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Instituto Superior de Contabilidade

e Administração de Coimbra

Caderno Teórico

Disciplina: Gestão e Organização de Empresas

Licenciatura: Contabilidade & Auditoria

Ano letivo de 2022/23– 2º Semestre


Gestão e Organização de Empresas

Índice

Texto nº 1 – A Empresa: Objetivos e Finalidades – J. P. Marques & G. Silva 3

Texto nº 2 – Aptidões dum Administrador Eficaz – R. Katz 20

Texto nº 3 – Administração Contingencial da Empresa – I. Chiavenato 36

Texto nº 4 – A Estrutura Organizacional: Dimensões, Determinantes e Formatos – M. Cunha 55

Texto nº 5 – A Motivação dos Recursos Humanos na Empresa - J. P. Marques & G. Silva 76

Texto nº 6 – Liderança – A. Calheiros 90

Texto nº 7 – Inovar sem Risco – E. Neves 117

Texto nº 8 – A Mudança Organizacional e a Inovação – J. P. Marques & P. Santos 146

Texto nº 9 – Conceitos Fundamentais de Marketing – M. Abreu 173

Texto nº 10 – Função Recursos Humanos – A. Calheiros 195

Texto nº 11 – Conceitos Fundamentais de Estratégia – G. Silva 208

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Gestão e Organização de Empresas

TEXTO Nº 1
A EMPRESA OBJETIVOS E FINALIDADES
João Paulo Marques & Gabriel Silva

1. A empresa enquanto organização social

A empresa enquanto organização social


O Conceito de Organização
O que é organizar?

Sob o ponto de vista conceptual, poderemos considerar três diferentes níveis de resposta ou, três
diferentes visões sobre esta realidade.
— Uma visão operacional
— Uma visão dinâmica
— Uma visão concreta ou social

• Na acepção operacional:
Organização corresponde ao "trabalho de estruturação organizacional", e pretende-se a este nível
recobrir o conjunto de tarefas concretas tais como as de:
1. Identificação e quantificação das tarefas a realizar segundo o tipo, o grau de dificuldade e as
competências requeridas pela concretização de um dado trabalho global, como por exemplo
o de fabricar um carro, ou uma porta, ou conceder um crédito ou vender um programa de
férias.
2. Distribuição de tarefas pelas pessoas que as devem realizar, afectando pessoas a postos de
trabalho
3. Agregação de postos de trabalho e agrupamento de pessoas segundo critérios de
homogeneização, de modo a criar diferentes departamentos ou serviços, supervisionados por
um dirigente comum.
4. Delegação da autoridade, com consequente estabelecimento de relações de subordinação e
de comunicação entre as pessoa de modo a melhorar a execução das tarefas.
Nesta acepção organizar significa desenvolver a aplicação dos métodos de divisão técnica do trabalho
como solução para o problema do aumento da produtividade do trabalho humano.
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Gestão e Organização de Empresas

• Na acepção dinâmica:
Organização corresponde à acção de organizar com responsabilidade do dirigente.
Organizar é aqui o acto de ordenar os diferentes futuros desejados para a organização, ou
seja organizar corresponde aqui ao trabalho dos dirigentes de topo das organizações.
Assim, nesta acepção a organização consiste no estabelecimento de objectivos, na sua coordenação e
integração em planos coerentes, bem como na respectiva afectação de meios e na contextualização
destes programas de acção.
Então a acção da gestão no plano da organização envolve:
• a determinação das actividades necessárias ao alcance dos objectivos planeados (vide
especialização)
• o agrupamento dessas actividades numa estrutura lógica (vide departamentalização)
• a afectação das actividades a posições e pessoas (vide cargos e tarefas)

• Na acepção concreta ou social:


Organização é agora a realidade da própria estrutura organizativa concreta.
Cada estrutura organizativa sendo um conjunto de tarefas agregadas em funções, onde através
da conjugação do esforço de um dado grupo de pessoas se atingem objectivos pré-determinados,
tem uma certa materialidade expressa pelo seu organigrama. Neste caso a organização é assim o
grupo concreto de pessoas, os dirigentes, os professores e os funcionários do ISCAC, que mediante
uma actuação preconcebida e articulada prosseguem uma finalidade comum (recomenda-se a
observação do Guia Escolar 1999/2000 e respectivos organigramas)
Sob este ponto de vista, Organização corresponde ao grupo social concreto, capaz de formular
objectivos que, através das suas actuações articuladas, prossegue uma finalidade comum, dividindo
tarefas, numa base de especialização e estabelecendo redes de comunicação entre si, sendo toda a
estrutura supra ordenada por um ou mais centros de poder que dão direcção à actuação da
organização.
Em síntese:
• Organização constitui o trabalho de estruturação da actividade de produção de objectos e serviços
comercializáveis;
• Organização constitui o trabalho da actividade de gestão e liderança dos grupos sociais mobilizados
para a produção de objectos e serviços comercializáveis;
• Organização constitui a realidade social dos grupos humanos de constituição deliberada e orientados
para uma finalidade comum, que articulando entre si tarefas diferenciadas, procuram desenvolver

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Gestão e Organização de Empresas

estratégias de melhoria da produtividade do trabalho global do grupo assim constituído.

2. Os Objectivos nas Empresas/Organizações

Como vimos uma organização é toda a entidade social deliberadamente constituída e orientada para
o cumprimento de objectivos, superando por esta via as limitações naturais que decorrem das
capacidades limitadas de cada sujeito que integra essa organização.
Conceptualmente, o tipo de objectivos assumidos por cada organização, definem a sua natureza e
legitimam como objecto social concreto a sua existência, sendo que todos conhecemos organizações
tão diversas tais como:
• as empresas
• as mais diversas instituições da administração pública;
• as associações de todo o tipo
• as fundações
• os partidos políticos, ou
• os clubes
de que em simultâneo somos empregados, clientes, utentes, associados, ou militantes,...

Isto é:
todas estas entidades compartilham o facto de constituírem conjuntos humanos formalizados
e hierarquizados, orientados, para o cumprimento de determinados fins e para o assegurar da
cooperação e da coordenação de todos os seus membros.
Tais objectos sociais correspondem aos empreendimentos humanos de constituição intencional,
com os quais se pretende atingir determinados objectivos, os quais devem ser sempre verificáveis.
Tais organizações tendo em comum o facto de constituírem grupos humanos orientados para a
acção, diferenciam-se em função:
• dos objectivos particulares de cada organização
• das tecnologias utilizadas
• dos mecanismos de coordenação e autoridade implementados
• dos modos de legitimação do poder operacionalizados.

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A Natureza dos Objectivos

Objectivos = Realidades simbólico-reais

São realidades virtuais e simbólicas, são situações desejadas, i.e., são algo que existe ex-ante e que
condiciona o desenvolvimento da acção.

Funções dos objectivos:


1. O de legitimação da existência da organização (=Fonte de legitimação)
2. O de direccionamento da actividade em relação ao futuro (= Padrões)
3. O de monitorização do funcionamento da organização (= Unidades de medida)
4. O de suporte aos dispositivos de motivação/incentivo (=Tensores motivacionais)

A que critérios devem obedecer o estabelecimento de objectivos?


• Devem decorrer da definição de missão da organização
• Devem ser operacionalizáveis
• Devem ser mensuráveis
• Devem ser consistentes
• Devem permitir a concentração de recursos e de esforços
e ainda ...
• Devem ser fixados para todas as áreas da empresa/organização
• Devem organizar-se numa arborescência do geral para o particular
• Devem ser datados, a curto, médio e longo prazo
• Devem ser realizáveis mas suficientemente ambiciosos
• Devem ser específicos
O processo de estabelecimento de objectivos numa organização é um processo de interacção com a
envolvente dessa organização, processo em que os diferentes actores internos e externos jogam um
papel activo. De modo a facilitar a compreensão da natureza desta interacção vejamos os casos da
co-incineração de resíduos industriais perigosos (RIP) e os casos dos efluentes das indústrias do
papel, ou ainda os casos da indústria automóvel, onde independentemente de razões de mera
eficiência produtiva tem de ser considerados nos processos internos de tomada de decisão factores,
tais como os associados à opinião pública, ou à regulamentação económica anti-poluição.

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Gestão e Organização de Empresas

O desfecho do caso da co-incineração é conhecido, a postura anti poluição da indústria do


papel é também hoje consensual e a estratégia de reciclagem da indústria automóvel constitui um
importante argumento de diferenciação.
Muito genericamente poderemos, identificar como grandes objectivos naturais das organizações
empresariais o do:
• Proporcionar competitivamente a satisfação de necessidades de bens e serviços
comercializáveis;
• Proporcionar emprego produtivo a todos os factores de produção utilizáveis na economia de
mercado;
• Proporcionar o bem-estar social através do emprego dos diferentes factores produtivos;
• Proporcionar um retorno justo pela utilização dos diferentes factores produtivos.
• Proporcionar um adequado clima social de integração, capaz de satisfazer as necessidades
humanas.
Estes objectivos devem ser vistos dinamicamente no quadro do processo de relação interna e
externa da organização, desenvolvendo-se a partir daí todo o processo de planeamento que conduz
ao estabelecimento de estratégias, planos, programas, políticas e procedimentos os quais conferem à
organização alguma previsibilidade e automatização.

3. As empresas enquanto sistemas abertos: A empresa e a envolvente.

Por sistema, entendemos todo o conjunto de elementos, interrelacionados e que nessa relação
constituem um todo.
Um sistema é dito aberto, quando este se inscreve num ambiente que o pode transformar ou
que ele próprio eventualmente pode transformar.
A organização das empresas papeleiras tem em consideração o impacto social que processos
tecnológicos ambientalmente activos têm numa opinião pública favorável às causas ambientais, bem
como as estratégias de empresas como a Coca-cola, a Benetton, a Nestlé, ou a Levís condicionam a
evolução dos estilos de vida, da cultura e dos hábitos de consumo de uma população.
A empresa é assim uma organização com objectivos próprios, parte de um sistema social mais
vasto no qual se integra. A empresa é assim um sistema que interage com outros sistemas que
constituem o universo social económico tecnológico e cultural de cada civilização, e sendo um
sistema tem objectivos próprios, assim como os tem as suas diversas partes constituintes, sejam estas
os seus diferentes departamentos, serviços ou pessoas que as integram.

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Gestão e Organização de Empresas

Uma rede de interacção entre o sistema empresa e outros sistemas


(stakeholder view)

Trabalhadores Distribuidores
Clientes

$ Trabalho $ Bens/Serv. $

Bens/Serv $ Operadores
Sub
contratantes
Empresa $ Financeiros

$
Bens Públicos
Bens/Serv

$ $ $ $
Fornecedores Sócios/Acionistas Estado

Na figura acima, diagramamos dois tipos de fluxos: financeiros, dinheiro que correspondem a
pagamentos, desembolsos ou reembolsos e económicos, ou seja que correspondem a bens e serviços,
que ainda poderemos reagrupar sob a forma de fluxos de:
• Consumo (trabalho+ dinheiro)
• e os que tornam o consumo possível ( ordenados + bens e serviços)
Ou seja, na perspectiva desta visão, a principal função da empresa na sociedade é a de, na interacção
com os diferentes sistemas que se localizam na sua envolvente, CRIAR E DISTRIBUIR RIQUEZA.

A análise ambiental
Poderemos arrumar os dados referentes à contextualização da actividade da empresa em dois
grandes grupos de informação:

• o que se refere ao conhecimento da envolvente imediata ou específica ou também


conhecida como transaccional, que tem como característica essencial o facto de as forças
e actores que a integram se relacionarem directamente com o negócio da empresa, pelo
que as acções e estratégias recíprocas condicionam directamente a posição competitiva da
empresa.
Ou seja:

• Os consumidores, cujo conhecimento habilita a empresa com a informação indispensável à


identificação de oportunidades;
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Gestão e Organização de Empresas

• Os concorrentes, cujo conhecimento também habilita a empresa com a informação


indispensável à identificação de oportunidades, pois estes podem não estar a satisfazer
adequadamente necessidades identificadas pelos seus clientes, ou ameaças que estes
poderão eventualmente, pelas mesmas razões, representar para a nossa posição
competitiva;
• Os distribuidores, cujo conhecimento igualmente habilita a empresa com a informação
indispensável à identificação de oportunidades, ou as ameaças, à nossa posição
competitiva;
• o que se refere ao conhecimento da envolvente mediata ou geral ou também conhecida
como contextual, que tem como característica o facto de as forças e actores que a integram
constituírem o sistema social e económico onde a empresa se insere, pelo que apenas
indirectamente, influenciam o negócio da empresa, e muito menos as acções e as estratégias
da empresa podem condicionar fácil e directamente tais forças e actores.

