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PRESSUPOSTOS PROCESSUAIS
RELATIVOS AO TRIBUNAL
A JURISDIÇÃO ADMINISTRATIVA
Fontes: Cap. V de “A Justiça Administrativa – Lições”, Vieira de Andrade. Capítulo Primeiro de “Manual de Processo Administrativo, Mário
Aroso de Almeida e aulas práticas lecionadas pelo Dr. David Pratas Brito.
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1. Competência em razão da
jurisdição
2. Competência em razão da
matéria
3. Competência em razão da
hierarquia
4. Competência em razão do
território
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O art. 212.º, n.º 3 da CRP estabelece como critério do âmbito jurisdicional administrativo e fiscal o critério das relações jurídicas
administrativas e fiscais;
o A tendência doutrinária tem sido no sentido da admissão da atribuição geral aos tribunais administrativos da resolução de litígios
referentes à atividade da Administração, ainda que respeitassem a relações ou incluíssem aspetos de direito privado (p.e.,
contratos privados da Administração, responsabilidade civil extracontratual por atos de gestão privada da Administração);
o Esta tendência é justificada pelo recurso cada vez mais comum da Administração aos mecanismos de direito privado.;
o Jurisprudência: Ac. 371/94.
o Mário Esteves de Oliveira: entende que existe reserva constitucional que, no entanto, pode ser afastada excecionalmente, em
caso de estado de necessidade. Este estado de necessidade é entendimento como as situações em que é impossível praticamente
o cumprimento da reserva, ou quando a realidade imponha a necessidade de desaplicar a norma constitucional.
o Diogo Freitas do Amaral/Mário Aroso de Almeida: têm uma posição mais mitigada, que admite a remissão do legislador para
a jurisdição judicial de questões emergentes de relações jurídicas administrativas, designadamente quando estejam em causa os
direitos fundamentais dos cidadãos, tendo em consideração a falta de meios e insuficiência do número de tribunais, para
corresponder às necessidades do princípio da tutela judicial efetiva.
o STA/Tribunal de Conflitos/TC/Vieira de Andrade: o preceito constitucional não deve ser lido como um imperativo estrito, mas
como uma regra definidora de um modelo típico, suscetível de adaptações ou de desvios em casos especiais, desde que não fique
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prejudicado o núcleo essencial da organização material das jurisdições. Vieira de Andrade baseia a sua posição em quatro
argumentos essenciais:
O preceito em causa (212.º, n.º 3) explica-se historicamente na sequência da intenção de consagrar a ordem judicial
administrativa como uma jurisdição própria e ordinária. Assim, é normal que se formule uma definição da área da jurisdição
nova, sem com isso pretender necessariamente estabelecer uma reserva material absoluta;
Este preceito serve como uma garantia que o legislador ordinário deve respeitar o núcleo essencial da organização material
das jurisdições;
O artigo 212.º visa apenas delimitar o sentido da parte final do art. 211.º, n.º 11, que atribui aos tribunais judiciais uma
competência jurisdicional residual;
Uma interpretação rigorosa implicaria a inconstitucionalidade de leis importante e de práticas de longa tradição,
designadamente, em matéria registral, de contraordenações e de expropriações por utilidade pública, bem como uma
alteração profunda da organização judiciária administrativa, para tornar o acesso aos tribunais administrativos uma
realidade.
Questões emergentes de relações jurídicas administrativas cuja competência não pertence aos tribunais administrativos:
São atribuídos ao Tribunal Constitucional competências no seio de questões eleitorais e de fiscalização abstrata da constitucionalidade e
de certas ilegalidades das normas administrativas;
Ao Tribunal de Contas são atribuídas as questões de legalidade financeira da atuação administrativa;
Ao Tribunal de Justiça da União Europeia é atribuída a competência para certas questões no âmbito da aplicação do Direito da União;
Certas matérias podem ser cometidas à jurisdição arbitral (arts. 180º e ss. do CPTA).
A competência dos tribunais administrativos depende da inexistência de convenção arbitral sobre a matéria (arts. 180º e ss. do CPTA);
A eventual preterição do tribunal arbitral em violação de convenção arbitral tem as consequências previstas nos arts. 577.º e 578.º do
CPC, supletivamente aplicáveis ex vi art. 1.º do CPTA;
Esta exceção dilatória não é de conhecimento oficioso, pelo que depende de alegação de parte.
