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CAPACIDADE SIMBÓLICA*
Introdução
nos domínios mais diversos (mito, religião, folclore, linguagem, etc.) e nas áreas
Bion produziu ao longo dos anos, desde 1957, um corpo teórico em que construiu
com o funcionamento mental da mãe. Pensar, para Bion, não tem apenas o
Em "Uma Teoria do Pensar" (1962) Bion afirma que o significado das emoções é
pensar sobre as emoções que são as que vinculam as relações íntimas e a partir
os vínculos originados das emoções: amor (L), ódio (H) e conhecimento (K), e
esta que impede o aprender da experiência), constituindo deste modo uma Teoria
dos Afetos.
generalizações).
As primeiras realizações da função alfa na vida do ser humano são feitas pela
mãe. Quando o bebê está sendo amamentado, está sendo alimentado com o leite
olhos, de sua voz, da forma como o segura, “algo” que elaborou em sua mente a
a ele de ter uma imagem onírica, de compreender, de dar sentido ao que está
II.
Sabemos que é primeiramente a mãe a realizar a função Alfa pelo bebê e que se
da mãe, olhando nos olhos que estão atentos a ele, ouvindo a voz da mãe dirigida
do bebê. A mãe transmite, dessa forma, ao bebê o que ela elaborou a partir do
Júlia está com três meses e sete dias e a observadora descreve na supervisão
levantou-a do berço para trocar sua fralda. Enquanto isso, falava com Júlia e com
peito e voltou a indagar se estava com fome, ao que ela respondia com “A-rru”.
Foram até o living onde o pai estava telefonando, e a bebê foi deitada no sofá ao
sobre assuntos a serem resolvidos durante o dia, tirou a blusa, colocou Júlia no
colo, mas não ofereceu imediatamente o peito. Júlia emitiu um choro forte e a
seguidamente por volta de cinco minutos. Engasgou por duas vezes, afastou-se e
rapidamente retornou ao peito. Mexia com a mão direita no colo da mãe enquanto
mamava; sua mão esquerda estava solta e, a um certo momento, sua mãe
segurou-a e percebeu que estava fria. Aqueceu-a com sua própria mão, enquanto
olhava nos olhos de Júlia. Nesse momento, Júlia olhou para os olhos da mãe e
soltou o mamilo. A mãe disse: “Pronto! Não olho mais! Continue mamando,
olhava nos olhos da mãe, falava “A-rru” e passava a mãozinha no seio. Essa cena
repetiu-se três vezes. Por fim, a mãe achou que ela não queria mais mamar, e
mãe. Não é difícil imaginar que Júlia esteja “pensando”, dando sentido à relação
III.
O que dificulta o início da vida de um bebê é ter uma mãe que não desenvolveu
tolerável. Desse modo, ela não pode responder criativamente (com reverie) às
pode levar o bebê à introjeção de um objeto que não compreende, que não
Na primeira, Arminda pegou e sugou o peito oferecido pela mãe. A mãe, então,
disse:
“Devagar, porque dói... se continuar a doer, vou dar-te o leite em pó, que a tua avó
sugeriu”. O bebê continuou a sugar, e a mãe: “Vou arrumar-te uma mãe que sabe
dar de mamar.” Arminda continuou mamando até adormecer ao peito. Sua mãe
disse: “Não dorme, não, nenê, senão a mãe tem pensamentos ruins”, e acordou o
bebê.
Arminda ficava chorando, e ela chorava junto. Achava ser dor de barriga e
perguntava se o seu leite era bom. Enquanto isso, o bebê voltou a adormecer, e a
bebê não parava de chorar. A mãe sacodia-a no colo, mas não conseguia
acalmá-la. Ofereceu, então, o peito, que o bebê pegava e largava, até que, na
tentou acalmá-la e a criança adormeceu. A mãe, então, disse: “Não dorme, filha,
(“Não sei o que se passa quando ela chora”; “Será que meu leite é bom?”; “Tenho
Poderíamos mesmo afirmar que, embora a mãe esteja presente e disponível para
com o bebê, e até sofra junto com ele, está sob a “influência de fantasias”
como mãe, a percepção do que realmente o bebê precisa. Uma mãe sem
presente e atual da mãe em interação com seu bebê, não está sendo percebida e
Ela interpreta o choro como fome e a continuação do choro como ela ser incapaz
morrendo. Parece-nos evidente que o bebê está sendo solicitado a ser continente
da angústia da mãe (“Não dorme, filha, fica um pouco com a mãe, não me deixe
sozinha”).
após a mamada e não dormia de noite. A mãe disse que por não agüentar o
bebê estava "tendo que se ocupar" da angústia da mãe, que o invade a todo
momento. Meses mais tarde, o observador foi informado pela mãe que Arminda
estava tendo condições de realizar a função Alfa pelo bebê o suficiente para que o
pós-parto (Esther Bick 1950). A questão é que esta atitude da mãe permaneceu
por 9 meses (data a partir da qual a observadora não teve mais acesso à esta
Esta, fruto de um vínculo K que a M não tinha condições de oferecer, ela que já
sabia (-K) que todo choro era fome e que o dormir significava morte.
IV.
Teria sido essa também a experiência infantil de Gianni? Ele foi trazido ao meu
símbolos.