Ou seja em síntese:
• Politico Legais
•Situação político institucional
•Ordem constitucional
•Legislação
• Económica
• Fiscal
• Administrativa
• Laboral
• Económicas
• Valor e evolução do PIB
• Valor e evolução da taxa de inflação
• Valor e evolução da taxa de juro
• Valor e evolução da produtividade
• Valor e evolução do índice de poder de compra, sua distribuição regional e social
• Evolução da Balança Comercial
• Politicas económicas
• Sócio-culturais
• Conflituosidade social
• Grupos sociais, étnicos ou religiosos
• Nível de escolaridade
• Atitude face ao trabalho

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• Expectativas face ao trabalho


• Valores, atitudes, normas de vida, estilos de vida
• Instituições e legislação de protecção cívica
• Tecnológicos:
• Política de I&D
• Tecnologias de produção
• Infra estruturas científicas
• Ligações Universidade / Empresas
• Nível de conhecimentos técnicos e científicos
• Inovação e divulgação de novas tecnologias

Diagrama das forças condicionantes da acção empresarial e dos seus principais parceiros

ESTADO
Mercado de Bens e Serviços Intermédios Mercado de Bens Finais

Instituições
Distribuidores
Consultores Clientes

Organizações
Profissionais

Concorrentes
Fornecedores

Organizações A Empresa
Os Actores Internos:
Organizações
Empresariais +Dirigentes
+Quadros Consumidores
+Trabalhadores

Sindicatos Factoring

Leasing

Seguradoras
Banca Sócios ou
accionistas

Mercado de Trabalho Opinião Mercado de Capitais

Pública
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Gestão e Organização de Empresas

4. Os recursos das empresas


Os factores trabalho e capital
Conforme irão estudar nas disciplinas de Economia, a teoria económica arruma os inúmeros
factores produtivos utilizados na empresa segundo duas grandes classes: a do trabalho e a do capital,
procurando-se actualmente desenvolver modelos onde um terceiro factor, o conhecimento, seja
considerado.
Os Recursos podem então ser classificados em 3 categorias:
1. Recursos Tangíveis: 1. Recursos físicos materiais, tais como os diferentes equipamentos,
indispensáveis ao desenvolvimento do processo produtivo e a respectiva gestão; e 2. os
recursos financeiros exigidos pelo financiamento do investimento realizado pela empresa e a
respectiva gestão.
2. Recursos Humanos, indispensáveis ao funcionamento geral da organização, tais como: 1.
Habilidades e conhecimento especializados, 2. Comunicação e Aptidões interactivas e 3.
Motivação individual, de entre os quais se destaca o ―capital Humano‖ da empresa;
3. Recursos Intangíveis, os quais incluem o conjunto das competências e capacidades da
organização e dos seus membros, tais como: 1. Tecnologia, que se traduz pelo conjunto dos
conhecimento científicos e técnicos directamente aplicáveis à produção de bens e serviços ou
ao melhoramento dos já existentes; 2. Reputação, a qual configura a imagem e o prestígio
alcançados e 3. Cultura, a qual constitui o conjunto dos valores, crenças, hábitos, atitudes e
comportamentos implícitos ou explícitos, os quais condicionam a actividade global da
organização.

Eficácia versus Eficiência


Em toda e qualquer organização confrontamo-nos com a necessidade de monitorizar o seu
funcionamento.
Para atingirmos este objectivo criamos sistemas de indicadores de desempenho, que nos
permitam proceder a esta monitorização.
Muito genericamente poderemos ―arrumar‖ estes indicadores entre duas grandes classes, a
dos indicadores de Eficácia e a dos indicadores de Eficiência, ou seja entre a avaliação da capacidade
de atingir objectivos, contra os meios e recursos sacrificados na produção/disponibilização por
unidade de produto, respectivamente. Este duplo controle, assume particular importância na medida

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Gestão e Organização de Empresas

em que tanto importa avaliar a capacidade de cumprir objectivos, como a de avaliar o custo suportado
pela organização com cada unidade de produto disponibilizado.

A mensuração excessiva
Pretende-se que as organizações, nomeadamente as empresas sejam as unidades sociais mais
eficientes e produtivas de entre todos os grupos humanos. Como vimos a eficácia de uma organização
específica em que medida esta atinge os seus objectivos, enquanto a sua eficiência nos dá a leitura
sobre a quantidade de recursos sacrificados para se obter uma unidade de produto.

Sob pressão da nossa cultura racional as organizações impacientam-se com a sua avaliação,
resultando do esforço de verificação da nossa posição relativa e da sua melhoria situações muitas
vezes indesejáveis sob ponto de vista dos objectivos das organizações.

Na medida em que certos aspectos são mais mensuráveis do que outros, pode-se estimular a
produção de itens de fácil mensuração, contra os que são mais dificilmente avaliáveis assim deformar
alguns dos esforços da organização. Se enfatizo os aspectos de produção numa dada fábrica posso
subalternizar os aspectos qualitativos e se centro a minha análise na qualidade arrisco por exemplo os
aspectos de manutenção ou de controle de custos.

Este problema da dupla avaliação, qualitativa versus quantitativa, não é fácil de no terreno
resolver, sendo apenas importante que as organizações tenham consciência de que muitas das suas
medidas de avaliação, estão longe de serem precisas, podendo assim o processo de atribuição de demasiada
importância a alguns indicadores de êxito da organização em detrimento de outros, constituir um factor
de deformação dos objectivos da organização que inevitavelmente conduz a uma perda de eficiência e
de eficácia que se procura atingir.

Quando o número de cirurgias constituem o principal referencial de avaliação de um serviço,


o número de clientes ligados a uma rede de comunicações, ou por exemplo o número de estudantes,
sem que se ponderem itens, tais como qualidade de vida pós operatória, rendimento e perfil de
consumo ou êxito académico, poderemos facilmente cair em situações em que o desvio entre
objectivos e práticas organizacionais conduzem a perdas de eficiência e eficácia.

5. Os níveis de actuação da Gestão


O principio da divisão técnica do trabalho determina a especialização dos diferentes postos de
trabalho e consequentemente a criação de diferentes órgãos, num movimento em que se procede a

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Gestão e Organização de Empresas

uma separação entre tarefas de execução e tarefas de concepção, planeamento, coordenação e


controle.
Na organização artesanal do trabalho humano, que dominou até ao desenvolvimento dos
sistemas de produção em fábrica, o artesão controlava o trabalho global associado aos diferentes
processos produtivos, concebendo, planificando e executando, enquanto nos processos de trabalho
em fábrica cada operador domina apenas um fragmento desse trabalho global, decorrendo daqui a
dicotomização das estruturas organizativas, entre execução e direcção e controlo e naturalmente o
trabalho de enquadramento e de gestão.
A racionalidade clássica (the best way) recomendava contra a imprevisibilidade do comportamento
humano, uma concepção de organização do trabalho que seguia uma única solução, a da especialização
sistemática do trabalho. Este modo de organizar gera estruturas organizativas em que se considera a
existência de mais de um nível de coordenação e controle:
• O nível institucional ou estratégico
• O nível intermédio ou gestionário ou de enquadramento
• O nível operacional ou técnico

Hierarquização dos diferentes níveis de gestão

Nível Institucional, ou nível +Incerteza⇒Eficácia


estratégico
Nível Intermédio, ou mediador, ou táctico ou Flexibilidade
de gestão ou de enquadramento...
-Incerteza⇒Eficiência
Nível operacional ou nível técnico
Nível

Estabelece Objectivos
Avalia alternativas estratégicas+Planifica a Longo prazo
Nível Institucional Toma decisões globais
Estabelece Políticas

Estabelece Objectivos departamentais+Avalia Resultado


Avalia alternativas tácticas
Nível Intermédio Elabora e implementa planos tácticos

Avalia alternativas operacionais


Nível operacional Avalia a acção diária
Implementa a operação quotidiana

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6. Os gestores e as suas Funções


Os Gestores e as suas funções
A qualquer nível de execução ou de hierarquia de uma organização, o gestor ou o operador,
para realizarem o seu trabalho, devem dominar um certo número de competências.
Na literatura de gestão no que se reporta ao conceito de competência é abundante a grande
diferença de opiniões, pelo que, entre outras, tomámos a definição de R. Katz para quem:
• no caso dos postos de trabalho de administração, competência constitui o domínio de uma
dada forma de habilidade: habilidade técnica; habilidade humana e habilidade conceptual, que
cada dirigente deve possuir.

O que é a competência técnica?


• É a habilidade em usar, conhecimentos técnicos apropriáveis,
• procedimentos e regras de despacho específicas.
Esta competência habilita o gestor a responder às diferentes situações de trabalho, é uma habilidade
treinável, apropriável e por conseguinte passível de ser melhorada

O que é a competência humana?


• Claramente a habilidade ou capacidade de trabalhar em grupo: motivando as pessoas;
envolvendo-as quer verticalmente quer horizontalmente, compreendendo-as enquanto
pessoas e enquanto membros do grupo de trabalho.
Esta competência é mais inata do que apropriável todavia também é treinavél e por conseguinte
melhorável.

O que é a competência conceptual?


• Etimologicamente, claramente o que o espírito concebeu, o que é relativo à concepção, à
ideia, à imaginação, é um construto abstracto e geral.

Nesta ordem de ideias: É a habilidade ou capacidade de imaginar a organização como um todo


integrado, de antecipar como é que eventuais alterações numa parte afectam o todo. É a habilidade
ou capacidade de coordenar e integrar os diferentes interesses e actividades
Ao longo dos diferentes postos de trabalho, posicionados na estrutura hierárquica, iremos
encontrar, por partes dos gestores, diferentes necessidades de domínio destas supracitadas

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Gestão e Organização de Empresas

habilidades, diferença que se estabelece em função do âmbito de actuação de cada gestor em


particular.
Deste modo a ―distribuição‖ destas competências, como é natural, é muito assimétrica no que
se reporta às competência conceptual, sendo esta mais importante no topo do que na base da organização;
assim como à técnica, é mais importante na base do que no topo, e muito simétrica no que se reporta
ás competências humanas, cujo domínio é exigido a qualquer nível organizacional.
Distribuição das exigências em competências de Gestão pelos diferentes Níveis de Gestão

AD M I N I S T R AÇ ÃO
M I S S ÃO E
O b j e c ti v o s G E S T ÃO
E s tr a té g i c o s E S T R AT É G I C A
O b j e c ti v o s
de
G e s tã o

O b j e c ti v o s O p e r a c i o n a i s

PIRÂM IDE DE OB JECTIVOS PIRÂM IDE DE COM PETÊNCIAS

Tipos de empresas
Poderemos considerar diferentes tipologias para classificar as empresas:
1. Estatuto dos detentores do capital
2. Dimensão
3. Ramo de actividade
4. Predominância dos factores produtivos
5. Âmbito territorial de actuação
6. Nacionalidade
Desenvolvendo alguns destes critérios:
Quanto à dimensão temos:
→ Grandes empresas
→ Médias empresas
→ Pequenas empresas
→ Micro empresas
Critérios
Nível de actividade: volume de negócio, ou volume de operações, nº de trabalhadores,

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Gestão e Organização de Empresas
Património envolvido no negócio: activo líquido total, capitais próprios.

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Gestão e Organização de Empresas

Quanto à actividade temos:


→ Industriais
→ Serviços
Critérios
Principal actividade desenvolvida pela empresa

Quanto à forma de gestão temos:


→ Privadas
→ Públicas
→ Mista
→ Cooperativas
Critérios
Consideração do estatuto do principal accionista.

1.6 -Os Gestores e as suas funções


O Problema
Que actividade é desenvolvem os gestores e os administradores, ou seja em que consiste o
―trabalho‖ de gestão?
De acordo com os postulados clássicos diríamos que:
• planeiam,
• organizam,
• lideram e
• controlam as suas organizações.
Ou talvez não, como o concluem outros autores...
Um dos trabalhos mais interessantes sobre a actividade dos Gestores é da autoria de Henry
Mintzberg.

O Contributo de Mintzberg
De acordo com o autor todos os administradores desenvolvem um conjunto organizado de
actividades mormente de ordem:
• interpessoal
• informativa
• decisória
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Gestão e Organização de Empresas

Ou seja representam papeis de diferente ordem, que se supra ordenam em função dos objectivos da
organização.

Que papéis interpessoais?


• de SIMBOLO
• O de LÍDER
• O de ELEMENTO DE LIGAÇÃO

O de Símbolo
Personificação dos sucessos e insucessos da organização, o que obriga o administrador a
desenvolver um importante trabalho protocolar.
Ex. saudar, cumprimentar, visitar, almoçar, ocupar tempos livres com iniciativas cooperativas...

O de Líder
Os administradores agem através de terceiros, a liderança é um processo de gestão da
subordinação. Liderar é obter subordinação, usando o poder de que se está investido para obter
obediência e através desta unidade na acção.

O de elemento de ligação
Constantemente os administradores agem no sentido de estabelecer redes internas
ou externas de cooperação que garantem a sobrevivência da organização.

Os Papéis de informação
O DE COLETOR/MONITOR DE INFORMAÇÃO
O DE DISSEMINADOR/DIFUSOR DE INFORMAÇÃO
O DE PORTA VOZ

Os Papéis decisórios
DE ENTREPRENEUR/INOVADOR
DE SOLUCIONADOR DE PROBLEMAS/CONTROLADOR DE TURBULÊNCIAS
DE AFECTADOR DE RECURSOS
DE NEGOCIADOR

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Gestão e Organização de Empresas

O CICLO DA GESTÃO

Planeamento

RECTROACÇÃO
ORGANIZAR
LIDERAR

AVALIAÇÃO

CONTROLO

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Gestão e Organização de Empresas

TEXTO Nº 2
APTIDÕES DE UM GESTOR EFICAZ
Robert L. Katz

APTIDÕES DUM ADMINISTRADOR EFICAZ


Embora seja geralmente reconhecido que a selecção e preparação de bons administradores constitui um dos
problemas mais prementes da indústria americana, surpreendente constatar a falta de consenso entre os
executivos e educadores quanto às características que definem um bom administrador. Os programas de
aperfeiçoamento de executivos de algumas das principais empresas e universidades do país reflectem uma
enorme variação de objectivos.

