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honra, contra a liberdade individual e contra o patrimônio. Conheça aqui os principais tipos penais
previstos no título I e II da parte especial do Código Penal.
Aprenda sobre os crimes à periclitação da vida e da saúde e suas noções gerais. Estude sobre os delitos
contra a honra e seus contornos. Por fim, conheça sobre os delitos que atentam contra a liberdade individual
e contra o patrimônio.
O capítulo III do Código Penal compreende oito figuras delitivas, dentre as quais se destacam os delitos de
perigo de contágio venéreo, de moléstia grave ou de perigo para a vida ou saúde de outrem, o crime de
abando de incapaz e de recém-nascido, e ainda os delitos de omissão de socorro e maus tratos. Neste tópico,
estudaremos os contornos desses tipos penais.
1.1 Crimes de perigo: perigo de contágio venéreo, perigo
de contágio de moléstia grave e perigo para a vida ou
saúde de outrem (CP, art. 130 a 132)
O delito de perigo de contágio venéreo é previsto no art. 130 do Código Penal, nos seguintes termos: “expor
alguém, por meio de relações sexuais ou qualquer ato libidinoso, a contágio de moléstia venérea, de que
sabe ou deve saber que está contaminado: Pena - detenção, de três meses a um ano, ou multa” (BRASIL,
1940). Deve-se destacar que, se a conduta do agente é intencional (preordenada pelo desejo de transmitir a
moléstia), a pena será de reclusão, de um a quatro anos, e multa, nos termos do art. 130, §1º do CP.
Dessa forma, tipifica-se a conduta de quem, conhecendo estar acometido de doença venérea, expõe a vítima
a perigo de contágio, mediante a prática de relações sexuais ou qualquer ato de libidinagem, assim
entendidos como atos que decorrem de contato pessoal com fins de deixar aflorar a libido, o desejo sexual
do agente (GRECO, 2017).
A expressão “doença venérea” trata-se de norma penal em branco, pois exige que sua complementação seja
feita por outro ato normativo. Dessa forma, cabe ao Ministério da Saúde elencar as doenças reputadas
“moléstias venéreas” (GRECO, 2017).
O delito, por se tratar de crime de perigo concreto, é consumado quando, “por meio de relação sexual ou
qualquer ato libidinoso, a vítima tenha se encontrado numa situação de possível contaminação da doença
venérea da qual o agente era portador” (GRECO, 2017). A tentativa, por sua vez, também é admissível.
Se da conduta do agente decorrer dano, isto é, “lesões corporais leves, prevalece o crime do art. 130. Porém,
se dela resultar lesão corporal grave ou gravíssima, responderá o agente pelo crime do art. 129, § 1º ou § 2º,
respectivamente e se resultar morte, responderá por lesão corporal seguida de morte" (TELES, 2006 apud
GRECO, 2017).
Consentimento do ofendido: Greco entende que, sendo a moléstia transmitida encontrada “no rol daquelas
que causam perturbação orgânica de natureza leve, poderá a vítima, sabendo dessa situação, consentir no ato
sexual, afastando, consequentemente, a ocorrência do delito”. Porém, se a doença venérea produzir lesão
corporal de natureza grave, gravíssima, ou morte, o consentimento não será válido (GRECO, 2017).
Por outro lado, o delito previsto no art. 131 do Código Penal tipifica a conduta de “praticar, com o fim de
transmitir a outrem moléstia grave de que está contaminado, ato capaz de produzir o contágio”, apenando-a
com reclusão, de um a quatro anos, e multa. Se a ação do agente resultar em lesão, ou morte (nos termos do
art. 129, §3º do CP), ele responderá pelo resultado.
Neste caso, o delito de perigo de contágio de moléstia grave trata-se de delito de dano que se consuma com a
exteriorização do comportamento dirigido a esse fim, independentemente da contaminação da vítima, sendo,
portanto, crime formal. É, neste caso, também, admissível a tentativa (GRECO, 2017).
O delito tem forma livre, sendo praticado independentemente de qualquer contato sexual, de forma direta
(contato pessoal) ou indireta (através de instrumento). O conceito de moléstia grave também depende de
definição pelo Ministério da Saúde (GRECO, 2017).
Por fim, o delito de perigo para à vida ou saúde de outrem, previsto no art. 132 do Código Penal, tipifica a
conduta de “expor a vida ou a saúde de outrem a perigo direto e iminente”. Segundo a doutrina de Rogério
Greco (2017), trata-se de delito subsidiário (apenas se configura quando não se consuma delito mais grave),
de perigo concreto e que possui vítima individualizada ou individualizável, “não se confundindo, portanto, o
crime em questão com os de perigo comum ou contra a incolumidade pública”.
Deve-se ressaltar que, para a configuração do delito, é necessário que o agente não tenha o dolo de causar
dano, mas tão somente a vontade dirigida a criar a situação de perigo. Porém, se da conduta decorrer dano, o
agente responderá pelo resultado.
Deve-se, ainda, registrar que o tipo penal descrito no art. 132, contém, em seu parágrafo único, causa
especial de aumento de pena quando a probabilidade de dano decorrer do “do transporte de pessoas para a
prestação de serviços em estabelecimentos de qualquer natureza, em desacordo com as normas legais”.
Segundo Greco (2017), a norma visou a coibir o “transporte clandestino e perigoso de trabalhadores, a
exemplo do que ocorre, inclusive, em propriedades privadas, com os chamados ‘boias-frias’”.
1.2 Abandono de incapaz ou de recém-nascido (CP, art.
133 e art. 134)
O delito de abandono de incapaz é previsto no art. 133 do Código Penal, enquanto o delito de abandono de
recém-nascido é previsto no art. 134 do mesmo diploma legal.
Primeiramente, a conduta de abandonar incapaz caracteriza-se quando o agente abandona pessoa que está
sob seu cuidado, guarda, vigilância ou autoridade, e, por qualquer motivo, incapaz de defender-se dos riscos
resultantes do abandono. Segundo Masson (2016), para configuração do delito o abandono deve ser real, ou
seja, “depende de separação física, distanciamento entre o responsável e o incapaz”, não sendo punível a
conduta quando é “o incapaz quem abandona seu protetor”.
Ensina Rogério Greco que o tipo penal definiu expressamente quem seria o sujeito ativo do delito, a partir
da caracterização daqueles que tem o dever de cuidado, de guarda de vigilância e de autoridade, assim
explicando (HUNGRIA, 2016 apud GRECO, 2017):
O texto legal “fala, minudentemente, em relação de cuidado, guarda,
vigilância e autoridade. Cuidado significa a assistência a pessoas que,
de regra, são capazes de valer a si mesmas, mas que, acidentalmente,
venham a perder essa capacidade (ex.: o marido é obrigado a cuidar da
esposa enferma, e vice-versa). Guarda é a assistência a pessoas que não
prescindem dela, e compreende necessariamente a vigilância. Esta
importa em zelo pela segurança pessoal, mas sem o rigor que caracteriza
a guarda, a que pode ser alheia (ex.: o guia alpino vigia pela segurança
de seus companheiros de ascensão, mas não os tem sob sua guarda).
Finalmente, a assistência decorrente da relação de autoridade é a
inerente ao vínculo de poder de uma pessoa sobre outra, quer a potestas
seja de direito público, quer de direito privado. Se a violação do dever
de assistência é praticada por ascendente, descendente, cônjuge, irmão,
tutor ou curador, dá-se uma agravante especial”.
Por sua vez, o sujeito passivo será aquele que se encontra sob os cuidados, guarda, vigilância ou autoridade
do sujeito ativo (GRECO, 2017). O delito pode ser praticado de forma omissiva, ou comissiva, admitindo-se
a tentativa, mas não a modalidade culposa, por ausência de previsão.
Se do abandono resultar lesão corporal de natureza grave ou morte, a pena imputada ao ganhará novos
contornos, sendo de reclusão – de um a cinco anos, no primeiro caso e de reclusão, de quatro a doze anos, no
segundo –, nos termos dos parágrafos primeiro e segundo do art. 133 do Código Penal, respectivamente.
Essas figuras são consideradas crimes preterdolosos, em que o resultado morte ou lesão não é desejado pelo
agente (GRECO, 2017).
