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Cafeína

Responsável pelo Conteúdo:


Prof.ª Me. Geovana S. F. Leite

Revisão Textual:
Prof. Me. Luciano Vieira Francisco
Cafeína

Fonte: Getty Images


Nesta unidade, trabalharemos os seguintes tópicos:
• Introdução;
• O Uso de Cafeína nos Esportes;
• Farmacocinética da Cafeína: da Absorção à Excreção;
• Efeitos Fisiológicos e Metabólicos da Cafeína;
• Cafeína como Recurso Ergogênico: Dosagem
em Diferentes Condições de Exercício Físico.

Objetivos
• Contextualizar o uso de cafeína nos esportes;
• Conhecer os conceitos farmacocinéticos envolvidos com a cafeína;
• Entender os efeitos metabólicos e fisiológicos da cafeína;
• Discutir os mecanismos de ação da cafeína;
• Discutir a suplementação de cafeína como recurso ergogênico em diferentes condições.

Caro Aluno(a)!

Normalmente, com a correria do dia a dia, não nos organizamos e deixamos para o úl-
timo momento o acesso ao estudo, o que implicará o não aprofundamento no material
trabalhado ou, ainda, a perda dos prazos para o lançamento das atividades solicitadas.

Assim, organize seus estudos de maneira que entrem na sua rotina. Por exemplo, você
poderá escolher um dia ao longo da semana ou um determinado horário todos ou alguns
dias e determinar como o seu “momento do estudo”.

No material de cada Unidade, há videoaulas e leituras indicadas, assim como sugestões


de materiais complementares, elementos didáticos que ampliarão sua interpretação e
auxiliarão o pleno entendimento dos temas abordados.

Após o contato com o conteúdo proposto, participe dos debates mediados em fóruns de
discussão, pois estes ajudarão a verificar o quanto você absorveu do conteúdo, além de
propiciar o contato com seus colegas e tutores, o que se apresenta como rico espaço de
troca de ideias e aprendizagem.

Bons Estudos!
UNIDADE
Cafeína

Contextualização
Atualmente, nos esportes em geral têm sido cada mais exigido que os atletas atinjam
limites físicos e de desempenho cada vez maiores. Dessa forma, estratégias nutricionais
que facilitem tais finalidades são importantes.

Uma das estratégias é a suplementação de cafeína, através de diversos mecanismos


que prometem aumentar a performance em diferentes modalidades esportivas.

Você sabe como a cafeína funciona? Quais as modalidades esportivas em que pode ser
prescrita? E quanto à dosagem e ao timing de ingestão?

A obtenção do conhecimento acerca desses parâmetros é peça-chave na prescrição


desse agente ergogênico nos esportes em geral. Dessa forma, o objetivo desta Unidade
é apresentar uma visão geral do uso da cafeína em diferentes tipos de exercícios físicos
como potencial recurso ergogênico, conceitos farmacológicos e como essa substância
age no organismo.

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Introdução
Atletas estão sempre procurando maneiras de melhorar a performance, além do que
o treinamento diário consegue oferecer. Essa prática é tão antiga quanto os esportes
competitivos. Nos Jogos Olímpicos da Grécia Antiga, os atletas já consumiam substân-
cias, tais como cogumelos e proteínas, com a intenção de melhorar o desempenho e
aumentarem as chances de vitória. Atualmente já se sabe que o uso de agentes ergogê-
nicos se tornou uma prática comum e bem disseminada.

O termo ergogênico deriva das palavras gregas ergo, que significa trabalho, e geno,
que significa produção. Dessa forma, ergogênico significa produção de trabalho.

Uma gama enorme de compostos, incluindo substratos energéticos, metabólitos,


agentes que auxiliam na recuperação e até drogas estão disponíveis – sozinhos ou em
combinação – e prometem aumentar a capacidade aeróbia, força, potência e velocidade.

Não obstante, as evidências científicas que investigaram tais compostos sejam, de certa
forma, escassas e nem sempre a eficiência do composto como recurso ergogênico esteja
estabelecida, o seu uso, comumente, baseia-se em empirismo e evidências anedóticas.

Por outro lado, existem substâncias com o potencial de aumentar a performance em


situações específicas, entretanto, muitas são banidas do uso em esportes competitivos.
Além disso, podem existir riscos no consumo de tais substâncias, dependendo dos efei-
tos colaterais que oferecem.

Neste contexto, não é de se admirar que a cafeína seja utilizada por diversos atletas, tan-
to profissionais quanto recreacionais, como agente ergogênico, uma vez que é uma subs-
tância permitida pela Agência Mundial Antidoping – World Anti-Doping Agency (Wada).

O escopo desta Unidade é justamente apresentar uma visão geral do uso da cafeína
nos esportes como agente ergogênico, a sua farmacocinética e os mecanismos de ação do
ponto de vista da Biologia Molecular. Além disso, apresentaremos evidências científicas so-
bre o efeito agudo da ingestão de cafeína na regulação hormonal, metabólica e fisiológica.

O Uso de Cafeína nos Esportes


Cafeína (1,3,7-trimethylxanthine) é a principal substância estimulante – psicoativa
– utilizada no mundo inteiro, com aproximadamente 80% da população consumindo
regularmente. Após a indústria farmacêutica conseguir isolar e produzir de maneira sin-
tética, a cafeína tem sido extensamente prescrita. As principais fontes de cafeína são o
café, alguns chás, produtos à base de cacau e diversas bebidas “cola”. Na Tabela 1 consta
um sumário das fontes de cafeína:

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UNIDADE
Cafeína

Tabela 1 – Quantidade de cafeína em diferentes fontes

Fonte Teor de cafeína (mg) Volume ou peso


Café 40 a 180 150 mL
Chá 25 a 50 150 mL
Cacau 5 a 10 150 mL
Barra de chocolate 5 a 20 100 g
Refrigerantes 20 a 40 250 mL
Bebidas energéticas 30 a 200 250 mL

Que a dose de cafeína letal para humanos gira em torno de 10 gramas e deve ser ingerida
em poucas horas? Isto equivale a mais de 50 cafezinhos tomados de uma única vez.

As bebidas energéticas representam uma nova categoria de bebidas que contém uma
quantidade maior de cafeína (até 200 mg) quando comparadas aos refrigerantes e se
aproximam das concentrações encontradas no café.

Os efeitos da ingestão de cafeína dependem de diversos fatores, tais como a fonte


da cafeína, idade, o gênero, estado nutricional e nível de aptidão física. No entanto,
assume-se que o fator mais pertinente é, provavelmente, a fonte de cafeína, uma vez
que o seu conteúdo em diferentes compostos naturais – e não naturais, variam de
forma significativa.

Em termos práticos, atletas fazem o uso de cafeína com o intuito de aumentar a per-
formance. A razão mais importante para justificar o uso de cafeína nesses indivíduos é
o aclamado efeito ergogênico que possui, mas a cafeína também é um dos ergogênicos
mais baratos disponíveis no mercado, podendo ser consumida geralmente em quanti-
dades que não infringem as regras da Wada, com pouco ou nenhum risco iminente à
saúde. Por fim, é uma substância socialmente aceita no meio competitivo. Em outras
palavras, o uso de cafeína não rotula o atleta como “trapaceiro”.

Dessa forma, fica evidente que atletas do mundo todo façam uso da cafeína. Para
se ter uma ideia, aproximadamente 30% dos atletas juvenis dos Estados Unidos e do
Canadá relataram o uso de cafeína como um agente ergogênico, enquanto que 70% dos
atletas juvenis dos Estados Unidos utilizam a cafeína para fins sociais (Figura 1).

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Ingestão de Cafeína 5
(mg/kg/dia) 4
3
2
1
0

Kuwait
Quênia

Emirados Árabes Unidos

Venezuela
Holanda

Noruega
Paraguai
Nigéria

Polônia
Rússia
Arábia Saudita

Suíça
Síria
Tanzânia

Reino Unido
Estados Unidos
Nicarágua

Suécia
África do Sul
Irlanda
Itália
Costa do Marfim
Japão

Malásia

Figura 1 – Consumo geral de cafeína no mundo todo independente da fonte

Farmacocinética da Cafeína:
da Absorção à Excreção
Apesar de não possuir uma função fisiológica essencial, a cafeína exerce efeitos em
diversos tecidos no corpo humano. Dessa forma, para entender como a suplementação
de cafeína funciona e as suas respectivas funções é necessário compreender, de maneira
geral, alguns conceitos referentes à sua absorção, distribuição, metabolismo e excreção.
A Tabela 2 apresenta resumidamente a farmacocinética da cafeína:

Tabela 2 – Farmacocinética da cafeína em humanos

Parâmetro Descrição
Biodisponibilidade Completa absorção em 60 minutos
Pico de Concentração Plasmática (PCP) 5 a 10 µM para cada 1 mg/kg de dose oral
Tempo para o PCP 60 (15 a 120) minutos
Meia-vida para a eliminação 5 (2,5 a 10) horas
Taxa de remoção do corpo 1,5 (1 a 3) mL/kg/min
Pico de Concentração Urinária (PCU) 0,5 a 1,5 µ/mL para cada 1 mg/kg de cafeína
Tempo para o PCU 120 (60 a 180) minutos

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UNIDADE
Cafeína

Absorção da Cafeína
A ingestão de cafeína é absorvida rapidamente e por completo no trato gastrointesti-
nal, demorando cerca de 60 minutos para a sua completa absorção. A taxa de absorção
dependerá de alguns fatores, tais como as propriedades fármaco-químicas da formula-
ção – como o potencial Hidrogeniônico (pH), volume e a composição.

Assim, por exemplo, a administração de cafeína na forma de goma de mascar é


mais rapidamente absorvida do que em cápsula. No entanto, a cápsula é mais rapida-
mente absorvida que o café normal, bebidas “cola” e achocolatados. Por fim, o café
normal é absorvido de forma mais rápida quando comparado ao chá e a outras bebi-
das ricas em cafeína.

Porém, cabe ressaltar que essa velocidade de absorção pode estar relacionada às con-
centrações de cafeína presentes na substância, uma vez que não é observada diferença
na taxa de absorção quando a dose de cafeína e o volume administrado são equiparados,
independentemente do tipo de formulação.

Outro detalhe importante é que uma absorção mais rápida não reflete em um efeito
ergogênico maior, mas em um início mais rápido desses efeitos.

Distribuição da Cafeína
Pensando em um consumo moderado de cafeína como, por exemplo, de 5 a 6 copos
de cafés diários, a concentração plasmática de cafeína se mantém estável por volta dos
50 µmol/L, enquanto estima-se que a dose de 1 mg/kg – um copo de café – produz
uma concentração plasmática de aproximadamente 5 a 10 µmol/L.

Interessante também é compreender que existe um pico plasmático de cafeína após a


ingestão oral, entretanto, apresenta considerável heterogeneidade entre os indivíduos, po-
dendo ser 15 minutos para alguns e 120 minutos para outros. Diversos estudos já demons-
traram que o aumento na concentração plasmática de cafeína acontece de uma maneira
dose-dependente, ou seja, quanto maior a dose maior a concentração plasmática (Figura 2).
Esse padrão foi observado tanto em condições de repouso quanto em exercício físico.

Figura 2 – Efeito de diferentes doses de cafeína nas concentrações plasmáticas e no tempo de decaimento
Fonte: Adaptado de tandfonline.com

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Uma substância hidrofóbica é aquela que não absorve ou não se mistura com a água.

