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PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO

Registro: 2023.0000227439

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível nº


1000153-85.2022.8.26.0053, da Comarca de São Paulo, em que é apelante E. DE S.
P., é apelado C. C. DE E. DE P. LTDA.

ACORDAM, em sessão permanente e virtual da 8ª Câmara de Direito


Público do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: Deram
provimento em parte ao recurso. V. U., de conformidade com o voto do relator,
que integra este acórdão.

O julgamento teve a participação dos Desembargadores BANDEIRA LINS


(Presidente sem voto), JOSÉ MARIA CÂMARA JUNIOR E PERCIVAL
NOGUEIRA.

São Paulo, 23 de março de 2023.

ANTONIO CELSO FARIA


Relator(a)
Assinatura Eletrônica
PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO

ACF nº 16.391/2023
Apelação nº 1000153-85.2022.8.26.0053
Apelante: Fazenda do Estado de São Paulo
Apelado: Cotemb Comércio de Embalagens de Papelão Ltda.
Comarca de São Paulo

APELAÇÃO Ação anulatória de débito fiscal ICMS


Pretensão à anulação de AIIM lavrado pela ausência de
pagamento do imposto, alegando que o valor apurado pela
fiscalização está equivocado, pois não foi considerada a não
cumulatividade do ICMS, vez que o agente fiscal não
apurou as notas fiscais de entrada e os créditos lançados, a
fim de abater o referido valor dos débitos decorrentes das
operações de saída.
Conclusões do laudo que fundamentam o decreto de parcial
procedência da demanda, concluindo que há débito de
ICMS, porém menor do que o apontado pela fiscalização.
Decadência parcial. Ocorrência. Não obstante o
reconhecimento do direito ao creditamento, conforme prevê
o parágrafo único do art. 23 da LC 87/96, o direito de
utilizar o crédito extingue-se depois de decorridos cinco
anos contados da data de emissão do documento.
Considerada, no caso, a data da perícia como sendo a da
escrituração, apenas poderão ser considerados os valores
apurados não atingidos pela decadência.
Sucumbência recíproca. Ambas as partes restaram
parcialmente vencedoras e vencidas em relação ao pleito
inicial, devendo cada uma delas arcar com a metade dos
honorários advocatícios. Majoração do valor devido à
apelante conforme previsão do art. 85, § 11, CPC. Sentença
parcialmente reformada. Recurso da Fazenda Estadual
parcialmente provido.

Trata-se de ação anulatória de débito fiscal ajuizada


por Cotemb Comércio de Embalagens de Papelão Ltda. em face da
Fazenda do Estado de São Paulo, na qual se alega que foi autuada pelo
fisco por supostamente deixar de pagar o ICMS devido no valor total de
R$ 340.962,30 nos períodos de Janeiro de 2016 a Março de 2019
AIIM 4.129.740-4. Afirma que a infração decorreu de erro do contador,
que não teria escriturado operações no registro de entrada (créditos de
ICMS), não declarou as operações e o montante do ICMS devido e GIA.
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Alega no entanto que o valor apurado pela Fiscalização está equivocado,


pois não foi considerada a não cumulatividade do ICMS, vez que o
agente fiscal não apurou as notas fiscais de entrada e os créditos
lançados, a fim de abater o referido valor dos débitos decorrentes das
operações de saída. Defende o caráter confiscatório da multa aplicada.
Requer a concessão da tutela de urgência para suspender o protesto
referente ao título CDA nº 1309406580 do 1º Cartório de Taboão da
Serra/SP - Auto de Infração nº 4.129.740-4. Requer a procedência da
ação judicial para anular o auto de infração de ICMS nº 4.129.740-4, e,
consequentemente, a inscrição do débito em dívida ativa de número
1309406580.
A r. sentença de fls. 755/764, cujo relatório se adota,
julgou parcialmente procedentes os pedidos, para anular parte do AIIM
n° 4.129.740-4, reconhecendo como devido R$ 121.398,34 (valor
histórico) a título de ICMS ante a ausência de comprovação do seu
pagamento. Por força do princípio da causalidade, condenou autor e ré
aos ônus sucumbenciais, fixando os honorários advocatícios para cada
uma na alíquota de 5% sobre o valor do proveito econômico, ressalvada
a gratuidade.
Apela a Fazenda Pública, às fls. 778/808, pela
reforma da sentença, para que os pedidos sejam julgados totalmente
improcedentes. Alega, em síntese, impossibilidade de aproveitamento de
créditos de ICMS (não-cumulatividade) por meio de decisão judicial,
sem escrituração do contribuinte, após a autuação. Afirma a ocorrência
de decadência, ao menos parcial, nos termos do artigo 38, parágrafo 3º,
da Lei 6.374/89 e artigo 61, parágrafo 3º, do artigo 61 do RICMS bem
como o artigo 23, parágrafo único, da Lei Complementar 87/96:.

