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Fundamentação conceitual
Princípios básicos
Segundo disposição do Instituto Brasileiro de Governança Corporativa, IBGC,
principal referência do Brasil para o desenvolvimento das melhores práticas de
Governança Corporativa, os pilares fundamentais para sua aplicação residem em
alguns princípios. Vamos conhecê-los?
Transparência
Mais do que a obrigação de informar a transparência é o desejo de deixar
disponível para as partes interessadas as informações que sejam de seu interesse
e não apenas aquelas impostas por disposições de leis ou regulamentos. A
adequada transparência resulta em um clima de confiança, tanto internamente
quanto nas relações da empresa com terceiros e não deve restringir-se ao
desempenho econômico-financeiro, contemplando também os demais fatores
(inclusive intangíveis) que norteiam a ação gerencial e que conduzem à criação de
valor.
Equidade
Essa característica se dá pelo tratamento justo de todos os sócios e demais partes
interessadas (stakeholders). A prática de atitudes ou políticas discriminatórias, sob
qualquer pretexto, são totalmente inaceitáveis. Algo que deve ser evidente nos
dias atuais.
Prestação de Contas (accountability)
Os agentes de Governança devem prestar contas de sua atuação, o que
chamamos de accountbility, assumindo integralmente as consequências de seus
atos e também omissões.
Responsabilidade Corporativa
Os agentes de Governança devem zelar pela sustentabilidade das organizações,
visando à sua longevidade, incorporando considerações de ordem social e
ambiental na definição dos negócios e operações.
Figura 2 - O Desenvolvimento das Corporações e o Despertar da Governança Corporativa. Fonte: Rosseti, J. P., Andrade, A. GOVERNANÇA CORPORATIVA: Fundamentos,
Desenvolvimento e Tendências, 2014.
Uma vez instaladas as condições para a adoção das práticas de governança,
fatores adicionais, internos e externos às organizações, contribuíram para o
fortalecimento de tais práticas, conforme se constata pela figura 3.
Figura 3 - Fundamentos para o Surgimento da Governança Corporativa.Fonte: ROSSETI, J. P., ANDRADE, A. GOVERNANÇA CORPORATIVA: Fundamentos, Desenvolvimento e
Tendências, 2014.Razões essenciais.
Fundamentação conceitual
1 EXPECTATIVA
Governo Impostos
A relação da organização com tais agentes é necessária e justificada pelos
benefícios proporcionados ao negócio, tais como eficiência operacional, ganhos
de escala, mão de obra especializada, gestão profissionalizada etc.
Na relação entre os agentes e a Firma cada indivíduo fornecerá recursos
(trabalho, capital, tecnologia etc) para o processo empresarial, na expectativa de
um retorno sobre o “investimento” realizado.
Considerando que, dentre os vários indivíduos envolvidos, cada qual trabalhará
pelo seu bem-estar pessoal, conflitos de interesses poderão surgir, assim, para
administrar tais conflitos, as relações entre a empresa e os agentes são
fundamentadas em contratos, contendo direitos e obrigações entre as partes
(agentes e empresa), ao que a literatura convencionou chamar de “nexo de
contratos” ou "visão contratual da Firma".
A visão contratual da Firma pressupõe a existência de contratos firmados entre a
organização e seus clientes, seus trabalhadores, seus fornecedores, seus
executivos etc.
Especificamente, quanto ao que concerne aos executivos, são estabelecidos
contratos estipulando a forma como seriam conduzidos e alocados os recursos da
empresa, de forma que tais executivos agissem sempre conforme os melhores
interesses da Firma. Ainda, os contratos deveriam prever toda e qualquer sorte de
eventualidade, estabelecendo a conduta a ser seguida pelo executivo, de forma
que tal contrato pudesse ser classificado como perfeito. Todavia, contratos
perfeitos não existem e, por conseguinte, são incontáveis as ocasiões em que os
executivos estarão diante de situações cujo processo de tomada de decisão pode
conflitar com os interesses do acionista (da Firma); poderão ser tomadas decisões
maximizando o interesse particular do executivo, em detrimento do interesse da
empresa, haja vista a característica precípua do ser humano: desejo de aumentar
seu bem-estar pessoal.
