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Fernando Pessoa - Ortónimo

“Autopsicografia”- Fingimento artístico


O título do poema divide-se em 3 partes: auto (dele próprio), psic
(interior do SP) e grafia (escrita). É a descrição da própria alma.
O poeta finge uma dor que não coincide com a dor sentida na
realidade. A criação poética assente no fingimento, pois um poema
não traduz aquilo que o poeta sente, mas sim o que imagina a partir
do anteriormente sentido.
Os leitores, ao lerem o poema, sentem uma dor, mas não é a dor que
o poeta sentiu nem a que escreveu, é a dor que neles próprios é
provocada pelo poema.
O ponto de partida para a escrita de um poema é a dor sentida,
segue-se a dor recriada (transformada pela imaginação) e originando
uma nova dor.
Há uma primeira dor (dor sentida, real), uma segunda (dor pensada)
e uma terceira (dor lida).
O poeta é um fingidor – tese. É este o seu ofício. A terceira pessoa
sugere universalidade. Fingir é escrever sobre o momento em que
sentiu. Há um desfasamento temporal onde racionaliza. Fingir é
racionalizar o sentimento.
Na terceira estrofe, o SP explica que, da mesma maneira que um
comboio não pode sair dos carris, pois necessita deles, também a
razão e o coração (emoção) são inseparáveis, há uma dependência
entre os dois. O SP compara a relação entre a razão (pensamento) e
o coração (sentimento) com um brinquedo.
O coração é a fonte dos pensamentos e das emoções. O sente e o
pensamento intelectualiza o que é sentido, racionalizando-o.
“Isto”- Fingimento artístico
O poeta, através do título do poema, pretender explicar que a
justificação que dá para o facto de não mentir quando escrever é
muito simples: apenas “isto”. (simplicidade)
O poeta finge, não mente. Para criar poesia, sente com a imaginação,
sendo a emoção filtrada por esta. Fingir, segundo o SP é sentir com a
imaginação, mentir será, por isso, sentir apenas, usando unicamente
o coração, os sentimentos. O poeta parte do que sente, mas recria o
sentimento através da razão, afastando-se do que inicialmente
sentiu.
O SP sonha (anseios), passa (vivências), falha (insucessos) e finda
(fugacidade da sua vida).
A realidade que envolve o SP é apenas a “ponte” para “outra coisa”:
o texto é o ponto de partida para o sonho (metáfora). Aquilo que
está além do mundo terreno, o que se encontra no mundo superior,
a que se acede por meio do intelecto, é que o poeta deve alcançar,
até porque esse é o espaço da perfeição. A verdadeira beleza reside
no ato de escrever.
Com a interrogação retórica final, o SP remete o “sentir” para o
leitor. Ordena, ironicamente, que o leitor se limite a sentir sem
utilizar a razão. Adquire ao leitor um sentido de inferioridade
relativamente ao poeta (como se o leitor fosse incapacitado de usar
a razão).

“Ela canta, pobre ceifeira” – Dor de pensar


- Estrofes 1 a 3: descrição da ceifeira e do seu canto (instintivamente
alegre), subjetividade do SP

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- Estrofes 4 a 6: o “eu” exprime os efeitos produzidos pelo canto,
revelando a sua emoção e o seu desejo de fuga ao pensamento
A expressão do desejo do SP resulta da consciência que o “eu” tem
do mal que o uso excessivo da razão produz em si próprio. O SP que
ser inconsciente como a ceifeira, mas sem deixar de ser ele próprio
(um ser consciente)  Paradoxo
- Sinceridade: inconsciência, espontaneidade e instinto
- Fingimento: uso da razão, consciência
A ceifeira é trabalhadora, sacrificada, de condição social baixa, viúva
e com uma voz bonita. Simplicidade da sua vida causa inveja ao SP.
“alegre e anónima viuvez” – ironia: viuvez é associada a desamparo
e tristeza.
As antíteses ao longo do poema têm, de um lado, a visão parcial da
ceifeira e, de outro, a visão total do poeta.
Sugere-se a imagem da ceifeira a cantar, em conjunto com a ideia de
o tempo passar lentamente. A voz da ceifeira é suave, instintiva,
alegre e inconsciente. A pureza da sua voz projeta-se no ambiente
em que se insere.
“Ouvi-la alegre e entristece” – paradoxo/ antítese: alegria pelo
contentamento de ver que a ceifeira aceita a vida com o que esta
tem de bom e de mau e tristeza pois apercebe-se de que a ceifeira
não tem consciência das suas precárias condições de vida.
A dor do SP é causada pelo seu intelecto (intelectualiza as suas
emoções). Gostaria de não sentir a dor derivada da sua lucidez, ou
seja, de ser como a ceifeira e não sentir o sentimento causado pela
intelectualização do sentir. O poeta aspira ao impossível pois ter a
consciência da inconsciência é deixar de ser inconsciente.
O SP desejava ser inconsciente e feliz como a ceifeira, libertando-se
da dor da intelectualização das emoções. A “alegre inconsciência” da
ceifeira remete para o seu parcial conhecimento que tinha da sua
vida (ironia).

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“Gato que brincas na rua” – Dor de pensar
A temática deste poema é a dor de pensar, motivada pela
intelectualização do sentir (felicidade de não pensar, isolamento do
“eu”, inveja sentida relativamente à inconsciência do animal,
desconhecimento e estranheza do “eu” em relação a si).
Ao longo do poema, o SP fala sobre um gato que observa a brincar
na rua, despreocupadamente. O gato é um animal feliz (brinca),
tranquilo, despreocupado, indiferente e inconsciente do perigo
(cama). A utilização de comparações em vez de metáforas remete
para a simplicidade da vida do gato.
SP tem inveja do gato: inconsciente dos perigos, ser irracional, que
não pensa. Cumpre o seu destino (age por instintos) sem se lhe opor.
O gato desconhece o significado de “sorte”.
Não tenta contrariar as etapas da existência. É inconsciente e aceita
calmamente o seu destino. Vive só por viver, sem saber por que vive,
limita-se a sentir. O seu carácter instintivo não lhe permite ter
consciência das inconveniências.
A dor de pensar do SP tortura-o e fá-lo querer ser como a ceifeira e o
gato: seres inconscientes, que não pensam. O SP, por ser demasiado
racional, não consegue ser feliz, daí invejá-los por não
intelectualizarem os sentidos e viverem felizes.
“Todo o nada que és é teu”: gato não pensa, não se questiona, é o
“nada” (de forma plena e feliz), não se conhece, rege-se por instintos
 é feliz porque é irracional e inconsciente.
As antíteses ao longo do poema remetem para a oposição entre o
gato (guiado pelos instintos, livre e feliz) e o SP (angustiado, infeliz e
torturado pela dor de pensar, guiado pelo pensamento).
Dois versos finais: Paradoxo  complexidade e confusão interior do
SP, despersonalização (ao ser muitos, acaba por se desconhecer a si

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mesmo), procura do autoconhecimento, racionalização e estranheza
face a si mesmo.
“Não sei se é sonho, se realidade,” – Sonho e realidade
“Tudo o que faço ou medito” – Sonho e realidade
“Quando era jovem, quando tinha pena” – Nostalgia da
infância

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