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MESTRADO EM CIÊNCIAS DA EDUCAÇÃO | Música

A DESMOTIVAÇÃO DOS ALUNOS QUANDO NÃO


PERCEBEM A APLICABILIDADE DAS APRENDIZAGENS

Isabel Silva, Vitor Lima

UNIDADE CURRICULAR PSICOLOGIA DA EDUCAÇÃO

PROFESSORA LURDES VERÍSSIMO

PORTO

fevereiro 2012
Mestrado em Ciências da Educação | Ensino

INTRODUÇÃO..................................................................................................................................... 3

REVISÃO DA LITERATURA.............................................................................................................. 3

MOTIVAÇÃO COGNITIVA................................................................................................................. 7

ESTRATÉGIAS DE REGULAÇÃO MOTIVACIONAL...................................................................10

CONCLUSÃO...................................................................................................................................... 11

BIBLIOGRAFIA................................................................................................................................. 12

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Introdução

O problema por nós identificado prende-se com a falta de motivação de alguns


alunos da Academia de Música de Viana do Castelo quando não percebem a
aplicabilidade das aprendizagens. Procuramos refletir sobre teorias de motivação
cognitiva e de que forma estas podem fundamentar a utilização de estratégias de ensino
que possam promover o rendimento escolar dos alunos.

Revisão da Literatura

Analisando os fatores que levam a um aumento ou diminuição da motivação nos


alunos e à sua influência no processo de ensino aprendizagem, vemos que esta tem um
papel importantíssimo na procura de conhecimento e nos resultados atingidos pelos
alunos. Alunos desmotivados evitam desafios, desistem facilmente, usam repetidamente
as mesmas estratégias, mostram-se aborrecidos, deprimidos, ansiosos ou irritados e não
aproveitam as oportunidades. Pelo contrário, alunos motivados são capazes de aprender
mais, articular estratégias de resolução de problemas, são mais ávidos e demonstram
entusiasmo, curiosidade e interesse, sentem-se mais autoconfiantes, fazem percurso

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escolar mais longo, utilizam estratégias cognitivas e metacognitivas e fazem


aprendizagens mais profundas. Contudo, “a importância relativa dos diferentes tipos de
motivação (cognitiva, homeostática, material, de engrandecimento do ego, aversiva e
afiliativa) variam dependendo do tipo de aprendizagem envolvida, da espécie a que
pertence o aluno e do seu nível de maturação.” (Ausubel; Novak & Hanesian, 1980,
p.333).

Todos nascem com a curiosidade e vontade de aprender, ao que Jerome Bruner


chama de motivação intrínseca. É também o impulso que nos permite adquirir

competências e desenvolver capacidades. Por último, a motivação intrínseca envolve


reciprocidade, traduzindo-se numa necessidade inerente às espécies, de interagir

cooperativamente. Os motivos intrínsecos são aqueles que são satisfeitos por reforços
internos, não estando dependentes de objetivos externos. Ao contrário, os motivos
extrínsecos dependem de necessidades que têm que ser satisfeitas por reforços externos.

A par desta motivação intrínseca, surge uma motivação externa ao indivíduo


que se traduz na atribuição de recompensas pelo esforço desenvolvido no alcance de um
objetivo final ou na realização de uma tarefa. Referir que esta motivação extrínseca é
importante nos primeiros anos da vida escolar do aluno e deverá acompanhar a
motivação intrínseca, contudo durante o percurso académico é desejável que os reforços
externos sejam menores e que o aluno seja capaz de desenvolver mecanismos internos
de auto-motivação. (Harlow, 1997)

Thorndike validou experimentalmente, no início do século XX, a ligação entre


motivação e aprendizagem, através da lei do efeito. “A aprendizagem, segundo
Thorndike, é fortalecida quando é seguida de um estado de coisas satisfatório –
satisfatório, claro, para o aluno.” (Sprinthall & Sprinthall, 1990, p.503). As variáveis
motivacionais e emocionais desempenham um papel bastante relevante no sucesso
académico, pelo que, a motivação nunca atua separada nem da aprendizagem nem da

