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Introdução:
Questão Jurídica:
Factualidade:
Insatisfeita com tal limitação, que na sua opinião, era injustificada, a candidata interpôs
uma ação no Tribunal Administrativo Central de Lisboa (doravante TAC), que para sua
infelicidade, não lhe atribuiu razão. Desta forma, com o objetivo de obter tais
informações, que afirmava a sujeita, possuir interesses superiores aos dos titulares dos
respetivos dados, recorreu ao Tribunal Central Administrativo Sul (doravante TCAS),
que revogou a decisão do TCA, dando razão à candidata. Por sua vez, o Ministério
Público da Educação interpôs um recurso de revisão desta decisão ao STA.
Alegações e Contra-alegações:
Uma primeira discussão, passa por saber se a questão jurídica em causa é suscetível de
ser admitida no STA, porque de acordo com o Artigo 150º/1 do Código do Processo dos
Tribunais Administrativos (doravante CPTA), o STA tem apenas competência para rever
decisões da segunda instância que sejam proferidas pelos TCA, “quando esteja em causa
a apreciação de uma questão que, pela sua relevância jurídica ou social, se revista de
importância fundamental ou quando a admissão do recurso seja claramente necessária
para uma melhor aplicação do direito”. Deste modo, a Recorrente, no sentido de fortalecer
e manter coerente a decisão revista, refere que matéria da proteção de dados pessoais tem
Para além destes argumentos, a Recorrente para justificar a razão deste recurso ao STA,
e para sustentar o anonimato dos restantes concorrentes, fundamenta que a documentação
solicitada pela Candidata ao concurso, continha dados pessoais de outros concorrentes,
invocando, desta forma, o Artigo 83º n2 do CPA, que determina a proteção legal dos
dados pessoais. Fez ainda referência, ao Artigo 6º alínea e) da Lei n.º 67/98 de 26 de
outubro, a partir do qual todo o sujeito que pretenda valer o seu direito à informação,
cabe-lhe o ónus de provar que “o seu titular deu de forma inequívoca o seu consentimento
ou se o tratamento for necessário para a prossecução de interesses legítimos do
responsável pelo tratamento ou de terceiro a quem os dados sejam comunicados”.
Todavia, como a candidata não apresentou qualquer fundamento ou interessente legítimo
na consulta dos documentos pedidos, a Recorrente interpretou a atuação da primeira como
“mera curiosidade”3, não estando esta segunda obrigada à prestação de tal informação.
Por seu lado, a Recorrida contra-argumenta, salientando que a matéria debatida não se
insere no Artigo 150º/1 do CPTA, não podendo a decisão proferida pelo TCAS ser revista
pelo STA.
Direito:
É neste sentido, que com a colisão entre dois grandes princípios - Princípio da
administração aberta e o Princípio da proteção dos dados pessoais – há que se realizar
uma ponderação dos mesmos, respeitando de tal modo, um outro principio - o da
Proporcionalidade.
Segundo o EMMP, os Artigos 18º e 83º do CPA salvaguardam sempre o acesso aos dados
pessoais dos particulares, e confrontando-os com o Artigo 6º alínea e) da Lei n.º 67/98,
que permite o acesso aos determinados documentos, caso se verifique a prossecução de
interesses legítimos, que na visão da entidade mencionada se encontra preenchido este
requisito, já que sendo a Recorrida uma concorrente do concurso, tem um interesse
legítimo em saber a identidade dos restantes, pois, só com toda essa informação na sua
posse, pode impugnar o respetivo concurso. Assim, o EMMP conclui que o recurso da
revista não merece provimento.
Não obstante, o STA analisou a procedência do recurso de revista, assim, numa primeira
instância o Tribunal apresentou a distinção entre direito à informação não procedimental,
que se pressupõe estar “conferido a todas as pessoas à margem de qualquer procedimento
administrativo, decorrente do princípio da administração aberta” e o direito à informação
procedimental que “pressupõe a existência de um processo pendente e um interesse direto
ou legítimo do destinatário da informação, ou seja, qualquer interesse atendível”5.