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Subsidiariamente, pugna pela exclusão de sua condenação à verba


honorária.
Recurso processado e respondido (fls. 813/823).
É o relatório.
O auto de infração e imposição de multa discutido
nos autos traz as seguintes autuações:
“I Infrações Relativas ao Pagamento do Imposto:
Deixou de pagar o ICMS devido no valor total de R$
340.962,30 (trezentos e quarenta mil, novecentos e sessenta e dois reais
e trinta centavos), nos períodos de Janeiro de 2016 a Março de 2019,
em virtude de ter emitido Notas Fiscais Eletrônicas - NFe, relacionadas
no DEMONSTRATIVO 01 anexo, para acobertar operações de saídas
tributadas, cujo valor do ICMS não foi declarado corretamente no
Quadro Débito do Imposto - Campo 051 Por Saídas com Débito do
Imposto das Guias de Informação e Apuração do ICMS - GIAs dos
respectivos períodos, conforme se demonstra pelas cópias dos
documentos juntadas.
Nota:
1. Nos períodos da irregularidade descrita no relato
da infração acima, o contribuinte não apresentou a Escrituração Fiscal
Digital EFD.
Infringência: Arts. 85 e art. 215 e art. 87, do RICMS
(Dec. 45.490/00).
Capitulação da Multa: art. 85, inc. I, alínea “l” c/c §§
1º, 9º e 10º da Lei 6.374/89.”

A autora alega que o valor apurado pela Fiscalização


está equivocado, pois não foi considerada a não-cumulatividade do
ICMS, pois o agente fiscal não apurou as notas fiscais de entrada e os
créditos lançados, a fim de abater o referido valor dos débitos
decorrentes das operações de saída.
A ré, por sua vez, afirma que o AIIM é legítimo, tanto
que a autora confessa a infração e se defende alegando que esta decorreu
de omissão do contador que não teria escriturados os documentos fiscais
corretamente, aduzindo não ser possível a escrituração e compensação
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de créditos extemporâneos.
Foi então determinada perícia judicial para apuração
do quanto alegado.
Nesse ponto, a prova dos autos foi bem apreciada
pelo d. Juízo de Primeiro Grau, entendendo-se não haver nos autos
elementos que enfraquecem os elementos de convicção exauridos na r.
sentença sob análise, cujos fundamentos ficam ratificados, nos termos do
art. 252 do Regimento Interno deste Egrégio Tribunal, que possibilita ao
Relator, nos recursos em geral, “limitar-se a ratificar os fundamentos da
decisão recorrida, quando suficientemente motivada, houver de mantê-
la”.
Importante ressaltar que a aplicabilidade do mencionado
artigo encontra respaldo em jurisprudência do Egrégio Superior Tribunal
de Justiça.
Conforme bem concluiu e decidiu o d. Magistrado a
quo:
“A expert concluiu que: "[...] relativo ao período de
janeiro/2016 a março/2019, não houve a transmissão de sua
escrituração fiscal digital (EFD) contendo as operações de “entradas”
e “saídas”, dentro do prazo estabelecido na legislação de regência, não
houve a escrituração dos documentos contábeis e fiscais, não houve a
devida escrituração nas GIAs enviadas para o Fisco Paulista e
consequentemente não houve o pagamento do valor do ICMS devido,
uma vez que o antigo contador da empresa não fez o que lhe compete
em seu trabalho. A Requerente na Prova Pericial apresentou os
documentos fiscais: Notas Fiscais de Entrada e Saída no arquivo XML,
relativo ao período de janeiro de 2016 a março de 2019, apurando os