O vídeo apresentado neste curso, sobre a fábrica de sorvetes Furlanetti, ilustra
bem a típica situação de possível conflito de interesses a qual toda organização
está sujeita.
O sr. Furlanetti, como único proprietário e único fornecedor de capital para a
empresa, seguia estritamente à justa e necessária segregação entre as suas
despesas pessoais e as operações da empresa, ao que chamamos em
Contabilidade de Princípio da Entidade (as operações da empresa não se
confundem com as operações do sócio, pois a empresa é uma entidade jurídica
independente da pessoa física). Contudo, quando o sr. César, aportando capital
na empresa, decidiu se tornar sócio do negócio e delegou ao sr. Furlanetti a sua
administração, este último mudou a sua conduta, passando a pagar suas
despesas pessoais com os recursos corporativos, aumentando sua utilidade
pessoal em detrimento dos interesses da organização e, por consequência, do sr.
César, que indiretamente “passou a ser sócio” também da família do sr. Furlanetti.
Esse cenário é o exemplo clássico da abordagem apresentada pela literatura,
denominada de conflito de agência, na qual os diversos agentes atuantes na
empresa, em razão de interesses e expectativas contrastantes entre si, agem na
melhor forma dos seus benefícios pessoais, muitas vezes contrapondo-se aos
interesses da organização e do acionista.
Sob a perspectiva da Teoria de Agência, o principal (detentor do capital) delega a
um terceiro (agente) a responsabilidade pela gestão do seu capital, remunerando-
o para tanto. No anseio da maximização de sua utilidade, entre principal e agente,
surge o conflito de interesses (conflito de agência).
Assim, as práticas de Governança Corporativa surgem como forma de reduzir os
conflitos de agência. Vejamos abaixo o vídeo sobre a visão contratual da firma.
Fundamentação conceitual
Conflito de agência
A Governança Corporativa normalmente é explicada a partir da Teoria de
Agência, cuja abordagem central prega a separação entre propriedade e controle
da firma.
Sob a perspectiva da Teoria de Agência, o principal (podendo ser compreendido
como o proprietário ou os acionistas da empresa) é o fornecedor do capital, mas
ele está apartado das decisões corporativas, motivo pelo qual é contratado o
agente (executivo), para o desempenho da administração e consequente
condução dos negócios. Essencialmente, a relação entre principal e agente é
marcada pela separação entre os tomadores de decisões (agente) e aqueles que
delegam as decisões a terceiros (principal).
Na relação contratual firmada entre principal e agente, ou executivos e acionistas,
estes últimos contratam os serviços especializados de gestão daqueles, pagando
por isso uma remuneração.
Os acionistas anseiam que os executivos tomem decisões visando à maximização
da sua riqueza (decisões do tipo 1 na figura apresentada na aula anterior), não
obstante, os executivos tendem a tomar decisões que maximizam sua utilidade
pessoal (decisões do tipo 2 na figura apresentada na aula anterior), fazendo com
que a empresa incorra nos denominados custos de agência.
Os custos de agência são caracterizados pelos “desvios” de recursos da empresa,
por parte dos executivos, representando desde valores pouco expressivos, como o
caso de despesas pessoais embutidas nas contas corporativas (conforme vimos
na fábrica de sorvetes Furlanetti), até valores de grande monta, como
investimentos não estratégicos e dispendiosos para a empresa.
Como forma de diminuir os conflitos de interesses entre principal e agente e os
decorrentes custos de agência, são empregados diversos mecanismos de
Governança Corporativa, em âmbito interno e externo à organização, conforme
podemos ver na figura abaixo.
Figura 4 - O problema de agência dos gestores e a governança corporativa. Fonte: SILVEIRA, A. M. Governança Corporativa, Desempenho e Valor da Empresa no Brasil. Dissertação de
mestrado. São Paulo, 2002.
