Você está na página 1de 5

o conceito de identidade cultural nacional como formas naturais e neutras e que

possivelmente não dialogam com a realidade, pois há diferenças em uma mesma nação

como gênero e etnia. Há, portanto as identidades locais e regionais e o hibridismo das

culturas proporcionado pela migração. A identidade pode ser vista, na perspectiva

apresentada por Hall, frente a globalização e modernidade como um conceito

estratégico e posicional, em meio a uma historização radical. O ponto de sutura

mencionado parte do discurso e prática que convoca os indivíduos a assumirem lugares

enquanto sujeitos sociais, de discursos particulares, e processos que produzem

subjetividades, construindo sujeitos aos quais se pode falar. Compreender as identidades

a partir de locais históricos e institucionais específicos - são mais produtos da marcação

da diferença e da exclusão do que signo de unidade idêntica. Ainda, o autor relaciona o

conceito de identidade com os processos identitários em constante modificação (p. 120,

2014). Para ele, nenhuma identidade é fixa ou imóvel, somos constituídos por

representações. Na pós-modernidade ele destaca a chamada crise de identidade, fruto

das transformações das sociedades, o que levou a uma mudança de maneiras de

compreender os sujeitos e sua cultura. O hibridismo, como ele o define, são as

identidades culturais movidas por mudanças, encontros e desencontros. Veremos mais

adiante como se aplica no nosso estudo de caso: a cidade de Santos.

1.2. A educação como contributo para a Cultura e para a identidade de um território.

Como falamos no subcapítulo anterior a educação e a cultura andam juntas para

a construção da identidade. Ainda, é necessário discorrer sobre a arte inserida no campo

cultural. Quando relacionamos arte, cultura e Estado podemos definir arte em quatro

frentes: (1) arte como patrimônio - relaciona-se intimamente com a existência de um

órgão estatal para a cultura; (2) arte como vanguarda - o artista enquanto crítico social;

38
(3) arte como mercado - relaciona-se com a indústria cultural, arte como produto

inserida no neoliberalismo; (4) arte como indicador social - políticas públicas culturais

para desenvolvimento humano e social (VIGANÓ, 2019).

Para nos aprofundarmos na questão da arte como mercado, relacionando

portanto cultura e economia ao tratar da chamada indústria cultural temos a análise e

discussão da Teoria Crítica de Adorno e Horkheimer, a partir do texto “Educação para a

resistência contra a barbárie”, de José Leon Crochik e a partir da obra "Dialética do

Esclarecimento" (ADORNO & HORKHEIMER, 1985) que nos trouxe bases para

discussão deste capítulo. Adorno vê a escola como um meio de suscitar nos alunos a

crítica à ideologia vigente. Esta instituição deveria atuar no combate à violência,

formando “indivíduos autônomos, democráticos e emancipados” (CROCHIK, 2009, p.

16). Para Adorno a educação é a forma de não vivenciarmos novamente na história o

holocausto. "A exigência que Auschwitz não se repita é a primeira de todas para a

educação." (Adorno, 1995, p. 119).

A emancipação em todas as instâncias deve passar por uma tomada de

consciência de si enquanto ser imerso numa sociedade repleta de mecanismos de

massificação e violência simbólica. Porém, quanto mais o Capitalismo se complexifica,

mais difícil é despojar-se do individualismo exacerbado trazido pelo consumismo. A

Indústria Cultural, termo cunhado pelos filósofos, também se desenvolve, tornando-se

mais movediça, ver os recursos utilizados na publicidade em geral.

Para a crítica aos produtos impostos pela indústria cultural, Adorno sugere

que o filme, o jornal, o livro, na escola, sejam alvos de análise por

professores para a explicitação dos mecanismos utilizados nesses produtos,

que visam a captar o consumidor, e o levam a manter desejos infantis

(CROCHIK, 2009, p. 24).

39
A indústria cultural, portanto, age sobre os imaginários, trabalha com a ideia de

uma formação civilizatória pela cultura. Isto, sem dúvida, tem sua origem na França

com a criação do primeiro ministério da cultura do mundo em 1959 com o intuito de

firmar uma identidade cultural nacional e, com isso, uma hegemonia internacional por

uma questão geopolítica (VIGANÓ, 2019).

Theodore Adorno e Max Horkheimer, autores da Escola de Frankfurt,

desenvolveram sua teoria em meados do século XX quando a indústria cultural de

massas ainda estava surgindo. De lá para cá, não só os jornais, o cinema, o rádio e a

televisão conseguiram alcance global, como também novas mídias foram desenvolvidas,

como a internet, smartphones e as redes sociais. Se antes as propagandas veiculadas por

esses meios já influenciavam os conteúdos culturais a serem produzidos e já tinham

grande poder de atuação na formação das subjetividades e dos desejos dos indivíduos,

agora com os algoritmos das redes sociais – que possuem informações detalhadas sobre

as características e gostos pessoais de seus usuários a partir da interação desses na

internet – os conteúdos de propaganda se tornaram ainda mais sofisticados podendo

oferecer cada vez com maior precisão os produtos e serviços que os números julguem

ser de interesses de cada usuário.

Para além das críticas que podem ser feitas ao pensamento dos autores do século

XX - como, por exemplo, uma certa visão dicotômica entre a “alta” e a “baixa” cultura,

priorizando uma cultura elitizada em detrimento às culturas populares - suas análises

ainda são de grande valor para se pensar a cultura e a educação em nosso tempo.

Principalmente no contexto educacional brasileiro, onde movimentos do tipo “Escola

sem Partido” vêm ganhando força, tornando cada vez mais difícil a proposição dos

autores de uma educação como crítica à ideologia vigente. Os frankfurtianos já

criticavam no século passado o excesso de racionalidade técnica que tornaria a escola

40
um empreendimento comercial, retirando do aprendizado seu caráter formador e

transformando a educação escolar em mercadoria. E é o que temos visto acontecer cada

vez mais frequentemente no cenário da educação no Brasil, onde grandes empresas

educacionais assumem o controle de várias escolas particulares, criando redes onde o

conteúdo de ensino é muito parecido e implementando projetos pedagógicos que têm

como foco a formação para o vestibular, desconsiderando a formação intelectual e

cultural dando ênfase apenas a uma formação técnica que relaciona meios e fins sem

pensar estes últimos, portanto desconsiderando a política.

Os autores viram este mesmo processo se delinear na cultura em geral, uma vez

que essa estaria se tornando externa aos indivíduos, instrumentalizando e não mais

formando. E para Adorno formação é introjeção de cultura e a obtenção dessa cultura

como um fim em si impossibilitaria o pensamento e o afastamento imediato que

permitiriam a compreensão da constituição social e das injustiças sociais e a

consequente luta por mudanças. A televisão continua sendo o meio de comunicação de

massa por excelência - presente em 75 milhões de residências no Brasil (2021, Instituto

Brasileiro de Geografia e Estatística, doravante IBGE). Isso representa mais de uma

televisão por domicílio, uma vez que a estimativa de casas segundo o IBGE é 72

milhões – mas cada vez mais novos produtos culturais são oferecidos por meio das

novas tecnologias que a internet possibilitou. Serviços de streaming que oferecem

músicas, filmes, séries, livros, podcasts, notícias e conteúdos nas redes sociais em

quantidade e velocidade imensuráveis. Tudo isso permeado por uma tecnologia

publicitária cada vez mais precisa aos desejos de cada consumidor específico. O excesso

de informação hoje disponível na palma da mão através dos smartphones cria um tipo

de alienação. O tempo da reflexão, do questionamento, da crítica como proposta pelos

autores, o tempo da construção do conhecimento, é diverso do tempo da informação.

41
Numa cultura prenhe de imagens, Adorno indica a retração da imaginação: a

adaptação hiper-realista, que envolve uma atividade passiva de receber os

conteúdos culturais sem ter de esforçar, cria imagens que não falam mais que

mil palavras..., mas sem imaginação não há pensamento… (CROCHIK,

2009, p. 10)

A adesão incondicional e irrefletida a qualquer coletivo é também o que a

educação deve combater. Se a atuação política coletiva é fundamental,

torna-se reacionária se seus membros participam para dar vazão aos seus

impulsos, em vez de a ela se associarem, ou não, pela racionalidade do que

propõe. (CROCHIK, 2009, p. 35)

1.3. Ação cultural e política cultural no Brasil

Estes dois temas serão importantes no momento da análise de dados ao

discutirmos duas ações culturais relatadas pelo docente de artes do Senac em entrevista.

Por isso discutiremos a definição e a origem dos conceitos. Como citamos

anteriormente com a criação do primeiro ministério da cultura do mundo, na França em

1959, o sujeito investido no cargo chamava-se André Malraux (VIGANÓ, 2019).

Inserido num processo civilizatório nacional, o então ministro cunhou o conceito de

ação cultural, que se define em seus discursos como meio de propiciar sujeitos ativos na

cultura, não objetos ou consumidores conforme discutimos no subcapítulo anterior

sobre a indústria cultural. Segundo Malraux, ações culturais são condições necessárias

para atingir a democracia cultural (VIGANÓ, 2019). Portanto, quando relacionamos

cultura e Estado temos a prática de políticas públicas culturais. No Brasil esse processo

teve início no Estado Novo, ou seja, na década de 1920 quando então o presidente

ditador era Getúlio Vargas. Neste período houve fortemente um incentivo ao inventários

42

Você também pode gostar