Refere ainda, com grande relevância, o Artigo 83º do CPA, que confere à Recorrida o
direito de “consultar o processo que não contenha documentos classificados ou que
revelem segredo comercial ou industrial ou segredo relativo à propriedade literária,
O STA concluiu que esta questão se enquadra no Artigo 6º alínea e) da Lei n.º 67/98,
logo, o interesse legítimo em causa é o direito a impugnar o concurso. Portanto, não
bastava à Recorrida conhecer a classificação final atribuída a cada um dos que ficaram
melhor classificados, era também essencial a graduação dos restantes concorrentes, os
relatórios de avaliação, as respetivas classificações que foram atribuídas em cada um dos
critérios de seleção e a sua fundamentação com expressa referência aos documentos que
se referem a cada candidato. Sem este suporte documental, e mantendo-se o anonimato,
a Recorrida não tinha como exercer o seu direito de sindicar o ato.
Assim, o Acórdão termina estabelecendo que era improcedente ocultar os dados pessoais
dos restantes concorrentes, sendo lícito a Recorrida ter acesso a toda a informação pedida,
uma vez que, segundo o Princípio da Proporcionalidade, esta possuía um interesse direto,
pessoal e legítimo suficientemente relevante que pela sua própria natureza não precisa de
ser demonstrado. Deste modo, os interesses de informação da mesma, prevalecem sobre
os interesses dos candidatos em manter em segredo a sua participação num procedimento
que é público.
Análise Crítica:
Com base no balanço exposto do Acórdão selecionado, propõe-se realizar uma análise
crítica da decisão do STA.
Neste sentido, cabe clarificar, sucintamente, o âmbito dos Princípios acima mencionados:
Mas afinal, o que se define por Dados Pessoais? A resposta é-nos dada pelo Regulamento
Geral sobre Proteção de Dados nº 679/2016, de 27 de Abril, constatando que são
“informação relativa a uma pessoa singular identificada ou identificável («titular dos
dados»); é considerada identificável uma pessoa singular que possa ser identificada, direta
ou indiretamente, em especial por referência a um identificador, como por exemplo um
nome (…)”. Desde logo, podemos então concluir que o nome de cada candidato presente
no concurso, é considerado um dado pessoal.
Um outro aspeto de grande relevância que terá de ser abordado, é o Direito à Informação
que está ligado ao Princípio da Colaboração com os Particulares (Artigo 11º do CPA) e
ao Principio da Participação (Artigo 12º do CPA), que segundo os Professores JOSÉ
NORONHA RODRIGUES e DANIELA MEDEIROS TEVES, o primeiro “estipula que os órgãos
da Administração Pública devem atuar em estreita colaboração com os particulares,
prestando-lhes informação necessária e esclarecendo qualquer dúvida” 8 e o segundo,
“consagra a obrigatoriedade de os órgãos da Administração Pública assegurarem a
A Professora mencionada, indica ainda uma distinção entre, por um lado, informação
procedimental, regulada pelo Artigo 268º/1 da CRP e que tutela os interessados num
determinado procedimento administrativo, e tal como o Professor JORGE MIRANDA refere
“concretiza apenas no direito que assiste ao imediatamente interessado num procedimento
administrativo de ser informado sobre o andamento do mesmo, sempre que o requeresse
ao órgão responsável”11, relacionando-se também com Artigo 267º/5 da CRP, que
salvaguarda a participação dos cidadãos na formação das decisões ou deliberações que
lhes disserem respeito. E por outro, informação não procedimental, prevista no Artigo
268º/2 da CRP, que como nos indica sucintamente a autora ALEXANDRA LEMOS RAMOS,
se prende com o direito à informação administrativa que qualquer cidadão possui,
incluindo o acesso aos arquivos e registos administrativos, à partida sem necessidade de
invocar qualquer interesse ou justificação. A autora salienta ainda, que o Artigo 17º do
CPA, acolhe o acesso à informação não procedimental, logo, “um direito geral de acesso