Os mecanismos internos de governança, voltados exclusivamente ao aspecto
financeiro dos executivos (sistema de remuneração), tais como remunerações
elevadas e a posse de ações da companhia, por si só já representariam estímulos
hábeis a que tais executivos tomassem as melhores decisões para os acionistas,
segundo a perspectiva de determinados indivíduos. Contudo, os valores e as
tendências pessoais são fatores determinantes para o comportamento e as ações
humanas.
Como sabemos, a empresa é formada por indivíduos e estes imprimirão à
empresa o produto das suas crenças e valores éticos. O comportamento dos
executivos, ao tomarem as decisões do tipo 2 em detrimento das decisões do tipo
1, será fruto do seu livre arbítrio e da sua conduta ética (ou ausência dela).
Vamos a um exemplo: Certa vez, uma advogada, professora e autora de livros
sobre ética, iniciou uma palestra afirmando que ética “não dá IBOPE” (poucas
pessoas estão dispostas a discuti-la) e que um comportamento ético equivale a
“olhar para o outro com amor”. Ora, em uma sociedade altamente marcada pelo
individualismo, na qual a competição dentro e fora do ambiente corporativo
aumenta dia a dia, as empresas devem, necessariamente, desenvolver e estimular
práticas éticas entre os seus stakeholders, tal qual sua preocupação com a
eficiência operacional e o alcance de bons resultados econômicos e financeiros.
Isso porque o estabelecimento de uma cultura ética é fundamental para a
perenidade da organização, pois os indivíduos que ali estão são os responsáveis
por imprimir elevados padrões éticos e de comportamento. Assim, faz-se
necessária a criação de um código de ética a ser seguido dentro e fora da
organização, pelos colaboradores e pelos agentes externos à empresa, como
clientes e fornecedores. Empresas éticas não se relacionam com agentes não
éticos.
A boa Governança Corporativa, somada a elevados padrões éticos, contribuirá
para a construção de uma imagem forte perante o mercado e a consequente
agregação de valor para a empresa. É importante sempre lembrar que um elevado
padrão ético se caracteriza como um importante mecanismo de governança das
empresas.
Fundamentação conceitual
Fundamentação conceitual
Figura 5 - Decisão entre Lucro e Market Share. Fonte: JENSEN (2001, p. 10). problema de agência dos gestores e a governança corporativa apud SILVEIRA, A. M. Governança Corporativa,
A busca por mais de um objetivo pode levar à ineficiência, assim, a empresa deve
definir como função-objetivo aquela que atenderá a todos os objetivos, ou a maior
parte deles, reduzindo os possíveis conflitos de interesses que surgiriam na busca
pela realização de vários objetivos.
Retomando a função-objetivo conforme o entendimento da Corrente 1, percebe-se
que não há conflito de objetivos com a Corrente 2, uma vez que a maximização da
riqueza da empresa proporcionaria a distribuição dos benefícios auferidos com
os stakeholders e, por conseguinte, atenderia aos anseios coletivos.
¹ Participação de mercado.
² Para mais detalhes, sugere-se realizar uma leitura sobre a Teoria dos Rendimentos Decrescentes (teoria econômica).
Vídeo - Função-objetivo das empresas
Além das formas acima expostas, há ainda outras condutas que acabam por
expropriar a riqueza dos acionistas, de forma indireta, como, por exemplo, quando
executivos não abrem mão de sua posição na organização, quando sabidamente
já não são mais competentes para tal, forçando sua permanência ou sonegando
informações sensíveis e/ou boicotando a gestão da informação.
Exemplos tradicionais e corriqueiros em empresas são as situações de pessoas
em posições operacionais estratégicas que não compartilham e não documentam
processos sistêmicos essenciais ao funcionamento do negócio, não obstante a
existência de regras claras e definidas para tanto.
Conselho de Administração
O Conselho de Administração é um dos principais mecanismos internos de
controle de uma entidade, haja vista seu papel relevante e independente de
atuação. Sua existência está prevista na Lei das S.A.
No Brasil, a Contabilidade está normalizada pela Lei Nº 6.404/76, que passou por
importantes alterações com a promulgação da Lei Nº 11.638/07 e da Lei Nº
11.941/09, com vistas à convergência do padrão contábil brasileiro aos padrões
internacionais de contabilidade - International Financial Reporting Standards
(IFRS).
Em seu capítulo XII, a Lei 6.404/76 determina que a administração da companhia
competirá ao Conselho de Administração e à diretoria.
O Conselho de Administração é um órgão de deliberação colegiada, obrigatório
para as companhias com capital aberto (empresas que transacionam suas ações
em Bolsa de Valores), cuja função é representar os acionistas majoritários e
minoritários, devendo ser composto, no mínimo, por três integrantes.
Inúmeras são as atribuições do Conselho, dentre as quais se destacam:
A responsabilidade atribuída ao Conselheiro é compatível ao perfil exigido desse
profissional, notadamente pelo seu nível técnico, dedicação, experiência,
reputação e independência e, por conseguinte, com uma remuneração condizente,
de forma que suas decisões estarão, necessariamente, alinhadas aos interesses
do acionista.
Verifica-se, portanto, que o Conselho de Administração está devidamente
justificado sob o aspecto financeiro (elevadas remunerações) e capacitado a tomar
as melhores decisões (decisões do tipo 1) corporativas, motivo pelo qual é
classificado por alguns agentes de mercado como sinônimo de Governança
Corporativa.
Figura 7 - Atribuições do Conselho de Administração. Fonte: Rosseti, J. P.; Andrade, A. GOVERNANÇA CORPORATIVA: Fundamentos, Desenvolvimento e Tendências, 2014.
Sistema de Remuneração
O problema de agência apresenta como um de seus aliados, na busca por boas
práticas empresariais, o sistema de remuneração atribuído aos executivos.
O montante e a forma de remunerar os executivos influenciam o nível de
alinhamento destes aos interesses da empresa, consubstanciando-se em
mecanismos de governança.
Na busca por maiores bônus, que estariam vinculados aos resultados obtidos
pelas empresas, o mundo presenciou inúmeras situações de manipulações
contábeis e a realização de operações com elevados níveis de risco, a exemplo do
caso Enron¹, em 2001, e as operações de empréstimos subprimes norte-
americanos, cujo ápice culminou na crise econômica mundial de 2008,
respectivamente.
A remuneração de executivos é alvo de grandes controvérsias desde 2009,
quando a Comissão de Valores Mobiliários - CVM, por meio da Instrução Nº 480,
passou a exigir que as empresas de capital aberto divulgassem a remuneração
mínima, média e máxima dos executivos, como uma forma de atribuir maior
transparência ao processo.
O Instituto Brasileiro de Governança Corporativa - IBGC, por sua vez, recomenda
que a remuneração de executivos e conselheiros seja divulgada individualmente, a
exemplo do mercado norte-americano.
Há empresas que condicionam a remuneração variável de seus executivos ao
EBITDA, o que pode fazer com que tais executivos tentem “manipular” tal número,
visando maximizar seus ganhos.
Independentemente de referencial a ser adotado, para que a política de
remuneração seja efetiva enquanto ferramenta de governança, há que levar em
consideração, além dos aspectos de atração, premiação e retenção de executivos,
o incentivo à condução dos negócios de forma sustentável, estabelecendo limites
de risco adequados, de forma condizente aos interesses dos acionistas. Para
tanto, o Conselho de Administração é o órgão responsável pelo estabelecimento
da política de remuneração.
Estrutura de Propriedade
Outro aspecto que deve ser considerado é o capital próprio colocado à disposição
da empresa para a consecução do seu objetivo, que pode ser originário de muitos
ou de poucos indivíduos (acionistas e/ou investidores), resultando na composição
da estrutura de propriedade da empresa.
A estrutura de propriedade é um fator que influencia o nível de aderência dos
executivos aos propósitos dos acionistas, contribuindo para um maior ou menor
cenário de conflito de interesses.
Estruturas de propriedade dispersas, com muitos acionistas, tendem a aumentar o
poder dos executivos e gestores, haja vista a assimetria de informações existente
entre as partes e à consequente concentração de poder nas mãos destes
executivos, que passam a ter grande poder de decisão. Inversamente, estruturas
de propriedade concentradas, com poucos acionistas, tendem a reduzir a
assimetria de informações e, por conseguinte, proporcionam maior controle sobre
as decisões tomadas na administração dos negócios (menor conflito de
interesses).
A concentração acionária por meio de investidores institucionais funciona como
um importante mecanismo de governança capaz de gerar maior monitoramento
sobre as ações dos executivos e de seu desempenho, forçando que suas
decisões sejam do tipo 1, em virtude do alto nível de profissionalização e controle
exercido por tais investidores. Essa situação se justifica pelo fato de os
investidores institucionais aportarem valores expressivos de terceiros em seus
investimentos, exigindo elevado nível de accountability (obrigação de prestar
contas para outras instâncias) a seus representados.
¹ Em out/2001, a Enron, a sétima maior empresa norte-americana e a maior
companhia do mundo de energia elétrica, apresentou graves problemas de
governança, acarretando em sua falência.
² Comissão que assessora a Security and Exchange Commission - SEC
(equivalente à brasileira Comissão de Valores Mobiliários - CVM) e mantém
estreito relacionamento com as “Big Four”, representadas pelas quatro principais
empresas de auditoria independente do mundo.
Mecanismos externos de
governança corporativa
Assim como vimos uma série de mecanismos de governança realizados
internamente à empresa, provocando elevados custos de manutenção, como um
bom ambiente de controles internos e uma estrutura de auditoria, a empresa
também conta com mecanismos externos, não sujeitos a custos.
Os mecanismos externos de governança se relacionam ao ambiente no qual a
empresa está inserida e à regulação aplicável ao seu mercado de atuação, que
teriam o poder de funcionar como uma “mão invisível” de regulação e controle.
Vejamos quais são estes mecanismos externos:
Competição
O mecanismo de competição, também conhecido como aquisição hostil, parte do
pressuposto de que as empresas que estejam envolvidas em grandes decisões do
tipo 2, ou seja, aquelas que maximizam o interesse pessoal do executivo em
detrimento do interesse do acionista, passam a ser percebidas pelos concorrentes
como empresas que destroem valor e, por conseguinte, seriam alvos de interesse
de aquisição por suas concorrentes, na expectativa de aumentar seu valor
agregado, em um processo de aquisição.
Os executivos das empresas mais expostas a tais situações, com receio de
perderem seus empregos em caso de uma aquisição hostil, tendem a tomar
decisões do tipo 1, reduzindo os conflitos de interesse.
Proteção Legal
Obrigações legais funcionam como mecanismos de governança, de forma
compulsória, para as empresas que desejam captar recursos para o financiamento
de seus projetos no mercado norte-americano.
O mercado de capitais norte-americano apresenta papel fundamental para a
economia dos Estados Unidos, representando, inclusive para outros países, uma
importante fonte de financiamento para grandes empresas, por meio da emissão
de títulos e valores mobiliários.
O mercado de capitais norte-americano apresentou, no decorrer da década de
1990 e até o início do ano 2000, uma expressiva e contínua elevação nos preços
das ações, com exceção de pequenos períodos de turbulência, como as crises do
sudeste asiático, em 1997, da Rússia, em 1998, bem como da desvalorização da
moeda brasileira, em janeiro de 1999.
No ano 2000 foi se tornando evidente a falta de consistência entre as promessas
de performance de algumas empresas até que, em outubro de 2001, quando a
Enron, divulgou um prejuízo enorme e, a posteriori, admitiu ter manipulado seus
resultados contábeis em anos anteriores, abalando sobremaneira a confiança dos
investidores.
Em jun de 2002, a WorldCom, então a segunda maior companhia de telefonia de
longa distância dos EUA, confessou a “maquiagem contábil” que procedera em
seu resultado, tendo sido acusada de fraude pela SEC.
Após uma sucessão de escândalos contábeis e éticos, o advento da WorldCom
levou à total destruição da credibilidade corporativa, sendo imperativo que
medidas legais de proteção aos investidores fossem tomadas, o que culminou, em
jullho de 2002, na edição do Sarbanes-Oxley Act¹ ou mesmo SOX, como é
chamado nos meios corporativos e financeiros.
Essa lei introduz regras rígidas de boa governança corporativa; regula aspectos
relacionados a controles internos, elaboração e divulgação de relatórios
financeiros; imputa regras a conselheiros, Chief Executive Officers (CEO’s), Chief
Financial Officers (CFO’s), diretores, auditores, analistas de mercado e
advogados, alcançando todas as empresas de capital aberto que transacionam as
suas ações no mercado norte-americano, sejam nacionais ou estrangeiras.
No caso específico do Brasil, tiveram de se ajustar aos ditames do SOX as
empresas brasileiras que possuem programas de American Depositary
Receipt² (ADR) dos níveis 2 ou 3, bem como as subsidiárias de empresas
estrangeiras que tenham seus títulos admitidos à negociação nas bolsas de
valores norte-americanas.
Assim, verifica-se que por força de obrigação regulamentar, naturalmente, os
executivos das empresas sujeitas ao SOX têm fortes estímulos para orientar suas
decisões aos interesses dos acionistas, sob pena de responderem, direta ou
indiretamente, criminalmente por seus atos.
¹ Curiosamente a Lei levou o nome de seu principal defensor, o senador
democrata Paul Sarbanes, e do seu mais renitente opositor de regulamentação
governamental, o deputado republicano Michael Oxley.
² Um American Depositary Receipt (ADR) é um certificado de depósito emitido por
bancos norte-americanos, representativos de ações de empresas sediadas fora
dos Estados Unidos.
Free Float
As ações emitidas por uma empresa de capital aberto não necessariamente
estarão livres para negociação em bolsa, à disposição do público.
As ações disponíveis para negociação livre em bolsa, classificadas como free
float, são todas as ações de emissão da companhia, exceto:
Tag Along
Para proteger os acionistas ordinaristas minoritários, desde 2002, com a
promulgação da Lei Nº 10.303/01, que introduziu alterações à Lei Nº 6.404/76,
novas deliberações foram estabelecidas às situações de mudança de controle
acionário de empresa com capital aberto.
O Tag Along tem por objetivo assegurar, por ocasião da alienação de controle de
companhia aberta, os mesmos direitos aos acionistas controladores e não
controladores.
No caso da troca (alienação) de controle de companhia aberta, o adquirente
deverá ofertar aos demais acionistas detentores de ações com direito a voto,
publicamente, o mesmo valor pago pelas ações do controlador, de modo a lhes
assegurar o preço, no mínimo, igual a 80% do valor pago por ação com direito a
voto, integrante do bloco de controle.
O adquirente do controle acionário de companhia aberta poderá oferecer aos
acionistas minoritários a opção de permanecer na companhia, mediante o
pagamento de um prêmio equivalente à diferença entre o valor de mercado das
ações e o valor pago por ação integrante do bloco de controle.
Insider System
Sistema de Governança da Europa Continental e do Japão.
Figura 8 - Tendências da Governança Corporativa. Fonte: Rosseti, J. P., Andrade, A. GOVERNANÇA CORPORATIVA: Fundamentos, Desenvolvimento e Tendências, 2014.
Vídeo - Governança Corporativa Brasil e Mundo - Visão
Panorâmica
Governança corporativa em
empresas familiares
As empresas de controle familiar têm importante relevância, no Brasil e no mundo,
em razão da considerável contribuição que trazem ao desenvolvimento econômico
e à geração de emprego e renda para a sociedade.
Não obstante, há um elevado grau de mortalidade dessas empresas devido às
características e desafios particulares desse tipo de organização.
A governança de empresas familiares ganha maior complexidade e
responsabilidade, pois, além dos tradicionais conflitos de interesses,
exaustivamente abordados nas diversas seções deste material, entre executivos e
acionistas (agente e principal), há a figura da família e a consequente relação
sentimental.
Quando do início de um empreendimento familiar, a gestão, a propriedade e a
família se configuram em uma única unidade: a própria família. Em uma
configuração simplificada, na qual existe uma única família e a ausência de
gerações, tende a não existir conflitos passíveis de administração, pois tudo é
decidido e operacionalizado por uma ou poucas cabeças.
Vejamos abaixo, os principais modelos para as empresas familiares:
Figura 9 - Estágio Inicial da Empresa Familiar (adaptado). Fonte: DAVIS et al. Generation to Generation: Lyfe Cycles of the Family Business. HBS, 1997 apud SILVEIRA, A. M. Governança
corporativa no Brasil e no mundo: teoria e prática. Rio de Janeiro, 2010.
Com o passar do tempo, a empresa cresce e passa por um processo de transição
entre as gerações da família inicial, de forma que as relações de poder se
modificam e surge uma nova composição entre família, propriedade e gestão, não
mais centrada em um único indivíduo, ao que alguns autores convencionaram
chamar de “O Modelo dos Três Círculos nas Empresas Familiares”.
Figura 10 - O Modelo dos Três Círculos nas Empresas Familiares (adaptado). Fonte: DAVIS et al. Generation to Generation: Lyfe Cycles of the Family Business. HBS, 1997 apud SILVEIRA,
A. M. Governança corporativa no Brasil e no mundo: teoria e prática. Rio de Janeiro, 2010.
Segundo esse modelo, as posições dos atores elucidados nos círculos estão
representadas da seguinte forma:
O modelo dos três círculos coloca a empresa familiar como três subsistemas
independentes e superpostos: gestão, propriedade e família. Os proprietários
(sócios e acionistas) estão representados no sistema propriedade; os membros da
família estão representados no sistema família; e os funcionários no sistema
gestão/empresa. Caso haja pessoas com mais de um tipo de relacionamento na
empresa, estas figuram em um dos setores sobrepostos; por exemplo, o
proprietário que também é gestor, estará no setor 5.
O modelo dos três círculos é importante para o entendimento das relações
existentes entre empresas familiares, contudo, deixa de considerar a dinâmica
evolutiva com o passar do tempo, para cada um dos subsistemas (propriedade,
família e gestão). E o que se vê é que muitos conflitos vivenciados por empresas
familiares são decorrentes da passagem do tempo e das novas configurações
originadas nos três subsistemas.
Nesse sentido, foi desenvolvido um modelo complementar ao dos três círculos,
contemplando uma escala de desenvolvimento para cada um dos três
subsistemas: propriedade, família e gestão/empresa.
Figura 11 - O Modelo Tridimensional de Desenvolvimento da Empresa Familiar. Fonte: DAVIS et al. Generation to Generation: Lyfe Cycles of the Family Business. HBS, 1997 apud SILVEIRA,
A. M. Governança corporativa no Brasil e no mundo: teoria e prática. Rio de Janeiro, 2010.
O modelo tridimensional retrata os efeitos da passagem do tempo na empresa. A
propriedade tem início com um dono, que na sequência passará a seus filhos e,
com o passar de algumas gerações, estará com os primos; a empresa tem seu
início de forma simples, evoluindo para a expansão do negócio e finalmente atinge
sua fase de maturidade (estabilidade); os membros da família estão inseridos no
negócio desde cedo, sendo que mais tarde iniciam seu trabalho na empresa,
trabalhando em conjunto com outros membros, até a transferência do poder a
outros membros/famílias.
Os estágios distintos em cada subsistema proporcionarão às empresas familiares
uma gama de desafios ao longo do tempo, sendo imperioso que haja um
mecanismo de regulação da ordem.
Conforme posicionamento do IBGC, as organizações familiares devem considerar
a implementação de um Conselho de Família, um grupo formado para discussão
de assuntos familiares e alinhamento das expectativas dos seus componentes em
relação à organização.
Entre as principais práticas do Conselho de Família estão: