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Fundacionalismo x Coerentismo
Guarulhos
2013
Desde Platão o conhecimento é caracterizado como crença justificada e a busca
por um verdadeiro conhecimento justificado nunca cessou. Diversas filosofias surgiram
com teorias do conhecimento, métodos que formulavam critérios para averiguar a
veracidade e justificação de uma crença. Nessa investigação, uma atitude cética não será
surpresa, tendo em vista as inúmeras incertezas e dúvidas quanto aos nossos sentidos e
nossa realidade. Entretanto, nunca será um obstáculo para a continuação da busca pelo
conhecimento.
1
STEUP, M. Foundation Knowledge. In: Contemporary Debates in Epistemology. Blackwell, 2005. p.
123.
Apesar de expor as teses gerais de cada vertente, existem várias versões de cada
uma. No campo da teoria coerentista da justificação há, por exemplo, o coerentismo
linear e holístico. O linear diz que uma crença a tem justificação em a¹,e a¹ em a², e a²
em an, assim sucessivamente, até que, enfim, obterá sua justificação em a¹. Ou seja,
esse modo cai no problema da circularidade e, portanto, não provaria nenhuma crença
de fato, pois, se a¹ não possui nenhuma garantia de ser verdadeira, assim como nenhuma
das outras crenças que se seguem, como poderão oferecer algum conhecimento?
Já o coerentismo holístico não é linear, e as crenças adquirem sua confiabilidade
de acordo com o papel que desempenham num complexo sistema total de crenças.
Nesse processo, uma crença pode receber suporte de muitas outras crenças, o que não
necessariamente cause um efeito de circularidade, dessa forma, a pode justificar b e,
dentro do sistema, b pode suportar a.
Passando para a vertente fundacionalista, entre as diversas variações, podemos
falar do fundacionismo forte, que define as crenças básicas como infalíveis em seu
conteúdo epistêmico, sendo crenças a priori ou imediatamente justificadas através da
percepção e experiência, únicas responsáveis por garantir todo o fundamento
cognoscitivo; o fundacionismo moderado: acredita na falibilidade das crenças básicas, e
a aceita, devido a sua alta probabilidade de ser verdadeira, ou seja, a inferência de
justificação não é mais necessariamente dedutiva; e o fundacionismo fraco, as crenças
básicas são necessárias, mas não suficientes, necessitando de uma coerência com as
outras crenças para atingir uma justificação adequada.
James van Cleve acredita na coerência como fonte de justificação, entretanto,
não exclui outros métodos. Como fundacionista moderado ainda defende a noção de
crenças básicas e de certos princípios indubitáveis 2 necessários para um fundamento
confiável do conhecimento. Em seu artigo, apresenta e compara duas fórmulas que
calculariam a probabilidade de uma testemunha estar falando a verdade. De acordo com
a fórmula de George Boole3, a verdade seria provável apenas se cada testemunha
possuísse certo grau de credibilidade. A segunda fórmula é de Michael Huemer e
mostraria ser provável a verdade mesmo se nenhuma das testemunhas fosse confiável.
Com a fórmula de Boole a coerência por si só não garante grau nenhum de justificação,
necessitando antes um antecedente – credibilidade –, ou seja, representando um
2
“Here I would like to protest that there are certain principles of logic, at least,that cannot be given up,
because they are framework principles without which coherence could scarcely be defined.” VAN
CLEVE, J. Why Coherence Is not Enough: A Defense of Moderate Foundationalism. In: Contemporary
Debates in Epistemology. Blackwell, 2005. p. 177
3
Ambas as fórmulas presentes no mesmo artigo, p. 172.
argumento fundacionalista, enquanto a fórmula de Huemer apoia que a coerência pode
gerar justificação por si mesma.
Apesar de Van Cleve enxergar a melhor plausibilidade da fórmula coerentista de
Huemer, não acha correto concluir essa vertente epistemológica justificada. Portanto,
para ele, a coerência das crenças e experiências apenas daria boas razões para se
acreditar nelas se antes houvesse um conhecimento fundamental.
4
Z. ELGIN, C. Can Beliefs Be Justified through Coherence Alone?: Non-foundationalist Epistemology:
Holism, Coherence, and Tenability. In: Contemporary Debates in Epistemology. Blackwell, 2005. p. 156
do sistema, mas o que não presumiria a total dissolução do sistema. Em outras palavras,
em um coerentismo mais forte, todas as crenças são relevantes para a justificação de
cada uma das crenças. Apesar de o fundacionismo ter seu conhecimento fundado em um
todo de crenças básicas e exigir que o conhecimento tenha origem nelas, não implica
necessariamente na desclassificação de todas as crenças perante a precariedade de
algumas outras.
Na gama de objeções aos coerentistas está a argumentação de que o sistema de
crenças poderia ser alterado para que qualquer crença em questão pudesse ser
coerentemente justificada e fazer parte do sistema. Se um sujeito S acredita em p devido
a p ter coerência com o sistema de crenças que S carrega, então ~p poderia ser
justificada a partir do momento em que estivesse em coerência com o sistema de S.
Logicamente, a objeção não coloca as crenças contraditórias justificadas ao mesmo
tempo, mas apenas objetiva apontar sobre o ajusto arbitrário do sistema. Mas tal objeção
torna-se fraca quando se vê possível dizer em um momento t1 para S que p e, em um
momento t2 que ~p. Ou, se uma crença p é justificada para S, nunca significará que não
poderá significar que ~p para S ou para qualquer outra pessoa.