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Introdução 1
Metodologia 2
Resultados 3
Análise quantitativa 3
Análise qualitativa - Padrão de Análise 20
Acordos de exclusividade 22
Políticas Promocionais 33
Fixação de preço de revenda 37
Créditos 44
***
1. Introdução
A ideia desse trabalho surgiu a partir de diversas discussões havidas internamente no grupo
e na recorrente necessidade de melhor compreensão da jurisprudência existente e do padrão
de análise do Cade. Muito embora esse trabalho não pretenda sistematizar a jurisprudência,
nem mesmo consolidar a prática de análise, os membros do GT Unilaterais entenderam
razoável reunir em um documento os casos até então julgados de forma a aprofundar as
análises até então realizadas no âmbito do grupo.
1
lapidado ao longo dos próximos anos. Além disso, algumas questões metodológicas
dependem eminentemente de decisões subjetivas do grupo, razão pela qual essas questões
poderão ainda ser debatidas no futuro, refinando ainda mais os resultados apresentados
neste relatório.
2. Metodologia
O presente trabalho foi realizado com o objetivo de mapear os casos de conduta unilaterais
já instaurados pelo Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade), no período de
1990 a 2021.1
Para a listagem inicial dos casos, os autores utilizaram a ferramenta de busca processual
própria disponibilizada pelo site do Cade, utilizando a busca por ano como filtro. A partir da
listagem inicial, os autores selecionaram, por meio de uma análise preliminar dos casos,
aqueles que tratavam de condutas unilaterais.
Cada um dos casos identificados foi analisado a partir dos seguintes parâmetros:
representante, representado, localização atual, data da representação, tipo de procedimento,
data de instauração, eventuais conversões em outros tipos de procedimento e respectivas
datas de conversão, condutas investigadas, mercados relevantes, concentração de mercado,
padrão de prova, precedentes mencionados, decisão da SDE/SG com relação a cada uma
das condutas, data da nota técnica da SDE/SG, órgão que proferiu a decisão final, eventual
avocação do caso pelo Tribunal do Cade, decisão do Tribunal do Cade por conduta, data do
julgamento do processo, Conselheiro Relator, composição da decisão, existência de
embargos de declaração e eventuais efeitos infringentes, valor e percentual de eventual
multa, outras penalidades eventualmente aplicáveis, observações específicas sobre a análise
do caso, existência de medida preventiva, data de aplicação dessas eventuais medidas,
órgão que a tenha concedido, penalidades impostas, eventual celebração de Termo de
Compromisso de Cessação (TCC), órgão que celebrou o TCC e conteúdo do acordo.
1 A seleção dos casos do mapeamento foi realizada entre maio e julho de 2021. Eventuais procedimentos que
tenham sido instaurados após essas datas não foram incluídos na base de casos analisados.
2 A classificação das condutas foi realizada de forma manual pelos membros do GT que colaboraram com a
elaboração deste relatório. Desta forma, a classificação está sujeita a uma análise subjetiva.
3 Dentro desta categoria residual, foram incluídos casos que não se enquadraram em nenhuma das outras
categorias consideradas. Muitas vezes, esses processos envolviam questões intrinsecamente privadas e o Cade
chegou, inclusive, a reconhecer a sua incompetência para apreciar a matéria. Alguns exemplos de casos concretos
auxiliam a ilustrar a categoria: (i) utilização de meios escusos para prejudicar a imagem e a reputação de
concorrente (Processo Administrativo n.º 08012.006358/1997-42); (ii) exercício de empresa por servidores
2
cada uma dessas condutas. Como há muitos casos que analisam múltiplas condutas, o
número de condutas analisado foi superior ao número de procedimentos identificados.
Este relatório visa a analisar os precedentes do Cade do ponto de vista quantitativo e também
qualitativo, identificando o padrão de prova comumente considerado pelo Cade e a evolução
deste critério ao longo do tempo. A despeito da extensa pesquisa realizada pelos membros
do GT, esse trabalho não exaure os casos já analisados pelo Cade, tendo em vista que nem
todos os casos julgados pela autarquia estão disponíveis digitalmente de forma integral. Além
disso, por ora, para análise qualitativa, selecionou-se apenas algumas das condutas já
analisadas pelo Cade para verificar quais os critérios considerados pela autarquia e qual a
evolução das análises ao longo do tempo. A pretensão é que esse relatório seja incrementado
e aperfeiçoado ao longo do tempo, de forma a se extrair ainda mais informações dos casos
levantados e das métricas apuradas.
3. Resultados
De maneira geral, a pesquisa exposta neste relatório identificou 610 processos envolvendo
condutas unilaterais no Cade, desde 1990 até 2021. O gráfico abaixo identifica o número de
procedimentos iniciados por ano, a partir de 1990:
Gráfico 1
públicos em horário incompatível com o serviço (Averiguação Preliminar n.º 08012.006574/1997-98); (iii) ataque
aos computadores da empresa concorrente, com o objetivo de promover o travamento da máquina e levar à
desconexão dos seus usuários (Processo Administrativo n.º 08012.000573/1998-93); (iv) exigência de
investimentos vultuosos por parte do concessionário de veículos automotores (Averiguação Preliminar n.º
08012.006532/1999-18); e (v) influenciar a revisão de norma técnica para criar barreiras técnicas à importação e
diminuir a concorrência externa (Inquérito Administrativo n.º 08700.007831/2012-79).
3
De todos esses casos, 113 procedimentos foram instaurados de ofício, enquanto 497 se
iniciaram a partir de representações, como indica o gráfico a seguir:
Gráfico 2
O gráfico abaixo, por sua vez, indica o número de procedimentos instaurados de ofício e por
representação de acordo com o ano de instauração:
Gráfico 3
Além disso, de todos esses procedimentos, 511 já tiveram um resultado final. Como
demonstra o gráfico abaixo, 376 desses procedimentos foram julgados durante a vigência da
Lei n.º 8.884/94, enquanto 135 foram julgados a partir da vigência da Lei n.º 12.529/2011:
4
Gráfico 4
A pesquisa também identificou que, do total de processos, 259 já foram instaurados como
processos administrativos, sem que houvesse averiguações ou inquéritos administrativos
prévios, como demonstra o gráfico abaixo:
Gráfico 5
5
Gráfico 6
A análise do gráfico acima demonstra que, com o passar do tempo, houve uma redução
significativa do número de processos instaurados já como processos administrativos, sem
procedimentos prévios. A partir de 2015, inclusive, não foram identificados mais processos
administrativos instaurados diretamente, isto é, sem que houvesse procedimento preparatório
ou averiguação preliminar.4
Nos casos em que procedimentos investigatórios prévios ocorreram, é possível constatar que,
em geral, a maior parte das averiguações preliminares e dos inquéritos administrativos foram
convertidos em processos administrativos - 130 conversões e 77 arquivamentos. Já em
relação aos procedimentos preparatórios, pôde-se constatar que, enquanto 51 casos foram
convertidos em inquéritos administrativos, apenas dois foram arquivados pela
Superintendência-Geral do Cade (SG/Cade) sem a referida conversão. Os gráficos abaixo
apresentam, respectivamente, o total de averiguações preliminares e inquéritos
administrativos convertidos em processos administrativos e arquivados por ano e o total de
procedimentos preparatórios convertidos em inquéritos administrativos por ano:
4 Em razão do método de seleção de casos adotado neste mapeamento, pode ser que exista algum processo
administrativo instaurado a partir de 2015 sem averiguação preliminar/inquérito administrativo prévio que não
tenha sido identificado na pesquisa. De toda forma, os dados levantados evidenciam que, nos últimos anos, existe
uma nítida tendência de diminuição dos processos administrativos iniciados sem prévio procedimento
investigatório.
5 “Art. 30. (...) § 2º A representação de Comissão do Congresso Nacional, ou de qualquer de suas Casas,
independe de averiguações preliminares, instaurando-se desde logo o processo administrativo.” (Lei n.º 8.884/94)
6
Gráfico 7
Gráfico 8
Por outro lado, a análise dos processos de acordo com as condutas investigadas mostra que
os casos mais frequentes no Cade envolvem acordos de exclusividade (156 casos),
discriminação (111 casos) e preços abusivos (109 casos). O gráfico abaixo indica o número
de casos investigados pelo Cade em relação a cada conduta6:
6Como já mencionado, frequentemente, mais de uma conduta é investigada no mesmo processo administrativo.
Por essa razão, a soma dos valores expostos no gráfico de número de casos investigados em relação a cada
conduta é superior ao número total de processos identificados no mapeamento.
7
Gráfico 9
Também é possível constatar que existem condutas que foram bem mais investigadas na
vigência da Lei n.º 8.884/94 do que a partir da Lei n.º 12.529/20117. Esse é o caso de condutas
predatórias, práticas de venda casada e, sobretudo, preços abusivos. O fenômeno inverso
também pode ser identificado: no caso de acordos de exclusividade, por exemplo, o número
de casos a partir da vigência da Lei n.º 12.529/2011 mais do que dobrou. O gráfico abaixo
indica o percentual de procedimentos por conduta de acordo com a vigência de cada uma
das referidas leis:
7 O critério adotado para a separação entre as duas legislações foi a data de julgamento do processo. Caso o
processo tenha sido julgado após a data de vigência da Lei 12.529/2011 (29/05/2012) considera-se que esse
processo é da lei nova, mesmo se caso tenha sido instaurado sob a vigência da Lei 8.881/94. Nesse sentido, a
soma de processos nas análises e estatísticas segregadas por legislação é menor que o total de processos
instaurados, vez que é possível que o processo ainda não tenha sido julgado, ou que a sua data de julgamento
não foi obtida quando da realização dos presentes trabalhos.