aos arquivos e registos administrativos”. 12
9 Cfr, IBIDEM.
10 Cfr, ALEXANDRA LEMOS RAMOS, O princípio da administração aberta versus O princípio da proteção
dos dados pessoais, (2016), p. 13. Versão PDF disponível em
file:///C:/Users/Utilizador/Desktop/ulfd136607_tese.pdf
11 Cfr, JORGE MIRANDA, Constituição da República Anotada Vol. III, Universidade Católica Editora,
Parece-me que esta foi a decisão correta, uma vez que, não tem qualquer cabimento o
argumento invocado pela Recorrente, segundo o qual a Recorrida, teria de possuir e
apresentar um interesse legitimo, tendo ainda de indicar uma hipotética intenção de
impugnar, se efetivamente quisesse impugnar o concurso. Todavia, no meu ponto de
vista, a Recorrida não pode nem consegue apresentar uma impugnação, se não tem
informações necessárias e suficientes, no sentido de realizar um juízo para impugnar.
Assim, entendo que o caso concreto se enquadrava na alínea e) do Artigo 6º, visto que a
Recorrida, sendo parte do concurso, teria um interesse direto e legítimo, que seria o
exercício do seu direito a impugnar o mesmo.
14
Cfr, MARCELO REBELO DE SOUSA e ANDRÉ SALGADO DE MATOS, Direito Administrativo Geral Tomo I,
Dom Quixote, (2004), pp. 207-209.
dos concorrentes, abrange uma escala relativamente pequena e justificada, como
verificado e analisado acima.
Cabe referir também que estando a Lei n.º 67/98 revogada 15, se este caso ocorresse
atualmente, a solução seria a mesma, já que o Artigo 6º/1 alínea f) do Regulamento Geral
sobre a Proteção de Dados, refere que “O tratamento só é lícito se (…) for necessário para
efeito dos interesses legítimos prosseguidos pelo responsável pelo tratamento ou por
terceiros, exceto se prevalecerem os interesses ou direitos e liberdades fundamentais do
titular que exijam a proteção dos dados pessoais, em especial se o titular for uma criança.”
Conclusão:
Tendo em conta o que foi dito supra, o problema jurídico em causa, era quanto à
disponibilização das informações pessoais dos restantes concorrentes do concurso. Desta
forma, no sentido da resolução do conflito, concordo com a decisão do STA, estando este
caso enquadrado no Artigo 6º alínea e) da Lei n.º 67/98, isto porque a Recorrida tinha
15Antes do CPA de 2015 entrar em vigor, aplicava-se a Lei n.º 67/98 aos casos de proteção de dados
pessoais. Todavia, de acordo com a Professora ALICE MANUEL MADEIRA POSSACOS, esta Lei foi
revogada pela Lei n.º 58/2019, de 8 de agosto, que assegura a execução, na ordem jurídica nacional, do
Regulamento Geral sobre a Proteção de Dados. Cfr, ALICE MANUEL MADEIRA POSSACOS, A (necessária)
articulação entre o direito à informação administrativa e o regime de proteção dos dados pessoais numa
perspetiva atual, U.Porto, (2020), p. 50, acedido em https://repositorio-
aberto.up.pt/bitstream/10216/131577/2/437402.pdf
direito a exigir os nomes dos restantes concorrentes, visto que tanto a legislação revogada,
como na que está em vigor, lhe atribuem essa legitimidade, na medida em que tem um
interesse legítimo e direto na obtenção da respetiva informação que, como vimos, é o
direito de impugnar o concurso. Deste modo, os interesses de informação da mesma,
prevalecem sobre os interesses dos restantes candidatos em ocultar os seus dados
pessoais.
Nº 66495
Subturma 12
BIBIOGRAFIA: