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Fundamentação conceitual

Governança Corporativa: Aspectos


introdutórios
Quando iniciamos o estudo de algum tema técnico ou específico, naturalmente
somos levados a pensar que encontraremos uma série de diretrizes e regras
“prontas e acabadas” acerca da matéria em questão, tais como leis, normas,
fórmulas etc.  
Distintamente, quando tratamos de Governança Corporativa (GC) estamos
interessados, sobretudo, no conjunto de instrumentos utilizados para garantir o
governo estratégico de uma empresa e o monitoramento de seus executivos, de
forma a sustentar sua perenidade, bem como lhe conferindo um caráter social.  
Verifica-se, portanto, que Governança Corporativa não é uma lei a ser seguida,
sob pena de não estarmos em compliance, mas antes uma sucessão de boas
práticas corporativas notadamente marcadas pelas estratégias e políticas
claramente definidas pela alta administração de uma entidade/empresa. 
Há diversas definições para Governança Corporativa, inclusive pelo seu caráter
não mandatório (mas requerido), conforme se depreende da explanação supra.
Para efeitos didáticos, apresentamos a definição adotada pelo Instituto Brasileiro
de Governança Corporativa - IBGC, a saber:  
Governança Corporativa é o sistema pelo qual as organizações são dirigidas,
monitoradas e incentivadas, envolvendo as práticas e os relacionamentos entre
proprietários, conselho de administração, diretoria e órgãos de controle. As boas
práticas de Governança Corporativa convertem princípios em recomendações
objetivas, alinhando interesses com a finalidade de preservar e otimizar o valor 
da organização, facilitando seu acesso ao capital e contribuindo para a sua
longevidade (IBGC, 2015). 
A primeira parte da definição de GC, segundo o IBGC, deixa claro que diversos
agentes interagem no interesse da administração de uma organização, ao
mencionar os relacionamentos existentes entre proprietários, conselho de
administração, diretoria etc. Nesse sentido, podemos afirmar que GC é um tema
multidisciplinar, pois se relaciona com abordagens diversas da corporação, como
estratégia empresarial, contabilidade, relações do direito societário e finanças
corporativas, dentre outras. 
O conjunto sistêmico de processos e normas que garantem o governo estratégico
de uma organização apresenta como um de seus objetivos assegurar a ética e a
transparência nas relações entre a empresa e o seu público interno e externo,
culminando na melhoria de resultados e da satisfação entre os agentes
envolvidos.
O administrador financeiro tem por objetivo maximizar a riqueza da empresa e, por
conseguinte, a maximização da riqueza do acionista. Para tanto, deverá tomar
decisões sobre quais projetos escolher e quais projetos rejeitar, no âmbito
empresarial, visando à geração de valor para a empresa e consequente retorno do
capital investido pelo acionista.  
Neste mister, o processo de tomada de decisão passa a ter papel relevante e
requer mecanismos de controle, visando assegurar que as decisões tomadas e
seus respectivos resultados estão em consonância com os interesses da
organização e de todos os sujeitos envolvidos, os chamados stakeholders,
caracterizados pelos agentes internos e externos que, de alguma forma, se
relacionam com a empresa (empregados, clientes, fornecedores, acionistas,
investidores, governo etc.). 

Fundamentação conceitual

Princípios básicos
 
Segundo disposição do Instituto Brasileiro de Governança Corporativa, IBGC,
principal referência do Brasil para o desenvolvimento das melhores práticas de
Governança Corporativa, os pilares fundamentais para sua aplicação residem em
alguns princípios. Vamos conhecê-los? 

Transparência 
Mais do que a obrigação de informar a transparência é o desejo de deixar
disponível para as partes interessadas as informações que sejam de seu interesse
e não apenas aquelas impostas por disposições de leis ou regulamentos. A
adequada transparência resulta em um clima de confiança, tanto internamente
quanto nas relações da empresa com terceiros e não deve restringir-se ao
desempenho econômico-financeiro, contemplando também os demais fatores
(inclusive intangíveis) que norteiam a ação gerencial e que conduzem à criação de
valor. 

Equidade
Essa característica se dá pelo tratamento justo de todos os sócios e demais partes
interessadas (stakeholders). A prática de atitudes ou políticas discriminatórias, sob
qualquer pretexto, são totalmente inaceitáveis. Algo que deve ser evidente nos
dias atuais. 
Prestação de Contas (accountability)
Os agentes de Governança devem prestar contas de sua atuação, o que
chamamos de accountbility, assumindo integralmente as consequências de seus
atos e também omissões.   

Responsabilidade Corporativa
Os agentes de Governança devem zelar pela sustentabilidade das organizações,
visando à sua longevidade, incorporando considerações de ordem social e
ambiental na definição dos negócios e operações.

Governança Corporativa - Modelo Genérico

Figura 1 - Modelo genérico de governança corporativa. Fonte: SILVEIRA, A. M. Governança Corporativa.

Governança Corporativa - Origem e Motivações


A Governança Corporativa, como uma ferramenta de gestão empresarial, é
relativamente recente no mundo, com início nos anos de 1980, nos EUA, e mais
tarde, em 1990, no Brasil, não obstante a origem da sua motivação ser bastante
antiga, qual seja, o conflito de interesses entre o principal (proprietário) e o agente
(administrador), temas que serão oportunamente abordados no decorrer dos
capítulos.
O uso do termo GC teve início nos EUA em fins dos anos de 1980, quando
investidores institucionais lideraram movimentos contra corporações administradas
de forma irregular, posteriormente extrapolando sua atuação para a Inglaterra e ao
restante da Europa, até atingir o Brasil, na década de 1990.
O investidor institucional é a pessoa jurídica que tem por obrigação legal investir
parte de seu patrimônio no mercado financeiro, notadamente: seguradoras,
entidades de previdência privada, clubes de investimento, sociedades de
capitalização, fundos externos de investimento e fundos mútuos de investimento.
Um aspecto importante a se observar é que a GC está associada à estrutura de
poder que se observa no interior das organizações, cujos importantes motivadores
para sua ascensão foram:

 Uma expressiva evolução dos negócios corporativos, fortemente marcada pelo


advento da globalização;
 A dispersão do capital das organizações, pelo aumento do número de acionistas;
 A separação entre propriedade e gestão e consequente substituição dos proprietários
por uma administração profissional (executivos).

Vemos abaixo, na figura 2, uma demonstração das conexões mencionadas:

Figura 2 - O Desenvolvimento das Corporações e o Despertar da Governança Corporativa. Fonte: Rosseti, J. P., Andrade, A. GOVERNANÇA CORPORATIVA: Fundamentos,
Desenvolvimento e Tendências, 2014.

 
Uma vez instaladas as condições para a adoção das práticas de governança,
fatores adicionais, internos e externos às organizações, contribuíram para o
fortalecimento de tais práticas, conforme se constata pela figura 3.

Figura 3 - Fundamentos para o Surgimento da Governança Corporativa.Fonte: ROSSETI, J. P., ANDRADE, A. GOVERNANÇA CORPORATIVA: Fundamentos, Desenvolvimento e
Tendências, 2014.Razões essenciais.

Neste material não temos a pretensão de esgotar a abordagem sobre GC sob o


seu aspecto conceitual, mas sim contextualizá-la de forma contemporânea e útil
aos profissionais que já estejam em posições de gestão e processos de tomada
de decisão, bem como àqueles profissionais que estejam em um processo natural
de ascensão hierárquica dentro das organizações.
Para tanto, faremos uso de abordagens clássicas da literatura, pertinentes às
áreas de Economia, Administração e Filosofia, tais como Teoria da Firma, Teoria
de Agência e Ética, sem contudo explorá-las quanto às suas nuances
catedráticas.

Fundamentação conceitual

Visão contratual da firma


 
Em um modelo teórico, considerando que a empresa tivesse um único
proprietário, sendo este também o administrador e o único fornecedor de capital
para o negócio, não haveria nenhum tipo de conflito de interesses a administrar,
pois tudo correria conforme as orientações e conveniências do referido
proprietário.
Entretanto, conforme o conceito clássico de empresa como um sistema aberto, no
qual insumos são processados e transformados em bens ou serviços colocados à
disposição do mercado, as relações empresariais são permeadas e influenciadas
por estímulos e fatores internos e externos ao ambiente empresarial, com a
consequente interferência de diversas pessoas nos processos de gestão e
operacional.
Nesse sentido, para a realização do seu objeto (atividade econômica desenvolvida
visando a alcançar o lucro), a empresa (a Firma) estabelece conexões com
diversos agentes, desenvolve estratégias e aloca recursos materiais e humanos
para a sua consecução; e os referidos agentes são os stakeholders.
Os stakeholders, como partes interessadas no aumento de sua utilidade
(benefício) pessoal, apresentam posições e expectativas distintas, conforme
podemos ver abaixo:
 

1 EXPECTATIVA

Receber remuneração pelo capital investido


Sócios
(dividendos)

Receber os recursos emprestados à empresa


Credores
(principal + juros)

Receber salários e participações nos


Funcionários
resultados

Clientes Produtos e serviços com qualidade e preço

Fornecedores Receber pelos insumos vendidos à empresa

Governo Impostos

 
A relação da organização com tais agentes é necessária e justificada pelos
benefícios proporcionados ao negócio, tais como eficiência operacional, ganhos
de escala, mão de obra especializada, gestão profissionalizada etc.
Na relação entre os agentes e a Firma cada indivíduo fornecerá recursos
(trabalho, capital, tecnologia etc) para o processo empresarial, na expectativa de
um retorno sobre o “investimento” realizado.
Considerando que, dentre os vários indivíduos envolvidos, cada qual trabalhará
pelo seu bem-estar pessoal, conflitos de interesses poderão surgir, assim, para
administrar tais conflitos, as relações entre a empresa e os agentes são
fundamentadas em contratos, contendo direitos e obrigações entre as partes
(agentes e empresa), ao que a literatura convencionou chamar de “nexo de
contratos” ou "visão contratual da Firma".
A visão contratual da Firma pressupõe a existência de contratos firmados entre a
organização e seus clientes, seus trabalhadores, seus fornecedores, seus
executivos etc.
Especificamente, quanto ao que concerne aos executivos, são estabelecidos
contratos estipulando a forma como seriam conduzidos e alocados os recursos da
empresa, de forma que tais executivos agissem sempre conforme os melhores
interesses da Firma. Ainda, os contratos deveriam prever toda e qualquer sorte de
eventualidade, estabelecendo a conduta a ser seguida pelo executivo, de forma
que tal contrato pudesse ser classificado como perfeito. Todavia, contratos
perfeitos não existem e, por conseguinte, são incontáveis as ocasiões em que os
executivos estarão diante de situações cujo processo de tomada de decisão pode
conflitar com os interesses do acionista (da Firma); poderão ser tomadas decisões
maximizando o interesse particular do executivo, em detrimento do interesse da
empresa, haja vista a característica precípua do ser humano: desejo de aumentar
seu bem-estar pessoal.
O vídeo apresentado neste curso, sobre a fábrica de sorvetes Furlanetti, ilustra
bem a típica situação de possível conflito de interesses a qual toda organização
está sujeita.
O sr. Furlanetti, como único proprietário e único fornecedor de capital para a
empresa, seguia estritamente à justa e necessária segregação entre as suas
despesas pessoais e as operações da empresa, ao que chamamos em
Contabilidade de Princípio da Entidade (as operações da empresa não se
confundem com as operações do sócio, pois a empresa é uma entidade jurídica
independente da pessoa física). Contudo, quando o sr. César, aportando capital
na empresa, decidiu se tornar sócio do negócio e delegou ao sr. Furlanetti a sua
administração, este último mudou a sua conduta, passando a pagar suas
despesas pessoais com os recursos corporativos, aumentando sua utilidade
pessoal em detrimento dos interesses da organização e, por consequência, do sr.
César, que indiretamente “passou a ser sócio” também da família do sr. Furlanetti.
Esse cenário é o exemplo clássico da abordagem apresentada pela literatura,
denominada de conflito de agência, na qual os diversos agentes atuantes na
empresa, em razão de interesses e expectativas contrastantes entre si, agem na
melhor forma dos seus benefícios pessoais, muitas vezes contrapondo-se aos
interesses da organização e do acionista.
Sob a perspectiva da Teoria de Agência, o principal (detentor do capital) delega a
um terceiro (agente) a responsabilidade pela gestão do seu capital, remunerando-
o para tanto. No anseio da maximização de sua utilidade, entre principal e agente,
surge o conflito de interesses (conflito de agência).
Assim, as práticas de Governança Corporativa surgem como forma de reduzir os
conflitos de agência. Vejamos abaixo o vídeo sobre a visão contratual da firma. 
 

Vídeo - Introdução e visão contratual da firma

Fundamentação conceitual

Conflito de agência
 
A Governança Corporativa normalmente é explicada a partir da Teoria de
Agência, cuja abordagem central prega a separação entre propriedade e controle
da firma.
Sob a perspectiva da Teoria de Agência, o principal (podendo ser compreendido
como o proprietário ou os acionistas da empresa) é o fornecedor do capital, mas
ele está apartado das decisões corporativas, motivo pelo qual é contratado o
agente (executivo), para o desempenho da administração e consequente
condução dos negócios. Essencialmente, a relação entre principal e agente é
marcada pela separação entre os tomadores de decisões (agente) e aqueles que
delegam as decisões a terceiros (principal).
Na relação contratual firmada entre principal e agente, ou executivos e acionistas,
estes últimos contratam os serviços especializados de gestão daqueles, pagando
por isso uma remuneração.
Os acionistas anseiam que os executivos tomem decisões visando à maximização
da sua riqueza (decisões do tipo 1 na figura apresentada na aula anterior), não
obstante, os executivos tendem a tomar decisões que maximizam sua utilidade
pessoal (decisões do tipo 2 na figura apresentada na aula anterior), fazendo com
que a empresa incorra nos denominados custos de agência.
Os custos de agência são caracterizados pelos “desvios” de recursos da empresa,
por parte dos executivos, representando desde valores pouco expressivos, como o
caso de despesas pessoais embutidas nas contas corporativas (conforme vimos
na fábrica de sorvetes Furlanetti), até valores de grande monta, como
investimentos não estratégicos e dispendiosos para a empresa.
Como forma de diminuir os conflitos de interesses entre principal e agente e os
decorrentes custos de agência, são empregados diversos mecanismos de
Governança Corporativa, em âmbito interno e externo à organização, conforme
podemos ver na figura abaixo.

Figura 4 - O problema de agência dos gestores e a governança corporativa. Fonte: SILVEIRA, A. M. Governança Corporativa, Desempenho e Valor da Empresa no Brasil. Dissertação de
mestrado. São Paulo, 2002.

 
Os mecanismos internos de governança, voltados exclusivamente ao aspecto
financeiro dos executivos (sistema de remuneração), tais como remunerações
elevadas e a posse de ações da companhia, por si só já representariam estímulos
hábeis a que tais executivos tomassem as melhores decisões para os acionistas,
segundo a perspectiva de determinados indivíduos. Contudo, os valores e as
tendências pessoais são fatores determinantes para o comportamento e as ações
humanas.
Como sabemos, a empresa é formada por indivíduos e estes imprimirão à
empresa o produto das suas crenças e valores éticos. O comportamento dos
executivos, ao tomarem as decisões do tipo 2 em detrimento das decisões do tipo
1, será fruto do seu livre arbítrio e da sua conduta ética (ou ausência dela).   
Vamos a um exemplo: Certa vez, uma advogada, professora e autora de livros
sobre ética, iniciou uma palestra afirmando que ética “não dá IBOPE” (poucas
pessoas estão dispostas a discuti-la) e que um comportamento ético equivale a
“olhar para o outro com amor”. Ora, em uma sociedade altamente marcada pelo
individualismo, na qual a competição dentro e fora do ambiente corporativo
aumenta dia a dia, as empresas devem, necessariamente, desenvolver e estimular
práticas éticas entre os seus stakeholders, tal qual sua preocupação com a
eficiência operacional e o alcance de bons resultados econômicos e financeiros.
Isso porque o estabelecimento de uma cultura ética é fundamental para a
perenidade da organização, pois os indivíduos que ali estão são os responsáveis
por imprimir elevados padrões éticos e de comportamento. Assim, faz-se
necessária a criação de um código de ética a ser seguido dentro e fora da
organização, pelos colaboradores e pelos agentes externos à empresa, como
clientes e fornecedores. Empresas éticas não se relacionam com agentes não
éticos.
A boa Governança Corporativa, somada a elevados padrões éticos, contribuirá
para a construção de uma imagem forte perante o mercado e a consequente
agregação de valor para a empresa. É importante sempre lembrar que um elevado
padrão ético se caracteriza como um importante mecanismo de governança das
empresas.

Vídeo - Conflito de agência

Fundamentação conceitual

Ética, moral e código de ética


 
Expusemos, na introdução deste curso, o conceito de Governança Corporativa de
forma bastante técnica e formal, conforme definição do IBGC.
Em um patamar menos formal, e com forte tendência contemporânea, podemos
conceituar GC como o conjunto de mecanismos de incentivo e controle que visa
harmonizar a relação entre proprietários e executivos pela redução do problema
de agência, numa situação de separação entre propriedade e controle.
O uso do termo executivo obviamente não restringe e não delimita a questão
central da discussão somente àqueles indivíduos que estão em elevadas posições
corporativas, tais como diretores e membros de conselhos diretivos, mas abrange
qualquer nível de gestor que tenha a atribuição de tomar decisões em nome da
empresa, desde as mais simples até as mais complexas.
O processo de tomada de decisão, seja nas corporações ou no âmbito privado,
envolve questões de natureza diversa, mas, sobretudo, o fator comportamental,
que será influenciado pelos fatores morais.
A moral está relacionada à conduta do indivíduo e reflete um conjunto de regras
estabelecidas em sociedade, orientando e norteando suas ações e julgamentos
sobre o que é certo ou errado, adequado ou inadequado.
A ética, por sua vez, é o segmento da Filosofia que se ocupa em estudar as
regras morais sob o seu aspecto racional e científico, avaliando-as e até
contestando-as, caso as julgue ultrapassadas ou inadequadas.
Pragmaticamente, ética e moral perseguem o mesmo objetivo, qual seja, conduzir
a conduta humana e determinar o seu caráter e, por conseguinte, um padrão de
comportamento em sociedade.
Uma vez que as regras adotadas em sociedade mudam de cultura para cultura, a
ética muda conforme a sociedade e a época, bem como o grupo no qual os
indivíduos estão inseridos.
No âmbito corporativo, a ética é fruto do ambiente onde a empresa está inserida e
das pessoas ali presentes, refletindo a cultura interna da organização.
A prática da ética, como “capacidade adequada de escolha e julgamento moral”,
influencia o grau de adesão dos indivíduos à cultura organizacional.
Contudo, o conflito de interesses é praticamente uma condição sine qua
non (condição necessária) no cotidiano das empresas, advindo da própria
natureza do homem.
Considerando que tudo é possível, mas nem tudo é lícito ou deve ser feito, a
formalização da ética empresarial se faz necessária para que os indivíduos
disponham de um direcionador a orientar as suas decisões e condutas, bem como
para a solução de conflitos sobre como se portar diante de determinado evento;
por exemplo: devo ou não aceitar o convite de um fornecedor para um almoço de
negócios? Há limites? Quais são os limites envolvidos? Posso convidar o auditor
para tomar um café? O auditor pode aceitar o convite de seu cliente?
A formalização da ética empresarial ocorre tanto pela adoção de códigos de ética,
para disciplinar as práticas de seus funcionários e executivos, como pela
implementação de uma cartilha de princípios de governança corporativa para
explicitar e nortear o relacionamento entre os diversos níveis de poder da
empresa, seja a diretoria executiva, o conselho de administração, o conselho fiscal
e até a auditoria externa.
Um código de conduta reflete os valores da empresa, definindo seu
posicionamento ético e sustentável, bem como representa um guia de referência
para todas as decisões tomadas na organização, desde as mais importantes até
as mais corriqueiras.
A organização que confecciona um código de ética de forma séria vai além de
uma mera declaração de boas intenções sem efeitos práticos, instituindo meios
que assegurem altos padrões éticos e a respectiva observância ao código de
conduta, tais como a criação de um Comitê de Ética, com vistas a fazer cumprir tal
código.   

Vídeo - Definição de governança, ética, moral e código de


ética
Fundamentação conceitual

Governança corporativa e valor


 
Vamos falar agora sobre a relação entre os benefícios proporcionados pela prática
da governança e a criação de valor para a empresa que a emprega.
Entretanto, para darmos início ao tema, faz-se necessário abordar o binômio
risco versus retorno existente em qualquer tipo de investimento.
Quando realizamos um investimento, como por exemplo uma aplicação em
poupança, a compra de um imóvel ou uma aplicação em ações, temos a
expectativa de um dado retorno.
Contudo, podemos afirmar que não é qualquer nível de retorno que interessa ao
investidor. O retorno desejado deve atender à expectativa do investidor de forma
associada ao risco envolvido no investimento (binômio risco e retorno), ou seja,
quanto maior o risco, maior o retorno requerido.
Vejamos o exemplo: um indivíduo dispõe de R$ 100 mil e decide investir em uma
empresa que, após um ano, gerou um retorno de R$ 8 mil ou 8% ao ano.
Alternativamente, este indivíduo poderia ter aplicado o mesmo recurso em um
Fundo de Investimento, cujo retorno teria sido de R$ 7 mil ou 7% ao ano. 
Ao retorno de R$ 7 mil, referente à alternativa abandonada pelo investidor,
chamamos de custo de oportunidade. O custo de oportunidade representa o
retorno da melhor alternativa de investimento preterida pelo investidor.
Considerando que o investidor tem a opção de receber 7% ao ano no Fundo de
Investimento, com um nível menor de risco, o retorno esperado pelo investimento
na empresa deve ser superior ao custo de oportunidade, no caso 7% ao ano.
De forma análoga, quando alguém investe em uma empresa, espera um
determinado nível de retorno, um prêmio, de forma correlacionada ao risco
percebido no negócio.
As operações de uma empresa são financiadas pelo capital próprio (investido pelo
acionista) e pelo capital de terceiros (um credor bancário, por exemplo), sendo que
cada um, acionista e terceiro, exige uma taxa de retorno diferente, haja vista os
níveis de percepção de risco serem distintos entre ambos.
O risco do capital próprio é maior comparativamente ao risco do capital de
terceiros, portanto, exigindo maior retorno.
À taxa que mede a remuneração requerida sobre o capital investido em uma
empresa, por acionistas e terceiros (credores), chamamos de custo médio
ponderado de capital (weighted average cost of capital - WACC em inglês), uma
vez que investidores e credores requerem taxas de remuneração distintas pelo
capital investido.
Finalmente reportando-nos ao tema central da questão, a governança corporativa,
as empresas que adotam práticas diferenciadas de governança despertam uma
percepção de riscos menores (decorrente do fato de possuírem melhores
controles para a condução dos negócios) e, por conseguinte, maior atratividade
para investidores e credores, que exigirão menores taxas de retorno pelo
investimento/financiamento (custo de oportunidade), resultando em um menor
custo médio ponderado de capital (WACC) para a empresa.
Segundo a moderna teoria de finanças, de forma simplificada, a geração de valor
de uma empresa ocorre quando as suas receitas superam todos os seus custos,
despesas e, sobretudo, o custo de oportunidade de acionistas e credores.
Nesse sentido, verifica-se que a redução do WACC proporciona o aumento do
valor da empresa, pois serão despendidos menos recursos para arcar com a
remuneração (custo de oportunidade) de suas fontes de financiamento (acionistas
e terceiros).
Adicionalmente, a redução do WACC também permite que a empresa reduza a
taxa mínima de retorno exigida em seus investimentos (projetos), levando a um
maior leque de possibilidades de aceitação de investimentos e, como
consequência, maiores retornos e agregação de valor ao acionista (geração de
valor da empresa).
Por todo o exposto, verificamos que há uma forte relação entre a forma de
conduzir os negócios de uma empresa, com boas práticas de governança
corporativa, e seu valor de mercado, que tenderá a ser tanto maior, quanto menor
for a percepção de riscos e maiores oportunidades, por parte de seus acionistas e
credores.
A boa governança reflete no custo de captação da empresa, devido à menor
exposição de seus financiadores, facilitando o acesso ao capital.

Vídeo - Governança corporativa e valor

Fundamentação conceitual

Função-objetivo das empresas


 
Na seção anterior mencionamos que as boas práticas de governança corporativa
levam à criação e ao aumento do valor da empresa.
Entretanto, não entramos no mérito sobre o que caracteriza uma boa governança.
Seria a boa governança igual em todas as empresas, independentemente de suas
características e objetivos peculiares?
A resposta pragmática é não. Para conceituarmos o que é bom e o que é
inadequado; o que é desejado e almejado e aquilo que é repudiado, precisamos,
inicialmente, definir quais são os objetivos empresariais.
A função-objetivo da empresa compreende a designação dos objetivos
gerais de uma empresa, com vistas à definição e ao estabelecimento de
critérios a serem adotados no processo de tomada de decisão e
consequente avaliação do desempenho empresarial.
A título de exemplo, consideremos uma instituição de ensino cujo objetivo seja a
inclusão social das classes menos favorecidas ao mercado formal de trabalho, por
meio de acesso ao ensino superior de qualidade. Para tanto, a instituição poderia
definir, por exemplo, a cobrança de mensalidades a preços módicos ou, ainda,
oferecer um financiamento estudantil de longo prazo.
Uma vez definida a função-objetivo da empresa, os executivos poderão
desenvolver um modelo de gestão e de governança corporativa customizados, de
forma a atender ao objetivo empresarial previamente definido.
A definição da função-objetivo passa por uma questão fundamental: a empresa
deve ter uma ou mais funções como objetivo?
Para responder a tal questão, recorreremos aos conceitos da literatura sobre a
administração de empresas, que aborda duas correntes básicas sobre a função-
objetivo:

 Corrente 1: a teoria da maximização da riqueza dos acionistas (conforme abordagem


apresentada no tópico sobre a geração de valor da empresa), cuja abordagem prega
que a função-objetivo deva ser única e exclusivamente a maximização do valor da
empresa;
 Corrente 2: a teoria de equilíbrio dos interesses dos stakeholders, cuja abordagem
prega que a função-objetivo deva contemplar e satisfazer aos interesses de todos os
entes envolvidos com a empresa (acionistas, credores, clientes, colaboradores etc.).

Para definir sobre qual função-objetivo perseguir, se uma (corrente 1) ou várias


(corrente 2), precisamos considerar três aspectos fundamentais:

 sociedade: qual função-objetivo gera um maior bem-estar social?


 empresa: qual função-objetivo leva a uma maior eficiência empresarial?
 profissional: qual função-objetivo define melhor como os executivos devem pautar
suas decisões e como estes executivos devem ser avaliados?
Quando a empresa persegue dois ou mais objetivos, pode comprometer um deles
em detrimento do outro.
Vejamos um exemplo: considere uma empresa que tem como meta aumentar o
seu lucro e a sua participação de mercado na venda de determinado produto
(Figura 4). Até determinado nível de expansão em seu market share¹,
simultaneamente haverá aumento em seus lucros, contudo, a partir de
determinado ponto, o aumento na participação de mercado resultará em
rendimentos decrescentes² provenientes, por exemplo, do aumento de despesas
com publicidade para alavancar as vendas.

Figura 5 - Decisão entre Lucro e Market Share. Fonte: JENSEN (2001, p. 10). problema de agência dos gestores e a governança corporativa apud SILVEIRA, A. M. Governança Corporativa,

Desempenho e Valor da Empresa no Brasil. Dissertação de mestrado. São Paulo, 2002.

A busca por mais de um objetivo pode levar à ineficiência, assim, a empresa deve
definir como função-objetivo aquela que atenderá a todos os objetivos, ou a maior
parte deles, reduzindo os possíveis conflitos de interesses que surgiriam na busca
pela realização de vários objetivos.
Retomando a função-objetivo conforme o entendimento da Corrente 1, percebe-se
que não há conflito de objetivos com a Corrente 2, uma vez que a maximização da
riqueza da empresa proporcionaria a distribuição dos benefícios auferidos com
os stakeholders e, por conseguinte, atenderia aos anseios coletivos.
 
¹ Participação de mercado.
² Para mais detalhes, sugere-se realizar uma leitura sobre a Teoria dos Rendimentos Decrescentes (teoria econômica).
Vídeo - Função-objetivo das empresas

Problemas de governança corporativa e os principais


mecanismos para mitigá-los

Identificando possíveis problemas de


governança
 
Conforme dissemos antes, um dos temas centrais a nortear os estudos sobre
Governança Corporativa é a Teoria de Agência, cuja essência recomenda a
separação entre os papéis do agente (o tomador das decisões corporativas) e o
principal (aquele que delega ao agente o poder de decidir e, em muitas ocasiões,
o fornecedor de capital).
Para alcançar os objetivos empresariais, o agente, representado na figura do
executivo, por vezes tomará decisões que acabarão por maximizar sua utilidade
pessoal, em detrimento dos interesses do acionista (principal), revelando um
conflito de interesses.
Considerando que os contratos firmados entre agente e principal não preveem
toda sorte de acontecimentos em uma organização e como estes devem ser
conduzidos, conforme abordado anteriormente - Visão Contratual da Firma -  bem
como o fato de os executivos possuírem maior conhecimento sobre os negócios,
comparativamente aos acionistas, em muitas ocasiões o executivo tomará
decisões sobre como conduzir e aplicar os recursos da empresa, à revelia da
vontade do acionista, podendo acarretar conflitos de interesses.
Trata-se de uma série de decisões gerenciais comumente tomadas por
administradores, muitas vezes envolvendo cifras bastante expressivas, sobretudo
quanto maiores os recursos disponíveis na empresa para realizar investimentos.
Nesse sentido, há situações clássicas relatadas pela literatura que levam à
dilapidação do patrimônio dos acionistas e que funcionam como alertas, bem
como simbolizam indícios de problemas de governança nas empresas, a saber:

 Diversificação excessiva dos negócios e, por consequência, da empresa, podendo


acarretar em desvio do foco principal do negócio, comprometendo seus resultados
econômicos e financeiros;
 Crescimento superior ao requerido, com reinvestimento dos fluxos de caixa em
projetos com retornos aquém do valor agregado esperado pelo acionista;
 Gastos pessoais excessivos;
 Resultados insuficientes, mas com altos bônus distribuídos aos executivos, superior
aos resultados trazidos por estes;
 Designação de membros da família desqualificados para posições gerenciais
(nepotismo);
 Tunneling: caracterizado pelo desvio de recursos corporativos de uma entidade ou de
seus acionistas minoritários para o controlador. A título de exemplo, a venda de
produção ou ativos da empresa a preços inferiores ao preço de mercado, a outras
empresas do grupo, visando à maximização do resultado dessa última (transações
entre partes relacionadas).

Além das formas acima expostas, há ainda outras condutas que acabam por
expropriar a riqueza dos acionistas, de forma indireta, como, por exemplo, quando
executivos não abrem mão de sua posição na organização, quando sabidamente
já não são mais competentes para tal, forçando sua permanência ou sonegando
informações sensíveis e/ou boicotando a gestão da informação.
Exemplos tradicionais e corriqueiros em empresas são as situações de pessoas
em posições operacionais estratégicas que não compartilham e não documentam
processos sistêmicos essenciais ao funcionamento do negócio, não obstante a
existência de regras claras e definidas para tanto.
 

Vídeo - Identificando possíveis problemas de governança

Problemas de governança corporativa e os principais


mecanismos para mitigá-los

Mecanismos internos de governança


corporativa
 
Visando mitigar os conflitos de interesses entre principal e agente, na melhor
forma da gestão empresarial, as entidades lançam mão dos chamados
mecanismos de governança, que contribuem para resguardar os interesses dos
acionistas e o desempenho empresarial.
Neste mister, citamos alguns mecanismos internos de governança corporativa
amplamente empregados:

Conselho de Administração
O Conselho de Administração é um dos principais mecanismos internos de
controle de uma entidade, haja vista seu papel relevante e independente de
atuação. Sua existência está prevista na Lei das S.A.
No Brasil, a Contabilidade está normalizada pela Lei Nº 6.404/76, que passou por
importantes alterações com a promulgação da Lei Nº 11.638/07 e da Lei Nº
11.941/09, com vistas à convergência do padrão contábil brasileiro aos padrões
internacionais de contabilidade - International Financial Reporting Standards
(IFRS).
Em seu capítulo XII, a Lei 6.404/76 determina que a administração da companhia
competirá ao Conselho de Administração e à diretoria.
O Conselho de Administração é um órgão de deliberação colegiada, obrigatório
para as companhias com capital aberto (empresas que transacionam suas ações
em Bolsa de Valores), cuja função é representar os acionistas majoritários e
minoritários, devendo ser composto, no mínimo, por três integrantes.
Inúmeras são as atribuições do Conselho, dentre as quais se destacam:

 Fixar a orientação geral dos negócios da companhia;


 Eleger e destituir os diretores da companhia e fixar-lhes as atribuições;
 Fiscalizar a gestão dos diretores, examinar, a qualquer tempo, os livros e papéis da
companhia;
 Escolher e destituir os auditores independentes.

O processo decisório de uma entidade envolve as fases de definição, gestão e


monitoramento, sendo o Conselho o ente responsável pelas decisões relevantes e
o seu consequente monitoramento a posteriori, conforme se depreende pela figura
6.
Figura 6 - Processo Decisório da Alta Gestão. Fonte: FAMA, E. JENSEN, M. “Separation of ownership and control”, Journal of Law and Economics, June, 1983 apud SILVEIRA, A. M.
Governança Corporativa, Desempenho e Valor da Empresa no Brasil. Dissertação de mestrado. São Paulo, 2002.

 
A responsabilidade atribuída ao Conselheiro é compatível ao perfil exigido desse
profissional, notadamente pelo seu nível técnico, dedicação, experiência,
reputação e independência e, por conseguinte, com uma remuneração condizente,
de forma que suas decisões estarão, necessariamente, alinhadas aos interesses
do acionista.
Verifica-se, portanto, que o Conselho de Administração está devidamente
justificado sob o aspecto financeiro (elevadas remunerações) e capacitado a tomar
as melhores decisões (decisões do tipo 1) corporativas, motivo pelo qual é
classificado por alguns agentes de mercado como sinônimo de Governança
Corporativa.  
Figura 7 - Atribuições do Conselho de Administração. Fonte: Rosseti, J. P.; Andrade, A. GOVERNANÇA CORPORATIVA: Fundamentos, Desenvolvimento e Tendências, 2014.

Sistema de Remuneração
O problema de agência apresenta como um de seus aliados, na busca por boas
práticas empresariais, o sistema de remuneração atribuído aos executivos.
O montante e a forma de remunerar os executivos influenciam o nível de
alinhamento destes aos interesses da empresa, consubstanciando-se em
mecanismos de governança.
Na busca por maiores bônus, que estariam vinculados aos resultados obtidos
pelas empresas, o mundo presenciou inúmeras situações de manipulações
contábeis e a realização de operações com elevados níveis de risco, a exemplo do
caso Enron¹, em 2001, e as operações de empréstimos subprimes norte-
americanos, cujo ápice culminou na crise econômica mundial de 2008,
respectivamente.
A remuneração de executivos é alvo de grandes controvérsias desde 2009,
quando a Comissão de Valores Mobiliários - CVM, por meio da Instrução Nº 480,
passou a exigir que as empresas de capital aberto divulgassem a remuneração
mínima, média e máxima dos executivos, como uma forma de atribuir maior
transparência ao processo.
O Instituto Brasileiro de Governança Corporativa - IBGC, por sua vez, recomenda
que a remuneração de executivos e conselheiros seja divulgada individualmente, a
exemplo do mercado norte-americano.
Há empresas que condicionam a remuneração variável de seus executivos ao
EBITDA, o que pode fazer com que tais executivos tentem “manipular” tal número,
visando maximizar seus ganhos.
Independentemente de referencial a ser adotado, para que a política de
remuneração seja efetiva enquanto ferramenta de governança, há que levar em
consideração, além dos aspectos de atração, premiação e retenção de executivos,
o incentivo à condução dos negócios de forma sustentável, estabelecendo limites
de risco adequados, de forma condizente aos interesses dos acionistas. Para
tanto, o Conselho de Administração é o órgão responsável pelo estabelecimento
da política de remuneração.
 