8
Gráfico 10
Entre todos os casos analisados, foi possível identificar a concessão de medidas preventivas
em 48 oportunidades, sendo 40 delas concedidas pela SDE/SG e oito concedidas pelo
Tribunal, como apresentado no gráfico abaixo:
Gráfico 11
8Não foi possível aferir o prazo médio para os casos de não-concessão da medida preventiva porque, para alguns
pedidos, verificou-se que não houve pronunciamento da autoridade investigadora ou julgadora até a decisão final
pelo Conselho.
9
meses e 24 dias ao longo da vigência da Lei n.º 8.884/94 e de, aproximadamente, um ano,
um mês e seis dias durante a vigência da Lei n.º 12.529/2011, como exposto no gráfico
abaixo:
Gráfico 12
Gráfico 13
10
Além disso, a pesquisa identificou que, a partir do início da vigência da Lei n.º 12.529/2011,
houve uma ampliação no prazo de duração médio entre a data de representação e a abertura
de processo administrativo para imposição de sanções por infração à ordem econômica. De
fato, nos casos analisados durante a vigência da Lei n.º 8.884/94, os processos
administrativos eram instaurados, em média, aproximadamente 10 meses e 24 dias após a
data da representação; na vigência da Lei n.º 12.529/2011, por outro lado, o prazo de duração
médio entre a data de representação e a instauração de processos administrativos passou a
ser de, aproximadamente, 1 ano, 7 meses e 6 dias, como descrito no seguinte gráfico:
Gráfico 14
Após a instauração dos processos administrativos, o prazo médio despendido pela SDE, ao
longo da vigência da Lei n.º 8.884/94, e pela SG, a partir da Lei n.º 12.529/2011, para encerrar
a instrução processual e publicar as suas respectivas notas técnicas é semelhante no que diz
respeito às condutas unilaterais. De fato, enquanto a SDE levava aproximadamente 4 anos,
4 meses e 24 dias para encerrar as instruções de condutas unilaterais, a SG tem levado
aproximadamente 4 anos, 2 meses e 12 dias, como exposto no gráfico a seguir:
11
Gráfico 15
Gráfico 16
Além disso, o prazo de duração médio dos processos administrativos desde as respectivas
representações até o julgamento final pelo Tribunal tem sido maior a partir da Lei n.º
12.529/2011 - aproximadamente 6 anos, 2 meses e 6 dias - do que foi ao longo da vigência
12
da Lei n.º 8.884/94 - aproximadamente 5 anos, 2 meses e 12 dias -, como exposto no gráfico
abaixo:
Gráfico 17
Além disso, quando considerado o tempo de tramitação dos processos administrativos a partir
de sua instauração até os julgamentos finais, para casos em que houve arquivamento ou
condenação, foi possível constatar um tempo médio pouco superior a cinco anos, tanto na
vigência da Lei n.º 8.884/94, quanto a partir da Lei n.º 12.529/2011, como exposto no gráfico
abaixo:
Gráfico 18
Também foi possível constatar distinções em relação ao tempo de duração dos processos
conforme o tipo de decisão adotada pelo Tribunal do Cade - arquivamento, condenação ou
celebração de TCC. Em casos de condenação, verificou-se um tempo de tramitação médio
13
de aproximadamente 6 anos e 9 meses nos casos julgados de acordo com a Lei n.º
12.529/2011 e de aproximadamente 3 anos e 2 meses naqueles julgados durante a vigência
da Lei n.º 8.884/94, como descrito no seguinte gráfico:
Gráfico 19
Em casos de arquivamento, por outro lado, o tempo de tramitação médio, nos casos julgados
de acordo com a Lei n.º 12.529/2011, foi de aproximadamente 7 anos e 4 meses e, naqueles
julgados durante a vigência da Lei n.º 8.884/94, de aproximadamente 5 anos e 6 meses, como
descrito no gráfico abaixo:
Gráfico 20
Nos casos arquivados com TCCs, por sua vez, naturalmente, o prazo de duração dos
processos foi abreviado. Na vigência da Lei n.º 8.884/94, processos encerrados com TCCs
duraram, em média, 2 anos e 3 meses e 21 dias; a partir da Lei n.º 12.529/2011, o tempo de
14
tramitação médio desses processos tem sido de 4 anos e 11 meses. Essas informações
encontram-se descritas no seguinte gráfico:
Gráfico 21
A análise temporal da celebração de TCCs pelo Cade de maneira geral mostra, ainda, que
houve, na última década, um nítido crescimento na utilização desses acordos em casos de
condutas unilaterais. De fato, enquanto apenas 11 TCCs foram celebrados na vigência da Lei
n.º 8.884/94, 69 foram concluídos a partir da Lei n.º 12.529/2011.10 Mais do que isso,
enquanto TCCs representavam apenas 2,93% dos casos julgados durante a vigência da Lei
n.º 8.884/94, a partir da Lei n.º 12.529/2011, 51,11%% dos processos envolvendo condutas
unilaterais foram encerrados com TCCs. Essas informações podem ser extraídas dos gráficos
abaixo, que expõem, respectivamente, o número e o percentual de cada tipo de decisão
adotada pelo Tribunal do Cade - arquivamento, condenação ou celebração de TCC - de
acordo com a vigência de cada uma das leis11:
9 Esse valor foi determinado de acordo com as informações disponíveis publicamente nos processos analisados.
Há dados confidenciais e contribuições definidas apenas em Unidades Fiscais de Referência (UFIR), que não
foram utilizadas para chegar a esses montantes.
10 O número de TCCs celebrados pelo Cade no julgamento de condutas unilaterais durante os períodos analisados
foi superior ao número efetivamente identificado na pesquisa. De fato, em casos envolvendo múltiplas partes
acusadas de condutas unilaterais, pode ser que o Cade celebre mais de um TCC no mesmo processo. Como isso
efetivamente ocorreu em algumas ocasiões, é possível identificar a discrepância mencionada.
11 Os gráficos apresentados a seguir analisam o tipo de decisão adotada pelo Cade de acordo com cada processo
administrativo. Como cada processo pode analisar mais de uma conduta, pode ser que, em um mesmo processo,
o Cade tenha tomado mais de uma decisão. Feita essa ressalva, em todos os casos em que o Cade tenha
condenado pelo menos uma empresa e/ou pelo menos uma conduta, considera-se, nesta análise, que o resultado
final do processo foi a condenação. O mesmo vale para TCCs, com a ressalva de que não foram identificados
casos de condutas unilaterais em que houve, ao mesmo tempo, condenações e a celebração de TCCs. Por fim,
foram considerados arquivamentos os casos em que não houve nem condenação nem celebração de TCCs.
15
Gráfico 22
Gráfico 23
A evolução temporal das decisões adotadas pelo Tribunal do Cade, em relação a cada
conduta investigada12, também permite que se identifique um crescimento substancial da
adoção de TCCs ao longo da última década, como mostra o gráfico abaixo:
12 Como mencionado acima, é comum que mais de uma conduta seja investigada no mesmo processo
administrativo pelo Cade. Enquanto os gráficos anteriores analisavam o número de condenações, arquivamentos
e TCCs de acordo com cada processo administrativo, o gráfico ora apresentado foca a análise em cada conduta
individualmente. A soma do número de condutas, nesse caso, é superior ao número total de processos
identificados no mapeamento.
16
Gráfico 24
O volume anormal de TCCs no ano de 2013 é devido aos acordos celebrados entre o Cade
e as cooperativas ligadas ao Sistema Unimed, com o objetivo de encerrar uma série de
processos envolvendo cláusulas de exclusividade entre médicos e cooperativas, como
exposto na seção 3.2.1 abaixo. De todo modo, ainda que feita essa ressalva, constata-se
que, desde 2010 e, sobretudo, a partir da vigência da Lei n.º 12.529, é possível verificar um
crescimento no número de TCCs celebrados pelo Cade na apreciação de condutas
unilaterais.
O mapeamento identificou, ainda, que os percentuais médios das multas aplicadas pelo Cade
em relação a condutas unilaterais foram 5,5%, em relação aos casos julgados durante a
vigência da Lei n.º 8.884/94, e 2,7% para os casos julgados a partir da Lei n.º 12.529. É
preciso ressaltar, contudo, que a amostragem da qual esses dados foram extraídos é pouco
representativa - apenas 18 processos dentre os 610 que foram identificados. De fato, em
muitos casos, os percentuais de multas foram mantidos em sigilo e, em outras oportunidades,
as multas estabelecidas pelo Cade foram fixadas com base no critério de UFIRs, nos termos
do art. 23, III, da Lei n.º 8.884/94, já que as pessoas jurídicas condenadas eram
cooperativas.13
Além disso, de maneira geral, as condutas que mais resultaram em TCCs foram a
discriminação (20) e os acordos de exclusividade (52), como descrito no gráfico abaixo:
13 Como já mencionado neste relatório, uma parcela considerável das condenações do Cade em condutas
unilaterais envolve a prática da unimilitância de cooperativas ligadas ao sistema Unimed. Nestes casos, as multas
eram fixadas em UFIRs, sem que fosse utilizado o critério do valor do faturamento bruto.