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créditos e débitos do ICMS e o valor do ICMS a pagar, caso houvesse a


correta escrituração dos referidos documentos, de R$ 121.398,34 (cento
e vinte e um mil, trezentos e noventa e oito reais e trinta e quatro
centavos)." (fl. 656).
Em resposta aos quesitos, ponderou que "O Fisco
Estadual somente analisou as Notas Fiscais de Saída, o que fez com que
o valor do ICMS apurado fosse maior do que o devido pela Requerente,
ressaltando que nas GIAs os valores de Débito do Imposto, Crédito do
Imposto e Apuração dos Saldos não foram devidamente preenchidos
pela Requerente em cada período apontado no AIIM nº 4.129.740-4."
(fl. 647).
Significa dizer que, há débito de ICMS, porém
menor do que o apontado pela Fiscalização. Não escapa ao Juízo que
toda a celeuma decorreu de descumprimento de obrigações acessórias
por parte da autora, que deixou de escriturar e destacar o imposto
devido no período. Contudo, tais infrações não implicam,
necessariamente, na falta de pagamento do imposto, infração esta
impugnada pela autora. Quanto ao descumprimento de obrigações
acessórias, caberia a imputação de penalidade própria a critério da
Administração.
Em suma, uma vez constatada em perícia que o
valor não recolhido a título de ICMS é inferior ao cobrado pela ré, por
meio do auto de infração n° 4.129.740-4, de rigor a sua revisão”.
É dizer, foi confirmada pela perícia a alegação trazida
na exordial de que os débitos de ICMS devidos pela autora são na
verdade em valor menor do que o encontrado pela Fiscalização, que não
considerou, na apuração, as notas fiscais de entrada e os créditos

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lançados, a fim de abater o referido valor dos débitos decorrentes das


operações de saída. De outro lado, o descumprimento de obrigação
acessória pela autora ensejaria a imputação de penalidade, mas não a
perda do direito ao creditamento, mormente quando comprovadas as
operações pela perícia efetuada sob o crivo do contraditório.
Acrescente-se que o perito judicial ostenta os
atributos de imparcialidade, de isenção, de equidistância com relação ao
autor e ao réu, não os favorecendo nem os prejudicando, e de
objetividade; ao contrário do que ocorre com os assistentes técnicos das
partes, que são por elas indicados, justamente para a defesa de seus
respectivos interesses.
Por outro lado, de rigor o reconhecimento da
decadência parcial do direito ao aproveitamento dos créditos
identificados na perícia. Com efeito, como bem apontou a apelante neste
ponto, o laudo pericial de fls. 637-657, elaborado em 21/09/2022,
considerou créditos de janeiro de 2016 a dezembro de 2019, conforme
planilha de fls. 648.
E, conforme prevê o parágrafo único do art. 23 da LC
87/96:
Art. 23. O direito de crédito, para efeito de
compensação com débito do imposto, reconhecido
ao estabelecimento que tenha recebido as
mercadorias ou para o qual tenham sido prestados
os serviços, está condicionado à idoneidade da
documentação e, se for o caso, à escrituração nos
prazos e condições estabelecidos na legislação.

Parágrafo único. O direito de utilizar o crédito


extingue-se depois de decorridos cinco anos
contados da data de emissão do documento.

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Portanto, apenas poderão ser considerados os valores


apurados até cinco anos antes da data da realização da perícia
(21/09/2022), pois não atingidos pela decadência. Vale ressaltar que,
contrariamente ao que afirma a apelada, o prazo decadencial não se
sujeita, em regra, a suspensão ou interrupção.
Assim, diante do reconhecimento de parcial
decadência do direito ao aproveitamento de créditos, o valor
reconhecido como devido pela r. sentença deverá ser recalculado, em
sede de cumprimento do julgado, levando-se em conta a compensação
com os créditos oriundos de documentos emitidos até cinco anos antes
da data da perícia.
No tocante aos honorários advocatícios, observa-se
que ambas as partes restaram parcialmente vencedoras e vencidas em
relação ao pleito inicial, devendo cada uma delas arcar com a metade
dos honorários advocatícios, como posto na r. sentença.
Diante do disposto no art. 85, § 11, contudo, os
honorários devidos pela autora deverão ser majorados em 1% sobre o
valor do proveito econômico, considerando o trabalho adicional
realizado em segundo grau e o parcial provimento do apelo.
Ante o exposto, dá-se parcial provimento ao
recurso, nos termos acima, mantido o mais.

ANTONIO CELSO FARIA


Relator

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