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GESTÃO DE FINANÇAS
PÚBLICAS
AULA 2

 
 

Prof. Fabrício Ramos Neves

CONVERSA INICIAL

Anteriormente discutimos os tipos de orçamento (orçamento clássico; orçamento-desempenho;

orçamento base zero; orçamento-programa; orçamento participativo), e agora cabe um


questionamento: se o orçamento é uma peça de planejamento, e o governante deixar de cumprir
alguma obrigação, existe alguma penalidade para o gestor? É sobre esse assunto que vamos

discorrer na aula de hoje.

CONTEXTUALIZANDO

Algumas correntes ligadas ao direito financeiro têm realizado verdadeiros debates, com defesas
que buscam identificar a essência jurídica do orçamento. Como não há unanimidade no campo

doutrinário do direito, o ordenamento jurídico brasileiro tem tratado o orçamento público como lei,
servindo de instrumento autorizativo para os gastos públicos.

“Mas, professor, se o orçamento é uma lei, por que você disse que é um instrumento

autorizativo?”

Precisamos entender que o modelo da nossa Constituição coloca o orçamento público como
peça de planejamento que assume a função de elemento de programação política e econômica do

país, na medida em que coloca o plano de ação do Estado para atender suas ações em prol da
sociedade como um todo. Mas devemos considerar que o art. 165 da Constituição trata o orçamento

público como lei, ao trazer: “Art. 165. Leis de iniciativa do Poder Executivo estabelecerão: I – o plano
plurianual; II – as diretrizes orçamentárias; III – os orçamentos anuais”.

A discussão então se pauta em saber se o orçamento é uma lei do ponto de vista material – e
poderíamos entendê-la como a que tem conteúdo de regra de direito (deve ser cumprida) – ou se
tem uma característica apenas formal, com viés político-administrativo. Sendo um instrumento de

atendimento aos anseios da sociedade, surge a necessidade da uma atividade financeira estatal
(que já vínhamos discutindo), justamente para viabilizar a consecução desses objetivos, por meio do

instrumento que chamamos de orçamento.

TEMA 1 – NATUREZA JURÍDICA DO ORÇAMENTO BRASILEIRO (LEI


FORMAL DE EFEITO CONCRETO)

Algumas divergências doutrinárias sobre a natureza jurídica do orçamento público vêm de muito

longe e há muito tempo. É interessante para nossa disciplina pensar sobre o verdadeiro significado
jurídico do orçamento e suas implicações práticas. Seria uma lei em sentido material, que cria
direitos subjetivos? Um mero ato administrativo-contábil? Apenas uma lei em sentido formal, que

autoriza as despesas sem criar, por si só, direitos e obrigações para sua execução?

Assim, as teorias dos juristas europeus Laband, Hoennel, Duguit e Jèze fizeram escolas e

influenciaram o pensamento jurídico em todo o mundo, e são importantes fontes que balizam nossa
discussão. Em resumo, há quem defenda que o orçamento é um ato-condição, considerando o

orçamento como ato que dá a condição legal para cobrar tributos (Jèze, 1936); há quem trate o

orçamento como lei formal (essa é a posição do jurista alemão Hoennel e de Paul Laband, 1979).

Por fim, Léon Duguit (1925) entende que orçamento é um ato administrativo no que diz respeito a
receitas e despesas, e como lei, em sentido material, no que diz respeito à autorização para cobrar

receitas derivadas dessa lei.

A ideia mais aceita no Brasil é que o orçamento deve ser tratado como lei formal. Torres (2010)
afirma que “a teoria de que o orçamento é lei formal, que apenas prevê as receitas públicas e

autoriza os gastos, sem criar direitos subjetivos e sem modificar as leis tributárias e financeiras, é, a

nosso ver, a que melhor se adapta ao direito constitucional brasileiro”.


Esse posicionamento é muito importante, especialmente porque, por ser lei formal no
entendimento do Supremo Tribunal Federal (STF), é possível controlar a constitucionalidade das leis

orçamentárias.

O caso clássico em relação a esse assunto foi o ADI 4.048-DF, que discutia a abertura de crédito

extraordinário no valor de R$ 5.455.677.660,00 (cinco bilhões, quatrocentos e cinquenta e cinco


milhões, seiscentos e setenta e sete mil e seiscentos e sessenta reais) a favor de diversos órgãos do

Poder Executivo e da Justiça Eleitoral pelo presidente da República, com a edição da Medida

Provisória n. 405/2007.

O art. 167, parágrafo 3º, da Constituição Federal de 1988 diz: “a abertura de crédito

extraordinário somente será admitida para atender a despesas imprevisíveis e urgentes, como as

decorrentes de guerra, comoção interna ou calamidade pública, observado o disposto no art. 62”.
Assim, para abrir crédito extraordinário, deve-se seguir os critérios de relevância e urgência exigidos

pelo art. 62. Na hipótese, o STF entendeu que a medida provisória era inconstitucional, pois os

créditos extraordinários se destinavam a cobrir despesas correntes, sem qualquer nota de urgência

ou imprevisibilidade.

Observe que o desvirtuamento da Lei Orçamentária pode gerar fortes impactos econômicos e

sociais. O ministro do STF, Carlos Ayres Brito, relatou o seguinte à época: “não há lei mais importante

que a lei orçamentária, porque é a que mais influencia no destino da coletividade” (Encarnação,
2014). Então devemos ter em mente que, se as políticas públicas são instrumentalizadas pelo

orçamento, como já discutimos, pode-se afirmar que sua observação é, no mínimo, fundamental.

Esse foi um dos casos de controle de constitucionalidade em matéria de orçamento em que o STF

acabou intervindo.

A rigor, a programação do orçamento anual aprovado para cada novo exercício não vale para os

anos seguintes, sendo necessário renovar o planejamento periodicamente, acompanhá-lo e elaborar

uma nova lei para os exercícios seguintes. Para isso, é preciso entender o ciclo orçamentário, nosso
próximo assunto.

Dessa forma, o orçamento é realmente entendido como lei formalmente instrumentalizada, mas

materialmente constituído em ato político-administrativo. Como já sabemos, a razão de existir do


orçamento nasceu da necessidade de combater as arbitrariedades dos gastos públicos, mas

atualmente o entendimento predominante é que a essência do orçamento tem caráter autorizativo


(“autorização para gastar”, e não “obrigação de gastar”). Logo, essa previsão legal não obrigaria o

governante a realizá-la; ao contrário, apenas o autorizaria.

A regra é que o orçamento tem caráter autorizativo, salvo se houver vinculação expressa. Então,
como vimos, apesar da necessidade do comprometimento do Estado com as ações definidas na lei

orçamentária para não se tornar uma peça fictícia, não podemos negar que o orçamento faz parte de

um contexto social dinâmico de planejamento e ação, não podendo ser entendido como documento

estático, e sim que deve ser ajustado conforme a conjuntura econômica e social que confere ao
orçamento certa margem de liberdade (atenção ao termo certa). Logo, o pensamento é que não se

pode impor o gestor público a cumprir o orçamento sem conhecer suas disposições e sem certa

margem de flexibilidade. Os extremos são, de igual forma, para os fins sociais.

Esse debate se relaciona às diversas propostas de emendas constitucionais já colocadas no

Congresso Nacional que tentaram implementar um modelo de orçamento impositivo. A questão

principal é que, como o orçamento é uma lei autorizativa, acaba abrindo espaço para o Poder
Executivo não realizar algumas despesas previstas no orçamento, deixando parte dele “guardado” ou

contingenciado. A ideia de “orçamento impositivo” é mudar essa prática, obrigando a execução de

parte ou de todo o orçamento nos termos em que for aprovado.

Saiba mais

Veja a cronologia do orçamento impositivo e entenda a polêmica do veto. Texto de Ralph

Machado (2020). Disponível em: <https://www.camara.leg.br/noticias/642112-veja-a-cronologia-

do-orcamento-impositivo-e-entenda-a-polemica-do-veto/>. Acesso em: 18 ago. 2021.

A saída parece estar no equilíbrio, pois o orçamento tem posicionamentos que revelam seus

objetivos e outros que denotam meios. O modelo orçamentário tem origem na Constituição Federal,

com a indicação de um planejamento e metas a apontar, chegando, depois, na fase de definir e


delimitar a aplicação dos recursos públicos com o orçamento.

Assim, a decisão de gastar é, sem dúvida, eminentemente política, porém deve passar por todo

um processo de criação das leis orçamentárias, com incentivo à participação popular na sua
elaboração, até as discussões de emendas no Legislativo. Para tanto, é preciso conhecer o ciclo

orçamentário.
TEMA 2 – CICLO ORÇAMENTÁRIO

Para entender melhor o processo orçamentário, vamos trabalhar com o exemplo do ciclo
orçamentário da União, dadas as suas particularidades que podem se estender aos demais entes

nacionais (estados e municípios), com os devidos ajustes. Toda vez que tratarmos do chefe do

Executivo, devemos ter em mente a figura do presidente, governador ou prefeito para facilitar o
entendimento.

Dito isso, o ciclo orçamentário tem início quando as leis orçamentárias são enviadas como

projeto pelo chefe do Executivo ao Congresso Nacional, a quem cabe discutir, votar, alterar e/ou

aprovar o texto do projeto para posterior vigência como lei após concordância e sanção do chefe do

Executivo.

O ciclo orçamentário pode ser entendido como uma sequência de fases ou etapas que deve ser

cumprida como parte do processo orçamentário. Grande parte dos autores da área adota esta

ordem como as fases do ciclo orçamentário: elaboração; apreciação legislativa; execução e

acompanhamento; controle e avaliação; quando, então, se inicia o ciclo seguinte.

Figura 1 – Fases do ciclo orçamentário

Fonte: Neves, 2021.

Relacionando-as com as normas constitucionais, as etapas ficariam assim:

Iniciativa (art. 165 c/c o art. 84, III, ambos da CF/88), discussão (quando se apresentam

emendas nos limites do art. 160 da CF/88);


Votação (art. 57, parágrafo 2º, da CF/88);

Sanção (até o encerramento da sessão legislativa).

De modo geral, a literatura apresenta o ciclo orçamentário como processo restrito à LOA,

formado pelo conjunto apresentado (vide Figura 1), que se repete continuamente ao longo dos anos.

No entanto, uma das mudanças introduzidas pela Constituição Federal foi a integração da
elaboração do orçamento ao planejamento, ampliando a abrangência do ciclo orçamentário. Assim,

o modelo orçamentário brasileiro (art. 165 da CF/88) é composto de três instrumentos:

1. Plano Plurianual (PPA);


2. Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO);

3. Lei Orçamentária Anual (LOA).

Todas devem funcionar de maneira integrada, como se depreende pelo art. 166, parágrafo 3º, I, e
parágrafo 4º:

§ 3º As emendas ao projeto de lei do orçamento anual ou aos projetos que o modifiquem somente

podem ser aprovadas caso:

I – sejam compatíveis com o plano plurianual e com a lei de diretrizes orçamentárias;

[…]

§ 4º As emendas ao projeto de lei de diretrizes orçamentárias não poderão ser aprovadas quando
incompatíveis com o plano plurianual.

De maneira similar, a necessidade de articulação entre os três instrumentos é reforçada pelo art.

167, parágrafo 1º:

Art. 167. São vedados:

[…]

§ 1º Nenhum investimento cuja execução ultrapasse um exercício financeiro poderá ser iniciado
sem prévia inclusão no plano plurianual, ou sem lei que autorize a inclusão, sob pena de crime de

responsabilidade.

Saiba mais
A Secretaria de Orçamento Federal (SOF) disponibiliza o Manual técnico orçamentário

(MTO), que contém instruções técnicas e orçamentárias, principalmente sobre a elaboração da

Proposta Orçamentária da União das Esferas Fiscal e da Seguridade Social. Disponível em: <http

s://www1.siop.planejamento.gov.br/mto/doku.php/mtos>. Acesso em: 18 ago. 2021.

O PPA, a LDO e a LOA dão suporte ao processo de elaboração, execução e avaliação do

orçamento brasileiro. Esses instrumentos orientam o ciclo orçamentário no Brasil e estão

relacionados, formando um sistema de planejamento e controle que deve ser adotado por todos os
entes da Federação (União, estados e municípios).

Para elaborar cada um desses instrumentos, eles podem ser representados por uma “pirâmide

orçamentária”, em cuja base está a LOA; no meio, a LDO; no topo, o PPA – conforme a Figura 2, que
apresenta uma comparação entre o orçamento e o planejamento.

Figura 2 – Pirâmide orçamentária

Fonte: Neves, 2021.

O setor privado tem uma segregação similar. Oliveira (2008) distingue os tipos de planejamento

em estratégico, tático e operacional. Segundo o autor, podemos relacioná-los aos níveis de decisão
de uma pirâmide organizacional. Essa divisão também é bem parecida quando se trata de

orçamento público.

TEMA 3 – PLANO PLURIANUAL (PPA)


Planejamento é a primeira etapa do processo orçamentário. O PPA é denominado planejamento

estratégico de médio prazo na administração pública brasileira, sendo elaborado para viger por quatro

anos.

Ele envolve as principais diretrizes e metas da administração pública. É conhecido também

como programa de governo, sendo o principal instrumento das ações do gestor público. As diretrizes
se relacionam aos grandes propósitos de atuação de determinada plataforma de governo para o

período do mandato do novo gestor. Já os objetivos se desdobram em programas, que contêm as

ações (projetos e atividades) da plataforma de governo[1].

Um detalhe: no primeiro ano de mandato, o chefe do Executivo de todos os entes federados


elabora seu planejamento de gastos e, com isso, estabelece o que pretende executar no período do

seu governo, em termos de obras e serviços públicos; para isso, deve fazer constar em lei. Por

exemplo, a Constituição Federal de 1988 traz que nenhum investimento cuja execução ultrapasse

um exercício financeiro (um ano) pode se iniciar sem prévia inclusão no PPA ou sem lei que a

autorize, sob pena de crime de responsabilidade, conforme a Lei n. 10.028/2000, conhecida como

Lei de Crimes contra as Finanças Públicas. Por que isso? Porque veremos que a vigência da LOA é de

apenas um exercício financeiro e, para controlar a execução de grandes obras (que podem levar

anos), devem constar no PPA para acompanhamento e controle.

Mas, enquanto o governo elabora o planejamento para os próximos quatro anos, ele está

executando o último ano do PPA de seu antecessor. Isso significa que, se um novo chefe do

Executivo assume, ele deve executar a LOA correspondente ao último ano do PPA de quem estava no
executivo anteriormente.

No transcurso do primeiro ano do seu mandato, ele elabora um novo PPA e uma nova LOA, que

executará por três anos, até o fim do mandato – deixando para o sucessor o último ano de vigor do
“seu” PPA e da correspondente LOA. Esse processo é balizador pela Lei de Responsabilidade Fiscal

(LRF) e pela Lei n. 4.320/1964. A grande ideia por trás disso é evitar rupturas com a entrada de um

novo gestor.

Curiosidade

A Constituição prevê ainda a aprovação de lei complementar (art. 165, parágrafo 9º, inciso

I) para tratar dos seguintes assuntos:


Vigência;

Prazos;

Elaboração;

Organização das normas citadas.

No entanto, essa lei complementar ainda não foi editada, mas os assuntos supostamente

tratados por ela encontram suas regras distribuídas pela Constituição e em outras leis relativas

ao orçamento, por exemplo a Lei n. 4.320/1964.

Na União, o processo se inicia com a elaboração, pelo Executivo, do projeto de lei do Plano

Plurianual (PPA). O projeto é analisado inicialmente, no Congresso, pela Comissão Mista de Planos,

Orçamentos Públicos e Fiscalização (CMO), que deve emitir parecer por meio de um relatório sobre o

plano e demais documentos de planejamento e orçamento da União.

Posteriormente, será analisado com base nesse parecer e deve ser aprovado pelo Legislativo.

Transformado em lei, o PPA define as prioridades do governo pelo período de quatro anos, contados

a partir do segundo ano do mandato do governante, e estabelece, de forma regionalizada, diretrizes,

objetivos e metas da administração pública federal para as despesas de capital e outras delas

decorrentes, além daquelas de programas de duração continuada.

TEMA 4 – LEI DE DIRETRIZES ORÇAMENTÁRIAS

Antes de fazer o orçamento de cada ano, o Poder Executivo Federal prepara e encaminha outra

lei para ser discutida no Poder Legislativo Federal (Congresso Nacional), chamada Lei de Diretrizes

Orçamentárias (LDO). Trata-se da norma que estabelece metas e prioridades para o exercício

seguinte, incluindo as despesas de capital (investimento) para o exercício subsequente, orientando a

Lei Orçamentária Anual (LOA), dispondo sobre mudanças na legislação tributária, estabelecendo a

política de aplicação das agências de fomento e definindo metas fiscais.

Art. 165 […]

§ 2º A lei de diretrizes orçamentárias compreenderá as metas e prioridades da administração

pública federal, estabelecerá as diretrizes de política fiscal e respectivas metas, em consonância


com trajetória sustentável da dívida pública, orientará a elaboração da lei orçamentária anual,

disporá sobre as alterações na legislação tributária e estabelecerá a política de aplicação das


agências financeiras oficiais de fomento. (Brasil, 1988, grifo nosso)
O projeto de LDO é elaborado com base no PPA. Devemos ter em mente que, com base no que

foi definido pelo PPA para o exercício fiscal seguinte, a LDO é ajustada, com base na qual será

elaborada – também pelos chefes dos executivos em todos os níveis – a Lei Orçamentária do ano

seguinte, como projeto de lei, considerando as prioridades (planejamento dos projetos de governo)

apresentadas no PPA, ajustadas e definidas na LDO para orientar a elaboração da LOA.

Atenção: no dia 15/3/2021 foi promulgada a Emenda Constitucional n. 109, proveniente da

chamada PEC Emergencial. Ela trouxe novas medidas emergenciais e permanentes para controlar as

contas públicas, em especial os orçamentos fiscais e da seguridade social da União. Também criou

diversos mecanismos, chamados de gatilhos, para controlar gastos se a relação entre as receitas e
despesas dos entes atingir 95%.

No caso da LDO, foi incluída uma premissa (em negrito) de que deve considerar, quando da sua

elaboração, metodologias de avaliação que ofereçam uma maneira de sinalizar se determinada

política é sustentável ou não. De forma geral, a dívida pública pode ser considerada sustentável se a

restrição orçamentária do governo puder se satisfazer sem romper a política monetária e a fiscal.
Então, a inclusão dessa premissa no texto constitucional procura mostrar a necessidade de controlar

e administrar a dívida pública, que pode desempenhar um papel fundamental ao determinar sua
sustentabilidade.

A LDO traz uma série de regras para elaborar, organizar e executar o orçamento, além de definir
as prioridades que deverão estar contempladas na LOA. Por exemplo, é a LDO que informa quanto
será o reajuste do salário mínimo, bem como quanto se espera (metas) que o governo deverá poupar

a cada ano para pagar a dívida pública.

Outros assuntos são as eventuais alterações na cobrança de tributos (com algumas exceções,
por força do art. 153, parágrafo 1º, da CF/88), assim como regras temporárias caso o orçamento não
seja aprovado até o final do ano. A LDO define ainda as políticas de investimento das agências

oficiais de fomento, por exemplo o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social


(BNDES) e bancos de desenvolvimento regionais, como o Banco da Amazônia e o Banco do

Nordeste. Essas instituições utilizam recursos públicos federais para financiar projetos que
desenvolvam o Brasil.

Para finalizar, mais duas funções da LDO:


1. Fixar parâmetros para que os poderes da União (ministérios) e o Ministério Público elaborem
as próprias propostas de orçamento a unificar;

2. Estabelecer parâmetros e autorizar concessão de vantagens ou aumento de remuneração aos


servidores dos poderes da União e do Ministério Público; exceto, nesse caso, as empresas

públicas (como a Caixa Econômica Federal) e sociedades de economia mista (como a


Petrobras e o Banco do Brasil).

Saiba mais

Para mais informações sobre o tema, leia os artigos a seguir:

“Governo terá restrições no início do ano caso orçamento não seja aprovado em dezembro.”

Disponível em: <https://bit.ly/3gfHUIp>. Acesso em: 18 ago. 2021;

“Senado aprova Lei de Diretrizes Orçamentárias para 2021, que segue para sanção

presidencial.” Disponível em: <https://bit.ly/3sqFQ54>. Acesso em: 18 ago. 2021.

TEMA 5 – LEI ORÇAMENTÁRIA ANUAL (LOA)

LOA é o orçamento público propriamente dito, a parte operacional, a execução do planejamento


feito pela PPA e orientada pela LDO. É discutida e aprovada anualmente pela elaboração de um
projeto analisado pelo Legislativo e sancionado pelo Executivo, programando os gastos

governamentais em cada área e prevendo as receitas para custeá-los.

Na LOA, os gastos governamentais se separam por áreas de governo, como saúde, educação,
transporte e segurança. Cada área tem seus programas e ações orçamentárias. Por exemplo, na
área de educação, pode-se ter um programa de melhoria na qualidade do ensino. Em cumprimento

ao art. 5º da Lei de Responsabilidade Fiscal (Lei Complementar n. 101/2000), o Projeto de Lei


Orçamentária Anual deve ser elaborado de forma compatível com o PPA e com a LDO.

Art. 165

[…]

§ 5º A lei orçamentária anual compreenderá:


I – o orçamento fiscal referente aos Poderes da União, seus fundos, órgãos e entidades da

administração direta e indireta, inclusive fundações instituídas e mantidas pelo poder público;

II – o orçamento de investimento das empresas em que a União, direta ou indiretamente, detenha a

maioria do capital social com direito a voto;

III – o orçamento da seguridade social, abrangendo todas as entidades e órgãos a ela vinculados, a

administração direta ou indireta, bem como os fundos e fundações instituídos e mantidos pelo
poder público.

Figura 3 – Estrutura do PPA

Fonte: Neves, 2021.

Quadro 1 – Prazos para o PPA, LDO e LOA

PRAZO DE ENVIO PELO PODER EXECUTIVO PRAZO DE DEVOLUÇÃO PELO PODER LEGISLATIVO AO
PROJETO
AO LEGISLATIVO EXECUTIVO

4 meses antes do encerramento do primeiro Até o encerramento do segundo período da sessão


PPA Vigora por
exercício financeiro do mandato (31 de legislativa (22 de dezembro) do exercício em que for
4 anos
agosto) encaminhado

LDO Vigora por 8 meses e meio antes do encerramento do Até o encerramento do primeiro período da sessão
18 meses exercício financeiro (15 de abril) legislativa (17 de julho)

LOA Vigora por 4 meses antes do encerramento do exercício Até o encerramento da sessão legislativa (22 de
1 ano financeiro (31 de agosto) dezembro)
Saiba mais

O governo federal lançou, com seu próprio orçamento, outra versão mais simplificada,
chamada Orçamento cidadão, do Ploa 2021. Disponível em: <https://bit.ly/3gahiIv>. Acesso em:

18 ago. 2021.

TROCANDO IDEIAS

Vimos que entender o orçamento é muito importante. Diversas situações podem impactar o
planejamento governamental, o que exige certa flexibilidade não apenas em relação aos valores

definidos, mas à rapidez das ações da gestão para resolver problemas rapidamente. Para apoiar a
discussão, leia o artigo “Reflexos da covid-19 no orçamento público do governo federal”, disponível

em: <https://bell.unochapeco.edu.br/revistas/index.php/rgo/article/view/5560>. Acesso em: 18 ago.


2021.

NA PRÁTICA

Para entender o que é análise da conjuntura e quais são alguns dos indicadores projetados para
o cenário econômico brasileiro, vamos relembrar o conceito de orçamento público. Lembra que é um

instrumento que estima a arrecadação e o planejamento de gastos? Então, para estimar quanto será
arrecadado no próximo ano, o governo prevê alguns indicadores econômicos importantes, por
exemplo: crescimento econômico total do país (variação do produto interno bruto – PIB); taxa de

inflação; taxa de juros; taxa de câmbio; salário mínimo; entre outras informações que têm impacto
direto no orçamento e interferem na sociedade.

Por exemplo, o valor gasto com aposentadorias depende do salário mínimo, as despesas com
juros (dívida pública) dependem da taxa de juros, e algumas despesas do governo são impactadas

pela taxa de câmbio, entre outras situações.

Todos os anos o Ministério da Economia (antigo Ministério da Fazenda) estima os parâmetros

macroeconômicos utilizados na elaboração do Projeto de Lei Orçamentária Anual (Ploa) para o


exercício seguinte, estimando variáveis macroeconômicas para o próximo ano. Com base nesse
cenário-base, os responsáveis pelo orçamento podem mensurar, com maior acerto (mesmo com a

margem de erro), as receitas e despesas do governo federal (no caso que estamos analisando).

O Ploa 2021 se baseou principalmente na LDO 2020 (Lei n. 14.116/2020).

Tabela 1 – Números do Ploa 2021

Crescimento do PIB 3,2%

Meta de inflação para 2021 3,75%

Salário mínimo R$ 1.088,00

Taxa de câmbio média R$ 5,30/US$ 1,00

Taxa de juros (Selic) média (ao ano) 2,5%

Com base nos dados, complete o relatório de avaliação de receitas e despesas com o quadro

macroeconômico nacional (Tabela 1) para o ano em que o orçamento for executado. Nesse cenário-
base, você, como responsável pelo orçamento, pode auxiliar a prever, de forma mais precisa,

algumas receitas e despesas do governo federal.

Na expectativa do Ploa-2021, é possível observar uma previsão de crescimento real do PIB que

impacte diretamente a arrecadação tributária: a diferença de 3,2% do PIB ante um crescimento zero.
Em contrapartida, Espera-se alta da taxa de inflação de 2% para 3,75%, acompanhada de uma

expectativa de alta da taxa de juros básica do mercado (Selic), tendência confirmada na última
reunião do Copom, com uma taxa de juros de 2% para 2,5%, com impacto sobre a dívida interna do
governo.

Em relação ao salário mínimo, o Ploa-2021 reflete o aumento fixado, de acordo com a medida
provisória de 2020, para R$ 1.088,00 a partir de 2021. O cenário atual apresenta ainda expectativa de

maior depreciação nominal do real frente ao dólar e de alta do preço médio do barril de petróleo
medido em dólares.

Tabela 2 – Análise das estimativas das receitas primárias (lDO 2021, art. 64, parágrafo 3º, incisos I e

IV)*
Descrição Ploa 2021 inicial (em milhões) Ploa ajustado (em milhões)

Imposto de importação  R$ 44.699.000,00 ?

IPI  R$ 53.096.200,00 ?

Imposto de renda, líquido de incentivos fiscais  R$ 400.814.000,00 ?

IOF  R$ 47.040.000,00 ?

Cofins  R$ 246.518.000,00 ?

Pis/Pasep  R$ 67.567.000,00 ?

*A presente atualização das estimativas das receitas administradas pela RFB, em relação às estimativas do Ploa 2021,
incorporou as alterações nas projeções macroeconômicas para 2021. Fonte: Neves, 2021.

Tabela 3 – Análise das estimativas das despesas primárias (LDO 2021, art. 64, parágrafo 3º, inciso

III)

Descrição Ploa 2021 inicial (em milhões) Ploa ajustado (em milhões)

Benefícios previdenciários R$ 704.416.328,00 ?

Abono e seguro-desemprego R$ 59.931.477,00 ?

Sentenças judiciais e precatórios R$ 20.646.200,00 ?

Despesas com juros e amortização da dívida R$ 3.704.000,00 ?

Fonte: Neves, 2021.

Benefícios previdenciários: as despesas projetadas sofreram acréscimo devido à incorporação

dos dados de fechamento do exercício de 2020 e ao ajuste do salário mínimo de 2021,

estabelecido em R$ 1.088,00, frente à estimativa de R$ 1.067,00, à época da elaboração do


Ploa, em virtude da atualização do INPC. A despesa estima atender 660.184 beneficiários;
Abono e seguro-desemprego: as despesas previstas sofreram majoração em virtude da

elevação do salário mínimo para o exercício de 2021, o qual fora projetado, à época do Ploa,
em R$ 1.067, além da incorporação de dados e parâmetros macroeconômicos atualizados. A

despesa espera atender 55.123 beneficiários;


Sentenças judiciais e precatórios: houve ajuste (o maior) no valor de sentenças, explicado pela

atualização da projeção de inflação;


Despesas com juros e amortização da dívida: as despesas previstas sofreram majoração em

virtude da elevação da taxa de juros básica do mercado (Selic).

FINALIZANDO

Esta aula mostrou a natureza jurídica do orçamento brasileiro. As referências discutidas e o


conhecimento do ciclo orçamentário fazem parte do processo para você assimilar o planejamento
de gastos do Estado.

Tratamos dos três tipos de orçamento (PPA, LDO e LOA) e discutimos sobre a interseção deles

para uma boa execução das atividades governamentais. Conhecemos em detalhes cada um e, por
fim, exemplificamos o que podemos extrair deles, dando mais um passo importante para as
próximas aulas.

Futuramente, trataremos dos princípios orçamentários. Vamos lá!

REFERÊNCIAS

BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Diário Oficial da União, Brasília,
DF, 5 out. 1988.

_____. Lei n. 14.116, de 31 de dezembro de 2020. Diário Oficial da União, Brasília, DF, 31 dez
2020.

_____. Manual técnico do orçamento. Brasília, DF: Ministério da Economia, 2021a. Disponível em:
<https://www1.siop.planejamento.gov.br/mto/doku.php/mtos>. Acesso em: 18 ago. 2021.

_____. Orçamento anual 2021. Brasília, DF: Ministério da Economia, 2021b.

_____. Orçamento cidadão: Projeto de Lei Orçamentária Anual 2021. Brasília, DF: Ministério da
Economia, 2021c. Disponível em: <https://www.gov.br/economia/pt-br/assuntos/planejamento-e-

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DUGUIT, L. Les Transformations du droit public. Paris: A. Collin, 1925.


ENCARNAÇÃO, I. A. O STF e o orçamento: controle de constitucionalidade das leis
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LABAND, P. El derecho pressupuestario. Madrid: Instituto de Estudios Fiscales, 1979.

MACHADO, R. Veja a cronologia do orçamento impositivo e entenda a polêmica do veto.

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SENADO aprova Lei de Diretrizes Orçamentárias para 2021, que segue para sanção presidencial.

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TORRES, R. L. Curso de direito financeiro e tributário. 17. ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2010.

GABARITO

Tabela 2 – Análise das estimativas das receitas primárias (LDO 2021, art. 64, parágrafo 3º, Incisos i e
IV)

Descrição Ploa 2021 inicial (em milhões) Ploa ajustado (em milhões)*

Imposto de importação  R$ 44.699.000,00  R$ 46.129.368,00

IPI  R$ 53.096.200,00  R$ 54.795.278,40


Imposto de renda, líquido de incentivos fiscais  R$ 400.814.000,00  R$ 413.640.048,00

IOF  R$ 47.040.000,00  R$ 48.545.280,00

Cofins  R$ 246.518.000,00  R$ 254.406.576,00

Pis/Pasep  R$ 67.567.000,00  R$ 69.729.144,00

* Atualização com base no aumento do PIB nacional em 3,2% sobre os valores iniciais. Fonte: Neves, 2021.

Tabela 3 – Análise das estimativas das despesas primárias (LDO 2021, art. 64, parágrafo 3º, inciso
III)

Descrição Ploa 2021 inicial (em milhões) Ploa ajustado (em milhões)

Benefícios previdenciários (I) R$ 704.416.328,00 R$ 718.280.192,00

Abono e seguro-desemprego (II) R$ 59.931.477,00 R$ 60.091.328,00

Sentenças judiciais e precatórios (III) R$ 20.646.200,00 R$ 21.007.508,50

Despesas com juros e amortização da dívida (IV) R$ 3.704.000,00 R$ 3.722.520,00

I. Reflexo do aumento do valor do salário mínimo para R$ 1.088,00 em relação à quantidade de

beneficiários;
II. Reflexo do aumento do valor do salário mínimo para R$ 1.088,00 em relação à quantidade de
beneficiários;

III. Reflexo da atualização do valor inicial pela inflação de 1,75% (3,75%-2%).


IV. Reflexo da atualização com base no aumento de 0,5% do aumento da taxa Selic (2,5%-2%).

[1] A iniciativa para elaborar o PPA, LDO e LOA é sempre do chefe do Poder Executivo.

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