar esta diferença constitutiva, nomeadamente a:
 A relação partido-Estado: As ditaduras totalitaristas são
ditaduras de movimento, que visam destruir o Estado, criando
para isso um dualismo de estruturas, mas em que as do Estado se
subordinam às do partido. O partido, entendido como movimento
é a fonte originária do poder e assume uma função de direção. O
totalitarismo é contrário à divinização do Estado e à absolutização
do seu poder, logo é antihegeliano. Herbert Marcuse contrapõe o
hegelianismo do fascismo ao nacional socialismo contra Hegel. De
facto, a filosofia do nacional socialismo de Alfred Rosenberg era
contraria ao conceito hegeliano do Estado que outorgava ao Estado
a dignidade de absoluto e o atributo de ser fim em si mesmo. O
nazismo podia descartar a forma de Estado, porque o movimento
era suficientemente forte para poder governar diretamente sem a
mediação desnecessária de formas políticas que se veriam
Patrícia Lemos

obrigadas a outorgar pelo menos um mínimo de igualdade leal e de


segurança. O Estado de Hegel é incompatível com o nacional
socialismo em que o Estado não é a realidade última da tríade
Estado, movimento, povo. É superado pelo movimento e pela sua
direção. As ditaduras autoritárias são ditaduras de partido que
visam assumir o poder de Estado, ocupar as suas estruturas. O
partido subordina-se ao Estado, que se absolutiza. O partido tem
apenas um poder derivado e desempenha uma função de suporte.
 Formas de dominação e repressão: A dominação totalitária é
mais vasta, mais intensa e é a maior repressão. O totalitarismo é
um regime de terror indistinto, que visa cidadãos indefesos e
inofensivos, e não apenas opositores. Visa suprimir a liberdade. É
uma repressão de massas. O monopólio do poder é não apenas
político mas também social. A dominação autoritária é mais
reduzida e menos intensa. Por isso a repressão é menos forte, mais
seletiva, atingindo apenas os que se manifestam contra, a oposição
organizada, a crítica pública. Visa tão só reprimir, colocar a
liberdade, mas não eliminá-la. O monopólio do poder pretende-se
apenas político.
 Concentração do poder e competitividade: Nos regimes
totalitários, a concentração do poder é maior. Existe um único
centro de poder e total ausência de competitividade. A situação é
de monismo político e social. Nos regimes autoritários, conhece-se
algum pluralismo, vários centros de poder, alguma competição
simulada ou controlada.
 Ideologia e mobilização política: Os regimes totalitários são
fortemente ideologizados, de grande e intensa mobilização
política. Conhecem a apoteose da política, que tudo invade. Tudo
se politiza. O totalitarismo significa a invasão da sociedade civil
pela sociedade política, a destruição da fronteira entre a Sociedade
e a Política, entre o poder administrativo e o poder político. Em vez
de funcionários públicos existem comissários políticos. O
totalitarismo militariza a política subordinada as Forças Armadas à
política. Os autoritarismos têm uma ideologia conservadora de
contenção de massas, visam o seu enquadramento mais do que a
sua mobilização. Querem a sociedade organizada e despolitizada.
Separam o político do social. Pretendem a mera fiscalização de
comportamentos e não a sua estandardização. São regimes mais
pragmáticos e pouco ideológicos. O autoritarismo politiza as
Forças Armadas, confere-lhes poder político.
 Condições de possibilidade do totalitarismo: O totalitarismo só
é possível em sociedade de massas. Só a massificação das
sociedades as atomiza e desintegra, a ponto de tornar possível a
sua mobilização intensa. Por outro lado, o totalitarismo exige
massas dispensáveis, que tornem possível a estratégia de terror
em que se baseia. O totalitarismo exige também novas técnicas de
destruição. Não é fácil exterminar multidões, o que exige
tecnologia de extermínio eficiente.
Patrícia Lemos

6. Modelos de Autoritarismo: Autoritarismo conservador e


autoritarismo moderno (fascismo)
Gino Germani contrapõe o autoritarismo conservador e tradicionalista ao
autoritarismo moderno ou autoritarismo de modernização e de
mobilização (participação). O processo de modernização traduzir-se-ia
numa crescente secularização (passagem de uma sociedade com
predomínio de comportamentos prescritivos a comportamentos eletivos),
numa mobilização social, traduzida em amplo processo de participação,
em ordem a uma mudança económica, no sentido da industrialização.
 Fascismo, autoritarismo moderno: O fascismo italiano teria a
modernização como propósito, a mobilização com estratégia. E
visaria o expansionismo das nações proletárias, em termos
internacionais. O que motiva a emergência de formas autoritárias
modernas é a tensão estrutural entre o processo de secularização e
a necessidade de núcleos mínimos de natureza prescritiva para
manter a integração nacional. Essencial no autoritarismo moderno
é o facto de que o objectivo da socialização e da ressocialização
planificada é a transformação de toda a população em militante
ideológico, em participante activa, porque a industrialização
moderna requer esta participação generalizada. O nacionalismo
autoritário moderno surge em países de débil nation-building, por
via da recente e incompleta unificação.
 Autoritarismo conservador: É reaccionário, seria recuperador
do tradicionalismo, procuraria integrar a nação na tradição e
visaria em termos externos, o integracionismo defensivo do seu
património histórico.

Teorias da Democracia

1. A Democracia segundo Tocqueville: regime de liberdade e igualdade


de condições
Define democracia como um regime de liberdade política e de igualdade
de condições ou de oportunidades, oposto por isso à aristocracia.
Utilizando um método indutivo, a partir da observação, e comparativo,
conclui pela formulação de modelos tipo de sociedades, caracterizadas
não apenas por características sociais políticas, mas também morais.
A democracia pressupõe uma sociedade mais igualitária, com maior
igualdade de oportunidades, e um governo fundado na soberania popular
e na liberdade política. A democracia é favorecida por relações sociais
menos hierarquizadas e por costumes brandos, porque nela os cidadãos
se assemelham na maneira de viver e de encarar o mundo. Os democratas
têm um gosto pela liberdade e uma paixão pela igualdade. Governo
democrático é aquele em que o povo tem maior parte nele, mas também
um sistema de maior autorregulação.
Papel importante na separação e no controlo do poder joga a liberdade de
imprensa, tal como a religião contribui para o auto-controle da sociedade.
Desligando do poder, a religião é um poderoso aliado da liberdade. É a
autorregulação democrática que impede a Revolução e a ausência dela
que a favorece.
Patrícia Lemos

2. A teoria do mandato concorrencial de J. Schumpter


Democracia é o sistema institucional de tomada de decisões políticas, em
que os indivíduos adquirem poder de estatuir sobre as decisões na
sequência de uma luta concorrencial por votos do povo. O que implica:
 Possibilidade de respeitar a escolha dos governantes feita pelo
povo em eleições. A monarquia parlamentar é democrática.
 Consagra e não ignora o papel da liderança e a possibilidade de a
substituir
 Não despreza as vontades colectivas automaticamente expressas
 Competição pela direção política: livres candidaturas em
competição por votos livres
 Regime de liberdade: cada um se pode candidatar contra o poder,
com liberdade de discussão e de imprensa
 Poder de gerar um governo e de o derrubar, pelo eleitorado
 Vontade da maioria e não vontade do povo – as rédeas do governo
confiadas aos que forem mais votados