17
Gráfico 25
Gráfico 26
18
Já em relação aos arquivamentos, a grande representatividade de algumas condutas expõe
dificuldades ligadas à comprovação da ilicitude dessas práticas. Condutas predatórias, por
exemplo, resultaram em arquivamentos em 73 casos. Já a prática de preços abusivos,
resultou em arquivamento em 102 oportunidades. O gráfico abaixo apresenta o número de
arquivamentos de acordo com a conduta investigada pelo Cade:
Gráfico 27
Por fim, convém destacar que, de maneira geral, quase todas as decisões do Tribunal do
Cade são tomadas por unanimidade. Na vigência da Lei n.º 8.884/94, apenas em 1% das
decisões mapeadas foram identificadas divergências entre os membros do Tribunal. A partir
da Lei n.º 12.529/2011, embora a divergência tenha crescido - em 13% dos casos, a decisão
foi maioria - ainda foram identificados julgamentos onde houve unanimidade em 87% dos
casos.
Gráfico 28
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Gráfico 29
No que diz respeito à relação entre o Tribunal e a antiga Secretaria de Direito Econômico
(SDE) e Superintendência Geral (SG), nota-se que usualmente há uma uniformidade no
entendimento destes órgãos. O mapeamento demonstrou que em 85% dos casos, o Tribunal
do Cade manteve a recomendação feita pela SDE/SG, conforme ilustra o gráfico abaixo:
Gráfico 30
Em regra, condutas unilaterais são analisadas pelo Cade sob a regra da razão.14 O Cade
consolidou uma estrutura geral para avaliar se determinada prática poderia culminar em
14 “Como no caso das restrições horizontais, as práticas verticais pressupõem, em geral, a existência de poder de
mercado sobre o mercado relevante “de origem”, bem como efeito sobre parcela substancial do mercado “alvo”
das práticas, de modo a configurar risco de prejuízo à concorrência. Embora tais restrições constituam em princípio
limitações à livre concorrência, podem também apresentar benefícios (“eficiências econômicas”) que devem ser
20
efeitos deletérios para a concorrência e ser considerada ilegal à luz da Lei de Defesa da
Concorrência:15 (i) existência de posição dominante da empresa que adota a prática
investigada - há uma forte presunção legal de que há poder de mercado sempre que o
operador detém mais de 20% de participação de mercado; (ii) verificação de potenciais efeitos
anticompetitivos - fechamento de mercado, por exemplo - e potenciais impactos aos usuários
finais - aumentos de preços, por exemplo16; e (iii) existência de justificativas razoáveis e
potenciais eficiências - verificação se as alegadas eficiências poderiam exceder os potenciais
efeitos anticoncorrenciais.
Considerando a estrutura geral exposta acima, para a análise de cada uma das condutas, o
Cade costuma analisar critérios específicos, relacionados às características das condutas sob
análise e a maneira como elas podem impactar a concorrência. Acordos de exclusividade,
por exemplo, costumam despertar a preocupação do Cade se tiverem potencial ou for
constatado um alto grau de fechamento de mercado injustificado. Para tal constatação,
verifica-se (i) a abrangência dos efeitos do acordo; (ii) grau de evolução do mercado; (iii)
duração do acordo; e (iv) contestabilidade do acordo de exclusividade.17 Já na análise da
concessão de descontos condicionados, os critérios para a concessão são observados.
Descontos não lineares, na visão do Cade, tendem a gerar impactos mais deletérios, gerando
incentivos à fidelidade e à negociação exclusiva.18
Companhia de Bebidas das Américas - AMBEV. No mesmo sentido: “Um patamar [de descontos] individualizado
- um baseado num percentual do total de exigido do cliente ou uma meta de volumes individualizada - permite que
o fornecedor dominante estabeleça o patamar em um nível que torne difícil para os clientes trocarem de
fornecedores, criando, assim, um efeito maximizador de lealdade. Em contrapartida, um patamar padronizado de
volume - em que o patamar é o mesmo para todos ou para um grupo de clientes - pode ser muito alto para alguns
clientes menores e/ou muito baixo para grandes clientes para ter um efeito maximizador de lealdade.”
(Communication from the Commission - Guidance on the Commission’s enforcement priorities in applying Article
82 of the EC Treaty to abusive exclusionary conduct by dominant undertakings (2009/C 45/02). § 45. Tradução
livre).
19 Desde o início da vigência da Lei n.º 12.529/2011, 31,4% dos casos envolvendo condutas unilaterais foram
<https://www.oecd.org/daf/competition/oecd-peer-reviews-of-competition-law-and-policy-brazil-ENG-web.pdf>.
Acesso em 6 out. 2021.
21
O mapeamento feito pelo Grupo Técnico em Condutas Unilaterais do Ibrac, nesse caso, pode
ser uma forma de trazer clareza para esse cenário e traçar um panorama geral da
jurisprudência do Cade em relação a cada conduta específica. Mais do que isso, o horizonte
temporal considerado permite que a própria evolução desse panorama seja delineada.
Questões como (i) em que medida o Cade aplica a regra da razão completa, com o balancing;
ou (ii) qual é o padrão probatório utilizado pela autoridade brasileira para definir acordos de
exclusividade como uma infração e quando foi definido esse padrão poderão ser respondidas
a partir dos dados coletados, que serão analisados a seguir.
De acordo com a Resolução n.° 20/99 dispõe que acordos de exclusividade são
caracterizados quando “os compradores de determinado bem ou serviço se comprometem a
adquiri-lo com exclusividade de determinado vendedor (ou vice-versa), ficando assim
proibidos de comercializar os bens dos rivais”. A mesma Resolução associa os efeitos
potenciais anticompetitivos da exclusividade “(i) à implementação de condutas colusivas,
tendentes usualmente à cartelização, no mercado “de origem”, quando são utilizadas como
instrumento de divisão de mercado entre produtos substitutos”; ou (ii) ao aumento do poder
unilateral do poder de mercado da empresa que impõe a exclusividade, por meio do
“bloqueio” e/ou aumento de barreiras à entrada no segmento de distribuição (ou de
fornecimento de insumos), o que pode resultar diretamente de cláusulas contratuais, ou
indiretamente por aumento de custos dos rivais”.21
Foram identificados 156 casos envolvendo cláusulas de exclusividade, entre 1990 e 2021.
Os dois processos administrativos mais antigos envolvendo cláusulas de exclusividade
identificados no mapeamento foram julgados ainda na vigência da Lei n.º 8.158/1991, em
1993.22 A análise do padrão probatório adotado nestes casos demonstra que, ainda que sob
diferentes regimes normativos, a utilização da regra da razão é um padrão nesses casos de
condutas unilaterais. Em geral, nos dois casos julgados na vigência da Lei 8.158/1991, a
legalidade dos acordos de exclusividade foi avaliada de acordo com os seguintes critérios: (i)
existência de poder de mercado;23 (ii) dificuldades à entrada e ao funcionamento de novas
empresas no mercado, ainda que sem uma análise aprofundada do grau de fechamento do
quanto por venda casada, detinha 91% do market share do mercado de assistência técnica de copiadoras e
percentuais entre 74,6% e 87,6% nos produtos de consumo das copiadoras, como toners, cilindros e reveladores,
mercado em que a exclusividade era imposta. No Processo Administrativo n. 32/1992, por sua vez, um dos
fundamentos do arquivamento do processo foi a ausência de poder de mercado da Valer (que detinha menos que
5% de marketshare no fornecimento de vale-alimentação).
22
mercado relevante; e (iii) comprovação de eventuais justificativas para a conduta.24 Alguns
elementos foram considerados para afastar a ilicitude da conduta, como a não imperatividade
do acordo, isto é, a possibilidade de negociação entre as empresas sem que a cláusula de
exclusividade fosse imposta; e a adoção da cláusula em caráter experimental, com prazo
definido de duração.25
Em 1998, o Cade julgou os três primeiros casos envolvendo acordos de exclusividade a partir
da vigência da Lei n.º 8.884/1994.26 Enquanto um dos casos foi arquivado sob o fundamento
de que o relacionamento discutido naquele processo seria exclusivamente contratual, sem
reflexos para a concorrência,27 os outros dois geraram condenações.28 Ambos os casos que
resultaram em condenação discutiam a prática da denominada unimilitância por cooperativas
do sistema Unimed. Essas cooperativas proibiam os médicos cooperados de se credenciarem
a outros planos de saúde. Tais julgamentos foram os marcos iniciais de uma série de casos
envolvendo essas cooperativas, que compreendem mais da metade dos processos
envolvendo cláusulas de exclusividade na jurisprudência do Cade.29
24 No voto que conduziu a condenação da Xerox, o Conselheiro Marcelo Monteiro Soares registrou que: “Protesta
a Representada quanto aos transtornos e prejuízos que o uso de materiais, sem a necessária qualificação, tem
trazido aos seus negócios, fato que não teria sido considerado pelo DPDE. No entanto, esses transtornos e
prejuízos não passaram de meras alegações. Cumpria à XEROX provar a existência do dano, de sorte a
justificar seu temor pelo uso de materiais de outras marcas.” Destacou, ainda, que “Não se lhe [à Xerox] nega,
contudo, o direito de impugnar os produtos comprovadamente danosos a seus equipamentos.”
25 Processo Administrativo n.º 32/1992, voto da Conselheira Relatora Neise Teresinha Mailard.
26
Processos Administrativos n.º 52/1992, n.º 08000.011866/1994-84 e n.º 08000.021182/1996-15.
27 Processo Administrativo n.º 52/1992.
28 Processo Administrativo n.º 08000.011866/1994-84, voto do Conselheiro-Relator Paulo Dyrceu Pinheiro; e
Processo Administrativo n.º 08000.021182/1996-15, voto da Conselheira-Relatora Lúcia Helena Salgado e Silva.
29 Como será demonstrado abaixo, os litígios entre o CADE e a Unimed só foram solucionados em 2013. Naquele
momento, como registrou o então Procurador-Chefe do CADE, Gilvandro Araújo, os litígios com a Unimed
correspondiam a 26% dos processos judiciais em que o CADE figurava como parte. Vide:
https://fenasaude.org.br/noticias/cade-acordo-historico-encerra-unimilitancia-em-93-unimeds.html. Acesso em 11
out. 2021.
30 Processo Administrativo nº 08000.011866/1994-84.
31 Por exemplo: Processos Administrativos n.º 08000.021182/1996-15; n.º 08000.012251/1994-75; n.º
23
Em 1999, esse padrão se manteve e, dos 14 processos julgados envolvendo cláusula de
exclusividade,32 13 tinham a unimilitância por objeto e levaram a condenações das
cooperativas ligadas ao Sistema Unimed.33 O racional utilizado no julgamento desses casos
seguiu, em grande parte, aquele adotado pelo Conselheiro Paulo Dyrceu Pinheiro no voto
mencionado acima. Na definição da ilicitude da conduta, também foram considerados
elementos como: (i) a exclusividade ter sido definida de maneira coletiva; (ii) a imposição da
cláusula de maneira coercitiva; (iii) a ausência de poder de barganha dos médicos;34 e (iv) o
risco à vida dos clientes de outros planos de saúde representado pela negativa de
atendimento por médicos credenciados à Unimed.35
Quatro desses processos foram arquivados. Em três deles, não houve análise do mérito, já
que, em um dos casos,37foi reconhecida a prescrição intercorrente, nos termos do parágrafo
1º do art. 1º da Lei n.º 9.873/199938, e nos outros dois39, a mesma conduta investigada já
havia sido objeto de condenação pelo Cade em processos administrativos anteriores. Em um
quarto processo, envolvendo a unimilitância por cooperativas odontológicas, o arquivamento
foi motivado pela falta de comprovação da materialidade da conduta.
32
No mesmo ano, além das 13 condenações envolvendo a Unimilitância, o Cade arquivou um processo
administrativo por exclusividade, considerando que a materialidade da conduta não foi comprovada ao longo da
instrução processual. O caso em questão envolvia o mercado de distribuição de veículos e o Cade considerou
que, neste segmento, montadoras teriam poder de mercado independentemente do seu market share no mercado
de venda de veículos para os consumidores; afinal, com a celebração de um contrato de concessão, os
concessionários não teriam alternativas a não ser a própria montadora e ficariam, assim, presos à marca. Vide
Processo Administrativo nº º 08000.017766/1995-33, voto da Conselheira-Relatora Lúcia Helena Salgado Filho.
33 Processos Administrativos n.º 08000.012251/1994-75, n.º 08000.020239/1994-25, n.º 08000.014608/1995-86,
voto da Conselheira-Relatora Lúcia Helena Salgado e Silva; e de n.º 08000.014608/1995-86, voto do Conselheiro-
Relator Ruy Santacruz.
35 Processo Administrativo n.º 08000.018480/1997-28, voto do Conselheiro-Relator Mércio Felsky.
36 Processos Administrativos 08000.006347/1995-49, 08000.028878/1996-18, 08012.003210/1998-46,
08012.010271/1998-51, 08000.004961/1995-76, 08000.025966/1996-69, 08012.003211/1998-17,
08012.003212/1998-71, 08012.006459/1998-31, 08012.009124/1998-29, 08012-003518/1999-72,
08012.007412/2000-07, 08012.007209/1998-17, 08012.007620/1997-49, 08012.011363/1999-93,
08012.012023/1999-71, 08012.001847/2000-49, 08012.001280/2001-35, 08000.023281/1997-41,
08012.003083/2001-51, 08012.004156/2001-21, 08000.011698/1994-81, 08012.000656/2001-94,
08012.001410/2002-11, 08012.005981/2002-24, 08012.001447/2002-49, 08012.000429/2003-21,
08012.000794/2003-35; 08012.004025/2000-63; 08012.005071/2002-41; 08012.001234/2004-89;
08012.005779/2002-01; 08012.003912/2003-67; 08012.001892/2004-71; 08012.000711/2004-99;
08012.010712/2005-22; 08012.004750/2005-46 e 08012.007780/2001-81.
37 Processo Administrativo 08000.011698/1994-81.
38 “(...) § 1o Incide a prescrição no procedimento administrativo paralisado por mais de três anos, pendente de
julgamento ou despacho, cujos autos serão arquivados de ofício ou mediante requerimento da parte interessada,
sem prejuízo da apuração da responsabilidade funcional decorrente da paralisação, se for o caso.”
39 Processos Administrativos 08012-003518/1999-72 e 08012.012023/1999-71.
24
poucos casos desse período, o Cade chegou a considerar possíveis eficiências da conduta,
como eventual proteção da marca ou da reputação, evitando atitudes oportunistas dos
profissionais, mas concluiu que os seus efeitos líquidos eram negativos.40 Também se
destacam alguns outros elementos que foram considerados na análise da ilicitude das
condutas, como: (i) prazo indeterminado dos vínculos entre cooperados e cooperativas41; (ii)
aumento de rigidez ao funcionamento do fator trabalho no mercado relevante; (iii) acréscimo
de custos à mudança de emprego para os médicos; (iv) a possibilidade de que a exclusividade
fosse utilizada como estratégia de açambarcamento de mão-de-obra; e (v) a grande
quantidade de médicos que teria que se desfiliar da Unimed para que outra concorrente
pudesse se estabelecer em escala mínima.42
Para além dos casos de unimilitância, os outros 12 casos de exclusividade julgados entre
2000 e 2007 levaram a quatro condenações43, cinco arquivamentos44 e à celebração de três
TCCs45. De maneira geral, é possível constatar que houve um avanço na aplicação da regra
da razão nos casos julgados nesse período.
No caso Philip Morris v. Souza Cruz, por exemplo, ao fundamentar a aprovação da proposta
de TCC apresentada pela Souza Cruz, o Conselheiro Mércio Felsky aproveitou para traçar o
padrão probatório referente aos acordos de exclusividade, definindo a reprovabilidade da
conduta da Souza Cruz, a partir dos seguintes pontos: (i) existência de posição dominante;
(ii) expressivos graus de fechamento de mercado em boa parte dos mercados relevantes; (iii)
existência de barreiras à entrada; e (iv) eficiências alegadas, como vantagens comerciais
para o varejo, redução nos custos de transação no atacado e melhorias no abastecimento,
não seriam suficientes para compensar os efeitos negativos da conduta.46 Nos outros dois
TCCs celebrados no período em análise, não foram tecidas maiores considerações a respeito
do padrão probatório de acordos de exclusividade.47
Nas condenações48, por sua vez, o Cade reiterou esses mesmos elementos no padrão
probatório, avaliando, ainda, na análise da ilicitude dos acordos de exclusividade, questões
como: (i) importância dos efeitos de rede enquanto barreiras à entrada; (ii) importância da
concorrência intramarcas em um cenário de baixa concorrência intermarcas; (iii) ausência de
objetividade na aplicação dos critérios para definição da exclusividade; (iv) existência de
incentivos para implementação da exclusividade com o objetivo de promover o fechamento
do mercado; e (v) razões econômicas apontadas - como estímulo ao investimento em
conhecimento do mercado, proteção contra free rider, necessidade de equilibrar a relação
com lojistas que poderiam romper seus contratos unilateralmente, proteção contra mudanças
08012.002841/2001-13.
44 Processos administrativos 08000.013446/1994-60, 08012.007285/1999-78 e 08012.009312/1998-39 e
25
de posicionamento das lojas e reduções de custos de transação - não eram capazes de
justificar a conduta.
