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A Psicomotricidade

no Contexto da
Educação Especial
1. A Deficiência Mental 4
Distinguindo Deficiência Mental de Doença Mental 5

2. Avaliação e Intervenção Psicomotora


em Portadores de Deficiência Mental 9
Teste – Salto Monopedal 12

3. O Jovem Adulto Portador de Necessidades Especiais 16

4. Portadores de Paralisia Cerebral 22

5. Os Portadores de Deficiência Visual 27


A Primeira Infância, o Desenvolvimento Normal
e Transtornos da Visão 28

6. Portadores de Deficiência Auditiva 36

7. Referências Bibliográficas 43

02
03
A PSICOMOTRICIDADE NO CONTEXTO DA EDUCAÇÃO ESPECIAL

1. A Deficiência Mental

Fonte: Nova Escola1

P odemos dizer que já algumas


décadas a literatura apresenta
aos educadores e terapeutas infor-
Os mesmos autores ressaltam
que as razões para a mensuração em
alunos com deficiência são as mes-
mações cada vez mais elaboradas so- mas para quaisquer outros grupos,
bre os portadores de necessidades principalmente se levarmos em con-
especiais, dentre eles o Deficiente ta que, mesmo polemizado por al-
Mental (DM). guns estudiosos, as estimativas da
A ciência, por sua vez, se preo- Organização das Nações Unidas -
cupa em estudar de maneira pro- ONU (1981) apontam que pelo me-
funda estes indivíduos, para solucio- nos 10% da população mundial
nar várias problemáticas que os apresenta algum tipo de deficiência
acompanham, haja vista que ainda e que a deficiência mental é respon-
não temos muito a saber sobre os sável pela maior parte desse percen-
mesmos (REZENDE ET AL, 2003). tual. E segundo dados do IBGE –

1 Retirado em https://novaescola.org.br/

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A PSICOMOTRICIDADE NO CONTEXTO DA EDUCAÇÃO ESPECIAL

censo 2000 - no Brasil há 25,5 mi- difícil detectar esse problema. Nos
lhões de portadores de necessidades centros educacionais as exigências
especiais, que equivale a 14,5% da intelectuais aumentam e aí a defici-
população e dentre este número, 8, ência mental torna-se mais explícita.
3% possui deficiência mental. Segundo Santana (2007) um
mito em torno da Deficiência Men-
Distinguindo Deficiência tal, e isso influi no diagnóstico, é
Mental de Doença Mental acreditar que a criança com este pro-
blema tem a aparência física dife-
A deficiência intelectual ou rente das outras. Como foi dito aci-
mental é conhecida por problemas ma, as de grau mais leve não aparen-
com origem no cérebro e que cau- tam ser deficientes, assim não se
sam baixa produção de conhecimen- deve esperar encontrar este sinal clí-
to, dificuldade de aprendizagem e nico para caracterizar a pessoa com
um baixo nível intelectual. Entre as necessidades especiais. Pode-se en-
causas mais comuns deste trans- contrar uma exceção nos que acu-
torno estão os fatores de ordem ge- sam um distúrbio mais grave e se-
nética, as complicações ocorridas ao vero, assim como na Síndrome de
longo da gestação ou durante o parto Down, que apresentam em comum
e as pós-natais. O grande enigma fisionomias semelhantes.
que se coloca diante dos pesquisado- Como a deficiência mental
res é como detectar ainda na vida está entre as síndromes considera-
dentro do útero estas características das anormais, é importante definir o
(SANTANA, 2007). que é normal para os especialistas,
Embora seja possível identifi- quais referências eles adotam para
car a maior parte dos casos de defi- estabelecer se uma criança possuiu
ciência mental na infância, infeliz- alguma deficiência. O fator mais as-
mente este distúrbio só é percebido sociado à ideia de normalidade é a
em muitas crianças quando elas co- capacidade da criança de se adequar
meçam a frequentar a escola. Isso ao objeto ou ao seu universo. Mas
acontece porque esta patologia é en- geralmente este distúrbio psíquico é
contrada em vários graus, desde os considerado como uma condição re-
mais leves, passando pelos modera- lativa da mente, comparada com as
dos, até os mais graves. Nos casos outras pessoas de uma mesma soci-
mais sutis, os testes de inteligência edade.
direcionados para os pequenos não O tratamento deve incluir o
são nada confiáveis, torna-se então acompanhamento simultâneo do

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A PSICOMOTRICIDADE NO CONTEXTO DA EDUCAÇÃO ESPECIAL

médico, do fisioterapeuta, da terapia É importante não confundir


ocupacional, do fonoaudiólogo, do Deficiência Mental ou Intelectual
psicólogo, do pedagogo, entre ou- com Doença Mental. A pessoa com
tros. Assim, é possível amenizar as necessidades especiais mantém a
consequências deste problema. O di- percepção de si mesmo e da reali-
agnóstico precoce também é funda- dade que a cerca, sendo capaz de to-
mental para oferecer à criança uma mar decisões importantes sobre sua
melhor qualidade de vida e resulta- vida. Já o doente mental tem seu dis-
dos mais eficientes - estas técnicas cernimento comprometido, caracte-
de detecção prematura, realizadas rizando um estado da mente com-
por vários profissionais ligados aos pletamente diferente da deficiência
campos da reabilitação e da pueri- mental, embora 20 a 30% dos defici-
cultura, ramo da medicina que en- entes manifestem algum tipo de li-
sina a criar e a desenvolver moral e gação com qualquer espécie de do-
fisicamente as crianças, são conheci- ença mental, tais como a síndrome
das como Avaliação do Desenvolvi- do pânico, depressão, esquizofrenia,
mento e Estimulação Precoce. entre outras. As doenças mentais
Como a criança tem suas fun- atingem o comportamento das pes-
ções intelectuais comprometidas, soas, pois lesam outras áreas cere-
ela pode também ter dificuldades brais, não a inteligência, mas o po-
em seu desenvolvimento e no seu der de concentração e o humor
comportamento, principalmente no (SANTANA, 2007).
aspecto da adequação ao contexto a A Deficiência mental é defini-
que pertence, mas igualmente nas da pela AAMR (American Associa-
esferas da comunicação, do cuidado tion for Mental Retardation) como
consigo mesma, dos talentos sociais, indivíduos que possuem comprome-
da interação familiar, da saúde, na timento intelectual associado a limi-
segurança, no desempenho acadê- tações do comportamento adapta-
mico, no lazer e no campo profissio- tivo em duas ou mais das áreas se-
nal. A deficiência intelectual mani- guintes: comunicação, cuidados
festa-se no paciente sempre no está- pessoais, vida escolar, habilidades
gio anterior aos dezoito anos de ida- sociais, desempenho na comuni-
de. Assim fica claro que, ao contrário dade, independência na locomoção,
da Demência, a Deficiência Mental saúde e segurança, desempenho es-
se caracteriza pelos transtornos no colar, lazer, trabalho; com tais mani-
desenvolvimento, não por degenera- festações ocorrendo até a idade de
ções cognitivas. 18 anos de idade.

