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Psicopatologia I
2020/2021

DÁ EM
CONNOSCO

DOIDOS(AS)

MESTRADO

☠️
O
1ª Aula Teórica (18 de setembro)

Avaliação da Cadeira:
- Exame (90%)
- Presenças nas aulas (10%)

e-mail: antonia_carreiras@ispa.pt

Algumas noções:
• O ser humano é um ser biológico, porém é também um ser cultural!
• A condição humana advém da relação que estabelecemos com o outro. Sem a solidariedade
do outro para connosco morreríamos, estes laços são interiorizados e fazemos deles nossos,
sendo desenvolvidos por nós em relação aos nossos descendentes.
• O bebé desconhece-se e desconhece o mundo que o rodeia e necessita do suporte de outro ser
humano (cuidador/mãe), e nessa relação com o outro, vai adquirindo ao que podemos chamar
de “características humanas". Características como a solidariedade, se não houver um ser
humano que se solidarize, o ser humano não nasce. É extremamente importante e necessário
que alguém nos apoie para futuramente sermos capaz de fazer o mesmo com o outro.

Perguntas:
O que é que uma criança sente quando entra pela primeira vez na escola, com 5 anos?
Todo o entendimento dos seres humanos é sempre o desentendimento.

Teste presencial: escolha múltipla e perguntas de desenvolvimento


Teste no pc: apenas perguntas de desenvolvimento
Questão de desenvolvimento - Reflexão crítica, analise critica sobre o que é perguntado elaboração,
(relacionar vários conceitos)

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1ª Aula Prática (23 de setembro)

Artigo: Fantasmas no quarto das crianças (equipa de 3 pessoas, uma psicóloga, assistente social e
psicanalista)

Existem fantasmas na mente das pessoas, existem fantasmas “positivos”, que são como constructos
humanos que se relacionam com meio em que nos encontramos, nas relações com outros e que estão
presentes para nos auxiliar. Os fantasmas negativos são seres que emergem e desencadeiam
estratégias defensivas face aos mesmos! Mas a mente dos pais também tem fantasmas positivos.
Com o nascimento de uma criança há fantasmas na mente dos pais, que com o nascimento,
que tem a ver ou estão relacionados com a sua história de vida. Estes fantasmas podem ser atualizados
de fantasmas já existentes (estão lá antes, porém adormecidos). Estes fantasmas surgem, mas podem
ser fantasmas que só aparecem de vez em quando ou com mais insistência, no entanto os pais têm
outros lados positivos que os ajudam a digerir os fantasmas com mais facilidade.
Há situações que os fantasmas surgem com uma grande intensidade, e quando estes fantasmas
emergem, levam os pais a ler/encarar o bebé de uma certa forma/maneira que não tem a ver com o
presente do bebé, mas sim com o passado dos pais, como se o passado dominasse o presente dos
mesmos. Estes fantasmas, fantasmas no sentido pejorativo e negativo, podem intoxicar a relação dos
pais com a criança, o que pode comprometer o desenvolvimento da criança.
Devemos ter em conta se que o tal bebe está numa família disfuncional, pois vamos interferir
de forma a prevenir situações mais patologias que podem vir a ser instaladas futuramente. Estes
fantasmas que vêm com maior intensidade não têm a ver com presente do bebé, mas sim com o
passado dos pais (fantasmas – medos). O Trabalho de prevenção contra quadros que se possam vir a
instalar-se nalgum bebé. Nalguns casos existe uma intervenção deve ser não só no bebe, mas junto
do bebé, pai, mãe e possível família presente no dia-a-dia daquele bebe.
Relativamente ao artigo, estão fundamentadas várias intervenções de prevenção. Em situações
mais problemáticas, não basta intervir com o bebé, mas também com os pais.
No caso do Greg (bebé de 3 meses e meio) existem dois pacientes, ele e a sua mãe.

História do Caso:
- Ambos os pais são adolescentes;
- Mãe do Greg (Any, com16 anos) evitava contacto físico (não queria contacto com o bebé), preferia
que fosse o pai da criança a fazer tudo. Por vezes, a mãe esquecia-se de comprar leite para alimentar
o Greg.
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- Esta família era muito conhecida na comunidade há 3 gerações. Era reconhecida pelos maus tratos,
muitos problemas graves, delinquência, pobreza, abandono, etc.
- Esta seria a 3 geração de mais problemas nesta família, e, portanto, a avó da Any (bisavó do Greg),
como não queria que acontecesse o mesmo que tinha acontecido com ela (positivo), fez o pedido
de ajuda ao serviço (tinha consciência do sucedido e preocupação pela bisneta). A avó da Any não
queria que ela passasse pelo mesmo que ela e a sua filha (mãe da Any), ambas tinham entregado
os filhos a outros. Ao invés disso, a bisavó desejava que a Any e o Greg tivessem uma vida melhor
que a dela e que vivessem coisas mais positivas juntos.
- A mãe, Any (adolescente), vista como fria, hostil (silêncio hostil), muito calada e sempre no seu
canto. O pai do Greg parecia infeliz, tem um ar triste e perdido. O próprio bebé tinha uma cara
sempre séria e não era risonho.
- Numa visita da assistente social, é percetível que o bebe Greg não olhou para a mãe durante toda
a visita/entrevista (1h).

Hipótese levantada:
Possivelmente não houve vinculação segura (vinculação insegura). O estímulo visual mais
interessante para um recém-nascido é o (mais semelhante a um) rosto humano (mais expectável o da
mãe/cuidador).

Como é que o rosto da mãe não é interessante para o Greg?


Não se desenvolveu uma relação em que o rosto da mãe fosse o estímulo mais apelante e interessante
para ele. Esta mãe não esta disponível para o bebe, não se ri para ele, não brinca com ele, não interage
então o bebe “desiste” dessa relação.

A assistente social achou que o Greg tinha um desenvolvimento mais ou menos normal, e
mais tarde seria realizada uma avaliação psicológica. Parecia ter recebido o mínimo de cuidados
básicos e apropriados. Estes cuidados (como suposto) era o pai que os assegurava e prestava, Any
pedia ao marido. Durante a visita foi sempre o pai que dava atenção a Greg, o bebé sorria para o rosto
do pai e parecia confortável nos seus braços. Quando o Greg precisava de auxílio, Any dizia sempre
ao pai do bebe para tratar dele, a Any parece não ser uma mãe 100% abandonada pois ainda responde
ao que ouve do bebe. Any parecia ter uma máscara que tapava os seus sentimentos e expressões
faciais, estava esparramada no sofá.
Pode haver uma agressividade dentro dela, uma contenção. Any não queria a ajuda da equipa,
afirmava que ela e o bebé não tinham problemas, e acusava a mãe e a equipa de conspirarem contra

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ela. E na sua cabeça, a assistente social não estava lá para ajudar, mas sim para a prejudicar. Assim o
mais complicado seria alcançar a confiança da Any. Ganhar a confiança da Any na relação terapêutica
seria a tarefa mais difícil bem como mantê-la depois de a alcançar. A projeção dos seus fantasmas e
da sua história passada na Mrs shapiro (assistente), em que o ataque não é diretamente à Mrs shapiro,
a assistente compreende e mantem-se disposta a ajudar esta mãe.

A equipa de intervenção, ao pensar em conjunto, emerge a questão:


“Porque é que a Any não toca ou evita tocar/pegar no bebé Greg?”
Será que não gosta dele, ou até não faz para o proteger?
 Para encontrar repostas a questões deste género é necessário conhecer melhor a Any. Não
por ter falta de informação, ou desconhecer. Mas existe sim uma razão interna para este
comportamento específico da Any.

Mas seria bom/adequado a assistente social perguntar o porquê de a Any não pegar no bebé?
 Any poderia levar esta questão como um ataque e sentir-se-ia fragilizada, dificultando a
tentativa de ganho de confiança da Any por parte da Mrs Shapiro. E com esta pergunta,
que poderia ser interpretada como um ataque, não seria a melhor escolha. É através do
incentivo dos pais a sentirem se competentes no seu papel de cuidadores, assim como no
apoio fornecido na parentalidade que se ganha/adquire a confiança dos mesmos para que
se torne possível intervir de forma eficaz.

Assim sendo o objetivo principal é tentar perceber o porquê destas atitudes e comportamentos
com o Greg. Ou seja, compreender as razões subjacentes do comportamento desta mãe para
com o seu filho.

Na 6ª visita:
A assistente achava que a própria Any tinha uma criança abandonada dentro dela, que
precisava de mais atenção. Quando Any começou a falar mais sobre ela, foi percetível que se irritava
muito quando alguém dizia que ela não tomava conta do seu bebé. E ela sabia. Any afirma que desde
pequena nunca quis/desejou ter um bebé, pois quando era mais nova teve de ocupar o papel de mãe
(com a irmã mais nova), teve de ajudar a cuidar da sua irmã mais nova, o que a impossibilitou de
viver a sua infância. Ou seja, não teve a possibilidade de viver a sua condição infantil, não ouve
espaço para esta poder ser criança.

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• Com 9 anos ela tinha de fazer a lide doméstica (tomava conta da casa), fazer o jantar, cuidar
dos seus irmãos depois de virem da escola e por vezes era espancada pelo padrasto. Ela não
queria ter este filho, pois teria que lidar com tudo isto de novo (ser mãe e cuidar de alguém).
A Any pronunciou-se a cerca da sua infância e falou desta com uma voz monótona e com
amargura, enumerava sem afeto todos os pormenores da sua história. Any narrava sem
sentimentos (afetos), como se não fosse capaz de os recordar a associara às palavras que
proferia enquanto falava.
• A mãe de Any abandonava regularmente a sua família, o pai morreu quando ela tinha 5 anos,
e o padrasto que aparecera depois era alcoólico e provavelmente psicótico.Any conta a história
de que um dia o seu padrasto a lavara para um barracão e que a esbofeteou e bateu com um
bastão. Depois de ouvir a história de Any, a assistente social mostrou empatia para com a
mesma, mas Any recusou os sinais de simpatia da terapeuta e começou a rir-se (cinicamente).
Any explicou que quando existiam estes episódios de maior violência ela e a irmã riam-se.
Quando a assistente descrevia que o afeto que estava presente nesses acontecimentos de
violência (como a tristeza, por exemplo), ela voltava a rir-se.

Hipótese levantada:
Riso como uma possível forma de tentar triunfar sobre o padrasto, que esta associado a um sofrimento
imenso dela que parece ser invertido e sair na forma de riso. “O que tu nos fazes, não nos afeta!”.
Como se Any não conseguisse contactar com os lados de infância dela, de mágoa, zanga e impotência.
Ela faz a terapeuta o que fazia aos outros quando se fala sobre estas partes e episódios de teor mais
sensível da infância. Parece não ser capaz de tomar conta das suas partes infantis, logo não é capaz
de tomar conta das partes bebés e infantis do seu próprio filho.

• Pela primeira vez desde o início das sessões, é na 6ª sessão que a terapeuta vê a Any a pegar
no seu filho quando este chorou. Any foi buscá-lo ao quarto e trouxe-o com ela. Foi a primeira
vez que a assistente viu Any a comportar-se daquela maneira.

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O que poderá ter acontecido?

Tal acontecimento faz nos pensar que a terapeuta pode ter “dado colo” à Any, ouvindo-a escutando-
a, apoiando-a, permitindo o sofrimento desta, dando-lhe a atenção que não teve quando fora mais
nova. E assim esta foi simultaneamente capaz de dar colo também ao seu filho. Talvez se Any
conseguir falar mais sobre a sua infância, talvez venha a ser uma mãe mais protetora. A parte criança
de Any não foi escutada. Ela não conseguiu ser criança. E tomar conta de crianças, também é
escutar/ouvir as crianças. Como Any nunca foi escutada quando era pequena, não consegue escutar
agora o seu filho Greg. É como se ela não pudesse tomar conta das suas partes de bebé, logo não
consegue tomar conta das partes do seu bebé. Parece que esta mãe esta no passado, e que o seu
passado estava a contaminar o seu presente.

• A Any conta ainda que o pai lhe cortou o cabelo pelas orelhas e pela primeira vez comenta
com a terapeuta o quão terrível aquele ato foi para ela, e que chorou durante 3 dias por causa
dele (associou uma emoção negativa a um acontecimento que partilhou com a terapeuta). Any,
para além deste acontecimento que referiu, tem guardados, na memoria, vários episódios,
porém não tem nenhum afeto que se associe aos mesmos (ex. historia acima do bastão que
conta friamente).
• O Greg parece querer um brinquedo (martelo), Any brincou com o martelo suavemente na
cabeça do bebe, pouco depois a Any diz “quando fores grande talvez te mate”, ainda há aqui
alguma agressividade, e partes não tão maternas nesta mãe.

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2º Aula Teórica (25 de setembro)

Em meados do século passado, o bebé descrito pela ciência era visto como um tubo digestivo
(comia, bebida, secretava e precisava de dormir). Depois descobriram-se características
extraordinárias, comos as suas inúmeras competências. Foi percecionado que os recém-nascidos e
bebés têm inúmeras competências, porém são seres extraordinariamente imaturos, vulneráveis e
dependentes pois estes seres não sobrevivem se não tiverem outro que cuide deles e que lhe satisfaça
certas necessidades.
Do ponto de vista de Bion, o desenvolvimento do bebé só é possível através da relação. Afirma
que a personalidade do bebé se vai construindo na relação com o outro. A entidade maternal partilha
a mente com o mesmo.
O que o bebé à partida vai ser, tem muito a ver com o seu equipamento biológico, mas também
com a tal mente que lhe vai ser emprestada (mente do cuidador). Cuidar de um bebé é atrativo, no
entanto não é de todo fácil, o bebe é um ser que não fala e não explicita as suas necessidades e sentires
através de palavras. O que se debruça sobre ele para cuidar dele, tem uma tarefa árdua e extremamente
complicada pois tem de ser capaz de cuidar dele e compreender as necessidades que têm de ser
satisfeitas.
Nota: T. Berry Brazelton: Ansiedade manifestada no fim da
gravidez, estava relacionada com a receção do bebé, nas mães.

Os pais têm cerca de 9 meses de gestação para se prepararem para receber o bebé. Esta
preparação compreende uma parte psíquica, composta por viagens internas que os pais fazem dentro
de si, com o rememorar a sua infância e rememorar a própria relação com os seus pais (preparação
em termos psíquicos é, às vezes, mais visível /percetível nas mulheres do que os homens, em termos
comportamentais).
A mãe, para ser capaz de cuidar do bebé, tem de se identificar com o seu bebé, acabando
também por se identificar com a sua própria mãe (no sentido lato, neste caso cuidador), para tentar
responder da melhor forma as necessidades do seu próprio bebé. Para a mãe cuidar do se bebé precisa
de se identificar com ele, e para tal, tem de se rememorar (relembrar) da sua própria experiência com
a sua mãe. Tem de saber identificar quais os estados do bebé e identifica-se com a sua mãe para
satisfazer as necessidades do seu bebé. É expectável que os pais durante a gravidez se preparem para
receber e acolher o bebé, tanto fisicamente (externa – ex. preparar o quarto do bebé) como
psiquicamente (interna). A preparação mental para acolher o bebé, consiste nos cuidadores reviverem
as suas épocas de bebé para poder cuidar de melhor forma os seus próprios filhos bebés. Os recém-

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nascidos são pequenos seres humanos desamparados que necessitam de cuidados prestados por
outro(s), para se conseguirem desenvolver saudavelmente.

Winnicott, psicanalista britânico (antes pediatra), trabalhou muito nesta área, no decorrer da
sua observação, achou que nos últimos meses de gravidez e primeiros depois do bebe nascer, as mães
se encontravam num estado psíquico particular, a que chamou “Preocupação Maternal Primária”.
Wnnicott, afirma também que não existe um bebé, existe um bebé e uma mãe, e que é bom que nos
primeiros tempos a mãe dê a ideia de que o bebé é um ser indiferenciado.

O bebé recém-nascido não tem mente e, para que consiga desenvolver a sua própria mente,
necessita da mente de um outro que esteja disponível para a “emprestar”. As mães grávidas e com
recém-nascidos encontram-se num estado de loucura/paixão total pelo seu bebé – a que Winnicott
chamou de preocupação maternal primária - em que se encontram totalmente focadas no bebé,
conseguindo assim estar atentas aos seus movimentos e necessidades dando respostas adequadas.
Assim, no estado de preocupação maternal primária, a mãe vai fantasiar e imaginar o seu bebé. Ao
imaginar esse bebé, os pais vão viver emoções relativamente ao bebé até ao momento em que se
confrontarem com ele.

A Preocupação Maternal Primária, é um estado psíquico particular em que as mães estão


muito ocupadas com os seus bebés, nos seus primeiros tempos de vida. O universo psíquico das mães
fica centrado nos bebés. “A mãe está louca de amores pelo seu bebé.”. A “paixão é um estado de
loucura normal” relativamente aos adultos e, a mãe, nos últimos meses de gravidez e primeiros após
o nascimento do bebé, vive um estado de loucura (normal) relativamente ao seu bebé. Mãe
apaixonada (estado de loucura normal) pelo seu bebé, absolutamente centrada no seu bebé. Consiste
numa preocupação ou ocupação mental da mãe para com o seu bebé dos primeiros tempos de vida do
mesmo. Só focalizam no bebe, só falam dos bebés, o universo psíquico centra se no bebé. Esta
“doença”, em que a mãe parece estar centrada no seu bebé, permite lhe adaptar-se e assegurar ao bebe
um sentimento continuo de existência. É importante nos primeiros tempos as mais terem a perceção
de que o seu bebé é indiferenciado.

Definição de Preocupação Maternal Primária segundo Winnicott:


Esta condição organizada, (que seria uma doença no caso de não existir uma gravidez), pode
ser comparada a um retraimento, dissociação, fuga, ou até mesmo com uma perturbação a um nível
mais profundo como um episodio esquizoide em que num determinado aspeto da personalidade toma
poder temporariamente. Esta condição deve ser levada em consideração à primeira fase da vida
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infantil, nesta fase inicial da vida infantil a mãe deve ser capaz de alcançar este estado de elevada
sensibilidade (quase doença) e depois recuperar. A palavra doença é empregada nesta definição pois
a mãe deve ser saudável para desenvolver este estado e conseguir recuperar-se dele quando o bebé a
“liberta” (quando o bebé cresce, e já não necessita tanto dela).

Acrescentado de apontamentos (fiáveis, Carreiras, 2017):


Quando o bebé nascer, é suposto que o bebé real surpreenda e suplante o bebé imaginário.
Contudo, pelo contrário, pode acontecer uma desilusão, em que o bebé real não preenche
narcisicamente a mãe e, consequentemente, ela não investe narcisicamente no bebé. É suposto que
este estado de loucura inicial desvaneça com o crescimento do bebé, para não pôr em causa o seu
desenvolvimento (Carreiras, 2017). Para que a mãe seja capaz de dar respostas adequadas precisa de
(a) se identificar com o bebé e (b) identificar-se com a sua própria mãe, ou seja, com a função materna.
Quer isto dizer que a mãe precisa de criar espaço e preparar sua a mente para o bebé, isto é, fazer
consecutivas viagens mentais à sua meninice, tornando-se mais próxima dos desejos e necessidades
infantis. Criar espaço mental para o bebé significa também ocupar-se dele ainda antes de nasces,
pensar como será, o que precisará, preparar inclusive coisas físicas para o receber. Se a mãe apenas
se identifica com o bebé irá “viver” aquilo que o bebé vive não lhe proporcionando respostas
adequadas. Desta forma é necessário que se identifique também à sua função materna, ou seja, que
viagem também pelos momentos que passou com a sua mãe, conferindo-lhe assim uma certa
sabedoria no que diz respeito a esta nova tarefa de ser mãe (Carreiras, 2017).
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Para Bion, a mente humana também é um operador, há dados externos que capto e que
transformo em dados mentais. A mente também é como uma espécie de “aparelho digestivo”: na
minha mente tenho determinados operadores, a mente processa os dados da realidade externa, que se
transformam face a várias vicissitudes em dados mentais. Bion fala do aparelho para pensar, e nas
funções da mente, sendo que uma das funções da mente é a função Alpha.
Bion denomina Função Alpha, como a capacidade que a mente materna deve ter para receber
e acolher tudo o que o bebé lhe envia – elementos beta – processando dentro dela de forma a dar
respostas adequadas ao bebé – elementos alfa. A função alfa é um dos conceitos-chave de Bion. É
nela que todas as impressões brutas são convertidas em elementos alfa, isto é, elementos mnésicos
suscetíveis de serem guardados, sonhados, pensados e comunicados. Os elementos beta são
processados pela função alfa que são transformados em elementos alfa, que já são elementos mantais
suscetíveis a serem guardados na memória, associados e pensados.

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Esta Função Alfa é uma função fulcral de acolhimento, processamento e transformação dos
dados da realidade externa, esta função permite nos sonhar e pensar. Os elementos beta
(dados/elementos brutos) são apropriados e processados (“tratados”) pela função alpha e
transformados em elementos alpha que são suscetíveis a serem processados, transformados, pensados
e guardados na memória. A mãe é que tem a função alfa, e inicialmente quando o bebe é pequeno,
este vai adquirindo/apropriando essa função através da mãe. Cabe a mãe fazer esta função ate que a
criança tenha autonomia. Com a ajuda da mãe, o bebe a pouco e pouco também vai construindo e
desenvolvendo a função alpha. Quando a mãe responde consecutivamente de forma adequada ao bebé
este acaba por perceber que a seguir ao desconforto e à aflição vem o conforto. Mais tarde esta noção
faz com que o bebé deixe de chorar assim que se aflige passando ele próprio a incorporar e
desempenhar a função alfa (Carreiras, 2017).

Há mães que são capazes de imaginar muitas possíveis origens de uma aflição do bebé o que
as torna mais flexíveis e, por isso, capazes de dar respostas mais adequadas – a isto chama-se
capacidade de Rêverie, que corresponde a esta capacidade de imaginação inerente à função alfa que
está relacionada com a história de vida da própria mãe e da preparação que fez para aquele bebé
(Carreiras, 2017).

“Rêverie” sonho acordado, devaneio. A mãe é capaz de sonhar o que se passa com o seu
bebé e é capaz de levantar várias hipóteses sobre o que se passa com ele. A capacidade de Rêverie
prende-se com uma mãe com uma mente mais enriquecida, variada e flexível de imaginar o que se
passa com o seu bebé. Quantas mais hipóteses coloca mais probabilidade e acertar na necessidade do
bebé, logo quanto mais flexível e variada a mente da mãe, melhor para o seu bebé.
Um bebé que não é salvo pela mãe, é um género de um terror sem nome, relacionado com os
elementos beta do bebe, quando a mãe não lhe responde convenientemente há uma sobrecarga dos
elementos beta da mãe. Quando um bebé esta sempre submerso na angústia que não é processada,
este não é capaz de se desenvolver saudavelmente. A mãe é contentora, uma mente que contem outra,
uma mente que é continente de outra mente, função de continente que apoia o benéfico e vantajoso
desenvolvimento do bebé.

Acrescentado de apontamentos (fiáveis, Carreiras, 2017):

Só porque a mãe é capaz de dar colo mental ao bebé é que a torna capaz de dar colo físico também.
O colo mental, que corresponde às interacções fantasmáticas, é sobretudo preparado quando a mulher
sabe que está grávida. Contudo, se pensarmos bem já foi sendo preparado antes, desde de muito cedo

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na infância, mas não de uma forma especifica. Assim, vai sendo preparado à medida que se cresce,
consolidando essa preparação na altura que se descobre que se está grávida, realizado através de
viagens às suas recordações, revivendo alguns caminhos da infância, com identificação à sua mãe e
identificação com a mesma. Este colo só existe quando há uma sintonia/ harmonia entre os pais e o
bebé e deve ser rico, generoso, flexível e acessível de forma a depois se adaptar à realidade (Carreiras,
2017).

Podemos identificar dois tipos de interacções mãe-bebé: (a) interacções fantasmáticas, que
corresponde ao lugar que o bebé ocupa nas fantasias internas da mãe (ex. forma de chamar o bebé) e
(b) interacções físicas, que correspondem à forma como a mãe interage fisicamente com o bebé (ex.
como o pega ao colo). A forma como estas interacções são feitas depende então muito da história da
vida da mãe, isto porque estas mudanças invocam a sua história relacional bem como as suas fantasias
ou fantasmas. Por outro lado, existem ainda aspectos culturais que vão ser transmitidos aos pais e que
vão influenciar algumas ideias sobre o bebé e sobre as práticas com o mesmo. Por exemplo, a nossa
cultura promove algum distanciamento físico entre a mãe e o bebé de uma forma muito precoce (ex.
utilização de carrinhos) que vão promover um maior desenvolvimento da comunicação à distância e,
portanto, uma maior autonomia dos bebés (Carreiras, 2017).

Conclusões da aula:
A partir da década de 70 à inúmeros estudos que vieram revelar que os recém-nascidos são
seres com competências, mas que necessita das necessidades básicas. O bebé não tem uma mente,
esta vai-se desenvolvendo com o decorrer do tempo, o bebé precisa de alguém que lhe ofereça uma
mente. E com essa mente o bebe vai construir a sua através das suas competências. A mente do bebé
vai depender das características da mente que lhe é emprestada. Assim, como o bebé não tem mente,
esta costuma ser-lhe oferecida pelo cuidador principal, de
forma a apoiar a formação da sua própria (mente do bebé).

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2ª Aula Prática (30 de setembro)

Importância da mente da mãe, para a mente do bebé, que é subsidiária das mentes que servem
de apoio para ele, que ajudam na sua construção e constituição e que servem de apoio ao
desenvolvimento da deles (mente dos bebes), neste caso as mentes subsidiarias são geralmente a dos
pais (cuidadores).
Ainda sobre o texto lido do Greg, as mudanças internas na relação da mãe com o bebé, foram
importantes para potenciar o bom desenvolvimento do bebé.
Para o recém-nascido, há sempre uma certa dependência relativamente à mãe, pois tem de ser
a mãe a apresentar o mundo e organizá-lo, para aos poucos o bebe ser capaz de se desenvolver e de
ser mais autónomo do ponto de vista psíquico. Somos tanto mais dependentes do outro, quanto menos
a nossa função simbólica é mais precária (menos desenvolvida).

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Caso Sarah, 7 meses:

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Acerca do caso:
Bebé Sarah, com 7 meses, que não está bem, apresenta indícios de depressão, parece pouco viva,
pouco ativa, pouco curiosa, com pouco interesse pelos brinquedos e pelo observador (psicólogo).
Os bebés são extremamente sensíveis ao estado emocional dos outros, um bebé é atento às tenções
musculares do corpo (demonstrações corporais da mãe, corpo mais tenso bebe mais ansioso) e são
muito sensíveis ao estado emocional do outro, em particular a aquele que e significativo para ele,
neste caso o cuidador (encontro íntimo, ter uma mãe virada para si). Para um bebé o conteúdo do
discurso verbal, não interessa, pois, este não é compreensível para ele.
• A mãe começa a chorar, e a bebe parece que fica preocupada com a mãe, assim esta bebé vai
de encontro à aflição da sua mãe. Existe um encontro visual mutuo (cruzam o olhar) entre o
bebe e a mãe, porém a mãe desvia o olhar da sua filha, quando ela desvia o olhar, pode-se
levantar a hipótese, de como esta mãe não está muito viva para a sua bebé, este meio que
deprimida, e como a mãe não vive muito esta relação mútus mãe-bebe (falta de encontro e
comunicação entre as duas), quando vive (olhar mutuo) quer acabar, ou seja, abandona o olhar
para não ser abandonada, quebra o encontro de olhares para não criar expectativas de um
sempre que não existe.
• Não é muito frequente a vivência da troca de olhares interações entre a mãe e a bebe. A mãe
de Sarah faz uma grande identificação com a sua filha, e parece que tem receio que por ser
uma menina, ela também, à semelhança dela (mãe) vá viver coisas tristes e amargurosa. A
uma projeção do passado na filha, como se a mãe tivesse no passado e não no presente, como
se a sua filha uma segunda edição dela própria. Colocação do passado dela no da filha (Não
querendo ter uma menina para a menina não ser infeliz como ela).

• Quando há personagens mais atentas para com ela, Sarah tem atitudes diferentes (o que para
a psicóloga é positivo). Estas outras relações com outros, são vistas como variáveis protetoras
face ao que se passa na sua relação com a mãe. Sarah é reativa ao estímulo da mãe. A bebé
prefere o pai e o irmão. O irmão de 5 anos, tem uma boa relação com a bebé, por ser mais
atento a esta, a bebé guarda-se para relações que sejam mais gratificantes para ela. Sarah reage
a parceiros mais ativos e vivos (irmão, pai e psicóloga), reage de forma diferente do que com
a sua mãe, o que não significa que não goste dela (apenas lida de forma diferente).
• O facto de a mãe não querer falar alto perto da bebé, porque diz que esta se assusta com tal
feito é provável que seja uma fantasia da mãe. A mãe fala com voz monótona e baixa, para
“não assustar a bebé”.

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• Quando a mãe chama pela bebé e esta não responde, a mãe não gosta (desagrado face à
“ignorância” a que foi sujeita por Sarah), e reage de forma imprópria, e chamando a bebé de
“malina”.

Porque é que chama má à filha?


• Para um bebé, se a mãe não lhe dá aquilo que ele quer, a mãe é má, mas para um adulto já não
funciona da mesma maneira. Os bebés não têm a capacidade de ver nos outros o bom e o mau,
bem como não têm a flexibilidade para interpretar nem distinguir as coisas boas das coisas
más. Ou seja, o mau e o bom é apenas vivido pelo bebé em função de si próprio, se têm o que
querem é vivido como bom (as pessoas que proporcionam o que o bebé quer são boas), se não
têm, as pessoas são más.
• Ao interpretar a resposta da filha como agressiva (com o ponto de vista de um bebé), responde
na mesma forma, sendo que não é correto, pois os pais já devem ter a capacidade de
interpretar. Como a mãe vive a rejeição por parte da bebé como agressiva, responde de forma
agressiva também à sua filha ao chamar-lhe “má” bebé, esta a ser uma “má menina” por não
estar a responder ao chamamento da mãe. Se não me das aquilo que eu quero (função da bebé)
eu retalio, como se a bebé tivesse uma função para a mãe, e quando a bebé não lhe dá o que a
mãe quer, a mãe retalia e responde em conivência (responde mal e fica chateada). No fundo é
como se, para a mãe, a bebé tivesse uma função (a minha bebé tem de me dar alguma coisa,
quase como se fosse uma mãe para ela).

Uma mãe com estas características não vão facilitar a evolução da bebé nem a conquista da sua
autonomia. O bebé não vai ser capaz de fazer a conquista da separação psíquica de forma a esta
conseguir atingir a autonomia psíquica (incapaz de construir um objeto interno seguro)! Esta
separação psíquica é fundamental para o alcance da autonomia do bebé.
A mãe não suportava que a filha revelasse autonomia (ex. entretida com brinquedos) e
considerava isso como uma rejeição, como um abandono por parte da filha, e respondia em função
disto tornando a relação das duas mais pobre, mais rígida e menos agradável, o que conduzia a bebe
a ser mais explicita no afeto em relação a outros do que relativamente à sua mãe. Tal transmitia à mãe
que a filha não gostava dela. O que não significa que isso seja verdade! A mãe não quer que ela deixe
de ser bebé, não quer que a filha deixe de precisar dela.

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Hipótese levantada:
A mãe talvez agisse assim, para que quando Sarah crescesse não passasse pelo mesmo que ela já
passou, ou seja, pelo que a mãe já passou na sua vida, no fundo para não ter um destino tão próximo
do seu.

• Inicio do tratamento, 9 meses da Sarah (fez pouco progresso), sem mostrar interesse pelos
brinquedos à sua volta, era muito sossegada, tentava raramente provocar interação com a mãe,
e quando tal acontecia era durante pouco tempo. A bebé parecia deprimida com a mãe,
havendo por parte de Sarah uma tentativa de encontro através da agressividade (bateu na mãe
quando esta lhe pegou ao colo) na tentativa de obter mais conforto no colo da mãe, porém não
conseguem ter uma interação com muita duração.
• A mãe (da bebé) nasceu para substituir o seu falecido irmão, para sarar a ferida dos pais, no
entanto ela não consegue ser o irmão, e sente que não havia espaço para ela, por parte do pai.
O pai não investia nela, e na sua fantasia culpabilizou-se a si própria por não ser o irmão
falecido e não ao pai, “se eu fosse o meu irmão, teria sido mais investida pelo meu pai”.
• A Sarah tinha interesse pela mãe, e quando a mãe se apercebeu desse interesse (que a filha
gostava dela), alimentou a capacidade de vinculação por parte da mãe, anteriormente
reprimida, investindo assim mais na sua filha e na sua relação com a mesma.

Assim com esta intervenção a mãe da Sarah foi capaz de separar os “fantasmas” do passado do
seu presente.

Objetivos do psicólogo/terapeuta:
1. Ajudar a mãe a compreender que uma coisa é o seu passado e que outra é o seu presente.
2. Ajudar a fazer ver a mãe que esta é muito importante para a sua filha de forma a esta melhorar
a sua relação com a filha e a filha conseguir
desenvolver-se melhor.

Nota: A uma certa inclinação Borderline nesta


mãe, que se repetiria provavelmente com a sua
filha.

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3ª Aula Teórica (2 de Outubro)

Será que os bebés são sensíveis aos estados dos outros a sua volta?
Sim! Pensa-se que os bebés são muito sensíveis ao estado emocional do outro, e quando
constroem uma relação com alguém significativo para ele, têm expectativas do que se possa passar a
seguir na perspetiva relacional.
Situações experimentais: Experiências Still Face: situações experimentais, que tentam recriar aquilo
que o investigador pensa que é uma mãe deprimida.
Bebés de 3 semanas, em que há um cesto com brinquedos e cadeiras um em frente a outra
numa sala. A mãe entra e senta o bebé numa cadeirinha, e é pedido à mãe que brinque com o seu
bebé, existindo um espelho atrés da mãe, para conseguir ver se o rosto da mãe e do seu bebé. Depois
é pedido à mãe que fique inexpressiva perante o bebé e que não responda às solicitações do seu bebé.
Quando o rosto na mãe fica inexpressivo, interessa ao investigador, perceber como é que o bebe
reage. Os resultados às 3 semanas são: quando a mãe se apresenta perante o bebé com o rosto
inexpressivo, o bebé dominantemente apresenta 3 respostas sequenciais:
1- O bebé não gosta (protesta, tenta fazer barulhos para tentar interagir com a mãe; tenta captar,
mudar a mãe, o seu olhar e interação);
2- Desiste (não tem sucesso na tentativa de chamar à atenção);
3- Manobras de auto conforto (procura de manobras de autoconsolo).

A generalidade dos bebés respondia num determinado padrão, de acordo com os resultados,
foi constatado que quando a mãe se apresenta perante o bebé de forma inexpressiva, o bebé responde
sequencialmente em 3 respostas, o bebé faz barulhos para tentar captar a atenção, olhar e interação
da mãe, como não é capaz, o bebé acaba por desistir, desvia o olhar da mãe e de seguida tenta as suas
próprias manobras de auto consolo. O bebé não gosta, protesta, desiste (pois não consegue captar
atenção com sucesso) e depois procura as suas próprias formas de se autoconsolar (ex. olha para as
mãozinhas). Assim pode-se dizer que os bebés são sensíveis às emoções das mães e dos outros
significativos, que interagem com ele.
Temos bebés muito pequenos, mas são sensíveis à forma como o adulto significativo interage
com ele. O bebé consegue perceber que a mãe está deprimida e tenta fazer com que a mesma haja da
maneira anterior, mas como não é estúpido, desiste e tenta confortar-se.

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Bebes com 6 meses: continua a existir o mesmo padrão de resposta: protesto, desistência e
procura de estratégias de autoconsolo.
Podem se diferenciar 2 grupos nestas idades: uma parte dominante dos bebés, protestavam e
outro grupo dominantemente procurava as suas próprias técnicas de autoconsolo.
Passam cerca de 3,5min a protestar (dominantemente) e depois desistem e procuram autoconsolar-se,
já no outro grupo protestam durante1,5 min, depois desviam o olhar e predominadamente procuram
consolar-se a eles próprios, reequilibrar se a eles próprios sem a ajuda da mãe.
Aos 6 meses já há uma história relacional entra a mãe e o seu bebé. E os bebés, fazem uma certa
abstração da experiência. É como se construíssem esquemas mentais muitos primitivos sobre o que
é costume acontecer na sua relação com a mãe. Os bebés que dominantemente procuram o seu
autoconsolo (e protestam menos) construíram uma representação interna que quando algo não corre
bem, não vale a pena protestar nem fazer barulho porque não vão conseguir alterar nada.
Autores afirmam que os bebés a partir dos 9 meses já têm representações internas, no
entanto outros autores que fizeram estas experiências, defendem isto acontece no bebé muito antes
dos 9 meses. Os bebés que fazem barulho para alcançar o sucesso, são bebés que se sentem
competentes na sua relação com a mãe: choram para ter sucesso, para terem o que necessitam
(comer, miminho, etc.). Os bebés que procuram as suas estratégias de autoconsolo, construíram uma
representação de que quando a coisa não corre bem, não vale a pena fazer barulho porque não vai
acontecer nada.

1º Grupo: Competência Relacional;


2º Grupo: Não se sentem tão competentes a nível relacional.

Daniel Stern: surge um bebé que é fruto das teorias psicanalíticas, reconstruído do ponto de vista
teórico a partir da análise de adultos. Teorização de um bebé que é resultado da observação direta,
partir da análise de adultos, e levanta a questão:

O que se passa com uma mãe deprimida e o seu bebé?


Se lida dominantemente com a sua mãe, que ideia (esquema mental) é que vai construindo
sobre o que é estar com outro, numa relação de intimidade? Qual o lugar dele e o lugar do outro?
Que ideia e que o bebe vai construindo dentro de si, sobre o que e estar com outro numa relação de
intimidade e que lugar e que cada um ocupa nessa. Que esquema mental é que o bebe vai construindo
nesta relação com uma mãe deprimida?

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Uma mãe deprimida pode ter um impacto negativo no desenvolvimento da criança. Esta mãe
será então alguém muito envolvida em si mesma e nos seus problemas e, por isso, menos disponível
para o seu bebé, o que resultará numa função alfa e capacidade de rêverie diminuídas. Esta mãe pode
provocar vivências de abandono, de solidão e da baralhação no bebé, no entanto, há momentos nos
quais consegue estar disponível e investir no seu bebé – o que cria uma alta instabilidade no bebé.
Contudo, este investimento vai ser de acordo com aquilo que considera que o bebé necessita e com o
que considera que devia ter investido anteriormente – portanto são investimentos carregados de
sentimentos de culpa pela indisponibilidade (Carreiras, 2017).

Uma das características principais destas mães é uma expressão facial apática e desprovida de
emoção. A EXPERIÊNCIA STILL-FACE e procurou perceber as reacções do bebé ao rosto apático
da mãe. Analisando os bebés às três semanas percebe- se que, num primeiro momento, o bebé apela
à mãe como se procurasse retomar aquilo que estava a vivenciar com a mãe antes de esta criar uma
still-face. Num segundo momento, e perante a não resposta da mãe, o bebé desvia o olhar, retira-se e
vai procurar as suas próprias técnicas de consolo (ex. chuchar no dedo). Percebe-se assim que, em
primeiro lugar, os bebés pequenos já são sensíveis ao estado emocional do outro e que, em segundo
lugar que, a estratégia de desvio do olhar corresponde à forma do bebé de não viver a frustração de a
mãe não conseguir corresponder aos seus desejos – sendo uma estratégia que se vai manter para a
vida do individuo (Carreiras, 2017).

Aos seis meses, ao se repetir a experiência, encontra-se dois tipos de resposta: (a) resposta de
protesto ao still-face da mãe e (b) uma resposta de desistência e retirada. Estes bebés tinham
inicialmente o mesmo tipo de resposta, mas passados cerca de seis meses encontram-se diferenças.
Estas diferenças prendem-se com a história relacional deste bebé com a sua mãe, isto porque o bebé
percebe que existem aspectos que se mantém no comportamento da mãe e outros que se alteram,
determinando assim as suas expectativas da mãe. Desta forma, os bebés que protestam são aqueles
que, na sua história relacional, perceberam que quando estão aflitos e estão a viver algo desagradável,
ao alterar alguma coisa e chamar à atenção, aquilo que estão a viver de mau desaparece – são bebes
que se sentem competentes porque sabem mudar os aspectos na mãe (i.e. o facto de esta não
responder). Este sentimento de competência será crucial para as futuras vivências relacionais do bebé.
Os bebés que desistiram e não protestaram são aqueles que já perceberam, pelo seu histórico
relacional, que não vale a pena protestar que não existirá qualquer tipo de retorno ou resposta por
parte da mãe (Carreiras, 2017).

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4 hipóteses levantadas por Stern:

Daniel Stern, no livro “A Constelação Materna”, levanta hipóteses em que num contexto em que
a mãe está deprimida e, por isso, não está disponível para ele, este irá criar uma relação assimétrica
na qual irá adoptar estratégias na tentativa de fazer com que a mãe passe a estar disponível. Se a
atitude da mãe se prolongar no tempo, irá ter consequências no crescimento do bebé, mais
propriamente, a nível dos esquemas mentais em que o individuo se perspectiva na relação com os
outros. Stern levantou quatro hipóteses de modelos relacionais, através da sua experiência enquanto
clínico com mães deprimidas, que serão adquiridos na vivência com uma mãe deprimida de como é
relacionar-se com o outro, que serão generalizados para as futuras relações do bebé (Carreiras, 2017).

1. Estar com o outro numa relação de intimidade é estar a (re)animar o outro.


→ Aquilo que o bebé mais quer é ter a atenção da sua mãe. Uma mãe deprimida está
muitas vezes distante, mas se o bebé a chamar, esta é capaz de se dirigir a ele. Se o bebé
conseguir muitas vezes “resolver o desentendimento” com a mãe, ele irá perceber que é capaz
de reanimar a sua mãe. Se tomarmos a relação com a mãe como o protótipo das relações
futuras, este individuo vai escolher pessoas em que possa sentir que reanima e cuida do outro.
Numa relação em que uma mãe precisa constantemente de ser puxada pelo bebé, e o bebé
assim o faz, também constantemente, é esperado que o mesmo construa o esquema mental de
que estar com o outro numa relação de intimidade é estar a animar o outro. O outro é alguém
que necessita de ser animado, e o bebe é o que anima (puxa a mãe e tem sucesso), tendo assim
um papel animador nesta relação mãe-bebé. Existe uma assimetria nesta relação e há uma
vivência de sucesso do bebé pois por vezes consegue captar a mãe, ou seja, animar a mãe.
Futuramente, o bebé pode vir a escolher parceiros (amigos, namorados, etc.), que ele tem de
cuidar. Pode não saber da existência da reciprocidade. Nesta hipótese há reciprocidade. O
bebé tem de ter uma vivência de sucesso.

2. Estar com outro numa relação de intimidade é estar com o outro como figura de fundo.
→Se o bebé não consegue puxar a mãe para si, ter a sua atenção, irá conceber que
estar com o outro é só na sua presença sendo que, ainda assim, é melhor do que estar sozinho.
No futuro, o individuo vai escolher parceiros relacionais que lhe proporcionem uma certa
distância, sem interações ricas sendo que apenas a presença parece suficiente.

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O bebé deseja que a sua mãe o olhe e que interaja com ele, porém esta mãe está
submersa/mergulhada no seu mundo interno, o bebé tenta captar a mãe, porém sem sucesso,
não conseguindo repetidamente captá-la, pensa que “se calhar não vale a pena”. Não obstante,
não significa que a mãe não seja importante para o bebé, então o bebé está ali como um fundo
e não como um parceiro. Ou seja, a mãe é importante como figura de fundo ao invés de um
parceiro ativo na relação mãe-bebé. É a sua presença que proporciona segurança e estabilidade
ao bebé, no entanto esta mãe não interage de forma rica e prazerosa (não proporciona uma
interação aprazível e boa ao seu filho). Neste caso existe uma maior mutualidade, o bebé tenta,
mas não consegue captar a mãe (bebé tenta → não tem sucesso → desiste), então desiste e vê-
a como fundo, um fundo importante, que não interage, mas que está ali presente.
Generalizando: se um bebé dominantemente cresce sem outras relações salvadoras, é possível
que mais tarde possa escolher para relações, pessoas que é importante estarem ali, mas com
as quais não têm a expectativa de viver uma realidade e relacionamento profundo ou de
partilha emocional (não têm expetativa de viver um relacionamento muito íntimo (interno),
uma intimidade verbalizada muito profunda).

3. Estar com outro é estar num registo de “não autenticidade”.


→ A mãe por estar deprimida não consegue sentir a alegria do bebé mas tenta. O bebé
é, no entanto, extremamente sensível à autenticidade da comunicação e, por isso, percebe que
a mãe não está verdadeiramente a viver a alegria dele. Como o bebé deseja tanto a mãe vai
aceitar esta falta de autenticidade dela. Se isto for recorrente, o bebé vai considerar que não
há encontro emocional com ela. No futuro, o individuo vai escolher alguém com que não
comunicará partes de si e, por isso, irão existir parte de si que nunca irão ser compreendidas
podendo originar um falso self.
O que o bebé mais deseja é estar com o outro, viver no encontro e o bebé é muito sensível à
autenticidade do outro. Somos atentos a todos os comportamentos do outro, e não sabemos
como processos (ele está-me a dizer aquilo, mas não está a ser autênticos). Estamos
fisicamente distantes uns dos outros, e somos mais conscientes e atentos ao discurso verbal
do que ao não verbal, porém os bebés não, pois não compreendem o discurso verbal, assim
são extremamente sensíveis à comunicação não verbal e, portanto, são também muito atentos
à autenticidade ou não do outro, sentem a tonicidade/tonalidade/tenacidade do corpo dos pais
(ex. colinho da mãe, se o corpo da mãe pode estar muito tenso, o que pode transmitir ansiedade
ao bebé, mas ao mesmo tempo transmite ao bebe que gosta muito dele pois esta a pegar-lhe
ao colo). Os bebés são muito sensíveis a autenticidade ou não do outro, bem como são muito
atentos ao ter necessidade e não ter necessidade do outro.

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- 1º Pressuposto: Os bebés querem muito estar com o outro;
- 2º Pressuposto: Os bebés são muito atentos à comunicação não verbal.

Estar no registo de não autenticidade, a mãe é deprimida e, portanto, não consegue comungar
o seu íntimo. A mãe quer muito estar com o bebé, mas não está internamente disponível.
Imaginando um bebé que está sentado no chão e recebeu uma bola nova, a mãe está setada ao
pé, e o bebé, que esta muito entusiasmado com a bola, está a brincar e a bater na mesma. A
mãe percebe que o bebé está muito alegre, e gostaria de dizer que está tão alegre como ele,
mas não consegue e por hipótese, a mãe para lhe dizer o que lhe quer dizer, vai utilizar uma
outra modalidade comportamental que é, por exemplo, com a voz fazer “ah ah ah” ao mesmo
ritmo do bebé a bater na bola. No entanto, o bebé capta e percebe que a forma como a mãe
faz os “ah ah ah”, não têm um fundo de alegria e felicidade como há nele. Não existindo um
registo de autenticidade, o bebé percebe que a mãe está a fazer um esforço, porém há uma
tentativa de encontro entre os dois e o bebé reconhece isso. Existe algo aqui que é verdadeiro,
a mãe tenta ir ao encontro do seu bebé. No fundo, a mãe está a fazer um esforço e o bebé
capta isso. E como o vive muitas vezes, o bebé aceita este encontro, porque mais vale este
encontro entre ambos do que nenhum.
Generalizando: No seu futuro, o bebé sabe que existem lados dele que não são suscetíveis de
serem partilhados e vividos com o outro. O bebé construi a ideia de um esquema mental de
que só é possível estar com o outro numa situação de não autenticidade (o que acarreta
sofrimento). Não é possível um encontro com o outro numa situação de não autenticidade,
logo nunca num registo emocional profundo.
4. Estar com o outro é imitar o outro.
→ Se o bebé não é capaz de reanimar a mãe, o bebé pode sentir-se mais próximo se
estiver apenas com ela imitando-a, no sentido em que vai adoptar uma postura pouco activa,
com vocalizações fracas, sem expressão facial rica, sem grandes movimentos. Assim vai
entender que uma relação é aquele em que se existe pela imitação ao outro e onde não há
forma aprofundar uma relação de intimidade. No futuro, o individuo vai preferir relações
superficiais, sem profundidade, onde imite a forma de estar do outro.
É como se o estar com a mãe fosse ser como a mãe, é no fundo imitar a mãe. É imitar o estado
emocional da mãe, na vivência de micro depressão, o bebe sintoniza o estado emocional da
mãe, onde tem uma manifestação comportamental através da expressão facial, daquilo que o
bebé faz com algumas semelhanças ao que a mãe faz. O vivido do bebé é como se fosse o
vivido da mãe, e há semelhanças entre o comportamento da mãe e do bebé, por exemplo uma
mãe pouco viva, o bebé é também pouco vivo. Recordar o caso clínico da Sarah. Falta de

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estimulação rica e prazerosa, é como se estar com a mãe, fosse uma maneira de estar (de ser)
como a mãe (ser igual à mãe, bebé sintoniza com a mãe, imita o seu estado emocional, para
estar fisicamente com ela).

As relações primordiais do bebé são importantes fundadoras e têm repercussões no adulto futuro.
Stern fala de um bebé que vai crescendo com uma mãe deprimida,a mãe intoxica o seu bebé, pois se
estivermos ao pé de uma pessoa com estas características, também ficamos ansiosos, também ficamos
a sentimo-nos desconfortáveis. Uma pessoa ansiosa que intoxica os outros. Por exemplo, uma mãe
muito ansiosa do ponto de vista comportamental, dificilmente tem espaço para ler os sinais do seu
bebé e provavelmente vai intoxicar o bebé com a sua ansiedade. Em vez de ser processadora dos
conteúdos do bebe, vai ler as mensagens do bebe à luz da sua intensidade e depois intoxicar o bebé.
Uma mãe deprimida, é uma mãe cheia de sofrimento, tem pouco espaço para acolher o bebé nas suas
características e descodificar de forma adequada as necessidades e sinais do mesmo.

Acrescentado de apontamentos (fiáveis, Carreiras, 2017):


André Green- “A mãe morta”
Green considera que não são só os excessos ou ausência da presença materna que podem dificultar o
processo de diferenciação mas também a indiferença materna ou esfriamento afectivo que ocorre quando a
mãe desinveste o bebé - a que chamou complexo da mãe morta. A distância afectiva da mãe pode ser
consequência de uma depressão que ela própria atravessa, de uma tristeza ou de uma diminuição do interesse
pela criança, que é vivida pela criança como um trauma narcísico – dada a desilusão antecipada que marca a
perda do amor do objecto primário. A mãe continua viva fisicamente, mas morre mentalmente para a criança
por não estar disponível para ela – sendo que a criança percebe que houve mudanças na mãe mas não as
compreende. A criança vive um luto branco e não elaborável, isto porque, evoca angústias dos estados de vazio
originado pela interrupção do investimento materno com uma impossibilidade de elaboração da perda do
objecto primário, pela falta de recursos (Carreiras, 2017).

O complexo da mãe morta suscita uma série de defesas contra a angústia branca que vive.
Considerando-se omnipotente e o centro do universo materno, a criança procura inicialmente
despertar a mãe do luto, suscitando um enorme esforço da criança para manter cativo o objecto
primário – o que impossibilita o processo de diferenciação. Pela sua lógica egocêntrica e insucesso
em cativar a mãe, a criança atribui a si própria a causa da decepção materna – apesar de não saber o
porquê da mudança, concebe-se como responsável e merecedora deste tratamento pouco afectivo. Em
última instância, a criança pode ainda considerar que a sua própria existência é a causa do sofrimento
da mãe (Carreiras, 2017).
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• Primeiras defesas: desinvestimento afectivo e representativo do objecto materno. Cria apenas
um buraco na relação com a mãe mas mantém investimentos secundários – tal como a mãe o
faz, ao se sentir incapaz de amar a criança mas continuando a cuidar dela. Existe ainda uma
identificação inconsciente com a mãe morta numa tentativa de restabelecer a união com a
mãe. Nas relações futuras, o desinvestimento dos objectos será uma tendência, visto que a
identificação se dá com o “buraco” deixado pelo objecto.
• Segundas defesas: a criança ao atribuir a responsabilidade pelo desinvestimento materno a si
mesma, passa a acreditar que lhe é interdito ser e que só a morte lhe resta, onde já nem a sua
agressividade pode ser expressa pelo caracter vulnerável da mãe.
• Terceiras defesas: uma triangulação precoce pode ser ensaiada se o pai for intuído como
objecto de luto materno, passando considerar a culpa do pai gerando um ódio tal que se cria
uma triangulação perigosa.
• Quartas defesas: pode se instar uma excitação auto-erótica com uma defesa voltada para a
procura de um amor sensual puro caracterizado por uma dissociação entre a sensualidade e
ternura.
• Quintas defesas: cai desenvolver uma sensibilidade emocional pela necessidade de estar
constantemente a detectar as emoções da mãe e a ajuda-la o que vai despontar uma
estimulação precoce do fantasiar e do intelecto, referindo-se uma obrigação de imaginar ou
pensar, com actividades projectivas que denotam um esforço em adivinhar ou antecipar o que
se passa com o objecto.

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3ª Aula Prática (7 de Outubro)

Desde pequenos que os bebés, quando se relacionam com outros seres humanos, se tiverem
sorte e encontrarem outros seres humanos, que estabeleçam um vínculo forte, o bebé, a pouco e
pouco tece uma ideia, não explicita, do que é estar numa relação de intimidade, sabendo o seu lugar
e o lugar do outro nessa mesma relação.
É também desde pequenos que vamos aprendendo o nosso estilo relacional, tal como
aprendemos a fazer as necessidades, a comer, etc. Todas estas coisas acabamos por aprender de forma
inconsciente. Este estilo relacional tem a ver connosco (com o que é nosso) e com dos outros á nossa
volta (neste caso figura materna) e por vezes arrastamos, inconscientemente, isso para todas as nossas
vivências e relações com os outros (o que foi construído naquela altura pode.se arrastar, e ainda que
a criança seja adaptativa, quando cresce e se torna adulto deixa de ser). O bebé apreende com a sua
relação com o cuidador principal, o bebé vai-se construindo na relação, vai construindo a sua mente,
nestes encontros com outros, nos encontros que são profundos, pode, do ponto de vista da criança,
haver mais sofrimento, ou não. O bebé vai-se construindo na relação.
Os bebés não têm mente, não têm espaço psíquico, vão construindo, para se desenvolver e
para tal é necessário um apoio, uma outra mente continente. A mãe empresta a sua mente ao bebé,
para a pouco e pouco este ser capaz de construir a sua mente. Se o bebe ainda não tem uma mente
desenvolvida, vive grandes insatisfações, ansiedades, então vão existindo manifestações corporais e
sintomas, por exemplo perturbações do sono (insónias e dificuldade em adormecer), anorexia
(perturbação alimentar), eczema, etc. É frequente que quando os bebés sofrem em pequenas, existir
uma expressão através do corpo.
Ambos os bebés dos seguintes casos a serem analisados apresentam perturbações do sono.
Normalmente quando se vêm crianças com insónias há problemas na relação com a mãe.

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Relativamente às insónias, se andássemos sistematicamente a dormir 4 h por dia, sentiríamos
nos exaustos. Se um bebé só dormisse 4 h por noite, seria grave, normalmente os clínicos a observar
bebés com estas perturbações conseguem identificar 2 tipos de insónias:
• Insónias graves mas agitadas: insónias em que os bebés dormem muito pouco mas quando
não dormem, não estão bem e explicitam-no (choram e manifestam-se), são muitas vezes
acompanhados de movimentos auto agressivos do bebé (ex. bater com a cabeça nas grades do
berço)
• Insónias graves mas silenciosas: insónias em que os bebés não dormem quase nada, mas o
bebé não dá sinais de que esta mal, não faz barulho, não chora, não protesta nem manifesta o
seu mal estar Este tipo de insónias pode passar despercebido pelos pais, pois não existe
demostração de insatisfação por parte da criança. Provavelmente este comportamento do bebé
está associado à sua historia relacional, pode não se manifestar pois pode já ter tentado e não
correu bem, não foi assistido, não obteve resposta, o que faz com que este desista de tentar
chamar a atenção pois não vale a pena (continuaria a não obter resposta por parte dos
cuidadores). Os clínicos associam isso a graves desentendimentos no seio do relacionamento
(vivências e experiências apreendidas pelo bebé). Quando se acolhe uma criança muito
perturbada, e se faz um diagnostico de psicose, também existe um historial de insónias severo.

Um bebé com este tipo de sintomatologia (insónias), é muitas vezes associado, por clínicos, a algo
que no seu ambiente familiar e na relação com as figuras primordiais não está bem, logo é importante
ter em atenção tais características (o vivido pelo bebé não lhe trouxe satisfação). O problema prende-
se com o facto de não existir sintonia e acerto entre o bebé e a mãe.

Caso do Renato (13 meses):

Renato, 13 meses, sofria de uma insónia precoce severa desde as primeiras semanas de vida. Pouco
depois do seu nascimento, Sofia, a mãe, tinha sido invadida pelo terror de o matar. Tratava-se de
uma fobia, contra a qual lutava sem cessar, num estado de sofrimento intenso. As noites de Sofia
eram entrecortadas por pesadelos, nos quais tinha uma faca na mão e o braço erguido sobre o filho.
Levantava-se, então, precipitando-se sobre a caminha do bebé, para ver se ele estava bem. Depois
fugia rapidamente, com medo de lhe vir a fazer mal. Sofia tinha montado todo um sistema de
protecção para ela mesma, colocando fora do seu alcance facas, tesouras e agulhas. Depois começou
a ter medo de se lançar pela janela com o filho. Um mês mais tarde, não aguentando mais, pediu à
mãe para ficar com o filho. Retomou-o pouco tempo depois, imaginando que tudo terminara. Mas as

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fobias recomeçaram com maior intensidade, enquanto a insónia de Renato se agravava com um
estado de agitação e gritos paroxísticos.

No decorrer da entrevista, Sofia falou longamente das suas aflições. Mas a “chave” só surgiu perto
do fim da sessão... Perguntou-se a Sofia – com o objectivo de apreender a sua dinâmica projectiva –
com quem é que achava o filho parecido. Sofia distendeu-se e, gracejando, disse recear que o menino
fosse o retrato chapado de um irmão seu, com quem não se deva. Sofia era a mais velha de uma
fratria de quatro. Recordava desentendimentos permanentes com esse irmão, dois anos mais novo.
Animou-se ao contar pormenores da relação entre ambos e descreveu, com raiva, certos conflitos.
Acabara por cortar relações com ele e não tinha, até, ido ao seu casamento. Comentou, então:
“Estávamos de navalhas puxadas! Mais valia cortar com ele!”

(Caso clínico adaptado do livro de L. Kreisler “Le nouvel enfant du désordre psychosomatique”)

Sobre este caso:


• Paroxísticos: Gritos estridentes;
• A perturbação do Renato está intrinsecamente relacionada á perturbação da mãe;
• Pode haver um deslocamento (acontecimento vívido por outra pessoa, neste caso a sua
própria mãe) para o Renato;
• Com medo de agredir o filho, distancia-se deste;
• É como se na mente desta mãe, a imagem do irmão se sobrepusesse à imagem do filho.
• Presença de um fantasma do passado;

Renato (13 meses) sofria de uma perturbação grave do sono, que consistia em insónias severas
desde as primeiras semanas de vida. A mãe sofria de um terror noturno, sonhava que tinha uma faca
na mão que matava o seu filho. É um bebé em sofrimento na relação com a sua mãe (fobias e insónia
agravada, gritava: paroxísticos: gritos estridentes).

Porque e que será que o bebé não dorme?


É possível que Renato sinta que a mãe não está bem, e que a sua sintomatologia e perturbação
do sono, seja como reflexo dos terrores que a mãe vive, ou seja, a perturbação do Renato, tem haver
com a perturbação da mãe.
Talvez:
Quando nos vamos deitar costumamos fazer algumas coisas, por exemplo, comemos, urinamos,
usamos roupa confortável que não aperte de modo a ficar o mais confortável possível, podemos ficar

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a ler um livro (para transitar da vigília para o sono) e no fim apagamos a luz (terminar a estimulação
interna). Pode fazer acordar a estimulação mecânica.
Se eu tenho uma capacidade de rêverie ou função alpha dentro de mim, que transforme a minha
inquietação, consigo dormir, se não tiver não consigo (insónia).
Uma mãe extremamente ansiosa, tem receio de matar o seu bebé, não quer matar o seu bebé,
há uma disputa dentro dela, não consegue oferecer o colo para acolher o seu bebé. Ela acaba por fugir
ao contacto com o seu filho, vê dele e depois foge, entrega o bebé a sua mãe. Toca o mínimo possível
no filho, não tem colo para ele, não é capaz de desintoxicar as inquietações do Renato e acaba por
intoxicar ainda mais o seu filho com as suas próprias ansiedades. Este bebé não dorme porque não
tem uma mãe que o ajude a organizar-se, podendo até acabar por desorganizá-lo ainda mais ao invés.
Não dorme, porque não tem quem o ajude a desintoxicar-se, ajude a organizar-se, ajude a metalizar
as suas inquietações e acaba por ser intoxicado pela ansiedade e angústia da sua própria mãe. A
perturbação do Renato tem a ver com a perturbação da mãe.
A mãe está em grande sofrimento, grande angústia, pensa em mandar se da janela com o filho,
tal é o desespero (assim acabava com ambos os sofrimentos). Esta perturbação esta relacionada a da
sua mãe, se tivesse uma mãe organizadora, talvez não tivesse estas insónias e problemas de sono.
Hipótese levantada:
O psicólogo apercebe-se de uma zanga na mãe que não seria dirigida para o filho, mas sim
para outro. Assim questiona “Com quem é que o seu filho se parece?” A mãe gracejando disse com
medo, que achava o seu filho parecido ao seu irmão, 2 anos mais novo, de quem não gostava e tinha
raiva. Ambos já não se falavam, “estávamos de navalhas fechadas”, estavam muito zangados e
cortaram a relação um com outro, distanciaram-se para não haver mais agressividade entre os dois.
Na mente desta mãe é como se a imagem do irmão se sobrepusesse á imagem do filho, quando esta
mãe encara o seu bebé estabelece um paralelo com o tio. O bebé é “equivalente ao irmão”, é como se
houvesse uma zanga entre eles também cuja mãe tem medo de resolver, então afasta-se, tal como fez
com o irmão mais novo. O cortar a relação é uma tentativa por parte da sua mãe de proteger o seu
filho. O menino é visualmente parecido com o irmão, é pequeno tal como o irmão, ambos do mesmo
sexo, o irmão fê-la sentir a perda do afeto dos pais, este filho acaba também por alterar a dinâmica da
sua família. Na verdade, Renato, para uma parte dela é como se fosse o irmão, é como se ela revivesse
no filho uma serie de coisas do seu próprio irmão, e das quais não é capaz de se descentrar.

Que trabalho terapêutico seria importante?


O trabalho terapêutico, neste caso, consiste em deixar a mãe falar sobre esse irmão e sua
relação com ele (história) de forma a tentar arrumar o seu pensamento (história esta com o seu irmão
e não com o seu filho). Falar sobre as zangas, e ser capaz de ter tolerância e perspetivar que estar

29
zangado com alguém não é o mesmo que matar essa pessoa. Aceitar os próprios sentimentos e
emoções, e construir melhor os seus pensamentos, desejos e posteriormente ações, para
posteriormente esta ser capaz de compreender os sentimentos e relações (zangada não é sinónimo de
assassina). Ajudar a mãe a perceber que uma coisa são os fantasmas do passado, outra coisa é o seu
presente, e que a relação com o seu filho não é a mesma que a relação com o seu irmão, mesmo apesar
das semelhanças visuais entre os dois.
Trabalho do psicólogo com a mãe e bebé: ensinar a mãe a dar lhe colo, a pegar no bebé, a
desintoxicá-lo, a ajudar a mãe a sentir se competente, capaz e organizadora para com o seu próprio
bebé.

Caso do Eurico:

Eurico é um soberbo bebé com cinco meses e meio, grande, risonho, ar vivo. Mantém-se sentado, de
forma estável, aos pés da mãe e chupa, com entusiasmo, os brinquedos que ela lhe dá. Responde à
minha aproximação com um sorriso largo, mas manifesta uma ligeira reacção de receio quando me
abeiro mais. Volta, então, a face para a mãe, procurando contacto visual com ela. No fim da sessão,
está nos meus braços enquanto a mãe lhe veste o casaco. Eurico chora e procura agarrar-se a ela,
receando, talvez, que ela parta, deixando-o.
Este belo rapaz não tinha, ainda, feito uma noite completa e a mãe diz-se esgotada, tendo quase
perdido o sono desde o seu nascimento. A regra é ser acordada com choros, preparar um biberão de
leite entre a meia-noite e a uma hora, e um segundo entre as quatro e as cinco da manhã. A mãe
nota, às vezes, que Eurico acorda de hora em hora sem, no entanto, reclamar a sua presença.
Ao olhar Eurico, não posso deixar de pensar que este “regime” é óptimo para ele. E a mãe confirma
que ele deve dormir o suficiente, uma vez que adormece logo a seguir aos biberãos, ou mal o embala
nos seus braços. O mesmo não se passa com ela, porque não consegue voltar a adormecer, receando
os próximos choros que a obrigarão a levantar-se de novo. A fadiga e a tensão são muito grandes,
tal como o prazer e o orgulho perante um bebé tão bonito.
Este caso não corresponde a um verdadeiro quadro de insónia mas sim – tal como se revelou
rapidamente – a perturbações reaccionais a um hiperinvestimento materno muito intenso.
Eurico, primeiro filho que surgiu um pouco tarde na vida da mãe, veio preencher, totalmente, os
desejos do pai e da mãe. É o centro do interesse de ambos e, apesar dos esforços repetidos da mãe
para manter uma conduta educativa razoável, ele respondia ao excesso de amor através da
impossibilidade de se manter longe deles por períodos superiores a três horas consecutivas. Donde
o acordar nocturno, com choro, que trazia de volta o objecto amado, duplamente gratificante por ser

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acompanhado por um biberão de leite. Não é de estranhar que Eurico também tenha apresentado,
para além das perturbações do sono, um quadro inconstante, mas nítido, de cólicas do primeiro
trimestre, o que obrigava a mãe a passeá-lo longas horas nos seus braços, em certos fins de tarde
particularmente agitados.
A participação materna na sintomatologia das perturbações do sono revelou-se incontestável logo
que ela me explicou que, para obviar à distância entre o seu quarto e o de Eurico – que ficava no
outro extremo do apartamento – tinha instalado um interfone munido de um amplificador no seu
próprio quarto. Assim, não perdia nem um suspiro do filho. Era justo, então, que este, para povoar
a longa separação da noite, chorasse e fizesse a mãe surgir em carne e osso. Foi o que lhe disse.
Bastaram duas sessões de psicoterapia para que a mãe modificasse o dispositivo precedente e para
que o bebé só chorasse uma vez durante a noite, renunciando, sem grade pena, aos dois biberãos
noturnos.

(Adaptado de um caso clínico narrado por Rosine Debray na sua obra “Bébés/mères en revolte”)

A mãe não está bem, quer muito que o seu filho esteja feliz e que não sofra nunca. A mãe quer
ser perfeita, porém segundo Winnicott, as boas mães são as
mães suficientemente boas, as perfeitas inundam os seus
filhos e não os deixam viver as suas dores (não permitem que
os filhos desenvolvam o seu próprio espaço). As mães
suficientemente boas confiam que os filhos sejam capazes de
lidar com o sofrimento, e de conquistar o seu espaço para
posteriormente serem capazes de se autonomizar.

31
4ª Aula Teórica (9 de Outubro)

Criança Autista

Autismo, por definição é ausência de vida mental, onde os indivíduos estão fechados sobre si
próprios em determinados momentos. Kanner encontrou uma série de sintomas e comportamentos
que caracterizam o individuo com autismo e Asperger definiu outras características (Carreiras, 2017).

A primeira definição de autismo, tem como base o pensamento de “Fecho da pessoa em si”.
Crianças com autismo de Kanner, eram considerados pacientes adultos esquizofrénicos.

Kanner trabalha nos estados unidos, mais ou menos na época da 2 guerra mundial, asperguer
trabalha com crianças perturbadas.
Autismo de Kanner (o mais característico é não ter linguagem)
VS
Síndrome de Asperger (é característico ter linguagem)

Asperguer e Kanner, pensa-se que falam de entidades clínicas muito semelhantes, comuns.
Do ponto de vista emocional e relacional são muito semelhantes as duas (autistas de kanner e
asperguers).

Acrescentado de Apontamentos:
O horrível é insuportável se não formos capazes de imaginar um fim ou uma saída possível
desse sofrimento. Se já houver uma certa maturidade há estratégias que permitem pensar numa saída
(ex. pensamento simbólico). O sentimento de viver o horrível pode vir de (a) características do meio:
o meio não está a socorrer o individuo (i.e. as figuras significativas não o ajudarem a sobreviver de
forma normativa ao horrível que está a viver); (b) características da criança: a criança não ser capaz
de percepcionar os movimentos de “salvamento” que lhe estão a ser direccionados ou de os
percepcionar como suficientes; (c) ou ainda das características do meio e da criança (Carreiras, 2017).

Tustin considerou, inicialmente, que o autismo seria um estado normal, a que chamou auto-
sensibilidade, em que a criança estaria focalizada exclusivamente nas sensações corporais – à
semelhança de Mahler. Desta forma, se o autismo primário normal, como designou Mahler, fosse
perturbado a criança reagiria através do autismo patológico, sendo certo que a criança se iria retirar
para a fortaleza sensorial do seu próprio corpo, isolando-se das influências externas (Serra, 2007).

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Klein achava que para a criança ser autista esta viveu algo insustentável para ela, Mahler
considera o mesmo e acrescenta que houve uma regressão da criança a um estado arcaico (Carreiras,
2017).

---

AUTISMO DE KANNER
Sintomatologia (nunca há diagnóstico antes dos 2, 3 anos, por causa da questão da
linguagem). Geralmente nunca há um diagnóstico de autismo, numa criança antes de ela ter 2 anos,
pois está muito relacionado à linguagem e antes desta idade não existe muito a fala nas crianças.
O mais comum na criança considerada autista, de acordo com Kanner, é esta apresentar uma
Perturbação da linguagem. São crianças sem linguagem, que imitam sons, parecendo para o
observador, que não há qualquer intenção de comunicação por parte delas. Existem também crianças
que têm linguagem, sendo frequente nelas, a Ecolalia (repetição do que o outro diz, ser o eco do
outro), parecendo não existir intenção de comunicação. Parece também haver a Dificuldade ou
impossibilidade de utilizar o pronome pessoal “eu”.

Caraterísticas presentes em crianças autistas segundo Kanner:

1. Relativamente à Perturbação da linguagem, nós falamos para o outro porque somos


distintos. Se não temos a ideia de distinção, não necessitamos de falar com o outro. Há
aqui uma indistinção do eu-outro, que contribui para a não comunicação com o outro. Esta
indistinção eu-outro não contribui para o desenvolvimento da linguagem na criança, para
desta forma ser capaz de comunicar com o outro.
2. Necessidade de Imutabilidade, de nada mudar (a criança autista reage muito mal à
mudança, parece ter uma necessidade absoluta de que todos os ritmos sejam iguais e tudo
se mantenha o mais igual possível). A criança autista não tem recursos internos, ou se tem
são muito escassos, tem uma mente pouco habitada e com poucos objetos, então necessita
de objetos fixos para se manter organizada.

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3. Presença de Estereotípias, ou seja, gestos e comportamentos que se repetem (ex.
movimentos de borboleta com as mãos, voltear as mãos). Se a criança as faz, há uma
necessidade delas não é por acaso, logo há uma função que elas têm na criança autista
(têm um significado). Jogos prolongados com os seus dedos. (são tipicamente movimentos
repetitivos do corpo ou das mãos, aparentemente sem propósito, que não causam risco á
criança ou a quem convive com ela, ou seja, diferente dos comportamentos auto-lesivos.)

4. Isolamento Autístico, é uma serie de comportamentos que parece que a criança está
fechada nela própria, parece não distinguir um mundo animado de um inanimado, tem
grandes dificuldades de relacionamento com o outro, o outro que se relaciona tem a
sensação de que não é um outro, parece que o autista manipula o outro como um objeto (a
criança pode manipular o outro como se fosse uma parte de si própria). As crianças
parecem não ouvir nem ver, por estarem tao fechadas nelas próprias, para o observador
externo parece que a criança não ouve nem vê, que está fechada em si, parece não ligar a
acontecimentos que se passem à sua volta (ex. o fechar de forma bruta uma porta por causa
do vento). Estas crianças estão muito recolhidas em si, não riem, não choram com o que
se esperaria que suscitasse tais emoções. Muitas vezes parece também e insensível à dor
(não querendo dizer que o seja). “Ser uma criança estranha”.

5. Interesse “contorcido” pela manipulação de certos objetos, interesse quase compulsivo.

A criança autista, é uma criança tao enigmática/estranha, que mobiliza muitos investigadores,
sobre o autismo. Eles parecem ter insensibilidade à dor, não reagem a sons, imagens, manifestações
afetivas como seria de esperar. Parecem ter uma relação estranha com o seu próprio corpo, muitas
vezes recusa o contacto com o outro, e por vezes se o outro insiste, a criança pode-se desorganizar.
No relacionamento com o outro, este outro parece ser um mero objeto e ser apenas a continuidade do
corpo da criança autista. Parece ter um interesse compulsivo por certos objetos, por exemplo o com

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da ventoinha, compenetrada por exemplo por uma máquina de costura antiga, parecem fixados e
fascinados como que “presos”.

** Tudo isto, em termos teóricos. Em termos práticos é diferente.

Acrescentado de Apontamentos:

- Variáveis Maternas: (não falado em aula, pelo menos diretamente)

No que diz respeito às variáveis maternas, Tustin identificou determinadas fragilidades na


mãe que fariam com que vivencia-se o parto não como um nascimento de um novo ser mas sim como
uma amputação (i.e. como se uma parte de si lhe fosse retirada). O facto de considerar o filho como
parte de si constitui uma estratégia para fazer com que se torne menos angustiante a presença de este
novo ser, uma vez que seria algo que lhe seria conhecido – uma extensão de si – e não algo
desconhecido (Carreiras, 2017). Remetendo para o normativo, existe uma percepção da separação
entre a mãe e o bebé, existindo a consciência de que o bebé é alguém diferente de si e que lhe é
desconhecido. Como tal, a mãe atribui um espaço mental ao bebé no qual este tem os seus desejos e
necessidades que são claramente diferentes das suas. Se a mãe vive o parto como uma amputação,
considerando o bebé parte do seu corpo, não lhe dá um espaço mental porque não o considera
diferente de si. Não lhe atribuindo uma mente, não potencia o desenvolvimento da sua mente e, por
isso, não permite que a criança se desenvolva ou aceda de forma adequada ao pensamento simbólico.
O registo de continuidade vivido com a mãe vai então ser passado para o bebé e vai-se tornar o seu
modelo de relacionamentos (i.e. adesão e procura de continuidade do outro), isto se, no próprio meio
não, existir alguém que corte a transmissão deste registo de relacionamento (ex. intervenção de um
pai com a criação de um espaço mental para o bebé; Carreiras, 2017). Assim, quando a ilusão da
separação da mãe é perturbada (i.e. o nascimento) numa época em que a criança ainda não teria
desenvolvido mecanismos mentais (i.e. bebé) para lidar com a tensão interna gerada (Serra, 2007),
resultaria em comportamentos por parte da mãe (i.e. adesão) que dariam origem ao autismo
patológico.

O espaço entre os dois corpos, imposto pela realidade, é vivido como um buraco negro
habitado por objectos persecutórios, que ameaçam aniquilar o bebé, roubando-lhe a sua existência.
Para lutar contra a depressão psicótica, da vivência desta separação, a criança adopta dois tipos de
defesa: a) a confusão eu/não-eu, em não vive a separação psíquica do outro mas vive o outro como
um prolongamento da outra pessoa e b) a capsula psíquica, auto-gerada pela criança e auto-sensorial
concebida como uma segunda pele que separa a criança do mundo externo para a proteger contra

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esta amputação/separação. Deste modo, a criança organiza um delírio autístico, tentando fundir-se
com o mundo concreto e negando toda a alteridade, toda a separação que reactivaria a angústia
dessa primeira separação (Carreiras, 2017).

- Variáveis do Bebé

Uma outra hipótese prende-se com as características do bebé (ex. deficiências) que podem
levar a mãe a aderir ao filho de forma patológica dando origem a um registo autista – a mãe considera
que esta é a única salvação do bebé. O bebé será então sempre tratado como parte do corpo da mãe,
sem mente até que, pela imposição da realidade, o bebé aperceber-se-á que existe uma
descontinuidade entre si e a sua mãe. Assim, irá desenvolver estratégias (i.e. adesão para apego às
sensações e viver a continuidade) para não ter consciência dessa descontinuidade e para manter a
continuidade com a mãe (Carreiras, 2017).

Características do Autista
Perturbações da linguagem/Não acedem à linguagem/ Possíveis ecolalias
Perturbações do pensamento simbólico
Não atingiram diferenciação do outro
Estereotipias
Têm objetos autistas
Necessidade de imutabilidade
Isolamento
O outro como objeto inanimado
Recusa do contacto corporal com o outro
Identificação adesiva
Omnipotência
Desmantelamento

Uma criança dita autista tem perturbações a nível da linguagem, sendo o mais característico
não aceder mesmo à linguagem – o que não quer dizer que a criança não imita sons, contudo estes
não têm uma intenção comunicativa, correspondendo apenas a uma descarga. O querer interagir e
comunicar com o outro implica que ambos tenham consciência de há uma diferenciação entre o eu e
o outro e que cada mente é diferente e tem os seus próprios desejos, que precisam de ser partilhados
com o outro. No autista podemos dizer que não existe esta diferenciação, podendo ainda se hipotetizar

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que existem problemas a nível do pensamento simbólico (Carreiras, 2017). Contudo existem crianças
autistas que acederam à linguagem, mas na maioria das vezes com atrasado além dos dois anos, não
tendo, novamente, nenhum valor de comunicação. A sua comunicação é feita de palavras isoladas,
deformadas, inventadas, de ecolalias (i.e. imitação do outro) simples ou deferidas (Mazet & Stoleru,
2003).

Se algumas crianças apresentam um desenvolvimento psicomotor atípico, outras adquirem


rapidamente autonomia motora e são muito ágeis em termos de motricidade global e fina. Outro
sintoma comportamental comum são as estereotipias (i.e. contracção e descontracção da musculatura)
que não têm qualquer fantasia associada. O que importa são os movimentos em si e as sensações que
provocam (Carreiras, 2017).

As performances cognitivas são variáveis:

a) as que dependem da capacidade viso-espacial e da memória são geralmente melhores do


que as que requerem a reflexão, especialmente ao nível do contexto social;

b) há uma utilização estratégias idiossincráticas de aprendizagem;

c) e uma construção do mundo segundo eixos de referência diferentes das outras crianças
(Carreiras, 2017).

---

Como distinguir no espetro?


Francis Stantis

Mais importante do que os sintomas, é perceber a dinâmica interna da criança, o modo de


funcionar, que podem ser mais dominantes. Não há ninguém que funcione 100% num registo
funcional austístico, pequenas bolsas ou cápsulas austísticas. As classificações limitam-nos, mas
também nos ajudam a pensar e clarificar as ideias. Temos de ver o modo de pensar (de funcionar), o
mundo interno da criança. A incidência na população é muito baixa, mas têm surgido imensos. E a
investigação, depende do seu investigador (cada um enfatiza a sua área).

É inato, é uma defesa, é uma coisa adquirida?


Há crianças onde o sofrimento de autismo, pode ter origem sobretudo do foro biológico, como
se calhar há outras que tem fonte na dinâmica relacional

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Nasce com défices do ponto de vista relacional (falha na teoria do espírito, não são capazes de pensar
que eles têm um espírito e uma mente tal com o outro), de ser capaz de conjugar a sua atenção com a
do outro. Há autores que se focalizam mais nos problemas neurológicos, défices, crianças que nascem
com determinados défices, que se processão e que quando constroem representações do mundo dentro
delas e não se desenvolvem tão bem.
Se isto é inato (já tem determinadas capacidades neurológicas que nos comprometem o seu
desenvolvimento) não nos centrarmos nisso, mas pensar que o vivido da criança. O nosso foco é não
pensarmos se isto é inato (à nascença o bebé ter determinadas capacidades neurológicas que
comprometem o desenvolvimento). Temos de pensar qual o vívido das crianças, por hipótese, a mãe
é uma mãe frigorifico e não é capaz de enfatizar/sintonizar com o seu filho ou a criança, devido a
dramas nos instrumentos que traz na infância, pode ter a melhor das mães possíveis, mas não é capaz
de captar, de agarrar, os movimentos de socorro.
O nosso campo de ação, não tem a ver com os genes, ou com químicos, a nossa área é o
psíquico, tentar compreender a dinâmica mental interna desta criança com autismo. Qual o
sofrimento, e como ajudar a criança a minorar o sofrimento de forma a auxiliar a construir
instrumentos e estratégias para esta lidar com ela, bem como ajudar os pais a relacionarem-se com
esta sua criança. Capacitar a criança a construir estratégias e instrumentos de forma a terem um
relacionamento mais satisfatório e adequado com ela própria, entender os pais e minorar as angústias
dos mesmos. O nosso trabalho é essencialmente ajudar a contruir outros instrumentos (e estratégias)
psíquicos para que a criança com autismo seja capaz de lidar com ele próprio e com o mundo á sua
volta (animado e inanimado). E ajudar os pais também a lidarem/ajudarem a criança (no
relacionamento).

Certamente é possível algumas crianças autistas recuperarem e ficarem “bem”, isto exige que
a intervenção seja o mais cedo possível, realizada por um terapeuta competente (qualidade) e
motivado, através de uma intervenção intensa e que tem um certo custo.

Dentro da lógica de tentar interpretar a lógica interna da criança, ou porque o meio é muito
falho na sua receção ou porque tem instrumentos fracos/débeis a apreender essa receção ela própria.

Hipótese levantada:
A criança autista vive terrores sem nome, aflições extremas e imensas, tão extremas e sendo
a criança tão pobre e fraca em instrumentos, esta só consegue recorrer a instrumentos fracos, frágeis
e primitivos para lidar com estas angústias imensas pelas quais passa. Assim, é como se a criança

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fizesse tudo para não perceber a sua situação insustentável, não pode perceber esta coisa tão horrível,
então arranja estratégias para não a perceber/compreender.
A criança fecha-se numa fortaleza, barrica-se para desta forma, de modo a não perceber o que
se passa de extremamente angustiante á sua volta, ao fazer isto priva-se de viver relações com o
mundo.
Hipótese da criança autista: viver coisas insustentáveis ou pelas características do meio, ou pelos
handicapes constitucionais. Esta criança é um ser pequeno desmunido de estratégias defensivas
evoluídas, só utiliza as mais arcaicas, visão não perceber o que tem de perceber. Estratégias autisticas,
são dominantemente estratégias de exacerbamento da censurialidade, ou seja, quando a criança está
a rodar as mãos em movimentos repetidos. → Hipótese: a criança está absolutamente focada na
sensação que esses objetos, ou que o rodar das suas mãos, provocam em si mesmo, ela vive apenas
isso. Fica mergulhada nas secações e vivências, e quando fica assim, tudo o resto não existe para ela,
fica isolada (não percebe as angústias exteriores a ela). Quando vem alguém chamá-la para a relação
e tentar tirá-la deste forte que construiu, desorganiza-se e pode até ser agressiva. Esta criança tem um
mental desprovido de referências, as suas referências são externas. Por exemplo, entro numa sala que
frequento e essa sala tem 2 caideiras, e eu, criança autista, sei que a sala tem 2 cadeiras, e quando eu
entro na sala, e as duas cadeiras não estão lá, isto pode ser desorganizador para mim → Necessidade
de Imutabilidade.

Objeto autístico, é o oposto do objeto transacional, o objeto transacional de Winnicot faz parte
do desenvolvimento, objeto simbólico para a criança (objeto vale pelo simbolismo que a criança
atribui a esse objeto), em geral costumam ser objetos macios e fofinhos, sem forma, com textura,
objeto que representa a história segura da relação, função simbólica (são importantes estas
carcateristicas físicas). Será um objeto que representa a relação segura com a figura cuidadora. O
objeto vale por ele, mas também vale por aquilo que a criança la colou.
Objeto Autistico é descrito em oposição ao transacional, é um objeto duro, tem uma forma
consistente (imutabilidade), não muda de forma é aquilo e pronto, o objeto é manuseado pela criança
ao bater na cabeça por exemplo, despoleta determinadas sensações. Este objeto não é uma
representação/substituição da mãe. A criança tem este objeto pelas sensações que este lhe proporciona
e que estão relacionados ao seu manuseio. Tem uma vivência de continuidade e omnipotência
(experiência de não rutura entre ele e o objeto autista) ao agarrar o objeto com força com a sua mão.
Em geral este objeto é substituível por um novo.

39
Acrescentado de Apontamentos:

Os autistas tendem a recorrer a determinados objectos manuseando-os de forma característica,


a que se chamam objectos autistas. Para compreende-los melhor iremos comparar com os objectos
transaccionais de Winnicott característicos dos indivíduos normais – onde há um apego exclusivo a
um objecto com características especiais (i.e. geralmente objectos fofos, maleáveis e macios) que
usam especialmente em momentos de transição (ex. da vigília para o sono) e de ansiedade sendo
importantes por aquilo que a criança coloca no objecto, dando suporte à representação da sua relação
coma figura vinculativa (i.e. permite criar uma representação para a ausência do objecto primário
amado; Carreiras, 2017).

O objecto autistico, segundo Tustin, tem a função para a criança autista de manter a ilusão de
uma continuidade entre o seu corpo e o mundo exterior: a) são objectos que manipulam recusando
larga-los; b) são representantes do mundo inanimado com o qual a criança quer sentir-se em
continuidade para evitar a depressão psicótica (Mazet & Stoleru, 2003); c) são objectos duros e
rígidos (ex. caneta), imutáveis e d) geralmente possíveis de ser trocados por outro. A criança manuseia
o objecto de uma forma repetitiva e estereotipada, não representando qualquer fantasia, sendo que o
importante é as sensações que o objecto desencadeia (ex. som) às quais o individuo fica colado.

Por oposição ao objecto transacional, que promove o crescimento e a autonomia, o objecto


autista impede o desenvolvimento cognitivo e emocional da criança. Para estas crianças, a mãe é
apenas mais um objecto, com o qual se sentem equacionadas (Carreiras, 2017).

Objeto Autístico Objeto Transacional


Função - Defende a criança contra a angústia de - Permite lidar com a angústia de
aniquilamento e as ameaças do mundo separação – na ausência da mãe,
externo – dado que a criança autista não reconforta a criança, substituindo-a de
estabelece relação com os outros algum modo e conferindo segurança,
enquanto tais, a mãe não pode exercer serenidade e tranquilidade.
essa função de proteção.
- Estabelece a ponte entre mãe e não-
- Sentido como um prolongamento de si. mãe, entre conhecido e desconhecido.
Utilização - Dominada pela sensação e pelo prazer - Dominada pelo sentimento de
imediato. aconchego.

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- O objecto não é utilizado na sua função
convencional, mas através da sensação
familiar que provoca.

Textura - Objeto duro (carrinhos, chaves...). - Objeto mole, fofinho e aconchegante


(fraldas, bonecos de peluche ou panos).
Eleição - Há uma eleição da sensação - o objecto - Há uma eleição do objeto
é substituível por outro que produza propriamente dito, o qual se torna
mesma sensação. insubstituível.

→ Objeto Autístico é importante porque é manuseado pela criança, de forma a provocar nela
determinadas sensações a que esta fica colada. Diferente do objeto transaciona que é de fantasia,
apresenta um determinado simbolismo para a criança. Este objeto transacional representa uma relação
segura, fonte de segurança para a criança, anda sempre com a criança para lhe transmitir segurança.

Não há pensamento simbólico na criança autista, o que importa é o toque, a vibração, a


sensação que o objeto prova nela. Este objeto não é de fantasia, é uma forma de eu ficar dentro de
uma fortaleza, de não me relacionar, e se não faço isso não sou capaz de desenvolver novas estratégias
para lidar com as minhas situações de aflição e angústia.

Acrescentado de Apontamentos:

Todos precisamos que haja aspectos que se mantenham estáveis ao longo da vida mas, se o
individuo não tem recursos internos, não é capaz de lidar com a mudança. O autista não tem recursos
internos (i.e. mente com representações) e, por isso, desorganiza-se com a mudança. Se não tem
referências internas que o guiem, o individuo precisa de referências externas, ou seja, precisa que o
mundo à sua volta não se altere (ex. através
posição dos objectos fixas, rotinas, etc.) – o que
se traduz numa necessidade de imutabilidade do
ambiente – sendo então estas referências externa
que vão ser organizadoras e securizadoras
(Carreiras, 2017). Existe assim uma necessidade
de manter a estabilidade dos limites que se

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exprime através de: a) um isolamento sempre no mesmo sitio; b) dos próprios objectos autistico que
são parte desta imutabilidade, sendo rígidos e sem possibilidade de se moldarem; e c) da própria
dificuldade relacional dos autistas, que advém da imutabilidade inerente ao ser humano – não há nada
mais imprevisível que um outro ser humano Qualquer tentativa de introduzir modificações pode
desencadear reacções de angústia maior, e mesmo um verdadeiro estado de desmoronamento (Mazet
& Stoleru, 2003).

Na relação com o autista, o outro é um objeto inanimado isto porque o outro é uma extensão
de si e do seu corpo e, por isso, há um uso do outro e não um apelo ao outro, como aconteceria numa
criança “normal” – que percebe que tem de dizer ao outro o seu desejo porque percebe a diferença
entre si e o outro e que os desejos do outro não são os seus – (Carreiras, 2017). O contacto corporal
é recusado e vivido muito negativamente se for imposto à criança. Por vezes aproxima-se do adulto
não como uma pessoa reconhecida na sua totalidade mas como um objecto parcial em que a criança
investe numa parte do seu corpo ou um pormenor das suas roupas. Pode pegar na mão do outro mas
apenas para lhe delegar o cuidado de realizar uma acção (Mazet & Stoleru, 2003).

Parece que a criança autista não reage aos estímulos externos, apesar de parecer reagir mais a
estímulos sensoriais. A criança parece estar fechada/isolada no seu mundo, mas esta retirada não é
para um mundo de fantasias mas sim para um mundo constituído predominantemente por sensações.
Este mundo consiste numa estratégia para se retirar do universo angustiante em que vive. Se as

crianças não tiveram acesso à intersubjectividade (i.e. diferenciação psíquica) encontram-se num
verdadeiro isolamento, enquanto aquelas que acederam, por pouco que seja, vão viver numa solidão

42
profunda por não conseguirem comunicar com o outro (seja de forma verbal ou pré-verbal; Carreiras,
2017).

Bettelheim tentou perceber este universo angustiante em que o individuo autista vive e
comparou-o à SITUAÇÃO EXTREMA (i.e. situações nas quais o individuo tem a impressão de que
qualquer acção da sua parte só poderá agravar a situação), não face à violência social como tinha
identificado no meio dos presos mas que, ainda assim, faz com que o individuo tenha de mobilizar
estratégias para combater a falta de controlo sobre o mundo horrível e imprevisível e pôr fim ao
sofrimento (Carreiras, 2017). O fracasso grave da relação de mutualidade entre o bebé e a mãe pode
confrontar a criança com uma “situação extrema”. A criança nestas condições desinveste o mundo
exterior e evita o mais possível qualquer acção para suprimir ao máximo qualquer desprazer. Em
paralelo, o seu mundo interior empobrece-se (uma vez que precisa de uma comunicação com os
outros) e a criança desinveste-o para limitar o sofrimento e a decepção. Finalmente, devido a este
empobrecimento progressivo, a criança torna-se uma fortaleza vazia (Mazet & Stoleru, 2003).

Este autor descreve assim a criança autista como uma fortaleza vazia – quer isto dizer que a
criança cria uma fortaleza que a irá impedir de sofrer com aquele mundo horrível mas que irá também
constituir um bloqueio ao seu desenvolvimento, especialmente relativamente ao seu pensamento
simbólico. A fortaleza da criança autista é composta por estratégias autisticas caracterizadas pelo
apego às sensações (ex. ecolalias, manipulação dos objectos autistico). O drama do autista prende-se
então com o facto de mobilizar estratégias de sobrevivência que também bloqueiam o seu
desenvolvimento (Carreiras, 2017).

Não Falado na aula:

Para Meltzer et al., a vivência da sensorialidade é muito importante, com grande capacidade
para a associação de estímulos, particularmente sensível ao estado emocional do outro (se a mãe por
exemplo estiver deprimida, o bebé poderá encontrar estratégias para não viver esse problema). O
autismo na sua forma mais extrema corresponde a um espaço unidimensional, totalmente desprovido
de pensamento, isto porque existe outro e, por isso, não existe diferenciação psíquica que permite o
desenvolvimento do pensamento simbólico. Contudo, a maioria dos autistas estão num espaço
bidimensional isto porque existe noção do outro mas uma recusa da separação que existe entre os
dois, assumindo-o como um prolongamento de si. Desta forma, Meltzer considera que a criança
autista recorre a uma identificação adesiva (i.e. colo-me e ao colar-me sou aquilo a que colo; ex. imita
gestos, posturas, linguagem) na qual não existe espaço de separação e portanto há uma vivência de
continuidade, poder e controlo (i.e. omnipotência).

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Outra estratégia identificada por este autor é o desmantelamento do ego (i.e. desmantelar/
desorganizar a experiência para retirar as sensações) que é uma estratégia diferente da clivagem
porque esta ultima é organizadora do mundo pela divisão do mesmo em categorias, enquanto a
primeira é desorganizadora (Carreiras, 2017). Ao desmantelar as experiências (o autista detém o seu
ouvido num estímulo, o olhar num segundo estímulo e o toque num terceiro) em modalidades
sensoriais, retirando assim o seu caracter de sofrimento pelo facto de a experiência deixar de fazer
sentido. O investimento não é assim feito sobre o objecto mas sobre a própria sensação (Mazet &
Stoleru, 2003). → pag. 47 (Desmantelamento)

Resumo:

A tentativa de evitar a separação do corpo resulta na separação da criança e na sua alienação


até que emerge da sua cápsula autista (Tustin, 1991). As estratégias dos autistas passam assim por
uma colagem sensorial que consiste na atitude na qual as crianças vivem mergulhadas/focadas nas
vivências sensoriais. Estas dimensões sensoriais, nas quais estão focados, não têm qualquer
profundidade emocional. O objectivo não é abstrair-se do mundo, mas sim fechar-se das emoções,
não percepcionando estímulos do ambiente que as possa magoar).

O bebé não tem recursos para sobreviver de outra forma além destas estratégias primitivas, o
que não vai permitir que este se desenvolva e lide com as emoções primárias e com o horrível de uma
forma mais evoluída. Ao fechar-se na sua cápsula está não só a impedir que se magoe com as emoções
mas também a impedir que vive as coisas boas e se desenvolva. A criança autista é imatura e tem
vários deficits sendo o mais crucial a fusão inicial com a mãe. As protecções autistas aumentam a sua
fraqueza porque limitam a sua prática em lidar com as exigências da vida (Tustin, 1991).

O autismo é geralmente definido como a ausência de vida mental. Contudo, existem vários
graus de perturbação que permitem momentos de percepção da continuidade e da diferença dos outros
– esta percepção embora parece um avanço no desenvolvimento é causadora de um enorme
sofrimento. Todos temos as nossas cápsulas autisticas mas, na criança autista, existe este modo
autistico como registo predominante de funcionamento. Quer isto dizer que o individuo normativo
pode recorrer a determinadas estratégias autisticas em determinados momentos da sua vida, como a
exacerbação das sensações (ex. respirar fundo e focar nessa sensação da respiração; Carreiras, 2017).

Intervenção

A criança autista relaciona-se com o terapeuta de forma peculiar: a) numa primeira fase do
processo terapêutico, ignora-o; seguidamente, estabelece com ele uma relação de rotina, em que a
44
pessoa é um prolongamento de si; b) só muito mais tarde, no seio de uma relação compreensiva, a
criança será eventualmente capaz de prescindir do objecto autístico. A partir daí, estará apta para
construir os objectos internos, o que levará ao estabelecimento de uma relação de apego com a própria
mãe.

O estado emocional do terapeuta é de extrema importância na terapia com crianças autistas.


A qualidade da atenção que o terapeuta lhes dispensa e uma total disponibilidade são fundamentais,
na medida em que estas crianças são hipersensíveis e vulneráveis. Esta atitude cria um envolvimento
psíquico que vai progressivamente fazendo com que a criança se sinta confiante, deixando
progressivamente de recorrer à sua cápsula auto-gerada e sensorial. Tal trabalho exige um ambiente
simples mas organizado e um terapeuta cujo comportamento seja disciplinado e consistente.

Quando esta forma de protecção começa a desfazer-se, surge-nos uma criança hipersensível,
vulnerável e ferida, com baixa tolerância à frustração. Com o desenvolvimento da capacidade de jogo,
estas crianças podem aprender a expressar e moderar estados afectivos e a utilizar objectos
transicionais em vez de objectos autísticos. Por outro lado, a terapia tem que ensinar à criança uma
forma de relação com os outros, separados e diferentes de si mesma. Para isso, têm que ultrapassar a
equação adesiva (que não é verdadeiramente uma identificação) à mãe e modificar a sua reacção crua
ao mundo externo (Carreiras, 2017).

45
5ª Aula Prática (14 de Outubro)

Formas Autísticas, a criança ficar focalizada numa forma, por exemplo dobram a língua
dentro da boca e ficam a sentir a forma da língua dobrada dentro da boca. A forma do contorno, tudo
remete para a sensorialidade, a criança fica apegada a tudo o que surge como uma forma.

Apegamento Própriocetivo, a criança fica a contrair ou descontrair partes da musculatura, e


fica colada a esta sensação e vivência da contração de um musculo, por exemplo ficar focalizada na
sensação do musculo do braço a ser contraído enquanto faz força. A criança fica focalizada nestas
vivências sensoriais como se o resto não existisse. Também pode acontecer com o mexer e sentir a
forma do ranho, ou até mesmo das fezes). Fica apegada a algo que tem forma. O horrível hipotético
do exterior é ignorado pela vivencia de continuidade do seu corpo e de Omnipotência (pensando que
há uma vivencia de vulnerabilidade, de rutura, através destas técnicas e como se a criança as
superasse).

A única estratégia da criança autista tem para lidar com o terror exterior a ela, é não
compreender. Assim utiliza estratégias muito primitivas, que apelam ao exacerbar da realidade. Para
a criança conseguir suportar o insuportável exterior (vivencia de terror sem nome), acaba por recorrer
a manobras autísticas A estratégia de linha autística e a forma como o sujeito a vive, por exemplo a
maneira como sente o corte feito na pele, por ele.

Acrescentado de Apontamentos:

Uma hipótese para este comportamento da criança Autista prende-se com as características
do bebé (ex. deficiências) que podem levar a mãe a aderir ao filho de forma patológica dando origem
a um registo autista – a mãe considera que esta é a única salvação do bebé. O bebé será então sempre
tratado como parte do corpo da mãe, sem mente até que, pela imposição da realidade, o bebé
aperceber-se-á que existe uma descontinuidade entre si e a sua mãe. Assim, irá desenvolver
estratégias (i.e. adesão para apego às sensações e viver a continuidade) para não ter consciência dessa
descontinuidade e para manter a continuidade com a mãe (Carreiras, 2017).

A criança que vem a ter um diagnostico de autista, é uma criança que se apercebeu (enquanto
é muito pequena) que o corpo da mãe não esta na sua continuidade (não está na continuidade do seu
corpo), há uma rutura, uma descontinuidade, e isto é uma angústia para ele. A criança não é capaz

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nem consegue lidar com isso, não tem estruturas para tal. Assim, arranja estratégias para lhe darem
uma sensação de continuidade, estratégias estas que são muito primitivas. O bebé não consegue
guardar enquanto representação a sua mãe, ao contrário de nós, mais velhos, que conseguimos.
---

Tipos de Funcionamento e tipo de identificação utilizada:


o Estilo de funcionamento Psicótico – Utilização da Identificação Projetiva como estratégia
defensiva do pensamento psicótico (Dimensão tridimensional - Implica haver um espaço que
contem).
o Estilo de funcionamento Neurótico – Utilização da Identificação Introjetiva como estratégia
do pensamento neurótico normal (Dimensão tridimensional - Implica haver um espaço que contem).
o Estilo de funcionamento Autista – Utilização da Identificação Adesiva. (Dimensão
Bidimensional) Existe um pensamento colante transmite uma vivencia de continuidade, um adesivo,
colo-me á superfície do outro, e tenho uma vivencia de continuidade, de não rutura, perceciono o
outro e eu próprio como uma superfície colante. Identifico-me pegando-me, colando-me de forma a
proporcionar uma certa vivencia de continuidade.

Acrescentado de Apontamentos:

Tustin considerou, inicialmente, que o autismo seria um estado normal, a que chamou auto-
sensibilidade, em que a criança estaria focalizada exclusivamente nas sensações corporais – à
semelhança de Mahler. Desta forma, se o autismo primário normal, como designou Mahler, fosse
perturbado a criança reagiria através do autismo patológico, sendo certo que a criança se iria retirar
para a fortaleza sensorial do seu próprio corpo, isolando-se das influências externas (Serra, 2007).

Klein achava que para a criança ser autista esta viveu algo insustentável para ela, Mahler
considera o mesmo e acrescenta que houve uma regressão da criança a um estado arcaico
(Carreiras, 2017).

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Daniel Meltezer: (Explorações no mundo do Autismo)


Este autor apresenta-nos o conceito de desmantelamento em contraposição ao conceito de
Clivagem, estratégia de defesa psíquica, tem a ver com um corte, cisão, separação. É uma estratégia
primitiva, dominantemente utilizada por psicóticos. Mecanismo patológico. Mas a clivagem tem um
papel organizador, existe o bom e o mau, bonito e feio, gordo e magro, alto e baixo. A clivagem está
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presente em todas as nossas classificações básicas que precisamos para pensar. Separa a experiência
e depois agrega. A mãe tem lados satisfatórios e outros muito frustrantes. Por exemplo nos contos
infantis/histórias para crianças, existem personagens muito estereotipadas. Ex. Na branca de neve há
a (madrasta) bruxa MÁ, porém há também os anões BONS e a branca de neve BOA, o que ajuda a
criança a organizar o seu mundo, agregar e organizar a experiência da criança. E não é por acaso, isto
ajuda a criança a integrar-se no mundo.

Desmantelamento
Desmantelar a experiência. Diferente da clivagem, quando a criança autista desmantela a experiência
em “fragmentos” sem sentido, não há organização da experiência em categorias. Há a desagregação
da experiência de forma a esta não ser percebida. A experiência é insuportável de
perceber/compreender para a criança, então a criança desmantela a experiência (provavelmente)
em diversas modalidades sensoriais, e desta forma a experiência deixa de ser percecionada
enquanto total (na sua totalidade) e passa a não ter sentido. Ex. criança entra numa sala e
está lá alguém, e tem uma experiência angustiante para ela, então a criança fica apenas
presa á luz da sala.

48
Caso do Afonso (3 anos e meio):

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50
Afonso vem a esta consulta através do pedido do pediatra da criança. Nesta criança está
presente um certo alheamento, parece não ouvir, apresenta movimentos estereotipados com as mãos,
não tem linguagem e não tinha desejo de comunicar com o outro (tal implicaria a criança perceber-se
como diferenciada do outro). A mãe de Afonso descreve o seu filho como um bebé bonito e calmo...
O que parece revelar um pouco de falta de disponibilidade e de atenção para com o seu filho, para o
ver e observar detalhadamente. Parece que esta mãe não se apercebera do que se passava com o seu
bebé por causa da sua depressão pós-parto que tivera. Não tinha muita disponibilidade da criança.
Afonso fica fixado na imagem em movimento da ventoinha quando vai ao consultório. Não há
contanto de olhares, parece que o seu olhar trespassa, esta criança apresenta também auto e hétero
agressões.

O que se deve fazer para ajudar?


Trabalhar com a criança e dar algum apoio a mãe e a educadora, no sentido de a ajudar a
compreender e ser mais adequada para o Afonso. Perceber as inquietações e angústias dos cuidadores
de forma a conseguir auxiliá-los e a fornecer estratégias para serem mais competentes na relação com
o Afonso.
Relativamente ao trabalho só com a criança: o trabalho da psicóloga com o menino, consiste em ações
num gabinete com água morna. A relação da psicóloga com a criança é mediada com a relação com
a água e com a música de fundo (Mozart). A água é utilizada como mediador, que torna possível a
criança acalmar-se e organizar-se, e reduz as agressões da criança tanto a ela própria como para com
a psicóloga (auto e hétero).

Hipótese levantada: o sofrimento da criança autista, com a vivência de uma descontinuidade, rutura,
é através do recurso à água morna e música, que se vai procurar proporcionar à criança uma vivência
de continuidade, supondo que esta pode gerar acalmia e organização para a criança autista. A água
envolve-nos, abraça-nos. Embala-nos e assim proporciona à criança uma vivência de continuidade,
isto facilita a acalmia e organização da mesma. O que torna a criança disponível para se relacionar
com a terapeuta e viver outras coisas. A música também nos envolve e abraça, propicia uma vivência
de continuidade e contenção. Este projeto com recurso à água e música, consiste em 10 sessões com
observou-se que a criança estava melhor e mais calma. Depois retirou-se a água e passou a utilizar-
se só música, a criança reagiu com alguma regressão, mas depois retomou a maior organização
alcançada anteriormente.
Quando deixa de existir a água, a voz da terapeuta sentiu que o seu falar, era intrusivo e
desorganizador para a criança. E remete-se mais para uma atitude silenciosa, um relacionamento mais
distante e menos ativo. Assim sendo, a terapeuta pensa em utilizar um boneco bebé para o qual dirige

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a sua narrativa, ao invés de para o Afonso. A psicóloga fala para o boneco, como se este boneco fosse
a criança (Afonso), tal como se este tivesse a sua vivência. Esta distância é organizadora para o
Afonso, e algumas das coisas que ela diz ao boneco fazem efeito nele. O dizer e falar da psicóloga e
contentor das suas angústias.
Algum tempo depois Afonso apresenta melhorias lentas, no jardim infantil o comportamento
deixou de ser tão agressivo. Começou a emitir sons de linguagem e começa a interessar-se por um
objeto macio que o acompanhava sempre (não era transacional, pois não havia pensamento simbólico
desenvolvido). Existe alguma recuperação, porém ainda é um menino com um atraso considerável,
pois é um menino de 5 anos e meio que ainda não falava, e seria fundamental ele continuar com a
intervenção terapêutica.

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5ª Aula Teórica (16 de Outubro)

Criança Psicótica

Criança psicótica, dizem-se generalidades em comum nas crianças e em adultos psicóticos. A


criança psicótica é uma criança que dominantemente funciona num registo psicótico. O que não
significa que a criança psicótica só funcione assim, pode haver aspetos a funcionar noutros
funcionamentos psíquicos (ex. funcionamento normal). Nas crianças psicóticas observa se uma rutura
com a realidade (tal como no adulto psicótico), discurso delirante, presença de alucinações. Com uma
criança mais pequena é difícil distinguir e perceber se é delírio, alucinação ou se é apenas a criança a
fantasiar e a utilizar a sua imaginação. Grande desorganização, incoerência, distinção entre fantasia
(imaginário) e a realidade é frágil. Há perturbações na comunicação e na interpretação, observação
de retiradas da criança (ausências na criança). É raro uma criança que só funcione no registo psicótico,
normalmente o funcionamento é dominantemente psicótico e também autístico. É rara a criança
autista que só funcione nesse domínio (autístico), normalmente a criança autista também tem um
certo registo no domínio psicótico.

A criança psicótica frequentemente recorre frequentemente à equação simbólica, um


conceito de Hanna Segal (algo que está a meio caminho entre o não acesso ainda à simbolização e o
acesso à simbolização). Ex. Uma criança que pega numa peça de lego, e que faz como se essa peça
fosse um carro, a peça de lego é um carro, mas esta criança sabe que na realidade a peça de lego não
é mesmo um carro, ela é que transforma essa peça num carro (a peça de lego representa um carro).
Uma outra criança que pega numa peça de lego e para esta é a peça é mesmo um carro, e passa com
a peça em cima do pé e desata aos gritos/berros (“O carro atropelou-me!”) porque é como se a peça
fosse mesmo um carro para ela, e é como se tivesse sido atropelada. (a peça é mesmo um carro). A
parte simbólica psíquica sobrepõe-se á realidade física. O real é rejeitado em função do psíquico. O
objeto passa a ser na realidade, aquilo que o sujeito quer.
O objeto (peça de lego) passa a ser, na realidade, aquilo que o
sujeito coloca nesse objeto - equação simbólica - muito
presente na criança psicótica (peça de lego = carro).

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O que observamos também nas crianças psicóticas é a intolerância à menor frustração/à
realidade, como quando a criança não quer vestir aquela roupa, não quer comer determinado alimento
ou quando não quer separa-se da mãe. Isto acarreta movimentos de frustração, estas crianças podem
ser auto e hétero agressivas (processos de hétero e autoagressão ou ambos). As suas reações à
frustração podem, por vezes, apresentar acessos de raiva com movimentos de auto e hétero agressão.
Movimentos de retirada subsequentes à agressão, é destrutiva para os objetos. A criança não
se deixa consolar, não permitindo a aproximação, fecha-se e retira-se.
São muito recorrentes Angústias Persecutórias, quando a criança sente que está a ser ameaçada e
perseguida. Angústias Confusionais, de fragmentação, de desintegração e de morte, angustias muito
intensas, terríveis mesmo.
- A criança psicótica, para lidar com a desorganização (desorientação), recorre a estratégias
primitivas:
Dentro de nós existe representações positivas dos outros significantes que colocamos em mente
na sua ausência – é isto que nos permite tolerar a separação física e o que permite que o nosso espaço
psíquico se delimite. Se não vivermos experiências dominantemente positivas, não somos capazes de
colocar coisas boas na ausência. O psicótico não consegue viver a separação e, por isso, tem
mecanismos para lidar com essa separação.

• Clivagem (ao fazer o corte para obter mais organização) - Este tipo de estratégia dita a
organização das experiências em duas categorias, o bom e o mau, em relação a si próprio ou
a objectos (sendo que esta diferença, do si e dos outros, não é percebida pelo sujeito);

• Retirada;

• Identificação projetiva (projeção) é também utilizada como estratégia, colocação fora dela
própria (criança psicótica), de coisas do seu mundo psíquico com as quais não consegue lidar
por serem horrorosas e terríveis. Não há uma clara separação entre o dentro e fora, há angústias
de perseguição, porque o que pus fora pode acabar por voltar (colocar fora e identificar-me
com esses aspetos. Não queremos/podemos reconhecer aspetos nossos e por isso colocamos
no outro essas características e dizemos que lhe pertencem);

• Projeção - Este tipo de estratégia consiste em colocar fora algo que incomoda, ou seja,
projetar no outro/mundo algo que nos incomoda;

• Negação (aquilo não se está a passar);

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• Idealização - o sujeito torna muito positivas certas partes de si, por exemplo, num delírio
persecutório o individuo idealiza uma realidade que o pode salvar – ao passar a janela que
está à sua frente estará numa outra realidade (uma realidade melhor). Este tipo de estratégia
tem subjacente a clivagem e a projeção;
• Movimentos de omnipotência: O individuo utiliza esta estratégia para “cobrir” a fragilidade
que sente sendo que este sente que é o melhor e que é capaz de fazer qualquer coisa;

• Podem ainda recorrer a estratégias autísticas, como o desmantelamento, no entanto esta


estratégia não é característica do psicótico.

O Eu na psicose tem múltiplas clivagens, que podem confundir-se e fundir-se com os objectos, e que
se devem a mecanismos de defesa primitivos como a identificação projectiva e a intrusão com os
objectos. A diferenciação não se faz e por isso o sujeito está confuso e tudo está interligado. Os
processos simbólicos estão perturbados porque não há distinção entre o interno e o externo e entre o
sujeito e o objecto (Bergeret, 1996).

A angústia profunda está então na fragmentação, na destruição, na morte por explosão, o medo de
perder, de dissolver. O conflito não é causado nem pelo Superego nem pelo Ideal do ego mas sim
pela realidade e, como tal, leva a que o individuo recuse todas as partes dessa realidade que se
tornaram perturbadoras podendo mesmo construir uma neorealidade mais vantajosa (Bergeret, 1996).

Acrescentado de Apontamentos:

Como bebé ainda não tem mente, a expressão da sua angústia é feita de forma somática (i.e.
através do corpo) sendo então característico uma série de perturbações que vão exprimir o seu
sofrimento psíquico alternando-se entre várias formas corporais. Uma dessas perturbações é do foro
alimentar que dizem, geralmente, respeito à recusa consistente do seio da mãe, vómitos persistentes
e que se mantém e uma anorexia da primeira infância. Para a mãe o alimento é ela própria. Um bebé
que recusa o alimento é um em que a mãe passa a considerar que o bebé a recusa – a mãe sente-se
rejeitada e vai tomar comportamentos de acordo com tal suposição (i.e. afastamento que tanto pode
ser físico como afectivo). Os pais, no geral, descrevem estes bebés como uns que nem se dão por eles

55
contudo, bebés irritadíssimo, com perturbações do sono - insónias. As perturbações do sono (ex.
insónias, dorme só 4h/dia) são mais graves quando não existe protestos de o bebé que não está a
dormir. Dormir implica encontrar um espaço sossegado e calmo e, se não o encontramos, podem
originar-se insónias – as angústias são potenciadas pela falta de estímulos.

Pode-se então pensar que uma criança psicótica vive constantemente a fase de simbiose, pois
vive predominantemente experiências negativas. Passando isto para o plano comportamental, é
evidente que a criança não esta bem sozinha nem acompanhada. É uma criança que não está nem bem
com ela, nem com o outro; quando está sozinha é insuportável, mas quando está com o outro vai
projectar as coisas negativas nesse outro. A criança não se ajeita com o contacto não havendo gestos
antecipatórios de forma consistente, que levam a um afastamento da mãe pelo sentimento de
incompetência que geram. Geralmente também não tem determinados comportamentos
organizadores, como o sorriso, o chorar com o estranho ao 8o mês ou o interesse por brinquedos
(Carreiras, 2017).

É necessário fazer uma intervenção na criança, com o objectivo de ela internalizar dentro dela
experiências dominantemente positivas, e que o terapeuta consiga transformar as negativas em
positivas (Carreiras, 2017).

---

O que está subjacente?


Conceptualização da Melanie Kheiln (posição esquizoide e paranoide) ou Margareth Mahler
(psicose infantil).

Uma psicose precoce é um profundo desequilíbrio do bebé na sua vivência da relação com a mãe.
Existem autores que consideram que dentro desta categoria se deve incluir o autismo. Contudo, há
quem considera o autismo como um outro modo de funcionar que não se encontra dentro de nenhuma
categoria. Mahler, descreve a psicose da criança como psicose simbiótica, alguns autores consideram-
na como esquizofrénica.

Do ponto de vista teórico de Margareth Mahler, que trabalhou com crianças muito perturbadas e
estudou o desenvolvimento normal da criança entre os 0 e os 3 anos. Dos primeiros autores a observar
crianças. Ao observar mães e crianças normais, observa os movimentos que as crianças fazem, em
relação às suas mães. Observa o que lhe parece que ser a capacidade de Autonomatização e escreve
sobre este conceito.

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Conceptualização do desenvolvimento normal entre os 0 e os 3 anos - processo de separação-
individualização – interessa a separação psíquica (e física) representada pela capacidade da criança
de se separar do pondo de vista físico, bem como a individualização da criança. Quanto mais separada
psiquicamente a criança está, mais se pode ver como um sujeito único e com uma identidade própria
(individualizada). A conquista da separação psíquica por parte da criança é a possibilidade, cada vez
mais desta investir em si própria e construir a sua identidade e individualidade. Investimento da
criança nas suas conceptualizações egoicas. Estamos a falar da separação psíquica. Há um
pressuposto da autora: haver inicialmente uma vivência de indiferenciação psíquica do bebé, este não
se perspetiva como um ser único separado e individualizado.

→ Mahler fez uma conceptualização da criança normal com base na observação da forma como as
crianças vivem a separação psíquica através do movimento (i.e. movimentos de aproximação ou de
retirada) a que chamou processo de separação- individualização. O processo de individualização
consiste num investimento nas funções egóicas contribuindo para a construção da identidade. Para
entender a psicose, é necessário perceber este processo para identificar onde o individuo estagnou.
Mahler descreveu então três fases deste processo:

Fases (as primeiras são conceptualizadas e as últimas é que são baseadas na observação direta
das crianças):
• 1ª fase – Autismo Normal: (até ao fim do 1º mês de vida) Nesta fase os processos fisiológicos
dominam os processos psicológicos. Não há a distinção dos “eu” e “não eu”, tudo é uma massa
indistinta. Metáfora: o pintainho que ainda não nasceu, e está dentro do ovo (tudo muito
desorganizado, a casca é pouco porosa não permitindo muitas trocas entre o interior e
exterior). Sensações hipoteticamente viscerais e corporais.

O autismo normal/primário corresponde à fase em que o bebé está centrado nele próprio e nas
suas vivências (i.e. vivenciaria um narcisismo primário absoluto), especialmente as sensoriais,
onde o objectivo principal seria a aquisição de um equilíbrio homeostático nesta nova
condição extra-uterina (Riani, 2013). Aqui o bebé não faz qualquer distinção entre o dentro e
o fora, nem é capaz de diferenciar e reconhecer diferenças entre ele e tudo o que é inanimado
que o envolve (Malher, 1964). Esta fase foi criticada posteriormente por Tustin que sugere
que, se um bebé estiver completamente fechado em si, é um bebé já perturbado. Sugere assim
o nome de autismo autosensual porque considera que o bebé pode ficar mais preso às suas
vivências sensoriais mas com aberturas para o exterior.

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• 2ª fase – Fase de Simbiose/Fase Simbiótica: (do 1º mês aos 6º/7ºmês) Começa a haver uma
diferenciação, muito insipiente que se vai acentuando, uma perceção por parte da criança entre
o ela e o outro. Como se ela e o outro, fossem o mundo e este mundinho estivesse cercado por
uma membrana (espécie de pele) mais porosa que permite maiores trocas entre o interior e
exterior. Nesta fase tenta perceber a psicose. O bebé comporta-se e funciona como se ele e a
sua mãe fossem um sistema omnipotente – uma unidade, dois indivíduos ligados. A passagem
da fase autistica normal para a simbiótica seria um atenuar do narcisismo primário absoluto –
começa a perceber que há algo externo que o conforta aquando o seu desprazer.

A fase simbiótica corresponde aquela onde ainda há indiferenciação, mas já existem alguns
rudimentos de diferenciação entre o eu e o outro, com benéficos mútuos. Esta fase é
considerada pela autora uma fase chave para o desenvolvimento da criança, pois é nesta fase
que o bebé começa a ter uma diferenciação Eu-Outro. O bebé torna-se então progressivamente
consciente que o que alivia a sua tensão de fome vem de fora enquanto a dor vem de dentro.
O mundo torna-se a relação entre os dois seres sendo que o bebé tem um espaço rudimentar
do outro em si. Desta forma, a distinção entre si e o outro depende da alternância entre o grau
de fome, que corresponde a quando a distinção se torna mais clara, e a satisfação, quando as
barreiras se fundem com o outro se fundem outra vez (Mahler, 1964). Para que a criança
consiga evoluir para a fase posterior, terá que assim que se diferenciar claramente do outro,
ou seja, é preciso que a criança construa dentro dela uma imagem estável, isto é, a criança
esteja dentro do outro e o outro esteja dentro da criança de forma segurizadora, isto significa
que só me consigo separar psiquicamente do outro se houver uma ponte de representação, a
representação que o outro tem de mim e eu tenho do outro.

• 3ª fase – Fase de Separação e Individualização: (6º/7º mês até aos 3 anos) Composta por várias
subfases nas quais ocorrem os processos de separação (i.e. saída da condição fusional com a
mãe) e de individualização (i.e. aceitação das características individuais; Riana, 2013). Nesta
fase realmente começa a ser construída e vivida a separação psíquica e individualização que
tem os seus alicerces nas fases anteriores. A partir da simbiose. Psicosimbiose: considera que
a criança psicótica não pode eclodir da fase de simbiose.

No fim da fase separação-individualização é expectável que a criança conceba que tem um


espaço psíquico separado e limitado do dos outros. Esta fase está subdivida em quatro
subfases: a) diferenciação, em que a criança inicia a sua tentativa de se afastar da mãe; b)
exploração, fase onde o afastamento aumenta pelo encanto pelas suas capacidades de
movimento e de exploração do mundo; existe um aumento das capacidades cognitivas da
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criança que a levam a aperceber-se da separação, c) reaproximação, em que há um
consciencialização da separação e uma perca da omnipotência da criança e volta a mostrar
interesse e necessidade pela mãe e d) constância objectal em que o bebé começa a aceitar a
separação e constrói um objecto interno estável e securizador – remete para a representação
do outro como alguém que gosta e pensa no bebé; Carreiras, 2017). Se o bebé não tiver
conseguido criar uma representação de um objecto constante, estável e securizador não
consegue ter um espaço psíquico delimitado – o que leva à construção de personalidades
pouco definidas e difusas (ex. borderlines; Carreiras, 2017).

A partir do momento que passa para a segunda fase passa a existir uma separação por parte da
criança entre o ela e o outro. Como se ele e o outro fossem, o que se passa entre ele e outro é o mundo.
O relacionamento entre o esboço do outro e dele. Na 1ª fase há uma indiferenciação total, na 2ª já
passa a haver alguma. Ex. a situação de alimentação (amamentação), um bebé que está mal e com
muito desconforto (estado desagradável porque o bebé tem fome), passa por uma vivencia muito
desagradável, algo que não deriva da ação dele. Há a aproximação do seio da mãe, e depois há uma
vivencia de satisfação quando está a ser alimentado pelo leite da mãe. Começa com uma vivencia
desagradável, porém depois passa a ter uma vivencia agradável. O outro que a socorre é bom, e há
uma vivencia de qualquer coisa é que é positiva para o bebé. Quando a criança não é socorrida, há
uma vivencia desagradável por parte da criança, o outro que não me socorre é mau, há algo entre nós
que não é nada bom, passa-se algo mau entre nós do ponto de vista da criança.
De acordo com a teorização da Melanie Klein, a vivencia da criança oscila entre momentos de
bem-estar e mal-estar (relacionados a situações de alimentação, frio, estar sozinha, etc). O vivido da
criança oscila em períodos bons e maus. E como a criança é pequena tenta organizar estes momentos
desta forma, ou seja, separando-os em momentos muito bons e momentos muito maus.
Quando o objeto está ausente e não satisfaz, a criança sofre (vivencia desagradável), e a criança
pode colocar algo a substituir o objeto ausente, qualquer coisa que o representa, se foi vivendo
experiências suficientemente positivas para me salvar dela. Se há alguma coisa que é desagradável,
eu só consigo olhar para ela se tiver experiências boas. Quando não temos instrumentos para lidar
com o terrível tentamos evitá-la. O objeto ausente só pode ter um substituto mental apenas se a criança
tiver vivido experiências boas com esse mesmo objetivo. Ex. As saudades são uma ausência, mas
também uma presença, pois ao rememorar uma lembrança esta torna-se presente na nossa mente.

59
Acrescentado de Apontamentos:

Mahler destaca a fase simbiótica em que o bebé começa a) a vislumbrar um outro objecto,
ainda que difuso – e, perante vivências negativas o bebé não é socorrido, este vai construir um esboço
mental do outro com conotações negativas; e b) começa a ser capaz de organizar o mundo através da
clivagem do mesmo em categorias opostas, como aspectos bons e maus – o que corresponde à posição
esquizoparanóide de Klein. Para conseguir ultrapassar esta fase (i.e. ser capaz de processar as
experiências negativas) precisa de viver dominantemente experiencias positivas. Só assim pode
esperar experiências positivas aquando as negativas ocorrem e poderá vir a pensar no objecto como
tendo características positivas e negativas que se vão integrar na posição depressiva permitindo a
separação psíquica. A forma como guarda o outro dentro de si depende não só das características da
própria mãe como também com a forma como a própria criança se relaciona com a mãe. A vivência
de experiências negativas constitui, do ponto de vista do bebé, relações insatisfatórias e a permanência
num mundo horrível. Não vivenciando experiências maioritariamente positivas, pode acontecer três
aspectos: a) ou regride uma parte de si para uma fase anterior, b) ou vai ficar nesta fase de simbiose,
ou c) avança de fase mas com falhas (Carreiras, 2017). Se o bebé vive maioritariamente experiências
negativas, o mais esperado é que não consiga ultrapassar esta fase, vivendo apenas relações
insatisfatórias para si e desejando ficar afastando deste mundo horrível e “colado” aonde se sente
seguro (i.e. a mãe) – o que leva à origem dos indivíduos psicóticos (Carreiras, 2017).

60
Exemplo: pais apontam o seu filho como uma criança normal mas que não tem tolerância à frustração
e que na mudança para a creche não se adapta e manifesta uma angustia intensa à ausência da figura
vinculativa podendo até ter sintomas autistas e regredir em aquisições. A criança acaba por se
reorganizar perante a mudança, mas de forma tão pouco consistente que continua, no entanto, com
uma elevada angústia tanto com a falta da figura vinculativa (isto por não ter a representação do
objecto estável) como com a sua presença (porque vai projectar na figura as angustias por não a ter
tido nem representado, não constituindo assim para a criança uma figura de confiança;

Não Falado em Aula:

Bergeret aponta que a mãe é a grande facilitadora para a condição não individualizante da criança e
descreve três posturas da mãe que têm este resultado. A mãe superprotectora que não esperaria que a
criança tenha necessidades para a satisfazer, gerando uma incapacidade na criança de perceber o que
sente. Nesta relação não haveria nenhum nível de frustração porque não há consciência por parte da
criança do que necessita. A ausência materna seria a constância e permeância num estado de
frustração porque a mãe não satisfaria nenhuma necessidade da criança, perdendo a criança o sentido
para desejar algo. A criança era mantida assim num estado de eterna dependência, por não saber como
se satisfazer. Por fim, temos a mãe que satisfaz inoportunamente a criança, onde há uma discordância
entre a necessidade fisiológica que a criança exprime e o sentido (desviante) que a mãe lhe confere,
deixando sempre a criança frustrada, fazendo com que, também aqui, a criança perda o sentido do
desejo. Desta forma, estes modos de relacionamento (a) não possibilitam relações objectais com
outros além da mãe; (b) que consciencialize o seu corpo como uma totalidade; (c) não permitem que
a criança saia desta relação simbiótica; e (d) assim não será capaz de movimentar-se para uma
separação e individualização, pela angústia de que pela separação da mãe deixe de existir (Riani,
2013).

Os pais descrevem a criança como nunca tivesse dado problemas, mas quando esta é colocada numa
situação não esperada, esta reage de maneira exagerada (ex. a criança desorganizar-se quando entra
no jardim infantil). Ou seja, só quando a criança é confrontada com situações onde tem que recorrer
aos recursos internos, é que se verifica que afinal esta não os possuía.

61
Quando é que podemos colocar algo de positivo no lugar da Ausência?
o Quando falamos da Saudade. Estamos a falar de uma ausência, mas a introduzir uma
presença. Só podemos tornar presente o ausente, se essa ausência/presença não for tão
terrível e desorganizadora que não possamos olhar para ela. Ex. uma pessoa que perde a
mãe, se esta morte foi muito terrível e se este desaparecimento da mãe for uma cena tão
terrível e angustiante, é espectável que a pessoa não evoque a mãe (colocar algo no lugar
dela) se as experiências más se sobrepuseram às boas. O ausente é mau (ex. a mãe que não
alimenta). A ausência é desagradável, é negativo, é de socorro, de suporte. Mas eu posso
ser capaz de olhar essa ausência, então eu sou capaz de colocar qualquer coisa no lugar
dessa ausência (capacidade de sobrepor as experiências boas às más). Torno presente o
ausente através da simbolização.
o O objeto que não me satisfaz é ausente, mas apesar de tudo sou capaz de lidar com essa
ausência e colocar nessa ausência algo de positivo que vivi com esse objeto (que não me
satisfaz). Colocamos algo no lugar do ausente quando somos capazes de lidar com a
ausência, capazes de a tolerar, porque provavelmente conseguimos viver coisas positivas,
que não foram destruídas pelas negativas que também vivi. São essas coisas positivas que
me tornam capaz de substituir o objeto ausente por essas memorias suficientemente boas.
o O Ausente é mau, a mãe que não alimenta é má, do ponto de vista do bebé. A ausência é
desagradável e negativa, mas eu posso ser capaz de olhar para essa ausência e encara-la,
sou capaz de colocar qualquer coisa (suficientemente boa ou uma vivência positiva) no
lugar dessa ausência de forma a transformar essa coisa positiva numa presença agradável,
estável e segurizadora! Ou seja, só se pode colocar alguma coisa no lugar do presente se
eu vivi coisas suficientemente boas com o que agora está ausente. Se não vivi coisas
suficientemente boas, eu não sou capaz de transformar essa ausência, numa presença boa
e seguradora. Assim podem vir a transformar-se em vivências persecutórias.
o Para colocar um símbolo (representação de algo que não esta lá), tenho de suportar que o
objeto não está lá (ausência). Através da simbolização de realização, eu transformo a
ausência em presença.
o Um ausente persecutório é um presente persecutório! Como só se tem isto constrói-se
estratégias para viver nesta situação, estratégias psicóticas. Por isso os instrumentos que a
criança tem, vão lhe permitir organizar-se então, num registo psicótico.
o As ausências são vivencias persecutórias e más (a criança deseja que esteja lá e não está),
o ausente é mau e persecutório, se a pessoa que gosta de mim não está ao pé de mim. Se
sou capaz de ligar esse mau com experiências positivas que eu vivi, sou capaz de

62
compreender que o sujeito agora não esta ali mas que tal não significa que não goste de
mim, ou seja vamos voltar a encontra nos e vamos voltar a ter vivencias positivas.

Intensifica-se na Fase 3, o bebé é capaz de representar um outro que apesar de não estar ao pé
de mim, gosta de mim, para ser capaz de me perspetivar é importante que eu transporte dentro de
mim uma companhia interna, que é a representação interna (dentro de mim) de alguém que se
preocupa comigo e que é bom para mim (Ex. no momento da fome o bebé cria uma representação de
um seio dentro dele que o está a alimentar para se acalmar). A separação psíquica, pressupõe que eu
seja capaz de representar o outro. → Conquista Gradual!
Podemos estar bem sozinhos se estivermos bem acompanhados por dentro, boas companhias
internas são representações internas de pessoas que sabemos que gostam de nós e que me transportam
(são positivas e boas para mim).

Na fase de Simbiose há alguma perceção insipiente entre o eu e o outro, é nesta fase que
começo a colocar coias boas no lugar do ausente. A eclosão da fase de simbiose para a fase 3, é onde
se começa a diferenciar sendo suposto que tenha dominantemente (da minha perspetiva) que tenha
vivido coisas boas.

Sub fase Simbiótica – fase da diferenciação: Se a criança não constrói instrumentos que lhe permitam
lidar com a separação e para o facto de viver uma diferenciação, significa que vai viver angústias
terríveis. A criança vai tentar organizar-se para lidar com estas angústias e desorganização de forma
a tentar arranjar estratégias para lidar com elas, porém estas vão ser estratégias psicóticas. A criança
organiza-se num registo psicótico.

Psicose simbiótica (funcionamento psíquico. Aprofundamento da psicose. Clarificação, na


criança pequena):

A Psicose simbiótica é um aprofundamento da Margaret, da psicose,


na criança pequena. A Criança com psicose simbiótica, à mínima separação
(não apenas a separação da mãe, pode simplesmente ser o facto de encontrar
o mundo à sua volta que não é como ela quer, provoca nesta criança, uma
vivencia de separação). Algo insuportável vivido pela criança por não ser
como ela quer (o mundo não ser como eu quero, faz-me sofrer, frustra-me.
A criança não consegue controlar, a realidade não é como ela quer). O
próprio mundo que não é como ela quer que a faz confrontar-se com a sua
63
omnipotência e falta de controlo. Ex. A minha mãe não estar aqui para me proteger, desencadeia
angústias na criança que não lhe permitem nem estar bem com nem estar bem sem. Este outro pouco
perspetivado também é ameaçador para mim. A criança pode retirar-se, no caso de um registo mais
autístico.

Criança Autística vs Criança Psicótica


A criança dominantemente
autística (vivencia de perda de
continuidade, não tem estratégia
suficiente para recorrer á clivagem,
não tem capacidade de projetar)
tem menos recursos internos do
que a criança psicótica (é mais
evoluída do ponto de vista
psíquico).

Diagnóstico da Criança Psicótica:


Tal como na criança autista não há diagnostico antes dos 3 anos, o que não significa que não haja
demonstrações psicóticas antes.

CARACTERÍSTICAS DIFERENCIADORAS: (Adaptado de F. Tustin e de G. Haag)

Autismo Precoce Psicose/Esquizofrenia na criança

- A retirada remonta à infância precoce. - Os sintomas graves surgem após um período


- Podem ter surgido, precocemente, crises de de normalidade.
gritos e de cólera. - A criança pré-esquizofrénica é “muito fácil”,
- Com boa saúde depois do nascimento. Sinais educa-se depressa, é asseada muito cedo, em
de progresso quando começam a surgir resumo, é um bebé perfeito (Rimland, 1964).
doenças infantis precoces. - A saúde é, muitas vezes, precária; os
- O corpo é rígido, insensível. Quando são problemas respiratórios, circulatórios ou
pegadas, permanecem rígidas. metabólicos são frequentes.
- Evitamento de qualquer contacto com os - Quando se lhes pega, “aderem como matéria
outros. plástica ou massa”. Movimentos dos braços
- no vazio, para se agarrarem às pessoas;
O olhar evita os outros.
enfiam-se.
- Inibição do pensamento. - O contacto é patologicamente invasivo.
- Sem atividade fantasmática. - Olhar vago. Mais do que pousar o seu olhar
- Podem não falar ou, então, apresentar sobre o outro, parecem atravessá-lo.
ecolalias.
- Confusão do pensamento.
- Atividade fantasmática confusa e primitiva.
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- Movimentos do corpo ágeis e graciosos; - Linguagem mal articulada, confusa ou
dedos ágeis. prolixa.
- Fazem girar objetos com habilidade. - Movimentos do corpo desordenados, mal
- Manipulam objetos com destreza. coordenados e às vezes desastrados.
- Pode faltar sensibilidade nos dedos e no dedo - Fazem girar objetos desajeitadamente.
grande do pé. - Manipulam os objetos desajeitadamente.
- “A criança autista é ... não orientada, - Falta, muitas vezes, sensibilidade nas
desligada, parece desinteressar-se de tudo o extremidades do corpo.
que passa à sua volta; mais retirada e alheada - “... a criança esquizofrénica parece
do seu ambiente do que em contacto com ele” desorientada, confusa e angustiada; mostra-se
(Rimland, 1964). muitas vezes interessada pelo seu ambiente.
- Potencial intelectual bom ou elevado. Tem consciência da sua confusão” (Rimland,
- Capacidade acentuada em reconhecer os 1964).
modelos e as formas. - Potencial intelectual variável.
- Órgãos sensoriais hipersensíveis. - Capacidade variável em reconhecer os
- O meio familiar é, em geral, instruído e de modelos e as formas.
alto nível intelectual. - Meio familiar muito variado.
- Fraca incidência de perturbações mentais na - Grande incidência, na família, de
família. perturbações mentais graves.
- Sem consciência da separação física, salvo - Vaga consciência, constante, da separação;
durante curtos períodos. sentimentos confusos.
- Quase sempre fascinada por objetos - Nem sempre fascinados por objetos
mecânicos; perseverante na utilização de mecânicos. Podem utilizar um objeto
objetos autísticos. transicional e permanecer muito ligados a ele,
- A criança pode dividir um objeto assustador depois de ter passado a idade em que as
em várias partes e reconstituí-lo; parece-lhe, crianças normalmente o abandonam.
então, mais dócil, porque ela própria o - Estas crianças procederam a uma clivagem e
fabricou. a uma dispersão excessiva de partes do seu
- Estas crianças escolheram retirar-se. corpo, para se fundirem nas outras pessoas;
- Paragem no desenvolvimento. assim, evitam ter consciência da sua
separação corporal.
- Do ponto de vista da criança, a mãe parece - Estas crianças estão na confusão.
ter-se fechado devido:
o à retirada da criança; - Regressão do desenvolvimento.
o à reserva natural da mãe; - Do ponto de vista da criança, a mãe parece ser
o à depressão ou à inquietação da mãe. demasiado “aberta” devido:
- O seu funcionamento repousa sobre a o à excessiva invasão da criança;
dicotomia entre um “si” reunido o à confusão da mãe;
prematuramente e o objeto externo. O “si” é o o à atitude sedutora ou de demasiada
“eu”, o mundo exterior assustador é o “não- indulgência da mãe.
eu”. O “não-eu” é “encoberto”, assim não há
nenhuma consciência do si. - O seu funcionamento assenta numa clivagem
- minuciosa (fragmentação).
Para combater a experiência traumatizante da
- Para evitar tomar consciência da separação
separação, mecanismos de envolvimento
física, os mecanismos de identificação projetiva
explosivos e invasivos persistem e tornam-se
(descritos por M. Klein) são usados
excessivos. Estão associados à evacuação que
excessivamente.
Herman (1929), num artigo pouco conhecido,
- Mãe e criança estão “embrulhadas” uma na
descreveu como o precursor da projeção.
outra. Em seguida, estas crianças perdem-se na
multidão, a sua identidade própria torna-se
65
- Estas crianças estão envolvidas nelas incerta. Tornam-se no que se chama
próprias, isto é, têm o delírio de estarem personalidades “desadequadas”.
envolvidas na sua própria substância corporal - Desintegração explosiva e destrutiva.
e nos outros, que percebem como um - Angústias arcaicas sobrecarregadas de
prolongamento do seu próprio corpo. angústias persecutórias intensas.
- - Hiperpenetração agressiva, controle tirânico e,
Não-integração.
por vezes, alucinatório do objeto, agitação.
- Angústias arcaicas (queda, aniquilação, - Repouso na retirada autística, manobras
liquefação, terror sem nome) autísticas defensivas contra a hiperpenetração.
- Evitada a interpenetração. - Ser penetrado violentamente.
- Retirada autística. - Fragmentação e penetração, confusa e
- Estar “colado a”. desorientada, utilizadas para evitar a
- consciência da separação corporal.
Encapsulamento utilizado para evitar a
- Identificação projetiva patológica.
consciência da separação corporal que produz
- Fragmentação, ataque oral sádico do
a sensação de ter perdido uma parte
continente (além do primeiro continente
importante do corpo.
psíquico).
- Identificação adesiva. - Perda ou fragilidade do primeiro continente
- Desmantelamento (aquém do primeiro (de natureza rítmica) conduzindo ao recurso,
continente psíquico). com frequência, aos ritmos corporais.
- Não constituição do primeiro continente
psíquico (de natureza rítmica) que conduz à
manutenção quase permanente dos ritmos
corporais.

Resumo:

Enquanto os autistas ficaram presos na fase de autismo primário estabelecida por Mahler, os
psicóticos ficaram presos na fase de simbiose. Isto significa que os psicóticos são indivíduos que
conseguiram alguns rudimentos de uma diferenciação (através da dinâmica de alimentação e do facto
de existir algo externo que alivia o seu desprazer) mas não conseguiram a diferenciação completa
devido às experiências negativas que viveram.

Enquanto que no caso dos autistas foi a situação extrema da imposição, pela realidade, da
separação física com a mãe que interrompeu o seu desenvolvimento; no caso dos psicóticos, foi a
sobreposição das experiências negativas que viveram com o outro que fez com que não conseguissem
progredir no processo de separação psíquica. Os psicóticos viveram demasiadas experiências
negativas que não permitiram que o individuo saísse da posição esquizoparanóide e, portanto, o objeto
é visto apenas de uma forma parcial sendo que o individuo tem de projetar fora os aspetos maus desse
objeto.

Desta forma o individuo vive uma realidade que é no domínio do horrível, sem coisas boas
para preencher a ausência da figura e uma realidade cheia das suas projeções más, o que faz com que
este se queira isolar do exterior. O autista isola-se como forma de recusar a separação da figura
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materna e não como recusa da realidade, como acontece na psicose. Em casos extremos o individuo
pode ainda criar a sua própria neorealidade, uma realidade própria que inclui delírios e alucinações,
que correspondem a narrativas relacionadas com os seus dramas, que podem ser mais ou menos
organizados e egossintónicos.

O psicótico recusa a realidade externa e protege-se da mesma através da utilização de um a


série de mecanismos de defesa: sendo os principais a clivagem das experiências e a projeção dos
aspetos maus fora.

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5ª Aula Teórica (21 de Outubro)

Na fase simbiótica pode-se dar uma psicose simbiótica…que se manifestaria na 3 fase.


(desenvolvimento da criança sem sucesso).

Margaret Maller, conceptualiza o desenvolvimento normal do bebé dos 0 aos 3 anos- processo
de separação e individualização – e tem 3 fases:
- 1º fase, no 1 mês de vida, fase Autismo Normal. Depois de muitos autores estudarem de diferentes
formas surgiram novas teorias sobre o desenvolvimento do bebé.

Francis Tustin apoia-se nas teorias de Margaret Maller mas propõe que o nome não seja
autismo normal, mas sim que se passe a chamar fase Autosensual (das sensações) e que se guarde o
a nomenclatura autismo apenas para a patologia. Se um bebé pequenino está muito centrado nele, se
calhar, apesar de pequenino, já é um que não está bem. No 1º mês de vida o bebé pode estar muito
concentrado na sua vivência sensorial, mas que pode haver momentos de ruptura que propiciam o
desenvolvimento.
Um bebé muito fechado e centrado nele, é um bebé que já não esta cá.

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69
A Rita tem 3 anos e 4 meses e tem um quadro psicótico, vem para esta consulta através de
sugestão do pediatra e porque a mãe “não aguenta mais”.
Neste caso está subjacente o facto de a outra menina ter nascido há 10 anos, e há 4 anos a mãe da Rita
quis ter outro filho. O que se passou? Quando desejou engravidar do novo a criança já tinha 6 anos,
a menina entrou na escola.
O que é que podemos levantar como hipótese?
Com a ida da criança para a escola, a mãe deixa de estar tão presente com ela quanto estava antes
dessa ida.
Hipótese levantada: (sobre o último parágrafo do caso sobre a história da mãe) A mãe podia
estar a sentir-se sozinha. Sabemos que a mãe da Rita tinha uma irmã gémea de quem era muito
próxima (grande ligação de proximidade). Esta irmã casou-se, e é sentido pela mãe da Rita como se
ficasse ali uma saudade e uma falta desta relação próxima que tinha com a sua irmã gémea. Quando
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a filha se autonomizou, a mãe ficou com saudades e sentiu a falta dela e saudades da dependência de
um bebé que não sai de ao pé dela (fantasia da mãe). Existe esta tendência no universo psíquico da
mãe e isto pode criar uma predisposição para fomentar uma relação de dependência, simbiótica
(negativamente), uma dependência tóxica com o próximo bebe que irá nascer. Faz parecer que
engravidou para não se voltar a sentir sozinha.
Relativamente ao parágrafo da descoberta do diagnóstico da malformação da filha, a mulher
grávida e que a partir dos 3 meses há ameaças de aborto, existe um risco para o seu bebé e este traz
consciências chatas (quotidiano) e uma grande angústia para a mãe, que tem de lidar com a
possibilidade de que a gravidez não vá avante, havendo uma probabilidade de o bebé não sobreviver.
Esta mãe oscila entre o investir (tem esperança e sonha a bebé) e o não investir (prepara-se
para a possibilidade de um desfecho negativo/horrível, luto prematuro do bebé). Quando a bebé nasce
e é diagnosticada, a mãe fica devastada, tanto que nem é capaz de a ver, não quer ‘’enateirar-se da
realidade’’ não é capaz de olhar para a malformação do bebé.
A equipa médica pode ter sido um pouco bruta, porém não há forma adequada de transmitir e
dar este tipo de notícias às mães. Há provavelmente angústias desta mãe em relação a como a bebé
vai viver, o que é que ela tem, vai sobreviver, quais as consequências da sua malformação (“Vou ter
uma bebé ou não?”). Quando há o nascimento e se descobre esta malformação há angústias:
sobrevive? Consequências associadas?
Também se pode pensar que o bebé é um mau produto que a mãe apresenta ao mundo, é uma
bebé defeituosa, com uma malformação. É provável que isto deprima a mãe (é um ataque ao seu
narcisismo) porque, a bebé sonhada (mesmo que pouco) não é a real. Isto tem um grande impacto na
mãe, agride a mãe, dificulta a sua interação com a bebé e pode criar dificuldades no desenvolvimento
da relação entre mãe-bebe. Há uma negação da realidade, a mãe nem olha para a bebé, não a despe.
Há muito sofrimento na mãe, o que provavelmente vai provocar um menor investimento por parte
desta no bebé. A mãe não a olha, não confirma o defeito da bebe é como se a mãe tivesse certas
expectativas para esta bebé (bebé sonhada), que depois não vão ser correspondias, e ela não consegue
lidar/confrontar-se com isso. Toda a gravidez é cheia de angústia, e quando a bebé nasce e lhe falam
da malformação, a mãe sofre uma angústia muito intensa e não é capaz de integrar a malformação da
bebé, é como se fosse uma ameaça.
o Ex. (sem ser do Caso da Rita) A mãe ao saber o diagnostico da bebé, capta que a malformação
é nela. só no fim da gravidez é que é capaz de associar a malformação à bebé. Na fantasia da mãe ela
acha que a bebé vai morrer, e não vai ver a bebé para não se ligar/apegar a ela, pois na lógica desta
mãe a sua bebé vai morrer. Existe uma dificuldade da mãe de processar e integrar o que é dito, então
a mãe da bebé desloca para ela própria, e quando consegue perceber que a malformação é da bebé é
como se fosse um ‘’certificado ‘’ de morte da sua bebé.

71
O facto de a mãe voltar para casa sem a bebé, é doloroso. Existe muito sofrimento na mãe da
Rita, o que vai dificultar o investimento da mãe na sua bebé. Este sofrimento imenso da mãe, traz
uma grande violência para a sua bebé (fica hospitalizada desde muito cedo, 1ª semana de vida é
hospitalizada, e na 6ª semana é operada, quando é operada tem de ficar cerca de 3 semanas amarrada
sem poder movimentar os membros). Muita da descarga/libertação do desconforto que um bebé vive,
é feito pela movimentação (chora e agita-se), porém esta bebé não pode fazê-lo. O bebé fez uma
cirurgia, teve 3 semanas presa e amarrada, sujeita a uma enorme violência, uma enorme dor sem
socorro, pois não é possível ajudá-la.
Os bebés têm fraca capacidade de se auto organizar, regular e de se acalmar como um adulto,
só são capazes de tal, através da relação com o cuidador. Os bebés organizam-se com o toque,
presença e outra das estratégias de organização e acalmia dos cuidadores é por norma pegarem ao
colo e embalarem os bebés. No caso da Rita, esta menina, durante o tempo que esteve hospitalizada,
sem se puder mexer, não tinha esta oportunidade, este socorro por parte da mãe. Tal é violento e
agonizante para a bebé, mas também para a mãe, que vê a bebé em sofrimento e não consegue fazer
nada, não pode pegar nela ao colo para a socorrer. As interações diretas com a mãe só ocorrem aos 2
meses e meio. A ligação e relação mãe-filha (que passa muito pelas interações diretas, como dar de
mamar, pegar ao colo, etc.) só pode ocorrer quando a bebé tem 2 meses e meio, até aí a mãe tem de
delegar a sua função materna de longe, logo sente-se incompetente (já foi incompetente pois formou
uma bebé com uma formação e depois não consegue socorre-la e ajuda-la em vida).
A mãe tinha de fazer dilatações anais 3x por dia, o que para esta é extenuante. O que importa
é aqui não é a tarefa, mas sim a sua representação, a forma como esta tarefa é vivida por quem a
realiza (em relação ao facto de a senhora dizer que é extenuante fazer dilatações no ânus e não mudar
a fralda em si). É uma tarefa intrusiva, a bebé deve chorar por não querer, há uma violência da mãe
sobre a sua própria bebé. A mãe não gosta de fazer isso e sente se mal por fazer a filha sofrer, é
complicado. Houve coisas que correram bem, porém esta bebé estava sempre doente, a mãe não
retomou ao trabalho, todo o seu investimento fica para a Rita.

72
A Rita tem também um quadro de anorexia muito grave (chega a estar 10 dias sem comer)
este é um sintoma frequente na 1ª infância, e na adolescência é frequente em raparigas e rapazes. E
pode começar com febre e uma pequena perda de apetite. Pode não estar bem fisicamente (dor de
dentes) e há perda de apetite, criança recusa comer, há movimentos de insistência por parte da mãe,
sente que a mãe é intensiva ‘’braço de
ferro’’ entre as duas. As mães vivem muito
a rejeição do bebé ao alimento, como uma
rejeição a elas. Se a criança não come é
como se as mães sentissem que o seu amor
por elas fosse rejeitado. Esta vivencia por
parte das mães pode intensificar o forcing
por parte destas. A oposição da criança e a
insistência da mãe cria um conflito. Que
depois é muito angustiante para a mãe.

De acordo com os dados de um Estudo: A anorexia na primeira infância tem maior incidência
no Sul da europa (latinos) do que no Norte —-> possivelmente porque tem na cultura dos países do
norte o ato de alimentar não tem a mesma importância como nos países do sul (questão cultural).
O alimento é fonte de vida, uma criança que não come está em risco. A “criança gorda” tem
mais reservas e mais probabilidade de viver. A criança rejeitar o alimento, revela uma inquietação
nas mães, que se sentem eles rejeitadas, e logo uma atitude de forcing, tudo centrado na alimentação.
Neste caso existe um grande conflito entre mãe e filha.
A relação da mãe e da Rita é muito interdependente (ambas as partes) e muito esgotante,
porque a Rita é uma menina que se desorganiza com muita facilidade, tem baixa tolerância à
frustração, Auto agride-se, é muito turbulenta, etc. Apesar da sua idade, é uma menina que ainda não
construiu dentro dela uma representação geradora de segurança. Quando esta doente tem de estar ao
colo da mãe, e a mãe alimenta isto, o que não propicia que a filha possa de viver a separação e que
seja capaz de colocar algo segurizador para ela, no lugar da presença da mãe, para posteriormente
esta criança ser capaz de se autonomizar. Há uma dificuldade de filha e mãe não estarem as duas
juntas, ainda que, quando estão juntas, estão muitas vezes também estão mal.
A criança parece estar fundida com a mãe, não utiliza o “eu”, o que revela a não diferenciação
e a sua incapacidade de integrar a diferenciação através do pronome pessoal “eu”. A Rita apenas
utiliza o “tu” (o “tu” é a forma como o outro a chama). As crianças pequenas, numa primeira fase,
nomeiam-se como os adultos as nomeiam a elas, ou seja, com o “tu” (ex. ‘a maria que óh óh’). A Rita
não se vê a ela própria como um ser que é diferenciado.

73
É importante para a criança que os de fora (mãe) validem e reconhecem que o sentir e pensar,
que validem o sentir e pensar diferente deles. Bem como também é importante ter em conta neste
caso o facto de a Rita só querer comida mastigada, e quando está no hospital começa a comer mais
coisas duras. A anorexia desaparece e os alimentos que ela come são duros. É de realçar que a Rita
se interessa por personagens femininas, seios, etc.
Parece existir um desejo de morder e ela “acha” que não pode fazer isso, e há melhorias
quando ela passa a trincar e morder alimentos. Como se o morder fosse algo angustiante, pode ser
destruir o outro, pode ser suscitar a retaliação do outro. Quando ela percebe que morder não suscita
a retaliação por parte do outro, e isto permite-lhe a alimentar-se não entrando neste conflito “mandas
tu ou mando eu” com a mãe.
O desejo de a mãe ter uma companhia, de ter alguém que não a largue e que lhe dê sentido,
a forma como a gravidez foi vivida (a mãe não podia investir mas tinha de investir, perigo de morte),
a malformação da criança traz angústias intensas, e a mãe viu-se atacada e agredida (narcisicamente).
A relação da mãe com a criança, é assente numa mãe muito angustiada, a relação entre as duas é
fusional, indiferenciada e com um pai pouco presente. Porém de acordo com uma parte do texto é
percebido que a Rita obedece mais ao pai. Se a Rita obedece é porque tem mais medo de perder o
afeto. Existe uma preferência por parte do pai da Rita, em que ela prefere o pai, tem mais medo de
perder o afeto dele e, portanto, obedece-lhe mais.

74
6ª Aula Teórica (23 de Outubro)

Depressão na Criança (primeira infância)

Esta entidade clínica começa a ser descrita em relação ao adulto, e relativamente tarde na
psicopatologia. A criança deprimida não apresenta a sintomatologia clara que muitas vezes os adultos
apresentam e que nos levam a dizer que aquele determinado adulto está deprimido. Hoje pensamos
que o adulto pode estar deprimido e pode não apresentar aquela sintomatologia obvia (exemplo de
pensamento: não tem esperança no futuro, etc).
Na criança não é muito frequente uma sintomatologia tão explicita, para além de que,
inicialmente não se pensava que a criança pudesse estar deprimida. Todos nós olhamos para a nossa
infância como uma espécie de paraíso, se olhamos para uma criança e pensamos que ela pode estar
deprimida, podemos levantar uma hipótese sobre nós próprios: “Será que nós também eramos
assim?”. Todos nós gostamos de imaginar a infância como se fosse um tempo em que fomos felizes,
porém se calhar nem sempre foi bem assim.

Depressão Anaclítica (acrescentado de apontamentos)

Um dos primeiros autores a falar da depressão foi Spitz que descreveu a depressão anaclítica.
Spitz fala na depressão anaclítica que surge quando a figura de apoio para o desenvolvimento da
criança/ figura de vinculação da criança não está presente e como consequência a criança deprime-
se; é um tipo de depressão que surge muito precocemente. A etiologia desta depressão é a falta de
apoio, o que a diferencia de outras depressões que geralmente estão relacionadas com dinâmicas
internas (isto porque houve uma construção da mente e das representações mentais; Carreiras, 2017).

A depressão anaclítica origina-se então por uma falta de envolvimento afetivo e de relações
reciprocas que vão originar falhas na construção da mente do individuo. Caracteriza-se por um estado
de apatia maciça com recusa de contacto ou indiferença com o outro próximo, que ocorre depois de
uma fase de choros, comportamentos de agarramento ao adulto e gritos (i.e. fase de protesto). Depois
da fase de protesto há uma fase de desespero e esgotamento, que se pode caracterizar por
comportamentos anorécticos e de insónias. Spitz fala em paragens no desenvolvimento, regressão de
aquisições motoras e intelectuais e sensibilidade a infecções que podem levar à última fase, a morte
da criança (Mazet & Stoleru, 2003).

75
Depressão no bebé, segundo Renén Spitz – O autor faz a descrição da depressão do bebé, na
época, era mais ou menos o concebido pela ciência, o que e que o bebé precisava? Alimentação, bons
cuidados de higiene, regras (regramento no tratamento deles). O bebé da ciência conceptualizado era
visto como um “tubo digestivo”, comia evacuava e dormia. A teorização de Spitz decorre de estudos
longitudinais de observação direta, o autor vai para instituições observar bebés. E vai aplicar testes
de avaliação do seu desenvolvimento que dão o quociente de desenvolvimento.

Spitz apoiou-se na observação de bebés institucionalizados e vai para 2 instituições:

- Cresce (instituição para bebés de reclusas; boa instituição do ponto vista físico, alimentício e
de cuidados de higiene dos bebés. Eram bebés cujas mães estavam a cumprir pena, contudo
muitos desses bebés estavam com as mães até aos 6 meses de idade);

- Casa da criança abandonada (esta instituição acolhia bebés que as mães não queriam ficar com
eles e de mães sem condições para os tratar; boa instituição do ponto vista físico, alimentício e
de cuidados de higiene dos bebés. bebés que foram deixados na instituição assim que nasceram
mas que tiveram um breve contacto com a mãe durante a amamentação até aos 3 meses).

Spitz observava os bebés quando as mães partiam e deixavam os seus bebés nas instituições.
Usualmente nestas instituições não havia adultos suficientes para investir em todos os bebés e com a
frequência de investimento adequada, cada enfermeira tinha de cuidar muitos bebés. As crianças que
são entregues à instituição, por vezes quando era possível, apenas havia um acordo, em que as mães
concordavam em alimentar (amamentar) os seus bebés e outros que precisassem até aos 3 meses.

No decorrer do estudo de Spitz:


Do 1º mês ao 3º mês de afastamento da mãe do seu bebé, as crianças tornam-se:
- Chorosas (protestam e refilão);
- Exigentes;
- Apegam-se ao observador (quando um adulto demonstra atenção), elas tentam agarrar-se a eles.
Com o passar do tempo, como não há um adulto de qualidade para investir na criança, o choro
transforma-se em gemido, a criança perde peso e o quociente de desenvolvimento estagna. A criança
já não tenta investir. Tentam recusar contacto com outros adultos, permanecem de brucos nas camas
a maior parte do tempo, não dormem e têm insónias, continuam a perder peso e há maior incidência
de doenças (maior probabilidade de a criança adoecer), o atraso motor generaliza-se e instala-se uma
certa rigidez facial.
Depois do 3 mês de afastamento da mãe do seu bebé, a crianças apresentam:

76
- Rigidez facial consolida-se;
- Choro cessa e passa a haver lamuria (já não é apelo, bebé desiste);
- Atraso motor cessa e é substituído por letargia (bebés letárgicos – falta de energia);
- Quociente de desenvolvimento diminui;

→ A isto Renén Spitz chamou de Depressão Anaclítica, uma depressão por falta de apoio
(importante distinguir da depressão dita comum).
Este tipo de depressão surge por falta de uma figura de apoio (neste caso a mãe) uma figura
que investisse no bebé e que tivesse disponível para ser investida pelo bebé. O bebé não se está a
desenvolver, deixa de se interessar pelo outro, deixa de ter esperança e acaba por desistir. Adoece
com facilidade, há uma estagnação e posterior diminuição do quociente de desenvolvimento.
Se a mãe volta, há uma retomada do desenvolvimento, se a mãe demora muito a voltar (ex.
demora 5 meses) há sequelas na criança, mesmo que haja alguma retomada (tempo relativamente
curto). É um estado depressivo, porque não esteve presente uma pessoa para apoiar, um ser em
desenvolvimento no seu desenvolvimento, faltou o objeto de apoio.
Não há o desenvolvimento de laços com as mães e bebés na instituição casa da criança
abandonada, porém na cresce ainda há. Na casa da criança abandonada, os bebés, desde início, são
menos apelativos, mais letárgicos, existe uma maior incidência do adoecer físico e uma taxa de
mortalidade mais elevada em comparação com a população dita normal. São crianças com
desenvolvimento mais atrasado. – Hospitalismo. É um atraso mais avassalador do que o quadro da
Depressão Anaclítico. Estas crianças não têm um outro ser humano que as invista e para ser investido
por eles (bebés), e tal, compromete irremediavelmente o seu desenvolvimento.

Resumo estudo de René Spitz: Ele percebeu que nos bebés das mães aprisionadas, no primeiro mês
de separação, o bebé chorava e tentava chamar à atenção – tenta viver com outras pessoas aquilo que
viveu com a mãe. Como não consegue, porque as enfermeiras não conseguem investir em todos os
bebés, a partir do primeiro mês os bebés mostravam uma desistência - o bebé ficava deitado de bruços
em lamúria (choro pouco expressivo), ficando passivo, desistindo de criar vínculos. Como não há
adultos disponíveis, há uma quebra no desenvolvimento da criança, tendo então um sofrimento
interno que não é expresso (Carreiras, 2017) – trata-se assim de um estado de privação materna, de
um estado relacional ligado à perda do laço privilegiado com a mãe e do suporte que representava
para eles (Mazet & Stoleru, 2003). Enquanto na creche da prisão ainda havia algum contacto com as
mães, na instituição o único contacto com a mãe era através da amamentação até aos 3M. Aqui Sptiz
observou um quadro semelhante mas manifestava-se de forma mais grave com uma quebra intensa
no desenvolvimento – a que chamou hospitalismo, sendo que o problema não é a institucionalização

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em si mas o facto de não haver nenhum adulto para criar um vínculo com as crianças (Carreiras,
2017). Do estudo de Spitz, das 91 crianças que existiam na casa da criança abandonada, 34 morreram
no final do 2º ano de vida e 57 sobreviveram.

Para um bebé o seu desenvolvimento depende mais do que apenas os cuidados básicos de
higiene, alimentação e condições onde vive, é importantíssimo os laços afetivos e relação afetiva que
estabelece com o outro.

→ A luta antidepressiva pode exteriorizar-se em actings agressivos, defensivos de uma


conversão somática. Birras, provocações, impulsos destrutivos são também, no deprimido, defesas
contra a destruição interna (Zeahana, Anders, Seifer & Stern, 1989). Observou ainda que estas
crianças adoeciam muito mais que as normativas dos EUA e que a taxa de mortalidade também era
superior. Pode-se concluir então que a ligação com o outro (i.e. existência de laços afetivos) é muito
importante tanto para os aspectos biológicos como psíquicos do individuo. Pode-se observar uma
série de sintomas (relacionados com o desenvolvimento) nestas depressões, mas se foi conseguido
algum grau de desenvolvimento (ex. cognitivo, motor, etc) vai haver sempre défices afectivos porque
a criança não foi capaz de criar representações estáveis de uma relação com o outro, procurando
sempre uma relação que o ajude a se desenvolver – podemos ver este tipo de depressão nos
borderlines que procuram constantemente alguém que os apoie (Carreiras, 2017).

Esta mesma depressão (anaclítica), que consideramos que exista no sujeito borderline, pode
ser aplicado no adulto, que quando era pequeno lhe faltou esta pessoa em quem foi possível investir
de forma segura e que investisse também nele, hoje é uma pessoa perturbada e tem um diagnostico
de funcionamento borderline.
Na depressão anaclítica existe a falta de um objeto de apoio no seu desenvolvimento, já não
é depressão, se ao longo da sua história de vida, sentiu que tinha perdido o investimento de pessoas
importantes (objetos de apoio). Para construir em mim representações internas estável e de segurança
de outros, tive de as viver. Se eu não tive é provável que possa ter depressão anaclítica. Se até tive
nos meus primeiros tempos de vida, tive relacionamentos satisfatórios, então consolidou o mundo
interno, dentro dele conseguiu construir representações segurizadoras de pessoas que o apoiaram e
que lhe foram importantes. Mas ao longo da sua história o sujeito pode sentir que o amor e
investimento que tinha desses objetos foram perdidos. – Neste caso só chamamos depressão.
Na depressão anaclitica, observa-se a existência de algum relacionamento positivo e
satisfatório entre mãe e o bebe, mas não foi suficiente para que o que foi vivido ganhar e ser contruída
uma representação interna estável e segurizador para o bebe.

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O sujeito borderline precisa mesmo de um outro ser humano que esteja ao pé dele, que possa
desempenhar as funções de apoio que faltaram na sua infância. Procura um objeto que não tem
funções de adulto (função adulto: que vive no mesmo patamar, reciprocidade) e quer que esse sujeito
tenha a funcionalidade de apoio que não teve na sua infância, o borderline procura uma pessoa com
essas funções de apoio para voltar a ter o que tinha (já viveu algo de positivo, porém não o suficiente).

➔ Não procuramos o que nunca experimentamos porque não sabemos o que aquilo seria.
A criança deprimida, viveu relações relativamente satisfatórias, separou-se do ponto de vista
psíquico, constrói um objeto estável e segurizador, a partir de certa altura, na sua ótica de criança
(egocêntrica), ela perde o amor, e o amor que tinha como seguro é perdido.
É comum a depressão passar-se numa criança quando ela acha que perdeu o amor da mãe e/ou
pai, a criança fará (não precisa de ser consciente) uma leitura disto: é provável que a criança ache que
a responsabilidade é sua. Quando alguém que me deixa de tratar bem é razoável que eu fique triste e
zangada, o “zangada” é o que me pode mobilizar para saber o que se passa, se ficar apenas triste é
provável que me retraia. Se fico os dois e possível que me mobilize a pedir justificações, e tentar
esclarecer. É comum as crianças ( pode não se passar sempre) não sentirem zanga e só sentirem
tristeza e sentirem que elas são as única responsáveis pela perda de amor (tem a ver com ela), a criança
em vez de dirigir a sua zanga para quem a deveria dirigir, ela dirige-a para ela própria ( fui eu que fiz
o que não devia ter feito). A criança atribui a culpa e responsabilidade a ela própria.
Se eu for perfeita, eu tenho o afeto dos meus pais, volto a ter o seu carinho/afeto, não tenho
porque não sou - gerador de sofrimento para a criança. Se tiver sempre boas notas, se andar sempre
limpinha, se me portar bem – tenho o afeto. Fantasia de crianças: perdi o afeto do meu pai e da minha
mãe, dado a minha natureza, então o melhor para eles era eu não existir, visto que eu sou de má
qualidade. Tendência forte da criança se responsabilizar e culpabilizar, em geral as crianças idealizam
os pais, sendo comum na infância isto acontecer.
Porque é que será comum?
Quando somos pequenos somos absolutamente dependentes de outros (normalmente pai e
mãe) são eles que nos salvam, que arranjam casa, alimento, roupas, tratam de nós, salvam-nos e
protegem-nos. Para uma criança os pais são grandes, são uma espécie de deuses (omnipotentes) e
decorre da imaturidade da dependência e fragilidade da criança, e do facto dos adultos terem mais
poder e conhecimento. A crianças têm de sentir que os pais investem nela (o que importa é a ótica e
o ponto de vista da criança). O que importa é o ponto de vista e a verdade das pessoas com quem
trabalhamos.
Em geral durante a infância idealizamos os nossos pais, esta é trabalhada na adolescência,
pois é aí que se desidealiza os pais, e começa-se a olhar para os pais com olhos de ver. Esta idealização

79
tem a ver com a imaturidade, dependência, fragilidade da criança e com o facto de os pais serem
adultos. Existe uma parte defensiva nesta idealização, que está relacionada com as angústias
persecutórias (Mellanie Khlein), quanto mais ameaçado e em risco se sente a criança, mais precisa
que tenham alguém ao pé delas, que seja protetor para ela e com grandes poderes. Uma parte da
idealização tem parte de realidade e outra parte é mais relacionada com necessidades mais defensivas
da criança (mais grandes os pais, mais a criança se sente protegida na sua fragilidade).
Quando me culpabilizo (vantagem: se sou eu posso ter um controlo sobre isso) salvo os meus pais,
porque e isso é importante para mim, mantenho a idealização dos meus pais, e salvo-os, mas é à
minha custa, desvalorizo-me a mim. Quanto mais me desvalorizo, mais importante para mim são os
meus pais. A idealização dos meus pais (criança mais insegura...). a idealização é uma fonte de
estabilidade e segurança.
É mais fácil dirigir a agressividade para o irmão mais novo do que para os pais. Eu zangar-
me com alguém, tanto mais facilmente quanto eu tenho a certeza que está minha zanga e raiva não
vai destruir o outro, há um fundo de afeto que se mantém e que não vai haver uma retaliação por parte
do outro.
O mais normal é a criança sentir zanga e tristeza, e que esta zanga se mobiliza aos pais para
expressar e tentar perceber o que aconteceu. As crianças ao expressar a zanga na direção dos pais,
têm medo da retaliação e destrutividade da própria agressividade. A nossa cultura, é uma cultura
culpabilizante, a agressividade é muito mal tolerada, só há afetos positivos (o que não é verdade), na
nossa cultura judaica cristã. Quando nascemos já somos responsabilizados por algo que não fizemos
e que foram na verdade outros. Relativamente à educação das crianças estas são muito incentivadas
a não exprimirem sentimentos de zanga e raiva, não podem discordar, são mais passivas. A criança
perspetiva-se com uma menor autoestima, foi rica e perdeu, e culpa-se, ‘’fui má, mas se fosse perfeita
tal não tinha acontecido’’.

Acrescentado de Apontamentos:

Depressão Neurótica

Freud pensou a depressão enquanto uma experiência de perda de um objecto amado. Já Klein
considerou o fenómeno depressivo como o sentimento de ter destruído o objecto amado e uma
culpabilidade, bem como um fracasso nas tentativas de “reparação” do objecto. Sandler e Joffe vêem
a resposta depressiva como um estado de impotência, de desespero e de resignação face ao sofrimento
mental – é uma resposta na qual existe o sentimento de ser incapaz de encontrar um estado desejado
com uma atitude de retirada. Segundo estes autores, quando um objecto amado é perdido, não é só o

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objecto em si que se está a perder, mas também o bem-estar implicado na sua relação (Mazet &
Stoleru, 2003).

A depressão normal visa um objecto interno estável, mas cujos acontecimentos externos mexeram
com essa representação (ex. nascimento de um irmão) fazendo com que haja alterações no mundo
interno (i.e. a criança vai pensar que perdeu o amor de alguém significativo) tornando os objectos
internos menos amantes e geradores de sofrimento (Carreiras, 2017).

O bebé não consegue descentralizar-se e perceber que a perda da atenção que vive não corresponde
a uma perda de amor – a criança ainda não tem capacidades cognitivas para reflectir e tomar a
perspectiva do outro. Ao ser muito egocêntrica, tanto do ponto de vista cognitivo como emocional, lê
tudo à sua volta segundo exclusivamente o seu prisma. Enquanto adultos somos capazes de protestar
e mostrar o descontentamento que temos pela perda de atenção – através da tristeza e irritação. As
crianças podem não ter o afecto do outro como seguro, nem uma ideia de si muito valorizada, o que
as leva a que sentir tristeza mas não a irritabilidade e, portanto, não protestam perante o seu sofrimento
– não sentem que podem exprimir o que sentem porque têm medo de perder ainda mais o afecto,
atribuindo essa perda a si mesmos (Carreiras, 2017).

Por conseguinte, se este sentimento de perda de amor do objecto, ou mesmo se esta perda é
continuada, esta criança vai olhar para si mesma de forma negativa, a sua auto-estima vai ser muito
baixa. Assim, o narcisismo da criança vai ser seriamente afectado. Poderá pensar-se que existe uma
depressão se existir uma deficiência narcísica, uma vez que é o objecto de amor que alimenta
narcisicamente a criança; se esse objecto não está lá, o narcisismo é negativamente afectado
(Carreiras, 2017).

Temos então na depressão uma vivência de tristeza e uma gestão da irritabilidade dirigida para si e
não para o outro, salvando desta forma os pais à conta de si próprio, ou seja, a idealização dos pais é
mantida à custa da sua desvalorização e bem como a relação satisfatória do passado. Todos
idealizamos os nossos pais sendo a tarefa de “deixar” esta idealização na adolescência podendo ou
não ser concluída. Esta idealização tem uma base na realidade que é útil para o individuo, porque faz
sentir uma segurança interna, sendo, portanto, também uma defesa depressiva do individuo
(Carreiras, 2017). O mais frequente é a sintomatologia da depressão da criança não ser igual à do
adulto. A sintomatologia da criança é polimorfa e, portanto, é importante a intuição do terapeuta.
Winnicott considera a criança deprimida como aquela que não brinca.

81
A sintomatologia da criança depressiva:
o Não é comum ter uma expressão exuberante de desanimo e tristeza, normalmente a depressão
expressa-se de muitas formas como por exemplo: sintomas apoiados no corpo, de que a
criança não esta deprimida, mas que por exemplo é o insucesso escolar.
A intervenção terapêutica para uma criança deprimida, passa muito por a ajudar a sentir e encontrar
dentro de si e depois expressar as suas angústias. A criança tal como o adulto encontra tristeza dentro
de si, e dificilmente encontra zanga mesmo que esta exista. Aprender a expressar a sua zanga e
irritação e é isto que depois vai tornar possível olha o outro, não como um ser idealizado. Nem olhar
para si como um desastre humano.
A depressão na criança é polimorfa (sintomatologia diversa) não é muito comum a criança
ter uma expressão exuberante de tristeza e desanimo. Ao tentar encontrar a criança dentro de nós,
encontramos tristeza. Ter atenção na comunicação não verbal dos que nos rodeiam.
Tenho de estar convicta que acho que valho alguma coisa, se não penso que a partida penso que noa
tenho sucesso. Se eu acho que o mau pai e mãe não gosta de mim, como e que pode haver outros que
não são eles, gostam de mim?

Intervenção

No trabalho com a criança deprimida é importante tentar transformar o que é insatisfatório da relação
em satisfatório e, se não der, procurar investir noutras relações. Mas este novo investimento implica
considerar que vai ter sucesso e que o individuo tem algum valor. Assim é importante uma mudança
no valor da criança deprimida, sendo fundamental o trabalho a ajudar a criança a ter contacto com
a sua zanga para depois esta se poder expressar – desta forma há um olhar mais valorizado, uma
descarga emocional e um melhoramento na relação com os outros. É ainda importante fazer perceber
que a expressão da zanga não vai trazer retaliação ou perda de afecto – deve ser vivida esta expressão
com o psicólogo e trabalhar relativamente aos pares e professores e, só depois, com os pais. O jogo
simbólico é uma técnica importante, visto que a criança não consegue expressar da mesma forma que
o adulto e, assim, o jogo permite que ela expresse diversos aspectos pessoas na situação de jogo e de
brincadeira (Carreiras, 2017).

82
6ª Aula Prática (28 de Outubro)

83
Jovem de 12 anos, vem à consulta só com a mãe, o pediatra é que reencaminha e acha que não
esta bem, recomenda uma consulta de psicologia. Grande fadiga e dificuldade escolar. Rui é um
menino inteligente e com recursos intelectuais (não é problema cognitivo). Parece que falta gosto na
vida, o rui é carregado por um grande sentimento de desvalorização, sentimento de solidão (a partir
do que é dito pelo psicólogo), o rui acha que é mau, não tem esperança (não encontra um propósito)
sente-se um encargo para os pais (sente que pesa aos pais, há um sentimento de culpa, por frequentar
uma escola privada e esta ser muito cara). Dá a ideia de investimento na linguagem, mas depois tem
incompetência nos recursos, a custa de aspetos mais emocionais (?). Criança precocemente é adulta,
para cuidar de certos aspetos dos pais, e que tal tem um custo no desenvolvimento emocional. A
criança que hiperdesenvolve algumas áreas de si e porque tem recursos para tal.
O psicólogo afirma que o inquieta o sentimento, por parte do Rui, o sentimento intenso de
solidão, exclusão e desvalorização. Isto é percetível, por parte do psicólogo, é o eco do rui dentro
dele, a ressonância do outro dentro dele (psicólogo).(capazes de nos colocarmos no lugar do outro -
empatia) Neste caso é a minha capacidade de recriar o outro dentro de mim, de imaginar o vivido do
outro dentro de mim, imaginar o outro dentro de mim, quanto mais faco isso, mais consigo empatizar.
Tenho de ser capaz de recriar o outro dentro de mim, sobretudo no seu vivido interno (o que é será o
mundo interno do outro).
Nós, enquanto psicólogos, sentimos coisas e devemos ser capazes de refletir esses sentimentos
Psicólogo sente que a solidão percorre o rui, sente se excluído pelos outros, sente-se que está na
margem (de ser diferente). O rui não imagina um mundo melhor, como se o tempo tivesse parado.
Linguagem elaborada, interesse pelas maquetes, o mundo onde estou não é bom, é difícil viver, sinto
me excluído, então crio outro e refugi-o me lá. Esta mundo (maquete) é criado por ele próprio, podia
criar um refúgio com a ajuda de outros, mas o rui escolhe fazer uma coisa de ele com ele, não há
dependência em relação a outro (não conta com ninguém para fazer a maquete, cria ele próprio o
mundo isolado na maquete). O que será o espaço da maquete, o que é que ele fantasia?? O sítio para
onde ele foge, pode ser por exemplo um sítio específico para mim, ser um astronauta, pode ser um
refúgio. O rui pode procurar este refúgio para o seu mundo interno, uma criação que tem a ver com
algo que ele queria, onde fica fechado e retido do ponto de vista interno.
Hipótese levantada: Interessante saber o que eram as maquetes do rui, pode estar relacionado
com o isolamento do afeto, numa linha obsessiva, ausência de relação, algo que o rui constrói, cria
sozinho (sem contar com ninguém) onde não há relação com ninguém. A maquete seria uma coisa
fria e com ausência de relações.
A apreensão que ele faz é que os outros não tem espaço para ele e não se interessam por ele, ele sente-
se um peso para os pais (apreensão da relação com os pais) não se sentiu bem guardado na casa

84
(coração dos pais) e depois é generalizado aos outros, os outros chateiam-no (não há o encontro que
ele gostaria) então o melhor é noa ter relações.
Tudo o que implica relações com o outro é sempre imprevisível, não há controlo porque o outro é
imprevisível. Quando nos agimos sobre maquetes, temos um certo controlo.
Para o psicólogo ela construiu este discurso, este é o rui que ela constrói para apresentar ao
psicólogo, se ela para o psicólogo, não transporta o rui dentro dela, dando lhe um “retrato” do rui que
não é compatível com a realidade. Como será que o rui se sente na relação com a mãe? Onde é que a
mãe o tem guardado? O rui sente que não tem casa no coração da mãe. Ele descreve a família como
vivendo a margem, vivencia de ameaça, angustias de cariz persecutório, há sempre um medo de uma
futura catástrofe. A senhora não consegue processá-las e não há espaço para a criança. O sentimento
de solidão do rui, não encontra prazer na relação com os outros, se não encontra com a mãe como
será capaz de encontrar o mesmo com os outros? O futuro e horrível, nada corre bem, não há
esperança, vivencia dos problemas financeiros, esta mãe esta tao ocupada com isso que não houve
espaço para “interiorizar” o seu filho rui. Registo de sobrevivência e um apegar-se a estratégias
(trabalhar muito) para não se sentir a enorme angústia que o atravessa. Esta é uma consulta por causa
do rui, é suposto esta ser dirigida ao rui, mas no diálogo do pai, não houve conversa sobre o rui apenas
sobre ele. Ele ta tao preocupado, tem tantas lutas que o filho “passa a ser um problema menor”.
Negação do rui, não há rui no discurso do pai, podemos pensar que quando vai ao psicólogo por causa
do rui e não há, imagina-se que o rui não o se sente no coração do pai. Os pais estão cheios de
ocupações, preocupações e angústias, não há espaço, por parte deles, para desempenhar a função
parental porque tem um grande peso em cima, são frágeis e o próprio rui sente se como mais um peso
para eles.
Hipótese levantada: Evita falar dos pais, evita demonstrar agressividade para com eles
Angústia de não encontrar lugar dentro dos pais, pode ser uma forma de não entrar em contacto com
a agressividade em relação aos pais. De não sentir casa autêntica no coração dos pais, é razoável o
rui não gostar e que esteja zangado (pode ser inconsciente) relativamente aos pais. “a morte está muito
presente nos meus pensamentos”, há ideação suicida, o gesto suicida é muito agressivo para o sujeito
e para os pais (para quem esta a volta do sujeito) – auto e hétero agressivo. E pode ser que acha que
não o ouvem, que não há espaço para ele, que não encontra forma para falar (não vale a pena falar,
porque não é ouvido), não há eco nos outros em relação ao que se passa no seu mundo interno, esta
passagem para o ato suicida pode ser uma linguagem, uma linguagem pela ação. Haver uma esperança
que neste ato limite (suicídio) ele ser olhado e e imaginado pelos outros que o revoltam. Nalguma
fantasia ( inconsciente) pode ser munido de alguma esperança que os pais “agora vão olhar para mim,
vão perceber como estava mal, vão ver-me,...” é mais fácil falar da nossa zanga em relação aos que
não são tao importantes para nós, do que com os que são importantes para nós (pais do rui) são o

85
fundamento do mundo psíquico dele, acusar os pais pode ser fragilizar os alicerces do seu próprio
mundo psíquico. O Rui é um jovem com algum risco de suicídio, seria importante o psicólogo falar
com ele, e se percebesse que haveria um risco seria importante ter cuidados especiais como
medicamentos ou psicoterapia.
Alguma confusão entre divido a destrutividade e agressividade, má diferenciação (Relação
com a mãe perigosa, desembocando na morte de um dos pais). Porque é que a mãe é perigosa?
Jovem com grandes dificuldades relacionais, os outros não são percebidos com outros com quem ele
possa viver coisas boas e que lhe tragam coisas boas. Dai a sua oposição ao seu psicólogo (não espera
nada de melhor que na sua perspetiva esta habituado). Jovem que necessita de apoio psicológico.

86
7ª Aula Teórica (30 de Outubro)

Criança com Doença Crónica Grave


Existem doenças agudas ou episódicas (ex. gripe) e situações de doença crónica (doença
“fixa” /constante). Para facilitar pode se pensar que quando há uma doença, há uma realidade meio
concreta que se torna mais difícil e penosa, e depois há uma vivencia psicológica disso, sendo que
esta pode sobrecarregar esta realidade ( ex. mau estar corporal, uma criança que tem de estar
acamada). Uma criança na escola que está a aprender um jogo com os amigos e que esta muito
entusiasmada por tal, mas adoece e esse desejo é interrompido e suspendido. Uma criança doente fica
obrigada a uma certa passividade, e a criança pode viver/encarar isso bem ou mal. Do ponto de vista
psicológico podemos imaginar que a criança vai fazer uma leitura (podendo esta leitura ser
inconsciente) de tudo o que está a viver e o porquê do que vive. E o que está a viver, estas fantasias
podem ser culpabilizantes, podem ser regulizantes de angústias persecutórias, associado a um viver
da situação de doença que não é agradável podendo haver associadas fantasias que ainda tornem a
vivencia mais difícil para a criança.
A situação de doença aguda, doença num curto espaço de tempo, em que há uma realidade
penosa e frustrante com fantasias associadas que a tornam mais difícil, mas que a criança
eventualmente superará.
Na situação de doença crónica: tudo isto se mantem (a doença não passa), e tal pode ter
consequências mais ou menos nefastas no desenvolvimento da criança. Uma doença grave crónica
que surge nos primeiros anos de vida, pode dificultar a criança na conquista da locomoção,
desenvolvimento da sua autonomia, linguagem e até sociabilidade. Exemplo 1: Uma criança que
devido a situação de doença, está muitas vezes acamada, não vai puder exercitar o seu corpo nem
explorar o seu espaço (não se mexe nem explora) e tal pode ter repercussões no desenvolvimento
motor e cognitivo. Exemplo 2: Linguagem: Uma criança muito doente, com pais angustiados que
tentam proteger e cuidar dela para esta não sofrer. A linguagem desenvolve-se para que exista uma
forma de comunicação entre dois seres distintos, porém se esta criança estiver num estado fusional
com outro (mãe) a linguagem não se desenvolve (a mãe fala sempre a bebé). Logo esta doença crónica
pode desenvolver repercussões na criança e não favorecer o desenvolvimento da linguagem.

→ Considera-se uma doença crónica uma doença que não tem cura e que se alastra no tempo. Dentro
desta categoria existem doenças que são mais “aligeiradas” pelos avanços da ciência e outras que não.
Existem determinados processos terapêuticos que são extremamente agressivos para o individuo e
que podem até implicar algumas regressões (ex. deixar de andar). Com o diagnóstico de uma doença
crónica existe uma ruptura da harmonia vivida até então – o fim desta harmonia implica a elaboração
87
de uma perda, uma perda de um corpo saudável e uma perda de um filho saudável. Quer isto dizer
que a doença vai afectar tanto os pais como a própria criança (Carreiras, 2017).

Relativamente ao caso da professora, que fez um estudo de crianças com atrasos e problemas
no desenvolvimento: a doença apareceu muito precocemente (no primeiro ano de vida), crianças
sujeitas a muitos internamentos e cirurgias e tinha-se desenvolvido uma relação muito fusional entre
as mães e as crianças.
Uma criança pequena é uma criança que não tem a capacidade de entender o que se passa,
contrariamente a uma criança em idade escolar, um criança de 2 anos que é internada e privada do
seu mundo familiar (que lhe da segurança) é difícil a compreensão de uma criança comparativamente
a uma já com os seus 7 anos. A mais nova ainda não tem instrumentos psicológicos que lhe permitam
digerir e processar esses acontecimentos.
Exemplo: Uma criança em idade escolar já tem uma capacidade de compreender o qe se passa
a sua volta e no seu corpo, que pode facilitar a digestão do que esta a viver no entanto é provável que
esta criança se culpabilize pelo que se esta a passar com ela e com o seu próprio corpo ( perspetiva
egocêntrica – origem negativa em si mesmo), que atribua a culpa ao se ter portado mal e é possível
que perceba que a dinâmica familiar se alterou e que se culpabilize também por isso.
Maiores Capacidade linguísticas, maior apreensão real, maior compreensão do que vive e
procedimentos médicos, se for internada tem maior capacidade de lidar com a separação e de se ligar
a outra figuras (ex. enfermeiro), as crianças em idade escolar também abandonam progressivamente
teorias magicofenomenológicas o que permite lidar com a situação de forma mais adequada, mas se
tiverem de estar hospitalizada ou em casa fica privada do convivo com outras crianças da escolaridade
normal e possível que se sinta diferente das outras crianças ( pela negativa) e que se sintam mais sós
e isoladas e que reforce os laços de dependência dos pais e equipa terapêutica no momento em que
espera que ela não seja tao dependente dos mesmo. Podem reviver nelas situações traumáticas para a
criança vividas em anos anteriores.
As crianças podem ser capazes de virar algo negativo em positivo (ex. uma menina que tinham
8 anos, a doença tinha surgido precocemente, muitos internamentos e cirurgias, ela tinha as pernas
ligeiramente entortadas, cansava se a andar e ainda se deslocava de carrinho de bebés e frequentava
a escola. Menina doente muito frágil do ponto de vista físico, esta menina estendia o braço para os
outros meninos tocarem “eu dou choque veem”, tinha algo de positivo que os outros meninos não
tinham, e os outros meninos admiravam isso e tinham imenso cuidado com ela no recreio. Para a
criança ser capaz de viver o diferente pelo positivo ao invés do negativo, é necessário ter instrumentos
dentro dela que o capacitem e tem também a ver com o meio onde vive.

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Exemplo: menina que às vezes não ia a escola por ir ao medico ou estar mal disposta, depois
tinha dificuldade em ir a escola por medo de lhe perguntarem o porque de não ter ido anteriormente,
ela ficava desconfortável por não querer dizer que era doente (ciclo vicioso) que prejudicava os
relacionamentos com outros e aprendizagens escolares.

O que é que será que se passa, como generalidade, nos adolescentes?


O corpo ganha uma dimensão muito importante durante a puberdade, e um corpo doente é um
corpo “com defeito” é um corpo que não se gosta, e que se eu não gosto vou imaginar que os outros
também não gostam – problemática do corpo, muito importante durante o surto pubertário. Durante
a adolescência, a crítica às figuras parentais, é importante para autonomização e para a posterior
fortificação da personalidade.
Reforça os laços de dependência dos pais e equipa de tratamento pode dificultar o deslaçar do
adolescente as outras gerações. Há medida que o jovem desidealiza a figura parentais, valoriza as
figuras pares, ganhando um maior valor para ele. Podem ter dificuldades em inserir se num grupo e
desenvolver laços com eles. A problemática do corpo pode ser centra, eu não gosto do corpo, não
gosto de mim e os outros provavelmente também não gostam podem conduzir a um reforço dos laco
com pais e maior dificuldade de procura de apoio e reforço nos pares. Imaturidade no
desenvolvimento físico, jovens que se desenvolvem mais tardiamente o que pode reforçar uma
imagem negativa de si próprios.

Quando há um diagnóstico é comum os pais, as suas mentes não estarem reparadas para acolher
aquela noticia, ficam mais ou menos em choque e durante mais ou menos tempo, negam um pouco a
situação, assim e importante as noticias irem sendo dadas aos pais, repetidas vezes para o técnico
compreender o que e que os pais captam e integram sobre o que se passa. Enquanto vão digerindo a
situação e comum ficarem muito tristes, os sonhos caírem, reorganizar o projeto de vida com o filho,
culpabilizam-se (o que e que fiz de mal?) ou culpabilizam o outro (médico). Lógica interna de tentar
encontrar um sentido para aquilo que acham que é impossível ter sentido para eles, receio de morte e
condução a um desinvestimento e investimento. Para me proteger desta morte anunciada os pais
começassem a fazer um luto antecipado (desinvestimento) mas este não se mantém, tendo
repercussões na criança pois também sente isto. Pais culpabilizam se deprimem e pesa sobre a criança,
as em idade escolar já são muito capazes de sentir isto, e para aliviarem os pais, elas precocemente
tornam se muito capazes de tomar conta delas próprias do ponto de vista da doença. As crianças em
geral eram ótimos cumpridores da dieta e medicação de forma a aliviar os seus pais.

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Podem surgir no desenvolvimento das crianças, pode surgir um certo atraso provocado pela
situação violenta para a qual ainda não tem instrumentos para lidar com (imatura), contribui para
algumas repercussões no desenvolvimento.
Procura desenvolver estratégias, que sejam fonte de homeostasia dentro do meio estranho, violências
que vivera no corpo, estranhos que surgiram no seu quotidiano, isto e tudo angustiantes. E provável
que ela tente encontrar segurança (ex. voltar a usar chucha) estratégias que já tinham sido
ultrapassadas, voltam a ser utilizadas.
Podem existir repercussões no desenvolvimento, relações empobrecidas na realidade com o
mundo inanimado com os pares. Exemplo:. menina quando tinha 7 anos caiu, partiu os dois fémures,
teve de estar estendida numa cama durante vários meses. Não tinha convívio com outras crianças,
quais seriam as suas brincadeiras? Tinha um atraso do desenvolvimento, pobre relação pouco
estimulante devido a sua situação de doença, pouca relação com outros. Faz nos pensar em formas de
compensar isto. Esta menina nunca teve nenhum apoio da escola.
Na adolescência uma doença cronica grave, pode trazer dificuldades acrescidas na relação
com a imagem corporal, e um exacerbamento de um conflito de dependência/independência, como
gerir a autonomia em relação aos pais. Os pais podem ter dificuldades de estabelecer limites e
formular exigências às crianças e por outro lado, podem híper proteger as suas crianças. Os pais têm
de fazer um luto de um filho com saúde e é certamente muito doloroso para eles, ficam tristes e
culpabilizam-se ou arranjam objetos externos depositários de culpa, há um futuro sonhado que
necessita de ser reconstruído a partir de novos projetos com os filhos. Investimento e desinvestimento
(esperança e luto antecipado) coisa que a criança sente. Pais que fruto disto tudo têm dificuldade em
impor limites e formular/estabelecer exigências em relação à criança e por outro lado, podem híper
proteger a sua criança.
A criança/adolescente também tem de fazer o luto de um corpo saudável. Criança sente-se
excluído, marginalizado. → intervenção da equipa terapêutica, percebe-se que é fruto do que se passa
na escola (professora poe no fundo da sala a criança).
No decurso da criança os tratamentos que ela vive, é violenta? (muitos internamentos?) e a relação
com a equipa terapêutica?

A maneira como a criança lida com a doença e suas consequências, terá muito a ver como os pais
também lidam com a situação de doença do filho. Existem diferentes formas como a criança lida
com a doença. Cada criança reage à doença e aos tratamentos inerentes em função de uma série de
variáveis, que nomeadamente serão:
- a natureza da doença e a sua evolução (há doenças mais graves que outras);

90
- o nível do desenvolvimento da criança e idade (bebe, idade escolar, adolescente...) aquando
do surgimento da doença (diagnóstico);
- como é a estrutura familiar;
- a dinâmicas familiar;
- a união do casal parental;
- família alargada ou a existência de uma rede alargada de apoio;
- a natureza dos tratamentos e também a existência;
- a natureza da equipa terapêutica com que a criança convive.
➔ Depende essencialmente do meio envolvente da criança e da própria forma como os pais agem
perante a doença da mesma.

Enquanto psicólogos, no apoio a uma criança ou adolescente numa situação de doença grave crónica,
pode passar por ajudar a pessoa a viver da melhor forma possível com as condições e com aquilo que
tem. Há um trabalho o psíquico que podemos realizar no sentido de a ajudar a viver o melhor possível
com o que ela tem. No evoluir da doença a momentos mais stressantes (ex. cirurgia) podemos ajudar.
A preparar se para isso promover o desenvolvimento e autonomia da criança e apoiar os pais.
Importante que haja uma equipa terapêutica, que seja dialogante e contentora da criança e dos pais, é
importante que os elementos dessa equipa se falem e sejam apoiantes em relação seus elementos.
Nomeadamente durante muito tempo acompanharem os doentes, provocam sentires intensos por parte
dos técnicos e de boa saúde mental que se reunião para a própria equipa ser escutada e contida
(periodicamente) por alguém fora da instituição da área da psicologia. Acolhimento e transformação
do sofrimento (BION).

Acrescentado de Apontamentos:
Os pais

Também os pais precisam de fazer um trabalho de luto (i.e. um trabalho mental lento que permite
desenvolver mecanismos de adaptação à nova realidade). Perante esta “novidade” é legítimo que haja
um momento de choque e uma certa negação do sucedido – a negação implica um não trabalho de
luto que pode pôr em causa determinados comportamentos adaptativos (i.e. podem fazer com que não
sejam adoptados processos terapêuticos necessários pelo não reconhecimento da doença; Carreiras,
2017). Seja qual for a idade, as hospitalizações a que o individuo está sujeito e as separações que
ocorrem provocam uma grande de necessidade de amor e de segurança. Estas mesmas necessidades
continuam insatisfeitas quando os pais, por não conseguirem fazer o luto, não aceitam a doença
(Mazet & Stoleru, 2003).

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Os próprios pais desenvolvem estratégias internas para se protegerem. Uma dessas estratégias é
o luto antecipado – esta estratégia tem consequências para a criança porque consiste num
afastamento e desinvestimento por parte dos pais. Estes movimentos vão ainda gerar culpabilidade
que vão ditar, por si só, gerar mais movimentos de afastamento ou superprotecção (Carreiras, 2017).
A culpabilidade dos pais pode ainda advir de um sentimento de alguma responsabilidade pelo estado
de saúde da criança (Mazet & Stoleru, 2003).

É altamente provável que os pais se tornem mais protectores e cuidadosos. É bom que os pais
invistam na criança mas não de uma forma exagerada – um sobreinvestimento pode ter repercussos
a nível do próprio desenvolvimento da criança e da sua autonomia (Carreiras, 2017). Do ponto de
vista do desenvolvimento psicoafectivo, este tipo de reacções parentais pode incomodar o processo
de separação- individualização para manter um estado de dependência psicológica dos pais. Pelo
contrário, a angústia parental pode traduzir-se numa permissividade exagerada o que cria uma
ausência ou fluidez dos limites nas atitudes educativas e podem induzir perturbações no
desenvolvimento pulsional, em particular as tendências agressivas (Mazet & Stoleru, 2003).

A criança

Existem variáveis que podem ser cruciais para o atraso no desenvolvimento da criança:

a) evolução lenta e agressiva da família;

b) fracos recursos socioeconómicos;

c) a ruptura familiar.

Do ponto de vista da criança pequena, todo o processo de desenvolvimento pode estar


comprometido. A criança, com o diagnóstico, deve ser confrontada com angústias intensas com as
quais não tem capacidades cognitivas nem emocionais para lidar e integrar. Só consegue integrar e
trabalhar estas angústias a partir das capacidades dos pais de acolherem a criança. Contudo, devido
ao próprio choque dos pais, estes podem não conseguir lidar de forma adequada com as angústias da
criança, o que dificultará também o processo da criança. Com a doença, também as próprias trocas
linguísticas se tornam limitadas –os próprios conteúdos da linguagem ficam mais cingidos ao tema
da doença – apesar da relação de grande proximidade que os pais tendem a estabelecer com a criança.
Se os pais não concebem a separação, e uma vez que a linguagem é uma forma de comunicar na
separação, a existência da própria linguagem não é vista como necessária, o pode fazer com que a

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linguagem de crianças pequenas não seja desenvolvida ou, se a criança já falar, pode limitar o seu
desenvolvimento (Carreiras, 2017).

Se o diagnóstico for feito em idade escolar implica também que seja feita um trabalho de
luto por parte da criança – um luto do seu corpo saudável. Em idade escolar também existem
consequências tanto a nível do sucesso escolar como o próprio relacionamento com os pares. O facto
de, constantemente, a criança faltar às aulas ou de não poder frequentar sequer a escolar tem um
grande impacto no sucesso escolar da criança. Quanto ao relacionamento com pares, a criança tem
clara consciência que é diferente dos outros – que tem características que os outros não têm – o que
pode afectar a imagem de si e a sua auto-estima. A própria imagem de si fica afectada principalmente
pela consciência de que a dinâmica familiar fica afetada pela sua doença – algo que é gerador de
culpabilidade na criança. Muitas crianças tentam ainda aliviar os pais tornando-se muito autónomas
e capazes de cuidar de si.

Também na adolescência existem grandes consequências, apesar das capacidades cognitivas


que o individuo já tem. Na adolescência o individuo deixa de precisar do concreto para pensar, sendo
que o pensamento já pode ser abstracto sendo ainda omnipotente (i.e. tenho a vida pela frente e tudo
é possível). O diagnóstico faz “cair” a crença na omnipotência tão importante nesta idade. Os
adolescentes são geralmente péssimos no cumprimento das suas responsabilidades com a doença, isto
porque entram numa negação intensa pelo facto de pôr em causa a sua omnipotência. A própria
adolescência traz determinados “problemas” ligados ao corpo, que são agravados com o diagnóstico.
Existe um grande trabalho de luto a fazer do corpo infantil ao qual se adiciona o luto do corpo
saudável, e instala-se a dúvida relativamente ao amor que se receberá com este novo corpo. É
esperado também que existe a procura de novos relacionamentos – que implicam uma determinada
valorização do próprio e sensação de que foi amado. Sendo a doença ligada ao corpo, pode tornar a
relação com o corpo e, com os outros, complicada (Carreiras, 2017).

Intervenção

A forma como a criança lida com a doença depende da forma como os outros significativos
também lidam com ela. Quanto melhor estiverem os pais, melhor estará a criança. É necessário,
portanto, trabalhar toda a rede que envolve a criança (i.e. pais, escola, equipa terapêutica, etc.;
Carreiras, 2017) para a ajudar a viver esta nova condição da sua vida.

93
7ª Aula Prática (4 de Novembro)

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Penelope, desde que nasceu ainda não saiu do hospital, tem uma tez amarelada, cabelo rapado para
permitir o soro, barriga muito inchada (ventre muito inchado - desmesuradamente desenvolvido),
tem 2 tubinhos para aparelhos.
o Há um espaço vazio – não é colocado um nome, como se não fosse identificada. Isto coloca
fantasias: “ela não vai ficar aqui muito tempo”.
o Parece que não há investimento. Porquê? Não sabemos;
o Bata branca → procedimento médico.

Existe a ideia de uma mãe deprimida e triste, olha para o infinito, como se não tivesse objetivo
para pensar, como se não tivesse futuro.

Movimento sonolento, a mãe tenta agarrar a ocasião para interagir com a filha, quando a mãe diz:
“Que é? Que é?”, se faz estas perguntas é porque não sabe a resposta. Esta mãe perspetiva a sua bebé
como um ser diferenciado dela (diferencia-se dela), distinto e separado dela (a mãe não sabe) há uma
separação psíquica da mãe em relação à sua bebé. A mãe considera-se alguém importante para a sua
bebé. A mãe esta coloca-se num lugar interessante para a sua bebé. A bebé pode não reagir de maneria
como a mãe queria. A mãe tenta desculpabilizar a sua bebé por não ter vivido um encontro com ela,
fazendo uma racionalização (“por eu estar de bata branca, ele não de deve reconhecer, pois pareço
uma enfermeira).

Há uma gravidez muito desejada e muito investida, não foi logo imediata, mas esta senhora
sempre desejou ter filhos e ficou particularmente feliz por ser uma menina. Espera que quando a bebé
crescer seja como se fosse uma confidente, companhia (fantasias desta mãe). Também há uma ilusão
com o pai da criança. Há um processo de sonhar a criança, o filho, que é positivo. Há uma criança/bebé
que é sonhada, porém esta não é a bebé que vai nascer (nunca é), é comum as mulheres a seguir ao
parto, descreverem sentimentos de estranheza (pode ser devido ao estado de gravidez para o estado
de mãe, ou com o facto do bebe sonhado nunca ser o real). O bebé sonhado nunca é o que nasce, em
todas as condições (com e sem patologias). É através do conhecimento da criança (ex. trocar fralda,
dar de mamar), que é possível a mãe substituir o bebé sonhado pela mãe pelo real (que tem
incorporada as suas próprias fantasias e desejos). Ex. filme perfume.

Falta algo de humano na personagem, ama muito experiente, mas não se liga a ele, faltava
condições de humanização (bebé não sonhado). É importante um bebé ser sonhado pela mãe. O
diagnostico brutal do seu bebé leva a mãe a mergulhar e desinvestir no bebé, desinvestir os seus
sonhos. A bebé ainda não nasceu, não é vivido, esta mãe tem de elaborar a perda daquele bebé
saudável sonhado por ela, como é um feto, não é palpável não se vê. Vai culpabilizar-se no sentido
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de encontrar um significado para uma história que não tem lógica. Há uma oscilação de estados de
grande tristeza. Esta bebé com uma malformação é um ataque narcísico à mãe e suscita sofrimento e
movimentos angustiantes por parte da mãe (podem ser inconscientes).
Este investir e desinvestir faz parecer que existem pedidos em que investe e outros em que há um
certo desinvestimento (luto antecipado) para se proteger, a mãe acaba por não investir muito, pois se
investir muito também pode vir a sofrer muito (perda do bebé).

São os pais que não valorizam o sentido dos filhos, minam a capacidade de lhes dar crédito a si.
A bebé nasce e aparentemente tudo está normal, pode parecer que tudo ficará bem, esperança da mãe
tudo o que se passa dentro da mãe é um produto ….? O discurso da mãe é de incerteza, clivagem na
tentativa de se organizar (ou é mau, verdade o que os médicos suspeitam) ou é bom (não é verdade),
ela não diz para não tornar presente o que ela tem medo, nunca diz. não quer dizer o que sente,
presente no próximo espaço psíquico, ela nem sequer diz (o que se passa com a filha) para não se
tornar real. Esta mãe não torna presente no próprio espaço, é como se no próprio espaço psíquico não
houvesse por ser demasiado angustiante para suportar.
Existe uma repetição do falado anteriormente, na última fala da mãe ela torna-se presente a
culpabilização, para dar um sentido a tudo isto, pois ajuda a construir uma narrativa, auxilia a
organizar. A confusão da mente da mãe tem a ver com uma clivagem que não é suficientemente
organizadora, há uma angústia de morte intensa desta bebé, e ao mesmo tempo, há um desejo de que
a bebé morra para nenhuma delas sofrer porém isto não é aceite pela mãe, é angustiante para a mãe,
este desejo gera muita culpabilidade (não pode desejar a morte do seu próprio filho).

Quando está no hospital, está mesmo perto da filha e tem a sensação que pode fazer algo para
reparar. Gosta de ver a bebé acordada, a bebé acordada é uma bebé viva. Uma bebé de olhos fechados
que não interage, é uma bebé morta, uma bebé mais sonolenta e na fantasia da mãe uma bebé mais
próxima da morte.
Deambular tem a ver com a instituição, hoje ta num serviço e amanhã pode estar noutro, a
bebé passa por vários serviços no hospital, acaba por não ter a mãe perto dela e não tem apenas uma
equipa terapêutica para se apoiar, não disponibiliza da mesma equipa estável e coesa que lhe dê uma
orientação. Assim fragmenta o paciente, não o ajudando e acaba por nem o ver como um sujeito com
uma parte psíquica tendo também um determinado sofrimento. Este problema de instituição
desorganizada, fragiliza a mãe e torna tudo ainda mais difícil. Não há uma mesma figura constante
(equipa terapêutica). Não é bom para a bebé nem para a mãe, não havendo vínculos entre elas e a
equipa terapêutica, a mãe não se sente entendida, porque constrói uma determinada confiança com
uma equipa e depois salta para outra.

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Sonho da mãe que emerge, “já não é tão recém-nascida, é mais humana”.
A mãe corre riscos, tem medo de deslocar a agulha quando lhe pega ao colo, tem medo de
fazer mal a bebé e a ela própria, tem medo de se ligar a bebé, de investir na sua bebe e depois ficar
sem ela. Neste encontro a mãe ultrapassa isso, e domina a ligação com a sua bebé e as duas se
encontram, a mãe é capaz de acalmar a sua bebé e sente-se investida enquanto mãe e reconhecida
enquanto mãe. a bebé liga-se à mãe e é recíproco, havendo um vínculo estabelecido pelas duas, e
alimentado por ambas. Passa-se o que se passar no presente, vivem algo de bom o que alimenta tanto
a mãe como a bebe.

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8ª Aula Teórica (6 de Novembro)

Criança Irrequieta – Hiperativa


Crianças sempre em movimento, crianças que mesmo sentadas não conseguem estar quietas,
e não tem consciência que estão em constante agitação, dificuldade de concentração e atenção, e
difícil de tar paradas do ponto de vista motor e do ponto de vista de atenção. Por estas 2 razoes criam
algumas dificuldades aos professores, colegas e muitas vezes tem dificuldades de aprendizagem.
Cultura anglo-saxónica, crianças hiperativas.
Emílio Salgueiro – debruçou-se sobre “as crianças irrequietas”, utilizou esta designação em
oposição à criança instável, pois pode nos fazer pensar que é uma criança que umas vezes está de
uma forma e de outras vezes de outra. A criança hiperativa é como se lhe fosse dada uma designação
relativa à sua problemática que é comportamental, a criança que não está quieta é um sintoma, que
será a manifestação de algo. Este sintoma pode estar incluído em modos de funcionar mais graves e
menos graves, mais perto de um funcionamento neurótico ou de um mais perturbado (psicótico).
Se nós pensarmos as queixas relativamente à criança que não para quieta, surgem sobretudo
na escola básica, até lá em geral, as crianças não param quietas, a criança pequena é uma criança que
se mexe (período sensório motor – explora, sente e apalpa). Criança pequena parada é uma criança
que não está bem. À medida que uma criança se desenvolve e constrói estruturas básicas no
desenvolvimento da simbolização e do pensamento abstrato é de esperar que seja capaz de estar cada
vez mais quieta, mas cada vez mais em movimento mental (psíquico). O mexer físico é
progressivamente passado a um maior movimento psíquico.

Emílio Salgueiro considera que a criança hiperactiva é constante na sua inquietação e,


portanto, recusa a denominação de “instável” (atribuída pelos francesas) e sugere inquietação. Toda
a criança é irrequieta do ponto de vista motor passando a ser também do ponto de vista mental quando
começa a aceder ao pensamento simbólico, deixando os movimentos de ser assim tão importantes.
Estes sintomas de inquietação só são considerados como tal quando não for expectável que haja tanta
inquietação – mais comum na idade escolar, sendo que tem um caracter mais prejudicial nesta idade
pelos factores sociais associados (Carreiras, 2017).

Acrescentado de Apontamentos

- Etiologia:

Não têm sido encontrados aspectos do foro biológico que expliquem a hiperactividade. No
entanto, existem aspectos psicológicos. Pode-se distinguir vários graus de sintomatologia que podem
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estar mais associados à “psicose” ou à “neurose”, de acordo com a capacidade que o individuo tem
para lidar com a separação e com as angústias. Salgueiro considera que, na sua etiologia, a criança
irrequieta é percorrida por angústias/preocupações que não é capaz de metabolizar do ponto de vista
mental, isto é, está constantemente perturbada e não consegue processar e transforar estas
inquietações com seria de esperar, transformando-as em movimento (Carreiras, 2017).

A questão que se levanta é porquê é que a inquietação mental se manifesta a nível motor?
Quando nascemos não sabemos processar e transformar as nossas angústias. É na relação precoce que
aprendemos a conter e transformar as angústias e, por identificação à figura vinculativa, passamos a
conseguir fazer este processo sozinhos. Se na relação precoce há dramas, que não permitem uma
relação harmoniosa (quer por características da mãe quer do bebé) e fazem com que as angústia não
sejam acolhidas, processadas e transformadas, há um impedimento de o bebé aprender a fazer este
processo sozinho (Carreiras, 2017). Perante a teoria de Bion, pode-se teorizar que a mãe poderá ter
uma capacidade de Rêverie diminuída e, portanto, não poderá receber de um modo adequado as
preconcepções ansiosas do bebé.

A mãe deveria poder recebê-las, elaborá-las e devolvê-las ao bebé sem ansiedade, para que
este as pudesse aceitar e elaborar. Se o bebé não tem alivio: 1) as mensagens seguintes do bebé virão
mais carregadas de ansiedade, confusão e hostilidade; e ele não será capaz de aprender a se conter e
transformar as suas angústias; 2) e a mãe ir-se-á sentindo progressivamente mais incapaz de as receber
e enfrentar = entramos então num ciclo vicioso (Salgueiro, 1987). Desta forma, será então previsível
que a criança não seja capaz de pensar sobre as angústias que sente. Quando os adultos estão
perturbados são capazes de se conter emocionalmente e de pensar sobre o assunto que os perturba e
tentar encontrar soluções. Se o nível de perturbação for elevado já não são capazes da contenção e
acabam por ficar inquietos e com falta de atenção – são capazes de decifrar mas não de dar significado
ao que lêem e processam do mundo. Se a criança não é capaz de elaborar o que sente, por falta de
recursos, vai deixar-se levar por todas as angústias e vai ter de as transformar em algo com o qual
consegue lidar – o movimento (Carreiras, 2017).

Poderá ainda se apontar desajustes na percepção do corpo do bebé, que fazem com que os
sintomas de inquietude se expressem através do movimento (Carreiras, 2017). Segundo Spitz são os
estímulos externos que chegam à criança, principalmente através da mãe, que iniciam a consciência
do próprio corpo. Este processo envolveria a introjecção de uma imagem corporal construída a partir
das sensações resultantes do toque, do aperto, do olhar, das palavras, que daria origem a várias
respostas orgânicas e consequentes traços mnésicos (Riani, 2013).

100
---

Salgueiro, ao longo de vários anos, acompanhou 65 crianças irrequietas ou hiperativas/


instáveis, tinha um grupo de controlo que era constituído por 20 crianças paradas (o oposto das
outras). Crianças desde o 1º ano até ao 4º ano de escolaridade.
Irrequietude Grave
Hipótese levantada: “Origem precocemente na primeira infância, teriam acontecido desencontros
com a mãe”
Grande incidência de sintomas psicopatológicos de depressão e de um funcionamento
psicossomático, ou seja, existência de uma sintomatologia depressiva nas mães bem como de um
funcionamento psicossomático.
A Mãe depressiva é uma mãe mais centrada nela, tem mais dificuldade em desintoxicar o
bebé das suas angústias, desenvolver um papel contentor e processador das angústias do seu bebé.
Funcionamento psicossomático- remete-nos para dificuldades de mentalização, é uma mãe com
menor capacidade de rêverie. A mãe tem de ter uma função processadora (alfa) e pode ser mais alta
ou menos alta dependendo da capacidade de rêverie. A Interação entre a mãe e a criança é uma dança,
temos de acertar nos mutuamente, deve haver uma harmonia entre a dança dos dois. O ajuste do corpo
da mãe ao bebe e vice-versa, lalações.

Salgueiro propõe vários tipos de diálogos entre o corpo do bebé e o do adulto, que implicam
ajustes por parte do adulto às interacções do bebé e que podem estar a perturbá-lo:

Hipóteses: Há desajustes/desentendimentos precoces entre a mãe e o bebé, nomeadamente a nível da


“dança” entre o movimento e ajuste corporal do bebé e da mãe em:
- Diálogos ecopráxicos – diálogos motores (ajustes posturais e movimentos do corpo do bebé fazer
eco aos da mãe e vice-versa);
- Diálogos ecomímicos – diálogos mímicos (eco da mãe à mimica do bebe e vice-versa (dança da
mimica));
- Diálogos ecolálicos - diálogo das vocalizações (eco do bebe às produções vocais da mãe e vice-
versa). Ex. criança de 3 meses ao colo, o adulto acomoda o corpo aos movimentos do bebé, para que
este se sinta seguro.
O bebé tem a capacidade de se auto-organizar (ex. picar o pé do bebé na prova, e o bebé
desorganiza-se, vê se como é que ele e capaz de se organizar, uma das estratégias é colocar-lhe os
braços cruzados (auto abraço), pois contém e envolve). A mãe deve ajustar a sua própria postura para
que o bebé se continue a sentir confortável e seguro.

101
Alguns ajustes que têm a ver com a mãe (depressão), estes diálogos que não são vividos em
harmonia, quer de qualquer uma das ecocoisas (ecopráxicos, ecolálicos e ecomímicos).
Nomeadamente desfasamentos com diálogos ecopráxicos têm repercussões na representação
construída pelo bebé dos ajustamentos posturais da sua imagem corporal e dos ajustes da postura do
seu próprio tutor/cuidador. A mãe que não se adequa, do ponto de vista dos diálogos ecocoisos
(ecopráxicos, ecolálicos e ecomímicos) é uma mãe que não se oferece adequadamente acolhedora e
processadora das angústias do bebé.
Desajustes nos ajustes dos diálogos vai ter consequências: sobrecarregados com as suas
próprias angústias e por apropriação da função alfa da mãe, têm dificuldade em desenvolver a sua
própria função alfa, que o vai impedir de processar as suas angústias. Vai ter repercussões na
aquisição da função simbólica. Não conseguir transformar as suas angústias, vão contribuir para uma
sobrecarga o seu esquema corporal, da via motora. O próprio bebe não consegue desenvolver, por
interiorização da função alfa (a partir da mãe), a capacidade de manter e processar as suas próprias
angústias. Há uma sobrecarga de angústias que não foram adequadamente metabolizadas pela mãe
(capacidade de rêverie e função alfa deficitária) e o próprio bebé depois não se pode apropriar de uma
função alfa adequada, não sendo capaz de processar as suas angústias de forma eficaz.
Existem desajustes/Disrupções nestes diálogos podem ter repercussões no vivido do bebé, na
representação dos ajustamentos corporais, e nos ajustes do seu próprio corpo. Uma mãe que não
recolhe estes diálogos, provoca um problema no acolhimento e transferência das angústias do bebé.
O bebé fica com uma sobrecarga de angústias, que ele próprio não consegue processar pois não foi
capaz de desenvolver pela interiorização da função alfa da mãe.

Refere que os desajustes precoces nas ecocoisas, o que terá consequências por um lado
ficarem sobrecarregados com angústias e não serem desintoxicados pelas suas mães, e por
apropriação da função alfa materna, terem dificuldades na capacidade da criança conter e processar
as suas próprias angústias e repercussões na aquisição progressiva da função simbólica.

O esquema corporal, ajustes corporais do nosso próprio corpo e a construção de


representações de transformação ligadas a vivencia corporal, são adquiridas na relação com a mãe. A
sobrecarga da motricidade na criança, as dificuldades da criança de metabolização das suas angústias
vai sobrecarregar o seu esquema corporal (o físico), a criança não aprende adequadamente a ser capaz
de transformar as suas próprias angústias (ponto de vista mental) e estas (angústias) acabam por não
ser não desintoxicadas, contribuindo para uma sobrecarga da via motora (crianças irrequietas).

102
→ Desta forma, tem-se que as crianças irrequietas têm uma inquietação motora constante que traduz
apenas a sua impossibilidade de transformar as angústias que sentem (Carreiras, 2017).

Na relação com o outro são evidentes constantes movimentos contraditórios, ou seja, a


criança tanto tem movimentos de aproximação do outro como movimentos de afastamento que podem
ser explicados pelas angústias vividas pela criança. Quanto às angústias que Salgueiro aponta que
existem na criança irrequieta, pode-se recorrer às angústias identificadas por Klein podendo-se dizer
que existem dois tipos predominantes nestas crianças as:

Angústias dominantes nestas crianças, são essencialmente de 2 tipos:


• Angústias Persecutórias (isto é, ameaçadoras - relacionadas com o sentimento de ameaça,
ricos e perigo de ameaça, ser perseguido);
• Angústias Depressivas (isto é, hipotéticas perdas de amor - vivencia de risco de perda, ficar
sozinho e desamparado).

Apoiando numa perspetiva psicanalítica, decorre daqui, e como se a criança não tivesse podido
construir internamente um objeto ou a representações de relações acolhedoras, transformadoras e
geradoras de confiança. Não vive na relação com a mãe, de acordo com a vivencia do bebé, a relação
com a mãe, não será possível construir dentro dele representações de relações acolhedoras com o
outro que sejam geradoras de confiança, esperança e segurança (ou objeto interno estável e
segurizador). Isto é a base para a construção psíquica que permite formar uma separação psíquica e a
delimitação do meu espaço psíquico “eu sou eu e o outro é o outro”, o que me permite perceber o
limite interior e o exterior(permite perceber o que são as minhas maluqueiras interiores, e o que se
passa no exterior). Posso me sentir triste e ameaçada, mas se tiver um espaço psíquico delimitado
segurizador, sou capaz de lidar com isso e consigo compreender que o mundo á minha volta não está
triste.
É a partir da interiorização de relações segurizadoras que me permitem construir um objeto
segurizador, de forma a conseguir a delimitação de um espaço psíquico e o desenvolvimento do
pensamento simbólico (representar um objeto, ser capaz de encontrar coisas boas dentro de mim que
me permitem metabolizar a ausência).
103
É fundamental para a possibilitar a capacidade de me ver e lidar com a separação psíquica, é
básico que eu tenha construído dentro de mim um objeto estável e segurizador, se me vir separada do
outro, significa que tenho um espaço psíquico bem delimitado e que nesse tenho conteúdos dentro
desse espaço em que não há mistura nem confusão com o mundo externo nem com os outros à minha
volta e é possível perceber o que está dentro e o que pertence ao exterior.
Só posso empatizar (vivido do outro) com o outro, tal passa por me percecionar como um ser
diferente de mim.
Criança com muita angústia sem estruturas de processar, o objeto estável e segurizador é formador
de angústias, e a separação psíquica está comprometida.

Acrescentado de apontamentos:

É expectável que a criança ponha fora de si as angústias persecutórias alias, é altamente


provável que as coloque no outro com quem interage – assim esse outro deixa de ser só positivo
passando a ter também conotações negativas/persecutórias e, portanto, é normal que exista um
afastamento. Depois de ter projectado as angústias persecutórias, sobra-lhe as depressivas. A criança
é então invadida por agustias depressivas e, portanto, é normal que se aproxime do outro para
dissipar esses sentimentos (Carreiras, 2017). É normal que as angústias persecutórias reapareçam e
que volte a afastar-se. Estes movimentos de aproximação e retirada mostram a tentativa de o individuo
regular o seu estado interior – como se andasse à procura de um objecto que seja capaz de
transformar essas angústias (Salgueiro, 1987). A criança irrequieta é percorrida então
dominantemente por estes dois tipos de angústias que, por falta de recursos, não tem a capacidade
para as processar, isto é, não conseguiu construir um objecto interno estável e securizador que a
ajuda a transformar estas angústias que vive. Já a teoria da separação- individualização de Mahler
permite teorizar que a irrequietude na criança poderá corresponder a uma separação psicológica
prematura, muito à frente das suas capacidades de individualização, devido a vicissitudes na relação
com o objecto de amor primário. Esta separação dificultará gravemente a travessia da etapa de
reaproximação (Salgueiro, 1987) o que resultará, como dito anteriormente, em movimentos tanto de
aproximação como de retirada (Carreiras, 2017).

Poderá encontrar-se um apego a materiais inanimados pela criança. Este investimento poderá
ser explicado através da clivagem forçada de Bion. O bebé recebe leite e outros confortos materiais,
mas também amor, compreensão e alívio da mãe/seio. Se o bebé se assustar com o seu próprio ódio
para com uma mãe insatisfatória, poderá inibir o seu impulso para se alimentar. Só o medo de morrer
poderá levar o bebé a voltar a alimentar-se, mas isto implica uma clivagem entre a satisfação material
e a satisfação psíquica. Esta clivagem vai permitir ao bebé receber confortos materiais sem ter de
104
reconhecer a existência de um objecto “vivo” de onde estes vêm. Assim, sentido como impossível a
satisfação da sua necessidade de amor, esta necessidade será transformada numa procura sem fim de
confortos materiais. Estes objectos servirão ainda como neutralizadores das ansiedades da criança
sendo, contudo, sempre insuficientes porque neles acaba por ser projectado o ódio pela figura materna
(Salgueiro, 1987).

---

Margaret Maller
Criança que não atingiu a penúltima subfase. Não atingiu a substância objetal.
Na sua relação com o outro, se não há uma separação psíquica (se não existe uma separação
suficientemente boa do outro, do ponto de vista psíquico) quer dizer que quando em relação com o
outro, é provável que o outro seja depositário das angústias da criança. Ex. metáfora da casa: casa
com espaços das janelas abertas, o que se passa na minha casa, se tiver grande ventania esse vento
sai de casa para fora.
A criança coloca no outro pois há uma certa confusão entre ele e o outro. Angústias
persecutórias, perigo e vivencias de ameaça, é provável que a criança deposite (fora dela) no outro
estas angústias persecutórias, e este outro se torne/vire o objeto mau, persecutório e ameaçador. Se
coloco no outro uma ameaça, é provável, do ponto de vista do movimento, que crie um afastamento.
Mas se eu não tenho dentro de mim um objeto estável e segurizador, quando me afasto não me sinto
bem, e sinto me desamparada, deixam de ser angústias persecutórias sentidas e passam a ser angústias
depressivas (estar sozinho). Assim a criança não consegue processar estas angústias depressivas e
tenta procurar outro objeto, através do movimento aproxima se de outro objeto, que à partida lhe
possa dar alguma segurança. E é provável que se volte a repetir pois a criança não é capaz de processar
ambos os tipos de angústias, e coloca a angústia persecutória no objeto (que se aproximou) e assim
sucessivamente- movimentos incessantes e irrequietos da criança. Está sempre a afastar-se (objeto
depositário das angústias persecutórias - ameaça) ao afastar-se defronta-se com angústias depressivas
(movimentasse/desloca-se para tentar afastar estas angústias) e acaba por se aproximar do objeto, e
assim sucessivamente.
A mãe não foi capaz de gerar confiança e segurança e é como se ela tivesse uma ideia de que
isto se repete em todas as pessoas próximas à criança. O que explicaria o movimento incessante da
criança irrequieta. Utilização da via motora como via de descarga das suas angústias.
Para a ultrapassar esta inquietude, seria ideal/deveria existir o desenvolvimento de estruturas
internas contentoras e processadoras de angústias bem como o desenvolvimento pensamento
simbólico.

105
Eu estar sobrecarregado com angústias persecutórias e depressivas, constantes, para sermos
capazes de metabolizar estas angústias, temos de ter dentro de nós objetos (função alfa) geradores de
segurança e esperança.
O mau desempenho académico, a dificuldade a nível da leitura e interpretação de textos,
desenhos, o que tem a ver com dificuldades no desenvolvimento do pensamento simbólico, e
comprometo o desempenho escolar mais do que o que é apontado como dificuldade de concentração.
É importante para a criança puder ir desenvolvendo estruturas dentro dela metabolizadoras de
angústias, devem existir intervenções contentoras, que ponham limites e que sejam contentoras e
acolhedoras das suas angústias. É importante (do ponto de vista escolar) que as crianças estejam
inseridas em turmas não muito grandes e cujos modelos educativos sejam flexíveis (não muito
rígidos). É importante também estabelecer limites de organização, mas também uma flexibilidade e
compreensão para haver um ambiente escolar de confiança e segurança para progressivamente ajudar
a interiorizar esta metabolização de angústias feitas pelo mundo exterior. O trabalho individual junto
da criança é importante (mediante a severidade da inquietude da criança).
Este movimento constante (agitação constante) é a solução para se reabilitar do ponto de vista
narcísico, tenta escapar das angústias persecutórias, afasta-se, é invadida por angústias depressivas,
movimenta-se para chegar a outros objetos – solução de reabilitação do ponto de vista narcísico, é
uma solução reequilibradora do ponto de vista narcísico. É útil nestes casos: psicoterapia, trabalho
com a criança e apoio escolar.

Acrescentado de Apontamentos:

Intervenção

Este tipo de crianças necessita de uma intervenção em rede junto de todas as estruturas. O
próprio terapeuta será alvo das angústias persecutórias, o que dificulta o processo. É importante tornar
a criança capaz de conter e transformar as suas angústias (Carreiras, 2017). Só depois de uma relação
de confiança se ter estabelecido e consolidado haverá uma retomada nos processos de maturação
paralisados, possibilitando modos mais complexos de pensamento. E assim a criança aprenderá a
pensar as suas ansiedades, em vez de as transformar em “passagens-ao-acto” permanentes (Salgueiro,
1987). Podem existir, na vida da criança, outras figuras protectoras que sejam contentoras e possam
prosseguir com o processo terapêutico (Carreiras, 2017).

106
8ª Aula Prática (11 de Novembro)

107
108
Eminem is praying for u.

109
Existe uma grande ansiedade nesta mãe, tem receio por causa da primeira gravidez. 2º
gravidez: tem ansiedade, pois existe uma ameaça de aborto e tem de estar de repouso durante algum
tempo (maior parte da gravidez), a ansiedade dela foi confirmada, esta mãe fica com uma carga de
ansiedade. O bebé nasce com 8 meses, com o cordão umbilical enrolado ao pescoço, pode haver
algum risco e é lhe dado oxigénio, fica 2 dias numa incubadora. As coisas até correm bem, é expetável
que a mãe fique com uma carga de ansiedade emocional, a mãe quando volta para casa, volta com o
seu bebé.
É um bebé muito investido, é uma criança muito desejada por todos. Mas este bebé está
sempre a chorar, tem dificuldades em ser acalmado pela mãe, há falta de momentos em que o bebé
está disponível para a interação e bem-disposto para tal.

Hipótese levantada 1: Bebé de 8 meses, bebé mais imaturo, provável que ele tenha menos capacidade
de auto organização,
Hipótese levantada 2: Ansiedade da mãe não a tornar disponível para o bebé.

A ansiedade torna difícil ter um espaço dentro de nós para apreender e carregar a pessoa,
quando estamos nervosos ficamos menos atentos e sensíveis ao que se passa a nossa volta. Mãe
Intoxicada com a sua ansiedade e tem dificuldade em ter espaço livre não saturado para receber os
conteúdos do seu bebé e processá-los para os devolver ao bebé processados. Esta mãe está carregada
em elementos beta, para depois processar os do bebé e transformar em elementos alfa para devolver
ao bebé. Função alfa da mãe está sobrecarregada e entupida, não tem capacidade de acolher os
conteúdos do bebé e de os devolver de uma forma suportável para este. A mãe sente-se ela própria
incompetente como mãe, incapaz de organizar o seu bebé e insegura. Quanto mais se sente assim,
menos capacidade tem de ajudar e acalmar o bebé, e a ansiedade aumenta e assim sucessivamente.
Mãe carregada por angústias de morte, tem medo que o bebe morresse, e que ficamos a
imaginar que não conseguia processar e acolher as angústias primitivas do seu bebé, a mãe além de
não processar os conteúdos do filho ainda o sobrecarregava com as suas próprias angústias.

Hipótese levantada: É frustrante para a mãe não ser capaz de o ajudar, então, esta tem um movimento
projetivo do que a mãe tem de desagradável dentro dela para o seu bebé.
É através da relação com a mãe e da relação com o bebé que é possível metabolizar as angústias do
bebe. Esta mãe tem dificuldade em fazer isso e o bebe fica mergulhado nas suas próprias angústias e
acaba por ficar sobrecarregado também com as da sua mãe. A mãe tem um medo contínuo de que
algo possa acontecer e que o seu filho morra. É uma mãe invadida por angústias persecutórias, onde
há uma ameaça ou risco do filho puder vir a morrer.

110
Outros tipos de angústias:
- Angústias depressivas (abandono)
- Angústias confusionais (confusão, sujeito invadido por confusão esta desorientado)

É expetável angústias dos pais de primeira vez. Podia ter sido benéfico esta mãe ter tido um
apoio de forma a poder ficar mais desintoxicada.
A mãe deixou de ralhar ao seu filho, com medo de lhe causar um novo espasmo “aí que ele
não pode ser contrariado, não pode chorar”, pensa-se que tem uma grande dificuldade de impor
limites ao seu filho, no entanto uma criança não pode ser sempre satisfeita. O pensamento da mãe:
“Se ele tiver outro espasmo e morrer, eu provoquei a morte dele”, a mãe culpabiliza-se pela possível
morte dele. Este não impor limites dificulta a estruturação da criança, ela tem dificuldade em
introduzir-lhe o princípio da realidade e da diferenciação, “eu sou eu e tu és tu”, espaços psíquicos
diferentes e dissociados. Contribui para a dificuldade do João da separação do ponto de vista psíquico.
Aos 2 anos o João falava com fluência, os dados da realidade poderiam contribuir para a mãe
ficar menos ansiosa, porém isso não acontecia. João tinha dificuldade em estar focado, durante algum
tempo, numa relação com alguém ou com algum objeto. O João dentro dele, como esta relação com
o cuidador, é difícil uma separação psíquica e é difícil consolidar objetos segurizadores. Ele próprio
está sempre invadido por angústias persecutórias que põe nos seus objetos/pessoas, e depois não
consegue estar muito tempo com eles. É como se esses objetos ganhassem a tonalidade do que ele lá
coloca, sendo o objeto depositário de angústias persecutórias, tornando-se posteriormente
persecutório/mau/angustiante, então o João afasta-se dele e posteriormente necessita de se aproximar
de outro.
É como se o João não tivesse limites e procurasse limites. Esta mãe que não é de confiança (a
mão dela não é de confiança), existe alguma provocação (afasta-se depois vem a procura dele).
Manifestações de omnipotência do João. Á medida que as crianças crescem a omnipotência vai se
perdendo e as crianças vão elaborando a omnipotência – apreende a realidade e aceita-a (não é tudo
como eles querem), para tal é importante a mãe (winnicott) adequar o seu comportamento. A
omnipotência é o reverso da fragilidade. Quanto mais frágeis somos, mais precisamos de estratégias
que nos ponham a funcionar no registo maníaco (para uma criança dependente e frágil a sua fantasia
seria de omnipotência). Uma mãe qua não impõe limites, impõe dificuldades do João de aceitar e
apreender a realidade à sua volta, facilitando a omnipotência do mesmo.
Ao longo do caso é percetível, pelo texto, a existência de uma suspeita de epilepsia, o João
foi medicado, no entanto, o comportamento não melhorou e veio-se a descobrir que não havia
problema nenhum do foro neurológico.

111
A mãe teve um segundo bebé, quando o João tinha 4 anos, este 2º bebé nasceu prematuro (7 meses),
com malformações e acabou por morrer engasgado (passado 21 dias): um bebé cuja razão da morte
era engasgamento, pode ser persistência das angústias da mãe (grande medo tóxico da mãe), a mãe
acha que o seu bebé morreu engasgado, pode ser uma interpretação da realidade feita pela mãe
(fantasmas da mãe). Possível sobreposição da interpretação da realidade da mãe ao que foi
verdadeiramente dito pelo médico (real razão da morte do bebé).
A mãe é invadida por angústias, que depois são confirmadas nas suas complicadas
gravidezes, possível existência de problemas biológicos que dificultam as gravidezes. Na sua mais
recente gravidez, existem novamente ameaças de aborto, mas nasce uma menina prematura e com
anemia. Tudo isto acaba por aumentar as ansiedades desta mãe (angústias correspondidas).
Receio da mãe que os filhos se engasguem, persistência de um tema: morrer engasgado. Pai
assume um papel ausente, e a mãe um papel central. Pai passivo que poderia ter um papel contentor
das ansiedades da mulher e impor limites e regras, mas não o faz.
O comportamento inquieto intensifica- se na presença da mãe e na escola é mais organizado,
comportamento mais em resposta à relação com a mãe. Criança gravemente irrequieta, mas não de
grande gravidade ao ponto de dificultar a aprendizagem. Pode não ter muita atenção, mas apanha as
coisas e apreende, sabe sempre a resposta certa.
E é percetível que a professora com tolerância á irrequietude, não é muito rígida e que suporta
e tolera a irrequietude do João, esta acaba por sentir-se narcisado e valorizado pela professora. Não
tolera a proximidade da mãe, comportamento/atitude defensiva da parte do João. Vive a mãe como
objeto gerador de ansiedade, não permite a ansiedade e defende-se afastando-se da sua mãe.
Esta mãe está constantemente carregada de ansiedade (vai ver se o filho atravessa a passadeira
bem, para ver se ele não morre). Há muitas queixas somáticas da mãe, a mãe tem dificuldade na
mentalização, há alguma ou pouca capacidade de rêverie e isso contribui para a não desintoxicação
das próprias angústias, nem das dos filhos.

Hipótese levantada: os objetos com que ele interage ficam rapidamente contaminados com angústias
persecutórias, quando se afasta procura um novo objeto depositário (destas angústias), esta é a
estratégia utilizada para se reequilibrar.

Trabalho terapêutico para ao ajudar com as suas angústias, de forma a que este seja capaz de
tolerar as suas angústias, de se perspetivar mais separado e diferenciado no sentido psíquico e
transformar a irrequietude física em psíquica.

112
9ª Aula Teórica (13 de Novembro)

Na criança autista e na criança psicótica, nunca há um diagnostico antes dos 2/3 anos,
nomeadamente na criança autista um sintoma é o facto de esta criança não ter linguagem, daí so puder
ser diagnosticada depois dos 2/3 anos pois a linguagem só é adquirida nessa altura.

Como é que aquela criança a funciona no geral? Algo de grave se passa com a criança?
Devem se ter em conta vários índices:
Presença de insónias precoces e graves pode ser um dos sinais, uma criança muito pequena que não
dorme nada. Existem 2 tipos de insónias, as insónias graves agitadas (a criança manifesta o seu mal-
estar agita-se e reclama) e as insónias graves silenciosas (reflete como se a criança desiste de pedir
socorro).
Índices inquietantes têm a ver com o não surgir os primeiros organizadores da psique,
descritos por Spitz como sendo o surgimento do sorriso e o surgimento do que é nomeado como a
angústia do estranho (desconforto perante o rosto do estranho, aparece aos 8 meses de vida) se a
criança que não revela um desconforto ao estranho pode não ter construído dentro dela uma
representação de algo positivo que vive com a mãe, e do desconforto de algo que lhe é estranho (rosto
do estranho) como se já houvesse uma organização do bom e mau, seguro e não seguro. Índices:
criança quando e espectável não sorrir e não apresentar a angústia do estranho.
Outros índices são as insónias, não manifestar uma atitude antecipadora do ponto de vista
postural, movimento corporal adequado em resposta ao do adulto (ex. bebe levantar os bracinhos para
ir para o colo da mãe).
Relação de familiaridade com o cuidador, criança que vai para o colo de qualquer um, pode
significar que não construiu uma relação de familiaridade com o cuidador. É expetável que a criança
tenha uma preferência pela mãe.
Ajustamento postural, relativamente a antecipação, índice se a criança vai para o colo de quem
e significativo para ela, mas não se ajusta ao colo dessa pessoa, a criança fica rígida no colo. O não
manifestar o ajustamento de antecipação, parece não encontrar conforto no colo dos pais tem
repercussões no colo dos pais, não se anexa/aninha no colo dos pais, os pais não se sentem
reconhecidos como pais (reações em cadeia).

Índices: perturbações muito precoces e intensas do ponto de vista da alimentação: bebé que
recusa o peito, anorexias e bulimias. Tem repercussões no vivido da mãe, conflitos com a mãe
(anorexia).

113
Outro índice: em geral até aos 6/7 meses, o estímulo mais interessante é o ser humano, a partir
dessa idade é suposto a criança demonstrar interesse por objetos inanimados (brinquedos) se não
demonstrar pode levantar inquietação, pode estar desinteressado do mundo a sua volta. Demonstração
de um interesse grande pelas suas mãozinhas
Outro índice: crianças pequenas que manifestam desorganização, pânico quase fobia a objetos
que lhes são familiares, desde reações de pânico aos ruídos de objetos de casa (aspirador) ou mais ou
menos familiares (brinquedos de peluche, balões) deposita algo de terrivelmente assustador para.
Criança.
São vários? Depois de olhar para a criança e família, há algo que não corre bem?
Devemos intervir junto da família, para evitar coisas piores que se instalem, em prol da saúde mental!
É necessário ajudar os pais a serem pais daquela criança, criar condições para os pais serem apis
daquela criança e a desempenharem a sua função parental. Temos sempre de trabalhar com os pais e
crianças.

Podemos pensar em certos aprenderes básicos que tem a ver com certas categorias, que
propiciam a sua organização psíquica, o que é bom e meu, o que e o presente e o ausente, bonito e
feio, bem estar e causa mau estar, interior e exterior, amor e odio, verdade e mentira, gratidão
(construtiva) e inveja (destrutiva), passado e presente, mais velhos e mais novos, feminino e
masculino..... Categorias básicas para a organização psíquica da criança
Há muitos aprenderes fundadores, no seio das relações fundadores, aprende estes aprenderes e são
básicas para a sua organização, se há falhas nestes aprenderes pode dificultar a aquisição de outros
aprenderes (não fundadores).
Para estar bem na escola, tenho de estar bem acompanhada por dentro, não estar invadida por
terrores para ser capaz de estar noutro espaço, ter construído que outro espaço pode ser bom para
mim. Uma mãe não deve retaliar, a criança diversifica os seus investimentos com outras pessoas, a
mãe deixa de ser tao investida, é necessário que a criança tenha ideia de que apesar de abandonar a
mãe que esta esta disponível sempre
quando volta a casa, a mãe não retalia e fica
contente com este movimento evolutivo da
criança. Importante a criança ter a ideia de
que o que ele deixa, fica bem na ausência
dela, não há retaliação, há satisfação e que
quando volta continua disponível e tudo
está bem (bem acompanhados). É
importante nesta relação com figuras

114
significativas, estes ficarem satisfeitos com as suas capacidades de explorar e descobrir outros e o
mundo e outras relações, o pai e mãe transmitem alguma confiança e esperança ( pode viver coisas
boas, mm que no primeiro momento não viva coisas boas, isso pode ser transformado, importante
que os pais lancem a semente da confiança e esperança na mente da criança, se não houver coisas
boas estão lá os pais para a apoiar e essas coisas podem ser transformadas em boas). É importante
que os pais gerem confiança e esperança nos filhos, é importante os próprios pais terem também
confiança e esperança. Pais ansiosos transmitem uma ideia de um mundo fora de casa perigoso e
assustador, que não pode ser transformado caso seja mau no primeiro momento.
Consciência do que eu não sei, como e que e vivido por mim eu ano saber? se for vivido por
mim o facto de eu não saber como uma falha narcísica, então fica difícil para mim aprender. Para eu
aprender tenho de ter consciência de que não sei, e esta não pode ser gravosa para mim, se for gravosa
na quero entrar em contacto com ele e dificulta eu querer aprender. Pode ser vivido como algo muito
angustiante (imagem de si próprio “sou um falhado” e por um sentimento de fragilidade e imaturidade
imensa). Pode potenciar o desejo de conhecer. Para se aprender e necessário ter consciência de que
se sabe, e não pode ser vivido como uma ameaça imensa pelo sujeito, e este não sei mas vou aprender
e ter desejo por aprender, ter confiança nas suas capacidades, ter esperança (não domino mas vou
conseguir) e ter prazer ao aprender.
‘’Contra mim’’
Irmão do autor levava cocas da professora, batiam-se nos alunos na cara (?)
A criança mostra a sua fragilidade a alguém de confiança, a pessoa pode ser de confiança e não abusar
da criança, é importante a história anterior da criança a entrada na escola.

→ Importante que a escola possa ser vivida para a criança como um lugar de acolhimento, incentivo
a descoberta do mundo e dela, lugar de tolerância, proporcionador de experiências outras e
agradáveis, e onde há limites e regras para se organizar.

115
9ª Aula Prática (25 de Novembro)

Caso da Joana

Joana, 10 anos, vem à consulta devido a ter muitas insónias. Vai para a cama cerca das 20h30,
lê até às 21h30 e, depois, tenta dormir, mas não consegue. Só adormece por volta das 23h e, muitas
vezes, apenas às 2h ou mesmo 3h da manhã. Os pais pensaram que o problema se poderia resolver se
ela dormisse no quarto da irmã mais velha, mas a Joana acabava por impedir a irmã de adormecer,
uma vez que a chamava constantemente.
Os pais descrevem a Joana como ansiosa desde a idade dos 18 meses: quando ela começou a
andar, voltava-se constantemente para observar o que se passava atrás de si.
Aos três anos foi para jardim infantil e adaptou-se com dificuldade: durante pelo menos três
meses chorava todos as manhãs. Nesse verão assistiu, com os pais, a um festival aeronáutico. Teve
muito medo de um avião que descia em direção à multidão e, a partir daí, manteve um medo muito
intenso de aviões.
Os pais não observaram outros medos intensos, mas referem que ela não gosta de sair, prefere
estar em casa e não procura muito os colegas para brincar.
Joana tem pesadelos: vê um homem que quer matar toda a gente e que acaba por a perseguir
ou, então, quer subir uma escada, mas é uma escada rolante e ela tem medo de colocar os pés em
cima.
Joana é a terceira de três irmãs. Nasceu num período difícil para os pais. O pai tivera, por essa
altura, um acidente de trabalho que lhe amputou vários dedos. Ele nunca aceitou esse acidente.
Durante cerca de um ano ficou muito deprimido. Além disso, teve que mudar de trabalho.
Resumindo: Joana sofre de sintomas ansiosos desde a primeira infância. As insónias de agora
parecem estar ligadas com uma angústia precisa, que é uma angústia de morte. Ela diz, com efeito,
que não suporta ver uma pessoa a dormir (é por isso que acorda a sua irmã) e recorda, também, que
há cerca de um ano, quando um dos seus colegas de escola morreu, o viu estendido sobre a cama.
Além disso as insónias da Joana surgiram no momento em que se receava a morte da avó materna,
que estava muito doente.

(Adaptado de um relato de P. Mazet e D. Houzel)

116
Aula passada: uso de organizadores de Spitz
Importante. A construção de instrumentos dentro de ela para sair segura de casa, para aprendermos e
preciso ter alguma consciência de não sabermos (inaptidão em certas coisas) é necessário apoiar-se
noutro para aprender e como é que é vivida essa aprendizagem.

Porque é que não dorme, será que tem medo de dormir? Ter medo de dormir pode significar
ter medo de perder o controlo, fico mais vulnerável durante o sono.
Será que tem medo do escuro? Ter medo do escuro, é mais universal, normalmente as crianças
tem medo do escuro. Sem luz, o quarto é diferente porque o escuro não se vê, serve de projeção para
os medos, sou eu que coloco no escuro, o que tenho dentro de mim que me assusta (movimento
projetivo), o que é diferente do quarto iluminado em que consigo ver o que existe no quarto.

Medo de adormecer, será que não tem uma figura interiorizada, segurizante, que lhe permitisse perder
o controlo?
No escuro não se vê os perigos, existe uma perda de controlo, podem existir estímulos
inquietantes, não adormece, ela não tem instrumentos internos, para transformar a estimulação
inquietante em estimulação acalmante (quietude).
Ela vai para a cama e tenta ler, tenta que haja uma transição da vigília para o sono, mas não consegue
adormecer. Dá ideia de que os pais são preocupados, pensaram que se sentisse acompanhada, tal
podia ser minorado, porem não funciona, pois ela e a irmã não conseguem dormir, acorda a mãe para
se sentir mais segura. Parece que a criança não tem instrumentos dentro dela, para fazer a
transformação dos estímulos inquietantes em tranquilizantes, ela era uma criança inquieta e ansiosa
desde muito pequena (18 meses).
Pais atentos e preocupados, observam que esta caminhava de forma insegura e que se virava
constantemente pra trás (à procura de objetos segurizantes – pais, ou a colocar no escuro atras dela
objetos persecutórios e ameaçadores), nós vemos o que esta a frente ( e periferia) porem não vemos
o que esta atras, e como se tivesse escuro, então acabamos por “colocar” coisas no escuro que existe
atras de mim, que sejam eventualmente persecutórios e ameaçadores (se estiver sempre a olhar para
trás), a Joana tem angustias de caracter persecutório. A criança ter Insónias, faz nos pensar que não
constrói/desenvolve dentro de ela instrumentos, que lhe permita transformar a inquietude (de forma
a que não coloque fora dela objetos persecutórios no escuro).
Menina com dificuldade de se adaptar (3 meses, durante as manhas chorava e não se entia
bem):

117
Hipótese levantada: não são angústias persecutórias, mas sim angustias de perda, vai para a escola e
perde os seus objetos segurizantes, não consegue construir uma segurança na relação com os outros
(professora e colegas), não tem um objeto gerador de bem-estar e confiança fora de casa.
Aviões: como se colocasse nos aviões, os seus medos, sendo os aviões os depositários dos seus medos
e angústias interiores (“económico”).
Talvez esta coisa toda dos aviões, pode ser proporcionadora de algum aparato e confusão, o que a
podia desorganizar, porém estavam lá os pais, leva a querer que estes não foram suficientemente
apaziguadores, então ela colocou fora dela o que é terrível e mau nos aviões.
Não gosta de sair, mas não signifique que não tente fazer amiguinhos. Talvez preferisse estar na sua
zona de conforto, o espaço que conhece com as pessoas que conhece, em sua casa, como se tivesse
receio, de que se sair de casa, não se sabe o que pode viver? Pode ver o exterior como um lugar
desconhecido potencialmente ameaçador e que os outros também podem representar uma ameaça e
que esta depois não sabe como lidar (porque é desconhecido).
Se tem sistematicamente estes pesadelos, ela tenta manter se num estado de vigília, de forma
a não viver estes pesadelos, e foge do dormir. Os sonhos e pesadelos são feitos por nós,
inconscientemente, o que significa que são feitos com os nossos matérias psíquicos e são
representativos do nosso mundo interno. No caso da Joana, ela tem um pesadelo em que um homem
que mata toda a gente menos a ela (brutalmente assustador pois fica sozinha no mundo) e persegue-
a. Há uma encenação das suas angustias persecutórias, porem esta não constrói uma salvação para
tal, dando a entender que esta não tem desenvolvidos instrumentos dentro dela que a salvem destas
angustias terríveis persecutórias.
NOTA: O objeto interno estável e segurizador, é criado e desenvolvido a partir apreensão
feita da relação com os cuidadores (ao longo do tempo).
Escada e subir, ficar mais alto, ir para outra dimensão, representa um certo desejo de crescer,
mas o sentir que não e capaz, que e difícil, que noa tem força interna para crescer. Não é uma escada
normal, é uma escada rolante, o chão mexe, que não é seguro. Este pesadelo, faz pensar, para além
da existência de um desejo de crescer mas ter medo, de não ter recursos internos para crescer (ser
ameaçador crescer), chão que mexe, não é seguro e é instável (sempre a mover-se), pesadelo que
evoque uma falta de segurança e apoio externo e interno, dos pais não proporcionarem uma segurança
básica (chão seguro e estável que permita o apoio para avançar). Parece que não consegue alcançar o
ritmo das escadas, ou seja, o ritmo de crescimento de forma segura (?).
O pai vive uma situação dramática, amputação de dedos, handicap físico que tem a partir
daqui, precisa de arranjar outro trabalho, nunca aceitou este acidente, este homem quando a filha
nasce esta muito perturbado com algo que se passou com ele. A mãe não muito bem, o seu marido
deprimido e lesado do ponto de vista físico, estes pais muito perturbados do ponto de vista emocional,

118
espaço mental danificado e com as suas próprias inquietações perante a situação. Se as irmãs forem
mais velhas (não sabemos) podem ter sido uma variável protetora (cuidaram dela).
Hipótese levantada: pais não estavam emocionalmente não muito disponíveis para a nova
bebe, pode ser uma razão para a joana não ter conseguido construir dentro dela um objeto segurizador
originário de proteção.

As inquietações dentro dela, ao ver o colega morto e a avó também próxima da morte, estes
acontecimentos externos, contribuíram para que estas inquietações (já existentes) se organizarem.
Menina com alguma capacidade deligação interna, pois faz a associação do ver a irmã dormir e do
corpo morto do colega, o que faz pensar que para Joana o estar a dormir é um certo equivalente de
estar morto.
Homem que persegue no pesadelo, ameaçador esta ameaça é uma grande ameaça que implica a morte
e a destruição. Dormir pode querer dizer morrer, tanto ela como a irmã, não ter controlo sobre o sono,
quer estar no estado de vigília pois tem controlo sobre a “fantasia” dela, quando dorme, constrói uma
narrativa (pesadelos), que não são transformados em sonhos através de uma solução para os terrores
que a invadem (ela não encontra então continua pesadelos).
Importante esta criança ter apoio psicológico, pois tem uma angústia invasiva mais ou menos
organizada, medo da morte, a vida relacional não parece afetada, mas estas angústias podem se
reorganizar e ser lesivo para o desenvolvimento dela. Intervenção terapêutica e apoio, para através
desta relação terapêutica ser trabalhadas as angústias contidas e transformadas (possível sucesso).
Terapia com ela s, para construir um objeto internos estável e segurizador, e com regularidade estar
e falar com os pais, para tentar perceber o cotidiano da criança como estes vivem as mudanças desta
criança.

119
10ª Aula Teórica (27 de Novembro)

Adolescência
Adolescência e problemáticas associadas (Generalidades)
Adolescentes da nossa cultura, vivencia tem muito a ver com a cultura em que o jovem está inserido
(neste caso, a cultura ocidental).

A adolescência pode ser vista como uma viagem em que o jovem procura encontrar-se a si
próprio, construir a sua identidade, este tempo de viagem é também uma oferta das gerações
anteriores aos jovens para estes fazerem viagens e se encontrarem a si próprios. Na cultura ocidental,
não há muitos anos a rás. Este tempo de adolescência é mais curto, dantes a escolaridade obrigatória
era de 4 anos, e passavam logo a ser adultos (trabalhar). A adolescência pode ser prensada como um
tempo de viagem, oferecida pelas gerações passadas, aos jovens. Começa com o surto pubertário e o
fim (não é bem definido) está relacionado com o “tornar-se” autónomo, entrar no mercado de
trabalho, etc.
As crianças idealizam os pais e adultos, o que eles dispõem está certo, brincam ao que estes
sugerem, não se questionam muito relativamente. Asi próprios e ao que lhes é proposto, estas questões
começam na adolescência. Na altura do surto pubertário, há mudanças do ponto de vista cognitivo,
Piaget, diz nos que por volta dos 11/12 anos entra-se no último estádio do desenvolvimento
(operações formais). A partir desta capacidade cognitiva, tudo é possível, é possível levantar todas as
hipóteses (ex. Ícaro que deseja voar, com asas de cera, aproxima-se demasiado do sol e acaba por cair
devido ao derreter da cera).

Acrescentado de Apontamentos:

→ A adolescência é um tempo de passagem entre a infância e a adultice. Esta é uma etapa que se
inicia com o surto pubertário e que não tem um fim definido, que tende a ser casa vez mais tardio –
isto porque o fim tem uma marca social que é a independência económica que, na nossa sociedade, é
cada vez mais tardia. O início, que é marcado biologicamente, vai despoletar as relações com os
outros fora do contexto familiar e torna possível o cariz sexual desses relacionamentos (Carreiras,
2017).

É esperado que no fim desta etapa se tenha conquistado a identidade, o que implica que se
tenha tido experiências que permitam essa conquista. São as experiências que se tiveram que ditam
as problemáticas e o sofrimento psíquico sentido pelo individuo. É a imagem de si, que foi sendo
120
construída, que vai modular a forma como vão ser vividas estas experiências. Por exemplo, se uma
criança tem uma imagem de si que é negativa, torna altamente provável que haja dificuldades em
criar relações íntimas fora do contexto familiar (Carreiras, 2017).

O período de latência é o período que antecede a adolescência que é marcado pelo


adormecimento das pulsões sexuais que são, depois, reactivadas na adolescência. Este é um período
de passagem e, como tal, há aspectos que se perdem e outros que se ganham:

• Se o individuo sente mais as perdas, há altas hipóteses de um processo depressivo


• Se o individuo encara as perdas e está focado nos ganhos, o “prognóstico” é bom, o que
significa que houve trabalho de luto

Pode-se dizer que existem três fases da adolescência:

1) fase inicial, em que há mudanças no corpo, uma desvalorização dos pais – e é difícil de
metabolizar e de se sentir compreendido;

2) fase intermédia, em que o grupo ganha uma elevada importância, em que o corpo sexual é
assumido e onde se ganha algum equilíbrio;

3) fase final que é a da consolidação (Carreiras, 2017).

- Se o individuo adolescente considera que não se compreende, vai considerar que também os
outros não o compreendem.
- O adolescente tem uma enorme dificuldade em verbalizar a turbulência interna e, portanto, há uma
grande probabilidade de a sua linguagem ser pela acção (acting out).

- Nesta etapa da vida pode existir ainda um grande isolamento dos outros.
- O jovem precisa de um ambiente contentor do seu mal-estar e das suas inquietações que o ajude
a lidar tudo e lhe dê novas formas de linguagem.

---

Manifestamente ao longo do processo adolescente, este pode-se desprender de incides, para


ganhar índices mais do interior (e menos do interior), O desenvolvimento moral, o bem e o mal está
relacionado com o que é bom e mau para a criança, há medida que se avança no desenvolvimento,
deixa de ser esta regra externa (pais/figuras significativas dizem se é bom ou mau) passa a ser uma
regra mais social (“lei da comunidade” normas sociais do que é bom e mau), no fim da adolescência

121
é expetável que os princípios éticos (bem e mal) sejam do próprio, decidir o que é bem e mal,
independentemente da regra moral vigente para a sociedade (interiorizado e construído).
Em geral os meninos escolhem os meninos, e as meninas com as meninas (amizade), para as
brincadeiras. Na adolescência e fim da mesma, os amigos começam a ser escolhidos pelas suas as
qualidades/critérios internos, o outro passa a ser escolhido pelas qualidades abstratas internas (ex.
saber ouvir), assim são valorizadas qualidades internas que nos fazem pensar que estas amizades da
adolescência e fim da adolescência, envolvem a intimidade e profundidade. Enquanto que os
amiguinhos do jardim de infância/escola, variam muito, a medida que se avança na adolescência os
amigos não são facilmente trocáveis, são imprescindíveis, passa a existir uma história relacional e
uma história construída.
Na adolescência deixam de ser anjinho, e passam a ser homem/mulher. Devido às mudanças
do corpo, passamos a ter um aspeto mais velho (mais de homem/mulher), isto tem implicações
simbólicas que podem ser mais complicadas. Relacionamo-nos com mundo animado e inanimado
através do corpo, a criança é mais pequena que os pais, a grandiosidade atribuída por esta aos pais,
tem a ver com a diferença de alturas. Na adolescência tal pode reverter-se, isso pode ter um efeito
psicológico, o meu pai era grande e sabia tanto, o que não e fácil para o adolesceste nem para os pais,
varia a forma como lidam com isto.
A mudança corporal que trás as dificuldades, manifesta-se nos, muitas vezes, comportamentos
do jovem manifestar grande interesse pelo corpo, aparência, sempre a ver se ao espelho e procurar-
se no reflexo dos outros, isto pode ter a ver com o querer acertar com a sua nova imagem e perceber
no olhar do outro se é agradável ou não. Pode ser observado o inverso, desinteresse pelo aspeto,
desleixe, etc..
A adolescência é um percurso, durante esta travessia ha coisas que se perdem mas outras que
se ganham, não se sabe o que vamos ganhar, mas temos esperança que sejam melhores do que as que
se perdem. Esta esperança é construída na história de cada adolescência, se este estiver mais
focalizado nas perdas e não nos ganhos, pode ser um percurso mais depressivo (mau prognostico). O
adolescente que fica mais entusiasmado com o que vamos ganhar do que o perdido, adolescência não
é tao percorrida por coisas depressivas, melhor prognostico.
Jovem elabore vários lutos durante a adolescência, decorrente disso há uma vivencia
depressiva, autores levantam a hipóteses de vários lutos.
Um dos primeiros lutos referidos, é o luto pela fonte de segurança, evidência a perda de uma
certa segurança que se tinha até aí e a necessidade de construir uma segurança a residir noutros sítios.
Para a criança é a casa, o espaço que conhece e encontra certas referências e afeto. Espaço de proteção
face ao mundo. Com a adolescência é esperado que o jovem saía de casa (metaforicamente). Largar
a fonte de segurança pode gerar dificuldades, medo, inseguranças.

122
Fazer um luto do refúgio desta “casa” da mãe/pai/família, com o abandono da casa há uma
sempre uma certa culpabilidade associada (eu abandono, faço mal). É necessário fazer um luto por
esta saída/abandono da casa.“Como é que ficam aqueles que deixo?”, “E se precisar de voltar será
que vou encontrar espaço para mim ou será que vão retaliar por os ter abandonado?” Se for embora
e voltar será que ainda há espaço para mim, ou outros vão retaliar por terem ficado
tristes/chateados/abandonados?”. Estes pensamentos podem ser intensificados pelos próprios pais.
Os pais devem demonstrar-se contentes pelas explorações do jovem fora de casa, e disponibilidade
para que eles voltem sempre para casa sem qualquer retaliação. Os pais muitas vezes sentem-se
abandonados e culpabilizam os jovens, retaliando por vezes.
O que facilita a travessia deste luto, se os pais ficam contentes de este estar a crescer, ficando
contentes com as aventuras e descobertas fora de casa, os pais disponíveis, apoiam, ficam felizes e
estão bem com isso não retaliando. Esta procura de novas fontes de segurança pode fazer o jovem
sentir que está a abandonar os pais, quanto mais seguros são os objetos internos (restruturados nesta
fase de adolescência) mais fácil a travessia. O jovem sai de casa e tenta investir nos seus pares,
procurando segurança noutros, no início da adolescente noutros adultos, mais tarde no seu grupo de
amigos e no fim da adolescência o jovem procura segurança no seu parceiro amoroso, o que significa,
que neste percurso, fortaleceu os seus objetos ficando mais capaz de estar sozinho.

Culpabilidade ligada ao sentimento de ferir as figuras paternas, sentimento de abandono e


retaliação dos pais, é importante os objetos internos que o jovem construiu até aí, mas também são
importantes os pais reais. Os pais são idealizados, e são ídolos com pés de barro, os pais que o jovem
tem dentro, são suportes da sua identidade, e se tal cair a sua identidade é profundamente abalada.
Espera se que o jovem desidealize os pais e que seja capaz de se relacionar com os pais reais
(percebidos e apreendidos na realidade, com aspetos bons e menos bons).
Luto vivido pelos pais e pelos adolescentes, a desedealização dos pais é vivida por ambos,
jovens confrontados com o facto de os pais não serem o que estes sonhavam, este conflito pode ser
“resolvido” através da autoritarice dos pais ou estes virarem adolescentes (evitar conflito). Se os pais
idealizam os pais, estes últimos também idealizam os seus filhos (o meu filho tão lindo, vai ser
médico).
A experiência da intimidade física, e vivido como algo intensamente assustador, ficar nas
mãos de outro, perder o controlo de si próprio, intruzam do corpo do outro dentro de mim, será que
me pode destruir ou algo bom? Fantasmas que podem ser reativados. Intimidade física, atração de um
outro podemos pensar que o jovem vai escolher outros na presença dos pais.
As vezes as relações são vividas pelos jovens às escondidas, pode ser por receio da critica dos
pais, receio de estar a trair os pais, e de os fazer sentir traídos (Luto vivido na presença do outro).

123
Quanto mais saudáveis os pais, e melhores consigo próprios, mais maduros e melhor objetos
internos segurizadores dentro deles, mais capazes são estes de viver o afastamento dos filhos e lidam
melhor com isso, sendo securizador para o jovem. Quanto melhor for o que eu construí dentro de
mim, mais facilmente faço a travessia da adolescência.
Normalmente não se sai de uma casa para um vazio, vai saindo de casa tentado procurar outras
fontes de segurança, investindo noutros adultos e nos pares. Para o fim da adolescência o grupo perde
a sua importância e investe numa relação amorosa.
Luto pelo grupo, no meio da adolescência, que existe como fonte de segurança, como local
de experimentação, e mais para o fim da adolescência vai deixando de ter tanta significância, pois o
adolescente começa com namoricos. (?). Alguns autores que olham para o processo adolescente,
como segunda edição do processo de separação (semelhanças) (Mahler - concetualização do
desenvolvimento normal entre os 0 e 3 anos). Jovem separa-se psiquicamente dos pais e tem de
construir outra identidade.

Acrescentado de Apontamentos:

Mahler fala do processo de separação individualização dos 0 aos 3 Anos. Alguns autores
consideram que existe um segundo processo de separação individualização na adolescência. Ou
seja, existe uma solidificação do objecto interno com uma reorganização do mesmo devido aos
processos de luto – com isto a fonte de segurança passa a ser o próprio. Referindo concretamente as
fases de Mahler:

1) no início da adolescência há uma diferenciação progressiva dos pais;

2) o que leva a uma exploração do meio e do corpo e ao desenvolvimento de competências do


próprio jovem;

3) o afecto volta a ser importante depois de tudo ser vivido;

4) o que leva à consolidação da segurança interna e externa e os objectos internos tornam-se


estáveis e, portanto, o individuo pode sair de casa dos pais (Carreiras, 2017).

Há dinâmicas familiares e estilos comunicacionais que podem boicotar o desenvolvimento


do adolescente – quando a criança deixa de ser instrumento dos pais, estes podem não permitir que o
adolescente seja o que ele pretende (Carreiras, 2017).

124
Características

O pensamento

Do ponto de vista cognitivo, na adolescência o individuo já tem um pensamento formal,


onde já existe um pensamento simbólico que agora já não precisa do concreto para existir. O facto de
o individuo poder pensar sobre os seus pensamentos e poder pensar no abstracto faz com que possa
pensar sobre o que quiser (Carreiras, 2017).

O corpo

Do ponto de vista do corpo, o individuo na adolescência sofreu alterações hormonais, nas


dimensões corporais e nos seus caracteres sexuais. Desta forma, o individuo passou a ter um novo
corpo com o qual se vai ter de relacionar e com o qual se irá relacionar com o espaço e com os outros.
Nesta fase existe uma grande importância dada aos espelhos como forma de confrontação com a nova
imagem e a integração da mesma. Para além da imagem de si é também importante a imagem que os
outros têm de si (Carreiras, 2017).

Dadas as dimensões da criança, os pais deixam de olhar para os pais de baixo para cima e
passam a olhar ou a) de uma forma igualitária (que remete para uma relação de igualdade) ou b) de
cima para baixo de uma forma de superioridade (que remete para algum sentimento de poder;
Carreiras, 2017).

Existe também a aquisição do género – até então as crianças são apenas crianças não tendo
um género marcado, apesar de existir e de lidarem com ele todos os dias, mas de uma forma mais
subtil. Com o assumir do género nascem fantasias na criança sobre como é ser homem ou mulher
(Carreiras, 2017).

A problemática do corpo está presente não só no suicídio adolescente como também no
sintoma da anorexia – mais comum nas raparigas e que constitui um desejo inconsciente de voltar ao
corpo infantil (Carreiras, 2017).

Trabalhos de Luto

Há autores que também falam da adolescência como um longo e variado trabalho de luto. Pode-
se pensar em vários tipos de trabalhos de luto e um desses é o do corpo infantil – de uma sexualidade
indefinida para uma sexualidade definida. Com esta mudança surge a dúvida se o individuo vai ser
amado com este novo corpo como foi no corpo infantil, será que vai suscitar afeto. Para responder a
125
estas questões o individuo levanta hipóteses com base naquilo que é o seu passado e as suas vivências
(Carreiras, 2017).

• Se sentiu que foi amado, há elevadas probabilidades de considerar que também o será.
• Se não sentiu que foi amado, é altamente provável que considera que não vai ser amado e,
portanto, vai se retrair nas relações com os outros.

Outro luto que o adolescente poderá ter der fazer é o luto pela fonte de segurança. Esta fonte de
segurança será o afeto, as regras – os pais. Com a entrada na adolescência é esperado que a fonte de
segurança deixe de ser os pais. É esperado que sejam feitos novos jogos identificatórios com outras
personalidades (ex. cantores, grupos). Com o tempo, a fonte de segurança passa a ser o próprio e mais
tarde as escolhas amorosas (que têm um grande papel a este nível). Quando se abandona uma fonte
de segurança, nasce o receio que essa fonte abandone também o individuo – perder o afecto daqueles
que se abandonou. Este luto poderá não ser facilitado pela preocupação de que se os pais vão ou não
ficar bem – o que despoleta sentimentos de culpa no adolescente.

A facilidade em fazer o luto depende então destes dois factores:

a) sentir que os pais estão bem

b) sentir que não se será abandonado (Carreiras, 2017).

É necessário fazer ainda o luto da idealização dos pais. Este idealização tem uma base na
realidade e uma base depressiva. Com todas as mudanças, o adolescente percebe que os pais têm
defeitos e daí a idealização “cair”. Com este luto, o adolescente deixa de se relacionar com os pais
idealizados (que são a base da sua identidade) e passa a relacionar-se com os pais reais. O que pode
acontecer é que os próprios pais vão sentir a desvalorização (que favorece a separação psíquica) que
advém deste luto, o que faz com que estes reajam. Os próprios pais também idealizam os filhos (o
que significa que investiram neles). O problema é quando essa idealização é muito fechada e não
permite que o individuo/adolescente seja ele próprio. Em geral, a idealização dos pais não é possível
de ser mantida. Pode-se dizer assim que existe uma idealização mútua que traz sofrimento e
vantagens para ambos os lados (Carreiras, 2017).

Tem-se ainda um luto renovado pelo objecto edipiano. O primeiro luto dá-se quando a criança
percebe que existe uma diferença geracional com os pais e que o pai amado tem outra pessoa. Nesta
renovação na adolescência, o objecto deixa de ser os pais e passa a ser o outro (um outro fora do
contexto familiar). O jovem pode perceber que esta escolha de um novo objecto (amoroso) pode
danificar o objecto de amor primário (Carreiras, 2017), o que o pode retrair.
126
Pode-se ainda dizer que pode ser feito um luto dos grupos.

Depressividade

Ao longo da adolescência tem de se realizar com sucesso vários lutos. Elaborar o luto é viver
a perda e, portanto, é normal uma certa depressividade a atravessar a adolescência. Esta
depressividade pode-se tornar depressão pela dificuldade em fazer o trabalho de luto e pelo foco nas
perdas – o adolescente não se consegue imaginar no futuro ou num grupo social. A depressividade é
um dos motivos que podem levar à tentativa de suicídio (Carreiras, 2017).

127
10ª Aula Prática (2 de Dezembro)

Caso do Miguel

Miguel, de 19 anos de idade, foi-nos enviado com uma situação de carácter urgente, sobretudo
em relação ao vivido familiar. Tratava-se essencialmente de uma tentativa de suicídio, cujo carácter
de imprevisibilidade apanhou “a frio” toda a família, a qual, ansiosa, procurou de imediato uma
resposta num eventual apoio psiquiátrico, embora este contasse desde o início com a resistência do
Miguel. Esta, diga-se desde, já, centrava-se num discurso anti-psiquiátrico, o qual, no entanto, não
padecia da vacuidade habitual deste tipo de racionalização. Pelo contrário, uma grande cultura,
alicerçada numa inteligência extraordinariamente viva, tornava no início esta defesa por
intelectualização quase impenetrável à palavra do outro.
Voltando, porém, ao primeiro contacto, a assistente social que nos pediu para ver o jovem, e
que estava aliás sensibilizada à problemática adolescente, insistiu sobretudo na necessidade de
desdramatizar a situação junto da família, particularmente junto do pai. Este, não vivendo em
Portugal, tinha-se deslocado expressamente a fim de poder encontrar uma resposta às suas naturais
inquietações.
Foi com um rapaz bem cuidado, de olhar vivo e inteligente, que nos deparámos à hora
previamente combinada. Com uma certa fluência, começou-nos a falar do seu problema, embora
como já previamente afirmámos, este aparecesse aprisionado nas malhas de um discurso
profundamente intelectualizado. Há cerca de dois anos que o Miguel se encontrava a estudar sozinho
em Coimbra. Até aí tinha sido um aluno brilhante, embora também até aí tivesse sempre vivido junto
dos pais.
A sua relação com os outros jovens e com o mundo em geral apresentava já então um carácter
profundamente intelectualizado; porém, o isolamento do afeto, consequência e causa deste modo
relacional, não tinha para ele ainda valor ou significado, já que na família um sistema compensatório
de trocas afetivas o mantinha e lhe permitia manter uma área transitiva em que as gratificações do
amor de infância eram ainda dominantes.
Para Miguel a relação com os pais, fosse embora objeto de contestação, funcionava como
manutenção de auxiliares do Eu nutritivos e nutrientes de um sistema de trocas, em que o pai e a mãe
eram ainda objetos investidos de um valor infantil. Por outras palavras, até à separação física com
estes não se tinha efetuado nenhum trabalho interno importante, no sentido da metabolização psíquica
das imagens parentais, isto é, o luto pela infância. Quando posto sozinho, Miguel foi-se mostrando
progressivamente incapaz de fazer face às tarefas que o quotidiano lhe impunha. Primeiro, foi o
rendimento escolar que apresentou uma nítida quebra. Como ele próprio nos disse, era como se na

128
ausência dos pais não tivesse ninguém que se alegrasse com o seu trabalho, como se este perdesse o
carácter de trocas afetivas, imanente à forma como vivia os resultados obtidos. As boas notas não
eram uma alegria que desse a si próprio, ou uma fonte de elevação da autoestima. Tratava-se pura e
simplesmente de coisas que dava aos pais, em troca de outras que deles recebia.
Seguidamente instala-se em Miguel uma profunda crise narcísica e de identidade, centrada
sobretudo no corpo. Olha-se ao espelho e acha-se feio. (“Só a mãe me acha bonito”, dir-nos-á mais
tarde). Não gosta do seu corpo. Sente-o como uma casa que se habita, mas que não é nossa. (O que
nega e recusa é o corpo adulto em nome do corpo idealizado, traço mnésico de uma relação jubilatória
infantil). Detesta-se por demasiadamente se amar. Dá-se conta do outro sexo. Vive-o como uma
impossibilidade. “Ninguém me pode amar”, “nenhuma rapariga olhará alguma vez para mim”. Sente-
se tímido e canhestro junto das mulheres. Só na infância, idealizada, lembrada nostalgicamente, lhe
parece haver uma secreta felicidade.
Vai nas férias ter com os pais. Uma semana depois ingere uma importante quantidade de
tranquilizantes, deixando àqueles uma carta de despedida. À saída do hospital os pais interrogaram-
no e interrogaram-se sobre o significado da tentativa de suicídio. Miguel diz que “nada há a dizer”, o
que de certo modo era verdadeiro dada a evidência da situação.
No regresso a Coimbra, o pai vem com ele, decidido a encontrar alguém que
o apoie. Obviamente que procura também o seu próprio apoio, na denegação e na
impossibilidade de ver o significado da tentativa de suicídio.
Vemos Miguel e falamos depois com o pai. Primeiro desdramatizamos a
situação, mostrando àquele o valor relacional do sintoma e o seu significado
desenvolvimental.
A Miguel, na primeira entrevista e nas seguintes, vamos clarificando, a
partir da tentativa de suicídio, a sua infância o valor atual da infância. Ajudamo-lo
a tomar consciência da dificuldade em fazer o luto pelo passado e em aprender a
estar só. Mostramos-lhe que, se a tentativa de suicídio foi ainda uma forma de
chamar sobre si a atenção parental, provavelmente o que ele queria matar era a
criança dentro de si, que não lhe permitia viver livremente o novo corpo adulto.
Abordamos a culpabilidade de crescer. Percebe que uma mãe que nos abandona é
também uma mãe que se abandona. Começa a compreender, dolorosamente é certo,
que viver é sobreviver a uma criança morta.
(In: Dias, C. A. & Vicente, T. N. (1984). A depressão no Adolescente. Porto: Ed.
Afrontamento)

129
Alguma vivacidade, ele próprio começa por falar dele, faz nos pensar que ele é capaz de se
deixar ajudar. começou a falar do seu problema, ainda que com um discurso intelectualizado, para
criar uma certa distancia dele em relação ao psicólogo.
Mora com os pais, era muito bom aluno, depois vai para a faculdade e passa a viver sozinho.
Relações de caracter mais funcional de trocas, quando o Miguel vai viver sozinho, há todo um
mundo de suporte que se perde e que se desmorona, este fica assentir se sozinho e perdido, como se
não tivesse dentro dele chama que lhe permitisse viver por ele e portanto sozinha. Não construiu o
objeto segurizador?
Brilhante aluno, o sucesso no estudo é como se não fosse uma coisa para ele, mas sim para os
pais. Se não estavam os pais para apreciar o presente (coco no bacio), aqui as notas seriam o presente
para os pais, passaria a ser uma coisa para ele, porém o Miguel não considera isso. Não construiu
suficientemente dentro dele, pais. As notas seriam uma prenda para os pais, mas passam a ser de nós
para nós, para os nossos pais dentro de nós.
Brusquidão, foi demasiado cedo para Coimbra, partiu antes de ter suficientemente solidificado
dentro dele representações de figuras securizadoras. Até a separação física não tinha feito a
metabolização psíquica das representações das figuras parentais.
Relação jubilatória infantil – não aceita o corpo adulto dele, gosta do seu corpo infantil que
sentiu que foi muito investido e amado.
Não fez o luto do corpo infantil, custa lhe não ter o corpo infantil, pois parece que só o corpo
infantil é que seria agradável pois puxava o amor dos pais, a aparência infantil foi muito acarinhada
pelos pais, e agora que já não tem, já não consegue suscitar afeto e júbilo (grande felicidade) e afeto
dos pais. Pensa que nenhuma rapariga olhe para ele e que o ache bonito que o seu corpo não suscita
o afeto de ninguém.
Cria resistência na relação, não vai cativar o psicólogo, mas isto não é algo muito rígido, tem a ver
com o psicólogo também, ate se mostra e desnuda, mostra-se e confia no psicólogo, “ o psicólogo
não se vai interessar por mim, não sou capaz de agradar ninguém” isto acaba por cair e ele sente-se
mais confiante para mudar isso, pois abre-se e mostra-se ao psicólogo ao longo do tempo. Não se
procura encontrar no olhar do outro, tem os olhos para baixo, se calhar pode haver aqui uma “certeza”
de que se eu olhar-me nos olhos do outro vou encontrar uma coisa negativa, então não olho porque
acho que me vai rejeitar, e se isso acontecer o que é uma hipótese, passa a ser realidade (rejeitado).
Problemática do corpo, que é dominante neste jovem, o sintoma que o traz à consulta é uma tentativa
de suicídio que é uma forma de atacar o próprio corpo, há um sofrimento dele relativamente ao corpo,
esta problemática é obvia através deste sintoma (tentativa de suicido).
Instala-se no Miguel uma Crise narcísica e de identidade (quem sou eu?). Não gosta do corpo
e recusa o corpo adulto, quer o seu corpo infantil ama esse corpo, da se conta do outro sexo e vive o

130
como uma impossibilidade (pressuposto nenhuma rapariga vai gostar de mim e do meu corpo nem
interessante) fica tímido e desajeitado com as raparigas. Parece haver uma cetta ansiedade pois quer
o tempo que já noa é o dele (infância).
Tentativa de suicídio? – não sabemos a gravidade da quantidade que ele toma, ele quer por
fim á vida ou que este gesto pode ser pensado como dominantemente uma chamada de atenção e um
pedido de socorro. Uma tentativa de suicídio é sempre um ato sobre o corpo, cortes no corpo também,
não é atacar um carro (vandalismo), não é roubar nem drogar-se, é mesmo um ataque ao corpo. Há
um mau estar (discurso intelectualizado) dificuldade em entrar em contacto com o vivido emocional,
e de entrar em contacto com os outros. Pode ser para fazer perceber a quem o rodeia que existe um
sofrimento e quer ser ajudado.
O sintoma é descodificado, o pai de alguma maneira é lhe dado a conhecer o sintoma e o
Miguel esta a cargo de fazer uma terapia com este psicólogo, situação de grande violência (suicídio)
em relação ao próprio (corpo e vida) mas também em relação aos que estão a sua volta.
O Miguel vai crescer e de alguma forma vai “abandonar “a mãe e vai arranjar outra mulher
importante para vida dele, e quando a abandona pode ter o receio que esta por sua vez também o
abandone (medo da retaliação). Todos nós transportamos dentro de nós todas as aulas que vivemos,
uma criança que foi integrada dentro de mim.
Tipo de intervenção para desenvolver com o Miguel:
Ajudar a tomar consciência a fazer o luto e ajudá-lo a fazer o luto, de forma a este ser capaz
de entrar em contacto com ele e com as suas dores, a conseguir verbalizá-las e lidar com elas.
O terapeuta tem de ser o outro não sendo o outro (identificação tentativa).

131
11ª Aula Teórica (4 de Dezembro)

Adolescência: (Tentativa) Suicídio


Tentativa de suicídio e suicídio: Segunda causa de morte na adolescência, a primeira são os acidentes.
Em geral, se pensarmos nas diferenças de géneros, há mais suicídio entre os rapazes do que
entre as raparigas, mas há mais tentativas em raparigas do que em rapazes.
Tentativa de Suicídio: o mais utilizado é intoxicação com medicamentos, envenenamento,
cortes (Auto lesões), afogamento enforcamento e defenestração.
As raparigas utilizam instrumentos que podem não ser tao eficazes, aquilo a que o sujeito
recorre para se suicidar tem a ver com o que tem a sua volta, o que é mais comum. Quando há uma
tentativa de suicídio, nos próximos 6 meses, é provável que haja outra tentativa com maior eficácia
de método para tal. É altamente frequente que um jovem faça uma tentativa de se matar depois do
primeiro insucesso (no decorrer dos 6 meses seguintes).
Por vezes há uma banalização do suicídio, mas é necessário ter em atenção.
Muitas das tentativas de suicídio, são impulsivas que nos pode fazer pensar e relacionar com
a impulsividade que é uma característica comum na adolescência e que tem a ver com dificuldades
de o jovem entrar em contacto consigo próprio e de comunicar com outros. Nesta fase há dificuldade
de ser capaz de entrar em contacto consigo próprio, elaborar os lutos, pensar, expressar e ter noção
das consequências dos seus atos (evidente no caso do Miguel – a tentativa de suicídio apanhou de
surpresa a família).
Reação da família: Cerca de metade dos familiares próximos destes jovens lamentam e
querem compreender e ajudar os jovens, a outra metade rejeita e manifesta agressividade. O gesto
suicida é extremamente agressivo, tanto para o próprio como para os familiares próximos, é um
abandono voluntário.
Dados gerais em relação às razões da tentativa de suicídio, grande generalidade atribui a
causas externas, não atribui ao seu mundo interno, nomeadamente culpa as dificuldades relacionais
coma família (surgem com maior peso). Representação do gesto suicidário, para os jovens que
tentaram, a maioria diz que o seu gesto é uma fuga ou desistência, depois um apelo e por fim como
um desafio.
O bebé e percorrido por certa omnipotência, o adolescente ao crescer perde essa omnipotência,
então deve também fazer o luto da omnipotência, os comportamentos de guiar na marginal na outra
faixa, andar de mota com alta velocidade que podem ser vistos como um desafio “eu venço a morte,
ela não me atinge”.
Como os jovens que fizeram tentativa de suicídio se descrevem a eles próprios:

132
Sinistros, pessimistas, tristes, inquietos., desencorajando, não sabem esperar (impulsividade
e impaciência), pouco dinâmicos, pouco sociáveis, aborrecem-se com facilidade e lentos (lentificação
que o jovem sente relativamente a si próprio) – certa depressividade do jovem que tentou suicidar-se.
No grupo de jovens que praticaram a tentativa suicídio, existiam antecedentes familiares com
maior incidência de tentativa de suicídio, de doença mental e alcoolismo.
Muitas vezes há uma banalização por parte da comunidade, do gesto suicidário, é preciso
olhar-se o jovem, esta banalização tem haver com a agressividade dos que tao a volta do jovem
sentem, uma agressão em relação a eles e o não se quererem inquietar. Há uma desvalorização e uma
certa agressividade por parte dos outros ex. “há pessoas que precisam mais desta cama”.
Um jovem que tentou suicidar.se e um jovem que precisa de ajuda e que comete a tentativa
porque não vê outra forma de resolver o seu problema.
Alta taxa tem haver com dificuldades do jovem em elaborar as perdas que deve elaborar neste
percurso (adolescência), que tem a evr com o corpo, no suicídio há uma clara tentativa de atingir o
corpo, pode haver um grande mau estar em lidar com o corpo que o jovem tem, com o corpo de adulto
e não mais o corpo infantil. Todos os lutos que devem ser elaborados, conduzem a uma certa
depressividade característica da adolescência, depressividade mais ou menos normativa. É diferente
de o jovem muito depressivo excessivamente, estar a sentir as perdas e não ser capaz de perspetiva o
que pode vir a ganhar com estas, o bem-estar.
O que nos pode ligar a vida são os laços dos outros em relação a nos e vice-versa, dentro de
nós temos laços interiorizados, temos representações de outros ligados a nós, e estes laços podem
dizer “ estas vivo e deves dar continuidade a isso” os laços que nos prendem a vida são sobretudo os
laços de outros interiorizados que nos ligam a vida. E bom que estes laços sejam alimentados nas
relações realmente vividas, há uma história relacional dentro do jovem que pode com mais ou menos
facilidade que pode faze lo sentir se vinculado e que podem prender à vida e querer fazê-lo viver a
sua vida ou não(Os laços têm um peso na decisão do jovem cometer ou não suicídio). Os laços têm
um peso significativo no jovem cometer ou não o suicídio para lidar com as dificuldades da
adolescência. Quando há dentro de nós, laços interiorizados, o jovem pode sentir esses laços e estes
podem prendê-lo à vida. A cultura é apropriada por nós.
Existem dinâmicas familiares que propiciam a segurança psíquica e autonimização, no
percurso da adolescência, e outras dinâmicas que dificultam. Pode haver modelos de comunicação
que bloqueiam a individualização do adolescente, a separação psíquica e a diferenciação da criança.
Não permitirem e não possibilitam esta diferenciação do jovem, tentam bloquear a diferenciação
psíquica do jovem, conduzem ao jovem a sentir-se bloqueado e sem saída quando tem de fazer uma
nova diferenciação e separação o que pode levar ao suicídio como forma de fuga (como pedido de

133
ajuda, expressão de não encontrar um saída para o seu percurso de vida, este acaba por ver o suicídio
como fuga).
Desta forma, os jovens:
- Não adquirem novos objetos;
- Não fazem diferenciação do self;
- Apelo aos pais que compreendam a sua individualização;
- Favorece a falta de limites, não há diferenciação do jovem.
A comunicação e o estilo relacional desde a primeira infância influenciam o desenvolvimento
do “eu” do jovem, pode favorecer a falta de limites (confusão) e pode enfraquecer a diferenciação e
predispondo uma evolução depressiva do mesmo, o que consequentemente pode conduzir a uma
tentativa de suicídio ou suicídio caso a tentativa seja eficaz.
O jovem vê-se bloqueado, desinvestimento dos pais e doloroso, a aquisição de novos objetos
e dificultada e o suicídio ou tentativa de tal é um apelo extremo a família para que o considerem e
compreendam pois não tem outros recursos.
Há autores que frisam que o processo de separação-individualização é revivido durante a
adolescência, o adolescente que já construiu bagagens dentro dele até aí, apoia-se nesses recursos e
revive o processo de separação psíquico e investir na sua individualidade (definição da identidade).
Jovens que comentem ou tentam suicidar-se tem grandes problemas neste processo.

Acrescentado dos Apontamentos:


Suicídio

Um jovem que atenta contra a sua vida está em sofrimento – neste ataque ao corpo há um enorme
agressividade autodirigida. Existem várias maneiras de exprimir a agressividade. Escolher dirigi-la
ao seu corpo poderá advir de algum desconforto com esse corpo. O individuo atinge com o suicídio
o corpo mas também aquilo que ele representa e, desta forma, é importante perceber se o individuo
tenciona magoar o corpo de adulto ou o infantil (Carreiras, 2017).

• As estatísticas mostram que existem muitos adolescentes que morrem em acidentes – sendo
que muitos desses acidentes são suicídio. Alguns desses suicídios estão associados a quadros
patológicos mas a maioria não – logo há problemáticas da adolescência que podem levar o
adolescente a sofrer e a formo de aliviar e expressar esse sofrimento pode ser através do
suicídio.
• As estatísticas mostram que o suicídio é maior nos rapazes no que nas raparigas, mas que são
mais violentos no que diz respeito aos instrumentos utilizados.

134
• As estatísticas mostram que as mulheres fazem mais tentativas de suicídio, e utilizam
instrumentos menos violentos (ex. ingestão de medicamentos).

A tentativa de suicídio é muito desvalorizada pelos outros. Contudo, quem faz uma tentativa de
suicídio é provável que a repita nos meses próximos e que seja mais eficaz. A população em geral
tem de perceber que só existe um corpo e, portanto, atacar o corpo mostra um enorme sofrimento
interno (Carreiras, 2017).

Tanto o suicídio como a tentativa de suicídio são actos auto-agressivos mas, também, hétero-
agressivos em que o outro também se sente agredido e também fica em sofrimento. A forma do outro
exprimir o seu sofrimento por estes actos pode ser através da desvalorização e do abandono do
adolescente.

− A estatística diz que as respostas às tentativas de suicídio das raparigas é mais agressiva do que a
dos rapazes isto porque: a) do ponto de vista biológico, são as mulheres que geram vida o que torna
o atentar contra a sua vida ainda mais chocante; b) porque a rapariga é vista como alguém mais
normativo a qual todos consideram que se devem portar como-deve-ser, enquanto os rapazes são
considerados mais disruptivos.

Por ser tão comum a tentativa de suicídio na adolescência e por não existirem, a maioria das vezes,
patologias associadas a estas tentativas, encontra-se algumas características da adolescência que
podem facilitar este processo.

A linguagem pelo comportamento/acting out é uma das características que pode contribuir
para a tentativa de suicídio. Muitas são as mudanças num curto espaço de tempo na vida do
adolescente, o que o torna incapaz de pensar e verbalizar tudo o que sente. É normal que no início da
adolescência haja mais comportamentos do que verbalização. No adolescente existem falhas na
mentalização do adolescente que geram falhas em se entender o que faz com que não consiga falar

135
explicitamente sobre si com os outros. Em vez de verbalizar o seu sofrimento, o adolescente utiliza o
comportamento para encontrar uma saída para o seu sofrimento – esta dificuldade tem implicações a
nível relacional que vão fazer com que, para além de não conseguir comunicar o seu sofrimento, não
consiga pedir ajuda.

Como referido anteriormente, o adolescente tem a capacidade de pensar de forma abstracta.


A intelectualização é um mecanismo de defesa que surge na adolescência pela aquisição de novas
capacidades cognitivas. A intelectualização leva a que o individuo tenha um discurso muito
elaborado mas desprovido de conteúdo emocional/afectivo. Esta constitui uma forma de não estar em
contacto com a sua vida emocional, o que vai alimentar a sua linguagem pelo comportamento como
forma de expressão da mesma.

Outro aspecto relacionado é o conceito de morte. Não nascemos com este conceito sendo que
é adquirido ao longo do desenvolvimento podendo se dizer até que este é o ultimo conceito a ser
adquirido – o conceito de morte como desaparecimento definitivo e irreversível. Este conceito adulto
de morte é inconcebível para uma criança pequena e, na adolescência, é usado como uma forma de
pôr um fim definitivo ao sofrimento (Carreiras, 2017).

Também a perda do sentimento de omnipotência poderá estar na origem de algumas


tentativas de suicídio. Com a adolescência perde-se este sentimento e, no desafiar dos limites, o
adolescente aproxima-se um pouco mais deste sentimento a que estava habituado na infância.

Aquilo que nos liga à vida e que lhe dá sentido são os outros e o facto de sabermos que existe
quem goste e pensa em nós – principalmente se desaparecermos. Ao desaparecermos, por sabermos
que gostam de nós, sabemos que vamos colocar os outros em sofrimento. Este poderá ser uma das
razões que leva o suicídio – os adolescentes percepcionam deficiências no amor que os outros sentem
por si e no amor que consideram que podem vir a ter. Desta forma, para eles, nada se perderá.

Intervenção

A intervenção deve ser feita na escola, com professores, funcionários e outros jovens,
alertando para os sinais importantes: a) jovens que falem pouco, b) com má imagem de si, c) que se
isolem, d) que têm comportamentos disruptivos e, e) que não têm amigos e não convivam.

136
11ª Aula Prática (16 de Dezembro)

Caso da Francisca

Francisca, com a idade de 14 anos e a pesar 56 quilos, decidiu fazer um regime de


emagrecimento com um dos seus amigos. Este parou rapidamente, mas Francisca continuou até pesar
cerca de 39 quilos. Tinha sido menstruada aos 13 anos e esse acontecimento tinha-a desgostado.
Apesar da sua perda de peso não fez amenorreia, ainda que as suas menstruações fossem muito
irregulares. Uma das razões por que pretendia emagrecer era porque queria ser mais magra do que a
sua irmã mais nova, com quem sempre tinha mantido uma relação de competição e que era magra.
Ingeria toda uma série de medicamentos para vomitar ou para cortar o apetite e não comer. Francisca
pensava que os seus sintomas estavam relacionados com o nascimento do filho da tia preferida. Ela
reagiu a esse nascimento com repugnância e horror e um dia, quando tinha a criança nos braços, teve
o desejo de a atirar violentamente para o chão. Sintomas ainda mais graves surgiram quando
descobriu que uma amiga, que não era casada, estava grávida. Francisca ficou horrorizada e
repugnada com a ideia de a amiga ter tido relações sexuais e dizia, até, que odiava os seus pais por
terem tido relações sexuais quando a conceberam. Preferia não ter nascido.
Quando tinha 15 anos ficou muito desiludida por não ter recebido um prémio escolar. Ficou
sem voz e passou apenas a cochichar. O cochichar manteve-se até à sua admissão no Instituto
Psiquiátrico, quando tinha 18 anos. Uma vez, enquanto dizia a cochichar “Eu não posso falar! Eu não
posso falar! Eu não posso falar!”, uma enfermeira declarou solenemente: “Sim, pode!”. Então falou,
durante alguns dias, com uma voz normal, que dizia detestar porque, pensava, era parecida com a da
sua mãe. Cochichava continuamente referindo os seus medos: medo de comer, medo de parar de
cochichar, medo de ficar bem.
Francisca era a filha mais velha de seis, dois irmãos e três irmãs. A irmã mais nova foi, ao
longo de toda a sua vida, objeto de inveja e de ressentimento. Expressava abertamente cólera e inveja,
porque ela era delgada e franzina. Francisca procurava estar sempre no centro das atenções através
do seu sofrimento e dos seus sintomas.
A dada altura, por insistência sua, decidiu ir viver com a avó materna. Esta mudança não
produziu melhoras no seu estado. Começou a coxear e foi admitida num hospital ortopédico. Os
médicos não encontraram nada de orgânico, mas, como coxeava muito, prescreveram-lhe canadianas.
Enquanto vivia com a avó, começou a queixar-se de grandes dores abdominais e levantou-se a
hipótese de ser um cálculo renal. Mas descobriu-se que ela tinha introduzido um lápis na bexiga. Foi
necessário retirar-lho através de uma incisão por cima do púbis. Este incidente foi acompanhado por
intensos fantasmas sexuais agressivos.
137
Durante todo o período de “invalidez”, que durou quatro anos, a relação familiar tornou-se
impossível. Francisca tinha um carácter violento e mantinha a casa inteira em grande tumulto e
agitação; recusava-se a comer, tinha receitas para vomitar, permanecia de pé toda a noite e impedia a
irmã mais nova de tocar piano. Ainda que tivesse sido, anteriormente, uma excelente aluna,
abandonara a escola e renunciara a uma carreira musical. Acabou por ser hospitalizada em psiquiatria.
Aquando da admissão parecia deprimida, tensa, recolhida e absorvida em si ainda que, de uma
maneira geral, educada, cooperativa e condescendente. Preocupava-se muito com questões sexuais e
entregava-se a vários devaneios sexuais, em que se sentia infeliz ou privada de qualquer coisa.
“Quando me sinto deprimida, penso na minha doença. Nos meus devaneios, os médicos examinam
sempre as minhas partes genitais e parece que me retiram qualquer coisa. Prestam sempre mais
atenção a mim do que aos outros doentes e isso dá-me prazer, porque assim sinto que gosto desses
doentes. Nestes sonhos nunca estou bem.”
Achava que a mãe era responsável pelos seus problemas e acusava-a de ter recusado responder
às suas questões sobre a sexualidade e o parto dizendo-lhe: “Não é bonito falar-se disso!”. Mas se a
mãe não tinha inclinação por relações sexuais porque é que tinha tido tantos filhos? Depois
considerava-se hipócrita: ainda que crente, pensava com ódio em Deus porque tinha permitido coisas
horríveis, como as relações sexuais, e tinha inventado uma maneira terrível de fazer nascer as pessoas.
Tinha angústias incríveis sobre o seu ventre, tinha medo que pudesse aumentar. Desejava, também,
ter o peito completamente liso. Imaginava-se a cravar uma faca no ventre de uma mulher grávida a
fim de fazer sair o bebé.
A visão que construía de si alternava entre a eterna criança inválida que, porque doente e
impotente era objeto de atenção dos pais, e a menina boa e perfeita, dotada do ponto de vista
intelectual e artístico, controlada e que se esforçava por estar à altura das ambições do pai.
Foi diagnosticada com esquizofrenia, apesar de “componentes histéricas” importantes.
Apresentava uma identidade confusa, estados de angústia e de cólera quase sempre constantes, uma
multiplicidade de sintomas “neuróticos” que mudavam constantemente (obsessões, fobias, sintomas
histéricos), uma distorção evidente da realidade e, provavelmente, alucinações auditivas.
Permaneceu no hospital durante dois anos. O tratamento consistiu em combinar medicação,
terapia ocupacional com frequência escolar assídua, o suporte do enquadramento hospitalar e uma
psicoterapia intensiva. A grande dificuldade residia no facto da Francisca ter, durante toda a sua vida,
utilizado a doença para preservar uma situação no interior da família, por isso tinha “necessidade de
ser doente”. No início, houve uma melhoria rápida e os sintomas mais visíveis desapareceram. Mas
os progressos na psicoterapia foram travados por numerosas recaídas, com um comportamento
sintomático que mudava sempre que se tocava nas questões mais importantes. Mas Francisca fez

138
esforços significativos para atingir a maturidade e para ter confiança nela, e não manifestou qualquer
sintoma durante as visitas prolongadas que fazia a casa. Sentia-se mais preparada para aí viver.

(Caso adaptado de “Les yeux et le ventre - L’obèse, l’anorexique” de Hilde Bruch)

Em relação a tia, que gosta muito, como se ela quisesse ser um bebé e a preferida da tia, e
como tem um bebé deixa de o ser. Fala de repugnância e horror ao nascimento desse bebe, há um
desejo de o lançar ao ar (não concretizado) isto é um pouco aberrante, dentro de uma certa lógia, ela
quer ser o bebé da tia.
Há um corpo (parto) por onde sai um outro corpo, coisa muito assustadora para ela, um corpo
de onde saiu coisas.
Com 14 anos decidiu fazer uma dieta, pensa se num quadro de anorexia (ficou com 39 kg),
comum surgir nesta altura dos 14 anos (surto pubertário) dificuldade de lidar com a perda do corpo
de criança e começo do corpo de mulher. ela ingeria medicamentos para vomitar, parece um sintoma
de anorexia (recusa do alimento), já para ser bulimia, tem de haver a pelo enfardamento de comida e
posterior vomito da mesma. Salienta-se que ficou menstruada aos 13 anos, e ela não gostou, isto é
mais uma marca de que se esta a deixar de ser criança e a passar à fase de mulher. Das razoes que
pretendia emagrecer, foi por que queria ser mais magra que a irmã mais nova, havendo uma
rivalidade, pode ter roubado o amor dos pais, e é como se fosse a irmã magra como um modelo a
seguir, queria ficar mais menina. A Francisca ingeria comprimidos para vomitar.
Talvez haja aqui a possibilidade de se levantar a hipótese de que a Francisca perde o amor da
tia, com o nascimento do seu primo. A tia é mulher e deu á luz, tem algo a ver com a sexualidade, ter
uma vida sexual que parece gerar repugnância na Francisca (há uma problemática subjacente).
Há aqui algo muito perturbado, que a faz reagir à vida sexual e a prova da vida sexual (ter um
bebé), como se isto que fosse insuportável e não integrável para ela. é a amiga, a tia e os próprios
pais, odiava-os por terem tido relações sexuais e ela ter nascido (preferia não ter nascido). Na
psicanálise fala-se na cena primitiva, os pais estarem envolvidos, a cena puder ser vida como uma
cena em que eles estão envolvidos (satisfeitos um com o outro) e a criança não está lá.
Os pais envolvidos um com o outro, e na fantasia dela, ela está completamente abandonada,
uma coisa é pensar nos pais envolvidos um com o outro, mas mantendo a prevenção. os pais
envolvidos e penetram-se o que pode ser, na fantasia dela, muito assustador e destruidor. Parece
percecionar a intimidade sexual como algo destrutivo.
Podia ter ciúmes do miúdo (filho da tia), da irmã, mas não expressava esta repugnância, parece
haver subjacente um modo de funcionar muito mais perturbado e que nos reenvia para um
funcionamento psicótico.

139
Grande desorganização, apenas cochicha, não falava, diz que a vos a reenviava para a mãe,
voz parecida com a da mãe, era mulher, parecida com a mãe, é como se isto fosse profundamente
ameaçador e desorganizado. medo de comer, de engordar, medo de parar de cochichar (ficar como a
mãe), medo de crescer (de ser mulher).
como se fosse mais fácil continuar deprimida, precisava de atenção, ser objeto do colo dos
outros (queria ser sempre o centro das atenções), a atenção dos outros mantém os outros perto dela,
proporcionam-lhe uma contenção e certa organização.
Sintoma psicológico, começa a coxear, ela não quer ficar bem, não pode ser autónoma, alguém
que coxear, que noa anda bem, que precisa de muletas, de outros que a organizem e estruturem, que
olhem para ela.
Extremamente violento, enfia uma coisa fálica (lápis), “o que é que leva a isso?”, destrói os
seus interiores, é como se ela atuasse na angustia, é destrutiva, e introduz um lápis na sua vagina que
chega a bexiga, sendo necessário cirurgia, como se tivesse atuando nos fantasmas dela.
Não consegue imaginar um feto dentro dela, que vive a sua custa e sai dele, que
destrói/desmembra e rebenta.
Esta mulher tem uma parte dela em funcionamento psicótico, e precisa de ser contida, deve
sentir invadida por angústias primitivas muito desorganizadores, e precisa de outros que a organizem.
Impedia a irmã mais nova a tocar piano, rivalidade evidente aqui. era muito doente e punha a
casa num inferno, era violenta, recusava-se a comer, vomitava, tava de pé durante toda a noite, não
tinha um ritmo sono vigília comum, não se conseguia adequar ao ritmo dos outros la de casa.
durante 4 anos que teve invalida e a andar de muletas,
Nota: Didier Anzieu, a pele dela não é contentora das suas angústias, precisa que os outros a
contenham.
Tinha boas notas, e carreira musical, esta desorganização deu se na adolescência, até lá era
“normal”, a estrutura que tinha dentro dela até aí, não aguenta o surto pubertário e desorganiza-se a
construída até aí era muito frágil não aguentou as exigências trazidas pela puberdade.
Quando e admitida parece deprimida e recolhida, há uma certa disponibilidade dela para ser
curada, tratada e puder recuperar, havendo uma atitude mais cooperativa por parte dela.
É importante para ela a atenção dos médicos, e há sempre uma temática das partes genitais e
órgãos genitais.
O que é que é para ela uma relação sexual? Algo de profundamente violento, uma ameaça, o
corpo de outro a intercomunicar com outro, é algo potencialmente violento tal como o nascimento de
um bebé.
Tem angústias do seu ventre, tem medo que este explodisse face a esta desorganização ela
arranja sintomas (estratégias) para se manter num certo equilíbrio.

140
Anoréxica, come menos, fica sem a menstruação e com menos corpo de mulher (menores
curvas, ex. maminhas) e permanece mais uma menina (na condição infantil), e sendo uma menina
fica a salvo das relações sexuais e de engravidar, sendo uma menina vive como um ambiente
estruturante pois tem os outros para a conterem e organizarem.

Chill, vai correr tudo bem <3


U can do it.

141
12ª Aula Prática (18 de Dezembro)

Anorexia
Quando se fala deste distúrbio alimentar, fala-se da recusa a ingerir alimentos, não quero
comer por razoes inerentes ao funcionamento psicológico, Anorexia Mental. Nota: Anorexia não
mental – tem perda de apetite ao contrário da Anorexia mental.
Na adolescência é sobretudo um sintoma que afeta o sexo feminino, aparece usualmente logo
depois do surto pubertário, normalmente os sintomas manifestos são: restrição alimentar metódica,
medo expresso pelo jovem de engordar, desejo de emagrecer mais, vigilância das calorias ingeridos
(ingerir menos), ingerência de diuréticos e laxantes (alimento o menos tempo possível no corpo, e se
absorvido o menos possível), controlo enorme pelas formas físicas, colecionam receitas (fazem
petiscos para os outros, cozinhados – há um desejo por vezes manifesto de alimentar o outro) parece
que a jovem rouba alimentos (ex. as vezes leva para o quarto uma banana e esconder como se fosse
uma coisa roubada e que não deveriam fazer).
Com estas condutas há um emagrecimento progressivo, acompanhado de amenorreia –
ausência de menstruação (conduz a este sintoma), a jovem por mais magra que esteja/pareça, ela
continua a achar-se gorda, deformada, dá a ideia de uma alteração da sua imagem percebida. No geral
o comportamento do jovem, permanece adaptado no seu conjunto, em geral são jovens com bons
resultados e como alunas não criativa (são “marronas”), o rendimento escolar continua adequado e
em geral é percecionado uma hiperatividade física ( para proporcionar um maior emagrecimento),
jovens que têm um quotidiano muito regrado, organizado e rígido, tendem a não ter uma grande vida
social.
A jovem esta a adquirir outro corpo ( de mulher, mais arredondado) quando ela fica magra ate
perde o fluxo menstrual, é como se continuasse com corpo de menina, corpo que se aproxima mais
com o de uma menina, existem aqui dificuldades em lidar com esta passagem de menina para mulher
e aceitar o seu novo corpo de mulher e tudo o que este traz com ele. O ser mulher aproxima-a da mãe
Podemos dizer que parece haver dificuldades na perda do corpo infantil, deixar de ser menina
e passar a ser mulher, aproximar a sua mãe (passar a ser a mãe), que suscita o desejo de outros e a
sua atração. Ser mulher é ser como a mãe, pode haver problemas relativos a jovem quanto a isso. Ser
adulta é caminhar para algo demoníaco do adulto, sensibilidade de a jovem em relação ao conflito de
dependência/independência – pode-se pensar que pode ser difícil para a jovem deixar a dependência
da condição infantil, mas por outro lado, quando ela se recusa a comer e enfrenta a hostilidade e
pressão dos pais “ tens de comer” ela afirma a sua diferenciação e individualização e autonomização
é uma forma de o jovem se afirmar e diferenciar e como uma oposição aos pais ( fazer o que ele quer

142
e não os que os pais querem ainda que tal atitude seja contra ele próprio). Há jovens que ficam em
risco de vida e precisam de ser internadas, o jovem anorético vai provocar um enorme conflito
familiar, quando se opõe aos pais e afirma a sua diferenciação, ao não comer, há dificuldades dela em
crescer.
Há variáveis culturais que propiciam a anorexia (corresponder a ideias de beleza).
Curiosidade: Em sociedades de carência alimentar não há anorexia.
Dificuldades de aceitação ao seu novo corpo, sensibilidade em relação a conquista de
autonomia (conflito dependência/independência), o mau estar que advém deste conflito é expresso
não de forma mentalizada, mas sim de forma comportamental coagida no corpo.
A jovem não diz habitualmente “estou infeliz, não quero crescer, não vou ter amor dos outros”
o seu mau estar é expresso pelo corpo, o problema dela é estar gorda, os seus desejos e o que a assusta,
há uma deslocação do sofrimento para uma temática.
Hipótese Levantada: Com o surto pubertário, não há só mudanças corporais, há também
mudanças do ponto de vista interno e um desejo pelo outro que se intensifica no vivido interno do
adolescente, nomeadamente a desenvolver relações de outro cariz com outro.
Qual será a perspetiva do jovem, o que é eu relacionar-me com outros?
Tem subjacente uma vivencia de incompletude e de dependência, “falta-me a minha outra
metade”, do encontro com o outro desejar um relacionamento com o outro (No relacionamento com
o outro também lhe posso dar poder).
O que é belo atrai-me, mas é bom ou mau? Só resolvo isso relacionando me com o outro, e
relacionar-me com o outro é uma aventura, não sabemos o que se vai passar, podemos viver coisas
muito boas ou muito más, mas não há outra forma de saber sem experimentar relacionarmo-nos com
o outro.
Viver e assumir a sua incompletude, qualquer coisa que falte, contactar a sua dependência,
fragilidade é assustador para os jovens. Na sua perspetiva qualquer relação implica massivamente o
eu e é um risco para o seu equilíbrio narcísico, há aqui uma angústia persecutória um ameaça vivida.
É como se a jovem tentasse reprimir esta vivencia de incompletude, a jovem mantém apetite e ao
recusar o alimento (triunfa) – sou mais forte do que isto → vivencia de omnipotência que salva a sua
vivencia de incompletude e dependência.
Há um deslocamento desta relação com o outro para uma outra relação uma relação com
objetos materiais, alimento, que lhe surge como mais fácil de controlar – há a fantasia de controlo. A
jovem torna-se totalmente dependente do alimente.
Existe um deslocamento do que lhe poderia trazer uma relação humana, para uma relação com
objetos materiais – o alimento – que lhe surge mais fácil de controlar e que a jovem tem a perspetiva
que controla. É verdadeiramente um comportamento de dependência, como a toxicodependência,

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porque acredita que controla o alimento, quando na verdade ela encontra-se dependente do alimento
e a sua vida gira em torno deste alimento.
A relação é substituída pela relação com o alimento. A relação com o outro ser humano, não
é vivida como uma possibilidade de florescimento mútuo, mas como algo destrutivo reciprocamente.
Aproximar-se da mãe e assemelhar-se à mãe é como roubar a mãe.
Devemos:
Ajudar a jovem a entrar em contacto consigo, e ajudá-la a descentrar-se (para sair da sua
relação com a comida) para poder entrar em contacto com o seu sentido e senti-lo.

Acrescentado dos Apontamentos:

Anorexia nos bebés

A anorexia nos bebés é o problema que preocupa mais os pais bem como o pediatra. O facto
de a criança comer ou não comer é muito importante para os pais- A alimentação é fundamental para
o crescimento do bebé, mas esta alimentação tem que ser controlada para que o bebé não seja muito
magro nem muito gordo. O bebé que é muito gordo salta algumas fases do seu desenvolvimento pois
estes ficam impossibilitados de realizar certos tipos de movimentos, não tendo assim uma evolução
normal como os outros bebés. O momento da alimentação é muito importante, o contacto afectivo é
muito importante. Quando existem problemas a nível da alimentação é porque algo ao nível da relação
também não esta bem. Os sintomas muitas vezes acentuam-se quando a mãe esta mais ansiosa e
diminuem quando esta está menos (Carreiras, 2017)

É fácil identificar as etapas onde podem surgir problemas com a alimentação, sendo elas então: a) 2a
e 3a semana – é aqui que surgem os primeiros contactos com a mãe e se esta apenas alimenta o seu
bebé e não mantém um contacto mais afectivo com ele podem então surgir problemas com a
alimentação; b) 4 e 6 meses – esta é a altura do desmame dá-se então a passada para as comidas
sólidas, nesta altura episódios de ansiedade e intranquilidade são suficientes para trazer problemas a
este nível; c) 2 a 3 anos – nesta altura a criança vai aproveitar as horas da refeição para se afirmar,
para se tornar autónomo é importante que os pais sejam flexíveis (Carreiras, 2017).

Anorexia na adolescência

A anorexia na adolescência não se deve à perda do apetite, mas há sim uma recusa em o adolescente
alimentar-se. Certos autores dizem que a anorexia mental (i.e., a anorexia onde existe recusa em se
alimentar) é comum na primeira infância, tanto em rapazes como em raparigas, mas na adolescência
tende a ser mais comum nas raparigas. A jovem tem, sobretudo, uma fantasia de controlo dos seus
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impulsos fisiológicos, achando que, mesmo tendo fome, consegue contornar isso e recusar-se a comer
(Carreiras, 2017).

A anorexia tende a surgir no início do surto pubertário, estando largamente relacionada com
as transformações que ocorrem no corpo do adolescente. Existem certas exigências que a
sociedade coloca àquela jovem, por exemplo que tem que ser magra, que vão impor sofrimento e
confusão à adolescente (Carreiras, 2017).

A jovem que em casa se recusa veementemente a comer induz um conflito no seio familiar.
Por um lado a) é como se a jovem se recusasse a crescer e a evitar os dilemas da adolescência e
futuro desenvolvimento, mas por outro lado b) esta recusa em comer também é forma desta rapariga
se afirmar e autonomizar, isto porque antes, quando era pequena, comia tudo o que lhe punham no
prato porque tinha que comer e obedecer aos seus pais, mas agora pode dizer que não quer comer. No
entanto, este mecanismo de autonomização e libertação é, supostamente, contra os pais e
especialmente contra a mãe, mas isto tudo acaba por resultar contra a própria jovem e ter efeitos
negativos para si. Além disso, a adolescente não está a fazer isto, não se está a recusar a comer por
si, mas sim pelos outros, mais concretamente os pais porque estes ainda são as figuras centrais (a
jovem não se move por ela, mas sim contra os pais; Carreira, 2017).

Possivelmente, a jovem anoréctica tem como centro do mundo o alimento; para a jovem não
anoréctica, o centro do seu mundo anda à volta das relações com os outros: amigos, pais, namorados.
O mais importante é a relação com o outro ser humano, para a jovem anoréctica é o alimento, como
objecto inanimado e que pode, supostamente, ser controlado, o que ela dá mais importância. Por sua
vez, o namorado hoje pode gostar da rapariga, mas amanhã passar a gostar de outra, ou seja, o ser
humano é imprevisível e não pode ser controlado como o alimento. É como se a relação com o outro
é substituída por uma relação com algo que pode ser controlado.

• Se na história da jovem, a criança desenvolveu relações positivas, que acrescentaram algo à


sua pessoa e a fizeram sentir bem, então mais tendência terá para continuar a desenvolver
essas relações.
• Se, por outro lado, as relações que viveu foram altamente negativas e prejudiciais, a jovem
afastar-se-á delas, evitará estabelecer essas relações. Por outro lado, a jovem pode perspectivar
a relação com o outro como algo ameaçador para ela; se deixar o outro aproximar-se
demasiado dela, que a irá prejudicar. Deseja o outro, mas o outro pode destrui-la. Tal fá-la
sentir-se ameaçada.

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Bulimia

Pode existir uma oscilação entre anorexia e bulimia (em que a adolescente come vorazmente),
mas na bulimia é “o encher-se de alimento sem limites” que contém a sua angústia, ao passo que na
anorexia a jovem combate esse “enchimento”. A questão é: o que representa este alimento? Na
bulimia, está ainda presente a culpabilidade: a jovem procura expulsar todos os alimentos que ingeriu
porque se sente culpada.

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12ª Aula Prática (6 de Janeiro)

Caso do Filipe

Dificuldades começaram com a puberdade, grandes angustias, medo de perder o controle,


medo de morrer, incapaz de concentrar e estudar, etc.. supostamente desencadeada e associada à
cirurgia pela qual este passou.
O corpo muda e passa a ser desconhecido, o corpo pode viver outras coisas, como ele
desconhecer este corpo e as suas potencialidades, tem medo de se desorganizar... Existem
Inseguranças, queixas hipocondríacas que a mãe também apresenta, pode fazer parte da cultura
familiar, como se. A mãe tivesse alguma dificuldade em conter e transformar as suas angústias, e se
as depositasse em medo de ter determinadas doenças e patologias, e que o filho aprende também esta
“linguagem”, expressa através de preocupações hipocondríacas.
O pensamento e discurso do filipe são monótonos, factual, pouco rico, pouco dinâmico, pouco
vivo e com grande isolamento do afeto, e este explica/reporta todos os sintomas e sentimentos por
um trauma vivido na puberdade (cirurgia). Este discurso e atitude torna mais difícil o trabalho
terapêutico com ele, porque torna tudo factual, banal e tudo sem afeto. Tudo se reduz a uma situação
concreta vivida, neste caso a cirurgia, não há manifestação clara de afeto e sofrimento, fica dificil de
trabalhar com o Filipe. Desenvolvimento de uma relação e confiança que se vai construindo, após 10
meses, e que o terapeuta passa para uma intervenção, passa para o divã 4x por semana. O que ele vai
descrevendo sobre o pai, é que este é um homem idealizado, e que é o sobredotado, “grande” este
tipo de relação é reproduzido no tipo de relação entre o Filipe. Se eu o idealizo, significa que eu me
desvalorizo, porque hipervalorizo o outro. A mãe e descrita como uma mulher desvalorizada, com
uma certa imaturidade e hipocondríaca. Deve-se fazer uma desidealização dos pais, para que se torne
possível o Filipe ser capaz de se ver na sua própria realidade, bem como ao pai e mãe. Existe pouco
contacto de ele com ele, com o seu vivido com os seus afetos, continua muito afetado pela tragédia
que passou, é percetível uma certa imaturidade. Tem medo de perder o terapeuta, há dependência
deste e tem medo que o abandone, liga-se a ele, tem importância em não investir muito no terapeuta
de forma a proteger-se. Relata um sonho, em que o terapeuta surge como poderoso e perturbador (a
semelhança do pai do filipe). Os problemas do Filipe continuam, maus resultados escolas, pouca
concentração, pouca esperança, deprimido e inseguro. Dificuldades associadas às mudanças advindas
da puberdade, uma mãe hipocondríaca, pode ser alguém que certamente tem alguma dificuldade de
conter a transformar angústias, logo também tem essa dificuldade de fazer o mesmo com as do filho.
Depois das férias e de um longo período de terapia, progressivamente o Filipe começa a ser
capaz de ligar e interpretar, começa a falar da infância em que se sentia muito abandonado pelos pais,
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começa a apresentar melhor capacidade de insight, a relação com as raparigas começa a melhorar.
Começa a criticar os pais, de não se terem ocupado dele o suficientemente por estarem mais ocupados
com o trabalho, e aí que começa a aparecer uma grande rivalidade com os irmãos. Agora tem mais
vontade de socializar. È capaz de reconhecer que os pais não lhe deram o que ele precisava que lhe
dessem, critica aos pais, e sente sentimentos de raiva ou odio, ciúme em relação aos irmãos.
Inicialmente a relação com o pai e idealizada, com o terapeuta também, a certa altura há uma
desidealização da relação com o pai e terapêutica, salienta-se que isto é vivido sempre com receio de
retaliação por parte do analista. Há períodos em que ele está mais positivo e outros em que se repeta
a situação, ele ta numa viagem em que consolida a sua identidade e força dentro dele. As crises de
ansiedade e hipocondríacas tornaram-se raras.. Começa a autonominar-se e a investir mais nele, esta
atitude do pai Compreendeu-se que uma das grandes dificuldades era a atitude demasiado solicita e
amável do pai, que nunca o criticava o que dificultava o processo de individualização. O rendimento
escolar normaliza, e o relacionamento com os pais melhora.

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