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entrar sozinho.
Na primeira vez que ele entrou sozinho, ele perambulou pela sala, em uma atitude
movimentos, falando: “abriu”, “fechou”. Ele olhou para a minha boca, para a
lâmpada que acendia e apagava, e pareceu estar unindo minha boca e fala, com
seu dedo no interruptor e luz. Passou a fazer o mesmo com o interruptor de fora
da sala e, nesse momento, eu abri a torneira da pia e ele retornou à sala, viu o
jorro de água e pediu, esticando os braços, para eu levantá-lo. Ele tocou a água
com as mãos, riu com felicidade, falou coisas incompreensíveis; lambe a mão
a água e lambendo seus dedos, passando a água pelo rosto, como que se
O fluxo de água foi uma continuidade que o atraiu, como minha fala. Ele foi
luz que entrava pelos seus olhos, e a minha boca que, se abrindo e fechando,
fazia sair palavras que entravam pelo seu ouvido e que testemunhavam minha
“mamá”, que equivale ao seio que o alimenta, e que ele usou imediatamente,
na vida do bebê não é realizada pelo bebê, mas pela mãe, temos que considerar
iniciador do pensar, sempre que o self defrontar-se com uma nova experiência
indispensável ter-se um objeto pensante, que possa ser reativado sempre que o
emocional.
(-K). Desde a ameaça de aborto, ela passou a sentir-se muito insegura, embora a
No terceiro mês, foi acrescentada a sopa, mas ele não aceitava. Insistia muito,
forçava-o a comer e o pai também ficava furioso com ele. Ela sabia que a conduta
Até hoje, essa dificuldade persiste e é uma “guerra” na hora das refeições.
Esse pequeno relato nos fez pensar tanto numa atividade projetiva dos pais no
Fui percebendo que relacionar-se, para ele, era um jogo de adivinhação, mais do
invadido com minha palavras, idéias, e então ele nem escutava o sentido, mas
mãe oferecia?
A experiência analítica com crianças como Ugo, exige do analista uma grande
chega ao limite da tolerância e próximo à ruptura de uma relação! Penso ter sido
conhecimento (K).
Na transferência, ele me fazia viver o bebê submetido, forçado a comer por uma
mãe e pai violentos, ele agora tendo os sentimentos violentos que ia enfiando-os
na analista.
bola de plasticina (massinha) que ele atirava com toda a força entre duas
almofadas, que ia crescendo até ser lançada com muita força e, por fim, se
transformar numa luta em que eu segurava a almofada que ele esmurrava como
um boxe. Todo o tempo das sessões desse período era preenchido pelo boxe e o
que eu fosse comentando não era levado em consideração por ele. Quando eu
pedia uma pausa para tentarmos compreender o que estava se passando naquela
comigo. Penso que ele sentia minha atitude como uma recusa em acompanhá-lo,
Pensamos que Ugo viveu a experiência de uma mãe que não conseguiu acolhê-lo
dentro de si, em sua mente, tentando descobrir e dar o que ele precisava, e ele,
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um bebê sem capacidade de tomar uma mãe para dentro dele, nem seu leite, nem
Assim, numa determinada sessão, limito sua luta com a almofada, por estar se
dramatização num ponto da sala do qual não posso vê-lo. Ele me diz que é uma
luta porque vai haver o rapto de uma criança. A um certo momento, Ugo morde a
mão do boneco raptor até arrancá-la e passa a morder as outras dizendo que vai
dramatização.
Finaliza dizendo que todos estão mortos, o pai está morto, só sobrou o bebê.
Uma semana após, ele jogou todo o material de sua caixa, conservando apenas
uma luva de boxe (feita de uma toalha e um saco de estopa), provavelmente num
Nas sessões seguintes, a “luva de boxe” se tornou uma bola que ele me pediu
para tentar acertar dentro de sua caixa vazia, que ele defendia colocando-se na
frente.
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Comentei que “estávamos começando de novo”, que havia um bebê que estava
começando a comer, mas resistia e uma mãe tinha que ser “bem esperta” para
Ugo escutou e passou a jogar agora defendendo bem menos o gol e deixando
suspendi sua ação, dizendo-lhe haver limite para a aceitação e para a tolerância e
que ele podia se esforçar para mostrar o que ele sentia de um outro modo. Ele se
Disse-lhe como ele estava frustrado ao ver que eu não podia aceitar todas as suas
desprezo, jogou a última coisa que havia em sua caixa e fez um gesto como que
Na sessão seguinte, ele passou a se comunicar por gestos, sem falar. Escreveu
na mesa de fórmica com um lápis que trouxera de casa e propôs lutar por 20
minutos com as regras que fizéramos e o restante do tempo seria para conversar.
Nas sessões seguintes, após a luta, ele tomava com freqüência goles de água da
Aos poucos, foi acontecendo um diálogo entre ele e eu que resultou na expansão
Comentários finais:
formação de símbolos, área de mistério, onde atua a função Alfa, de acordo com a
teoria de Bion.
Ugo.
Gianni, com uma parada do desenvolvimento psico-motor e Ugo com uma inibição
emoções.
Resumo:
formação simbólica.
Bibliografia
London Heinemann