A democracia não significa que o povo governe efetivamente, mas, que o


povo aceita ou afasta os homens chamados a governar, através da livre
concorrência entre candidatos aos postos de comando, pelos votos dos
eleitores. Subordinação do governo aos votos do parlamento e do corpo
eleitoral. Cria profissionais da política, que converte em “homens de
Estado”.
 Condições de sucesso da democracia:
 Material humano de qualidade: uma classe política selecionada,
experiente, treinada
 O domínio efetivo das decisões politicas não deve ser
exageradamente vasto, mas limitado as questões que o grande
publico pode compreender e sobre os quais pode ter opinião
 Um processo democrático deve dispor dos serviços de uma
burocracia bem treinada, gozando de boa reputação, apoiada em
sólidas tradições, dotada de sentido vigoroso do dever e de
espírito de corpo: uma burocracia forte para guiar e instruir os
ministros políticos
 Auto-controlo democrático – enquadramento de opiniões,
disciplina de partido, respeito pelas legislaturas

3. Os pressupostos económico-sociais da ordem democrática de S.


Lipset
Para Lipset a democracia é o sistema político que oferece oportunidades
constitucionais regulares para a mudança dos funcionários governantes, e
um mecanismo social que permita a maioria da população influir nas
principais decisões mediante a escolha entre contendores para cargos
políticos. Exige pois:
 Uma fórmula política
 Um conjunto de líderes políticos
 Uma oposição
 Pré-requisitos económico-sociais da democracia:
Patrícia Lemos

 Uma sociedade igualitária


 Modernização
A estabilidade das democracias depende da legitimidade e da eficácia;
condição avaliativa e instrumental. As crises de legitimidade dão-se nas
mudanças de estrutura social e com as crises de ingresso na política de
novos estratos sociais.

4. Teoria poliárquica da democracia de Robert Dahl


A principal característica da democracia é a contínua responsabilidade do
governo perante as preferências dos seus cidadãos, considerados
politicamente iguais. Para haver responsabilidade, os cidadãos devem ter
oportunidade de:
- Formular as suas preferências
- Manifestá-las ao governo por ações individuais e colectivas
- Ver as suas preferências igualmente consideradas no
comportamento do governo, sem discriminação por causa do
conteúdo ou fonte dessa preferência
 Condições da democracia:
 Liberdade para formar e entrar em organizações
 Liberdade de expressão
 Direito de voto
 Elegibilidade para cargos políticos
 Direito para os líderes políticos competirem em votações
 Fontes de informação alternativa
 Eleições livres e isentas
 Instituições governamentais dependentes do voto e de outras
expressões de preferência
Regimes políticos: dependem da inclusividade e da contestação pública, ou
seja, da participação e da liberalização.
 Teoria da poliarquia: O poder não é soma-zero, algo que uns têm
e outro não. O estrato político não é homogéneo, mas pluralista e
diversificado nas sociedades industriais. O poder está disseminado
e as possibilidades de controlo dos governantes e os recursos
políticos dos governados. A elite dirigente das democracias
pluralistas depende dos subordinados. Influenciam-se
reciprocamente. As poliarquias são de elevada participação e
oposição, inclusão e competição.
 As modernas democracias representativas são uma
poliarquia porque são:
 Governos de representação
 De extensão ilimitada
 Com limites a participação democrática
 Diversidade política dos seus habitantes
 Multiplicam-se as clivagens e os conflitos políticos
 Pluralismo de grupos sociais e organizações
 Expansão dos direitos individuais
 Poliarquia distingue-se por duas características:
- A cidadania entende-se a uma alta proporção de adultos
Patrícia Lemos

- Os direitos de cidadania incluem o de se opor e votar os mais altos


cargos do governo (oposição)
 Instituições da poliarquia:
 Cargos eleitos. Controlo sobre o governo e suas decisões através de
eleições
 Eleições livres e justas, sem coerção
 Sufrágio inclusivo, alargado a todos os adultos
 Direito de candidatura aos lugares
 Liberdade de expressão sem repressão
 Informação alternativa: outras fontes
 Autonomia de criar associações

Poliarquia é um sistema político que em que existem as seguintes


condições:
 Durante o período eleitoral:
 Todos os membros da organização realizam os actos que se
considera serem uma expressão de preferência entre as
alternativas
 Ao ordenar as preferências, o valor atribuído à escolha de cada
indivíduo é idêntico
 A alternativa com maior número de votos é declarada vencedora
 No período pré-eleitoral:
 Qualquer membro que apreende um conjunto de alternativas, uma
das quais é encarada como preferível às outras, pode inserir a sua
preferência entre as alternativas postas à votação
 Todos os indivíduos possuem idêntica informação acerca das
alternativas
 No período pós-eleitoral:
 As alternativas com o maior número de votos destituem as
alternativas com menos votos
 As ordens dos eleitos são executadas
 Durante o período entre eleições:
 Todas as decisões entre eleições são subordinadas às chegadas
durante o período eleitoral, isto é, as eleições estão controlando;
ou novas decisões durante este período são governadas pelas
precedentes 7 condições, operando contudo sob circunstâncias
institucionais bem diferentes.

5. Teoria económica da democracia de Anthony Downs


Anthony Downs vai buscar a Schumpeter a ideia de que a função social
não corresponde aos motivos privados dos diretores de grandes
empresas, bem como dos políticos. Os primeiros querem produzir bens
(função social) mas pessoalmente querem obter lucros (função privada).
Os segundos, da mesma maneira, têm como motivo social promover
políticas governamentais, mas privadamente o que pretendem é manter-
se no poder.
A vida política possui uma racionalidade idêntica a vida económica. Os
partidos comportam-se como os empresários das economias lucrativas:
Patrícia Lemos

racionalmente, para obter o maior número de votos. Os cidadãos


comportam-se igualmente de forma racional, analisando os custos e
benefícios dos seus atos.

6. A teoria decisional da democracia de Giovanni Sartori


A política consiste em decisões colectivizadas, isto é, decisões que dizem
respeito a uma colectividade. Mas nem todas as decisões colectivizadas
são políticas. São políticas quando são, soberanas, sem escapatória e
sancionáveis.
Riscos externos e custos de decisão – os custos variam com o número de
pessoas que participam nas decisões. A amplificação de um órgão
decisório realiza-se para minorar os riscos externos. O número de
decisores está em relação inversa com os riscos externos.
Para além do número de pessoas há que introduzir outras variáveis:
- O método de formação do órgão decisório
- A norma que rege a tomada de decisões
A primeira pode reduzir riscos externos, a segunda incide sobre os custos
de adopção.
Os riscos externos variam na medida em que varia o método de nomeação
e o tempo de nomeação.
A unanimidade nem sempre implica poder igual. Só funciona em grupos
reduzidos. Os custos de adopção são elevados. A maioria qualificada,
simples ou absoluta, ou relativa, diminuem os custos de adopção.
A razão para baixar os tectos maioritários é o facilitar das decisões, no
entanto, o motivo oculto é a redução dos riscos externos.
Optar por uma regra maioritária obriga ao equilibro entre conveniência e
segurança.
Os riscos externos são mais função do método de formação do grupo
decisor, da sua composição e natureza, do que do número de pessoas que
decidem.
O método representativo visa fazer face aos riscos externos. Minimiza-se
os riscos, sem obstrução ao processo de decisão, partindo mais de como
se forma o grupo decisor do que do como decide.
O método representativo de formação de órgãos decisores possibilita uma
queda vertiginosa da curva dos riscos externos, enquanto as regras de
adopção de decisões apenas permitem menor crescimento dos custos das
decisões.
 Resultados e contextos das decisões:
- Tipo de resultado
- Contexto da decisão
- Intensidade de preferência
A regra da maioria iguala os indivíduos, mas iguala intensidades
desiguais.
A intensidade é a base esquecida do poder, a mais poderosa e
absolutamente independente. As minorias intensas levam consigo uma
carga adicional nos processos de decisão: a sua intensidade compensa a
sua inferioridade numérica. As minorias governam sempre.
 O sistema ideal de adopção de decisões tem que:
- Dar a mesma importância a cada individuo
Patrícia Lemos