Nos casos que foram arquivados50-51, há alguns apontamentos relevantes com relação às
cláusulas de exclusividade que merecem ser destacados. No Processo Administrativo n.º
08000.013446/1994-6052, que investigou a exclusividade que beneficiava a Empresa Guiatel
S/A - Editora de Guias Telefônicos na elaboração e distribuição de listas telefônicas, o Cade
adotou, como fundamento para o arquivamento do processo, o fato de ter havido uma opção
regulatória pela exclusividade, de modo que a apreciação de sua ilicitude ultrapassa as
competências do Cade. Essa posição não foi embasada por doutrinas como State Action ou
Pervasive Power.
Entre os anos de 2009 e 2011, por sua vez, o Cade analisou 8 casos envolvendo supostas
práticas anticompetitivas de exclusividade.54 Todos os 8 casos foram arquivados, sendo três
49 Os mesmos critérios foram observados pelo Conselheiro Pfeiffer, ao analisar a cláusula de raio imposta nos
contratos celebrados pelo Center Norte S/A - Construção, Empreendimento, Administração e Participação no
Processo Administrativo nº 08012.002841/2001-13, e pelo Conselheiro Luiz Fernando Rigato Vasconcellos, na
análise da cláusula de raio imposta Condomínio Shopping Iguatemi, no Processo Administrativo nº
08012.006636/1997-43.
50 Processos administrativos 08000.013446/1994-60, 08012.007285/1999-78 e 08012.009312/1998-39 e
Averiguações Preliminares 08012.001353/1999-11 e 08012.009784/1998-28.
51 A Averiguação Preliminar 08012.001353/1999-11, foi arquivada pela falta de provas da materialidade da
26
deles mediante a celebração de TCC.55 Em todos esses casos, foi possível depreender que
o Cade seguiu adotando o mesmo padrão probatório delineado acima em seus julgamentos
para a definição de ilicitude de acordos de exclusividade. Alguns casos julgados no período,
entretanto, reforçam alguns aspectos específicos desse padrão probatório e merecem ser
mencionados.
27
escala e de rede; e (iv) a medida em que a exclusividade poderia representar uma verdadeira
barreira à entrada e, logo, promover o fechamento do mercado.
Em 2012, o Cade julgou o primeiro caso envolvendo acordo de exclusividade após o início da
vigência da Lei nº 12.529/2011. Trata-se do Processo Administrativo n.º 08700.003070/2010-
14, que envolveu cláusulas de exclusividade de consignação em pagamento em contratos
celebrados entre o Banco do Brasil e órgãos responsáveis pelo pagamento dos vencimentos
de potenciais clientes dessa modalidade de crédito. O caso foi encerrado com TCC63 e, no
voto que determinou a imposição de medida preventiva no caso, o Conselheiro Marcos Paulo
Veríssimo destacou que, para que determinada cláusula de exclusividade seja considerada
ilícita, é necessário verificar: (i) existência de posição dominante; (ii) exclusão de
competidores como efeito direto e imediato da exclusividade; (iii) ausência de eficiências
como redução de custos de transação e de custos de distribuição, economias de escala,
incentivo à entrada de novos distribuidores mediante garantia de investimento, preservação
da imagem do produto, impedimento da ação de free riders e excessiva concentração de
distribuidores. Além disso, o Conselheiro Marcos Paulo Veríssimo recomendou que a
Superintendência-Geral do Cade (SG/Cade) apurasse denúncias de que outras instituições
financeiras estariam praticando a mesma conduta objeto do referido TCC. A partir de tal
recomendação, foi instaurado o Inquérito Administrativo n.º 08700.010837/2012-23 que, em
junho de 2015, ensejou a instauração de seis novos processos administrativos64, apurando a
celebração de contratos entre bancos e entes públicos quanto à exclusividade na realização
por descumprimento de medida preventiva. Naquele momento, essa era a maior contribuição pecuniária já
estabelecida pelo Cade em julgamento de conduta unilateral.
64 Processos Administrativos 08700.005770/2015-58, 08700.005766/2015-90, 08700.005761/2015-67,
08700.005755/2015-18, 08700.005781/2015-38 e 08700.005759/2015-98.
28
de operações de crédito consignado no pagamento dos servidores. Todos esses casos foram
arquivados, com destaque, em geral, para os seguintes pontos: (i) ausência de poder de
mercado, tanto isoladamente, quanto em joint dominance com outros agentes do mercado,
na maior parte dos casos; (ii) a exclusividade era episódica, sem utilização indiscriminada; e
(iii) incapacidade dos contratos de gerar fechamento de mercado.
Em 2013, por sua vez, o CADE julgou 49 casos envolvendo acordos de exclusividade.
Novamente, os casos de unimilitância envolvendo cooperativas ligadas ao sistema Unimed
ganharam destaque - 44 dos 49 casos (87,88%).65
Em 2013, tramitavam “no Judiciário mais de 397 feitos relativos a condenações impostas pelo
CADE a cooperativas praticantes de unimilitância”.69 Considerando que os primeiros
processos envolvendo a unimilitância foram julgados em 1998, é possível constatar que as
reiteradas decisões condenatórias do Cade apresentavam baixo efeito dissuasório
envolvendo a prática. A partir dessa constatação - e considerando, ainda, que, a partir de
2008 houve uma mudança jurisprudencial nas Cortes Superiores que passaram a considerar
a exigência de exclusividade ilegal70 - o Cade celebrou uma série de TCCs com as
princípios tutelados pelo atual ordenamento jurídico, notadamente à liberdade de contratação, da livre iniciativa e
da livre concorrência.” (REsp 768.118/SC, Rel. Ministro LUIZ FUX, PRIMEIRA TURMA, julgado em 11/03/2008,
DJe 30/04/2008); “A cláusula de exclusividade em tela é vedada pelo inciso III do art. 18 da Lei n. 9.656/98, mas,
ainda que fosse permitida individualmente a sua utilização para evitar a livre concorrência, através da cooptação
de parte significativa da mão-de-obra, encontraria óbice nas normas jurídicas do art. 20, I, II e IV, e do art. 21, IV
29
cooperativas, de maneira centralizada e em conjunto com transações judiciais, encerrando
43 dos 44 casos envolvendo unimilitância que foram julgados no ano de 2013. A única
condenação envolveu uma cooperativa ligada ao sistema Unimed que não havia participado
do acordo coletivo que originou os TCCs mencionados acima, com a adoção do padrão
probatório já consolidado na jurisprudência do Cade.71
Para além dos casos envolvendo a unimilitância, também houve a celebração de TCC no
processo administrativo n.º 08012.003921/2005-10, instaurado pela SDE por recomendação
do Tribunal do Cade, contra Souza Cruz e Philip Morris, a fim de investigar uma possível
exclusividade adotada pela Souza Cruz com pontos de venda após o encerramento da
instrução do já mencionado caso Philip Morris v. Souza Cruz, além da exclusividade de
merchandising e de exposição de produtos adotadas por ambas as empresas.
Todos os outros quatro casos julgados em 2013 envolvendo acordos de exclusividade foram
arquivados.72 O padrão probatório, mais uma vez, não destoa daquele já estabelecido durante
a vigência da Lei n.º 8.884/1994: (ii) análise da possibilidade arrefecimento da concorrência
intramarcas em razão da exclusividade compensado por eficiências como o fortalecimento da
concorrência entre marcas, a proteção contra comportamentos oportunistas e a
compensação por custos de pós-venda e de garantia;73 e (ii) verificação de incapacidade de
promoção de fechamento de mercado por empresa que detém mais de 20% do market share,
mas concorre com grandes empresas nos mercados relevantes afetados pela conduta.74
Entre 2014 e 2020, além dos casos envolvendo acordos de exclusividade entre bancos e
órgãos públicos responsáveis pela folha de pagamento de consumidores de crédito
consignado, já expostos acima, o Cade julgou 14 casos envolvendo acordos de exclusividade,
sendo que três foram encerrados com TCCs75, cinco levaram a condenações76 e os outros
seis foram arquivados77. Em relação aos TCCs, dois deles foram celebrados sem que tivesse
havido qualquer juízo de mérito, ainda que preliminar, em relação à conduta.78 Já no caso do
terceiro TCC, celebrado no âmbito do Inquérito Administrativo nº 08012.009876/2007-79, que
investigava possível prática de exclusividade no fornecimento à IMS, pela ABAFARMA, do
banco de dados que congrega as informações dos distribuidores de produtos farmacêuticos,
o padrão probatório já consolidado na jurisprudência do Cade em relação aos acordos de
exclusividade foi reiterado.
e V, ambos da Lei n. 8.884/94. Portanto, violados pelo acórdão de origem todos aqueles preceitos.” (REsp
1172603/RS, Rel. Ministro HUMBERTO MARTINS, SEGUNDA TURMA, julgado em 04/03/2010, DJe 12/03/2010).
71 Processo Administrativo 08012.007205/2009-35.
72 Averiguação Preliminar 08012.010760/2007-82, Inquéritos Administrativos 08700.005241/2013-92 e
08700.003070/2010-14.
76 Processos Administrativos 08012.003118/2005-85, 08012.012740/2007-46, 08700.009890/2014-43,
08012.007423/2006-27 e 08012.005009/2010-60.