A cafeína é suficientemente hidrofóbica para passar por todas as membranas biológicas


e é prontamente distribuída por todos os tecidos do corpo. Em humanos, após a ingestão
e absorção, a cafeína se dilui na água corporal total e atinge um volume de distribuição no
estado estacionário entre 500 e 800 mL/kg, independentemente da dose – até 250 mg
–, mas essa distribuição parece ligeiramente aumentada com doses superiores. Importante
ressaltar que em consumidores assíduos de café – mais de 6 copos por dia – o volume de
distribuição da cafeína é mais alto quando comparado aos consumidores habituais de café.
Como a cafeína tem a capacidade de passar pelas membranas biológicas, as concen-
trações encontradas em fluidos extracelulares de diferentes tecidos não se diferem das
encontradas no plasma. Em relação às concentrações de fluidos intracelulares de cafeína,
estudos têm mostrado que apresentam diferenças entre os distintos tecidos – cérebro,
músculo, fígado etc. –, principalmente, logo após a ingestão de cafeína. No entanto, a
distribuição entre o plasma e os fluidos intracelulares é mais uniforme de 30 a 60 minutos.
Em suma, essa discussão sugere que a disponibilidade de cafeína é abundante após
a ingestão e que os efeitos sistêmicos dessa são rapidamente alcançados, uma vez que a
sua presença é encontrada em diversos tecidos.

Metabolizando a Cafeína
A cafeína é um alcaloide purino, e como a maioria dos xenobióticos, passa por uma
extensiva metabolização nos microssomos hepáticos. Pelo menos 25 metabólitos da
cafeína já foram identificados.

Xenobióticos: são substâncias estranhas ao organismo, capazes de alterar o mecanismo


funcional do sistema neuroendócrino e também a toxicidade genética.

Desses metabólitos, 3 dimetilxantinas são consideradas mais importantes e em con-


junto são responsáveis por mais 95% de todas as biotransformações da cafeína: a para-
xantina, teobromina e teofilina (Figura 3).

Figura 3 – Biotransformações da cafeína e as suas respectivas taxas de eliminação


Fonte: Adaptado de Wikimedia Commons

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UNIDADE
Cafeína

Outras biotransformações e a eliminação renal da cafeína não metabolizada for-


mam o restante da eliminação total de cafeína. É importante ressaltar que após a for-
mação de paraxantina, teobromina e teofilina, podem ocorrer outras transformações
metabólicas adicionais.

Excreção de Cafeína
A meia-vida de eliminação da cafeína do plasma para doses menores que 10 mg/kg
varia entre 2h30 e 10h, e a taxa de remoção varia aproximadamente de 1 a 3 mL/kg/
min. Por sua vez, doses maiores, repetidas e a ingestão habitual de cafeína, precisarão
de mais tempo para serem eliminadas do corpo.

A alta variabilidade encontrada na eliminação da cafeína do corpo (2h30 até 10h) im-
plica que as diferenças individuais na farmacocinética da cafeína são mais dependentes
da metabolização e excreção do que a absorção propriamente dita.

Um exemplo disso é a atividade da enzima hepática Citocromo P450 1A2 (CYP1A2),


principal enzima responsável pela metabolização da cafeína, que é, geralmente, respon-
sável pela meia-vida e taxa de remoção da cafeína do corpo.

Dessa forma, qualquer alteração nessa enzima mudará os parâmetros de meia-vida e


remoção de cafeína. Por exemplo, o aumento da atividade de CYP1A2 diminui a meia-
-vida e aumenta a taxa de remoção, enquanto que a diminuição de CYP1A2 exerce
efeitos contrários.

Uma gama enorme de variáveis comportamentais e de estilo de vida pode influenciar


a atividade da CYP1A2 hepática – tais variáveis encontram-se resumidas na Tabela 3:

Tabela 3 – Fatores comportamentais e de estilo de vida que influenciam na atividade da CYP1A2 hepática
Fator ou condição Efeito
Idade ↔
Consumo de álcool ↓
Exposição crônica à altitude ↑
Café ↑
Exercício físico ↑ ou ↔
Flavonoides ↓
Ciclo menstrual ↔
Obesidade ↓
Anticoncepcionais ↓ ou ↔
Gravidez ↓
Fumante ↑
Estresse térmico ↔
Fonte: Adaptada de MAGKOS & KAVOURAS, 2005

Legenda: ↑ = aumenta; ↓ = diminui; ↔ = sem efeito.

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A excreção da cafeína pela urina é menos de 5% da dose de cafeína ingerida. Após
ingestão e absorção por vários tecidos, a cafeína é extensivamente reabsorvida do túbulo
renal e se equilibra com a cafeína não ligada no plasma, enquanto que cerca de 0,5%
a 3% da cafeína é eliminada na urina sem alteração na sua estrutura. O pico de con-
centração urinária de cafeína gira em torno de 1 hora e pode demorar até 3 horas em
alguns indivíduos.

Em termos práticos, o conhecimento acerca das concentrações urinárias de cafeína,


bem como o seu processo de excreção, é importante do ponto de vista de doping no
esporte. Apesar de atualmente a cafeína ser aceita pela Wada, é mantida na lista do pro-
grama de monitoramento de substâncias, podendo futuramente ser novamente incluída
na lista de substâncias banidas.

Efeitos Fisiológicos e Metabólicos da Cafeína


Agora que os processos de absorção, distribuição, metabolização e excreção da ca-
feína estão mais claros, abordaremos neste tópico os principais efeitos fisiológicos e
metabólicos da cafeína, que serão importantes para compreender os mecanismos pelos
quais a cafeína atua como um agente ergogênico.

Perceba que anteriormente à descrição desses efeitos da cafeína, uma gama enorme
de pesquisadores se esforçou arduamente investigando em células – in vitro – as diferen-
tes funções da cafeína, e posteriormente a estes fatos foram descritos vários dos efeitos
da cafeína em humanos, entre os quais pode-se destacar o efeito que a cafeína – e os
seus metabólitos – exerce nas várias funções de tecidos centrais e periféricos. Existe um
consenso de que esses efeitos ocorrem, principalmente, pelo bloqueio do receptor de
adenosina. Assim, a cafeína exerce uma ação antagônica à da adenosina.

Esse e outros efeitos serão melhor detalhados a seguir e estão sumarizados na figura
a serguir:

Efeitos centrais e periféricos da cafeína: http://bit.ly/2M2UI7z.

Cafeína: Mecanismo de Ação no Sistema Nervoso Central


A cafeína é um estimulante do Sistema Nervoso Central (SNC) da classe das me-
tilxantinas. É a droga psicoativa mais consumida no mundo. Ao contrário de muitas
outras substâncias psicoativas, o seu uso é considerado legal e não há regulamentação
acerca de seu uso em quase todas as partes do mundo.

A cafeína é classificada como purina cristalina amarga, branca, um alcaloide meti-


lxantina. É encontrada nas sementes, nozes ou folhas de um número de plantas nativas
da África, Ásia Oriental e América do Sul; auxilia na proteção contra insetos predadores

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UNIDADE
Cafeína

e na prevenção da germinação de sementes próximas. A fonte mais conhecida de cafe-


ína é o grão de café. Bebidas contendo cafeína são ingeridas para aliviar ou prevenir a
sonolência e melhorar o desempenho.

Existem vários mecanismos conhecidos de ação para explicar os efeitos da cafeína;


o mais aceito e estudado é o bloqueio reversível da ação da adenosina em seu receptor.

Adenosina é um metabólito gerado pela “quebra” de Adenosina Trifosfato (ATP). Por


exemplo, no sistema nervoso central o aumento de adenosina indica que o cérebro “tra-
balhou” muito e que precisa descansar. Essas moléculas, então, ligam-se ao seu receptor
– de adenosina –, causando a sensação de sonolência.

Especificamente, em neurônios responsáveis pela sensação de alerta, a adenosina


se liga a receptores do tipo A1, tornando-os menos ativos; enquanto que em neurônios
responsáveis pela sensação de sonolência, a adenosina se liga a receptores do tipo A2A,
tornando-os mais ativos. A combinação desses sinais juntamente com a liberação de
hormônios são os responsáveis pelo início do sono.

Esses receptores de adenosina, por exemplo, do tipo A1, estão espalhados pelo cor-
po todo e são encontrados no coração, tecido adiposo, musculatura esquelética e rins.
Assim como no sistema nervoso central, a ativação desses receptores resulta, geralmen-
te, na diminuição da função desses tecidos como a menor frequência cardíaca, filtragem
de sangue pelos rins e, dessa forma, a diminuição da produção de urina, bem como em
menor estimulação da lipólise no tecido adiposo.

Nesses tecidos, quando a cafeína se liga aos receptores A1, torna-se antagônica aos
efeitos da adenosina. Ou seja, é observado aumento da frequência cardíaca, volume
urinário e lipólise. Essa ação antagônica à adenosina ocorre porque a cafeína apresenta
estrutura química similar e, dessa forma, compete pelo receptor de adenosina. A estru-
tura química é próxima o bastante para se ligar ao receptor, mas não próxima o bastante
para ativá-lo (Figura 4).

Cafeína Adenosina
Figura 4 – Semelhança nas estruturas químicas da cafeína e adenosina
Fonte: Adaptado de Wikimedia Commons

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Em relação aos efeitos ergogênicos da cafeína, acredita-se que sejam multifatoriais.
A cafeína é capaz de aumentar a força de contração muscular em intensidades submá-
ximas, provavelmente através do aumento do acoplamento excitação-contração e da
liberação de cálcio do retículo sarcoplasmático.

De acordo com Tarnopolsky (2008), Goldstein e colaboradores (2010), mecanismos


centrais também parecem influenciar nos efeitos ergogênicos: primeiramente, porque a
ingestão de cafeína diminui a sonolência – como mencionado – e isso pode ser diferen-
cial em esportes de longa duração; em seguida, porque a fadiga central também é dimi-
nuída. Diversos estudos já demonstraram uma diminuição na escala subjetiva de esforço
– o famoso Borg – com a ingestão de cafeína. Por fim, observou-se que a ingestão de
cafeína atenua a sensação de dor através do aumento na liberação de endorfina, a qual
permite maior capacidade de suportar sinais aferentes nocivos durante uma contração
fatigante – e por isso exerce efeitos ergogênicos.

Liberação de Catecolaminas Durante o Repouso e Exercício Físico


Catecolaminas são monoaminas, compostos orgânicos que têm um grupo catecol –
grupo benzeno com duas hidroxilas laterais nos carbonos 1 e 2 – e uma cadeia lateral
de amina. São exemplos de catecolaminas a adrenalina, noradrenalina e dopamina. A
liberação, por exemplo, de adrenalina e noradrenalina está relacionada à resposta de
luta ou fuga, caracterizada pelo aumento na frequência cardíaca, pressão arterial, níveis
plasmáticos de glicose e, em geral, a uma estimulação do sistema nervoso simpático.

A resposta das catecolaminas em relação à ingestão de cafeína – e metilxantinas re-


lacionadas – tem sido objeto de investigação desde o século XX. A hipótese na época
era que a ingestão de cafeína poderia aumentar a liberação de catecolaminas – adrena-
lina e noradrenalina. A princípio os estudos foram conduzidos em situação de repouso,
sem a utilização de algum protocolo de exercício físico. Nesses estudos foram observa-
dos que uma dose aguda de cafeína aumentava a excreção urinária de catecolaminas.
Esse fato colocou em dúvida se a cafeína apenas aumentava a excreção de catecolaminas,
ou se aumentava a liberação de catecolaminas e, consequentemente, a sua excreção.
Esse “quebra-cabeça” foi montado anos depois, quando estudiosos observaram a cinética
das catecolaminas plasmáticas em relação à ingestão de cafeína. Desde então, é um con-
senso que a liberação de catecolaminas é influenciada positivamente pela cafeína.

Contudo, tal efeito da cafeína não é tão claro para todas as catecolaminas.
Na verdade, existe um consenso em relação à liberação de adrenalina mediada pela
cafeína, podendo ser de 30 a 100% superior ao encontrado na situação placebo
com duração de até 4 horas (Figura 5). Por outro lado, há controvérsias em rela-
ção à liberação de noradrenalina, uma vez que alguns estudos mostram que tem e
outros que não tem liberação de noradrenalina mediada pela ingestão de cafeína.

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UNIDADE
Cafeína

100

90 ***

80 bebida
***
70 Estudo da cafeína
Concentração
de Adrenalina
60
Plasmática
(pg/mL)
50

40
Estudo placebo

30

20

10

0
8:00 9:00 10:00 11:00 Meio-dia

Tempo
Figura 5 – Aumento na liberação de adrenalina mediada pela
ingestão de cafeína (250 mg) em situação de repouso
Fonte: Adaptado de nejm.org

Posteriormente a essa descoberta, estudos começaram a focar na liberação de cate-


colaminas mediada pela cafeína em situações de exercício físico. Tais estudos mostraram
resultados similares aos encontrados em situações de repouso.

No geral, a ingestão aguda de cafeína está associada a níveis aumentados de adrenalina


durante vários tipos de exercícios físicos (Figura 6). Em relação à noradrenalina, o
efeito do exercício associado à ingestão de cafeína na sua liberação ainda é incerto.
Similar ao encontrado em situações de repouso, alguns estudos reportam aumento de
noradrenalina, enquanto que outros não.

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Figura 6 – Liberação de catecolaminas mediada pela ingestão de cafeína durante o exercício físico
Fonte: Adaptado de researchgate.net

Relacionados em conjunto, evidencia-se que a ingestão de cafeína aumenta a li-


beração de catecolaminas, principalmente a adrenalina, em situações de repouso e
exercício físico.

Lipólise e Oxidação de Lipídios


Além da utilização como agente ergogênico, a cafeína tem sido geralmente prescrita
a fim de melhorar a composição corporal – por exemplo, diminuir gordura. Apesar de
esse efeito não ser considerado ergogênico diretamente, pode auxiliar indiretamente
no aumento da performance em algumas modalidades esportivas – estas divididas em
categorias de peso.

A ideia de que a ingestão de cafeína poderia auxiliar na lipólise surgiu a partir de


estudos que verificaram aumento de 40 a 70% nas concentrações plasmáticas de ácidos
graxos livres – sendo estes indicadores bem estabelecidos de lipólise –, acentuação esta
manifestada de 2 a 3 horas após a ingestão em situações de repouso.

De fato, atualmente há um consenso de que a ingestão de cafeína aumenta de 30 a


100% a liberação de ácidos graxos pelo tecido adiposo quando comparado à situação
placebo. O início da lipólise tem sido apontado como, aproximadamente, 1 hora após
a ingestão de cafeína (Figura 7). O mais interessante é que esse efeito parece ser in-
dependente do consumo habitual de cafeína, uma vez que tanto os indivíduos que são
consumidores habituais e os que não o são parecem se beneficiar desse efeito.

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UNIDADE
Cafeína

Outro detalhe importante é em relação ao aumento da lipólise durante o exercício:


conforme exemplo na Figura 7, a ingestão de cafeína aumenta drasticamente a liberação
de ácidos graxos livres na condição de repouso (60 minutos antes do exercício físico),
enquanto que o aumento durante o exercício, apesar de acontecer, é menos evidente.

Além disso, o glicerol, outro marcador de lipólise, não apresenta grandes modifica-
ções mediadas pela cafeína durante o repouso e exercício físico, deixando em dúvida se
realmente a lipólise está aumentada.

Em termos práticos, o efeito da cafeína na lipólise pode ser resumido da seguinte


forma: a ingestão de cafeína provavelmente aumentará a liberação de ácidos graxos du-
rante o repouso e – provavelmente – durante o exercício físico, enquanto que o glicerol
poderá ou não aumentar.

1000
Placebo *
Cafeína
900

800
Arterial [FA] (M)

700

600

* *
500

400

300

200

-60 0 10 30 45 60

Tempo (min)
Figura 7 – Efeito da cafeína na indução de lipólise durante o exercício físico de moderada intensidade

Você sabe como o processo de lipólise mediado pela cafeína acontece no tecido adiposo?
A cafeína age no adipócito de duas formas para aumentar a lipólise: a primeira é através da
inibição direta de receptores do tipo 1 de adenosina; esses receptores são conhecidos por ini-
bir a adenilato ciclase e, dessa forma, atenuar a lipólise. Como a cafeína inibe esse receptor,
consegue ativar a adenilato ciclase e aumentar a lipólise. A segunda é de maneira indireta:
conforme descrito, a cafeína aumenta a liberação de adrenalina – epinedrina – e esta, por
sua vez, é capaz de ativar receptores β-adrenérgicos que estimulam a lipólise (Figura 8).

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Cafeína
Adrenalina adenosina
Adipócito
receptor beta-adrenérgico receptor de
adenilil ciclase adenosina A1

ATP EtOH
AMPK

cAMP PDE
AMP

Gotículas PKA
Lipídicas
HSL
TAG
DAG HSL
ATGL
Cafeína
aFABP FA MAG
aFABP FA
aFABP FA MGL

aquaporina glicerol

Figura 8 – Mecanismos celulares de lipólise induzida por cafeína

Em relação à oxidação de lipídios, o que se sabe é que a musculatura esquelética não


parece absorver mais ácidos graxos livres com a ingestão de cafeína, o que coloca em
dúvida a noção popular de que a cafeína aceleraria a oxidação de lipídios e, consequen-
temente, “pouparia” glicogênio muscular.

Uma das formas de avaliar a oxidação de substratos – carboidrato e lipídios – é através do


quociente respiratório (RER), ou seja, a relação entre o dióxido de carbono produzido (VCO2)
e o volume de oxigênio consumido (VO2). A partir dessa relação (VCO2 / VO2), denominada
taxa de troca respiratória, estima-se a porcentagem da contribuição dos carboidratos e das
gorduras ao metabolismo energético durante o repouso e exercício físico. Assume-se que
para um RER próximo de 0,7, a utilização de ácidos graxos é predominante; enquanto que
em um RER próximo de 1,0, a oxidação de carboidrato se torna predominante.

Muitos estudos utilizando o RER foram realizados para examinar o efeito da cafeína
na contribuição da oxidação de lipídeos e de carboidratos. Enquanto alguns, de fato,
verificaram um valor diminuído de RER, indicando aumento da oxidação de lipídios, a
maioria não encontrou diferenças entre o RER da situação placebo e o da cafeína. Isso
demonstra que, apesar de a cafeína estimular a lipólise e aumentar a disponibilidade de
ácidos graxos na circulação, este não é um fator determinante no aumento da oxidação
de lipídios na musculatura esquelética ativa durante o exercício.

É claro que mais estudos serão realizados ao longo do tempo para tentar resolver de
vez esse “quebra-cabeça”, ainda mais porque estudos como os de Lally e colaboradores
(2012) e de McFarlan e colaboradores (2012), com modelos animais que apesar de nem
sempre refletirem algo fisiológico observado em humanos, principiam as observações
científicas. Estas têm mostrado que a cafeína é capaz de induzir não apenas a lipólise no

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Cafeína

tecido adiposo, como também a importação de lipídios para a musculatura esquelética,


o que por sua vez aumenta a oxidação de lipídios.

Podemos concluir que a utilização de cafeína com o objetivo de aumentar a utilização


de ácidos graxos durante o exercício não é uma conduta nutricional relevante. Se con-
siderássemos apenas os estudos antigos – das décadas de 1970 e 1980 – concluiríamos
que a cafeína é eficaz em aumentar a utilização de ácidos graxos durante o exercício.
No entanto, com o avanço da Ciência e tecnologia e a utilização de técnicas cada vez
mais sofisticadas, estudos mais recentes demonstraram resultados diferentes, em que a
cafeína não aumentaria a oxidação de lipídios – pode ser que estudos futuros com novas
técnicas demonstrem resultados inéditos. Por isso é importante ser um(a) profissional
atualizado(a) e se manter antenado(a) em tudo que há de novo na literatura científica.

Utilização de Glicogênio Muscular


O efeito da cafeína no metabolismo muscular do glicogênio tem atraído atenção du-
rante anos, especialmente no campo da Fisiologia do Esporte, uma vez que já é bem
descrito que a disponibilidade de glicogênio muscular é um fator limitante da performan-
ce em exercícios de moderada a longa duração, realizados em intensidades submáximas.

Semelhante à oxidação de ácidos graxos, os estudos que avaliaram o efeito da inges-


tão de cafeína na utilização de glicogênio muscular não apresentam consenso. Estudos
mais antigos, utilizando doses de 5 a 9 mg/kg de cafeína, encontraram redução na uti-
lização de glicogênio muscular de, aproximadamente, 30 a 40% em relação ao placebo,
em exercícios submáximos – de 65 a 85% do consumo máximo de oxigênio; enquanto
que em estudos mais recentes esse efeito da cafeína não foi encontrado. Isto ocorre por
diversos motivos, principalmente os relacionados aos desenhos do estudo, tal como a
dose de cafeína, o tipo, a intensidade e duração do exercício; e às características dos
indivíduos, tais como a utilização prévia da cafeína, condição do treinamento etc.

No entanto, uma análise retrospectiva realizada por Graham e colaboradores (2008),


na qual os autores incluíram resultados de vários estudos diferentes, mostrou que a ca-
feína não exerce um efeito “poupador” de glicogênio durante o exercício físico. Outro
ponto importante é que estudos com modelos animais também “falharam” em mostrar
que a cafeína consegue poupar a utilização de glicogênio durante o exercício físico.

Cafeína como Recurso Ergogênico: Dosagem


em Diferentes Condições de Exercício Físico
Condições de Endurance
Conforme descrito, o efeito ergogênico promovido pela cafeína é multifatorial, ou
seja, não afeta apenas um processo biológico. Os potenciais mecanismos de ação para
os efeitos ergogênicos observados em exercícios de endurance envolvem o aumento da

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mobilização intracelular de cálcio e da lipólise do tecido adiposo, no entanto, o meca-
nismo que exerce maior contribuição para os efeitos ergogênicos é o antagonismo dos
receptores de adenosina.

Uma metanálise é uma análise estatística que combina os resultados de múltiplos estudos
científicos. A metanálise pode ser realizada quando há vários estudos científicos abordan-
do a mesma questão, com cada pesquisa individual relatando medidas com expectativas
que tenham algum grau de erro. O objetivo é utilizar abordagens estatísticas para obter
uma estimativa agrupada mais próxima da verdade comum.

Nada melhor que uma recente e aclamada metanálise para nos embasar acerca dos
efeitos ergogênicos da cafeína em exercícios de endurance: os autores incluíram 45 es-
tudos, totalizando mais de mil participantes, que realizaram um exercício de endurance
com ou sem a administração de uma dose de cafeína.

Então, vamos lá!

Primeiramente é importante descrever o tipo de indivíduo que foi incluído no


experimento: relacionavam-se em sua maioria de homens com aproximadamente 27
anos de idade e com um VO2 máximo de 57,6 mL/kg/min.

Não sabe como interpretar os valores de VO2 máximo? Acesse este artigo e entenda mais
sobre o assunto: http://bit.ly/2M873qM

Posteriormente, é necessário saber a dosagem e o timing de ingestão. Baseada na


biodisponibilidade, a maioria dos estudos preconizou por administrar a cafeína 60 mi-
nutos antes do exercício de endurance – sendo considerado o timing ideal para a inges-
tão desse ergogênico. Em relação à dosagem, de acordo com Southward, Rutherfurd-
-Markwick e Ali (2018) e Goldstein e colaboradores (2010), a mais comum é de 6 mg/
kg, mas também podem ser prescritas dosagens menores – de até 3 mg/kg –, bem como
dosagens superiores – alcançando 9 mg/kg. Como as dosagens de 3 e 6 mg/kg geral-
mente apresentam efeitos ergogênicos similares, devem ser recomendadas.

Mas quais exercícios são positivamente afetados pela ingestão de cafeína?

Essa metanálise mostrou que, em média, os estudos utilizaram protocolos de exer-


cícios principalmente em bicicleta e corrida com duração de, aproximadamente, 50
minutos. Claro que ocorreram pesquisas com menor duração e em outras modalidades
esportivas que mesmo assim apresentaram efeito ergogênico. No entanto, exercícios
mais prolongados parecem ser mais afetados pela cafeína. Desta forma, para obter os
efeitos ergogênicos da ingestão de cafeína no sistema nervoso central é preconizado que
o exercício de endurance dure, pelo menos, 20 minutos.

Qual é a magnitude dos efeitos ergogênicos?

De acordo com Southward, Rutherfurd-Markwick e Ali (2018) e Ganio e colaborado-


res (2009), metanálises recentes demonstraram que a utilização de cafeína previamente

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ao exercício de endurance gera diminuição de, aproximadamente, 2% (de 2,2 a 2,3%)


no tempo de execução de uma corrida ou ciclismo.

Com a prevalência do uso de cafeína antes e durante eventos de endurance em atle-


tas de elite variando de 70 a 90%, é pouco provável que a cafeína ofereça vantagem
adicional aos atletas em relação aos adversários; no entanto, pode evitar que sejam
prejudicados em comparação a outros concorrentes que também realizam a ingestão
de cafeína.

Para se ter uma ideia, o tempo oficial mais rápido da meia-maratona é de 58 minutos
e 18 segundos, alcançado em 2018. Com o aumento do desempenho médio – encon-
trado em excelentes metanálises já publicadas – sendo em torno de 2,2%, em um evento
de 58 minutos, isso equivale a uma melhora de, aproximadamente, 1min22 – esta, por
exemplo, é a diferença entre o primeiro (58min18) e o décimo lugar (59min42) na lista
dos tempos mais rápidos da meia-maratona de 2018.

Relacionados em conjunto, é preconizado que a suplementação de cafeína seja na


dosagem de 3 a 6 mg/kg e administrada 60 minutos antes do exercício de endurance.

Condições Anaeróbias
Os efeitos ergogênicos da cafeína são bem conhecidos na performance aeróbia – tal
como descrito no tópico anterior –; porém, pouco se sabe sobre tais efeitos em condi-
ções anaeróbias.

Lembrando das aulas de Bioenergética, a utilização predominante do metabolismo


anaeróbio durante o exercício físico ocorre, principalmente, até os 180 segundos do re-
ferido exercício. Dessa forma, neste tópico será descrito apenas o efeito ergogênico em
exercícios que se encaixam nesse período de tempo.

Potência anaeróbia é o máximo de energia liberada por unidade de tempo pelos sistemas
energéticos ATP-CP e glicolítico.

Existem alguns testes físicos que mensuram a potência anaeróbia, tais como o
Wingate – realizado em bicicleta ergométrica – e o Running-Based Anaerobic Sprint
Test (Rast) – realizado geralmente em pista de atletismo. Pela fácil aplicabilidade, o
Wingate tem sido de longe mais estudado e disseminado como avaliação da potência
anaeróbia e, por isso, será o foco deste tópico.

De maneira breve, o teste de Wingate consiste em um esforço máximo de 30 segun-


dos contra uma resistência fixa, geralmente calculada a partir do peso corporal. Este
ainda é um assunto de muita discussão científica, mas de acordo com Franchini (2002),
estima-se que durante o teste de Wingate de 60 a 84% da energia utilizada seja prove-
niente do metabolismo anaeróbio.

Quer saber mais sobre o teste de Wingate? Acesse este artigo: http://bit.ly/33lj4ic

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Em vista disso, alguns estudos buscaram avaliar se a ingestão de cafeína poderia
exercer efeito ergogênico na potência anaeróbia durante o teste de Wingate. Em resu-
mo, mostraram pouco ou nenhum efeito adicional da cafeína na potência anaeróbia.

Apesar de o Wingate ser o teste mais comum utilizado para avaliar potência anae-
róbia, geralmente não reflete os requisitos de desempenho de esportes que envolvem
esforços intermitentes de alta intensidade e, consequentemente, isso gera incerteza em
relação aos efeitos ergogênicos: a cafeína não exerce efeito adicional na performance
anaeróbia? Ou o teste não foi específico o suficiente para identificar a melhora?