Sistema de Controles Internos e Auditoria


Para que a governança das empresas seja efetiva, faz-se necessário um sistema
eficaz de controles internos, cujos componentes compreendem: políticas e
procedimentos claramente definidos; sistemas de alçadas e limites; atribuição e
definição de responsabilidades; segregação de funções etc.
A definição de controles internos mais amplamente aceita foi desenvolvida pelo
Committee of Sponsoring Organizations of the Treadway Commission – COSO²,
sendo um processo desenvolvido pelo Conselho de Administração,
administradores e outras pessoas da companhia, fornecendo razoável segurança
quanto ao alcance de objetivos nas seguintes categorias: eficácia e eficiência das
operações; confiabilidade dos relatórios financeiros e cumprimento de leis e
regulamentos aplicáveis (compliance).
Controle interno é a ferramenta que assegura a efetiva realização ou reavaliação
das estratégias, dos objetivos e das metas, quando não da própria missão da
empresa, ao permitir a identificação do nível de aderência, por parte de todos os
níveis hierárquicos, à consecução dos objetivos de negócio.
Corroborando a importância do sistema de controles internos, o Sarbanes-Oxley
Act of 2002, que veremos adiante, assinado pelo presidente dos EUA, George W.
Bush, em julho de 2002, como forma de coibir os abusos contábeis verificados no
início do ano 2000 e restabelecer a confiança dos investidores norte-americanos,
enfatiza de forma crítica a importância dos controles internos. Tão importante
quanto o sistema de controles internos e as práticas de boa governança
corporativa, outros aspectos se destacam, quais sejam, integridade e valores
éticos; filosofia da administração e estilo operacional; estrutura organizacional;
papéis e responsabilidades bem definidos para diretores, gerentes e demais corpo
funcional; compromisso com a excelência; diretorias e comitês eficazes e
proativos, dentre outros.
Outro importante mecanismo de governança, a auditoria, por meio de um conjunto
estruturado de procedimentos, tem por objetivo certificar a fidedignidade e a
integridade de determinada informação.
A auditoria avalia a integridade, adequação, eficácia e eficiência de processos, de
sistemas de informações e de controles internos integrados ao ambiente, com
vistas a assistir à administração da entidade no cumprimento de seus objetivos,
contribuindo para o consequente “controle” das ações de executivos e gestores.

Assim, os sistemas de controles internos, certificados pela auditoria, efetivamente


representam elementos críticos de sucesso no governo estratégico das empresas,
contudo, deve ser levada em consideração a relação custo-benefício entre o
ambiente de controle e os ricos relacionados ao negócio.
 

Estrutura de Propriedade
Outro aspecto que deve ser considerado é o capital próprio colocado à disposição
da empresa para a consecução do seu objetivo, que pode ser originário de muitos
ou de poucos indivíduos (acionistas e/ou investidores), resultando na composição
da estrutura de propriedade da empresa.
A estrutura de propriedade é um fator que influencia o nível de aderência dos
executivos aos propósitos dos acionistas, contribuindo para um maior ou menor
cenário de conflito de interesses.
Estruturas de propriedade dispersas, com muitos acionistas, tendem a aumentar o
poder dos executivos e gestores, haja vista a assimetria de informações existente
entre as partes e à consequente concentração de poder nas mãos destes
executivos, que passam a ter grande poder de decisão. Inversamente, estruturas
de propriedade concentradas, com poucos acionistas, tendem a reduzir a
assimetria de informações e, por conseguinte, proporcionam maior controle sobre
as decisões tomadas na administração dos negócios (menor conflito de
interesses).
A concentração acionária por meio de investidores institucionais funciona como
um importante mecanismo de governança capaz de gerar maior monitoramento
sobre as ações dos executivos e de seu desempenho, forçando que suas
decisões sejam do tipo 1, em virtude do alto nível de profissionalização e controle
exercido por tais investidores. Essa situação se justifica pelo fato de os
investidores institucionais aportarem valores expressivos de terceiros em seus
investimentos, exigindo elevado nível de accountability (obrigação de prestar
contas para outras instâncias) a seus representados.
 
¹ Em out/2001, a Enron, a sétima maior empresa norte-americana e a maior
companhia do mundo de energia elétrica, apresentou graves problemas de
governança,  acarretando em sua falência.
² Comissão que assessora a Security and Exchange Commission - SEC
(equivalente à brasileira Comissão de Valores Mobiliários - CVM) e mantém
estreito relacionamento com as “Big Four”, representadas pelas quatro principais
empresas de auditoria independente do mundo.
 

Vídeo - Mecanismos internos de governança corporativa

Problemas de governança corporativa e os principais


mecanismos para mitigá-los

Mecanismos externos de
governança corporativa
 
Assim como vimos uma série de mecanismos de governança realizados
internamente à empresa, provocando elevados custos de manutenção, como um
bom ambiente de controles internos e uma estrutura de auditoria, a empresa
também conta com mecanismos externos, não sujeitos a custos.
Os mecanismos externos de governança se relacionam ao ambiente no qual a
empresa está inserida e à regulação aplicável ao seu mercado de atuação, que
teriam o poder de funcionar como uma “mão invisível” de regulação e controle.
Vejamos quais são estes mecanismos externos:
 

Competição
O mecanismo de competição, também conhecido como aquisição hostil, parte do
pressuposto de que as empresas que estejam envolvidas em grandes decisões do
tipo 2, ou seja, aquelas que maximizam o interesse pessoal do executivo em
detrimento do interesse do acionista, passam a ser percebidas pelos concorrentes
como empresas que destroem valor e, por conseguinte, seriam alvos de interesse
de aquisição por suas concorrentes, na expectativa de aumentar seu valor
agregado, em um processo de aquisição.
Os executivos das empresas mais expostas a tais situações, com receio de
perderem seus empregos em caso de uma aquisição hostil, tendem a tomar
decisões do tipo 1, reduzindo os conflitos de interesse.
 

Cobertura de Analistas de Mercado


Empresas com elevado nível de exposição no mercado, por serem alvo de
interesse de analistas, investidores e agências de classificação de riscos, por
exemplo, possuem elevado nível de transparência e divulgação de suas ações ao
mercado.
A contínua “fiscalização” das empresas pelos agentes do mercado faz com que as
ações dos executivos estejam alinhadas aos interesses dos acionistas, inibindo
decisões do tipo 2, pois seriam facilmente percebidas as deficiências em sua
gestão e a consequente destruição de valor do negócio.
 