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O art. 4.º do ETAF passou, após a revisão de 2002, a consagrar o critério constitucional das relações jurídico-administrativas como um critério residual de
competência, que consta da al. o). As restantes alíneas resultam numa enumeração que visa eliminar dúvidas sobre situações que possam ser menos claras.
Esta enumeração não é, portanto, taxativa, até porque se recorre a conceitos imprecisos. Por vezes, o art. 4.º sofre derrogações resultantes de legislação
especial.
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Tem um critério orgânico mais amplo que a al. b), que demonstra a
preocupação legal de incluir no âmbito da jurisdição os atos, no exercício
de poderes públicos, praticados por sujeitos privados.
Nota: existe uma limitação a este artigo, pois está excluída a apreciação
dos litígios relativos a ações de responsabilidade por ato judiciário
cometido por tribunais judiciais, assim como correspondentes ações de
regresso (art. 4.º, n.º 4, al. a)).
Na al. h), remete-se para o art. 1.º, n.º 5 da LRCEDEP. Ou seja, também
podem estar em causa pessoas coletivas de direito privado, contudo,
apenas são relevantes os atos de gestão pública.
Inclui situações em que há uma condenação à remoção de situações Ocupação de imóveis pela AP sem
N.º 1, AL. I) constituídas em via de facto, sem título que a legitime. ter feito qualquer procedimento
de expropriação.
A inexistência de título engloba duas situações: (1) as situações em que
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N.º 1, AL. L) Esta alínea deve ser interpretada restritivamente, como válida apenas
para a área do Urbanismo. Discute-se a sua aplicação às situações de
ordenamento do território.
N.º 1, AL. O)
É a cláusula geral que funciona como critério residual de competência, Litígios relativos à condenação ao
permitindo incluir na jurisdição administrativa litígios que (1) não lhe pagamento de indemnizações
estejam expressamente atribuídos e que versem sobre matéria jurídica decorrentes da imposição de
administrativa e fiscal ou (2) que, embora não versem sobre matéria sacrifícios por razões de interesse
jurídica administrativa ou fiscal, sejam-lhe expressamente atribuídos por público, que não se integram nas
norma especial. indemnizações por
responsabilidade civil (excetuando
Na opinião de Mário Aroso de Almeida, devemos considerar que estamos indemnizações devidas por
perante uma relação jurídica administrativa (1) quando lhe sejam expropriações)
aplicáveis normas que atribuam prerrogativas de autoridade ou (2)
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N.º 2 Deve entender-se que existe, aqui, uma remissão para o art. 8.º, n.º 2 da
LRCEDEP.
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ARTIGO DESCRIÇÃO
REGIME DO ILÍCITO DE
MERA ORDENAÇÃO SOCIAL A impugnação de decisões administrativas de aplicação de coimas está cometida aos tribunais judiciais.
CÓDIGO DAS O regime da fixação das indemnizações devidas por expropriações e outros atos impositivos de sacrifícios estão
EXPROPRIAÇÕES cometidas aos tribunais judiciais.
Está subtraída à jurisdição administrativa, por lei especial o contencioso das eleições relativas ao Presidente da
ART. 8.º, ALS. A), C) E D)
Assembleia da República, assembleias legislativas regionais dos Açores e da Madeira e autarquias locais, que é
DA LEI DO TRIBUNAL
atribuído à competência do Tribunal Constitucional (art. 8.º, als. A), c) e d) da Lei do TC).
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CONSTITUCIONAL
ESTATUTO DO CONSELHO
SUPERIOR DA Está subtraída a competência referente às eleições do Conselho Superior da Magistratura, que é atribuída ao
MAGISTRATURA Supremo Tribunal de Justiça.
A al. a) exclui do âmbito da jurisdição administrativa os litígios que tenham por objeto a impugnação de atos
praticados no exercício da função política e legislativa (p.e., atos legislativos ou atos políticos). Levanta-se a
questão de como distinguir atos administrativos de atos políticos. Segundo Afonso Rodrigues Queiró:
Os atos políticos são aqueles que representam o exercício de faculdades diretamente conferidas pela
constituição e que são de caráter geral e abstrato. Devemos apenas considerar aqueles que são
praticados pelos órgãos superiores do Estado;
Os atos administrativos são de caráter individual e concreto.