77 Inquéritos Administrativos 08700.010837/2012-23, 08700.006268/2018-15, 08700.004909/2014-65,
08700.000018/2015-11, 08700.007817/2016-07, 08700.000800/2016-11, 08700.006846/2015-62 e Processos
Administrativos 08012.002917/2002-91, 08700.005770/2015-58, 08700.005766/2015-90, 08700.005761/2015-67,
08700.005755/2015-18, 08700.005781/2015-38, 08700.005759/2015-98.
78 Processo Administrativo 08012.006209/2010-30 e Inquérito Administrativo 08700.000018/2015-11 (TCC
celebrado em relação a duas Representadas; inquérito arquivado pela SG em relação aos demais).
30
O padrão probatório do Cade foi também mantido nas decisões pelo arquivamento dos seis
casos julgados no período mencionado.79 Merecem destaque os seguintes critérios avaliados:
(i) existência de um contrato associativo entre as partes para o desenvolvimento de um
empreendimento comum, com compartilhamento de riscos e existência de uma estrutura
comum, o que justificava a exclusividade80; (ii) desistência unilateral e voluntária de
manutenção da exclusividade, após a notificação da instauração do inquérito81; (iii) proteção
dos investimentos realizados nos estabelecimentos que funcionam com exclusividade82; (iv)
limitação da exclusividade em matéria temporal e geográfica83; e (v) substitutibilidade do
produto alvo da exclusividade84.
O teste adotado para essa verificação passou pelas seguintes premissas: (i) verificar a
existência de poder de mercado; (ii) verificar se a conduta impede os rivais de terem a
oportunidade de concorrer; e (iii) verificar inexistência de justificativa legítima para a restrição
adotada. Esses aspectos foram constatados no caso concreto, com destaque para os
seguintes pontos: (i) além de deter posição dominante, a Kibon, marca da Unilever Brasil
Ltda., “é uma “must-carry brand”, com um mix importante de marcas de sorvetes”86; (ii)
existência de exclusividade de fato e de direito; (iii) efeito lock-in a partir da imposição de
31
quantidade mínima de vendas de um produto em determinado lapso temporal; (iv)
exclusividade adotada em pontos de venda com maior expressividade em termos de
faturamento; e (v) comportamento da Unilever, enquanto líder de mercado, desencadeia em
outros agentes a necessidade de impor condições contratuais semelhantes. As eficiências
alegadas pela Unilever não foram suficientes para justificar a razoabilidade da conduta.
32
Por fim, o Inquérito Administrativo nº 08700.004588/2020-47, foi instaurado a partir de
denúncia da Rappi Brasil Intermediação de Negócios Ltda. contra a IFood.com Agência de
Restaurantes Online S.A. e envolve a suposta imposição de exclusividade a restaurantes no
mercado online de comida. A Uber do Brasil Tecnologia Ltda. - administradora de relevante
plataforma que também atua neste mesmo mercado - ingressou como terceira interessada.
Nota-se que este é um dos poucos casos onde houve a concessão de medida provisória,
proibindo o IFood de celebrar novos contratos de exclusividade. Na Nota Técnica que
fundamentou a concessão da medida, a SG destacou que “a potencialidade de as restrições
verticais adotadas pela Representada causarem efeitos prejudiciais à concorrência no
mercado está associada a pelo menos dois aspectos: (i) existência de posição dominante
pelo autor da conduta no mercado de origem; e (ii) existência de efeitos da conduta sobre
parcela significativa ou estratégica do mercado.”90
Com relação às políticas promocionais, a análise dos casos apontados pelo mapeamento
demonstrou que o Cade vem consistentemente considerando, principalmente, dois fatores:
(i) a existência de poder de mercado - presumida a partir de um market share superior a 20%;
e (ii) a possibilidade de exclusão ou criação de dificuldades para acesso de concorrentes ao
mercado afetado pela conduta. A existência de justificativas razoáveis para a prática também
é um dos pontos analisados.
Apesar de a SG adotar a análise padrão para casos de restrições verticais,91 é possível notar
que a autoridade reconhece os possíveis efeitos pró-competitivos de tais políticas e vem se
preocupando mais com os critérios utilizados na concessão dos benefícios. No caso de
programas de descontos, por exemplo, os casos analisados - esmiuçados abaixo -
demonstram que o Cade vem demonstrando preocupação com descontos que são
concedidos a partir de critérios não lineares ou desiguais para os participantes e que possam
induzir à fidelização, levando ao fechamento de mercado.
Alimentos Ltda em desfavor da Kellogg Brasil. A Representada estaria atuando de modo a dificultar o acesso de
concorrentes aos meios de distribuição de cereais matinais mediante propostas de descontos maiores aos
atacadistas e varejistas que se comprometessem a não comercializar produtos de concorrentes. Não houve uma
discussão aprofundada a respeito do padrão de prova, uma vez que, antes disso, a autoridade antitruste entendeu
que não teriam sido identificados indícios de materialidade da suposta conduta e o caso foi arquivado.
33
O Processo Administrativo nº 08000.000128/1995-98, instaurado a partir de denúncia da
Empresa Folha da Manhã em desfavor da S.A. O Estado de São Paulo. A acusação seria
que o O Estado de São Paulo exigiria exclusividade para propaganda publicitária em troca da
concessão de reduções de preço (bonificações). Já no Processo Administrativo nº
08000.16153/1995-8994 a mesma empresa Folha da Manhã havia sido denunciada pelo
DPDE (ex officio), visto que estaria concedendo facilidades de pagamento apenas para
anunciantes diretos, publicando anúncios sem qualquer ônus para estes. Em ambos os
casos, foi aplicada a regra da razão incompleta (i. e., sem o balancing). A conduta foi
considerada ilegal (concorrência desleal em detrimento da concorrência) por bloquear a
renovação do mercado, uma vez que (i) as empresas detinham poder de mercado e (ii) havia
possibilidade concreta de prejuízo à concorrência no caso concreto - em razão da abusividade
da conduta, materializada na "polarização estabelecida pelas duas empresas jornalísticas,
tendo como alvo afastar ou impedir a entrada de novos concorrentes".95
Em 2001, o Tribunal teve a oportunidade de, mais uma vez,96 debruçar-se a respeito de
políticas promocionais envolvendo publicidade e anúncios. Na ocasião, a Empresa Folha da
Manhã S/A havia denunciado o Diário do Grande ABC, por supostamente exigir exclusividade
para propaganda publicitária em troca de reduções de preço e descontos, além de ameaçar
refaturamento para a inserção de publicidade em seu jornal, impedindo, por conseguinte, que
anunciantes procurassem espaço para publicidades no caderno regional da Folha de São
Paulo. Contudo, não houve análise aprofundada da conduta, tendo em vista que a
reconheceu-se a ocorrência de prescrição intercorrente.
O próximo caso julgado pelo Cade envolvendo políticas promocionais ocorreu em 2005, no
Processo Administrativo n.º 08012.001182/1998-31, originado a partir de representação da
Paiva Piovesan Engenharia & Informática Ltda. destinada a apurar práticas cometidas pela
Microsoft Informática Ltda. No que concerne especificamente às políticas promocionais, o
Cade considerou que seria pouco provável que o sistema de descontos da Microsoft para os
seus distribuidores provocasse fechamento de mercado, uma vez que havia “duas dezenas
de outros distribuidores e milhares de revendedores aptos a realizar a comercialização dos
produtos concorrentes”.97
94
Destaca-se que, apesar de ter sido expressamente mencionado em um dos casos analisados, o processo não
foi encontrado a partir do mecanismo de busca disponibilizado pelo Cade. Desta forma, as informações incluídas
no presente relatório levam em consideração o constante no processo administrativo nº 08000.000128/1995-98.
Segundo consta no relatório preparado pelo Conselheiro Relator João Bosco Leopoldino da Fonseca, com relação
aos casos (08000.16153/1995-89 e 08000.000128/1995-98) são “idênticas as matérias neles discutidas e as
partes envolvidas, embora em pólos opostos”, sendo que a decisão apresentada nos autos de final 98 se estende
a ambos os casos.
95 Processo Administrativo nº 08000.000128/1995-98, Voto do Conselheiro João Bosco Leopoldino da Fonseca,
§10.
96 Processo Administrativo 08012.006733/1997-08.
97 Processo Administrativo n.º 0812.001182/1998-31, Voto do Conselheiro Thompson Andrade.
98 Processo Administrativo 08700.000198/2008-10.
34
medicamentos possuiria baixas barreiras à entrada de novos concorrentes, seja em função
do pequeno custo para abrir uma farmácia, seja em razão do breve período de tempo
necessário para atender às exigências regulatórias; e que (ii) como mercado regulado, os
preços de revenda dos medicamentos seriam controlados pelo Estado, o que impossibilitaria
uma precificação arbitrária por parte da representada. Diante disso, concluiu-se pelo
arquivamento.
Embora o processo tenha sido encerrado com a assinatura um TCC, a SG, na nota técnica
que fundamentou a instauração do processo administrativo, analisou a conduta e concluiu
que a lógica por trás da política de desconto da Aperam reduziria as aquisições de seus
distribuidores integrados junto a terceiros. Os descontos concedidos pela Aperam foram
definidos como "estruturas de apreçamento que oferecem preços mais baixos em
contrapartida ao consentimento ou ao compromisso de facto do comprador direcionar grande
parcela de suas necessidades a um determinado vendedor".102 Na oportunidade, concluiu-
se que descontos não-lineares, por serem baseados no percentual do volume de compra do
cliente que é dedicado a uma empresa em relação ao total que adquire do produto e não no
volume adquirido, exigem maior atenção, uma vez que encorajam o comprador a direcionar
suas compras àquele vendedor que lhe oferece descontos, de forma que os concorrentes
a conduta em sua Nota Técnica que fundamentou a instauração do processo administrativo, datada de 16.07.2013.