Proteção Legal
Obrigações legais funcionam como mecanismos de governança, de forma
compulsória, para as empresas que desejam captar recursos para o financiamento
de seus projetos no mercado norte-americano.
O mercado de capitais norte-americano apresenta papel fundamental para a
economia dos Estados Unidos, representando, inclusive para outros países, uma
importante fonte de financiamento para grandes empresas, por meio da emissão
de títulos e valores mobiliários.
O mercado de capitais norte-americano apresentou, no decorrer da década de
1990 e até o início do ano 2000, uma expressiva e contínua elevação nos preços
das ações, com exceção de pequenos períodos de turbulência, como as crises do
sudeste asiático, em 1997, da Rússia, em 1998, bem como da desvalorização da
moeda brasileira, em janeiro de 1999.
No ano 2000 foi se tornando evidente a falta de consistência entre as promessas
de performance de algumas empresas até que, em outubro de 2001, quando a
Enron, divulgou um prejuízo enorme e, a posteriori, admitiu ter manipulado seus
resultados contábeis em anos anteriores, abalando sobremaneira a confiança dos
investidores.
Em jun de 2002, a WorldCom, então a segunda maior companhia de telefonia de
longa distância dos EUA, confessou a “maquiagem contábil” que procedera em
seu resultado, tendo sido acusada de fraude pela SEC.
Após uma sucessão de escândalos contábeis e éticos, o advento da WorldCom
levou à total destruição da credibilidade corporativa, sendo imperativo que
medidas legais de proteção aos investidores fossem tomadas, o que culminou, em
jullho de 2002, na edição do Sarbanes-Oxley Act¹ ou mesmo SOX, como é
chamado nos meios corporativos e financeiros. 
Essa lei introduz regras rígidas de boa governança corporativa; regula aspectos
relacionados a controles internos, elaboração e divulgação de relatórios
financeiros; imputa regras a conselheiros, Chief Executive Officers (CEO’s), Chief
Financial Officers (CFO’s), diretores, auditores, analistas de mercado e
advogados, alcançando todas as empresas de capital aberto que transacionam as
suas ações no mercado norte-americano, sejam nacionais ou estrangeiras.
No caso específico do Brasil, tiveram de se ajustar aos ditames do SOX as
empresas brasileiras que possuem programas de American Depositary
Receipt² (ADR) dos níveis 2 ou 3, bem como as subsidiárias de empresas
estrangeiras que tenham seus títulos admitidos à negociação nas bolsas de
valores norte-americanas.
Assim, verifica-se que por força de obrigação regulamentar, naturalmente, os
executivos das empresas sujeitas ao SOX têm fortes estímulos para orientar suas
decisões aos interesses dos acionistas, sob pena de responderem, direta ou
indiretamente, criminalmente por seus atos.
 
¹ Curiosamente a Lei levou o nome de seu principal defensor, o senador
democrata Paul Sarbanes, e do seu mais renitente opositor de regulamentação
governamental, o deputado republicano Michael Oxley.
² Um American Depositary Receipt (ADR) é um certificado de depósito emitido por
bancos norte-americanos, representativos de ações de empresas sediadas fora
dos Estados Unidos.
 

Vídeo - Mecanismos externos de governança corporativa

Boas práticas de governança corporativa

Terminologia básica em governança


corporativa
 
Com o objetivo de proporcionar uma melhor compreensão de termos normalmente
usados no ambiente de governança, apresentamos abaixo algumas definições: 
Ações Preferenciais e Ordinárias
A quantia inicial aportada pelos proprietários ou investidores de uma empresa é
denominada "capital". O capital, por sua vez, é fracionado em pequenas partes,
denominadas "ações"; a ação é a menor parte do capital de uma empresa.
De acordo com a Lei Nº 6.404/76, as ações, conforme a natureza dos direitos ou
vantagens que confiram a seus titulares, serão classificadas em ordinárias ou
preferenciais.
As ações preferenciais (PN) conferem a seu titular prioridade no recebimento de
dividendos (remuneração pelo capital investido na empresa) e, normalmente, não
conferem direito a voto nas deliberações da empresa.
Para proteger os acionistas preferencialistas, desde 2002, com a promulgação da
Lei Nº 10.303/01, que introduziu alterações à Lei Nº 6.404/76, o número de ações
preferenciais sem direito a voto - ou sujeitas a restrição no exercício desse direito -
não pode ultrapassar 50% do total das ações emitidas pela empresa, contra os
67% anteriores à emissão da referida Lei.
As ações ordinárias (ON) conferem a seu titular o direito de voto em assembleia.
Para ter o direito de controle de uma empresa é necessário ter, no mínimo, a
metade mais uma das ações com direito a voto. 

Free Float
As ações emitidas por uma empresa de capital aberto não necessariamente
estarão livres para negociação em bolsa, à disposição do público.
As ações disponíveis para negociação livre em bolsa, classificadas como free
float, são todas as ações de emissão da companhia, exceto:

 As ações de titularidade do acionista controlador, de seu cônjuge, companheiro(a) e


dependentes incluídos na declaração anual de imposto de renda;
 As ações em tesouraria, representadas pelas ações recompradas pela própria
empresa emitente;
 As ações de titularidade de controladas e coligadas da companhia, assim como de
outras sociedades que com qualquer dessas integre um mesmo grupo de fato ou de
direito;
 As ações de titularidade de controladas e coligadas do acionista controlador, assim
como de outras sociedades que com qualquer dessas integre um mesmo grupo de
fato ou de direito;
 As ações preferenciais de classe especial que tenham por fim garantir direitos
políticos diferenciados, sejam intransferíveis e de propriedade exclusiva do ente
desestatizante (o Estado).

 
Tag Along
Para proteger os acionistas ordinaristas minoritários, desde 2002, com a
promulgação da Lei Nº 10.303/01, que introduziu alterações à Lei Nº 6.404/76,
novas deliberações foram estabelecidas às situações de mudança de controle
acionário de empresa com capital aberto.
O Tag Along tem por objetivo assegurar, por ocasião da alienação de controle de
companhia aberta, os mesmos direitos aos acionistas controladores e não
controladores.
No caso da troca (alienação) de controle de companhia aberta, o adquirente
deverá ofertar aos demais acionistas detentores de ações com direito a voto,
publicamente, o mesmo valor pago pelas ações do controlador, de modo a lhes
assegurar o preço, no mínimo, igual a 80% do valor pago por ação com direito a
voto, integrante do bloco de controle.
O adquirente do controle acionário de companhia aberta poderá oferecer aos
acionistas minoritários a opção de permanecer na companhia, mediante o
pagamento de um prêmio equivalente à diferença entre o valor de mercado das
ações e o valor pago por ação integrante do bloco de controle.

Vídeo - Terminologia básica em governança corporativa

Boas práticas de governança corporativa

Modelos de governança corporativa


 
Os países apresentam distinções em seu ambiente institucional, no que diz
respeito às áreas social, econômica, corporativa e regulatória, e isso se reflete no
modelo de governança corporativa adotado pelas empresas.
O aspecto legal e jurídico de um país determina o formato do mercado de capitais
e, por conseguinte, o nível de proteção aos investidores, influenciando, de forma
definitiva, o modelo de governança a ser adotado localmente.
Nesse contexto, há duas grandes categorias de governança, que abrangem os
principais modelos adotados pelo mundo, a saber: o Outsider System (ausência
de atuação dos acionistas no dia a dia das empresas, apenas recebendo
informações e dividendos periódicos) e o Insider System (atuação dos acionistas
no dia a dia das empresas, por meio de participação na Diretoria Executiva ou no
Conselho de Administração).  
Vejamos agora como funciona cada um desses sistemas:
Outsider System
Sistema de governança anglo-saxão (Estados Unidos e Reino Unido).

 Acionistas pulverizados e tipicamente fora do comando diário das operações da


companhia;
 Estrutura de propriedade dispersa nas grandes empresas;
 Papel importante do mercado de ações no crescimento e financiamento das
empresas;
 Ativismo e grande porte dos investidores institucionais;
 Mercado com possibilidade real de aquisições hostis do controle;
 Foco na maximização do retorno para os acionistas (orientado para o acionista).

Insider System
Sistema de Governança da Europa Continental e do Japão.

 Grandes acionistas tipicamente no comando das operações diárias, diretamente ou


via pessoas de sua indicação;
 Estrutura de propriedade mais concentrada;
 Papel importante do mercado de dívida e títulos no crescimento e financiamento das
empresas;
 Frequente o controle familiar nas grandes companhias, bem como a presença do
Estado como acionista relevante;
 Presença de grandes grupos/conglomerados empresariais, muitas vezes altamente
diversificados;
 Baixo ativismo e menor porte dos investidores institucionais;
 Reconhecimento mais explícito e sistemático de outros stakeholders não financeiros,
principalmente funcionários (orientado para as partes interessadas).

Síntese das Principais Características


Insiders
Outsiders
Sistema de Governança Europa Continental e
EUA e Reino Unido
Japão
Estrutura de propriedade Dispersa Concentrada
Controle familiar Raro Comum
Participação do Estado como
Raro Mais frequente
acionista
Papel do mercado de ações Muito importante Menos importante
Maximização da riqueza do
Função-objetivo Orientado aos stakeholders
acionista
 
 
Especificamente, o Brasil, guardadas as peculiaridades de suas empresas, está
preponderantemente no modelo de governança aplicável à Europa Continental, no
qual os grandes conflitos de interesse, dada a grande concentração acionária,
acaba por surgir entre acionistas majoritários (controlador) e acionistas
minoritários, inclusive pelo ainda pouco nível de proteção legal a estes últimos.
Inversamente, o modelo de governança adotado no mercado norte-americano,
considerando a grande pulverização acionária das empresas, propicia o conflito de
interesses entre executivos (que são fortes em seu poder de decisão e julgamento
gerencial) e acionistas minoritários, uma vez que estes, isoladamente, dificilmente
possuem mais de 10% das ações de uma empresa, logo, com pouca capacidade
de afetar as decisões corporativas.
Não obstante as peculiaridades dos sistemas institucionais entre os países,
acredita-se em uma tendência do processo de governança corporativa, cuja
velocidade depende de valores culturais, sistemas institucionais e características
estruturais das organizações.

Figura 8 - Tendências da Governança Corporativa. Fonte: Rosseti, J. P., Andrade, A. GOVERNANÇA CORPORATIVA: Fundamentos, Desenvolvimento e Tendências, 2014.

 
Vídeo - Governança Corporativa Brasil e Mundo - Visão
Panorâmica

Boas práticas de governança corporativa

Governança corporativa em
empresas familiares
 
As empresas de controle familiar têm importante relevância, no Brasil e no mundo,
em razão da considerável contribuição que trazem ao desenvolvimento econômico
e à geração de emprego e renda para a sociedade.
Não obstante, há um elevado grau de mortalidade dessas empresas devido às
características e desafios particulares desse tipo de organização.
A governança de empresas familiares ganha maior complexidade e
responsabilidade, pois, além dos tradicionais conflitos de interesses,
exaustivamente abordados nas diversas seções deste material, entre executivos e
acionistas (agente e principal), há a figura da família e a consequente relação
sentimental.
Quando do início de um empreendimento familiar, a gestão, a propriedade e a
família se configuram em uma única unidade: a própria família. Em uma
configuração simplificada, na qual existe uma única família e a ausência de
gerações, tende a não existir conflitos passíveis de administração, pois tudo é
decidido e operacionalizado por uma ou poucas cabeças. 
Vejamos abaixo, os principais modelos para as empresas familiares:

Figura 9 - Estágio Inicial da Empresa Familiar (adaptado). Fonte: DAVIS et al. Generation to Generation: Lyfe Cycles of the Family Business. HBS, 1997 apud SILVEIRA, A. M. Governança
corporativa no Brasil e no mundo: teoria e prática. Rio de Janeiro, 2010.
 
Com o passar do tempo, a empresa cresce e passa por um processo de transição
entre as gerações da família inicial, de forma que as relações de poder se
modificam e surge uma nova composição entre família, propriedade e gestão, não
mais centrada em um único indivíduo, ao que alguns autores convencionaram
chamar de “O Modelo dos Três Círculos nas Empresas Familiares”.

Figura 10 - O Modelo dos Três Círculos nas Empresas Familiares (adaptado). Fonte: DAVIS et al. Generation to Generation: Lyfe Cycles of the Family Business. HBS, 1997 apud SILVEIRA,
A. M. Governança corporativa no Brasil e no mundo: teoria e prática. Rio de Janeiro, 2010.

 
Segundo esse modelo, as posições dos atores elucidados nos círculos estão
representadas da seguinte forma:

 Membros da família que não são acionistas ou gestores;


 Membros da família que são acionistas;
 Acionistas que não pertencem à família e não são gestores;
 Membros da família não acionistas que trabalham na empresa;
 Membros da família que são acionistas e gestores da empresa;
 Acionistas que não pertencem à família e atuam como gestores;
 Executivos da empresa sem vínculo com a família.

O modelo dos três círculos coloca a empresa familiar como três subsistemas
independentes e superpostos: gestão, propriedade e família. Os proprietários
(sócios e acionistas) estão representados no sistema propriedade; os membros da
família estão representados no sistema família; e os funcionários no sistema
gestão/empresa. Caso haja pessoas com mais de um tipo de relacionamento na
empresa, estas figuram em um dos setores sobrepostos; por exemplo, o
proprietário que também é gestor, estará no setor 5.
O modelo dos três círculos é importante para o entendimento das relações
existentes entre empresas familiares, contudo, deixa de considerar a dinâmica
evolutiva com o passar do tempo, para cada um dos subsistemas (propriedade,
família e gestão). E o que se vê é que muitos conflitos vivenciados por empresas
familiares são decorrentes da passagem do tempo e das novas configurações
originadas nos três subsistemas.
Nesse sentido, foi desenvolvido um modelo complementar ao dos três círculos,
contemplando uma escala de desenvolvimento para cada um dos três
subsistemas: propriedade, família e gestão/empresa.

Figura 11 - O Modelo Tridimensional de Desenvolvimento da Empresa Familiar. Fonte: DAVIS et al. Generation to Generation: Lyfe Cycles of the Family Business. HBS, 1997 apud SILVEIRA,
A. M. Governança corporativa no Brasil e no mundo: teoria e prática. Rio de Janeiro, 2010.

 
O modelo tridimensional retrata os efeitos da passagem do tempo na empresa. A
propriedade tem início com um dono, que na sequência passará a seus filhos e,
com o passar de algumas gerações, estará com os primos; a empresa tem seu
início de forma simples, evoluindo para a expansão do negócio e finalmente atinge
sua fase de maturidade (estabilidade); os membros da família estão inseridos no
negócio desde cedo, sendo que mais tarde iniciam seu trabalho na empresa,
trabalhando em conjunto com outros membros, até a transferência do poder a
outros membros/famílias.
Os estágios distintos em cada subsistema proporcionarão às empresas familiares
uma gama de desafios ao longo do tempo, sendo imperioso que haja um
mecanismo de regulação da ordem.
Conforme posicionamento do IBGC, as organizações familiares devem considerar
a implementação de um Conselho de Família, um grupo formado para discussão
de assuntos familiares e alinhamento das expectativas dos seus componentes em
relação à organização.
Entre as principais práticas do Conselho de Família estão:

 Definir limites entre interesses familiares e empresariais;


 Preservar os valores familiares (história, cultura e visão compartilhada);
 Definir e pactuar critérios para proteção patrimonial, crescimento, diversificação e
administração de bens mobiliários e imobiliários.

Os objetivos do Conselho de Família não devem ser confundidos com os do


Conselho de Administração, que são voltados para a organização, conforme pode-
se ver abaixo:

 Criar mecanismos (ex.: fundo de participação) para a aquisição de participação de


outros sócios em caso de saída;
 Planejar sucessão, transmissão de bens e herança;
 Visualizar a organização como fator de união e continuidade da família;
 Tutelar os membros da família para a sucessão na organização, considerando os
aspectos vocacionais, o futuro profissional e a educação continuada; e
 Definir critérios para a indicação de membros que irão compor o Conselho de
Administração.

Vídeo - Governança Corporativa em Empresas Familiares

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