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perceção. Existe uma interligação entre estes três elementos, influenciando-se


mutuamente. Não só a motivação afeta a aprendizagem, mas esta também exerce
interferência na anterior. É importante ter presente o fato de que o comportamento dos
alunos na busca do conhecimento pode ser desenvolvido ou por motivações intrínsecas
ou extrínsecas, mediante as características do indivíduo. A motivação intrínseca quando
presente no indivíduo, desenvolve-se por si mesma, aumentando a vontade de
desenvolver novos esforços para alcançar o conhecimento. “As pessoas que são
motivadas intrinsecamente numa certa área fazem um esforço especial para procurar
situações ainda mais desafiantes.” (Sprinthall & Sprinthall, 1990, p.509). Transpondo
esta ideia para o contexto escolar, sabemos que os alunos motivados são capazes
também de desenvolver esforços maiores na procura e assimilação do conhecimento,
como tal, nos alunos desmotivados há que procurar as causas dessa desmotivação para
podermos desenvolver estratégias que aumentem a motivação intrínseca e extrínseca
dos alunos.

No que respeita ainda à influência da motivação no processo de ensino


aprendizagem, Bruner (1990) defende a ideia de que a aprendizagem será mais
duradoura quando sustentada pela motivação intrínseca. Estas são por si próprias
recompensadoras e por isso autossuficientes. Contudo, a motivação extrínseca pode ser
necessária para obrigar o aluno a iniciar certas atividades ou para começar e ativar o
processo de aprendizagem.

A partir do momento em que os alunos estão intrinsecamente motivados, têm


tendência para atribuir a si próprios a causa da sua atividade, mostrando-se
autodeterminados. Se estão extrinsecamente motivados, a causa da sua atividade parece-
lhes externa e, consequentemente, sentem-se menos autodeterminados, diminuindo a
motivação intrínseca. Esta é resultante de dois sentimentos: a competência reconhecida
e a autodeterminação. O interesse diminui com o constrangimento e com um ensino de
estilo controlador. A teoria da autodeterminação é um modelo que salienta três
necessidades básicas: competência, autonomia e pertença. A necessidade de
competência refere-se ao desejo de dominar e ser competente nas interações com o
meio. A necessidade de autonomia reflete o desejo de assumir o controlo ou de se sentir

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autónomo ou autodeterminado no que toca às atitudes do indivíduo. A necessidade de


pertença reflete o querer pertencer ou estar associado a um grupo.

Um outro autor a debruçar-se sobre a teoria da motivação foi Abraham Maslow,


ao sugerir que existe uma ordem definida através da qual os indivíduos procuram
satisfazer as suas necessidades fisiológicas, de segurança, de amor, de estima e
autorrealização. Contudo, o mesmo autor refere que os indivíduos não alcançam da
mesma forma a satisfação de todas as necessidades pelo que muitos deles nem
sepreocupam em satisfazer as que se encontram no topo da hierarquia pois não
conseguiram satisfazer ainda as necessidades básicas.

Os motivos sociais são particularmente relevantes, pois moldam o


comportamento humano. Aspetos como a necessidade de aprovação social é algo que
adquirimos na infância, ao associarmos os sons dos adultos a comportamentos de
aprovação ou reprovação.

Pirâmide de Maslow

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MOTIVAÇÃO COGNITIVA

De entre as várias teorias da motivação existentes, parece-nos importante


salientar duas relativas ao autoconceito de inteligência, a Teoria Incremental e a Teoria
da Entidade, desenvolvidas por Carol Dweck, por se direcionarem mais diretamente
com a questão que nos propusemos abordar.

A Teoria Incremental caracteriza-se por os alunos acreditarem que o sucesso na


aprendizagem vem do seu esforço e trabalho, ao longo do tempo e com a experiência.
Para estes alunos, os insucessos ou problemas no processo de aprendizagem, resultam
de falta de trabalho ou esforço e de estratégias inadequadas às tarefas propostas. Esta
atitude faz com que os alunos se sintam mais motivados para trabalhar e interpretar os
desafios do processo de aprendizagem.

A Teoria da Entidade, por sua vez, mostra-nos que os alunos acreditam que as
suas capacidades e inteligência são estanques, inalteráveis. Face ao insucesso,
consideram não ter aptidões ou inteligência suficientes, o que leva a ponderarem a
pertinência da continuidade de determinada aprendizagem, ou seja, o esforço é visto
como um reflexo negativo da falta de aptidões.

Consideramos que no contexto do ensino especializado da música, é possível


identificar estas duas teorias no quotidiano académico dos nossos alunos. A estruturação
dos cursos, com caráter profissionalizante e orientados para a formação de solistas, os
currículos, o elevado número de horas de estudo individual necessárias e a exigência das
apresentações em público, são fatores que podem potenciar a desmotivação nos alunos
que se revêm na Teoria da Entidade.

A falta de perceção dos alunos relativamente à interligação dos saberes das


várias disciplinas e sua importância, o não atribuírem relevância a determinado tipo de
tarefas específicas das disciplinas (elementos que por si só não constituem um produto
final mas que são fundamentais para a construção de um todo), são por si fatores que
podem contribuir para o afastamento e desmotivação do aluno quanto ao contexto de
aprendizagem global. O papel do professor junto destes alunos é importante no sentido
de perceber e descodificar as razões que levam a esta atitude desistente, adaptar

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mecanismos de ação aos diferentes contextos de aprendizagem, e ao mesmo tempo ser


criativo nas respostas dadas.

 O que motiva os alunos nas salas de aula?


Entre outros parâmetros, o valor atribuído àquilo que se aprende é um agente de
motivação dos alunos. Embora o interesse e a motivação intrínseca motivem os alunos a
aprender, o facto de estes acharem que a tarefa proposta é importante ou tem alguma
utilidade, é um factor a ter em conta.

Brophy sugeriu a importância de criar tarefas e atividades que os alunos considerem


úteis, com sentido, e relevantes a nível pessoal, e que lhes permitam identificar-se com
o conteúdo. O autor refere que o princípio da identificação pessoal, apesar de necessitar
de suporte empírico, realça o tema da investigação multidisciplinar, que pretende

integrar a investigação na área das componentes sociocognitivas básicas da motivação


(eficácia, controlo, interesse, valor e objetivos) e outras construções na área da
psicologia da personalidade e da psicologia social, assim como da antropologia e da
sociologia.

 Como é que os alunos obtêm aquilo que querem?

Uma vez que as necessidades básicas originam interesses, valores e objetivos, como
é que o indivíduo traduz na prática os mesmos? Uma das formas de abordar esta questão
envolve os modelos da autorregulação para descrever a planificação, a monitorização, o
controlo e a regulação do conhecimento, motivação e comportamento ao serviço dos
objetivos do indivíduo.

 De que forma se altera e desenvolve a motivação?

O autor salienta quatro pontos fundamentais para responder a esta questão, citando
Wigfield e Eccles:

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1. De que forma as crianças e adolescentes compreendem as estruturas


motivacionais e de que forma o significado das mesmas se altera consoante a
idade do indivíduo e ao longo do tempo?

2. De que forma estas estruturas motivacionais se tornam mais diferenciadas e


complexas consoante a idade do indivíduo?
3. De que forma o nível e a qualidade da motivação se altera ao longo do tempo?
4. De que forma as relações entre motivação e diferentes resultados variam e de
que forma as relações entre fatores contextuais e motivação se alteram com o
desenvolvimento?

Relativamente às duas primeiras questões, o autor afirma que os significados que os


alunos atribuem à motivação tornam-se mais diferenciados ao longo do tempo,
acompanhados por uma compreensão mais complexa de noções como capacidade,
esforço, inteligência, interesse e valor. Quanto à terceira questão, o autor refere haver

provas empíricas de que durante a idade escolar, a motivação dos alunos tende a
declinar ou a tornar-se menos flexível, evidenciando uma grande queda nos anos
escolares centrais.

Concluindo, o autor refere que a ciência da motivação fará progressos enquanto se


continuar a procurar responder às questões apresentadas acima. Quanto melhor se
perceber estas questões, melhor se entende a motivação dos alunos e melhor se criam
situações de aprendizagem na sala de aula. É importante ter em conta que estes
princípios têm sempre que ser adaptados às possibilidades e constrangimentos das
diferentes salas de aula, escolas, comunidades e contextos culturais, e também
dependem da criatividade dos docentes envolvidos.

