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Testes de revisão de Os Maias

Teste 1

Grupo I

- Tenha Vossa Excelência a paciência de esperar um instantinho que eu vou dar parte à Srª D.
Maria Eduarda…
Maria Eduarda! Era a primeira vez que Carlos ouvia o nome dela; e pareceu-lhe perfeito,
condizendo bem com a sua beleza serena. Maria Eduarda, Carlos Eduardo…Havia uma
similitude nos seus nomes. Quem sabe se não pressagiava a concordância dos seus destinos!
Domingos, no entanto, já à porta da sala, com a mão no reposteiro, parou ainda, para dizer
num tom de confidência e sorrindo:
- É a governanta inglesa que está doente…
- Ah! É a governanta?
- Sim, meu senhor, tem uma febrezita desde ontem, peso no peito.
- Ah!...
O Domingos deu outro movimento lento ao reposteiro, sem se apressar, contemplando Carlos
com admiração:
- E o avozinho de Vossa Excelência, passa bem?
- Obrigado, Domingos, passa bem.
- Aquilo é um grande senhor!..Não há, não há outro assim em Lisboa.
- Obrigado, Domingos, obrigado…
Quando ele finalmente saiu, Carlos, tirando as luvas, deu uma volta curiosa e lenta pela sala. O
soalho fora esteirado de novo. Ao pé da porta havia um piano antigo de cauda, coberto com
um pano alvadio; sobre uma estante ao lado, cheia de partituras, de músicas, de jornais
ilustrados, pousava um vaso do Japão onde murchavam três belos lírios brancos; todas as
cadeiras eram forradas de repes vermelhos; e aos pés do sofá estirava-se uma velha pele de
tigre.

Eça de Queirós, Os Maias

1 – Situe o excerto na estrutura do romance, justificando devidamente a sua resposta.


2 - Atente no segundo parágrafo do texto e refira de que modo o seu conteúdo constitui um
presságio do desenrolar da ação.
3 – Mostre de que forma a descrição do espaço contribui eficazmente para a caracterização de
Maria Eduarda.
4 – Identifique no texto uma figura de retórica característica do estilo queirosiano, referindo o
seu valor expressivo.
Teste II

Leia atentamente o texto transcrito:

[…] Carlos, pálido e calado, abriu adiante a porta do bilhar. Aí, que era a maior sala do
Ramalhete, tinham sido recentemente acumulados na confusão das artes e dos séculos,

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como num armazém de bric-à-brac, todos os móveis ricos da Toca. Ao fundo, tapando o
fogão, dominando tudo na sua majestade arquitetural, erguia-se o famoso armário do tempo
da Liga Hanseática, com os seus Martes armados, as portas lavradas, os quatro Evangelistas
pregando aos cantos, envoltos nessas roupagens violentas que um vento de profecia parece
agitar. E Carlos imediatamente descobriu um desastre na cornija, nos dois faunos que entre
troféus agrícolas tocavam ao desafio. Um partira o seu pé de cabra, outro perdera a sua
frauta bucólica...
- Que brutos! exclamou ele furioso, ferido no seu amor da coisa de arte. Um móvel
destes!...
Trepou a uma cadeira para examinar os estragos. E Ega, no entanto, errava entre os
outros móveis, cofres nupciais, contadores espanhóis, bufetes da Renascença italiana,
recordando a alegre casa dos Olivais que tinham ornado, as belas noites de cavaco, os
jantares, os foguetes atirados em honra de Leónidas... Como tudo passara! De repente deu
com o pé numa caixa de chapéu sem tampa, atulhada de coisas velhas - um véu, luvas
desirmanadas, uma meia de seda, fitas, flores artificiais. Eram objetos de Maria, achados
nalgum canto da Toca, para ali atirados, no momento de se esvaziar a casa! […] Depois, como
Carlos saltava da cadeira, sacudindo as mãos, ainda indignado, Ega apressou aquela
peregrinação, que lhe estragava a alegria do dia.
[…] Entraram no quarto. Vilaça, na suposição de Carlos vir para o Ramalhete, mandara-o
preparar; e todo ele regelava - com o mármore das cómodas espanejado e vazio, uma vela
intacta num castiçal solitário, a colcha de fustão vincada de dobras sobre o leito sem
cortinados. Carlos pousou o chapéu e a bengala em cima da sua antiga mesa de trabalho.
Depois, como dando um resumo:
- E aqui tens tu a vida, meu Ega! Neste quarto, durante noites, sofri a certeza de que
tudo no mundo acabara para mim... Pensei em me matar. Pensei em ir para a Trapa. E tudo
isto friamente, com uma conclusão lógica. Por fim dez anos passaram, e aqui estou outra
vez...
Parou diante do alto espelho suspenso entre as duas colunas de carvalho lavrado, deu
um jeito ao bigode, concluiu, sorrindo melancolicamente:
- E mais gordo!
Ega espalhava também pelo quarto um olhar pensativo:
- Lembras-te quando apareci aqui uma noite, numa agonia, vestido de Mefistófeles?
Então Carlos teve um grito. E a Raquel, é verdade! A Raquel? Que era feito da Raquel,
esse lírio de Israel?
Ega encolheu os ombros:
- Para aí anda, estuporada...
Carlos murmurou: «Coitada!» E foi tudo o que disseram sobre a grande paixão
romântica do Ega.
Carlos no entanto fora examinar, junto da janela, um quadro que pousava no chão, para
ali esquecido e voltado para a parede. Era o retrato do pai, de Pedro da Maia, com as suas
luvas de camurça na mão, os grandes olhos árabes na face triste e pálida que o tempo
amarelara mais. Colocou-o em cima duma cómoda. E atirando-lhe uma leve sacudidela com o
lenço:
- Não há nada que me faça mais pena do que não ter um retrato do avô!... Em todo o
caso este sempre o vou levar para Paris.
Então Ega perguntou, do fundo do sofá onde se enterrara, se, nesses últimos anos, ele
não tivera a ideia, o vago desejo de voltar para Portugal...
Carlos considerou Ega com espanto. Para quê? Para arrastar os passos tristes desde o
Grémio até à Casa Havanesa? Não! Paris era o único lugar da terra congénere com o tipo
definitivo em que ele se fixara: «o homem rico que vive bem». Passeio a cavalo no Bois;
almoço no Bignon; uma volta pelo boulevard; uma hora no club com os jornais; um bocado
de florete na sala de armas; à noite a Comédie Française ou uma soirée; Trouville no Verão,

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alguns tiros às lebres no Inverno; e através do ano as mulheres, as corridas, certo interesse
pela ciência, o bric-à-brac, e uma pouca de blague. Nada mais inofensivo, mais nulo, e mais
agradável.
- E aqui tens tu uma existência de homem! Em dez anos não me tem sucedido nada, a
não ser quando se me quebrou o faeton na estrada de Saint-Cloud... Vim no Figaro.
Ega ergueu-se, atirou um gesto desolado:
- Falhámos a vida, menino!
in Os Maias

Responda, de forma correta e completa, às seguintes questões:

1- Situe o excerto transcrito na arquitetura do romance, justificando devidamente a sua


resposta.
2- Baseando-se apenas no excerto apresentado, indique três traços psicológicos de Ega,
fundamentando a sua escolha em segmentos textuais.
3- Refira o modo como o excerto confirma a imagem que o romance nos oferece sobre o
protagonista, Carlos.
4- Tendo em conta a globalidade da obra, comente a exclamação final de Ega.

Questões B

1. Importância de Carlos na construção da crónica de costumes.


2. Importância do título e do subtítulo no desenvolver da ação no romance.
3. Portugal, a personagem oculta em Os Maias.
4. A atualidade da crónica de costumes (exemplificar com um episódio).

Prof. Zaida Braga


setembro 2022

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