A pena, será majorada em até um terço, se o abandono ocorre em lugar ermo, se o agente é ascendente ou
descendente da vítima, cônjuge (não se admite a majoração quando se tratar de companheiro, haja vista que
entender de outra forma seria analogia in malam partem), irmão, tutor ou curador da vítima ou ainda se a
vítima é maior de 60 anos.
Por outro lado, o delito descrito no art. 134 do Código Penal consiste em “expor ou abandonar recém-
nascido, para ocultar desonra própria”. Para este caso, primeiramente, exige-se que a vítima seja recém-
nascida. Segundo Greco (2017), refere-se àquele “que acabou de nascer [...] ou aquele que possui poucas
horas ou mesmo alguns dias de vida” - punindo-se tanto a conduta de quem expõe a risco ou abandona – o
que, no entender da doutrina são conceitos sinônimos (HUNGRIA, 2016 apud GRECO, 2017).
Por fim, exige-se também que o agente tenha o dolo específico de buscar, com o seu comportamento, ocultar
desonra própria, isto é, para que sua honra não seja maculada (GRECO, 2017). Disso decorre o fato de se
tratar de delito de mão própria, pois somente pode ser cometido pela mãe do recém-nascido, pois a mácula à
honra que pretende ser ocultada é a honra daquela mãe. Nesse caso, o delito é consumado quando a vida do
neonato é exposta a risco (GRECO, 2017).
O artigo 134 do CP, em seus parágrafos primeiro e segundo, também traz hipóteses de abandono de recém-
nascido qualificadas pelo resultado. Assim, se do fato resulta lesão corporal de natureza grave, a pena será
de detenção, de um a três anos, e, se resultar em morte, a pena será de detenção, de dois a seis anos.
Novamente, são crimes preterdolosos, em que o resultado não é desejado pelo agente (GRECO, 2017).
1.3 Omissão de socorro (CP, art. 135)
O delito previsto no art. 135 do Código Penal descreve a conduta de “deixar de prestar assistência, quando
possível fazê-lo sem risco pessoal, à criança abandonada ou extraviada, ou à pessoa inválida ou ferida, ao
desamparo ou em grave e iminente perigo; ou não pedir, nesses casos, o socorro da autoridade pública”
(BRASIL, 1940), sendo cominada pena de detenção, de um a seis meses, ou multa. A pena ainda poderá ser
aumentada “de metade, se da omissão resulta lesão corporal de natureza grave, e triplicada, se resulta a
morte”, nos termos do parágrafo único do mesmo dispositivo legal.
Segundo Greco (2017), o sujeito passivo do delito refere-se a:
Por criança abandonada ou extraviada devemos entender aquela que, de
acordo com o art. 2º do Estatuto da Criança e do Adolescente (Lei n.
8.069/90) não tenha, ainda, completado 12 anos de idade e que tenha,
por algum motivo, sido abandonada à própria sorte por aqueles que
eram seus responsáveis ou, no caso da criança extraviada, que tenha
com eles perdido o contato ou a vigilância, não sabendo retornar ao seu
encontro. Pessoa inválida, segundo a concepção de Hungria, “é toda
aquela que, entregue a si mesma, não pode prover a própria segurança,
seja isto por suas próprias condições normais ou por acidente (velhos,
enfermos, aleijados, paralíticos, cegos etc.)”. Pessoa ferida é aquela que
teve ofendida sua integridade corporal ou saúde, seja por ação de
terceiros, caso fortuito ou até mesmo por vontade própria, como no caso
daquele que tentou contra a própria vida e conseguiu sobreviver, sendo
incapaz de, por si mesmo, buscar auxílio a fim de evitar a produção de
um dano maior à sua pessoa. Em ambas as hipóteses, ou seja, pessoa
inválida ou ferida, a vítima deve encontrar-se ao desamparo, isto é,
abandonada, sem os cuidados exigidos à manutenção da sua integridade
corporal ou saúde, bem como da sua vida.
Dessa forma, o crime se consuma quando o agente omitir-se frente à situação em que deveria prestar socorro
direto em razão da vítima encontrar-se em “grave e iminente o perigo que ameaça atualmente a vida da
pessoa ou, de modo notável, a sua incolumidade física ou fisiológica” (HUNGRIA, 2016 apud GRECO,
2017).