102 Processo Administrativo nº 08700.010789/2012-73, Nota Técnica nº 254/2013, §87.
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restam excluídos da análise do comprador. O objetivo do desconto não-linear é cativar a
demanda do cliente, ou seja, "fidelizá-lo". Dessa forma, a SG pontuou que, diferentemente
dos descontos por quantidade, que dependem exclusivamente do volume de compra
efetuado junto ao produtor, o desconto de fidelidade tende a impedir que o cliente compre
junto a produtores concorrentes, devido à concessão de uma vantagem financeira. Em
conclusão, a SG afirmou que a forma de estruturação dos descontos e o fato de que a
representada era a única fabricante do produto no país resultariam num forte incentivo para
a exclusividade dos distribuidores, que são os maiores do mercado brasileiro, havendo fortes
indícios de que o objetivo do programa de descontos fosse evitar as importações, em prejuízo
da livre concorrência, na medida em que as importações seriam a única pressão competitiva
enfrentada pela Aperam.
A análise mais recente realizada pelo Cade identificada no mapeamento envolvendo políticas
promocionais foi realizada em 2019. O Procedimento Preparatório nº 08700.005134/2018-79
foi instaurado de ofício pelo Cade e visa analisar o programa de fidelização com foco no varejo
de materiais de construção da Tigre, que consistia no incentivo a acumulo de pontos por
lojistas a partir da venda de produtos do portfólio da Tigre. Desta forma, a dinâmica do produto
poderia “incentivar lojas a ampliarem artificialmente suas vendas de produtos Tigre, o que
poderia configurar uma prática discriminatória por meio das condições operacionais de venda,
potencialmente capaz de gerar efeitos anticompetitivos.”104 A SG concluiu pelo arquivamento
do PP, tendo em vista que: (i) a prática ocorreu numa fase de testes do programa, durante
período bastante limitado; (ii) as recompensas oferecidas aos lojistas não foram de cunho
financeiro; (iii) o número de clientes que pontuaram sob o critério adotado foi baixo e (iv)
houve oscilações negativas, no decorrer do tempo, de clientes que pontuaram no Programa.
Não foi possível, portanto, concluir que houve efeitos condizentes com uma conduta
anticoncorrencial nos critérios programa, durante o período analisado.
O mapeamento também identificou alguns outros casos que tratam de políticas promocionais
e que ainda estão sob análise do Cade.
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de sementes); (c) objetivos qualitativos (atividades de desenvolvimento de mercado).
Segundo a SG, haveria uma classificação do multiplicador em categorias, cada uma com
valores de royalties distintos: (i) com base na proporção da área cultivada com cultivares
Monsoy em relação à área cultivada total; (ii) a área cultivada com cultivares IPRO Monsoy
em relação à área cultivada total com cultivares IPRO (peso dois); e (iii) a área cultivada com
cultivares IPRO Monsoy em relação à área total cultivada com cultivares Monsoy. Os
descontos não eram concedidos com base apenas objetivamente na área ou volume
multiplicados pelo multiplicador, nem eram iguais para todos os multiplicadores em situações
semelhantes (que multiplicam o mesmo volume), tendo em vista que a fórmula para
concessão dos descontos cria incentivos para que os multiplicadores aumentem a
participação das sementes Monsoy em relação ao total de sementes que multiplicam; e o
gatilho de volume também não é estabelecido da mesma forma para todos os multiplicadores,
mas é específico para cada um e é baseado na capacidade de multiplicação e na participação
de Monsoy e de Intacta de cada multiplicador
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A conduta de fixação de preço de revenda está expressamente prevista no rol exemplificativo
do artigo 36, da Lei 12.529/2011, sendo que o §3º, inciso IX, do mencionado dispositivo
considera conduta anticompetitiva “impor, no comércio de bens ou serviços, a distribuidores,
varejistas e representantes preços de revenda, descontos, condições de pagamento,
quantidades mínimas ou máximas, margem de lucro ou quaisquer outras condições de
comercialização relativos a negócios destes com terceiros”.
Para fins deste relatório, serão analisadas as práticas unilaterais de imposição de preços de
revenda, ou seja, quando um fabricante ou fornecedor impõe a sua rede de revendedores,
distribuidores ou concessionários preços para a revenda de seus produtos ou serviços. Esta
conduta diferencia-se, no que se refere ao seu padrão de análise, da indução à conduta
uniforme e das demais práticas descritas no mesmo dispositivo legal (embora, muitas vezes,
a investigação inclua estas práticas combinadas).
O Cade entendeu que a conduta em questão era mera sugestão de preços e não imposição,
tendo em vista que: (i) não havia condições estruturais para que a Representada exercesse
domínio de mercado, capazes de obrigar as revendedoras a seguir sua política (ou
sugestões) de preços; (ii) não se verificou a existência de dispositivos contratuais ou acordos
que obrigassem os distribuidores a exporem as tabelas de preços sugeridas ao consumidor;
e (iii) o comportamento dos preços não só não seguiu tendência uniformizante, como também
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apresentou significativa dispersão. Além disso, a sugestão de preço teria função pedagógica,
ou seja, de informar aos consumidores sobre os preços justos, mas deixando o varejista livre
para decidir que preço iria aplicar.
No mesmo ano do processo da Kibon, foi instaurado um outro processo de idêntica natureza,
igualmente decorrente de representação do Sindicato da Indústria de Panificação e
Confeitaria de São Paulo, em face da empresa brasileira produtora dos sorvetes Yopa, a qual,
na época, era concorrente da Kibon. O CADE manteve o mesmo entendimento do caso da
Kibon e concluiu pela configuração de sugestão de preço de revenda e consequente
arquivamento do feito108.
O mercado de editoração de livros também foi investigado pelo Cade no que se refere à
possível conduta de fixação de preço. Em 1995, o Cade instaurou processo em face de uma
distribuidora exclusiva de certas editoras, alegando que as editoras seriam responsáveis pela
elaboração da tabela de preços praticada pela distribuidora ao consumidor final. O Cade
realizou análise com base na regra da razão e concluiu pelo arquivamento, pois a conduta
limitava-se à disponibilização pela distribuidora aos consumidores da lista de preços
elaboradas pelas editoras e não houve tipificação da “imposição”: de fato, a editora previa o
chamado “preço de capa”, em cumprimento ao disposto na Lei dos Direitos Autorais (Lei
9.610/1998)109, mas as livrarias podiam oferecer descontos na revenda aos consumidores.
Em um primeiro momento, a SDE entendeu que não foi comprovado o poder de mercado da
Fiat no caso. O Tribunal Administrativo, no entanto, entendeu que, no segmento da
distribuição, como o concessionário não tem alternativas e fica preso à marca, a Fiat deteria
poder de mercado. Ou seja, o poder de mercado da montadora seria independente de sua
participação de mercado na venda de veículos. Além disso, a materialidade das condutas
estaria provada em excertos contratuais. Contudo, a análise não pôde prosseguir, em razão
de falhas na instrução processual, que não permitiram a comprovação dos efeitos das
condutas.
A Conselheira-Relatora Lucia Helena Salgado entendeu que a conduta poderia gerar efeitos
anticompetitivos, mas, como a representação foi apresentada muito tempo após a conduta,
sem que houvesse adequada investigação sobre as condutas, e parte das condutas
decorriam da antiga redação da Lei n.º 6.729/79, decidiu pelo arquivamento. Entretanto,
diante da possibilidade de exercício de práticas anticoncorrenciais em contratos de
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concessão, ela determinou que o Cade fizesse um estudo detalhado sobre o segmento de
distribuição, com enfoque na relação montadora/concessionária.111
Também em 1996, foi instaurado o primeiro processo referente à suposta conduta derivada
da relação entre distribuidoras e revendedores de combustíveis. Diferentemente dos futuros
casos envolvendo a antiga Shell que serão mencionados adiante, este primeiro caso é uma
representação do Sindicato do Comércio Varejista de Derivados de Petróleo do Estado de
Pernambuco contra algumas distribuidoras de petróleo, sob a alegação de que elas estariam
incentivando as revendedoras de sua propriedade a ofertarem descontos nos preços finais
dos combustíveis114. Nesta ocasião, o Cade decidiu pelo arquivamento, uma vez que o
incentivo das distribuidoras às revendedoras, próprias ou de terceiros, a ofertarem descontos
nos preços finais dos combustíveis visava estimular a concorrência, beneficiando o
consumidor final.
111 Em 1999, foi instaurada a Averiguação Preliminar n.º 08012.006532/1999-18, a partir de representação em
que a Nova Texas Veículos Ltda. acusava o Grupo Fiat de impor a utilização de preços de frete superiores aos
preços do mercado - conduta que pode ser equiparada à fixação de preço de revenda. No entanto, na visão do
Tribunal do CADE, nos termos do voto do Conselheiro-Relator Fernando de Oliveira Marques, a matéria não
atrairia a incidência da Lei n.º 8.884/94, já que seria uma demanda de natureza inteiramente privada. O caso,
então, foi arquivado.
112 Processo Administrativo 08000.000146/1996-55.
113 Averiguação Preliminar 08000.009882/1997-41.
114 Processo Administrativo 08000.019459/1996-96.
115 Averiguação Preliminar 08012.004258/2000-02.
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Em 2005, foi instaurada uma Averiguação Preliminar - posteriormente convertida em Inquérito
Administrativo - em face da Monsanto do Brasil Ltda. e Monsoy Ltda.116, devido à
representação apresentada pela MSW Comércio e Representação de Produtos
Agropecuários Ltda. e Wellington Vieira Pereira, segundo a qual a Monsanto estaria impondo
preço de venda de seus produtos, sob pena de multa aos distribuidores que desrespeitassem
as tabelas de valores enviadas mensalmente pela representada. Na análise do caso,
destacou-se que, para configuração da conduta de fixação de preço de revenda, seria
necessário comprovar que (i) havia algum tipo de mecanismo de coerção nas tabelas de
sugestão de preços apresentadas aos seus distribuidores; (ii) as tabelas sugestivas tenham
sido editadas por pedido ou interesse dos próprios distribuidores. Nenhum destes dois
elementos foram comprovados, motivo pelo qual o Inquérito Administrativo foi arquivado pela
SG.
Em 2008, foi instaurada Averiguação Preliminar117 para apurar suposta fixação de preços
mínimos pela Everest Refrigeração e Indústria Ltda. aos seus revendedores no mercado de
filtros, bebedouros e purificadores. Em análise com base na regra da razão, o Cade decidiu
pelo arquivamento devido à ausência de condições estruturais (ausência de restrições
territoriais para revenda, fidelidade a marcas e exclusividade) e pela existência de eficiências
(evitar free-riders). Portanto, apesar de a Representada possuir poder de mercado, concluiu-
se pelo arquivamento. Este caso é relevante, pois é o primeiro precedente em que se discute
especificamente a conduta de fixação de preço de revenda.
No mesmo ano, foi instaurado uma nova Averiguação Preliminar118 referente ao mercado de
bebidas, desta vez Ambev. Da mesma forma que nas investigações em face da Brahma, o
Cade decidiu pelo arquivamento por tratar-se de lide privada. Em relação especificamente à
conduta de fixação de preço de revenda, o voto do Conselheiro-Relator destaca que as
preocupações concorrenciais podiam ser afastadas pelos seguintes motivos: (i) os preços
eram apenas sugeridos; (ii) referiam-se apenas a preços máximos e (iii) não havia evidência
de cartelização. Portanto, a decisão continua alinhada com os precedentes anteriores no
sentido de diferenciar sugestão de fixação de preço de revenda, bem como preços mínimos
de preços máximos.
Em 2012, foi instaurado Processo Administrativo119 para investigar imposição pela Bematech
de política de preços mínimos ao distribuidor Fagundez (Política Comercial que previa esta
possibilidade). A Nota Técnica da SDE de Instauração explica que o caso refere-se à fixação
de preço de revenda e que a regra de análise deveria ser a regra da razão. Segundo a SDE,
havia indícios de sanções aos revendedores que não cumprissem o preço, visto que a
denúncia era originada de um revendedor. A SDE considerou relevante a existência de
posição dominante da Bemarch em um mercado concentrado, o que fazia com que a empresa
pudesse restringir a concorrência (intramarca e intermarca). A coerção foi considerada um
elemento central para diferenciação da tipificação entre a sugestão (posição do Tribunal) e a
fixação (posição da SDE). A Representada celebrou um TCC em que se comprometeu a
alterar a sua Política Comercial de forma a abster-se de sugerir ou divulgar preços mínimos
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de revenda de impressoras fiscais aos clientes. Não houve recolhimento de contribuição
pecuniária, reconhecimento de culpa e nem colaboração tendo em vista a baixa probabilidade
de exercício de poder coordenado. O Voto do Conselheiro-Relator Alessandro Octaviani Luis
no TCC120 deixa claro o entendimento de que seria um caso de sugestão e não fixação de
preço de revenda, uma vez que não havia indícios de penalização das empresas que não
cumprissem o quanto recomendado.
A primeira condenação e o caso mais paradigmático sobre fixação de preço de revenda foi o
caso SKF121. O caso foi julgado em 2013 e a decisão final, obtida em julgamento por cinco
votos a dois. Além de ter sido uma condenação, o caso é relevante por ter representado uma
mudança de entendimento do Tribunal, que até o momento estava analisando as condutas
sob a regra da razão e entendendo que elas configurariam sugestão de preço de revenda ou
indução à conduta uniforme. Neste caso, a conduta foi considerada um ilícito por objeto, nos
termos do voto do Conselheiro-Relator Vinícius Marques de Carvalho, que determinou a
inversão do ônus da prova, ou seja, haveria uma presunção relativa de ilicitude da conduta
de fixação de preços, cabendo ao representado demonstrar: (i) a inviabilidade da conduta por
ausência de poder unilateral ou coordenado e (ii) eficiências plausíveis que não pudessem
ser obtidas por outra forma. O Voto do Conselheiro-Relator concluiu pela existência de poder
de mercado da Representada no mercado de rolamentos, mas também afirmou que a prática
de fixação de preço de revenda independe da participação das partes. Outros pontos
considerados para a conclusão pela condenação foram: (i) ausência de prova de existência
de eficiências (a prática durou um período curto, o que comprova que não era essencial ao
negócio); e (ii) verificação de elementos que possibilitam o exercício do poder coordenado no
mercado de rolamentos.
Além da condenação da SKF, há apenas mais duas condenações por fixação de preço de
revenda, ambas relacionadas ao mercado de revenda de combustíveis.
O primeiro caso122, julgado em 2014 pelo Cade, refere-se à suposta prática de fixação de
preço de revenda pela distribuidora Shell e dois gerentes comerciais à época nas cidades de
Bauru (SP) e Marília (SP). O Tribunal decidiu, por maioria, pela condenação, nos termos do
voto do Conselheiro Márcio de Oliveira Júnior. Segundo o voto, haveria inversão do ônus da
prova nos casos de fixação de preço de revenda, de forma que os representados deveriam
apresentar eficiências que superassem os efeitos anticompetitivos da conduta. Como ponto
de partida, ele definiu que a Shell possuía poder de mercado nas duas cidades. Interessante
notar que o voto considerou que o poder de mercado não estava baseado apenas no índice
de participação de mercado, mas também em outros fatores (histórico de ilicitude no setor e
influência dos postos Shell).
Ao final, afirmou que a análise deveria ser pela regra da razão e conclui pela condenação,
com fundamento nos seguintes fatores: (i) ausência de eficiencias; (ii) tipificação da conduta
de imposição – não apenas de sugestão – devido à existência de mecanismo de coerção; (iii)
possibilidade do controle do serviço ofertado e, consequente, da proteção da marca ser feito
a partir de fiscalizações de qualidade do combustível (sem interferência no preço). Como
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consequência deste processo, está em trâmite no Cade uma nova investigação123 para
melhor apurar eventuais práticas concorrenciais, como a fixação de preço de revenda, entre
Raízen e seus distribuidores franqueados e não franqueados.
Em 2017, destaca-se o TCC firmado pela Seasub Artigos Esportivos para encerrar
investigação no mercado de equipamentos de mergulho, ainda em sede de procedimento
preparatório125, referente à divulgação de Política Comercial aos revendedores com
imposição de preços mínimos de revenda.
Por fim, cumpre ressaltar que práticas que possam possivelmente ser tipificadas como fixação
de preço de revenda têm sido alvo de Consultas apresentadas ao Cade, as quais, respeitados
os limites de uma decisão em sede de Consulta em comparação à decisão em processos,
têm trazido orientações consideradas relevantes. Em primeiro lugar, destaca-se a consulta
apresentada pela Continental127, em 2018, referente à licitude de uma Política de Preços
Mínimos Anunciados (PMA) que pretendia implementar nos mercados de reposição de pneus
comerciais e de passeio.
Neste caso, o Tribunal decidiu pela licitude da prática, nos termos do Voto do Conselheiro-
Relator Paulo Burnier, que destacou os seguintes aspectos como relevantes para a
conclusão: (i) ausência de poder de mercado unilateral ou coordenado; (ii) unilateralidade da
política de preços mínimos (ausência de indícios de cartelização); e (iii) ausência de
condições discriminatórias entre revendedores (por exemplo, pontos de venda físicos e
canais online). Mais recentemente, em 2021, o Tribunal Administrativo também considerou
lícita uma política de negociação de preços inteligente (via algoritmos) a ser adotada pela
Ipiranga em relação aos seus revendedores128. Alguns aspectos considerados relevantes
para que a prática fosse considerada lícita foram: (i) imposição unilateral da política de preços;
(ii) tipificação de sugestão de preços: (iii) estabelecimentos apenas de preços máximos; (iv)
política individualizada a cada revendedor.
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