- Dar o mesmo peso as intensidades iguais


- Equilibrar os resultados de soma positiva e soma zero
- Minimizar os riscos externos
- Minimizar os custos de adopção de decisões
Patrícia Lemos

Regimes e Sistemas Políticos – 2ª Frequência

Evolução do sufrágio eleitoral


A reivindicações “one man, one vote” era não só de que a todos os homens fosse dado o
voto (alargamento ou universalização do sufrágio), mas também que a cada homem
fosse dado o mesmo voto (igualitarização do voto).
Modelos de evolução por Stein Rokkan:
 Modelo inglês: emancipação lenta e gradual, mas com longo período de
conhecimento formal de desigualdades
 Modelo francês: antiga e súbita universalização e igualitarização da
cidadania política, mas com frequentes recuos e com tendência para a
exploração plebiscitária do apoio de massas

Limitações do direito de voto:


A universalização do fisco vai de par com a universalização do voto na Europa, num
equilíbrio cívico que carateriza a construção da cidadania e do Estado-nação.
Estabelece-se uma troca entre um direito concedido mediante um dever comprimido
para com o Estado (ex: direito dado aos militares da 1ª Guerra Mundial).
Da concepção patrimonial do Estado, e do entendimento do voto como função, e não
ainda como um direito, resultou o primeiro grande limite do sufrágio, o sufrágio
censitário, seguido pelo sufrágio capacitário.
De acordo com a concepção liberal do voto como função e não como direito, a insistência
é feita nos requisitos de independência económica e de capacidade intelectual. Ideia do
corpo eleitoral “qualificado”, que gera a subordinação do sufrágio à propriedade e à
razão. A evolução para o sufrágio universal fez-se porém através da eliminação de
inúmeras outras limitações do direito de voto.
 Principais formas de limitação:
 Sufrágio censitário – liberdade conferida por propriedade; só os
proprietários, que por ela pagavam impostos, podiam votar; base
fiscal
 Sufrágio capacitário – o que tornava os cidadãos esclarecidos era a
instrução; o voto fica reduzido aos escolarizados – defendido por
Stuart Mill
 Critérios de responsabilidade doméstica – só os chefes de família,
por serem os únicos a terem responsabilidade familiar, podiam
votar; faziam-no em nome da família
 Critérios de residência – quem não residisse há tempo suficiente na
circunscrição, não acompanhava a vida política, não reunia as
condições de consciência para votar livremente; exclusão dos
emigrantes
 Critérios tradicionais de Estados
 Limites etários – limite relativo a idade dos indivíduos; começou
por ser aos 25, passando para os 21, depois para os 18 e, já há
países que desceram o patamar para os 16
 Limites de sexo – limite relativo ao voto da mulher, as mulheres não
tinham poder de voto; apenas concebido em 1897
Patrícia Lemos

A desigualdade do voto:
Foram várias as formas de diferenciação do voto:
 O voto plural ou voto múltiplo, cada cidadão teria, além do seu, um ou
mais votos, conforme a sua fortuna e impostos e, conforme os seus
diplomas de educação formal – “pessoas superiores têm direito a uma
influência superior”.
 O voto estratificado, divisão do eleitorado por estratos ou graus ou
categorias sociais, com desigualdade numérica de eleitores mas com
número igual de representantes.
 O voto limitado, os eleitores não podem votar mais do que parte do
número de representantes de circunscrição.
 A panachage, possibilita o corte ou acréscimo de algum nome as listas
apresentadas.
 O voto público ou aberto, por vezes por aclamação, com declaração
pública em que se votava ou com evidência pública do sentido de voto.
O sufrágio indireto, utilizado como crivo do sufrágio universal, ou a cooptação de parte
das assembleias pela parte eleita.

Causas e efeitos da extensão do voto:


Teve como efeitos o aumento da mobilização política e, com ela a transformação de
partidos. Os conservadores viram no ingresso de subordinados e de mulheres no
eleitorado um passo estratégico decisivo para a estabilização do sistema nacional,
contra liberais e socialistas.
Mais do que a exigência popular, foi um expediente de reforço do poder estabelecido.
Acabou por desenvolver a oligarquia e de transformar o caciquismo local em caciquismo
governamental e administrativo.

Efeitos da consagração do carácter secreto do voto:


Evitam-se pressões sobre o eleitor, enfraquecendo-se os poderes intermédios. O adulto
é posto fora dos seus sistemas de subordinação e posto só perante o Estado. O voto
secreto permite ao operário votar conservador, afastando-o tanto dos superiores como
dos pares. O voto passa a não ser vendido, enfraquecendo a corrupção e, reduzindo o
conformismo e a solidariedade. A privacidade do voto ajuda a estabilizar o sistema, ao
consentir a muitos abandonar a política. Estratifica o eleitorado na dimensão público-
privado, ao diferenciar os que revelam o sentido de voto e os que não o fazem.

Sistemas eleitorais:
O sistema eleitoral é o mecanismo de transformação de votos em mandatos. Os sistemas
eleitorais têm dois objectivos: visam a eleição de representantes e a escolha de
governantes, têm pois uma função legislativa e outra política. Estas duas funções dos
sistemas eleitorais – assegurar a governabilidade e a eficácia e, a legitimidade ou
representatividade – são de difícil compatibilização. Sistemas que servem para escolher
governantes, não servem tão bem para escolher representantes e, vice-versa. Os
sistemas eleitorais são apenas instrumentos a utilizar em função dos fins a prosseguir e
dos problemas a que devem fazer face de cada vez.

Origem dos sistemas eleitorais:


O primeiro sistema eleitoral a surgir, foi o sistema maioritário. Correspondia a ideia de
que ganhava a eleição o que tinha mais votos (first past the post system). Foi um sistema
introduzido por via evolutiva e, criou as chamadas democracias maioritárias.
Inicialmente adoptado sob a forma de maioritário simples (simple plurality system),
viria a exigir posteriormente a obtenção de maiorias absolutas, e para tanto começarem
Patrícia Lemos

a multiplicar-se os turnos, criando-se a chamada segunda volta ou ballotage. Era um


sistema de “zona zero”, onde quem ganhava, ganhava tudo (the winner takes all) e quem
perdia, perdia tudo.
Com a massificação da democracia iniciou-se uma luta pela representação proporcional.
Este, passou a ser o sistema adoptado por via revolucionária, cuja ideia era de que as
eleições deveriam configurara proporcionalmente a representação dos vários sectores
de opinião pública de um país, favorecendo a democracia consociativa. Os ganhos
eleitorais passavam a distribuir-se por todos, numa ótica de “soma positiva”.