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A PSICOMOTRICIDADE NO CONTEXTO DA EDUCAÇÃO ESPECIAL

O diagnóstico e classificação Em outros casos, os alunos


são algumas das questões polêmicas que possuem dificuldades acadêmi-
que acompanham a DM. É de certo cas são avaliados como uma tenta-
modo bastante discutido os procedi- tiva de se identificar em que medida
mentos utilizados para estabelecer o as dificuldades psicomotoras podem
diagnóstico, dando oportunidade estar influenciando o desempenho
para o desenvolvimento de diferen- acadêmico. E finalmente estes testes
tes opiniões sobre este assunto. também são usados para se diagnos-
Dentre estas, há o modelo médico, ticar lesões cerebrais e comporta-
que busca como fator etiológico da mentais.
DM as alterações orgânicas; o mo- Para a avaliação psicomotora,
delo psicopedagógico, onde o alvo a revisão de literatura apresenta di-
do diagnóstico pode ser o QI (Quoci- versos instrumentos e testes, como a
ente intelectual), o desempenho psi- BPM de Vítor da Fonseca, além de
comotor, estágio de desenvolvimen- trabalhos científicos, principalmen-
to cognitivo, além de outras conside- te teses e dissertações, que por sua
rações; e por fim, o modelo social vez colaboram para o aprofunda-
que propõe a avaliação da conduta mento dos conhecimentos e na pa-
adaptativa, tanto para o diagnóstico dronização de avaliações específicas
como para a possibilidade de ações para o deficiente mental. Entretan-
educacionais e melhoria nas condi- to, por se tratar de indivíduos que
ções de vida dos indivíduos. apresentam dificuldades adaptati-
O desenvolvimento psicomo- vas, cria-se a necessidade de um
tor, utilizado pelo enfoque psicoedu- maior número de pesquisas para a
cacional, é avaliado pelo conheci- elaboração de avaliações confiáveis.
mento de sua importância como A BPM é um dos instrumentos
pré-requisito para o desenvolvimen- que estudos como os de Rezende et
to de habilidades acadêmicas. A ava- al mostram ser de fácil utilização
liação psicomotora geralmente ocor- principalmente quando os fatores
re devido a vários propósitos. Em são analisados de forma individual.
geral, avalia-se o aluno pela tenta-
tiva de se identificar alguma dificul-
dade psicomotora, de forma que
possa ser elaborado um programa
de treinamento para a estimulação
de tais habilidades não adquiridas.

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A PSICOMOTRICIDADE NO CONTEXTO DA EDUCAÇÃO ESPECIAL

2. Avaliação e Intervenção Psicomotora em Porta-


dores de Deficiência Mental

Fonte: Ism2

V imos ao longo do curso, princi-


palmente na apostila intitu-
lada “Avaliações Psicomotoras”, a
Segundo Gorla, Araújo e Car-
minato (2004) nenhum teste único
pode satisfazer as necessidades de
sua importância para diagnóstico e todas as pessoas. Dessa forma, cada
terapêutica de problemas relaciona- um dos testes deve ser examinado
dos ao desenvolvimento motor do cuidadosamente.
sujeito. As avaliações são essenciais Populações com necessidades
na determinação dos programas de especiais, neste caso a deficiência
educação física para as pessoas por- mental, são compostas de indiví-
tadoras de deficiência mental. Em duos cujas características físicas,
primeiro lugar, porém, o profissio- mentais e/ou emocionais interferem
nal dessa área deve entender como no seu desenvolvimento e/ou de-
classificar as informações geradas sempenho ótimos (TRITSCHLER,
por tais avaliações. 2003).

2 Retirado em https://www.ism.org/advice/career-in-music-therapy

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A PSICOMOTRICIDADE NO CONTEXTO DA EDUCAÇÃO ESPECIAL

Uma definição que parece to normal, mas defasada em relação


ser mais compartilhada por todos à idade cronológica (GORLA; ARA-
é a da American Association on ÚJO; CARMINATO, 2004).
Mental Retardation (AAMR), falada
anteriormente, ou seja, limitação
substancial que o sujeito apresenta
em seu funcionamento intelectual
(inferior à média); limitações em
duas ou mais das seguintes áreas de
habilidades adaptativas: comunica-
ção, cuidados pessoais, vida escolar,
habilidades sociais, desempenho es-
colar, lazer, trabalho, desempenho
Fonte: https://novaescola.org.br/
na comunidade, independência na
locomoção, saúde e segurança e, ma-
Algumas crianças encontram
nifestar-se antes dos 18 anos de
dificuldades em habilidades moto-
idade. ras tais como escrever, desenhar,
Uma pessoa portadora de uma
manipular e construir, ao passo que
deficiência, isto é, de uma diminu- outras têm dificuldades em recrea-
ição de adaptabilidade provocada
ção, jogos de correr, saltar, saltitar,
por uma perda, de caráter perma- arremessar, no equilíbrio, nas orien-
nente, de certa(s) capacidade(s),
tações espaciais e temporais, na la-
apresenta diferentes características teralidade, nos esportes e até dificul-
quanto ao desenvolvimento do seu
dades na locomoção e nas atividades
esquema corporal, da organização
da vida diária Influências genéticas
espacial, do equilíbrio, da agilidade e ambientais têm sido consideradas
e da força, entre outras, que podem
por autores como Krebs (1997), Pe-
ser consideradas, em certos casos, reira, Sobral e Silva (1997), Gallahue
patológicas, isto é, desenvolvendo-
e Ozmun (2001), entre outros, cuja
se com particularidades e sequên- preocupação se centra no atual estilo
cias distintas do desenvolvimento
de vida das pessoas, sejam elas nor-
considerado “normal”, e noutros mais ou deficientes, e nas conse-
simplesmente atrasadas, isto é,
quências que a falta de oportunida-
quando se verifica uma evolução em
des de exploração dos movimentos
tudo semelhante ao desenvolvimen- naturais pode causar.

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A PSICOMOTRICIDADE NO CONTEXTO DA EDUCAÇÃO ESPECIAL

Uma vez que a coordenação do-os a indagar se efetivamente as


corporal é um dos componentes im- baterias de testes usuais estão dispo-
portantes no desenvolvimento da níveis para a população com defici-
criança, Gorla, Araújo e Carminato ência mental.
(2004) desenvolveram um estudo Ao mesmo tempo em que as
objetivando analisar esta coordena- informações são relativamente es-
ção à luz do teste chamado teste sal- cassas, nota-se um grande problema
to monopedal (SM) que faz parte da quando se observa na literatura a
bateria de testes de coordenação compilação ou utilização de testes
motora para crianças KTK, de Ki- padronizados aplicados com popu-
phard e Schilling (1974), em pessoas lações que não apresentam caracte-
portadoras de deficiência mental. rísticas de deficiência mental, o que
pode levar a uma preocupação de ca-
ráter métodológico para algumas
variáveis apresentadas pelas pes-
soas portadoras de deficiência men-
tal.
As análises e as ponderações
feitas pelos pesquisadores acima le-
varam à conclusão de que o assunto
Fonte: https://g1.globo.com/ avaliação e intervenção é relevante,
devendo ser estimulado na educação
O referido estudo veio reforçar especial, pois certamente haveria
as preocupações, que sempre estive- benefícios às pessoas com deficiên-
ram presentes ao longo de vários cia mental e ao próprio profissional
anos trabalhando com população es- no desenvolvimento de seus plane-
pecial, mais precisamente com a de- jamentos.
ficiência mental, quanto às dúvidas Dada a diversidade de suas di-
por parte de alguns profissionais so- ficuldades, ponderam que não foi fá-
bre a importância de avaliar a refe- cil identificar com precisão as medi-
rida população. das dentro do Programa de Educa-
Outro fator importante que ção Física Orientado para melhorar
analisaram, também pela pouca in- as habilidades motoras das pessoas
formação, foi o desconhecimento com deficiência mental, bem como
dos instrumentos avaliativos por que tipos de testes deveriam ser apli-
parte de alguns profissionais, levan- cados.

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A PSICOMOTRICIDADE NO CONTEXTO DA EDUCAÇÃO ESPECIAL

Observaram que os resultados Ponderaram ser necessário


das avaliações no pós-teste foram também estimular e desenvolver es-
significativos para ambas as pernas tudos dentro desse tópico geral,
esquerda e direita, o que demonstra como, por exemplo: a verificação de
uma interferência das atividades de- quais os tipos de tarefas motoras
senvolvidas durante o Programa de planificadas, e de quais testes cor-
Educação Física Orientado. respondam a tipos específicos de ta-
Entretanto, alguns sujeitos refas de habilidades da vida cotidi-
não tiveram rendimento satisfatório ana; estudos sobre populações de
no pós-teste, indicando uma neces- crianças com problemas específicos,
sidade de mais tempo para as inter- uma vez que são diferentes em níveis
venções e análises mais profundas e graus de deficiência, tentando as-
sobre outros comportamentos. sociar estes aos comportamentos
Levando-se em conta estas li- adaptativos e não apenas e simples-
mitações, e para que haja aquisição mente à deficiência mental.
ou melhorada coordenação corporal Recomendaram ao final da
no teste salto monopedal entre pes- pesquisa, também para futuros estu-
soas portadoras de deficiência men- dos semelhantes, que haja avalia-
tal, torna-se necessário observar al- ções antropométricas em conjunto
guns princípios gerais, tais como: com a testagem, pois o peso corporal
 Estímulo tanto quantitativo pode ter sido um fator de interferên-
como qualitativo das ativida- cia nos resultados, não tendo sido,
des motoras; contudo, controlada esta variável
 Elaboração de atividades (GORLA; ARAÚJO; CARMINATO,
adaptadas às dificuldades es- 2004).
pecíficas dos sujeitos;
 Redução da influência dos
problemas de comportamento Teste – Salto Monopedal
(ansiedade, por exemplo) nas
habilidades motoras; Objetivo: coordenação dos
 Redução da influência das di- membros inferiores; energia dinâ-
ficuldades no tocante às habi- mica/ força.
lidades motoras sobre outras Material: são usados 12 blocos
funções tais como a motiva-
ção; de espuma, medindo cada um 50 cm
 Estimulação do desenvolvi- x 20 cm x 5 cm.
mento perceptivo-motor.

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A PSICOMOTRICIDADE NO CONTEXTO DA EDUCAÇÃO ESPECIAL

Execução: tarefa consiste em O indivíduo, não conseguindo


saltar um ou mais blocos de espuma passar, começa como antes, com 0
colocados uns sobre os outros, com cm de altura; se ele conseguir, inicia-
uma das pernas. se a avaliação na altura recomen-
O avaliador demonstra a ta- dada para sua idade.
refa, saltando com uma das pernas Se na passagem válida na al-
por cima de um bloco de espuma co- tura recomendada o indivíduo co-
locado transversalmente na direção meter erros, esta tentativa é anu-
do salto, com uma distância de im- lada. O indivíduo reinicia a primeira
pulso de aproximadamente 1,50 m. passagem com 5 cm (um bloco).
A altura inicial, a ser contada Alturas recomendadas para o
como passagem válida, baseia-se no início do teste por faixa de idade:
resultado do exercício-ensaio e na  5 a 6 anos – nenhum bloco de
idade do indivíduo. Com isso devem espuma
ser alcançados mais ou menos os  6 a 7 anos – 5 cm (1 bloco de
mesmo números de passagens a se- espuma)
rem executadas pelos indivíduos nas  7 a 8 anos – 15 cm (3 blocos de
diferentes faixas etárias. Estão pre- espuma)
vistos dois exercícios-ensaio para  9 a 10 anos – 25 cm (5 blocos
cada perna (direita e esquerda). de espuma)
Para indivíduos de 5 a 6 anos  11 a 14 anos – 35 cm (7 blocos
são solicitados, como exercício-en- de espuma)
saio, duas passagens de cinco saltos
por perna, sem blocos de espuma Para saltar os blocos de es-
(nível zero). O indivíduo, saltando puma, o indivíduo precisa de uma
com êxito numa perna, inicia a pri- distância de mais ou menos 1,50 m
meira passagem válida, com 5 cm de para impulsão, que também deverá
altura (um bloco). Isso é válido para ser passada em saltos na mesma
a perna direita e esquerda separada- perna. O avaliador deverá apertar vi-
mente. O indivíduo, não conse- sivelmente os blocos para baixo, ao
guindo passar essa altura saltando iniciar a tarefa, a fim de demonstrar
numa perna, começa a avaliação ao indivíduo que não há perigo caso
com nível zero. este venha a ter impacto com o ma-
A partir de 6 anos, os dois terial. Após ultrapassar o bloco, o in-
exercícios-ensaio para a perna di- divíduo precisa dar pelo menos mais
reita e esquerda são feitos com um dois saltos com a mesma perna para
bloco de espuma (altura = 5 cm). que a tarefa possa ser aceita como

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A PSICOMOTRICIDADE NO CONTEXTO DA EDUCAÇÃO ESPECIAL

realizada. Estão previstas até três a perna direita assim como para a
passagens válidas por perna, em perna esquerda.
cada altura. Com os 12 blocos de espuma
Fórmula verbal: “Você começa (altura = 60 cm), podem ser alcan-
a saltar daqui, numa perna só; salta çados no máximo 39 pontos por per-
por cima do bloco e dá mais dois sal- na, totalizando assim 78 pontos.
tos com a mesma perna. Durante
todo o tempo a outra perna não pode
tocar o chão nem os blocos; se tocar,
conta-se como erro”.
Avaliação da tarefa: para cada
altura, as passagens são avaliadas da
seguinte forma:
Na primeira tentativa válida -
3 pontos Na segunda tentativa vá-
lida - 2 pontos Na terceira tentativa
válida - 1 ponto
Nas alturas iniciais, a partir de
5 cm, são dados 3 pontos para cada
altura abaixo, quando a primeira
passagem tiver êxito.
Como erro se considera o to-
que no chão com a outra perna, o
derrubar dos blocos, ou ainda, após
ultrapassar o bloco de espuma, tocar
os dois pés juntos no chão, por isso
pede-se que depois de transpor os
blocos de espuma se dê mais dois
saltos.
Caso o indivíduo erre nas três
tentativas válidas numa determi-
nada altura, a continuidade somente
será realizada se nas duas passagens
(alturas) anteriores houver um total
de 5 pontos. Caso contrário, inter-
rompe-se a tarefa. Isso é válido para

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A PSICOMOTRICIDADE NO CONTEXTO DA EDUCAÇÃO ESPECIAL

3. O Jovem Adulto Portador de Necessidades Espe-


ciais

Fonte: Medium3

F alar de avaliação é um assunto


complexo por si só, por tratar-
se de um processo multifacetado, em
dificuldades inerentes à própria
condição de deficiência (FUMES;
MARQUES, 2011).
que valores e perspectivas estão o Na deficiência mental comu-
tempo todo confrontando-se. Com- mente nos deparamos com sujeitos
tudo, é ainda mais complexo pensar, que apresentam curta atenção, difi-
falar e avaliar pessoas com necessi- culdade de entender e seguir solici-
dades educativas especiais. tações complicadas, desmotivados
Em parte, o aumento do grau intrinsecamente para a avaliação,
de complexidade por nós atribuído à com pobre capacidade de memoriza-
avaliação de pessoas com necessida- ção, e assim por diante, conforme
des educativas especiais deve-se às

3 Retirado em https://medium.com/lifespeak/archive/2018/01

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A PSICOMOTRICIDADE NO CONTEXTO DA EDUCAÇÃO ESPECIAL

nos aponta Lavay (1992 apud FU- estabelecimento de um “perfil intra-


MES; MARQUES, 2011). individual em termos de futuro, de
Por outro lado, Lunt (1994) propensibilidade à modificabilidade
vislumbra também existir uma crise psicomotora” (Fonseca, 1992) e não
na avaliação psico-educacional dos apenas em estabelecer um rótulo
grupos minoritários, desencadeada, calcado em aspectos quantitativos.
sobretudo, pelos resultados discri- Perspectivamos ser possível identifi-
minatórios e limitantes produzidos car capacidades psicomotoras efeti-
pelos modelos de avaliação tradicio- vas através da mesma.
nais disponíveis. A elaboração da BPM resultou
Quando nós voltamos para a da experiência do autor com crian-
avaliação na área da Atividade Física ças com dificuldades de aprendiza-
Adaptada, em particular, de jovens gem e é considerada, por este, como
adultos portadores de deficiência uma oportunidade de estudar a psi-
mental, constatamos que ainda pre- comotricidade atípica e tendo sido
dominam os modelos de avaliação aplicada em casos de deficiência au-
tradicional. ditiva, visual, sócio-emocional e em
Neste universo, mais uma vez gerontos.
a Bateria Psicomotora (BPM) de Fonseca (1976), na obra Um
Fonseca (1992) apresenta aspectos contributo para a gênese da psico-
diferenciadores que a coloca em um motricidade, onde a BPM é apresen-
outro patamar, diferente daquele tada em uma versão anterior, que
destinado às escalas ou baterias de continha maior número de tarefas e
avaliação convencionais. Um dos as- não tinha explicitamente as unida-
pectos principais que a diferencia des funcionais de Luria permeando
das demais é que ela não se restringe sua organização, considera como in-
à mera aplicação de situações-pro- dicado e aplicável a BPM a casos de
blemas para avaliar o perfil psico- debilidade e deficiência motora, de-
motor de um sujeito, mas considera bilidade mental, crianças psicóticas,
também como alvo da avaliação as com instabilidade, inibição, impulsi-
manifestações ocorridas ao longo do vidade, e, na reinserção profissional.
processo de avaliação do sujeito, Ponderando sobre as possibili-
bem como procura complementar dades apresentadas por tal instru-
estes resultados com informações mento de avaliação, Fumes e Mar-
mesológicas e biomédicas do sujeito. ques (2011) propuseram uma pes-
Semelhantemente à avaliação quisa tendo como objetivos levantar
dinâmica, a BPM orienta-se para o

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A PSICOMOTRICIDADE NO CONTEXTO DA EDUCAÇÃO ESPECIAL

o perfil psicomotor de jovens adul- dores da Trissomia 21. Na escola re-


tos portadores de deficiência mental cebiam aulas de escolaridade e ou-
(pdm) através da Bateria Psicomo- tras atividades complementares, de
tora de Vítor da Fonseca (1992) e cunho pedagógico, profissionali-
analisar a aplicabilidade da referida zante ou terapêutico.
bateria para esta clientela. Os sujeitos foram avaliados in-
dividualmente através da BPM de
Fonseca, no próprio centro educa-
cional onde estavam matriculados,
após alguns contatos informais com
a avaliadora durante as atividades
psicomotoras realizadas na FCDEF/
UP e no próprio Centro. O instru-
mento de coleta de dados utilizado,
a BPM, estruturava-se sobre as 03
Fonte: https://www.bebac.com/
unidades funcionais de Luria da or-
ganização do sistema nervoso do ho-
Vejam a metodologia aplicada
mem, sendo composta ao todo por
e os resultados obtidos por eles:
07 subfatores psicomotores, distri-
A amostra foi composta por
buídos por aquelas unidades funcio-
10 jovens adultos considerados
nais. As unidades funcionais de Lu-
como portadores de deficiência
ria estão assim categorizadas: 1ª
mental, matriculados em uma Insti-
unidade - regulação tônica de alerta
tuição e também participantes de
e dos estados mentais;
atividades psicomotoras, de caráter
2ª unidade - recepção, análise
extracurricular, na Faculdade de Ci-
e armazenamento de informação; e,
ências do Desporto e de Educação
3ª unidade - programação, regula-
Física da Universidade do Porto du-
ção e verificação de atividade. Os fa-
rante o ano letivo de 1997/1998. A
tores psicomotores da BPM ligados
faixa etária compreendida foi dos 18
à 1ª unidade funcional são a tonici-
aos 31 anos de idade (cronológica) e
dade e a equilibração; os fatores psi-
os níveis de deficiência mental vari-
comotores lateralização, noção do
avam entre o leve e o moderado. As
corpo e estruturação espaço-tempo-
etiologias da deficiência mental
ral correlacionam-se com a 2ª uni-
eram, em sua maioria, desconheci-
dade funcional; e, os fatores praxia
das ou inespecíficas, sendo 02 sujei-
fina e praxia global com a 3ª uni-
tos (20% do total da amostra) porta-
dade funcional de Luria.

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A PSICOMOTRICIDADE NO CONTEXTO DA EDUCAÇÃO ESPECIAL

Fonseca (1992) considera que conseguida nos 07 subfatores da


o perfil, resultante da BPM, torna-se BPM foi estabelecido o perfil psico-
mais preciso se juntamente aos da- motor do indivíduo, que apresen-
dos obtidos pela BPM houver a com- tava a seguinte distribuição: para
plementação com os dados biomédi- aqueles sujeitos que obtivessem en-
cos (condições de desenvolvimento tre 27-28 pontos na BPM, seu perfil
pré, peri, pós-natais) e dados meso- psicomotor era considerado como
lógicos (características do ambiente sendo superior; de 22-26 pontos
familiar imediato). Neste caso, o correspondia a um perfil psicomotor
perfil psicomotor dos sujeitos foi re- bom; 14-21 pontos a um perfil psico-
sultante da aplicação da BPM, das motor normal; enquanto de 09-13
observações dos comportamentos e pontos representava o perfil psico-
atitudes ocorridos durante a realiza- motor dispráxico; e, 07-08 pontos a
ção da mesma, nas atividades de um perfil psicomotor deficitário. Os
Educação Física ocorridas na escores encontrados em cada tarefa
FCDEF e das informações obtidas foram utilizados para a determina-
informalmente junto ao professor ção do índice de discriminação e de
sobre o desenvolvimento escolar do dificuldade da mesma, os quais fo-
sujeito. ram calculados empregando os re-
Os resultados da avaliação psi- sultados dos 30% superior da amos-
comotora de cada sujeito foram ano- tra e dos 30% inferior da amostra,
tados em ficha individual, proposta considerando o resultado final no
por Fonseca (1992) para este fim. O subfator em que a tarefa em questão
desempenho dos sujeitos para cada pertencia. Foram determinados os
tarefa podia receber cotações entre 1 índices de discriminação e de difi-
e 4 pontos, conforme os critérios de culdade de todas as tarefas de todos
cada uma das tarefas. De forma ge- os subfatores. O índice de discrimi-
ral, a cotação 1 foi atribuída para o nação refere-se a diferença de pro-
desempenho fraco ou a não realiza- porção de respostas corretas entre
ção da tarefa, 2 para o desempenho os melhores e os piores resultados.
satisfatório, 3 para o bom e 4 para o Safrit e Wood (1989 citados
desempenho excelente. pelos pesquisadores) indicam que
A partir dos resultados de cada máxima discriminação de um teste
tarefa foi encontrado o resultado acontece quando um índice de difi-
médio e, assim, atribuída a cotação culdade é de 50%. Já o índice de di-
final para o subfator que elas perten- ficuldade de um teste é a porcenta-
ciam. Do somatório da pontuação gem de respostas corretas entre os

19
A PSICOMOTRICIDADE NO CONTEXTO DA EDUCAÇÃO ESPECIAL

sujeitos que responderam correta- proposição de uma adaptação da


mente a questão ou a tarefa. BPM para esta população não foi o
Os comportamentos e atitudes objetivo nesse momento.
apresentados durante a avaliação e Um aspecto decisivo da BPM e
que não eram alvos dos critérios da que deveria ser alvo de estudos pos-
bateria foram anotados e utilizados, teriores, que pretendam sua adapta-
de modo complementar, na análise ção, concerne ao seu tempo de apli-
qualitativa da aplicabilidade da cação. Como já indicado, a bateria
BPM para sujeitos portadores de de- revelou ser demasiada longa e can-
ficiência mental. sativa para utilização em sujeitos
A BPM de Fonseca (1992) pdm (FUMES; MARQUES, 2011).
mostrou ser útil e aplicável para ava-
liar o nível real dos subfatores psico-
motores de jovens adultos portado-
res de deficiência mental, sendo pos-
sível elaborar um perfil psicomotor
destes e definir suas principais capa-
cidades psicomotoras.
O critério utilizado para anali-
sar a aplicabilidade da BPM, que foi
o índice de discriminação e de difi-
culdade, bem como elementos de ca-
ráter qualitativos obtidos durante a
aplicação da bateria e das observa-
ções do sujeito, revelaram a necessi-
dade de exclusão de algumas tarefas
que não atingiram o índice de discri-
minação e de dificuldade pré-esta-
belecidos.
No caso dos subfatores estru-
turação espaço-temporal e praxia
fina, estes foram excluídos na ínte-
gra, ao passo, que algumas tarefas de
outros subfatores demonstraram ser
necessário adaptá-las quando estas
forem utilizadas na avaliação psico-
motora de pessoas pdm. Todavia, a

20
21
A PSICOMOTRICIDADE NO CONTEXTO DA EDUCAÇÃO ESPECIAL

4. Portadores de Paralisia Cerebral

Fonte: Pinterest4

N a atualidade tem-se visto um


aumento relativamente grande
no interesse da deficiência humana.
um ortopedista inglês chamado Wil-
liam John Litle como uma rigidez
espástica. O termo “Paralisia
Cerca de 10%, ou mais da população
mundial sofre de alguma deficiên- Cerebral” foi introduzido por Freud
cia, seja ela física, mental ou senso- para diferenciá-la da Paralisia In-
rial. No Brasil segundo os dados do fantil causado pelo vírus da Poliomi-
IBGE (2000), este índice chega a elite.
14,5% da população com algum tipo A Paralisia Cerebral (PC), é um
de deficiência. termo utilizado para descrever uma
Segundo Souza e Ferraretto condição de ser, ou um estado de Sa-
(2001), a Paralisia Cerebral foi des- úde, que podemos afirmar ser contí-
crita pela primeira vez em 1843 por

4 Retirado em https://www.pinterest.es/

22
A PSICOMOTRICIDADE NO CONTEXTO DA EDUCAÇÃO ESPECIAL

nua, instável e irreversível, uma de- transtorno persistente, do tono, da


ficiência física adquirida, um dano postura e do movimento do sujeito,
cerebral ou no sistema nervoso uma agressão não progressiva, mas
central (SNC) que leva o sujeito a ter geralmente mutável, quando nos re-
certa dificuldade ou descontrole ferimos as suas sequelas. Em muitos
muscular, impedindo-o de execu- casos a inteligência do portador é
tar certos movimentos com maior normal, a não ser que a lesão tenha
perfeição, afetando diretamente a afetado áreas responsáveis pelo pen-
coordenação motora e a postura samento ou pela memória. Portanto,
corporal de seus portadores, como um portador de Paralisia Cerebral
se fosse uma “confusão” de envio de não pode ser classificado, exclusiva-
mensagem entre o estímulo do cére- mente, como um portador de defici-
bro e a resposta do músculo (COLE- ência mental.
TTA ET AL, 2005). Machado (1981) enfatiza que o
sistema nervoso dá vida de relação a
todas as partes do corpo, relacio-
nando o organismo com o meio, os
quais são conduzidos do cérebro por
neurônios sensitivo através da me-
dula ou tronco encefálico a todos os
receptores do corpo, portanto, a co-
ordenação de todos os movimentos
do corpo é feita pelo cérebro, e no
caso do portador de Paralisia Cere-
bral, esses estímulos foram de al-
guma forma bloqueados, causando
aos seus portadores sequelas, como
ausência de coordenação motora, di-
ficuldades na fala, em alguns casos
paraplegias, tetraplégicas, e assim
sucessivamente.
Fonte:
Acredita-se que estímulos ao
https://portalcorreio.com.br/t/busto-
de-tamandare/ SNC, aplicados de formas coerentes
apresentam resultados satisfatórios,
Para Bobath e Bobath (1978), onde as células nervosas (neurô-
a PC, é uma sequela de uma agressão nios) vizinhas a da lesão, acabam
encefálica, que se caracteriza por um

23
A PSICOMOTRICIDADE NO CONTEXTO DA EDUCAÇÃO ESPECIAL

por se adaptar e assumirem, em par- se identificar a influência do equilí-


tes, a função da célula afetada. Mar- brio, da tonicidade, da lateralização,
chean (1996, p. 171) cita que através da noção do corpo e das praxias glo-
de um estudo derivado de uma lesão bal e fina no resultado motor final,
central do córtex, onde região afe- utilizando-se de uma abordagem
tada foi a da coordenação fina do su- transversal para analisar as altera-
jeito, mais precisamente nos dedos, ções psicomotoras em portadores de
e após estímulos sensoriais: “a fun- Paralisia Cerebral utilizando como
ção do tecido destruído foi assimi- instrumento o teste BPM (Bateria
lado pelo tecido nervoso vizinho in- Psicomotora) de Vitor da Fonseca.
tacto à custa de uma assimilação da De acordo com os resultados,
sensibilidade...”. Dessa forma pode- puderam verificar que as tarefas de
mos dizer que através de estímulos execução voluntária, tiveram res-
adequados, pode-se ao menos mi- postas imperfeitas ou incompletas,
nimizar sequelas motoras em por- sendo realizadas com dificuldade.
tadores de Paralisia Cerebral (PC). Conforme Fonseca (1995), a pessoa
Coletta et al (2005) realizaram com síndrome cerebral pode falhar
um estudo com pessoas portadoras em muitas tarefas da bateria. En-
de PC, com idade cronológica entre contraram maior dificuldade na rea-
8 e 18 anos, matriculados em uma lização das tarefas de equilíbrio, de
escola de Educação Especial, pontu- praxia fina e global, pois a própria
ando que a relevância do estudo está lesão cerebral já é caracterizada pelo
em proporcionar uma contribuição encurtamento e atrofia dos flexores
aos portadores de PC e especial- dificultando a noção de respostas
mente, aos profissionais de Educa- motoras dos sujeitos.
ção Física que trabalham com essa De acordo com o escore final, a
população, ampliando o conheci- média dos avaliados foi boa, mas
mento sobre causas, lesão e o com- com dificuldades na realização e
prometimento motor. com falta de controle. O teste não
Mais uma vez, partiram da pode ser utilizado como identifica-
premissa que o desenvolvimento ção de um possível déficit da lesão
completo do sujeito se dá por aspec- cerebral, mas somente como um fa-
tos motores, cognitivos, psicológicos tor que indica uma disfunção psico-
e neurológicos e tendo como base, o motora da aprendizagem e na coor-
BPM (Bateria Psicomotora) ideali- denação motora.
zada por Fonseca (1995), procurou-

24
A PSICOMOTRICIDADE NO CONTEXTO DA EDUCAÇÃO ESPECIAL

Os resultados mostraram a utilizada como uma avaliação indivi-


área onde o sujeito tem um maior dual, pois a lesão cerebral determina
comprometimento ou atraso psico- a diferenciação dos afetados. Infe-
motor, e reconhecendo a extensão rem que deve-se considerar a impor-
do problema, o profissional saberá tância de estudos nessa área, pois a
onde trabalhar e como aplicar o estí- coordenação motora influencia dire-
mulo ao portador de PC, bem como tamente no desenvolvimento global
fazer um desenvolvimento global de da criança, como o falar, o caminhar,
sua coordenação motora. o físico, mental e o social, fatores im-
portantes para um bom relaciona-
mento dentro da sociedade.

Fonte: https://folhadomate.com/

O sujeito com PC depende em


grande parte de um estímulo exter-
no para conseguir desenvolver sua
coordenação motora. A Educação
Física desenvolve um papel impor-
tante nessa estruturação motora
oferecendo recursos para tais estí-
mulos.
Os autores perceberam que a
BPM pode ser utilizada como forma
de identificação das capacidades
motoras e psicomotoras, desde que

25
26
A PSICOMOTRICIDADE NO CONTEXTO DA EDUCAÇÃO ESPECIAL

5. Os Portadores de Deficiência Visual

Fonte: Nova Escola5

N o processo de desenvolvimen-
to infantil normal, a visão pro-
move a integração das atividades
informações fornecidas por outros
canais perceptivos devem ser ampla-
mente exploradas nestas crianças
motoras, perceptivas e mentais, ou (MASSINI, 1994; GESELL, 1999).
seja, estabelece uma relação na qual A representatividade da defici-
a diminuição das capacidades vitais ência visual permite considerar que,
leva a uma série de comprometi- todos os anos, cerca de 500.000 cri-
mentos em outras áreas do compor- anças menores de 16 anos de idade
tamento da criança, causados geral- ficam cegas no mundo, sendo que
mente pela privação de certos estí- aproximadamente 90% delas resi-
mulos. Sendo assim, no decorrer dos dem em países em desenvolvimento
primeiros anos de vida a integração, (GRAZIANO; LEONE, 2005; SOU-
a sintetização e a interpretação das ZA ET AL, 2010).

5 Retirado em https://novaescola.org.br/

27
A PSICOMOTRICIDADE NO CONTEXTO DA EDUCAÇÃO ESPECIAL

A cegueira infantil representa visual, poderá conservar as imagens


3,9% dos casos de cegueira no mun- e memória visual. As crianças que
do (FIGUEIRA, 2000; OMS, 1994; nascem cegas ou perderam a visão
SOUZA ET AL, 2010). muito cedo, apresentam necessida-
Em função das necessidades des de aprendizagem diferentes das
destas crianças, os profissionais da demais crianças (BRASIL, 2004).
área de reabilitação têm procurado
desenvolver aspectos conceituais
que as caracterizem, orientando-as
para o treinamento e a intervenção
precoce de acordo com os princípios
da medicina de reabilitação e de ha-
bilitação (RAMÍREZ, 1989).
Por parte dos fisioterapeutas,
faz-se necessária a compreensão das
características intrínsecas deste gru-
Fonte: https://nl.pinterest.com/
po para a efetiva intervenção, já que
o déficit de integração sensorial po- A aprendizagem por meio de
de comprometer o desenvolvimento um sistema visual alterado, embora
(MILLER; CLARK, 2002). se produza mais lentamente e inclu-
sive em alguns casos de forma adap-
A Primeira Infância, o De- tada, segue o mesmo processo de de-
senvolvimento Normal e senvolvimento que um sistema vi-
Transtornos da Visão sual normal, sendo fundamental
nesse momento a aplicação de pro-
As causas de cegueira na in- gramas voltados a promover a efici-
fância variam de região para região, ência visual. A potencialidade de
sendo, em parte, determinada pelo cada criança para aprender a intera-
desenvolvimento socioeconômico, e gir em condições satisfatórias em
a disponibilidade de serviços de sa- seu meio familiar, na escola e em seu
úde. Dentre as 1,5 milhões de crian- ambiente social pode ser estimulada
ças cegas no mundo 75% apresen- ou inibida pela atitude das pessoas
tam causas que podem ser preveni- que a rodeiam (MARTÍN; BUENO,
das ou curáveis. Se a criança se torna 2003).
deficiente visual após os cinco anos A deficiência visual, visão pior
de idade, ela já terá desenvolvido que 20/60, impõe restrições à capa-
praticamente todo o seu potencial cidade de movimento livre, seguro e

28
A PSICOMOTRICIDADE NO CONTEXTO DA EDUCAÇÃO ESPECIAL

confiante da criança no ambiente. atividades e tarefas típicas da rotina


Agir autonomamente é fundamental doméstica. Trabalhos anteriores fo-
para uma criança com deficiência vi- ram realizados utilizando o PEDI
sual, pois, o movimento é fonte de para avaliar o desempenho funcio-
ação, da experiência, da integração nal de crianças deficientes (MAN-
sensorial, da aprendizagem e cons- CINI ET AL, 2002; MANCINI ET
trução do conhecimento (BRASIL, AL, 2003).
2004). Malta et al (2006) realizaram
Mais recentemente, novas um estudo que objetivou descrever o
abordagens de avaliação têm sido padrão de desenvolvimento das ha-
desenvolvidas com base nestas ten- bilidades funcionais de autocuida-
dências teóricas. Estas avaliações do em crianças com deficiência vi-
apresentam-se como testes padroni- sual, observando as dificuldades re-
zados que documentam de forma lativas no desempenho de atividades
objetiva e quantitativa característi- funcionais de alimentação, banho,
cas funcionais da criança, possibili- vestir e higiene pessoal, utilizando o
tando assim a investigação sistemá- método de avaliação PEDI.
tica de aspectos como a qualidade do Dentre as conclusões do es-
movimento e a mobilidade (MAN- tudo, os pesquisadores observaram
CINI ET AL, 2002; HALEY ET AL, que a deficiência visual impõe restri-
2000). ções ao desenvolvimento seguro e
confiante da criança no ambiente,
interfere no conhecimento do pró-
prio corpo, e na inter-relação entre
as coisas e as pessoas no ambiente
(BRASIL, 2004).
A promoção do desempenho
de atividades e tarefas funcionais
pode ser definida como objetivo a
ser alcançado pelas terapêuticas em-
pregadas. No presente estudo foi ob-
Fonte: https://bobo.grid.id/
servada a influência da deficiência
O teste funcional “Pediatric visual no desempenho funcional das
Evalution of Disability Inventory” crianças, principalmente em ativi-
(PEDI), é uma avaliação padroni- dades de autocuidado e mobilidade,
zada do desempenho da criança em em que houve uma diferença estatis-

29
A PSICOMOTRICIDADE NO CONTEXTO DA EDUCAÇÃO ESPECIAL

ticamente significante comparando- vive (BRASIL, 2004). Quanto à fun-


se crianças sem deficiências e defici- ção social, foi observado no presente
entes visuais. estudo, a média dos escores maior
Os sentimentos de pena, pie- nas crianças do grupo controle, no
dade e comiseração são frequentes entanto, esta diferença não foi esta-
em relação à criança deficiente vi- tisticamente significante, possivel-
sual, levando muitas vezes a atitudes mente devido ao tamanho reduzido
de superproteção, como protegê-la da amostra.
em casa, guiar ou conduzi-la, evitar
que brinque com crianças de visão
normal, deixá-la sentada para que
não se machuque, falar por ela ou
tentar resolver os seus problemas
(BRASIL, 2004). Esta atitude pode
interferir na independência dessas
crianças para desempenhar ativida-
des.
Em vista disso, durante a esti-
Fonte:
mulação visual é importante enfati-
http://www.movimentodown.org.br/
zar a necessidade da participação
dessas crianças nas atividades diá-
A comparação entre os escores
rias. A aceitação da deficiência vi-
nas diferentes faixas etárias pode
sual significa a aceitação da pessoa
mostrar o momento onde as dificul-
como ela é, sem o desejo de transfor-
dades nas áreas testadas são maio-
má-la ou modificá-la para que seja
res e em que faixa etária essas dife-
aquilo que se considera o melhor
renças entre os escores são menores.
(AMIRALIAN, 2002).
Estudos realizados com crianças
A interação social depende da
portadoras de síndrome de Down
forma de como a criança é recebida,
com 2 e 5 anos indicam que as dife-
acolhida, observada, ouvida e com-
renças observadas entre os dois gru-
preendida em suas necessidades.
pos são influenciadas pela idade,
Essa forma de relação e comunica-
não permanecendo constante ao
ção influencia o desenvolvimento
longo do desenvolvimento (MAN-
psicoafetivo e determina a maneira
CINI ET AL, 2002). Com esses da-
como a criança vai interagir com as
dos sabe-se quando e onde intervir
pessoas, objetos e o meio em que
para o melhor desempenho e rein-
serção social.

30
A PSICOMOTRICIDADE NO CONTEXTO DA EDUCAÇÃO ESPECIAL

Apesar do pioneirismo na ava- Comportamentais (motoras, lin-


liação objetiva do desempenho fun- guísticas, cognitivas e sociais)
cional de crianças deficientes utili- (AMARAL; TABAQUIM; LAMÔNI-
zando o PEDI, este foi um estudo CA, 2005). Com base nos dados co-
transversal avaliando as crianças em letados neste estudo, comprova-se
apenas um momento. Idealmente, o que as crianças com deficiência vi-
PEDI deve ser aplicado a cada seis sual apresentam atraso no desenvol-
meses para possibilitar a identifica- vimento neuropsicomotor e na visão
ção das áreas deficientes como tam- funcional em comparação com as
bém o acompanhamento e avaliação crianças sem comprometimento, o
das intervenções realizadas (MAL- que também foi confirmado no es-
TA ET AL, 2006). tudo desenvolvido por (Cioni et al.,
Em outro estudo, mais recen- 2000 apud SOUZA ET AL, 2010).
te, Souza et al (2010) procuraram Os resultados mostraram que
avaliar o desenvolvimento neuropsi- o desempenho da coordenação foi o
comotor e visual (DNPM) de crian- mais comprometido no grupo expe-
ças com deficiência visual, justifi- rimental, o que está de acordo com
cando que pesquisas específicas so- os achados das pesquisas relaciona-
bre estes aspectos ainda são escas- das às manifestações que ocorrem
sas. nos primeiros anos de vida e que são
pobremente experimentadas. A defi-
ciência visual limita a ação da cri-
ança em seu ambiente, o aprimora-
mento de seus atos motores e a sua
vivência em atividades interativas
com objetos, ou seja, altera o ambi-
ente através do qual o processo de
aprendizagem se desenvolve (MIL-
LER; CLARK, 2002).
Segundo Glass (2002 apud
SOUZA ET AL, 2010), o impacto das
Fonte: https://www.reddit.com/ alterações visuais pode interferir ne-
gativamente no estabelecimento de
Os transtornos de integração um contato social eficaz, uma vez
sensorial causam alterações no de- que as expressões faciais, os gestos e
senvolvimento em diversas áreas o contato ocular têm um importante

31
A PSICOMOTRICIDADE NO CONTEXTO DA EDUCAÇÃO ESPECIAL

papel na comunicação e na interação pressiva (NAVARRO ET AL, 2004


social. A socialização da criança ad- apud SOUZA, 2010).
vém do primeiro grupo social ao A tabela do DNPM normal
qual ela pertence, a família, que pos- possui validação de uso, pois foi pos-
sui grande responsabilidade na for- sível observar que os atos comporta-
mação afetiva e também pessoal. mentais das crianças pertencentes
Quanto ao comportamento social, a ao grupo controle, em relação à ida-
análise estatística mostrou valores de cronológica, foram compatíveis;
mais próximos do limite de signifi- fato notório durante a coleta de da-
cância p=0,04. dos. Esse fato demonstra ainda a ho-
mogeneidade das escalas avaliadas
(motora, de coordenação, de lingua-
gem e social), confirmação referida
nos resultados após o teste de Aná-
lise de Variância. Desta forma, a ta-
bela (apresentada ao final) pode ser
utilizada como método de avaliação
de crianças com deficiência visual,
visto que outros instrumentos de
avaliação precoce para essa faixa
Fonte: http://soblec.com.br/
etária, que envolvem todos os aspec-
tos conceituais similares aos da ta-
Na literatura, tem-se mostra-
bela aplicada, não estão inclusos na
do que as crianças portadoras de de-
prática clínica (SOUZA ET AL,
ficiência visual demonstram dificul-
2010).
dades sociais e emocionais que atin-
Os pesquisadores concluíram
gem suas famílias, causando assim
que crianças com deficiência visual
impactos em termos de qualidade de
apresentam atraso global no desen-
vida (TARTARELLA; KAWAKAMI;
volvimento neuropsicomotor e na
SCARPI, 1995). Estudos demons-
visão funcional em comparação com
tram a preocupação primária com a
as crianças sem esse tipo de defici-
socialização, porém, comparando
ência. Referente aos comportamen-
este trabalho com o desenvolvido
tos abordados na avaliação notou-
por Navarro e colaboradores, a
se, no entanto, que o comportamen-
questão do comportamento da coor-
to da coordenação foi o mais com-
denação aparece de forma mais ex-
prometido.

32
A PSICOMOTRICIDADE NO CONTEXTO DA EDUCAÇÃO ESPECIAL

33
A PSICOMOTRICIDADE NO CONTEXTO DA EDUCAÇÃO ESPECIAL

34
35
A PSICOMOTRICIDADE NO CONTEXTO DA EDUCAÇÃO ESPECIAL

6. Portadores de Deficiência Auditiva

Fonte: Jornal de Brasília6

A LIBRAS (língua brasileira de


sinais) usada pelos indivíduos
com comprometimentos auditivos é
A Psicomotricidade é a ciência
que estuda o movimento humano
em sua globalidade, corpo, mente e
reconhecida pela Lei 10436/2002 e suas relações com o meio ambiente.
pelo Decreto 5626/2005. Ela se de- Segundo Gallahue e Ozmum (2003),
senvolve no espaço construído com o indivíduo torna-se, então, capaz de
articuladores visuais: as mãos, o transformar imagens em ação por
corpo, os movimentos, o ritmo e o meio do movimento intencional, in-
espaço de sinalização. A língua de si- teriorizado com bases psíquicas, re-
nais americana iniciou-se na década sultante de suas capacidades biopsi-
de 1950, por meio de uma descrição cossociais, é o movimento integrado
realizada por Willian Stokoe, publi- e organizado.
cada em 1965. No Brasil, a LIBRAS Segundo Quadros (2006), a
teve um maior alcance nos anos profissionalização dos tradutores e
1990 (QUADROS, 2006). intérpretes de língua de sinais se deu

6 Retirado em https://jornaldebrasilia.com.br/

36
A PSICOMOTRICIDADE NO CONTEXTO DA EDUCAÇÃO ESPECIAL

a partir de atividades voluntárias todos os movimentos da cabeça e


que foram sendo valorizadas en- dos olhos. Ao receber estímulos vin-
quanto atividades laborais. A parti- dos da mudança de direção, envia-os
cipação de indivíduos com compro- ao Sistema Nervoso Central (SNC),
metimentos auditivos nas discus- ao cerebelo, aos núcleos vestibulares
sões sociais representou e represen- no tronco cerebral, ao centro oculo-
ta garantir acessibilidade em várias motor e à medula espinhal que con-
instituições do profissional intérpre- trolam os movimentos da cabeça e
te de língua de sinais, atuando nos dos membros. Esse mecanismo leva
processos de comunicação, princi- à percepção de aceleração e desace-
palmente nos ambientes educacio- leração (POWERS; HOWE-LEY,
nais. 2000).
Para Oliveira (2002) a psico- Silva, Aquino e Bello (2008)
motricidade é um meio de propiciar realizaram uma pesquisa com obje-
o desenvolvimento da criança frente tivo de avaliar o nível psicomotor
às suas dificuldades, possibilitando antes e após 72 aulas de LIBRAS -
a totalidade de expressão e assumin- língua brasileira de sinais, em alu-
do sua realidade corporal. Não se li- nos com comprometimentos auditi-
mita a psicomotricidade ao enrique- vos - Deficiência Auditiva (DA),
cimento gestual, mas se observadas acompanhados por intérpretes de
as etapas do desenvolvimento infan- escolas públicas estaduais e munici-
til, torna-se elemento essencial e a pais. O ato de interpretar sinais é um
base para a aprendizagem (LE processo em que o intérprete desen-
BOULCH, 1987). volve ações cognitivas e linguísticas,
O fator psicomotor tonicidade diante de pessoas que apresentam
ou tônus muscular é um estado de intenções comunicativas específicas.
tensão muscular que mantém o or- Participam do presente estu-
ganismo pronto a respostas imedia- do, 32 alunos, de ambos os gêneros.
tas aos estímulos (BURGOS, 2006). Foram feitas avaliações (pré e pós)
Rosa Neto (2002) relaciona tono e aulas de Libras, utilizando o proto-
mente ao definir que a tonicidade é colo de Bateria Psicomotora (BPM),
uma forma de convivência pessoa- elaborado por Fonseca (1995).
família-sociedade. Os resultados apontaram após
O equilíbrio é mantido em fun- 72 aulas de LIBRAS aumento signi-
ção do aparelho vestibular, locali- ficativo de quase todos os fatores
zado no ouvido interno. E sensível a psicomotores avaliados, em 32 alu-

37
A PSICOMOTRICIDADE NO CONTEXTO DA EDUCAÇÃO ESPECIAL

nos acompanhados por intérpretes Vale a pena conferir alguns as-


da língua de sinais de escolas públi- pectos que foram comuns no estudo
cas, procurando caracterizar o de- realizado por Falkenbach, como: as
senvolvimento psicomotor com o características da DA descritas na li-
ensino de Libras. Pode-se sugerir teratura e nos diagnósticos iniciais
que o ensino de LIBRAS em questão das crianças protagonistas do estu-
influenciou de modo positivo o de- do; a convivência em um grupo mis-
senvolvimento psicomotor dessas to de crianças, que reuniu crianças
crianças, concluindo que a rotina de com necessidades educacionais e es-
atividades hábil-motrizes, desde que peciais e aquelas “normais”; bem co-
metodologicamente bem estrutura- mo o ato pedagógico como estímulo
das, é um aliado potencial ao ama- para as relações entre as crianças no
durecimento psicomotor infantil. grupo.
Em outro estudo, utilizando a Em relação ao primeiro as-
Psicomotricidade Relacional, Fal- pecto, das características da DA,
kenbach (2006), procurou investi- descritas na literatura e nos diagnós-
gar crianças com deficiência audi- ticos iniciais das crianças protago-
tiva reunidas com crianças “nor- nistas do estudo, o autor compreen-
mais” em sessões de psicomotrici- deu que o diagnóstico inicial não po-
dade relacional. O objetivo do es- de caracterizar-se por uma análise
tudo foi estudar o processo de brin- “bíblica” ou determinista do com-
car das crianças protagonistas do es- portamento e das possibilidades de
tudo, as experiências de jogo e de desenvolvimento da criança.
exercício. O estudo, de corte qualita- Nos estudos de Vygotsky
tivo, fez uso de vários instrumentos (1997) fica claro que tanto as crian-
para a coleta de informações tal ças com necessidades educacionais e
como: entrevistas, observações pau- especiais como aquelas “normais”
tadas, memoriais descritivos e aná- aprendem e se desenvolvem de for-
lise de documentos. A análise e in- ma idêntica. O aparecimento das
terpretação dos resultados permiti- funções superiores de conduta se dá
ram compreender que a intervenção no coletivo. O social é o provocador
pedagógica da prática da psicomo- das aprendizagens em seres huma-
tricidade relacional em conjunto nos.
com um grupo de criança misto per- Nesse sentido, no estudo do
mitiu ampliar e enriquecer a trajetó- desenvolvimento e da aprendizagem
ria de brincar, seus comportamentos infantil, é importante levar em con-
de jogo e de exercício.

38
A PSICOMOTRICIDADE NO CONTEXTO DA EDUCAÇÃO ESPECIAL

sideração, no mínimo, dois níveis de 3. A imitação favoreceu o desen-


desenvolvimento: primeiro - aquilo volvimento dos processos
que a criança é capaz de fazer por si mentais superiores das crian-
mesma, sua zona de desenvolvimen- ças protagonistas do estudo
to atual; segundo - aquilo que a cri- possibilitando novas formas
ança ainda não é capaz de fazer por de jogos, representações e per-
si mesma, mas que com a ajuda de sonagens, bem como de exer-
um modelo externo, de guias, ou dos cícios, de desafio, de explora-
professores poderá vir a ser capaz de ção e de uso plástico dos obje-
fazer, que é a zona de desenvolvi- tos;
mento potencial. Nesse aspecto a zo- 4. Os jogos entre as crianças pro-
na de desenvolvimento proximal se moveram o desenvolvimento
inscreve como todas as formas cole- dos processos mentais das cri-
tivas, vivências satisfatórias da cri- anças contribuindo com ideias
ança, que podem ajudar a ampliar as novas para brincar e, também,
capacidades iniciais do desenvolvi- o discernimento entre o que é
mento. fantasia e o que é realidade;
O repertório de movimentos 5. O ritmo do grupo favoreceu
das crianças foi provocado na convi- atitudes de descontração, de
vência das crianças com DA no dinamismo, de iniciativa, de
grupo misto, nas sessões de psico- curiosidade e de organização
motricidade relacional: frente às situações vivencia-
1. Os modelos diversos de brin- das, de acordo com as rotinas
car, jogos e exercícios amplia- da sessão;
ram a trajetória lúdicas das 6. A escuta e a valorização das
crianças protagonistas do es- crianças do grupo, em relação
tudo; ao momento da comunicação
2. A observação da movimenta- dos colegas permitiram a iden-
ção dos colegas se inscreveu tificação do momento de falar,
como uma forma inicial de in- bem como a ampliação do de-
teração e que ajudou no esta- senvolvimento das formas de
belecimento de confiança e de comunicação no grupo, seja de
segurança, premissas iniciais forma verbal, como tônica e
para o investimento relacional gestual;
nas brincadeiras com os cole-
gas;

39
A PSICOMOTRICIDADE NO CONTEXTO DA EDUCAÇÃO ESPECIAL

7. A atenção sobre a fala dos co- para brincar contribuíram pa-


legas ajudou no desenvolvi- ra o desenvolvimento da aten-
mento das ideias e dos proje- ção, percepção e envolvimento
das crianças no momento dos
tos de brincar.
ritos;
 A orientação dos professores
Em relação à ação pedagógica para a observação das crianças
como estímulo para as relações das em relação aos colegas do gru-
crianças protagonistas do estudo no po favoreceu a compreensão e
grupo, evidenciou-se que: o discernimento entre os mo-
 O ambiente que transmitiu se- mentos de brincar e de parar
gurança e acolhida favoreceu a de brincar;
descontração inicial das crian-  O estímulo e a orientação para
ças protagonistas do estudo a fazer e receber a massagem
integrarem-se como legítimos entre os colegas proporcionou
constituintes do grupo nas ses- a experiência de carinho e o
sões de psicomotricidade rela- exercício de vínculo das crian-
cional; ças com os colegas.
 A disponibilidade dos profess-
Nas crianças com DA, a provo-
sores em emprestar o corpo,
brincar junto e proporcionar o cação para o brincar e as diversas ex-
meio lúdico necessário para a periências corporais provocadas,
manifestação do outro permi- ajudadas pelos professores e pelos
tiu o estabelecimento da moti- colegas, que participaram das ses-
vação inicial para as primeiras sões de psicomotricidade relacional,
relações das crianças protago-
contribuíram para as novas relações.
nistas do estudo com os pro-
fessores; Este aspecto relacional é provocador
 As relações iniciais com os do simbolismo e da necessidade de
professores criaram as pontes comunicação nessas crianças. Se a
necessárias para os jogos cole- aquisição dos processos mentais su-
tivos, que permitiram as rela- periores se dá através do meio e o
ções entre as crianças; brincar é provocador de novas zonas
 A orientação para brincar em proximais na criança, então a psico-
conjunto e cooperar com os
motricidade relacional, que se uti-
colegas contribuiu para o
olhar das crianças protagonis- liza do brincar como instrumento
tas do estudo sobre os seus co- para o desenvolvimento e aprendi-
legas do grupo; zagem infantil, possibilita um ambi-
 A utilização dos recursos pe- ente fundamental para a ampliação
dagógicos como as estórias, os das aprendizagens das crianças com
desenhos e as demonstrações DA.

40
A PSICOMOTRICIDADE NO CONTEXTO DA EDUCAÇÃO ESPECIAL

É importante destacar, ainda, Agora cabe a você profissional,


que o processo vivenciado pelas cri- agir com o coração, desprendimento
anças ultrapassou as fronteiras da e comprometimento em prol do de-
sala de psicomotricidade e foram se senvolvimento total dos nossos/seus
manifestar nas relações com os fa- alunos.
miliares. Os registros feitos pelos
pais, ou que eram ditos pessoalmen-
te ratificam essas evidências.
Antes de finalizar estas consi-
derações é importante destacar que
as repercussões na vida do grupo das
crianças não ficaram restritas às cri-
anças protagonistas do estudo, mas
também foram constantes no com-
portamento relacional das demais
crianças “normais”. O carinho e a
amizade desenvolvidos e comparti-
lhados no processo das sessões, em
conjunto com as crianças protago-
nistas do estudo, sinalizaram fran-
cas evidências que fundamentam
aprendizagens significativas para as
crianças “normais”.
Como pudemos observar por
meio de vários relatos e resultados
de pesquisas de cunho científico, a
psicomotricidade, quer seja utilizan-
do a Bateria Psicomotora (BPM) de
Vítor da Fonseca ou outros instru-
mentos na mesma linha e a psico-
motricidade relacional vem contri-
buir para o desenvolvimento não só
motor como afetivo, social, intelec-
tual, integral dos nossos semelhan-
tes que apresentam alguma necessi-
dade especial.

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A PSICOMOTRICIDADE NO CONTEXTO DA EDUCAÇÃO ESPECIAL

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