Na base desta diferença, vamos encontrar a procura, por parte da indústria, dos traços ou atributos que
permitirão definir objectivamente o "executivo ideal", habilitado a lidar eficazmente com qualquer problema em
qualquer organização. Um observador da indústria americana comentou recentemente:

"A suposição de que existe um executivo - padrão é largamente aceite, tanto aberta como implicitamente.
No entanto, é de presumir que qualquer executivo sabe que uma empresa precisa de vários tipos de
gestores, para diferentes níveis. As qualidades mais necessárias ao encarregado de uma oficina são
provavelmente opostas as exigidas para um vice-presidente coordenador da produção. A literatura referente
ao aperfeiçoamento do executivo está repleta de tentativas de definição das qualidades necessárias aos
executivos e, por si só, elas apresentam-se cheias de lógica. Poucos, por exemplo, poriam em dúvida o facto
de um gestor de topo precisar de possuir uma boa capacidade de julgamento, de capacidade de tomada de
decisões, capacidade para merecer o respeito dos outros e todos os outros ―chavões‖ já gastos que qualquer
homem de negócios poderia mencionar. Mas basta-nos dar uma vista de olhos pelos bons directores de
qualquer empresa para perceber quanto as suas diferentes e particulares capacidades diferem de qualquer
lista ideal das virtudes do executivo"

No entanto, esta busca do estereótipo do executivo tornou-se tão intensa em muitas empresas que, ao
concentrarem-se certas características e qualidades, correm o risco de perder de vista o seu aspecto essencial:
aquilo que um homem pode realizar.
A finalidade deste artigo é apresentar aquilo que poderemos considerar como a maneira mais útil de
abordar a escolha e o aperfeiçoamento de administradores. Esta abordagem baseia-se não tanto naquilo que os
bons executivos são (as suas características pessoais inatas), mas antes naquilo que eles fazem (os t i p o s
d e a p t i d õ e s d e m o n s t r a m possuir na eficiente execução das suas funções). Tal como utilizadas aqui,
aptidões subentendem uma capacidade que pode ser desenvolvida, não é necessariamente inata, e que se
manifesta em termos de "performance" e não meramente em termos de potencial.

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Gestão e Organização de Empresas

Assim, o principal critério de qualificação do que é uma aptidão devera corresponder à actuação eficaz em
condições variáveis.
Esta abordagem sugere que uma administração eficaz se baseia em três aptidões básicas passíveis de
se desenvolverem, o que logo evita a necessidade de definir características específicas e pode proporcionar
uma maneira útil de observar e compreender o processo de administração. Esta abordagem deriva da observação
directa dos executivos em acção, aliada a estudos em curso sobre administração.
Nas secções que se seguem tentaremos definir e demonstrar o que são estas três aptidões; mostrar que a
importância relativa das três aptidões varia conforme o grau de responsabilidade administrativa; apresentar
algumas das implicações desta variação na selecção, treino e promoção de executivos; e propor formas de
desenvolver estas mesmas aptidões.

A FÓRMULA DAS TRÊS APTIDÕES


Partimos da definição de que um administrador é a pessoa que:
a) dirige as actividades de outras pessoas, e
b) toma a responsabilidade de atingir certos objectivos através do desenvolvimento dessas
actividades.

Dentro desta definição, uma administração bem-sucedida parece apoiar-se em três aptidões básicas, a
que chamaremos técnica, humana e conceptual.
Não seria realístico afirmar que estas aptidões não estão inter-relacionadas, no entanto, haverá mérito
em examinar cada uma de per si e desenvolvê-las independentemente.

A aptidão técnica
Tal como a utilizamos aqui, aptidão técnica sugere um conhecimento de, e uma perícia em, um tipo específico
de actividade, particularmente se essa actividade abranger métodos, processos, procedimentos ou técnicas.
É - nos relativamente fácil visualizar a aptidão técnica do cirurgião, do músico, do contabilista ou do engenheiro,
quando cada uma deles está a desempenhar as suas funções. Aptidão técnica implica conhecimento
especializado, capacidade analítica dentro da sua especialidade, e facilidade na utilização das ferramentas e
técnicas da disciplina específica.
Das três aptidões descritas neste artigo, a aptidão técnica é talvez a que nos é mais familiar porque é a
mais concreta e também porque, na nossa era de especialização, é a aptidão mais solicitada ao maior número
de pessoas. A maior parte dos nossos programas de formação vocacional no local de trabalho estão
essencialmente virados para o desenvolvimento desta aptidão técnica especializada.

A aptidão humana
Tal como a utilizamos aqui, aptidão humana é a capacidade do executivo trabalhar eficazmente como membro
de um grupo e de promover uma colaboração dentro da equipa que lidera. Ao passo que a aptidão técnica se
preocupa principalmente em trabalhar com "coisas" (processos ou objectos físicos), a aptidão humana, dirige-se
principalmente ao trabalho com pessoas. Esta aptidão é demonstrada pela forma como um indivíduo percebe (e

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Gestão e Organização de Empresas

identifica as percepções de) os seus superiores, os seus colegas e os seus subordinados, e a forma como
subsequentemente se comporta.
A pessoa possuidora de aptidão humana bem desenvolvida tem consciência das suas próprias atitudes,
presunções e crenças em relação a outros indivíduos e grupos; é capaz de ver a utilidade e as limitações destes
sentimentos. Ao aceitar a existência de pontos de vista, percepções e crenças diferentes dos seus, está apto a
compreender o que os outros realmente querem dizer através das suas palavras e comportamento. Tem
igualmente a capacidade de comunicar aos outros, nos seus respectivos contextos, aquilo que ele pretende
significar com o seu próprio comportamento.
Uma tal pessoa trabalha no sentido de criar uma atmosfera de aprovação e segurança na qual os
subordinados se sentem livres de se expressar sem receios de censura ou de se ridicularizarem, e isso através
do encorajamento a que participem no planeamento e execução de tudo aquilo que os afecta directamente.
Essa pessoa é suficientemente sensitiva às necessidades e motivações dos outros elementos da sua empresa
para poder ajuizar das possíveis reacções a, e resultados de várias alternativas de acção que possa vir a
empreender. Devido a essa sensibilidade, ele poderá e virá a actuar duma forma que tenha em conta essas
percepções dos outros.
O verdadeiro talento em trabalhar com outros deve tornar-se numa actividade natural e contínua, já
que isso implica perceptibilidade não só nos momentos de decisão, mas também em relação ao comportamento
do indivíduo no dia - a - dia. A aptidão humana não pode ser "uma coisa para de vez em quando". As técnicas
não podem ser aplicadas ao acaso, nem os traços de carácter se podem pôr ou tirar como um sobretudo. E
como tudo o que um executivo diz ou faz (ou deixa por dizer ou por fazer) se vai repercutir nos seus
associados, a sua verdadeira personalidade acaba sempre por transparecer. Donde, para se ser eficaz, esta
aptidão tem que ser desenvolvida natural e inconscientemente, mas também de forma consistente e
demonstrada em todos os actos do indivíduo. Tem que se tornar parte integrante de todo o seu ser.
Porque a aptidão humana desempenha um papel tão vital em tudo o que um administrador faz, é mais
fácil descrever exemplos de atitudes inadequadas do que de performance altamente conseguidas. Talvez a
apreciação de uma situação real sirva para ilustrar o que pretendemos dizer:
Quando se instalou um tapete rolante numa fábrica de sapatos onde, até então, os operários usufruíam
da liberdade de estabelecer o seu próprio ritmo de trabalho, o director da produção pediu ao engenheiro
industrial que projectara o tapete que servisse de encarregado, e isso apesar de lá haver um encarregado
qualificado. O engenheiro, que trabalhava sob as ordens directas do director de produção, protestou; mas
acabou por aceitar o cargo, sob pressão, "até se encontrar um encarregado adequado", apesar de o seu posto
actual ser acima daquelas funções. Travou-se então o seguinte diálogo:

Director de Produção: Tenho tido muita experiência de tapetes rolantes. Quero que mantenha o tapete a
funcionar ininterruptamente, com excepção dos períodos de repouso, e a funcionar a toda a velocidade.
Ponha esta gente a pensar em termos de 2 pares de sapatos por minuto. 70 dúzias de pares por dia, 350
dúzias de pares por semana. Todos eles são operários qualificados nos seus sectores respectivos, e é
apenas uma questão de conseguir que eles trabalhem de maneira ligeiramente diferente. Quero que

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Gestão e Organização de Empresas

consiga atingir uma média-base de 250 dúzias de pares por semana S " (Esta média-base fora calculada
ligeiramente abaixo da capacidade máxima. Mas era 50% mais elevada do que a do antigo sistema).

Engenheiro: Se vou ser o encarregado do tapete rolante, quero fazer as coisas à minha maneira. Já
trabalhei com tapetes rolantes, e não concordo com a sua teoria de começar por habituar as pessoas à
velocidade máxima. Esta gente nunca viu um tapete rolante. Vai assustá-los. Gostaria de o por a
correr a um terço da velocidade durante umas semanas e então, gradualmente, aumentar a velocidade.
Acho que devemos começar por estabelecer a média-base (quota de produção abaixo do bónus de
incentivo) num esquema diário em vez de semanal. (Anteriormente os operários eram pagos na base
de peça acabada por dia.)
Sugiro ainda que a média-base diária seja de 45 ou até de 40 dúzias de pares. Tem que se
estabelecer uma média-base suficientemente baixa, para que eles a possam atingir. Assim, logo que
eles reconheçam que podem atingir, esforçar-se-ao por conseguir o bónus.

Director de Produção: Faça como quizer quanto à velocidade; mas não se esqueça de que os
resultados é que contam. Quanto à média-base, não vou discuti-la consigo; estou a dizer-lhe que tem
que atingir as 250 dúzias de pares por semana. Não quero uma média-base diária. "

Temos aqui um caso em que o director de produção estava tão preocupado em obter a produção física
que não prestava qualquer atenção às pessoas através das quais essa produção tinha que ser atingida. Repare-
se, em primeiro lugar, que obrigou o engenheiro que projectara o tapete a servir de encarregado, esperando
aparentemente levá-lo a justificar o seu projecto através da consecução duma produção máxima. No entanto, o
director de produção parecia esquecer
a) que o engenheiro interpretou esta nomeação como uma despromoção, e
b) que o engenheiro precisava de poder controlar as variáveis, já que ficava responsável por uma
produção máxima. Em vez disso, o director de produção impôs uma produção standard e recusou-
se a fazer alterações no ritmo de trabalho.
Além disso, e embora se tratasse de ama situação completamente nova para os operários, o director de
produção pretendia que eles apresentassem de imediato uma produção muito superior à anterior e isso apesar
de os operários irem defrontar-se com um sistema de produção que lhes era desconhece do, de nunca terem
antes trabalhado em equipa, de os operários e o novo encarregado nunca terem trabalhado juntos até ali, e de
o próprio encarregado discordar dos níveis e objectivos de produção. Ao ignorar todos estes factores humanos,
o director de produção não só colocou o engenheiro numa posição delicada e difícil, como também, ao
recusar-lhe "conduzir as coisas à sua maneira", desencorajou qualquer atitude de tomada de responsabilidade
que, no fundo, pretendia, ao nomeá-lo para o cargo.
Nestas circunstâncias, é fácil compreender como se deterioraram as relações entre estes dois elementos,
e como a produção, ao fim de dois meses, se encontrava em apenas 125 dúzias de pares por

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Gestão e Organização de Empresas

semana (exactamente 75 % do que fora a produção com o antigo sistema).