“A motivação é, pois, o conjunto dos mecanismos biológicos e psicológicos que


permitem o desencadear da ação, da orientação (na direção de um objetivo, ou, pelo
contrário, para se afastar dele) e finalmente da intensidade e da persistência: quanto
mais se está motivado maior é a atividade e mais persistente”. ( Lieury & Fenouillet,
1997, p. 9).

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ESTRATÉGIAS DE REGULAÇÃO MOTIVACIONAL

Apresentamos de seguida alguns mecanismos e estratégias que podem levar os


alunos a melhor entender a função e os objetivos das matérias para as quais não
vislumbram aplicabilidade:

 os professores deverão ajudar os alunos a atingir níveis elevados de eficácia na


aprendizagem, centrando a sua atenção no que é necessário fazer (processo) para
dominar uma tarefa ou resolver um problema, desconstruindo a ideia de que o
alcance de metas depende das capacidades ou talentos inatos;
 fornecer feedback apropriado quando os alunos são bem sucedidos ou quando
falham; quando os alunos não atingem os objetivos, é importante que se façam
críticas construtivas, centradas naquilo que os alunos precisam de mudar no
processo e como se podem operar essas mudanças – “abordar o insucesso desta
forma ajuda os alunos a adotarem uma perspetiva construtiva de auto-eficácia “
(Cardoso, 2004, p. 14); quando os alunos são bem sucedidos, o professor deve
reforçar e elogiar o esforço dispendido e as estratégias utilizadas pelo aluno,
destacando como estas contribuíram para o seu sucesso, ou seja, deve valorizar o
processo;
 perceber os interesses individuais dos alunos e adaptar o programa, dentro do
possível, aos mesmos;
 recorrer a músicos profissionais para relatarem as suas experiências e
fundamentarem as suas práticas, de forma a fazer uma ponte entre os conteúdos
teóricos e técnicos lecionados e a performance musical;
 implementar cada vez mais planificações integradas que promovam a articulação
dos saberes.

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CONCLUSÃO

É um dado adquirido que alunos motivados desenvolvem aprendizagens mais


significativas. A desmotivação causada pela não perceção clara, por parte dos alunos, da
aplicabilidade dos conteúdos lecionados no ensino especializado da música, pode ser
contornada por meio de vários agentes motivacionais. Contudo o professor ocupa um
lugar privilegiado ao nível da implementação de estratégias que possam inverter esta
situação. A delineação de estratégias para este propósito passa por um conhecimento
profundo do aluno no que toca às suas motivações intrínsecas, aos seus interesses.

“(…)os benefícios de se aprender a valorizar o esforço, a reduzir a carga


negativa do erro, e de aprender a usar os mecanismos de regulação motivacional,
vão para lá do sucesso na aprendizagem musical. Estes poderão afectar também
a forma como a criança aprende em outras disciplinas, em outros contextos
escolares, e poderão modificar a forma como as crianças se vêem a si mesmas, a
sua auto estima e o seu conceito de auto eficácia. Desta forma, a aprendizagem
musical pode ajudar a criança a crescer, quer musicalmente quer como ser
humano.” (Cardoso, 2007, p. 14)

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BIBLIOGRAFIA

 Arends, R. I. (2008). Aprender a Ensinar (7ª Ed.). Lisboa: McGraw Hill


 Ausubel, Novak & Hanesian (1980) Psicologia Educacional: Rio de
Janeiro: Interamericana
 Cardoso, F. (2007). Papel da motivação na aprendizagem de um
instrumento. Revista de Educação Musical, 127, 11-14.
 Sprinthall, A. & Sprinthall, R. (1993). Psicologia Educacional. Lisboa:
McGraw-Hill.
 Lieury, A. & Fenouillet, F. (1997). Motivação e Sucesso Escolar. Lisboa:
Editorial Presença.
 Pinto, A. (2004). Motivação para o estudo da música: factores de
persistência. Revista Música, Psicologia e Educação, 6, 33-43.
  Pintrich, P. R. (2003). A motivational science perspective on the role of
student motivation in learning and teaching contexts. Journal of Educational
Psychology, 95, 667-686.
 Sousa, R. (2003). O abandono no ensino especializado em Portugal. Revista
de Educação Musical, 117, 19-28.

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