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TRIBUNAL DE JUSTIÇA

PODER JUDICIÁRIO
São Paulo

Registro: 2019.0000787452

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível nº


1001917-86.2018.8.26.0299, da Comarca de Jandira, em que são apelantes S. R. C.
e A. B. DE O. C., é apelado O J..

ACORDAM, em 9ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de


Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: "Deram provimento ao recurso. V.
U.", de conformidade com o voto do Relator, que integra este acórdão.

O julgamento teve a participação dos Exmos. Desembargadores


GALDINO TOLEDO JÚNIOR (Presidente) e JOSÉ APARÍCIO COELHO PRADO
NETO.

São Paulo, 24 de setembro de 2019.

PIVA RODRIGUES

RELATOR

Assinatura Eletrônica
TRIBUNAL DE JUSTIÇA
PODER JUDICIÁRIO
São Paulo

APELAÇÃO CÍVEL Nº 1001917-86.2018.8.26.0299

APELANTE: Sergio Ricardo Capuano e Andrea Baptista


de Oliveira Capuano

COMARCA: Jandira 2ª Vara

VOTO: 34679

Apelação. Pedido de alteração do regime de bens. Casal


que contraiu matrimônio no ano de 1999, no regime da
comunhão parcial de bens e pretende sua alteração para a
participação final nos aquestos. O Código Civil de 2002
passou a prever a mutabilidade do regime matrimonial
desde que cumpridos os seguintes requisitos: pedido sólido
e motivado de ambos os cônjuges, autorização judicial e
preservação do interesse de terceiros. Presente justo
motivo. Não se vislumbra potencial prejuízo a terceiros,
uma vez que a mudança do regime de bens somente
produzirá efeitos para as dívidas contraídas após o trânsito
em julgado da sentença que reconhecer a pretensão (ex
nunc). Recurso provido.

Trata-se de apelação contra a sentença (fls. 65/66)


proferida pela MMª Juíza de Direito da 2ª Vara da Comarca de Jandira, Drª Juliana
Moraes Corregiari Bei, de relatório adotado, que julgou improcedente o pedido de
alteração de regime de bens postulado pelo casal.

Apelam os autores. Pugnam pela reforma da r.


sentença, a fim de que seja decretada a alteração do regime de bens do casamento
dos apelantes de comunhão parcial de bens para participação final nos aquestos.
Sustentam serem empresários, possuindo empresas distintas, necessitando de maior
liberdade e autonomia para disposição de seus bens para poderem desenvolver de
forma plena suas atividades empresariais. Aduzem que o regime de bens é situação
jurídica que emana apenas da vontade dos contraentes, não podendo haver limitação
ao exercício regular do direito. Aduzem que a modificação incidental do regime de
bens não afeta eventuais direitos de terceiros, uma vez que os artigos 1.632, §2º do
Código Civil e 734 do Código de Processo Civil expressamente ressalvam os seus

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interesses.

Recurso distribuído a esta Relatoria em 06.05.2019.

A Douta Procuradoria Geral de Justiça opinou pelo não


provimento do apelo, por entender que “a existência de eventuais dívidas,
justamente como ocorre no caso dos autos, impede a homologação pretendida”. (fls.
88/91).

É o relatório.

O recurso comporta provimento.

Os autores contraíram matrimônio no dia 21 de julho


de 1999, quando optou pelo regime da comunhão parcial de bens, conforme certidão
acostada a fl. 12.

Sob a égide do Código Civil de 1916, vigorava o


princípio da imutabilidade do regime de bens escolhido pelos cônjuges, como se
extrai do seu artigo 230: “O regime dos bens entre cônjuges começa a vigorar desde
a data do casamento, e é irrevogável”.

Com o advento do novo Código Civil, a regra foi


alterada para permitir aos cônjuges a alteração do regime de bens original, desde que
observados os requisitos trazidos no artigo 1.639, § 2º, segundo o qual:

"É admissível alteração do regime de bens, mediante autorização judicial


em pedido motivado de ambos os cônjuges, apurada a procedência das
razões invocadas e ressalvados os direitos de terceiros".

Tal regra foi igualmente prevista no caput do art. 734


do Novo Código de Processo Civil, in verbis:

"A alteração do regime de bens do casamento, observados os requisitos


legais, poderá ser requerida, motivadamente, em petição assinada por

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ambos os cônjuges, na qual serão expostas as razões que justificam a


alteração, ressalvados os direitos de terceiros".

Pois bem. Afiguram-se observados, in casu, todos os


requisitos legais exigidos à pretensão de alteração do regime de bens.

O pleito restou devidamente justificado. Esclareceram


os apelantes serem ambos empresários, possuindo empresas distintas, necessitando
de maior liberdade e autonomia para disposição de seus bens para poderem
desenvolver de forma plena suas atividades empresariais.

Ainda que assim não fosse, como bem se extrai do


parecer ministerial (fl. 90), consoante ensinamentos de Maria Berenice Dias, “se os
cônjuges, antes do casamento, podem livremente eleger o regime de bens, descabido
que a sua alteração, durante o casamento, necessite de uma justificativa a ser
homologada judicialmente. Para se contornar a absurda exigência, nada impede
que os cônjuges se divorciem e casem novamente, elegendo o regime de bens que
desejarem, sem a necessidade de se submeterem à ação judicial”1.

No mesmo sentido, já decidiu o Colendo Superior


Tribunal de Justiça: “(...) a melhor interpretação que se deve conferir ao art. 1.639,
§ 2º, do CC/02 é a que não exige dos cônjuges justificativas exageradas ou provas
concretas do prejuízo na manutenção do regime de bens originário, sob pena de se
esquadrinhar indevidamente a própria intimidade e a vida privada do consortes.”
(REsp nº.1.119.2462/MGMG, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, 4ª Turma,
j. em 26.02.2013, DJe 12.03.2013)

Com a devida vênia, a mera existência de dívidas não


pode constituir óbice à alteração pretendida. Em que pese a existência de execuções
em que os apelantes figuram como devedores, consoante certidões de 27/28, é certo
que não se vislumbra qualquer prejuízo a terceiros, uma vez que a mudança do

1Manual de direito das famílias [livro eletrônico]. 4ª Edição - São Paulo: RT, 2016, Item 18.11.1,
pág. 554.

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regime de bens somente produzirá efeitos para as dívidas contraídas após o trânsito
em julgado da sentença que reconhecer a pretensão.

Assim, como a mudança do regime de bens somente


produzirá efeitos para as dívidas contraídas após o trânsito em julgado da sentença
que reconhecer a pretensão, é certo que, até lá, os credores continuam garantidos por
todos os bens até então pertencentes ao casal no regime da comunhão parcial de
bens.

Consigne-se por fim, que, diversamente do que consta


da inicial, a pretensão de alteração do regime de bens deduzida no recurso não alude
à adoção de efeitos retroativos. Limita-se o recorrente a requerer a alteração do
regime. Daí o integral, e não parcial, provimento ao presente recurso.

Por tais fundamentos, dá-se provimento ao recurso.

PIVA RODRIGUES

Relator

Apelação Cível nº 1001917-86.2018.8.26.0299 -Voto nº 34679 5

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