Modalidades de sistemas eleitorais:

1) Sistemas maioritários
 O sistema maioritário mais antigo é o inglês. Trata-se de um sistema
uninominal a uma só volta, a um só turno, em que ganha por maioria
simples o candidato que fica à frente.
 O sistema maioritário uninominal a duas voltas, que existe em França,
exige a obtenção da maioria absoluta para se ser eleito. Se essa
maioria for conseguida na primeira volta, o candidato é eleito. Caso
contrário, processa-se a uma segunda volta, à qual concorrem apenas
os dois candidatos mais votados.
 O sistema maioritário é, em regra geral, um sistema de single-member
constituency ou de circunscrição uninominal, muito embora com o
tempo tivesse adotado também a modalidade de circunscrição
plurinominal, em duas versões: lista completa ou lista bloqueada
plurinominal, ou maioritário de lista – em cada circunscrição distrital
era eleita toda a lista vencedora; ou lista incompleta plurinominal –
permite às minorias, que não conseguem representação em nenhum
círculo, juntar os votos dispersos, para obter representação própria.
 O sistema de voltas sucessivas, pode concentrar-se apenas numa só
operação, assumindo a forma de voto alternativo, com várias
contagens. A aquisição da maioria obtém-se com as distribuições
adicionais das segundas escolhas as primeiras, começando pelos
eleitores dos candidatos menos votados.
 Voto único não transferível, cada eleitor tem um único voto mas em
circunscrições plurinominais, ou seja escolhe-se entre um certo
número de nomes apenas um desses.
 Voto limitado, onde nas circunscrições se elegiam vários deputados,
podendo cada eleitor votar em apenas um deles.
 Voto acumulativo, atribuía-se a cada eleitor tantos votos como o
número de membros da lista.

Características fundamentais:
- Proximidade candidato-eleitor.
- Governabilidade, estabilidade e eficácia governativa.
- Diminui influência dos partidos sobre deputados, e faz crescer a dos deputados nos
partidos.
- Valoriza os votos dos indecisos.
Patrícia Lemos

- Pragmatiza os partidos.
- Proporciona maior rejuvenescimento.

2) Sistemas de representação proporcional


No sistema de representação proporcional, não ganha apenas o que fica à frente, mas
todos ganham, na proporção dos votos obtidos. Há uma maior e mais equitativa
distribuição dos lugares.
Motiva a formação de associações em sua defesa, tais como a Liga para a Representação
Proporcional, em França, e a Proporcional Representation Society, em Inglaterra.
Primeira expressão de RP foi a do: voto único transferível, sistema semelhante ao do
voto alternativo, de votações sucessivas, numa circunscrição unipessoal, de uma só vez,
mas em vez de um só eleito, este método permite a eleição de vários.
Cada eleitor tem um voto, independente do número de lugares, aplica-se o Quociente de
Droop, quando o eleito atinge o quociente é eleito, onde de seguida param os votos o seu
favor, ficando alguns por eleger, eliminam-se os que tiveram menos votos na
1ºpreferência e assim sucessivamente.
o Este sistema visa reforça a posição do candidato individual, estimula as
minorias, consegue eleger os mais capazes, sem estarem demasiado
dominados pelas máquinas partidárias.
o É um sistema particularmente adequado para países ou comunidades
pequenas.
Sistema de Andrae: o eleitor, em vez de votar num só candidato, distribui os
candidatos da sua preferência numa lista, por ordem de preferência. Um candidato é
eleito quando atinge o número correspondente ao quociente eleitoral de Andrae,
traduzido pela divisão do número de vontades pelo número de deputados. Os votos
sobrantes desse deputado eleito transitam para o segundo nome das preferências.
Método de Hondt ou da média mais alta: divide-se o número de votos obtidos por
cada partido pelo número de deputados elegidos em cada circunscrição.
Método de Saint-Lague: variável da média mais alta. Divide-se o nº de votos obtidos
por cada lista por números ímpares, é diferente do anterior porque toma em conta uma
parte dos restos.
Método do Quociente Hare: obtém-se dividindo o número total dos sufrágios
validamente expressos pelo número de lugares, depois dividem-se os votos obtidos por
cada partido pelo Q e apuram-se os restos.
Q – sufrágios expressos. Lp – lugares a preencher.

Correções da proporcionalidade:
- Cláusula barreira, que impede as mais pequenas formações políticas de aceder ao
Parlamento, evitando o efeito fraccionalizador e polarizador da proporcionalidade.
- Moção de censura construtiva, refreia a instabilidade governativa favorecida pela
proporcionalidade.

3) Sistemas Mistos
São sistemas que tentam conciliar as vantagens dos anteriores, minorando os
correspondentes defeitos. Têm vindo a crescer, principalmente em novas democracias.
Em que sobrepõem dois níveis de atribuição de lugares, sendo um nominal ou pessoal e
outro de lista.
Patrícia Lemos

Se as duas fórmulas agem independentemente uma da outra, temos “sistemas mistos de


combinação independente”, caso contrário, se o resultado de uma fórmula depende do
resultado da outra, denominam-se “sistemas mistos de combinação dependente”.
Ainda existem sistemas mistos de correção – os lugares proporcionais são atribuídos
para corrigir as distorções provocadas pelo maioritário.
Sistemas mistos condicionais – uma fórmula só entra em jogo se os resultados da
aplicação da outra, não respeitam as condições pré-estabelecidas. Sistema mais
conhecido é o alemão.
Influência dos sistemas eleitoras:
Os sistemas eleitorais influem na vida política através dos partidos, quer de forma direta
(provocando uma certa organização de partidos) quer de forma indireta (essa
organização de partidos leva a determinadas formas políticas). Analisando apenas a
influência direta dos sistemas eleitorais sobre o número, a estrutura e a dependência
recíproca dos partidos, Duverger estabeleceu as seguintes “aproximações”:
1. A representação proporcional conduz a um sistema de partidos múltiplos,
rígidos e independentes;
2. O escrutínio maioritário de duas voltas leva a um sistema de partidos
múltiplos, flexíveis e independentes;
3. O escrutínio maioritário de uma só volta leva ao dualismo dos partidos.

Os sistemas eleitorais que gerem sistemas de partidos fortes ou fracos tenderão a


configurar os parlamentos. Assim, os sistemas eleitorais de representação proporcional,
que favorecem a partidocracia e fortes influências dos partidos nos sistemas políticos,
propenderão a criar parlamentos arenas, onde se privilegia a função política de debate.
Por seu lado, os sistemas maioritários, que tendem a reforçar o poder dos deputados,
enfraquecendo os partidos, produzirão mais facilmente parlamentos transformadores,
em que a função legislativa é sobrevalorizada.

Sistemas partidários
Os partidos são condição indispensável da democracia, que se organiza através deles. Os
partidos nasceram com o governo representativo, ou seja com o pluralismo do
parlamentarismo liberal, quando se começaram a formar frações nos parlamentos. Os
partidos do parlamentarismo são formas de mediação estrutural e duradoura entre os
parlamentares e os eleitores, entre a sociedade civil e o Estado.

Natureza e função dos partidos políticos

a) Natureza de mediação dos partidos


O pluralismo da representação política começou por se traduzir no aparecimento de
fações e, só mais tarde estas evoluíram para a forma de partidos.
Partidos políticos: Organizações políticas que estabelecem a mediação entre a
sociedade e o Estado, entre a sociedade civil e a sociedade política, que apresentam e
traduzem as mensagens sociais ao Estado, em termos políticos e, reapresentam e
traduzem as mensagens políticas do Estado a sociedade em termos sociais. Conformam
politicamente a sociedade e configuram socialmente o Estado. São instituições de
mediação política e social, que agregam, combinam e representam os interesses e as
opiniões políticas numa dada sociedade. Os partidos são uma expressão da
modernidade, que concretizam uma das suas dimensões, que é a da mobilização política
e da participação política.

b) Funções dos partidos


 Função de agregação e combinação política
Patrícia Lemos

 Função de representação
 Função de seleção de candidatos e recrutamento de pessoal político
 Funções de educação e socialização política
 Função de regulação de conflitos
 Função tribunícia
 Função de legitimação-estabilização
 Função de revezamento político de autoridades de substituição

c) Organização de partidos
São organizações que tendem a institucionalizar-se para além dos seus fundadores,
dotando-se de autonomia própria.

1. Origem dos partidos


Existem várias abordagens explicativas da origem dos partidos, que deram origem a
várias teorias relativas a génese dos partidos. Há três principais teorias explicativas das
origens dos partidos:
a) A teoria institucional, que focaliza a sua atenção nas relações entre os
primeiros parlamentos e a emergência dos partidos
b) A teoria histórica que aponta para as situações históricas de crise e para
as tarefas a desempenhar pelos partidos
c) A teoria de desenvolvimento, que relaciona os partidos com processos de
modernização

a) A teoria institucional de Duverger

Os partidos começaram por ter uma base e dimensão nacional, mas rapidamente se
internacionalizaram e se regionalizaram. Os partidos diferenciam-se à partida pela sua
origem. Duverger estabelece a diferença entre partidos de origem parlamentar e
eleitoral e partidos de origem exterior ao parlamento.

 Partidos de origem eleitoral e parlamentar:


o Iniciam-se em afinidades locais, depois ideológicas e de interesses;
o Formação de grupos parlamentares para potenciar capacidade
eleitoral; papel do clientelismo e caciquismo na angariação de votos e
na compra deles.
o Surgimento de comités eleitorais, alargamento do sufrágio, ao
desenvolvimento de sentimentos igualitários, com vontade de
eliminar as elites tradicionais;
o Formação de comités eleitorais: agrupa amigos fiéis à sua volta.

 Partidos de origem exterior ao parlamento:


o Fundados por sindicatos ou por intelectuais.
o Cooperativas agrícolas ou grupos profissionais de agricultores.
o Influência de sociedades de pensamento ou grupos intelectuais.
o Influência de igrejas
Patrícia Lemos

o Antigos combatentes: não atuam no terreno eleitoral e parlamentar,


apenas visam a propaganda e agitação.
o Sociedades secretas e grupos clandestinos.
o Grupos de interesses económicos.

b) A teoria histórica das crises


Os partidos seriam respostas a crises específicas, quer crises de legitimidade, quer crises
de integração, quer crises de participação, ou o seu aparecimento provocaria uma crise
no sistema político. Em primeiro lugar, houve partidos que surgiram de crises de
legitimidade, quando as autoridades estabelecidas foram substituídas, ou não foram
capazes de enfrentar e resolver problemas de legitimidade. Por outro lado, houve
partidos que apareceram para responder a crises de integração nacional, em países em
processo de unificação ou de emancipação. E ainda, formaram-se partidos para
responder a crises de participação, com a ocorrência de mudanças nas relações entre as
autoridades e os indivíduos, e a emergência de novos grupos e elites.

c) A teoria do desenvolvimento político


Os partidos terão surgido para fazer face à necessidade dos que pretendem manter ou
conquistar o poder de procurar apoio junto de um mais largo público, sobretudo quando
a atitude dos sujeitos para com a autoridade se altera, ou quando uma parte da elite
dominante procura novos apoios políticos para tomar ou manter o poder.

2. Desenvolvimento dos partidos


Franz Neumann : distingue partidos de representação dos partidos de integração.
Os partidos de representação eram grupos de deputados e de comités locais de notáveis.
A transformação de partido de notáveis em organização de eleitores, inicia-se com a
relação dos deputados aos comités de eleitores. Os notáveis pertenciam à elite
aristocrática, património próprio que lhes permitia administrar sem ganhar, cultura e
direito de voto.
Partidos de notáveis – “uniões eleitorais” de burgueses unidos por convicções políticas
comuns. Os eleitos dispunham de liberdade de se unirem a qualquer grupo parlamentar.
Estas “uniões eleitorais” são comités alargados de notáveis, centralizadas. Só se
transformam em partidos de massas com o alargamento do sufrágio.
A ideologia torna os partidos em mundividências, em projectos de organização do
mundo e da sociedade. Daí que estes partidos fidelizem muito mais que os simples
partidos baseados em lealdades pessoais de caciques ou notáveis, que patrocinavam as
suas cliques.

Partidos e desenvolvimento político


a) Partido de expressão da modernidade e factor de modernização:
 Ingresso das massas na política moderna
 Alargamento e institucionalização da participação política
 Modernização tecnológica
 Modernização educativa
 Modernização financeira – novas formas de gestão.
b) Partido, factor desenvolvimento: intercomunicador entre cidadão e
governo, entre grupos, clivagens e estratos, promovendo a circulação das
elites e a renovação da administração.
Patrícia Lemos

Tendências de evolução dos partidos


a) Do partido de representação ao partido de integração de massas – por via
do ingresso das massas camponesas e operárias na política moderna nas
sociedades de classes.
b) “Catchallparty”
- Partido interclassista; heterogeneidade social
- Drástica redução da ideologia; prevalecem as tácticas a breve prazo
- Reforço dos grupos dirigentes
- Diminuição do papel do indivíduo, membro do partido.
- Menor acentuação da “classe gardé”, de uma classe ou clientela eleitoral
- Mercantilização do partido e da política; o partido como “marca” comercial.
- Diminuição das fidelidades; aumento da volatilidade eleitoral
- Influência crescente de factores circunstanciais.
- Maior independência dos partidos em relação aos grupos de interesses
- Alargamento dos objectivos dos partidos aos nacionais: educação, bem-estar
- Diminuição das necessidades de segurança.
c) A desideologização dos partidos e crescente pragmatização
partidos ideológicos continuam com funções tribunícias ou expressivas.
d) Aumento da volatilidade eleitoral
e) Partido Cartel: Provem do Catch-all-party
 Objetivos políticos: reivindicações concorrentes sobre a eficiência e a
eficácia das respetivas gestões
 Competição entre partidos: controlado e gerido pelo reciproco
interesse na sobrevivência organizativa coletiva
 Recursos: as campanhas são profissionais e centralizadas, quase
exclusivamente com uso intensivo de capital e com recursos vindos de
subvenções estatais
 Inscritos e lideranças: a diferença entre inscritos e não inscritos não é
tão clara , pois a mobilização é dos apoiantes: prevalece uma visão
otimista da base do partido, com filiações nao tanto locais mas
diretamente centrais, minimizando as organizações locais
d) O cartel dos partidos manifesta-se de duas maneiras:
 Conspirando para obter subsídios do tesouro público, já que as fontes
tradicionais de financiamento não satisfazem a crescente procura
 Limitando a concorrência entre as políticas: os partidos cartelizam o
mercado dos votos, tornando-o num oligopólio, apenas acessível a
alguns

Indicador do declínio das clivagens tradicionais: estado/igreja; campo rural/cidade


industrial; centro/periferia; capital/trabalho;

Tipologia do Sistemas de Partidos

Desde à muito tempo que os sistemas partidários são classificados consoante o nº de


partidos ( um, dois, mais que dois). Mas hoje em dia existe um acordo praticamente
unanimo de que esta distinção entre um partido, dois partidos ou sistemas
multipartidários é altamente inadequada.
Patrícia Lemos

A importância da contagem dos partidos reside no facto de esse valor numérico indicar
um aspecto relevante do sistema político: a medida em que o poder político é
fragmentado ou não fragmentado, disperso ou concentrado. Da mesma maneira que
sabendo quantos partidos existem ficamos alertados para o número de possíveis fluxos
de interação que estão envolvidos.
E tendo em conta que estes fluxos de possível interação ocorrem a diferentes níveis –
eleitorais, parlamentares e governamentais – isto indica claramente que quanto maior
for o numero de partidos, maior a complexidade e interação do sistema.
Além disso as estratégias de competição e oposição entre partidos aparecem
relacionadas com o numero de partidos, e consequentemente com a formação de
coligações e como é que estas são capazes de representar.
Ou seja nenhum sistema de contagem pode funcionar sem regras de contagem. Logo se
recorrermos ao método de contagem , temos que saber como contar. Mas o problema é
que até em decidir se um partido é mesmo ou se é um sistema de dois partidos nós
enfrentamos problemas na classificação. Portanto não é de surpreender que a
abordagem do numero de partidos conduza a frustração.
2. Rules for counting
• Which parties are relevant?
• How much strength makes a party relevant, and how much feebleness makes a
party irrelevant?
• What size, or bigness, makes a party relevant regardless of its colligation
potential?
Para começar, a força de um partido traduz-se na sua força eleitoral, mas como o que
conta no final das eleições são os lugares, podemos entender a força de um partido como
“Strenght in seats”. Por outro lado e em termos de comparação num sistema
bicameralista a força do partido parlamentar é indicado pela percentagem de lugares na
câmara baixa.
Assim sendo, olhando para os partidos como um instrumento de governo, quanto maior
for o numero de partidos, mais temos que averiguar o potencial de governo e potenciais
coligações de cada partido. Porque aquilo que realmente pesa na balança do
multipartidarismo é o quão um partido pode ser necessário enquanto parceiro de
coligação para uma ou mais maiorias governamentais.
Assim os partidos devem ser contados de acordo com dois critérios: em primeiro lugar
pela relevância coligacional ou o potencial de alianças, e em segundo lugar o potencial
de intimidação ou capacidade de pressionamento da governação. Ou seja, o peso de um
partido depende não apenas no numero de votos ou de deputados, mas também da sua
colocação no espectro partidário, ou seja, dentro do sistema de partidos.
Ou seja, os partidos que devem ser considerados são aqueles que têm ou relevância na
arena de formação de coligações, ou uma relevância competitiva na arena oposicional.
Para conseguirem imaginar isto na prática, é como sistema inglês, que é bipartidário
mas porque o terceiro partido não é relevante para formar coligações.
Sartori vai mais além do que a utilização de um critério exclusivamente numérico,
olhando também para dimensão ideológica dos partidos e respetiva polarização ou
despolarização do sistema partidário.
Isto torna-se visível analisando a tipologia de sistemas de partidos que este apresenta,
cujo tema será aprofundado seguidamente mas enquanto base de partida importa fazer
a seguinte classificação:
• Partido único – totalitário em que não são permitidos outros partidos
• Partido hegemónico - Existem outros partidos mas em que nem sequer têm
possibilidade de ganhar
• Partido predominante - Exemplo da madeira eleições livres democráticas e
justas, mas quem ganha sempre é o PSD por isso pode-se falar em sistema de partido
predominante
• Bipartidarismo - caso britânico
Patrícia Lemos

• Pluralismo limitado: menos de 5 partidos


• Pluralismo extremo: + de 5 partidos
• Atomizado ?
Conclusão: Para além da contagem dos partidos é necessário ter em conta a dimensão
ideológica dos partidos.
Ou seja a distancia entre partidos e os polos que se traduz na sua capacidade de
consenso. No fundo a polarização e despolarização traduzem o grau de centramento ou
descentramento político na escala esquerda-direita. a dinâmica do sistema partidário e
denotam ou o processo centrifugo, dilacerador do consenso, ou o processo centrípeto de
recomposição do consenso.

Critérios de classificação
- Indicador da fragmentação: número
- Indicador da polarização: distância ideológica

Partido Cartel
Provem do Catch-all-party
 Objetivos políticos: reivindicações concorrentes sobre a eficiência e a
eficácia das respetivas gestões
 Competição entre partidos: controlado e gerido pelo reciproco
interesse

Famílias políticas partidárias


1 – A democracia cristã e os partidos populares – aparecimento do pensamento
político.
1 – Anti- liberalismo e liberalismo católicos
 O anti-clericalismo e o racionalismo laicista da revolução liberal: conflito
ideológico, o conflito político de jurisdições e o conflito económico, entre
o estado liberal e a igreja nos países latinos e católicos.
 A 1º expressão do liberalismo católico: L’Avenir (1830), e a tentativa de
conciliação entre a religião e a liberdade: defesa da liberdade de
consciência e da liberdade religiosa, da liberdade de ensino e de
imprensa, da liberdade de associação e do sufrágio universal, das
liberdades locais e da liberdade dos povos e das nações.
 Primeira condenação do “liberalismo católico” – condenação da liberdade
de consciência como liberdade de erro, e da imoderada liberdade de
opiniões. Contra a liberdade de imprensa defesa do index e da censura;
contra o rebelião defesa da submissão às autoridades
 A 2º expressão do liberalismo católico – defesa da liberdade de ensino, de
associação, de imprensa e de culto; defesa da autonomia da sociedade
temporal, com o propósito de corrigir a democracia com a liberdade e de
conciliar o catolicismo com a democracia.
 Segunda condenação do liberalismo: crítica aos que pretendem separar a
igreja do estado, defesa da obrigação do estado proteger a igreja: critica
ao laicismo do estado e da subordinação da igreja ao estado; critica da
opinião pública como constituidora da lei suprema , independente do
direito divino; critica da liberdade de opinião e de culto; economiciscmo
liberal; laicização do ensino.
Patrícia Lemos

Syllabus – condenação da separação entre o estado e a igreja, do direito de rebelião, da


recusa da religião católica como religião do estado.
- A conciliação com o liberalismo moderado: A autoridade vem de Deus, e necessária às
sociedades, servir o bem comum. As ordens devem ser justas, respeitar-se a autoridade
do soberano. A sedição e crime. A liberdade do Homem é a liberdade de obedecer a deus.
2 – O movimento social católico e democrata cristão
2.1 – O catolicismo liberal
 Assistencialismo social para operários: tentativa de conciliar a
democracia com o catolicismo; defesa do corporativismo de produção.~
 Pensamento social católico: Harmel – defensor da organização autónoma
dos operários contra os sindicatos mistos; ketteler – defensor do
intervencionismo estatal e da legislação operária.
2.2 – Primeiras tentativas de politização do movimento social católico
- “abbésdémocrates”: LeSillon por marcsangnier.
- “novos” Don RamuloMurri em Itália: vitória no congresso de Bolonha e formação da
Liga Democrática Nacional.
- As diretrizes do Vaticano: a questão social é também moral e religiosa e não só
económica; democracia cristã como ação não só social independente de regimes dos
partidos.
- levantamento da proibição aos católicos italianos d intervir na vida política 1904.
- condenação do Pio X
- Bento XV e o levantamento de entraves ao aparecimento de partidos católicos e
democratas cristãos no pós-guerra.
3 – O Catolicismo Social e Político em Portugal
3.1 – A crise religiosa da instauração do liberalismo em Portugal – do cisma à
concordata.
- extinção e expropriação das ordens religiosas e a desamortização dos bens
eclesiásticos.
- cisma religioso, o corte das relações com Roma, o reatamento de relações e a
concordata.
3.2 – O primeiro associativismo católico: da Sociedade Católicande 1843 à
concretização do “ralliment” (1894).
- associações católicas dos anos 70, congressos católicos, jornais católicos e a tentativa
de partido católico.
3.3 – O movimento social católico
- Círculos católicos de operários e o reformismo interclassista: projeto mais social do
que politico de democracia.
- Centros Académicos da Democracia Cristã – 1901
- Congressos da Democracia Cristã (1906-1910) e revistas democratas – cristãs.
- Tentativa de instrumentalização política conservadora
3.4 – Politização da democracia cristã
- Implantação da República, Lei de separação e a perseguição religiosa.
- Apelo de Santarém e a União Católica. Centro católico ramo politico da UCP (1917).
- Atuação do CCP: congressos e atuação parlamentar.
4 – Resistência e Rendição aos autoritarismos
- aparecimento dos autoritarismos nos países latinos ou católicos, e a rendição dos
partidos católicos : Austria (Dolfuss); Itália, Irlanda (De Valera); Espanha (Franco);
Portugal (Salazar). Resistência maioritária de líderes e elites democratas cristãos.
5 – Renascimento da Democracia Cristã no Pós – Guerra
- Rádio-Mensagem de Natal de 1944 de Pio XII: reorganização do mundo, nova atitude
crítica dos povos perante o Estado e os governantes, oposição aos monopólios de um
Patrícia Lemos

poder ditatorial, infiscalizável e intangível, e exigência de um “sistema de governo, mais


compatível com a dignidade e a liberdade dos cidadãos”.
Aceitação da tendência democrática e de governos moderados de forma popular; da
verdadeira e sã democracia, fundada na igualdade cívica e não no arbítrio da massa nem
na uniformidade monócrona, no Estado democrático com o poder de mandar com
autoridade verdadeira e efetiva na dignidade do homem.
Recusa do absolutismo do estado.
Ordem internacional, condenação da guerra de agressão , defesa da constituição de um
órgão para manutenção da paz , investido de autoridade suprema.
Papel da religião na realização da democracia: grandes partidos democratas-cristãos –
PDC na Itália; CDU-CSU na Alemanha; MRP em França; PSC na Bélgica; OVP na Austria.
6 – Crise do Confessionalismo Político e Regresso dos Partidos Populares.
- Concílio Vaticano II: recusa da confessionalidade política, reconhecimento do
pluralismo; fim do colateralismo político sindical; heterogeneização ideológica e a
pragmatização dos partidos.
- novos partidos centristas populares

Liberalismo Político
Ascensão dos partidos liberais na Europa
Desde a Constituição de Cadiz em 1812 à I Guerra Mundial:
 Acesso ao poder nos anos 30: orleanistas em França com a revolução de
1830; correção bonapartista de 1852.
 Em Inglaterra, a afirmação das ideias liberais, políticas e económicas
precedem a afirmação política do liberalismo partidário.
 Fragilidade do liberalismo perante o nacionalismo, nos países de
unificação nacional recente (Alemanha, Itália).
A Crise do Liberalismo entre as duas guerras
- Instabilidade da representação política e da governação em quase todos os países da
Europa, a cedência da liderança aos partidos socialistas e católicos
- Ameaça autoritária e a rendição da cultura liberal elitista.
O Declínio dos partidos liberais no pós-guerra
- Marginalização política das formações liberais.
O Socialismo
a) Primeiro socialismo associativo – Owen, Fourrier, Siant – Simon.
b) O marxismo e o leninismo.
c) O anarquismo – Proudhon e Bakunine.
d) O socialismo reformista e a social democrata – E.Bernstein.
As internacionais: 1864-1872 I Internacional – finda com a Comuna de País

Parlamentos Arenas e Parlamentos Transformadores


Dentro dos parlamentos, podemos distinguir entre parlamentos arenas e parlamentos
de transformação, consoante o grau de independência de influências exteriores. Os
parlamentos são arenas ou transformadores consoante desempenham mais
acentuadamente a função política ou a função legislativa.
Parlamentos transformadores serão aqueles que possuem uma capacidade
independente para transformar proposta por leis. Adotam como método principal a
negociação. Este tipo de parlamento pressupõe partidos fracos, valorizam sobretudo o
espaço das comissões onde se desenrola o principal trabalho da produção legislativa,
através da negociação. Nos partidos transformadores, as formas de deliberação são mais
baseadas na consulta e na negociação, a ter lugar nas comissões. Para estes são mais
Patrícia Lemos

relevantes a estrutura interna e as normas de funcionamento. A análise destes partidos


pede o estudo das estruturas das comissões e os processos de nomeação, os processos
de socialização institucional e a percepção e regulação dos interesses pelas legislaturas e
a disposição dos grupos informais legislativos. O que mais influi na independência e na
capacidade transformativa dos parlamentos tem a ver com os partidos parlamentares,
tomando em consideração três variáveis: quanto mais ampla a coligação abraçada pelos
grupos parlamentares dominantes, mais transformativos são os parlamentos; quanto
menos centralizada e hierárquica for a gestão dos partidos parlamentares, mais
transformativos são os parlamentos; quanto menos fixa e assegurada for a composição
das maiorias parlamentares em sucessivas questões específicas, mais transformativos
são os parlamentos.
Por sua vez, as arenas são mais abertas à interferência das forças políticas significativas
na vida do sistema política. Os parlamentos arenas adotam como método principal a
discussão. Este tipo de parlamentos pressupõem partidos fortes, que fazem de plenário
o seu centro, porque são parlamentos de discussão política. As arenas caracterizam-se
por comissões parlamentares truncadas e pela importância da composição social dos
parlamentos. Nestes parlamentos, o impacto das forças externas é decisivo para o
resultado legislativo. Por fim, para compreender as arenas é fundamental a base social
dos legisladores, o recrutamento parlamentar, os grupos de pressão, os partidos extra-
parlamentares, a organização dos partidos e o debate.

Sistemas Parlamentares
Funções e tipos de parlamentos
Parlamentos – o órgão do poder legislativo, onde se reúnem, para esse efeito, os
representantes eleitos do povo.
Funções:
o Função legislativa – consiste na transformação em leis as propostas de
lei e os projectos de lei do governo e dos vários grupos parlamentares
representados no parlamento.
o Função de representação política do povo – diversamente de outras
formas de representação (corporativa; geográfica – regional, estadual), a
representação parlamentar é estritamente política.
o Função de controlo político do governo e da administração pública.
Consoante desempenhem mais acentuadamente a função política ou a função legislativa,
segundo Nelson Polsby, constituem-se assim parlamentos arenas ou parlamentos
transformadores.
Arenas – o método principal é a discussão; pressupõem partidos fortes, que fazem do
plenário o seu centro, pois são parlamentos de discussão política.
Parlamentos transformadores – o método principal é a negociação; pressupõem
partidos fracos, valorizam o espaço das comissões onde se desenrola o principal
trabalho da função legislativa, através da negociação.
Sistemas parlamentares: monocamaralismo e bicamaralismo
Monocamaralismo – particularmente usado em países de pequena extensão territorial
e de reduzida dimensão demográfica, e de acentuada homogeneidade étnica e cultural,
funcionando como substituto da segunda Câmara, o Conselho de Estado ou as direcções
partidárias. Principalmente adoptado pelos estados unitários e não federais. Defendido
como sendo mais democrático, e porque a divisão do legislativo é vista como um
obstáculo ao progresso e ás reformas, os conflitos entre câmaras enfraquecem os
Patrícia Lemos

parlamentos; atacado por ser mais típico de situações revolucionárias por permitir
decisões imponderadas; facilitar a tirania e o despotismo.
Bicamaralismo - mais frequente em países de grande extensão ou de maior
heterogeneidade, sobretudo pelos estados federais. Defendido por corrigir excessos e
abusos da primeira câmara, por emprestar ao processo legislativo maior competência e
experiência, e evitar a precipitação de decisões em matéria legislativa
Pode ter várias modalidades:
Bicamaralismo assimétrico: a câmara alta difere de sistema de formação ou
constituição, e de competências.
Bicamaralismo desigual: a câmara alta é igualmente eleita, mas com desigualdade de
competências.
Bicamaralismo integral ou simétrico ou congruente: as duas câmaras com igual
processo de formação e idênticas competências.
Partidos e grupos parlamentares
1. Génese dos grupos parlamentares: meados do séc. XIX; a propósito da
designação dos membros das comissões; ligado ao controlo da
representação proporcional.
2. Funções dos grupos: coordenação e de representação do partido.
3. Disciplina de voto: quando o governo está comprometido; a disciplina é
maior quanto mais extremo é o partido; maior no governo do que na
oposição; aumenta com a força do governo; é elemento de simplificação;
afasta a confusão; o deputado não é tanto por mérito próprio mas mais do
partido.
4. Relações deputados – dirigentes partidários: Duverger enumera três
fases nesta relação; 1º, de domínio dos deputados, típica dos primórdios
da evolução dos partidos e do parlamentarismo; 2º de equilíbrio e
rivalidade entre deputados e dirigentes, própria do aparecimento do
partido de massas; 3º de domínio dos partidos sobre os deputados, típica
dos tempos mais modernos, o que se traduz em várias manifestações.
Governos e parlamentos
Governamentalização dos parlamentos:

 Competência legislativa: o grande legislador é o governo; há um declínio


da “iniciativa parlamentar” na produção legislativa.
- Iniciativa legislativa varia na razão direta da intensidade da oposição.
- Iniciativa legislativa dos grupos tem vários objetivos: tribunícios,
limítrofes e legislativos.
- Produtividade legislativa: predominam as iniciativas do governo, que
pode solicitar prioridade e marcar a ordem do dia.
 Competência fiscalizadora: o controlo parlamentar do governo tem vindo
a crescer devido a: pedidos de ratificação, apresentação de
requerimentos, comissões de inquéritos, interpelações ao governo,
sessões de perguntas, debates da nação.
- Pedidos de ratificação aumenta na oposição e em situações de governo
maioritário, mais eficaz com os governos minoritários.
- Controlo por requerimentos aumento em situações de maioria
governamental
Patrícia Lemos

- Moção de censura e moção de confiança; a moção de censura


construtiva.
- Presença do governo nas comissões e no plenário.
Organização de parlamentos
Comissões; conferência de líderes: é a direcção do parlamento, que assessora o
Presidente marca a agenda política.
Institucionalização dos parlamentos
É o processo de autonomização da instituição em relação àqueles que a integram e
compõem. Um parlamento institucionalizado é um parlamento com baixa rotação na sua
composição o que acontece nos primórdios e tende a diminuir à medida que o
parlamento ganha lastro, experiencia, história e sedimentação.
Excessivas substituições de deputados contrariam a institucionalização dos
parlamentos, para além de serem expressão e reforço da subordinação dos deputados
aos partidos. É um parlamento profissionalizado, com deputados vivendo
exclusivamente para a política e vivendo sobretudo dela, com parlamentares que fazem
dela a sua carreira.
Sistemas de governo
Os sistemas de governo estão todos interligados e, estão divididos em duas grandes
famílias:
 Sistemas de governo parlamentares
 Sistemas de governo presidencialistas

Estas diferem, essencialmente, no facto de que no s.g. parlamentar, o governo e o


parlamento estão interligados, são dependentes, enquanto que no s.g.
presidencialista, o governo e o parlamento estão totalmente separados.

Sistema de governo parlamentar:


É composto por cinco sistemas que se diferenciam para maior ou menos predominância
do governo e, maior ou menor predominância do 1º ministro.
a) Governo de convenção: típico das revoluções; quem governa é a própria
assembleia; o executivo é constituído por comissários da assembleia; é
um sistema parlamentar mas não democrático, porque o governo não tem
autonomia
b) Governo directório suíço: heterogeneidade do executivo uma vez que o
governo é composto por representantes dos vários partidos que
concorreram as eleições; semelhante a Comissão Europeia
c) Governo de gabinete: os membros do governo são todos membros do
parlamento; sistema de primado do 1º ministro sobre os demais
membros do governo, é propenso da responsabilidade de todos os órgãos
nas decisões; responsabilidade política determinada pela maioria, ou seja,
se o governo cai dissolve-se o parlamento
d) Governo de Chanceler: não tem supremacia de governo sobre o
parlamento, porque atribui mais poderes ao presidente; apenas o
presidente pode dominar o Chanceler e, perante uma alternativa; sistema
de poder e de demissão e dissolução condicionado
e) Governo parlamentarista puro: presidente sem poder; sistema de grande
instabilidade pois enfraquece o governo, possui um grande
Patrícia Lemos

fraccionamento partidário e uma grande dependência do parlamento;


quando os sistemas de governo vão apodrecendo, acabam por cair.

Sistemas de governo presidencialistas:

a) Norte-americano: o presidente da república tem legitimidade própria,


idêntica a legitimidade do parlamento (dupla legitimidade); sistema de
total separação de governo, parlamento e independência; o executivo é
mono pessoal – o presidente e colaboradores são escolhidos pelo
presidente; coexiste a maioria parlamentar e presidencialista, mas não
têm de coincidir; o presidente é eleito por sufrágio universal; uns ficam na
presidência, outros na oposição; há um risco elevado de se tornar em
autoritarismo
b) Sistema misto (de duas cabeças): dupla responsabilidade do governo;
dupla legitimidade eleitoral geral; possui 3 características
parlamentaristas:
 Governo dependente das eleições para o parlamento
 Governo é responsável perante o parlamento
 Parlamento é dissolúvel

E possui 3 características presidencialistas:

 Eleição sufrágio geral


 Governo responsável perante o presidente
 Amplos poderes do presidente

Sistema português e adopção do sistema misto:

 Não se queria nem o parlamento da 1ª república, nem o presidencialismo


do estado novo
 Falta de hábito de participação na vida pública derivado do salazarismo

Razão sistémica: sistema eleitoral de representação proporcional – tentativa de reforçar


o poder do presidente por sufrágio direto universal

Você também pode gostar