Você está na página 1de 3

Módulo IV

O conhecimento e a racionalidade científica e tecnológica.


Filosofia – 11.º Ano – 2019-20 – Doc. 5

1.2. Análise Comparativa de Teorias Explicativas do Conhecimento

1. O problema da possibilidade do conhecimento (Será o conhecimento possível?)

A Resposta Cética

O termo cético é comumente utilizado para expressar dúvida ou incerteza. No entanto, em


filosofia, o termo não se aplica a quem simplesmente tem dúvidas relativamente a uma ou
outra coisa, mas sim quem desafia a nossa pretensão de que sabemos com certeza seja o que
for, pondo em causa a possibilidade do conhecimento.

Os céticos antigos, de entre os quais se destaca Pirro de Élis, consideravam que, uma vez que
as pretensões de conhecimento se podem revelar injustificadas, o melhor a fazer é suspender
o juízo relativamente a todo e qualquer assunto, isto é abster-se de considerar que sabiam que
o que quer que seja é absolutamente verdadeiro ou falso. Ainda hoje há quem seja desta
opinião.

Existem céticos radicais que põem em causa a possibilidade de toda e qualquer espécie de
conhecimento e há céticos moderados que cingem o seu ceticismo a certos tipos ou domínios
de conhecimento. É desta segunda espécie de ceticismo que nos iremos ocupar.

Argumento da regressão infinita

O principal argumento apresentado a favor do ceticismo é familiar a todos aqueles que já


contactaram com uma criança na idade dos porquês.

“Come a sopa!”, “Porquê?”, “Porque isso é importante para ti.”, “Porquê?”, “Porque te torna
mais saudável.”, “Porquê?” (…) e a conversa pode prolongar-se indefinidamente, ou até que
um dos dois desista. Normalmente, é o adulto o primeiro a dar-se por vencido, afirmando num
tom impaciente: “Porque sim!”. No entanto, não é difícil perceber que “Porque sim!” não
justifica coisa alguma.

Quando uma cadeia de justificações se começa a desenrolar existem apenas três alternativas:

1) A – justifica-se com – B – justifica-se com C (C não se justifica – “Porque sim!”)

Cadeia de justificações termina arbitrariamente numa crença injustificada.

Não temos crenças justificadas pois nenhuma crença injustificada serve de justificação para o
que quer que seja.

2) A – justifica-se com – B – justifica-se com C – justifica-se com A

A cadeia de justificações volta-se sobre si própria de um modo viciosamente circular. (falácia


da petição de princípio).

Não temos crenças justificadas porque nenhuma justificação circular pode ser eficaz, pois o
que se pretende justificar está a ser usado na própria justificação.

3) A – justifica-se com – B – justifica-se com C – justifica-se com D – Justifica-se (…) (…)

A cadeia de justificações regride infinitamente.

Escola Secundária Dr. Joaquim de Carvalho, Figueira da Foz


Professor: Elisa Matos 2
Módulo IV
O conhecimento e a racionalidade científica e tecnológica.
Filosofia – 11.º Ano – 2019-20 – Doc. 5

Não temos crenças justificadas porque nenhuma cadeia infinita pode ser abarcada por
criaturas finitas e limitadas como nós. Como este tipo de justificações não tem fim à vista não
serve de justificação para coisa alguma.

Assim: as três possibilidades têm o mesmo desfecho: as nossas crenças não são justificadas,
não temos crenças justificadas.

Argumento:

(1) As nossas crenças justificam-se com base noutras crenças.


(2) Se as nossas crenças se justificam com base noutras crenças, então caímos numa
cadeia de justificações.
(3) Se caímos numa cadeia de justificações, então ou i) paramos arbitrariamente numa
crença injustificada, ou ii) voltamos a um ponto anterior da cadeia, de modo
viciosamente circular, ou iii) regredimos infinitamente.
(4) S i), então as nossas crenças não estão justificadas.
(5) Se ii), então as nossas crenças não estão justificadas.
(6) Se iii), então as nossas crenças não estão justificadas.
(7) Logo, as nossas crenças não estão justificadas.

O ceticismo instala-se quando se conjuga esta conclusão com a ideia de que o conhecimento
só é possível se tivermos crenças justificadas.

(8) Se as nossas crenças não estão justificadas, então não temos conhecimento.
(9) As nossas crenças não estão justificadas.
(10) Logo, não temos conhecimento.

Modus ponens – afirma a antecedente/afirma a consequente

Objeções ao ceticismo

1) Alguns autores consideram o ceticismo como uma posição autorefutante1

Porque é simplesmente contraditório afirmar que se sabe que “o conhecimento não é


possível”, pois ao afirmar que o conhecimento não é possível está-se a afirmar o conhecimento
de que o conhecimento não é possível.

2) Fundacionalismo – É uma das mais antigas respostas ao problema do ceticismo.

Rejeitam a primeira premissa do argumento cético da regressão infinita. Para estes autores,
nem todas as crenças se justificam com base noutras crenças, pois existem crenças que são de
tal forma evidentes que podemos considerar que se justificam por si mesmas.

Por exemplo: não parecem ser necessárias razões adicionais para acreditares que a) existes; b)
2+2=4.

1
Uma perspetiva é autorefutante quando se refuta a si mesma, isto é, quando demonstra a sua própria
falsidade.

Escola Secundária Dr. Joaquim de Carvalho, Figueira da Foz


Professor: Elisa Matos 2
Módulo IV
O conhecimento e a racionalidade científica e tecnológica.
Filosofia – 11.º Ano – 2019-20 – Doc. 5
a) Para acreditar seja no que for, tem obviamente de existir; portanto, o facto de
acreditares em a) garante, por si só, a veracidade dessa proposição.
b) Basta compreender os significados de “2”, de “adição”, de “4” e de “identidade” para
perceber que 2+2=4.

Para os fundacionalistas existem 2 tipos de crenças:

1) Crenças básicas (ou fundacionais) – de tal modo evidentes que não precisam de ser
justificadas por outras crenças, justificam-se a si mesmas como autoevidentes.
Tal como os alicerces (fundações) servem de suporte para a totalidade do edifício, sem
que sejam suportados (as) por este, também as crenças básicas representam uma base
sólida sobre a qual podemos edificar as nossas restantes crenças.

2) Crenças não básicas – não são evidentes, são inferidas a partir de outras crenças, com
base nas quais se justificam.

Dois tipos de fundacionalismo:

1. Racionalismo de R. Descartes.
2. Empirismo de D. Hume.

Escola Secundária Dr. Joaquim de Carvalho, Figueira da Foz


Professor: Elisa Matos 2

Você também pode gostar