Assim, Aroso de Almeida distingue entre dois tipos de atos da função política:
Atos respeitantes à política externa do Estado;
Atos auxiliares de Direito Constitucional: atos do Executivo destinados a prover ao funcionamento da
Constituição, atos no exercício do poder de graça e os que se traduzem na direção da atividade dos
ministros.
Concluindo, devemos adotar uma conceção restrita do que possam ser atos políticos, para evitar a
inimpugnabilidade dos mesmos.
No que respeita à al. b), esta declara excluída do âmbito da jurisdição administrativa e fiscal a apreciação de
litígios que tenham por objeto a impugnação de decisões jurisdicionais proferidas por tribunais não integrados na
jurisdição administrativa e fiscal.
Coloca-se, neste âmbito a controversa questão da sindicabilidade perante os tribunais administrativos das
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ART. 4.º, N.º 4 DO ETAF Quanto à alínea b), VPS não compreende esta divisão no contencioso das relações laborais públicas consoante se
trata de vínculo de funções públicas ou não. Considera que é uma solução esquizofrénica, que implica que se o
vínculo for de funções públicas, a jurisdição é a administrativa, mas se for um vínculo privado, já será a jurisdição
dos tribunais judiciais.
Segundo o art. 13.º do CPTA, a questão da competência em razão da jurisdição é uma questão de ordem pública e o seu conhecimento
precede o de qualquer outra matéria. A decisão que declare a incompetência em razão da jurisdição implica a absolvição da instância (art.
14.º, n.º1);
O art. 14.º, n.º 2 confere ao autor a possibilidade de requerer a remessa do processo ao tribunal competente, no prazo de 30 dias a contar
do trânsito em julgado da decisão que declarou a incompetência;
Se, no entanto, o tribunal judicial ou de outra ordem jurisdicional para o qual o processo tenha sido remetido ou perante o qual tenha sido,
de novo, proposta a ação, vier igualmente a declarar-se incompetente, configura-se um conflito que deve ser solucionado mediante
recurso para o Tribunal de Conflitos (arts. 109.º e ss. do CPC);
A composição do Tribunal varia consoante o tipo de conflito, nos termos do art. 1.º, n.º 3 da Lei n.º 98/97, de 26 de agosto.
Nesta fase, cabe averiguar a delimitação da matéria administrativa e tributária, visto que em quase todos os tribunais da jurisdição existe
uma secção administrativa e uma secção tributária ou fiscal:
o Os tribunais administrativos são competentes para os litígios cuja resolução exige a aplicação de normas de Direito
Administrativo;
o Os tribunais tributários são competentes para dirimir os litígios cuja resolução exige a aplicação de normas de Direito Fiscal.
o Aroso de Almeida considera que os tribunais fiscais devem ser vistos como os tribunais comuns para o conhecimento dos litígios
emergentes das relações jurídicas fiscais, pelo que também são competentes para dirimir os litígios emergentes de contratos
fiscais, assim como as questões de responsabilidade civil extracontratual emergentes das relações jurídicas fiscais;
o No Acórdão do STA de 29 de Janeiro de 2014, Proc. N.º 01771/13, a jurisprudência tomou a posição de que resulta do art.
49.º do ETAF que os tribunais administrativos são “uma espécie de Tribunal comum da jurisdição administrativa (...) – e que a
competência dos Tribunais Tributários foi definida em termos bem precisos e rigorosos”, concluindo que os tribunais tributários
apenas têm competência para julgar os conflitos emergentes das relações jurídicas tributárias elencadas na lei. Disto resulta que
os tribunais tributários são competentes para averiguar a legalidade dos atos de liquidação de imposto, mas já não para apreciar
questões de responsabilidade civil resultante da ilegalidade de tais atos.
A competência para dirimir estes conflitos pertence ao Plenário do Supremo Tribunal Administrativo (art. 28.º e 29.º, ETAF).