Também se consuma o delito quando o autor omitir-se de prestar socorro indireto, ao não solicitar socorro à
autoridade pública, sendo certo ainda que o “recurso à autoridade pública (assistência mediata) é subsidiário,
ou seja, é cabível apenas quando se revelar capaz de arrostar tempestivamente o perigo ou quando a
assistência direta oferecer riscos à incolumidade do agente” (PRADO, 2016 apud GRECO, 2017).
O delito em análise não admite a tentativa, segundo a doutrina majoritária, se consumando quando “o
omitente deixar passar a última oportunidade de realizar a ação de salvamento esperada antes que ocorra o
aumento do perigo, a diminuição das chances de salvamento ou a ocorrência do dano” (GALVÃO, 2016
apud GRECO, 2017).
Deve-se ressaltar que o delito impõe um dever de solidariedade e, dessa forma, caso alguém tenha prestado
socorro de forma eficiente, não se pode imputar aos que se quedaram inertes o delito do art. 135 do Código
Penal (GRECO, 2017).
1.4 Condicionamento de atendimento médico hospitalar
(art. 135-A)
Em vários diplomas normativos já se vedava a prática de exigir qualquer caução para prestação de
atendimento médico-hospitalar Buscando repreender de forma mais sistemática essa conduta é que a Lei n.
12.653, de 28 de maio de 2012, inseriu no Código Penal o delito previsto no art. 135-A, que é a hipótese de
omissão de socorro especial (GRECO, 2017).
Nesse sentido, sanciona-se com pena de detenção, de três meses a um ano, e multa a conduta daquele que
“exigir cheque-caução, nota promissória ou qualquer garantia, bem como o preenchimento prévio de
formulários administrativos, como condição para o atendimento médico-hospitalar emergencial”. (GRECO,
2017)
Dessa forma, proíbe-se a conduta de condicionar o atendimento médico-hospitalar emergencial (necessário
de forma imediata) a qualquer procedimento burocrático, entendido este como a exigência de prévia garantia
ou de formulários administrativos.
O delito em análise é consumado quando a situação da vítima é agravada em razão da exigência da
condicionante burocrática, dessa forma, como a conduta de “exigir” não admite fracionamento, o tipo penal
não admite a tentativa (GRECO, 2017).
Segundo Greco (2017), pode ser sujeito ativo qualquer pessoa que realiza o atendimento médico-hospitalar
emergencial. Entendendo também que:
Normalmente, quem estipula essas condições para efeitos de
atendimento é o diretor do estabelecimento de saúde ou qualquer outro
gestor que esteja à frente da administração. O problema surge quando o
empregado, que trabalha no setor de admissão de pacientes, cumpre as
ordens emanadas da direção e não permite o atendimento daquele que se
encontrava em situação de emergência. Nesse caso, entendemos que
haverá o concurso de pessoas, devendo, ambos (diretor e empregado)
responderem pela infração penal em estudo.
A pena do mencionado delito é ainda majorada se da exigência resulta morte ou lesão grave, nos termos do
parágrafo único do art. 135-A.
1.5 Delito de maus tratos (CP, art. 136)
O delito de maus tratos é previsto no art. 136 do Código Penal, descrevendo a conduta de “expor a perigo a
vida ou a saúde de pessoa sob sua autoridade, guarda ou vigilância, para fim de educação, ensino, tratamento
ou custódia, quer privando-a de alimentação ou cuidados indispensáveis, quer sujeitando-a a trabalho
excessivo ou inadequado, quer abusando de meios de correção ou disciplina”, apenando-a com pena de
detenção, de dois meses a um ano, ou multa. A pena ainda é aumentada de um terço se o crime é praticado
contra vítima menor de 14 anos.
Nessa perspectiva, trata-se de delito próprio, pois somente pode ser cometido por quem possui autoridade,
guarda ou vigilância da vítima. É também exigível que o agente atue com especial fim de agir, ou seja,
busque com sua conduta educar, fornecer tratamento ou custódia.
O tipo penal em análise também descreve os meios que caracterizam os maus tratos (TELES, 2006 apud
GRECO, 2017):
Ainda que realizadas as condutas típicas, o delito somente se consuma com a concreta exposição da vida ou
saúde da vítima a perigo. É admissível a tentativa, bem como a prática do delito de forma comissiva e
omissiva.
O delito prevê as formas qualificadas, sendo a pena de reclusão de um a quatro anos, se dos maus-tratos
resulta lesão grave e de quatro a doze anos se resulta morte. Os delitos são preterdolosos nessa modalidade
(GRECO, 2017).
Diferentemente da calúnia, podem ser vítimas do delito as pessoas jurídicas, sem maiores controvérsias. O
sujeito ativo também não exige nenhuma qualificação especial. Embora inexista previsão específica, o
agente que propaga ou divulga o fato desabonador também deve responder como incurso no art. 139 do
Código Penal, haja vista que com sua conta também imputa a alguém fato ofensivo a sua reputação.
O parágrafo único do art. 139 também prevê a possibilidade de exceção da verdade quando o ofendido é
funcionário público e a ofensa é relativa ao exercício da sua função e quando o ofendido ainda desempenha
a função pública.
2.3 Injúria (CP, art. 140)
A conduta tipificada no art. 140 do Código Penal, nomeada injúria simples, consiste em ofender a dignidade
ou o decoro de alguém, sendo a conduta apenada com pena de detenção, de um a seis meses, ou multa. Ao
contrário dos delitos de calúnia e difamação o delito de injúria busca tutelar a honra subjetiva do ofendido
(GRECO, 2017).
Segundo Greco (BRUNO, 1976 apud GRECO, 2017), a ofensa ao decoro ou dignidade de alguém pode ser
assim explicada:
A diferença entre esses dois elementos do tipo é tênue e imprecisa, o
termo dignidade podendo compreender o decoro. Entre nós costumava-
se definir a dignidade como o sentimento que tem o indivíduo do seu
próprio valor social e moral; o decoro como a sua respeitabilidade.
Naquela estariam contidos os valores morais que integram a
personalidade do indivíduo; neste as qualidades de ordem física e social
que conduzem o indivíduo à estima de si mesmo e o impõem ao respeito
dos que com ele convivem. Dizer de um sujeito que ele é trapaceiro
seria ofender sua dignidade. Chamá-lo de burro, ou de coxo seria atingir
seu decoro.
Dessa forma, no delito de injúria não se imputam fatos, mas atributos negativos à pessoa. consumando-se a
injúria quando a vítima toma conhecimento das palavras ofensivas à sua dignidade ou decoro (GRECO,
2017).
Como o bem jurídico tutelado é a honra subjetiva, o sujeito do crime não poderá ser pessoa morta ou pessoa
jurídica, pois “estas não possuem a capacidade para o sentimento da própria honorabilidade ou
respeitabilidade” (GALVÃO, 2016 apud GRECO, 2017). Admite-se a tentativa, a depender do meio
utilizado.
A figura qualificada, prevista no parágrafo segundo, chamada de injúria real, requer que a injúria consista
em violência ou vias de fato, ou, ainda, que, por sua natureza ou pelo meio empregado, se considerem
aviltantes. Nesse caso, é apenada com detenção de três meses a um ano e multa, além da pena
correspondente à violência.
No parágrafo terceiro há previsão da injúria preconceituosa, que consiste na ofensa com utilização de
elementos referentes à raça, cor, etnia, religião, origem ou a condição de pessoa idosa ou portadora de
deficiência, sancionada com reclusão de um a três anos e multa.
Segundo o parágrafo primeiro do art. 140 do Código Penal, que contempla hipóteses de perdão judicial, o
juiz poderá deixar de aplicar a pena quando o ofendido de forma reprovável, provocou diretamente a injúria,
ou no caso de retorsão imediata, que consista em outra injúria.
A possibilidade de revista pessoal é prevista no art. 244 do Código de Processo Penal como medida
excepcional, somente sendo possível nas hipóteses ali delineadas. Dessa forma, a revista pessoal feita pelo
empregador, de forma habitual, configura abuso na relação de trabalho e, se “baseada na ameaça de despedir
o empregado que não se submete a revista pessoal, pode viabilizar a imputação objetiva do crime de
constrangimento ilegal” (GALVÃO, 2016 apud GRECO, 2017).
3.2. Ameaça (CP, art. 147)
O delito de ameaça está previsto no art. 147 do Código Penal, no âmbito dos delitos contra a liberdade
individual. Porém, esse delito merece especial destaque, em razão do expressivo número de casos que
ocorrem diariamente no país. A conduta da ameaça consiste em “ameaçar alguém, por palavra, escrito ou
gesto, ou qualquer outro meio simbólico, de causar-lhe mal injusto e grave” sendo tal ação apenada com
detenção, de um a seis meses, ou multa.
Segundo Greco (2017) o delito possui forma livre, sendo feita por palavras, escritos ou gestos. De tal
previsão decorre que o autor pode utilizar até mesmo de elementos simbólicos para intimidar a vítima.
Nesse sentido Hungria dispõe que a ameaça poderá ser:
A ameaça pode ser direta (quando o mal anunciado se refere à pessoa ou patrimônio do sujeito passivo) ou
indireta (ameaça de dano a uma pessoa vinculada ao sujeito passivo por especiais relações de afeto). Pode
ainda ser explícita ou implícita (exemplo desta segunda espécie: um indivíduo escreve a outro que, para
resolver a dissenção entre ambos, ‘não tem medo de ir para a cadeia’. (HUNGRIA, 2016 apud GRECO,
2017)
Além das classificações apresentadas por Hungria, a ameaça ainda poderá ser condicional (mal ameaçado
está condicionado a adoção de comportamento pelo sujeito passivo, ocorrendo, por exemplo, quando alguém
ameaça mantar outrem caso este não lhe conte um segredo), ou reflexa (ameaça dirigida a terceira pessoa
que mantém vínculo com o sujeito passivo como alguém que diz a vítima que matará seu filho).
Para configuração típica, é necessário que o mal prometido à vítima seja injusto, isto é, contrarie o
ordenamento jurídico. Também deve se tratar de mal grave, capaz de imbuir na vítima medo de que aquela
promessa venha se concretizar. Dessa forma, Greco (2017) exemplifica que será atípica a conduta de quem
prometer a vítima “que irá cortá-la do seu círculo de amizades, que não a convidará para sua festa de
casamento etc.”.
Quanto à necessidade de que o mal seja futuro, o tema é objeto de controvérsia doutrinária. Parte da doutrina
entende que o tipo penal não exige que o mal seja futuro, sendo, portanto, um indiferente penal. De outro
lado, Greco justifica a necessidade de que o mal seja injusto:
A ameaça tem como bem juridicamente protegido a liberdade psíquica
da vítima e, em algumas situações, a sua própria liberdade física, que
fica inibida quando a parte psicológica é abalada. Para que isso ocorra, a
vítima deve conviver com a angústia do cumprimento da promessa do
mal injusto e grave. Deve ter tido tempo suficiente para buscar socorro
das autoridades competentes, se for do seu interesse, uma vez que
também a instauração de inquérito policial ou mesmo do termo
circunstanciado, próprio dos Juizados Especiais Criminais, estará a ela
subordinado. Por outro lado, quando há uma promessa de mal imediato,
caso este venha a ser concretizado, a ameaça ficará por ele absorvida.
(GRECO, 2017)
Ameaça supersticiosa: ocorre quando o autor, conhecendo a crença da vítima em simpatias, macumbas ou
similares, ameace-a dizendo que se utilizará desses meios para que um mal injusto a atinja. Dessa forma,
segundo a doutrina de Greco (2017), a ameaça será capaz de lesar o bem jurídico tutelado, qual seja a
liberdade psíquica da vítima, sendo, portanto, conduta típica.
Trata-se de delito que pode ser cometido por qualquer pessoa, exigindo-se apenas do sujeito passivo que ele
tenha capacidade para compreender a gravidade e a ilicitude do mal proferido pelo autor (GRECO, 2017).
A ameaça é considerada delito formal. Portanto, o delito é consumado ainda que a vítima “não tenha se
intimidado ou mesmo ficado receosa do cumprimento da promessa do mal injusto e grave” (GRECO, 2017),
devendo observar apenas se a ameaça é suficientemente apta a gerar temor.
Quanto à possibilidade da tentativa, há divergência doutrinária. Greco (2017) sobre o tema dispõe que:
Noronha, com precisão, afirma: “Não obstante delito formal, admite ela
doutrinariamente a tentativa, por ser fracionável, por apresentar um iter.
É perfeitamente configurável a tentativa de ameaça por carta, ao
contrário do que parece ao douto Hungria, ao refutar Carrara, que alude
à carta ameaçadora extraviada, dizendo que só se ficou em atos
preparatórios. Cita em seu abono Longo, porém não procede a opinião.
O envio, remessa ou expedição de uma carta não é ato preparatório. Se
assim fosse, onde estaria a execução do delito? Quando ela fosse aberta
pelo destinatário (ação executada pelo sujeito passivo) ou ele a lesse
(consumação)? Atos preparatórios, no caso, serão, v.g., a aquisição do
papel, da tinta etc. A remessa é pleno ato de execução. O recebimento
por outrem caracteriza a circunstância alheia à vontade do agente.
Por fim, é importante destacar a previsão contida no art. 147, parágrafo único, que dispõe que o
processamento do delito somente ocorre mediante representação da vítima (BRASIL, 1940).
3.3 Sequestro e cárcere privado (CP, art. 148)
Nos termos do que dispõe o art. 148, o delito de sequestro e cárcere privado consiste em “privar alguém de
sua liberdade, mediante sequestro ou cárcere privado”, sendo cominada sanção de reclusão, de um a três
anos.
O delito será qualificado, com pena de reclusão de dois a cinco anos, quando a vítima é ascendente,
descendente, cônjuge, maior de 60 anos ou menor de 18 anos, e inclusive, quando se trata de
companheiro do agente, conforme redação dada pela Lei n. 11.106, de 28 de março de 2005. Igualmente,
quando o crime é praticado mediante internação da vítima em casa de saúde ou hospital, quando a privação
da liberdade dura mais de quinze dias, ou ainda quando o crime é praticado com fins libidinosos (BRASIL,
1940, art. 148, §1º). Nos termos do art. 148, § 2º do mesmo Código, se do sequestro resulta grave sofrimento
físico ou moral a pena será de reclusão, de dois a oito anos.
Embora o Código Penal trate o sequestro e o cárcere privado como condutas distintas, a doutrina as
considera idênticas (GRECO, 2017). Logo, o crime se consuma quando se impõem restrições à liberdade de
locomoção da vítima, que fica impedida de ir, vir ou mesmo de permanecer no local onde quer, sendo
plenamente admissível a tentativa, haja vista se tratar de crime permanente, cuja consumação se prolonga no
tempo. Ressaltamos que a conduta típica pode ser realizada por comissão ou omissão, posto que o
impedimento à liberdade de locomoção pode ocorrer, segundo Greco (2017), por “detenção, quando
praticado comissivamente” ou “retenção, quando levado a efeito omissivamente”.
Na esteira de entendimento de Hungria, citado por Greco, o delito se consuma, inclusive quando inexistem
barreiras físicas impostas à vítima, como ocorre no caso em que a “vítima não possa livrar-se por
inexperiência ou ignorância das condições do local, ou por estar sob vigilância” (HUNGRIA 2016 apud
GRECO, 2017).
O delito é comum e pode ser praticado e sofrido por qualquer pessoa. Porém, como adverte Greco (2017),
“se o crime for praticado por funcionário público no exercício de suas funções, aplica-se, de acordo com o
princípio da especialidade, a alínea a do art. 3º da Lei n. 4.898/1965 (abuso de autoridade)”.
3.4 Redução à condição análoga a de escravo (CP, art.
149)
O crime tipificado no art. 149 do Código Penal descreve a conduta de “reduzir alguém à condição análoga à
de escravo, quer submetendo-o a trabalhos forçados ou a jornada exaustiva, quer sujeitando-o a condições
degradantes de trabalho, quer restringindo, por qualquer meio, sua locomoção em razão de dívida contraída
com o empregador ou preposto”, sancionando essa conduta com pena de reclusão, de dois a oito anos, e
multa, além da pena correspondente à violência (BRASIL, 1940).
Conforme se depreende da leitura do artigo, o delito em análise se consuma quando a vítima é submetida à
condição análoga à de escravo. Assim é entendida qualquer conduta que lhe imponha trabalhos forçados (ao
qual a vítima não se ofereceu voluntariamente), jornada exaustiva de trabalho (capaz de esgotar o
trabalhador, tanto física como mentalmente), ou que o sujeita a condições degradantes de trabalho (ambiente
de trabalho que impõe restrições a sua alimentação, ou condições indesejáveis de higiene e moradia), ou
ainda restringe, por qualquer meio, sua locomoção em razão de dívida contraída com o empregador ou
preposto. Por ser um delito que admite fracionamento na execução, admite-se a tentativa (GRECO, 2017).
Igualmente, pratica o delito de redução à condição análoga a de escravo o empregador que “cerceia o uso de
qualquer meio de transporte por parte do trabalhador, com o fim de retê-lo no local de trabalho” ou “mantém
vigilância ostensiva no local de trabalho ou se apodera de documentos ou objetos pessoais do trabalhador,
com o fim de retê-lo no local de trabalho” (GRECO, 2017).
A pena do delito também é aumentada em até 50% quando o crime é cometido contra criança ou
adolescente, ou por motivo de preconceito de raça, cor, etnia, religião ou origem. Trata-se o delito de crime
próprio, pois somente pode ser cometido pelo empregador contra seu empregado (Greco, 2017).
Por fim, deve-se destacar que após o julgamento do Recurso Extraordinário n. 398.041/PA, em 2006, o
Supremo Tribunal Federal passou a entender que a competência para julgar o delito seria da Justiça Federal.
A ação de detentos que cerram as grades do estabelecimento prisional para conseguir fugir não é tipificada
como delito de dano, pois neste caso, a conduta dos agentes não é direcionada a gerar prejuízo à
administração pública (vítima), mas tão somente visa à liberdade (GRECO, 2017).
O delito se consuma quando ocorrido o dano, que poderá ser total ou parcial, sendo admitida a modalidade
tentada do delito (Greco, 2017).
A figura qualificada, prevista no parágrafo único do mesmo dispositivo, caracteriza-se quando o crime é
cometido, de acordo com Greco (2017):
Com violência à pessoa ou grave ameaça (violência como meio para a prática do dano).
Com emprego de substância inflamável ou explosiva.
Se o fato não constitui crime mais grave, contra o patrimônio da União, de estado, do Distrito Federal, de
Município ou de autarquia, fundação pública, empresa pública, sociedade de economia mista ou empresa
concessionária de serviços públicos.
Por motivo egoístico – definido como “desejo ou expectativa de um ulterior proveito pessoal indireto, seja
econômico ou moral” (HUNGRIA, 2016 apud GRECO, 2017).
Com prejuízo considerável para a vítima (deve considerar patrimônio da vítima), sendo, nestes casos,
apenado com detenção, de seis meses a três anos, e multa, além da pena correspondente à violência.
É ISSO AÍ!
Nesta unidade, você teve a oportunidade de:
• entender sobre as noções gerais aplicáveis aos crimes contra a periclitação da vida e da saúde e seus
tipos penais;
• estudar sobre os delitos contra a honra, entendendo as disposições comuns e principais elementos
que diferenciam os delitos de calúnia, difamação e injúria;
• aprimorar seus conhecimentos sobre os delitos praticados contra a liberdade individual e seus
contornos legais;
• analisar os delitos contra o patrimônio; notadamente o delito de furto, extorsão, roubo, estelionato,
dano e apropriação indébita;
• conhecer as principais punições e agravamentos que os determinados tipos de crime podem possuir.
REFERÊNCIAS
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República, 1940. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del2848compilado.htm.
Acesso em: 24 fev. 2020.
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______. Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília, DF: 1988. Disponível
em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm. Acesso em: 24 fev. 2020.
______. Supremo Tribunal Federal, Recurso Extraordinário n. 398.041/PA. Relator: Ministro Joaquim
Barbosa, julgado em 30 nov. 2016. DJ, Brasília, DF, 12 dez. 2006.
______. Superior Tribunal de Justiça. AgRg. no REsp. 1251465/MG. Relator: Ministro Sebastião Reis
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______. Superior Tribunal de Justiça. REsp. 1414303/RS. Relator: Ministro Rogério Schietti Cruz, DJe,
Brasília, DF, 25 jun. 2014b. Disponível em: https://stj.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/25155292/recurso-
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Desembargador Fed. Hilton Queiroz, DJe, Brasília, DF, 15 out. 2015.
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