Em testes mais aplicáveis, ou seja, em situações reais vivenciadas em alguns esportes


como, por exemplo, corridas intermitentes de curta duração (< 10 segundos) com perío-
dos curtos de recuperação, a ingestão de 6 mg/kg de cafeína tem se mostrado eficaz em
aumentar a performance em, aproximadamente, 8% quando comparada ao placebo.

De acordo com Davis e Green (2009), como recomendação geral, parece que a suple-
mentação de cafeína apresenta pouco efeito, porém significativo, na potência anaeróbia,
principalmente em situações esportivas mais reais com duração máxima de 10 segundos.

Outro elemento importante que constitui a performance anaeróbia é a capacidade


anaeróbia, descrita como a ressíntese de ATP através das vias metabólicas anaeróbias.

Uma das formas de se avaliar esse desfecho é através do teste de Maximal Accumulated
Oxygen Déficit (Maod), que consiste, brevemente, de uma corrida em intensidade su-
pramáxima – por exemplo, 125% do VO2 máximo – até a exaustão, que dura cerca de
2 a 3 minutos.

De maneira geral, os estudos científicos têm mostrado que a cafeína pode aumentar o
tempo de forma significativa até a fadiga nesses tipos de exercício, indicando que a cafeína
exerce efeito ergogênico na capacidade anaeróbia. Os resultados positivos da cafeína não
se limitam a atletas, mas são observados independentemente do nível de treinamento.

Até agora vimos como a cafeína pode ser utilizada ou não em atividades anaeróbias
relacionadas à corrida e ao ciclismo, mas a famosa musculação também é uma atividade
que tem predomínio do metabolismo anaeróbio para a produção de energia.

A cafeína é ergogênica para quem pratica musculação?

Pesquisas científicas sobre os efeitos da cafeína em esportes ou atividades de força, em-


bora variadas em relação aos resultados e desenho do estudo – o que dificulta a interpre-
tação –, sugerem que a suplementação pode ajudar de maneira branda atletas treinados
em força e potência, principalmente na realização de exercícios de membros superiores.

Relacionadas em conjunto, a cafeína, geralmente em doses moderadas (de 4 a 6 mg/


kg) parece aumentar a performance anaeróbia, principalmente em situações que simu-
lam o esporte, podendo também ser utilizada para elevar minimamente o nível da carga
durante o treinamento de força.

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Cafeína

Esportes Coletivos
Geralmente, em esportes coletivos há alternância entre momentos com predomi-
nância aeróbia e anaeróbia. Conforme demonstrado, em ambas as condições a cafeína
consegue exercer algum efeito ergogênico, apesar de menos evidente em atividades
anaeróbias. Dessa forma, é de se esperar que em modalidades esportivas a ingestão de
cafeína aumente a performance. De fato, isso é verdade.

De acordo com Goldstein e colaboradores (2010), estudos investigando, por exemplo,


futebolistas e rugby mostraram melhora de até 10% na precisão de passes, bem como
diminuição da fadiga em exercícios de tiros repetidos, com 6 mg/kg de cafeína.

Nesse contexto, em um estudo clássico conduzido por pesquisadores australianos,


colocaram jogadores de futebol e hockey para correr de forma intermitente por 80
minutos – divididos em dois tempos de 40 minutos –, simulando uma condição real de
jogo, com ou sem a suplementação de cafeína (6 mg/kg). Cientistas como Schneider e
colaboradores (2006) perceberam que houve aumento da performance em, aproxima-
damente, 8% quando os jogadores ingeriram cafeína.

Dessa forma, fica evidente que a suplementação de doses moderadas de cafeína (de 4 a
6 mg/kg) exerce efeito ergogênico em esportes coletivos com características intermitentes.

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Material Complementar
Indicações para saber mais sobre os assuntos abordados nesta Unidade:

Livros
Cafeína: ergogênico nutricional no esporte
ALTIMARI, L. R.; CYRINO, E.; ZUCAS, S. et al. Cafeína: ergogênico nutricional no
esporte. Revista Brasileira de Ciência e Movimento, v. 9, n. 3, p. 57-54, 2008.

Consumo máximo de oxigênio: fatores determinantes e limitantes


DENADAI, B. S. Consumo máximo de oxigênio: fatores determinantes e limitantes.
Revista Brasileira de Atividade Física & Saúde, v. 1, n. 1, p. 85-94, 1995.

Teste anaeróbio de Wingate: conceitos e aplicação


FRANCHINI, E. Teste anaeróbio de Wingate: conceitos e aplicação. Revista Mackenzie
de educação física e esporte, v. 1, n. 1, 2002.

Cafeína e esporte
GUERRA, R. O.; BERNARDO, G. C. GUTIÉRREZ, C. V. Cafeína e esporte. Revista
Brasileira de Medicina do Esporte, v. 6, n. 2, p. 60-62, 2000.

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Cafeína

Referências
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v. 39, n. 10, p. 813-832, 2009.

FRANCHINI, E. Teste anaeróbio de Wingate: conceitos e aplicação. Revista Mackenzie


de educação física e esporte, v. 1, n. 1, 2002.

GANIO, M. S. et al. Effect of caffeine on sport-specific endurance performance: a


systematic review. The Journal of Strength & Conditioning Research, v. 23, n. 1,
p. 315-324, 2009.

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caffeine and performance. Journal of the International Society of Sports Nutrition,
v. 7, n. 1, p. 5, 2010.

GRAHAM, T. E. et al. Does caffeine alter muscle carbohydrate and fat metabolism
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and exercise in diabetes mellitus. Applied Physiology, Nutrition, and Metabolism,
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