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A jurisdição administrativa e fiscal está organizada em três ordens de tribunais: tribunais de primeira instância, tribunais de segunda
instância (Tribunais Centrais Administrativos) e o Supremo Tribunal Administrativo;
o Regra geral (art. 44.º, ETAF): compete aos tribunais de primeira instância conhecer, em primeiro grau de jurisdição, de todos
os processo em matéria administrativa, com exceção daqueles cuja competência esteja reservada aos tribunais superiores, assim
como da apreciação dos pedidos que nestes processos sejam cumulados.
o Mas também possuem competências em primeira instância: art. 37.º, alíneas c) e d) do ETAF e outras, conferidas em leis avulsas
(p.e., art. 6..º da Lei n.º 34/2007, de 13 de agosto).
o Mas também possui competências em primeira instância: art. 24.º, n.º 1, alíneas a) a f) do ETAF.
NOTA: o princípio da livre cumulabilidade dos pedidos implica que nas situações de cumulação em que a apreciação de um dos pedidos, em
primeiro grau de jurisdição, seja da competência de um tribunal superior, este também é competente para apreciar os demais pedidos (art. 21.º,
n.º 1 do ETAF).
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Segundo o art. 105.º, n.º2 do CPC, as decisões transitadas em julgado resolvem definitivamente as questões de competência, pelo que
este tipo de conflitos não é comum.
No que respeita ao Supremo Tribunal Administrativo, a sua jurisdição cobre o território nacional, pelo que não se levantam problemas de
competência em razão do território (art. 1.º, Decreto-Lei n.º 325/2003, de 29 de dezembro);
o Tribunal Central Administrativo Norte: a área de jurisdição do Tribunal Central Administrativo Norte abrange o conjunto das
áreas de jurisdição atribuídas no mapa anexo aos Tribunais Administrativos de Círculo e Tributários de Aveiro, Braga, Coimbra,
Mirandela, Penafiel, Porto e Viseu (art. 2.º, n.º1, Decreto-Lei n.º 325/2003, de 29 de dezembro);
o Tribunal Central Administrativo Sul: a área de jurisdição do Tribunal Central Administrativo Sul abrange o conjunto das áreas
de jurisdição atribuídas no mapa anexo aos Tribunais Administrativos de Círculo e Tributários de Almada, Beja, Castelo Branco,
Funchal, Leiria, Lisboa, Loulé, Ponta Delgada e Sintra (art. 2.º, n.º2, Decreto-Lei n.º 325/2003, de 29 de dezembro).
Os tribunais de primeira instância são uma rede de tribunais, existindo atualmente 16. A área de jurisdição de cada um destes tribunais
encontra-se estabelecida no mapa anexo ao Decreto-Lei n.º 325/2003, de 29 de dezembro.
o Critério regra: local da residência habitual ou da sede do autor ou da maioria dos autores, ou, não havendo maioria, do local da
residência ou da sede de qualquer deles (art. 16.º);
o Área da sede da entidade demandada (art. 20.º, n.º1), para as entidades administrativas regionais e autárquicas;
Exemplos: processos impugnatórios de atos administrativos que incidam sobre bens imóveis, como os atos de expropriação,
embargo, demolição ou licenciamento de construções;
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ATENÇÃO: só é aplicável às questões de interpretação, validade e execução de contratos, não abrangendo os processo de
impugnação de atos administrativos pré-contratuais, aos quais se aplica a regra geral;
o Cumulação de pedidos: 21.º, n.º 2. Contudo, se houver uma relação de prejudicialidade ou dependência entre pedidos, a ação
deve ser proposta no tribunal competente para apreciar o pedido principal.
CASO PARTICULAR DA INOBSERVÂNCIA DAS REGRAS RESPEITANTES À INTERVENÇÃO DE TRIBUNAL EM FORMAÇÃO ALARGADA
Em princípio, os processos nos tribunais administrativos de primeira instância são decididos por juiz singular (art. 40.º, n.º 1 do ETAF).
Quando é determinado que haja lugar à intervenção do plenário dos juízes (art. 41.º do ETAF), a decisão é proferida em conferência pelo
plenário;
Coloca-se a questão de saber qual a consequência da inobservância dessa regra: não existe uma situação de incompetência do tribunal
em sentido próprio. Assim, há lugar a uma nulidade processual, que pode ser suscitada pelas partes ou oficiosamente conhecida nos
termos do art. 104.º, n.º 3 do CPC. Quando arguida tempestivamente, a consequência é a repetição perante a formação de julgamento
adequada.
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