Aptidão Conceptual
Tal como a utilizamos aqui, aptidão conceptual tem a ver com a capacidade de ver a empresa como um todo;
isso corresponde a reconhecer como as varias funções de uma empresa dependem umas das outras, e como
qualquer alteração em qualquer dos seus sectores se reflecte em todos os outros; e alarga-se a visualizar o
relacionamento da empresa individual com a indústria, com a comunidade, e com as forças políticas, sociais e
económicas da nação em geral. Ao reconhecer este relacionamento è apreender os elementos significativos de
qualquer situação, o administrador fica em posição de actuar por forma a melhorar o bem estar geral de toda a
empresa.
Donde que o sucesso de qualquer decisão dependa da aptidão conceptual das pessoas que tomam as
decisões e das que as põem em execução. Quando, por exemplo, se faz uma alteração importante na política
de marketing, é vital que se considerem os seus efeitos sobre a produção, sobre os serviços de controle,
financeiros e de investigação e sobre as pessoas abrangidas. E mantém-se igualmente vital até ao último
executivo abrangido pela implementação da nova política. Se cada executivo reconhecer o relacionamento geral
e o significado da mudança, será certamente muito mais eficaz a administrá-la. E, consequentemente, muito
maiores são as suas chances de sucesso.
Não é só a coordenação eficaz dos vários sectores da empresa que depende da aptidão conceptual dos
administradores em causa, mas também todo o futuro e o "tom" da organização. As atitudes de gestores de
topo "tonalizam" o carácter geral da capacidade de resposta de uma empresa e determinam a sua
"personalidade empresarial", que distingue a actuação de uma determinada empresa da das outras. Estas
atitudes são o reflexo da aptidão conceptual do administrador (a que alguns chamam de "capacidade criativa" -
a forma como ele se apercebe e reage quanto à direcção em que a empresa se deve expandir, aos objectivos e
políticas da empresa, e aos interesses dos accionistas e dos empregados).
Aptidão conceptual, tal como a descrevemos, é aquilo a que se refere Chester I. Barnard, antigo
presidente da NEW JERSEY BELL TELEPHONE COMPANY, ao dizer : "... o aspecto essencial do processo (da
administração) é o sentir a organização como um todo, e a situação geral em relação a ela." Temos à nossa
volta inúmeros exemplos de falta de aptidão conceptual. Apresentamos seguidamente um caso:
Numa grande fábrica com uma grande tradição de trabalhos por encomenda, a responsabilidade
primária do controle da produção estava entregue aos encarregados e outros supervisores dos escalões
inferiores. Operações do tipo "aldeia" com pequenos grupos de trabalho e organização informal eram a regra.
Logo após a Segunda Grande Guerra, um pesado fluxo de encomendas fez triplicar as necessidades normais de
produção e aumentou severamente a matéria colectável da fábrica. Nessa altura, foi admitido um novo director
de produção que estabeleceu um largo esquema de controlos e formalizou toda a estrutura de produção.
Enquanto durou o "boom", os empregados fizeram todos os esforços para se adaptarem ao novo contexto e
processos. Mas quando a procura baixou para os níveis anteriores a Guerra, surgiram graves problemas
laborais, a fricção era grande entre as chefias de departamentos, e a empresa viu-se a braços com pesados
custos laborais indirectos. A administração optou por regressar ao sistema antigo; despediu o director de
produção e tentou atribuir de novo mais autoridade aos encarregados. No entanto, durante os quatro anos de
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Gestão e Organização de Empresas

controlo formalizado, os encarregados tinham abandonado os seus velhos hábitos, vários tinham deixado a
empresa, e não se tinham desenvolvido substitutos adequados. Assim, sem a liderança de bons encarregados,
os métodos tradicionais de trabalho por encomenda tornaram-se onerosos e ineficazes.
Neste caso, quando se instalou o novo sistema de controlo de produção e organização formalizada, a
direcção não previu as respectivas consequências no caso só de uma futura redução de actividade. Mais tarde,
quando as condições se alteraram e se tornou necessário reduzir a actividade, a administração outra vez foi
incapaz de prever as implicações da sua actuação e optou pelo antigo sistema que já não era apropriado
naquele momento. A dupla falta de aptidão conceptual deixou a companhia em grave desvantagem
relativamente à concorrência.
Uma vez que o sucesso geral de uma empresa se encontra de pendente da aptidão conceptual dos seus
executivos em determinar e por em execução decisões sobre a política empresarial, esta aptidão é o ingrediente
unificante e coordenador do processo de administração, de alcance global inegável.

IMPORTÂNCIA RELATIVA
É de reparar que, de um modo muito real, a aptidão conceptual engloba os conceitos de aptidão técnica e
aptidão humana dentro da empresa. No entanto, o conceito de aptidão, como a capacidade de converter
conhecimentos em acção, devia permitir-nos fazer a distinção entre as três aptidões: a de levar a cabo as
actividades técnicas (aptidão técnica), a de compreender e motivar os indivíduos e grupos (aptidão humana), e
a de coordenar e integrar todas as actividades e interesses da empresa tendo em vista um objectivo comum
(aptidão conceptual).
Esta divisão de uma administração eficaz em três aptidões básicas é principalmente útil para efeitos de
análise. Na prática, estas aptidões estão tão intimamente interligadas que é difícil determinar onde uma acaba e
a outra começa. No entanto, só porque elas se encontram assim interligadas, não quer dizer que não seja útil
analisá-las separadamente, ou variando a sua ênfase. Ao jogar golfe, a acção das mãos, dos pulsos, das ancas,
dos ombros, dos braços e da cabeça está toda ela interligada; no entanto, para melhorar a tacada, é por vezes
necessário aperfeiçoar um destes elementos separadamente. E também a importância relativa destes elementos
varia em situações diferentes. Do mesmo modo, embora todas três sejam importantes a todos os níveis
administrativos, as aptidões técnica, humana e conceptual do administrador variam em importância relativa nos
diferentes níveis de responsabilidade.

Nos escalões inferiores


A aptidão técnica é responsável por muitos dos grandes avanços da indústria moderna e indispensável a uma
actividade eficiente. No entanto, é mais importante nos escalões inferiores de administração. A medida que o
administrador se afirmar cada vez mais da produção física, esta aptidão técnica torna-se progressivamente
menos importante, desde que tenha subordinados capazes e possa ajudá-los a resolver os seus próprios
problemas. No topo da cadeia hierárquica, a aptidão técnica pode ser quase nula e no entanto o executivo ser
capaz de um desempenho eficiente, se tiver aptidão humana e conceptual apuradas. Por exemplo:
Numa grande empresa produtora de bens de primeira necessidade, o "controller" foi nomeado para
substituir o vice-presidente de produção que fora subitamente acometido de doença grave. O “Controller” não
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Gestão e Organização de Empresas

tinha qualquer experiência de produção, mas trabalhava na companhia há mais de vinte anos e conhecia de
perto muitos dos principais elementos da produção. Ao nomear um corpo de consultores e delegar um invulgar
grau de autoridade nos seus chefes de departamento, pôde dedicar-se ele próprio à coordenação das várias
funções. Deste modo, conseguiu formar uma equipa altamente eficiente. Os resultados traduziram-se em
custos mais baixos, maior produtividade, e um moral muito superior ao que alguma vez existira na divisão da
produção. A administração apostara na capacidade deste homem de trabalhar com as pessoas como mais
importante do que a sua falta de prática na produção técnica... e ganhara a aposta.
Temos inúmeros outros exemplos à nossa volta. Todos nós conhecemos aqueles "directores
profissionais" que se estão a tornar nos protótipos do nosso moderno mundo executivo. Estes homens
transitam com grande à vontade de uma indústria para outra, aparentemente - sem qualquer perda de
eficiência. As suas aptidões humana e conceptual parecem compensar perfeitamente a sua falta de
familiaridade com os aspectos técnicos do seu novo emprego.

Em todos os escalões
A aptidão humana - a capacidade de trabalhar com os outros - é essencial para uma eficaz administração a
todos os níveis. Um estudo recente provou que a aptidão humana é de importância primordial ao nível do
encarregado, fazendo notar que a principal função do encarregado, como administrador, é conseguir a
colaboração entre os elementos de um grupo de trabalho. Um outro estudo reforça este ponto de vista
alargando-o ao grupo administrativo intermédio, acrescentando que o administrador deve essencialmente
preocupar-se em facilitar a comunicação adentro da organização. E um outro estudo, ainda que dedicado
sobretudo ao escalão superior de administração, minimizou a necessidade de auto observação e de sensibilidade
às relações humanas por parte dos executivos desse escalão. Todos estes pontos de vista parecem indicar que
a aptidão humana é de grande importância a todos os níveis, mas repare-se nas diferenças de ênfase.
A aptidão humana parece ser mais importante nos escalões inferiores, em que o número de contactos
directos entre administradores e subordinados é mais elevado. Conforme se vai subindo nos escalões
hierárquicos da administração, o número e frequência destes contactos pessoais diminui, e a necessidade de
aptidão humana torna-se proporcionalmente menor, embora não em absoluto desnecessária. Ao mesmo tempo,
torna-se progressivamente mais importante a aptidão conceptual, face à necessidade de decisões de política
empresarial e acção em larga escala. Neste ponto, a aptidão humana para lidar com as pessoas fica subordinada
ã aptidão conceptual de integração dos interesses e actividades do grupo num todo.
Com efeito, um recente trabalho de pesquisa pelo Prof. Chris Argyris da Universidade de Yale, dá-nos o
exemplo de um director de fábrica extremamente eficiente, o qual, apesar de possuir tão pouco aptidão
humana como se verá, foi mesmo assim muito bem sucedido:
Este director, chefe duma divisão muito autónoma, através da sua forte personalidade e da "pressão"
exercida, tornou os seus supervisores altamente dependentes de si próprio no que respeitava a "recompensas,
penalizações, autoridade, perpetuação, comunicação e identificação".
Como resultado, os supervisores passavam a vida a competir uns com os outros pela preferência do
director. Só lhe contavam aquilo que achavam que ele queria ouvir, e passavam a maior parte do tempo a
tentar descobrir o que ele quereria. Dependiam dele para a definição dos seus objectivos, e a maneira de os
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Gestão e Organização de Empresas

atingir. Como o director era inconsistente e de comportamento imprevisível, os supervisores sentiam-se


inseguros, e envolviam-se continuamente em disputas interdepartamentais que escondiam do director.
É óbvio que faltava aqui a aptidão humana. No entanto, segundo a avaliação dos seus superiores e
devido aos resultados obtidos no aumento de eficiência, dos lucros e do moral, este director era altamente
eficaz. O Prof. Argyris sugere que os empregados das modernas organizações industriais têm uma certa
tendência para criar um clima de dependência nos seus superiores, dependência essa que indivíduos atentos e
hábeis conseguem utilizar em seu proveito.
Dentro do contexto da fórmula das três aptidões, parece que este director conseguiu tirar proveito
desta dependência na medida em que percebeu o inter-relacionamento de todas as actividades sob o seu
controle, se identificou com a empresa e sublimou os interesses individuais dos seus subordinados em relação
aos seus (da empresa) interesses, definiu os seus objectivos realisticamente, e mostrou aos seus subordinados
a forma de os atingir. Isto parece-nos um excelente exemplo duma situação em que uma forte aptidão
conceptual compensou largamente a ausência de aptidão humana.

No escalão superior
A aptidão conceptual, tal como se viu nas secções precedentes, torna-se cada vez mais crucial nos postos
executivos de maior responsabilidade, onde os seus efeitos são maximizados e mais facilmente observados.
Aliás, pesquisas recentes levam à conclusão de que no escalão superior de administração esta aptidão
conceptual se torna a mais importante de todas. Como disse Herman Wi-Steinkraus, presidente da
BRIDGEPORT BRÁS S COMPANY:
"Uma das lições mais importantes que aprendi neste cargo (a presidência) é a importância de coordenar os
vários departamentos para que formem uma equipa eficaz, e, em segundo lugar, a alternância de ênfase,
de tempos a tempos, sobre a importância dos vários departamento relativamente à empresa. "
Parece, assim, que nos escalões inferiores da responsabilidade administrativa, são mais necessárias as aptidões
técnica e humana. Nos escalões mais elevados, a aptidão técnica torna-se relativamente menos importante,
enquanto que aumenta rapidamente a necessidade de aptidão conceptual. No escalão superior duma
organização, a aptidão conceptual torna-se a mais importante de todas para uma administração bem sucedida.
Um executivo-chefe pode ser falho de aptidões técnica e humana e ser na mesma eficaz se tiver subordinados
com fortes capacidades nesses campos. Mas se possuir fraca aptidão conceptual, poderá pôr em perigo toda a
organização.

IMPLICAÇÕES SOBRE A ACÇÃO


Esta fórmula das três aptidões sugere que poderão resultar notáveis benefícios da redefinição dos objectivos
dos programas de aperfeiçoamento de executivos, através da redefinição da colocação de executivos nas
empresas e da revisão dos procedimentos de avaliação e selecção dos futuros executivos.

Aperfeiçoamento de Executivos
Muitos programas de aperfeiçoamento de executivos podem não estar a atingir resultados satisfatórios pela sua
incapacidade de estimular o desenvolvimento destas aptidões administrativas. Os programas que se

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Gestão e Organização de Empresas

concentram na mera transmissão de informação ou no aprimoramento de características específicas mostrar-se-


iam largamente improdutivos na sublimação das aptidões administrativas dos candidatos.
Um director de uma grande companhia responsável pelas actividades de aperfeiçoamento dos
executivos da sua empresa descrevia-me recentemente da seguinte forma um programa exclusivamente
informativo:
"O que nós estamos a tentar é juntar os nossos jovens mais promissores com os nossos executivos
mais velhos, em reuniões mensais regulares. E então os jovens podem fazer perguntas sobre os antecedentes
da empresa e ―como‖ e porquê as coisas se faziam dantes."
Nada nos surpreende que nem os executivos mais velhos nem os jovens sentissem que este programa
lhes trazia qualquer melhoria das suas capacidades administrativas. A futilidade de insistir em características
específicas torna-se evidente se repararmos no comportamento dum administrador num certo número de
situações. Ao lidar com estas diferentes situações, ele pode por vezes demonstrar uma característica num caso
- por exemplo, dominador em relação aos subordinados, e uma atitude diametralmente oposta num outro
conjunto de circunstâncias - por exemplo, permissividade face aos seus superiores. E no entanto, em cada
caso, estará provavelmente agindo da .forma mais apropriada para atingir os melhores resultados. Qual, então,
deveremos nós considerar como a característica desejável? Seguidamente, mais um exemplo deste dilema:
Um director de vendas duma empresa da Costa do Pacifico tinha grande reputação de determinação e
dinamismo. No entanto, quando lhe pediram que designasse um assistente substituto de entre os seus vários e
qualificados subordinados, ele esquivou-se deliberadamente a tomar uma decisão. Os seus colegas rapidamente
repararam naquilo que parecia uma obvia incapacidade de decisão.
Mas ao fim de vários meses tornou-se claro que ele tinha estado, discretamente, a dar aos vários
vendedores a oportunidade de demonstrarem as suas atitudes e sentimentos. Consequentemente, foi-lhe
possível descobrir uma forte inclinação por um homem cuja subsequente promoção foi entusiasticamente aceite
por todo o grupo.
Neste caso, a habilidosa táctica do director de vendas fora indevidamente interpretada como
"incapacidade de decisão". A preocupação dos seus parceiros com características irrelevantes levou-os a
negligenciar a sua meritória actuação. Não teria sido mais apropriado concluir que o seu talento humano no
lidar com os outros lhe tinha permitido adaptar-se eficazmente aos requisitos duma situação nova?
Casos como este servem para demonstrar que mais vale julgar um administrador pelos resultados da
sua "performance" do que pelas suas características aparentes. As aptidões são mais fáceis de identificar do
que as características, e têm menos probabilidades de ser mal interpretadas. Além disso, as .aptidões constituem
um ponto de referência de melhor aplicação directa para o aperfeiçoamento do executivo, já que qualquer
melhoria nas aptidões dum administrador resultará necessariamente numa actuação mais eficaz.
Ainda um outro perigo em muitos dos existentes programas de aperfeiçoamento de executivos encontra-
se no injustificado entusiasmo com que algumas empresas e universidades se lançaram em cursos de "relações
humanas". Parece haver aqui dois riscos inerentes:
1. Os cursos de relações humanas podem estar apenas a transmitir informação ou técnicas
específicas, em vez de desenvolverem a aptidão humana dum indivíduo;

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Gestão e Organização de Empresas

2. Mesmo que se verifique um aperfeiçoamento individual, algumas empresas podem estar a esquecer
es requisitos de treino para posições cimeiras ao colocar toda a ênfase na aptidão humana.
Podem correr o risco de produzir homens com uma aptidão humana altamente desenvolvida, mas
falhos da aptidão conceptual que lhes permitiria tornarem-se administradores eficazes.
Pareceria, então, importante que o treino dum candidato a um posto administrativo fosse dirigido para o
desenvolvimento das aptidões de que mais necessitara no nível de responsabilidade para que esta a ser
considerado.

Colocação de Executivos
Este conceito das três aptidões sugere de imediato a possibilidade de se criarem equipas de administração
constituídas por indivíduos com aptidões complementares. Por exemplo: uma empresa retalhista do Centro-
Oeste, de dimensão média, tem como presidente um homem de invulgar aptidão conceptual mas com uma
aptidão humana extremamente reduzida. No entanto, tem dois vice-presidentes com aptidão humana
excepcional. Estes três homens constituem uma comissão executiva que se tem evidenciado pelo seu êxito, pois
as aptidões de cada um dos seus membros compensam as deficiências dos outros. Talvez seja também de
assinalar o plano de direcção por "liderança conjunta" constituída por dois elementos, propôs to por Robert P.
Bales, segundo o qual um dos líderes mantêm a "chefia das operações" enquanto o outro assegura a "chefia
social".

Selecção de Executivos
Hoje em dia vem-se recorrendo muito a vários tipos de testes para tentar predeterminar as capacidades de
um possível candidato a um determinado lugar. Os executivos vêm sendo testados a tudo, desde a "capacidade
de decisão" à "conformidade". Estes testes, como o indicava um recente artigo da "FORTTUNE", deram
resultados muito duvidosos no que respeita à actuação "em campo". Não seria muito mais produtivo
preocuparmo-nos mais com aptidão na prática do que com um número de características que não dão
garantias no desempenho?
Esta fórmula das três aptidões toma os testes de carácter desnecessários e substitui-os por
procedimentos que examinam a capacidade de um indivíduo lidar com os problemas e situações reais que virá a
encontrar no seu trabalho Estes procedimentos, que indicam o que é que um indivíduo pode fazer em situações
específicas, são os mesmos tanto para a selecção como para a avaliação do aperfeiçoamento. Serão descritos
mais abaixo, no capítulo sobre o aperfeiçoamento dos talentos do executivo.
Esta fórmula sugere que os executivos não devem ser escolhidos com base na sua aparente posse de um certo
número de características de comportamento, mas sim com base na sua posse das aptidões necessárias para o
nível específico de responsabilidade a que se destinam.

APERFEIÇOANDO AS APTIDÕES
Já há anos que muita gente argumenta, que a capacidade de chefia é inerente a uns quantos indivíduos.
Referimo-nos a "chefes-natos", "executivos-natos", "vendedores-natos". É indubitável que algumas pessoas

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Gestão e Organização de Empresas

possuem naturalmente, ou de forma inata, maior aptidão ou capacidade em certos campos. Mas as pesquisas
psicológicas e fisiológicas também indicam, primeiro, que aqueles que possuem fortes aptidões ou capacidades
podem aperfeiçoar a sua aptidão pela prática e formação; em segundo lugar, que mesmo aqueles que não
possuem essa capacidade inata podem melhorar o seu performance e eficácia geral.
A noção de aptidão de administração sugere que podemos esperar melhorar a nossa eficácia
administrativa e preparar melhores administradores para o futuro. Esta noção de aptidão subentende "learning
by doing", isto é, aprender fazendo. As pessoas são diferentes aprendem de maneiras diferentes, mas as
aptidões são desenvolvidas através da prática é relacionadas a aprendizagem com a experiência pessoal e os
antecedentes de cada um. Se for bem feito, o treino nestas aptidões básicas administrativas deverá desenvolver
capacidades executivas mais seguramente e mais rapidamente do que através de qualquer experiência
desorganizada. Quais são, então, algumas das formas de levar a cabo esta formação?

Aptidão Técnica
O desenvolvimento da aptidão técnica tem merecido grande atenção, desde há muitos anos, por parte tanto da
indústria como das instituições de ensino, e muitos progressos se tem feito. Uma boa instrução básica dos
princípios, estruturas e processos da especialidade individual, aliada à própria prática e experiência, durante as
quais o indivíduo é observado e ajudado por um superior, parece ser o sistema mais eficaz. Dada a vasta
quantidade de trabalho dedicado ã formação das pessoas nas aptidões técnicas, desnecessário seria alargarmo-
nos sobre o assunto neste artigo.

Aptidão Humana
A aptidão humana, no entanto, tem sido muito menos compreendida, e só recentemente se vêm fazendo
progressos sistemáticos no seu desenvolvimento. Várias universidades e profissionais dos nossos dias vêm
adoptando muitas e diferentes formas de desenvolver a aptidão humana. Todas estas fórmulas têm as suas
raízes em disciplinas tais como a psicologia, a sociologia e a antropologia.
Algumas destas fórmulas encontram a sua aplicação na "psicologia aplicada", no "engineering humano",
e em toda uma série de outras manifestações que exigem que técnicos especializados ajudem o homem de
negócios nos seus problemas humanos. Como aspecto prático, no entanto, o executivo deverá aperfeiçoar a
sua própria aptidão humana, de preferência a ter que recorrer a conselhos alheios. Para ser eficaz, convirá que
desenvolva o seu próprio ponto de vista em relação à actividade humana, por forma a:
a) identificar os sentimentos e opiniões que ele próprio traz a uma situação;
b) ter uma atitude em relação às suas próprias experiências que lhe permita reavaliá-las e tirar
delas ensinamentos;
c) desenvolver a capacidade de compreender o que os outros estão a tentar comunicar-lhe
(explicita ou implicitamente) através das suas palavras e actos; e
d) desenvolver a capacidade de conseguir com êxito comunicar aos outros as suas ideias e atitudes.
Alguns indivíduos conseguem desenvolver esta aptidão humana sem qualquer formação formal específica.
Outros poderão ser ajuda dos individualmente pêlos seus superiores imediatos, como parte integrante do

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Gestão e Organização de Empresas

processo de "preparação" que descreveremos mais adiante. Como é óbvio, esta ajuda, para ser eficaz,
dependerá do grau de aptidão humana que o superior possuir.
Para grupos maiores o uso do método dos casos, aliado a "role-playing" improvisado, pode ser muito
mais eficaz. Esta formação pode ser feita numa base formal ou informal, mas de vê ser orientada por um
instrutor qualificado e requer uma sequência de actividades organizada. Constituirá uma aproximação da
realidade tão boa quanto possível numa sala de aulas, e fornecerá uma oportunidade de reflexão crítica que
nem sempre se apresenta na vida real. Um dos aspectos importantes do processo é a auto-análise dos
conceitos e valores do próprio educando, que poderá permitir-lhe o desenvolvimento de atitudes mais úteis em
relação a si próprio e aos outros. Com essa mudança de atitude, é de esperar que talvez lhe apareça também
uma aptidão activa para tratar os problemas humanos.
A aptidão humana também já foi testada em salas de aulas, dentro de limites razoáveis, através de
uma série de análises de descrições detalhadas de situações reais abarcando decisões de administração,
simultaneamente com várias oportunidades de desempenho de papéis em que se pediu ao indivíduo que
interpretasse em pormenor a actuação que sugerira. Deste modo pôde ser avaliada a percepção que o indivíduo
teve da situação gerai, e a sua própria capacidade de a resolver.
No emprego propriamente dito, não deverão faltar oportunidades de um superior observar a capacidade
de um indivíduo trabalhar eficazmente com os outros. As avaliações, aqui, poderão parecer altamente
subjectivas e a sua validade dependente da aptidão humana do avaliador. Mas, no fundo, e em última
análise, toda e qualquer promoção não dependerá ela sempre da apreciação subjectiva de alguém? E devemo-
nos censurar essa subjectividade, ou, pelo contrário, fazer um esforço maior para aperfeiçoar pessoas dentro
das nossas empresas cuja aptidão humana lhes permitirá fazer apreciações eficazes?

Aptidão Conceptual
A aptidão conceptual, tal como a aptidão humana, não tem sido bem compreendida em geral. Têm sido
experimentados vários métodos de aperfeiçoamento desta aptidão, com êxito variável. A maior parte dos
melhores resultados foram conseguidos através da "preparação" de subordinados pêlos seus superiores. Isto
não é uma ideia nova. Isto implica, sim, que uma das principais responsabilidades do executivo é ajudar os
seus subordinados a desenvolver o seu potencial administrativo. Uma das formas de um superior ajudar à
"preparação" do seu subordinado é atribuindo-lhe uma determinada responsabilidade, e depois corresponder
com perguntas explorativas e opiniões, de preferência a dar respostas, cada vez que o subordinado solicitar a
sua ajuda. Quando "Benjamin F. Fairless era presidente-executivo da UNITED STATES STEEL CORPORATION
(agora é presidente do Conselho de Administração), eis como descrevia a sua actividade de "preparação":
"Quando um dos meus vice-presidentes, ou o chefe de uma das nossas companhias de operações, me vem
pedir inspiração, eu respondo-lhe geralmente contrapondo perguntas. Às tantas, está ele próprio a dizer-me
como resolver o problema."
É evidente que este é um processo ideal e inteiramente natural de treino administrativo, e que se aplica
tanto ao desenvolvimento da aptidão técnica e humana como da conceptual. No entanto, o seu êxito depende
necessariamente das capacidades e da boa vontade do superior em ajudar o subordinado. Outra excelente
maneira de desenvolver a aptidão conceptual é trocando de funções, isto é, fazendo rodar pelas diferentes
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Gestão e Organização de Empresas

funções da empresa os jovens mais promissores, mas sempre no mesmo nível de responsabilidade. Isto dá ao
indivíduo a oportunidade de, literalmente, "se colocar no lugar do outro".
Há outras possibilidades que incluem: tarefas, especiais, muito particularmente do tipo que envolvam
problemas interdepartamentais? e reuniões da direcção, tais como o plano de Administração Múltipla da
McCORMICK, no qual os executivos mais novos servem de conselheiros à Direcção Geral sobre assuntos de
política empresarial.
Para grupos maiores, o tipo de curso por método dos casos anteriormente descrito pode ser útil, mas
utilizando apenas casos que abranjam política geral de administração e coordenação interdepartamental. Os
cursos deste tipo, geralmente denominados "Gestão Geral" ou "Política de Empresa" vão-se generalizando cada
vez mais.
Também nas salas de aula a aptidão conceptual vem sendo avaliada com razoável eficácia, através da
apresentação de descrições detalhadas de situações concretas e complexas. Nestas, é pedido ao indivíduo que
está a ser examinado que defina uma modalidade de acção que se ajuste às condições subjacentes de cada
situação, e que tome em consideração as implicações dessa acção nas várias funções e sectores da empresa e
no seu meio envolvente.
No emprego, um supervisor atento terá certamente inúmeras oportunidades de observar até que ponto
o indivíduo é capaz de se conjugar a si e ao seu trabalho, com as outras funções e actividades da empresa.
Tal como a aptidão humana, também a aptidão conceptual deve tornar-se uma parte natural, integrante, da
caracterização do executivo. Poder-se-iam indicar diferentes métodos para o aperfeiçoamento de pessoas
diferentes, em função dos seus antecedentes, atitudes e experiência. Mas em qualquer desses casos, deverá
ser escolhido o método que melhor permitirá ao executivo desenvolver a sua aptidão pessoal de "visualizar a
empresa como um todo e de coordenar e integrar as suas várias partes.

Conclusão
A finalidade deste artigo foi a de demonstrar que uma administração eficaz depende de três aptidões pessoais
básicas, que denominámos de técnica, humana e conceptual. O administrador devera possuir:
a) aptidão técnica suficiente para executar a parte mecânica dum determinado trabalho de que é
responsável;
b) aptidão humana suficiente no trabalho com outras pessoas, por forma a tomar-se um eficaz
membro de grupo e a conseguir criar um esforço de cooperação adentro da equipa de chefia;
c) aptidão conceptual suficiente para identificar o inter-relacionamento dos vários factores envolvidos
na sua posição, o que o levara a determinar a acção que provavelmente obterá os melhores
resultados para toda a organização.
A importância relativa destas três aptidões parece variar com o nível de responsabilidade administrativa.
A níveis inferiores, são principalmente necessárias as aptidões técnica e humana. A níveis superiores, a eficácia
do administrador depende sobretudo das aptidões humana e conceptuais. No topo, a aptidão conceptual torna-
se a mais importante de todas para uma administração bem sucedida.
Esta fórmula das três aptidões faz notar que um bom administrador não o é desde o berço; essa
capacidade pode ser cultivada. Ela transcende a necessidade de descobrir características específicas,
31
Gestão e Organização de Empresas

esforçando-se antes por encontrar uma forma mais útil de ver o processo de administração. E como ajuda a
determinar as "aptidões mais necessárias aos diferentes níveis de responsabilidade, pode tornar-se muito mais
útil, na selecção, formação e promoção de executivos.

COMENTÁRIO RETROSPECTIVO
Quando da primeira publicação deste artigo, ha quase 20 anos, havia grande tendência no sentido de se tentar
estabelecer um conjunto ideal de traços de carácter que permitiria distinguir de imediato uma potencial aptidão
executiva. A procura desse tipo de personalidade prosseguia energicamente na esperança de se poder levar a
cabo de forma mais segura a selecção e a formação de administradores.
A finalidade deste artigo foi a de tentar chamar as atenções para aptidões visíveis de "performance",
em vez de para as características inatas / aptidões de administração. E, ao descrever os três tipos de aptidões
(técnica, humana e conceptual), tentamos também realçar a importância da aptidão conceptual como sendo a
capacidade de administração unicamente valida e isto muito antes de o conceito de estratégia empresarial ter
sido bem definido e largamente difundido.
Continua a parecer-nos útil pensar em capacidade de administração em termos destas três aptidões
básicas. E continuamos a achar que a importância relativa destas aptidões varia com o nível de administração
do indivíduo dentro da empresa. Por outro lado, a minha experiência ao longo dos últimos 20 anos, em que
trabalhei lado-a-lado com os principais executivos de uma vasta gama de indústrias, sugere que certos pontos
específicos precisam de ser ou drasticamente modificados ou substancialmente retocados.

Aptidão Humana
Presentemente, sou da opinião que este tipo de aptidão poderá vantajosamente subdividir-se em:
a) capacidade de liderança na sua própria unidade, e
b) aptidão para as relações inter-grupos.

Pela minha experiência, pude constatar que uma elevada capacidade num destes casos corresponde
frequentemente a um desempenho medíocre no outro.
Muitas vezes, os chefes de departamento mais eficientes internamente são os que se dedicaram de
corpo e alma apenas aos valores e critérios das suas funções especializadas, sem reconhecerem que os
diferentes valores de outros departamentos podem ser minimamente válidos. Por exemplo, um director de
produção pode ser altamente eficiente ao por toda a ênfase na obtenção de um elevado grau de confiança nos
seus prazos de produção. Esse director vai opor-se a todas as pressões externas que dêem maior prioridade a
outros critérios que não o da entrega do produto no prazo estipulado. Ou então teremos o caso do director de
vendas muito eficiente que põe toda a ênfase em manter relações positivas com os clientes. Este director irá
fazer resistência a todas as pressões que pretendam pôr a ênfase noutros valores tais como facilidade de
produção ou venda de produtos com margem de lucro mais elevada. Em qualquer destes casos, o director
contará provavelmente com o apoio enérgica dos seus subordinados, que partilham a mesma escala de valores.
Mas irá defrontar-se com um forte antagonismo por parte de outros departamentos com valores incompatíveis.

32
Gestão e Organização de Empresas

Na medida em que os valores de dois departamentos estejam em conflito, uma habilidosa relação inter-grupos
terá que recorrer a certas soluções de compromisso. Mas estas concessões são frequentemente interpretadas
como "traição" pelos subordinados departamentais. Assim, o director vê-se obrigado a escolher entre manter o
apoio total dos seus subordinados ou desfrutar da inteira colaboração dos seus pares e/ou superiores. Obter as
duas coisas raramente é possível. Consequentemente, sou forçado a rever a minha inicial avaliação do factor
humano, afirmando agora que as aptidões internas intra-grupo são essenciais nos cargos administrativos dos
escalões inferior e intermédio, e que as aptidões inter-grupo se tornam progressivamente mais importantes
nos escalões sucessivamente mais elevados da administração.

Aptidão Conceptual
Olhando para trás, vejo agora que aquilo a que chamei aptidão conceptual depende inteiramente duma forma
específica de visualizar a empresa. Este "ponto de vista de gestão geral" como se tornou conhecido, implica
pensar sempre em termos de: ênfases e prioridades relativas entre objectivos e critérios conflituantes? Tendências
e probabilidades relativas (em vez de "certezas"); duras correlações e normas entre os elementos (em vez de
relações causa-efeito perfeitamente definidas).
Sou agora muito menos categórico quanto à medida em que esta forma de pensar pode ser desenvolvida
no próprio trabalho. A não ser que uma pessoa tenha aprendido a pensar desta maneira desde muito cedo,
é irrealista esperar que uma grande mudança se verifique ao atingir o "status" de executivo. A rotação de
funções, tarefas especiais inter-departamentos, e o trabalhar com casos, tudo isso fornecera certamente
oportunidades de uma pessoa aperfeiçoar capacidades conceptuais anteriormente adquiridas. Mas pergunto-me
ate que ponto esta forma de pensar poderá ser inculcada numa pessoa já saída da adolescência. Sob este
prisma, então, talvez a aptidão conceptual deva ser considerada como uma capacidade inata.

Aptidão Técnica
Na versão original do artigo, alvitrei que aptidões técnicas específicas são irrelevantes nos níveis superiores de
gestão. Citei, como prova disso, a facilidade com que muitos gestores transitam de uma indústrias para as
outras sem qualquer perda aparente de eficiência.
Presentemente, sou da opinião de que esta mobilidade só é possível nas empresas muito grandes, onde o
director-geral dispõe, a nível de toda a organização, do apoio dum vasto "staff" e de técnicos altamente
competentes e experimentados.
Uma grande empresa já estabelecida há muitos anos atingiu uma boa velocidade de cruzeiro que
permite ao novo director-geral dedicar a sua atenção a decisões estratégicas.
Penso que nas empresas mais pequenas, em que a perícia técnica não é tão dominante, e onde se não dispõe
de tanto "staff" experimentado, o director geral precisa de muito mais experiência pessoal no ramo. Ele precisa
não só de saber quais as perguntas certas a fazer aos seus subordinados, como também tem de conhecer
suficientemente bem os antecedentes da empresa e do ramo para poder sopesar convenientemente as suas
respostas.

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Gestão e Organização de Empresas

Papel desempenhado pela Direcção Geral


No artigo de origem, expressei um ponto de vista demasiado simplista e ingénuo em relação ao papel do
director geral. Os meus longos anos de trabalho com presidentes de empresas, e a minha própria experiência
pessoal como director geral, fizeram-me olhar com muito mais respeito para as dificuldades e complexidade
desse papel. Sei agora que toda e qualquer decisão importante, por ter que atingir o equilíbrio entre tantos
valores, objectivos e critérios antagónicos, será sempre considerada "suboptimal" quando analisada sob um
qualquer prisma isolado. Toda e qualquer decisão ou escolha abrangendo a empresa como um todo, terá
efeitos negativos sobre alguns dos seus sectores.
O director geral tem que tentar aperceber-se dos conflitos a prever com exactidão o seu provável
impacto através da organização. Relutante mas deliberadamente, ele poderá ter que sacrificar os interesses de
um só sector a favor do bem do todo. Ele tem que ter abertura para aceitar soluções adequadas e exequíveis
para o contexto total, de preferência as soluções elegantes ou ideais dum ponto de vista único.
O director geral tem que ser não só um executante eficiente como também um estratega eficaz. É a ele que
cabe a responsabilidade de estabelecer o enquadramento e o rumo das operações da empresa em geral.
Compete-lhe determinar continuamente em que campos a empresa devera colocar a ênfase, em termos de
produtos, de serviços, e de clientes. Tem que definir critérios de "performance" e determinar as competências
distintivas que a companhia devera evidenciar. Precisa, também, de fixar prioridades e "timings". Tem que
estabelecer as normas e os controles, necessários para vigiar a boa marcha, e fixar limites ã actuação
individual. E tem ainda que obter para a empresa os recursos adicionais sempre que necessários.
Além de tudo isto, o director geral tem que saber mudar o seu estilo de gestão e jogar com o equilíbrio
entre as suas diferentes capacidades, de acordo com a alteração de condições ou consoante o crescimento da
sua empresa em tamanho e complexidade. O papel terapêutico (salvar a empresa quando esta se encontre em
situação difícil) exige acção humana drástica e faz sobressair as aptidões conceptual e técnica. O papel de
manutenção (conservar a empresa na sua posição actual) faz realçar a aptidão humana e exige apenas
modestas alterações técnicas e estratégicas. Mas o papel inovador (desenvolver e expandir a empresa) exige
elevada competência tanto ao aspecto conceptual como no de acção inter-grupo, sendo a contribuição técnica
fornecida primordialmente pêlos subordinados.
Na minha opinião, é impossível uma pessoa desempenhar bem todos estes papeis - em constante
mutação, sem qualquer ajuda. Por outro lado, como uma eficaz gestão da empresa como um todo envolve uma
constante sub-optimização, é impossível ao director geral conseguir o apoio contínuo e unânime de todos os
seus subordinados. Se for demasiadamente amistoso ou paterna lista poderá comprometer a sua eficácia ou a
sua objectividade.
No entanto, ele precisa de ter, algures dentro da empresa, um conjunto de indivíduos bem informados,
objectivos, compreensivos e apoiantes, com os quais possa livremente discutir/analisar as suas dúvidas, receios
e aspirações. Por vezes esta função poderá ser desempenhada por um director externo, um consultor externo,
ou pelo auditor da empresa. Mas um tal confidente precisa de possuir aptidões conceptuais e humanas tão
elevadas quanto as do próprio director geral; e, para ser de real utilidade, tem de conhecer a fundo a actividade
da empresa, o seu pessoal chave, e o sector de actividade. Este papel, regra geral, tem sido muito esquecido

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Gestão e Organização de Empresas

na discussão/análise de requisitos organizacionais, nas, na minha opinião, o seu correcto desempenho é


essencial para o êxito do director geral e da empresa.

Conclusão
Apercebo-me agora muito melhor de que os gestores a todos os níveis necessitam de alguma competência em
cada uma das três aptidões. Ate os responsáveis de nível mais baixo terão continuadamente de as utilizar. Lidar
com as exigências externas relativas ao departamento de um director requer uma aptidão conceptual; as
limitações dos recursos físicos e financeiros postos à sua disposição põem à prova a sua aptidão técnica; e as
capacidades e exigências das pessoas com quem lida tornam essencial que possua aptidão humana.
Um claro entendimento destas aptidões e das formas de medir a competência de um gestor em cada nível
continua a parecer-me o instrumento mais eficaz do escalão superior, não só para compreender o
comportamento do executivo, mas também para a selecção, formação e promoção de directores a todos os
níveis.

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Gestão e Organização de Empresas

TEXTO Nº 3
ADMINISTRAÇÃO CONTINGENCIAL DA EMPRESA
Idalberto Chiavenato

INTRODUÇÃO
As empresas constituem hoje uma das mais maravilhosas e complicadas invenções do génio criativo do homem.
As pessoas costumam admirar as maravilhosas e incríveis criações da moderna tecnologia, mas geralmente se
esquecem de que toda essa tecnologia é inventada, criada, projectada, dimensionada, produzida e
implementada dentro de empresas. As empresas constituem uma das mais complexas e multifacetadas invenções
do homem. Elas se manifestam sob diferentes formas e tamanhos extremamente variados. Elas se dirigem
para objectivos diversos e escolhem ramos de actividades que as levam a produzir produtos ou serviços
multivariados, operando em mercados diferentes. Basicamente, a Administração interpreta os objectivos
propostos pela empresa e os transforma em acção empresarial através de planeamento, organização, direcção
e controle de todos os esforços realizados em todas as áreas e em todos os níveis da empresa, a fim de
garantir o alcance daqueles objectivos. Assim, a administração se preocupa com a eficácia - quando está
voltada para o alcance dos objectivos empresariais - e se preocupa com a eficiência - quando está voltada para
o pleno proveito dos esforços realizados em todas as áreas e em todos os níveis da empresa. O significado e a
amplitude da palavra administração sofreu um formidável aprofundamento e ampliação nos últimos 80 anos. E
o administrador - seja ao nível da dirigente de empresa, gerente de departamento ou supervisor de secção -
passou a ser uma figura indispensável em todos os tipos possíveis de organizações humanas.
Provavelmente, uma das melhores maneiras de se mostrar o aprofundamento e ampliação do significado
da administração, seria percorrer rapidamente a sua trajectória e traçar em rápidas pinceladas os passos
gradativos da chamada teoria administrativa.

OS CINCO MOMENTOS DA TEORIA ADMINISTRATIVA


De facto. a teoria administrativa é uma teoria em crescente expansão e gradativamente abrangente. Começou
como uma teoria de sistema fechado, voltada inicialmente para alguns poucos aspectos e variáveis situados
dentro da empresa e preocupada exclusivamente com os problemas mais concretos e imediatos do ponto de
vista de sua aplicação e foi paulatinamente expandindo e ampliando o seu objectivo de estudo.
Essa expansão e ampliação não se apresenta de maneira uniforme, mas variando enormemente de
acordo com as escolas e teorias administrativas, e de acordo com os aspectos e variáveis que cada uma delas
considerou relevantes na sua época, para fundamentar as suas conclusões ou para solucionar os problemas
então mais importantes com que se defrontavam. No fundo, a teoria administrativa apresenta cinco momentos
bastante distintos em sua complicada linha de desenvolvimento.

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Gestão e Organização de Empresas

O primeiro momento: ênfase nas tarefas


O primeiro momento nasceu na virada deste século, a partir da Preocupação inicial de alguns engenheiros
americanos em racionalizar e metodizar as tarefas ao nível do operário e melhorar a eficiência do processo
produtivo. Assim, com a Administração Cientifica de Taylor, o primeiro momento reflecte a ênfase sobre a
tarefa. Até então, a escolha do método de trabalho era confiada ao próprio operário que se baseava na sua
própria experiência pessoal anterior para definir como iria realizar as suas tarefas. Taylor procurou tirar do
operário o direito de escolher a sua maneira pessoal de executar a tarefa – no que foi bem sucedido - para
impor-lhe um método planejado e estudado por um profissional especializado no planeamento de tarefas. Essa
administração das tarefas se assentava na organização racional do trabalho do operário que procurava localizar
o método (The Best Way) pelo qual o operário poderia se tornar eficiente.

O segundo momento: ênfase na estrutura


Rapidamente, se verificou que apenas a eficiência dos operários e das suas máquinas e linhas de montagem
não resolvia todos os problemas múltiplos e complexos da empresa como uma totalidade: tornava-se necessário
um estudo mais amplo da estrutura organizacional da empresa em termos globais. Assim, a ênfase sobre as
tarefas foi deslocada para ênfase na estrutura organizacional, marcando o inicio do segundo momento da teoria
administrativa. A ênfase sobre a estrutura organizacional apresenta duas linhas bem distintas e conhecidas:
de um lado a Teoria Clássica de Fayol e, de outro lado, a Teoria da Burocracia de Weber.
A primeira linhagem – a Teoria Clássica iniciada por Fayol - surgiu como uma abordagem
eminentemente normativa e prescritiva: como o administrador deve conduzir-se em todas as situações através
do processo administrativo e quais os princípios gerais da administração que deve seguir para obter a máxima
eficiência. Dentre os princípios gerais avultam os da divisão do trabalho, da especialização, da unidade de
comando, da amplitude de controle e da departamentalização. Mais recentemente, a teoria Clássica foi vestida
com nova roupagem e actualizada com um sentido altamente eléctrico com a Teoria Neoclássica. Mas a
preocupação com as regras do Jogo permaneceu fundamentalmente importante.
A segunda linhagem da ênfase sobre a estrutura organizacional desenvolveu-se a partir da Teoria da
Burocracia de Max Weber adaptada à administração das empresas. Segundo Weber, a organização formal
chamada burocracia apresenta algumas dimensões fundamentais, como formalização (ou seja, a definição por
escrito de todas as actividades, fazendo com que a organização opere de acordo com um conjunto de leis ou
regras aplicáveis a todos os casos, sem excepção), divisão do trabalho ou seja, cada participante tem um cargo
ou posição definidos com deveres oficiais especificados e delimitados), princípio da hierarquia (ou seja, cada
funcionário é submetido a uma hierarquia de autoridade, da qual recebe ordens impessoais), impessoalidade
(ou seja, a burocracia enfatiza os cargos e não as pessoas que os ocupam), selecção do pessoal pela
competência técnica e não por preferências pessoais, separação entre propriedade e administração e, sobretudo,
profissionalização do funcionário.
Dentro de um ponto de vista estritamente técnico, a burocracia atinge o mais alto grau de eficiência no
alcance dos objectivos empresariais, segundo Weber, pois ela representa o tipo de organização humana onde a
racionalidade atinge o seu mais elevado grau. A racionalidade aqui, significa a adequação dos meios para o
alcance de determinados fins ou objectivos. Contudo, certas consequências imprevistas - ou disfunções - podem
37
Gestão e Organização de Empresas

conduzir o modelo burocrático à ineficiência e à imperfeição. Mais recentemente, esses aspectos críticos da
organização burocrática foram exaustivamente estudados e analisados por muitos sociólogos. E o
desdobramento natural de suas conclusões conduz à Teoria Estruturalista, preocupada não apenas com a
análise organizacional, mas também com a análise interorganizacional, abordando a estrutura organizacional e
carregando fortemente nos conceitos inspirados na sociologia organizacional.

O terceiro momento: ênfase nas pessoas


O terceiro momento da teoria administrativa marca a ênfase sobre as pessoas e foi fruto da profunda influência
das ciências Comportamentais sobre a Administração, numa ferrenha tentativa de humanizar e democratizar as
práticas administrativas da época. É a chamada abordagem humanística, que procura enfatizar as pessoas
dentro das empresas, deixando em segundo plano as tarefas e a estrutura organizacional. A ênfase sobre as
pessoas pode ser desdobrada sequencialmente em duas escolas ou teorias: a Escola das Relações Humanas,
que teve inicio na década de 30, e a Teoria do Comportamento Organizacional que a sucedeu mais
recentemente. Esse terceiro momento marca a introdução de novos conceitos em administração: o de organização
informal, liderança, motivação, comunicação, dinâmica de grupo, estilos de administração, conciliação dos
objectivos empresariais e objectivos individuais, etc. Marca sobretudo, a preocupação de fazer com que as
pessoas participem e compartilhem no gestão das empresas.

O quarto momento: ênfase na tecnologia


O quarto momento da teoria administrativa é a ênfase na tecnologia e surge a partir da cibernética, da
automação, da robotização, da computação e dos seus profundos efeitos sobre as empresas e sua
administração. Muito embora a Administração Científica de Taylor e seus seguidores tenha se preocupado, em
sua época. com a tecnologia, suas incursões neste campo são estritamente limitadas ao nível da tarefa
individual de cada operário e são eminentemente concretas e imediatistas. Por incrível que possa parecer uma
das mais novas arcas de estudo da teoria administrativa é o estudo do papel da tecnologia na determinação da
estrutura e do comportamento organizacional das empresas. Alguns autores chegam ao exagero de salientar
que existe um ―imperativo tecnológico‖, ou seja, é a tecnologia quem determina a estrutura e o
comportamento organizacional de uma empresa. No fundo, para estes autores, a estrutura e os processos
empresariais nada mais são do que meios que a empresa utiliza para bem operar a sua tecnologia e obter dela
a máxima eficiência possível. A Teoria da Contingência - que assegura não haver nada de absoluto ou de rígido
em Administração - incumbiu-se de absorver rapidamente a preocupação com a tecnologia ao lado da
preocupação com o ambiente para definir uma abordagem mais ampla a respeito da administração e gestão
das empresas, cujas linhas básicas apresentaremos adiante.

O quinto momento: ênfase no ambiente


Com o advento da Teoria de Sistemas e sua gradativa incorporação à teoria administrativa, surge a ênfase no
ambiente e, a partir dai, as empresas passam a ser analisadas como sistemas abertos em contínuo intercâmbio
com o ambiente que as circunda externamente. Verificou-se que apenas o estudo das variáveis intra-
organizacionais – as variáveis endógenas - não proporcionava uma compreensão mais ampla e adequada da

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Gestão e Organização de Empresas

estrutura e comportamento organizacionais, tornava-se necessário o estudo das variáveis exógenas, situadas
fora dos limites da empresa e que influenciam poderosamente os seus aspectos estruturais e comportamentais.
As relações de interacção entre empresas e seus ambientes passaram a explicar com mais profundidade certos
aspectos da estrutura organizacional e dos processos operacionais utilizados pelas empresas. Essa ênfase no
ambiente surgiu com o aparecimento da Teoria da Contingência, segundo a qual não existe uma única e
―melhor maneira‖ (the best way) de organizar as empresas. Pelo contrário, as características estruturais das
empresas dependem das características ambientais que as circundam. Em outros termos, as características
estruturais são condicionadas fortemente pelas características ambientais. Alguns autores chegam a falar em
―imperativo ambiental‖ para explicar tal determinismo: as ―variáveis ambientais‖, são variáveis independentes e
os aspectos da estrutura organizacional são variáveis dependentes. Na medida em que uma empresa se situa
em um ambiente instável e mutável, ela precisa adaptar-se adequadamente para poder sobreviver.

PERSPECTIVAS FUTURAS DA ADMINISTRAÇÃO


Esses cinco momentos da teoria administrativa não são consecutivos, lineares e sequenciais. Ao contrário, eles
se sobrepõem, alcançam períodos de grande ressonância, ou de quase-abandono, retornam com novos
ingredientes. Todavia, em tempo algum, a ênfase nas tarefas, na estrutura organizacional e nas pessoas foi
abandonada. As ideias de Taylor, Fayol Weber e Elton Mayo permanecem até hoje, com roupagens que variam
com a moda.
Mas porque essas mudanças constantes na teoria administrativa? A resposta está no facto de que a
teoria administrativa nada mais é do que o suposto repositório das soluções aos principais problemas que
rondam as empresas a cada momento. Realmente, os problemas não mudam. Surgem novos problemas e os
antigos permanecem sob relativo grau de controlo. E a teoria administrativa vai tacteando os novos problemas,
riscando seus contornos e propondo soluções que somente o tempo é capaz de comprovar a sua adequação.
Nas próximas décadas, a tarefa administrativa será incerta e desafiadora, pois deverá ser atingida por um
sem-n ú m e r o de variáveis e de mudanças e transformações carregadas de ambiguidades e de incertezas. O
administrador se defrontará com problemas multifacetados e cada vez mais diferentes e mais complexos do que
os anteriores, e sua atenção será disputada por eventos e por grupos situados dentro e fora da empresa que
lhe proporcionarão informações contraditórias que complicarão o seu diagnóstico perceptivo e sua visão dos
problemas a resolver ou das situações a enfrentar: são as exigências da sociedade, dos clientes, dos fornecedores,
das agências regulamentadoras, são os desafios dos concorrentes. as expectativas da alta administração,
dos subordinados, dos accionistas, etc. Porém. todas essas exigências, desafios e expectativas sofrem profundas
mudanças que a ultrapassam a capacidade que o administrador tem para poder acompanhá-l a s de peno e
compreende-las adequadamente. Essas mudanças tendem a aumentar, face à inclusão de outras novas variáveis,
à medida que o processo se desenvolve criando uma turbulência que perturba e complica a tarefa
administrativa de planejar, organizar, dirigir e controlar uma empresa de modo eficiente e eficaz. Existem
alguns factores de desafio e de turbulência que estarão presentes nas próximas décadas, a saber:

1. As empresas tendem a se ampliar, na medida em que são bem-sucedidas. O crescimento empresarial é,

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Gestão e Organização de Empresas

sem dúvida, uma consequência do seu sucesso, seja por que os mercados estão se expandindo, seja
para se beneficiar da economia de escala proporcionada pelo aumento de produção, seja para concorrer
com êxito com as demais empresas concorrentes, à medida que o tamanho da empresa aumenta,
aumentam em proporção muito maior as complicações de sua administração. E é preciso manter o
tamanho da empresa em proporções administráveis.
2. Existe uma tendência para a continuidade de taxas elevadas de inflação. Os custos de energia, de
matérias-primas, de mão-de-obra estão se elevando sensivelmente. A inflação exigirá maior eficiência
da administração das empresas para obter melhores resultados com os recursos disponíveis e imporá
fatalmente novas pressões e ameaças sobre as empresas, para que mantenham seus lucros e sua
própria sobrevivência.
3. A concorrência se torna cada vez mais aguda, à medida que aumentam os mercados e os negócios,
fazendo crescer os riscos na actividade empresarial. Mais do que nunca, o produto ou serviço que
demonstra ser superior - mais avançado, mais seguro, mais desejável - será o mais procurado. O
resultado será um novo sentido de urgência para desenvolver tais produtos e serviços e, para isso,
maiores investimentos em pesquisa e desenvolvimento, aperfeiçoamento das tecnologias e maiores
esforços de vendas por parte das empresas. Isto provocará a dissolução de velhos departamentos e a
criação de novos departamentos com diferentes tarefas e objectivos.
4. Existe uma tendência para uma crescente Sofisticação da tecnologia. Graças ao progresso das
comunicações, do computador e do transporte a jacto, as empresas estão internacionalizando suas
actividades e operações. Não é difícil prever uma série de profundas mudanças na estrutura e
comportamento das empresas em consequência desses desenvolvimentos. A tecnologia proporcionará
cada vez mais eficiência maior, uma precisão mais avançada e a liberação da actividade humana para
tarefas mais complicadas e que exigem planeamento.
5. Haverá maior internacionalização do mundo dos negócios, levando a um esforço, para a exportação ou
para a criação de subsidiárias para fincar o pé em outros territórios estrangeiros.
6. A maior visibilidade das empresas. Enquanto crescem, as empresas tornam-se mais competitivas, mais
sofisticadas tecnologicamente, internacionalizam--se mais, e com isto, sua influência ambiental
necessariamente aumenta. Isto faz com que as empresas chamem mais a atenção do ambiente e da
opinião pública e passem a ser mais visíveis e percebidas pelo público. A visibilidade da empresa - a sua
capacidade de chamar a atenção pode ocorrer de muitas maneiras positivas ou negativas, trazendo
forte impacto sobre sua estrutura e comportamento.

No fundo, Galbraith tem razão: estamos na era da incerteza, cheia de mudanças e transformações, de
turbulências e de instabilidade. E o mundo nunca mais será o mesmo de antes. E resta saber como tudo isto
será absorvido pelas empresas e pela sua administração.

AS EMPRESAS E SUA COMPLEXIDADE


Na moderna sociedade em que vivemos, quase todo o processo produtivo é realizado dentro do que chamamos
de organizações. Assim, a nossa sociedade moderna e industrializada se caracteriza por ser uma sociedade
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Gestão e Organização de Empresas

composta por organizações. O homem moderno passa a maior parte do seu tempo dentro de organizações, das
quais depende para nascer, viver, aprender, trabalhar, ganhar seu salário, curar suas doenças, divertir-se, obter
todos os produtos e serviços de que necessita, etc. Uma das razões que explicam a enorme variedade e
densidade de organizações no mundo actual é o facto de que a organização é o mais eficiente meio de
satisfazer um grande número de necessidades humanas. Pelas suas limitações físicas, biológicas, o ser humano
busca, através da cooperação com seus semelhantes, a conjugação de esforços para atingir objectivos que
sozinho não teria condições de atingir, ou, se tivesse condições de atingi-los individualmente com suas próprias
forças e recursos, talvez levasse muito mais tempo e consumisse muitos mais esforços. As organizações são
unidades intencionalmente construídas e reconstruídas, a fim de atingir objectivos específicos. As empresas
nada mais são do que classes de organizações. Elas são organizações lucrativas. Ou seja, são organizações com
objectivos de lucro. Elas constituem a coordenação de diferentes actividades de pessoas com a finalidade de
efectuar transacções planejadas com o ambiente. Com a sua proliferação, as empresas alcançaram elevado
grau de heterogeneidade e diversidade dificultando enormemente o seu estudo. Surgiram algumas tentativas
de classificação de tipos de empresas. Inúmeras tipologias foram criadas para facilitar seu estudo e comparação,
a saber:

1. Classificação quanto ao tamanho. É muito comum a classificação das empresas de acordo com o seu
tamanho, levando-se em conta certos critérios como o número de empregados, o volume de actividades
(operações ou facturação), o património envolvido (capital ou activo fixo), etc. Dentro destes critérios, as
empresas podem variar de um contínuo de tamanhos, pequenas, médias ou grandes. Há todavia, as
mini-empresas e as micro-empresas. Mas qual será efectivamente o limite entre uma e outra destas
classificações?
2. Classificações quanto à actividade. Conforme o tipo de actividade desenvolvida pelas empresas, elas podem
ser classificadas como produtoras de bens (empresas industriais ou artesanais) ou prestadoras de serviços
(actividades especializadas). Porém, muitas empresas industriais estão gradativamente ingressando na área
de serviços para poderem vender seus produtos. Uma outra forma de se visualizar esta classificação é a de
configurar três tipos de empresas: as primárias (ou extractivas), as secundárias (ou de transformação) e as
terciárias (ou de prestação de serviços). Contudo, existem empresas que simultaneamente desenvolvem
actividades primárias, secundárias e terciárias.
3. Classificação quanto à forma de propriedade. Uma terceira forma de classificar as empresas separa-as em
empresas públicas (ou governamentais) e privadas (ou de iniciativa particular), pois a maneira de administrar
é diferente porque são diferentes os objectivos, a obtenção e alocação dos recursos e os resultados
esperados. Contudo, existem empresas para-estatais, que não são públicas e nem privadas, mas que
exemplificam a intervenção estatal na economia. Por outro lado, também existem empresas multinacionais,
nas quais as subsidiárias funcionam de acordo com as decisões e modelos impostos pelas matrizes. Além
do mais, empresas compartilhadas (joint ventures) cuja propriedade é dividida em proporções diferentes
entre várias outras empresas, fazem com que este critério de classificação sofra críticas.

41
Gestão e Organização de Empresas

Classificação quanto a concentração/dispersão de actividades. Refere-se ao grau de concentração ou de


dispersão das actividades empresariais ou de seus recursos. As empresas concentradas se caracterizam pela
existência de recursos processados dentro de única área ou unidade física: as pessoas, máquinas e
equipamentos, os edifícios, etc. se encontram em um só local geográfico. As empresas dispersas se caracterizam
pela existência de recursos esparsos e distribuídos em locais estratégicos diferentes, geralmente distanciados
entre si, provocando problemas de coordenação e de integração. O problema básico da concentração x
dispersão das empresas reside na alocação e administração dos recursos necessários para as operações e
actividades e consequente alcance dos objectivos empresariais.
Todavia, todas estas formas de classificação de empresas resvalam pelo reducionismo: tentam comparar
as empresas através de apenas uma única variável - seja o tamanho, ou o tipo de actividade básica ou o facto
de serem públicas ou privadas ou ainda concentradas ou dispersas - o que nem sempre identifica
completamente as características organizacionais eminentemente complexas e multivariadas e que nem
sempre identifica com precisão as diferenças entre as várias empresas para efeito de comparação. A conclusão
é óbvia: pela sua complexidade, heterogeneidade e diversidade, as empresas ainda carecem de tipologias
adequadas à sua classificação. Ou em outros termos: as classificações de empresas devem levar em conta as
limitações do reducionismo que acabamos de aventar.

OS RECURSOS DAS EMPRESAS


Outro aspecto complicador e o facto de que a empresa constitui um ponto de convergência de inúmeros
factores de produção, isto é, de recursos produtivos. Tradicionalmente, os factores de produção têm sido
apontados genericamente em todo processo produtivo como sendo: natureza, capital e trabalho. Obviamente,
esta colocação também peca pelo exagerado simplismo e pela superficialidade, pois o processo produtivo é
muito mais complexo e envolve um número muito grande de variáveis intervenientes. Além do mais, esta
colocação focaliza o processo produtivo do ponto de vista de um mero sistema fechado, quando, na realidade,
o mesmo apresenta marcantes características de sistema aberto. Face ao intenso intercambio com o ambiente.
Basicamente, as empresas são constituídas de uma infinidade de recursos como pessoas, edifícios, máquinas,
equipamentos, matérias-primas, etc. Elas precisam de dinheiro, de fornecedores, de clientes, para realizar suas
actividades e sobreviver. Em outros termos, as empresas necessitam de recursos obtidos no ambiente externo e
aplicados, processados e transformados em produtos, ou serviços que são distribuídos e colocados novamente
no ambiente externo. No fundo, há um processo contínuo de importação-conversão-exportação assentado
sobre recursos empresariais. Alguns recursos ingressam no sistema com transformadores ou processadores
(como é o caso das máquinas, equipamentos e ferramentas que operam a produção), outros ingressam para
ajudar a importação de outros recursos (caso das actividades de compras, de recrutamento de pessoal, de
contactos bancários para obter dinheiro e financiamentos, etc.), outros ingressam para ajudar a exportação de
outros recursos (caso das actividades de vendas, de colocação de acções no mercado de capitais, etc.),
enquanto outros ingressam para serem processados e transformados em produtos ou em serviços (caso das
matérias-primas, componentes e materiais, ou ainda de dados ou informações que são transformados em

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Gestão e Organização de Empresas

serviços pela imprensa ou pelos órgãos de processamento de dados). Esses recursos variam enormemente de
empresa para empresa, em todos os sentidos: na sua natureza, na sua quantidade, na sua qualidade, etc. Os
recursos são os meios que as empresas possuem ou adquirem para realizar suas tarefas e atingir seus
objectivos: são bens ou serviços consumidos na realização das actividades empresariais. Podem ser imaginados
como os insumos necessários para produzir o produto final ou o serviço prestado pela empresa. Os recursos
podem ser próprios ou alheios, isto é, podem ser de propriedades da empresa que os adquire e os incorpora
para utilizá-los em suas actividades ou podem ser obtidos sob empréstimo, aluguer ou locação (leasing). Face à
sua diversidade, os americanos preferem classificar os recursos empresariais em cinco tipos: materials and
machinery, money, man, marketing e management. Preferimos chamá-los respectivamente: recursos físicos ou
materiais, recursos financeiros, recursos humanos, recursos mercadológicos e recursos administrativos.
Normalmente, cada conjunto de recursos similares é administrado dentro de um esquema de divisão de
trabalho e de especialização de actividades. A cada área de recursos corresponde uma especialidade da
administração: Administração da Produção, Administração Financeira, Administração de Recursos Humanos,
Administração Mercadológica e Administração Geral respectivamente. Na medida em que os recursos
disponíveis são correctamente utilizados e aplicados, obtém-se eficiência e, na medida em que se atingem os
objectivos da empresa, obtém-se a eficácia. A eficiência e a eficácia são algumas das principais medidas para se
avaliar uma boa administração, já que quase sempre os recursos são limitados ou escassos

OS NÍVEIS DE GESTÃO DAS EMPRESAS


Como as empresas são muito heterogéneas e diversificadas, assim como o são os seus recursos utilizados,
procuraremos lançar mão de alguns artifícios para facilitar nossa exposição. As empresas constituem sistemas
complexos destinados a atingir objectivos igualmente diferenciados e complexos. Para tanto, ocorre a divisão
do trabalho e a especialização de actividades dos órgãos e dos participantes. Independentemente na sua
natureza ou tamanho, as empresas podem ser analisadas sob o prisma de três diferentes níveis de actuação
empresarial: o nível institucional, o nível intermediário e o nível operacional. Se imaginássemos a empresa como
um conjunto de três círculos concêntricos de tamanhos diferentes, o nível institucional seria o circulo mais
periférico, o nível intermediário o do meio e o nível operacional o circulo interno.
O nível institucional também chamado nível estratégico, corresponde ao nível mais elevado da empresa,
composto dos directores, proprietários ou accionistas e altos executivos. Nele estão o presidente, os directores
e todos os gerentes responsáveis pelos assuntos globais da empresa e que definem os objectivos empresariais
e as estratégias gerais necessárias para atingi-los adequadamente. E o nível que faceia o ambiente externo
extremamente vasto e mutável que circula e envolve a empresa. Além de estar voltado para os objectivos do
negócio e para os interesses do grupo dominante, o nível institucional é predominantemente extroversivo, isto
e, voltado para a realidade ambiental que externamente envolve a empresa. Em outros termos, é composto
pelas camadas da empresa expostas ao ambiente e que estão situadas na periferia organizacional e na
interface com a realidade externa que a empresa precisa atender, é o nível que mantém contacto e interacção
com as forças e pressões ambientais. Lida com a incerteza, exactamente pelo facto de não ter poder ou
controle algum sobre os eventos ambientais presentes e muito menos capacidade de prever com razoável

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Gestão e Organização de Empresas

precisão os eventos ambientais futuros. E o nível da empresa que actua como sistema aberto em contínua
interacção com o ambiente externo.
NÍVEL INSTITUCIONAL
(Estratégico)

Nível mais elevado

NÍVEL INTERMÉDIO
(Táctico)

onde são tomadas


Utilização de as decisões
recursos

Definição NÍVEL OPERACIONAL Execução de


Mudanças dos órgãos planos e
Mudanças
(Execução de Tarefas) programas
Ambiente
Produtos

externo com o máximo e


serviços
Adequações Eficiência de eficácia
das relações
estruturais

tendo em vista
a incerteza envolvente

O nível intermediário, também chamado nível mediador, nível tácito ou ainda nível gerencial está colocado entre
o nível institucional e o nível operacional. Cuida da articulação interna entre os dois níveis que respectivamente
estão colocados no topo e na base da organização empresarial. Trata-se da linha do meio de campo. Cuida da
escolha e captação dos recursos necessários, bem como da distribuição e colocação do que foi produzido pela
empresa nos diversos segmentos do mercado. É o nível que lida com os problemas de adequação das decisões
tomadas no nível institucional com as operações e tarefas realizadas no nível operacional. O nível intermediário
é geralmente composto da media administração da empresa, isto é, as pessoas ou órgãos que transformam as
estratégias elaboradas para atingir os o objectivos e empresariais em programas de acção, também chamado
nível mediador pois se defronta com dois componentes completamente diferentes entre si: um componente
extremamente sujeito à incerteza e ao risco, faceando um ambiente externo mutável e complexo, que é o nível
institucional e outro componente extremamente voltado à lógica e a certeza e ocupado com a programação
rotineira e execução de tarefas muito bem definidas e delimitadas do dia-a-dia, que é o nível operacional. É o
nível intermediário quem amortece e limita os impactos e solavancos da incerteza trazido do ambiente externo
pelo nível institucional absorvendo-os e digerindo-os para trazer ao nível operacional trazido do ambiente
externo pelo nível institucional, absorvendo-os e digerindo-os para trazer ao nível operacional os programas,
rotinas e procedimentos de trabalho rigidamente estabelecidos que este deverá seguir para executar as tarefas
básicas da empresa com eficiência permitindo-lhe atender às demandas do ambiente e alcançar os seus
objectivos. Assim, o nível intermediário deve ser flexível, elástico, capaz de amortecer e conter os impactos e
pressões externas para não prejudicar as operações internas que são realizadas no nível operacional bem como

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Gestão e Organização de Empresas

deve ser capaz de dilatar ou reduzir cerras demandas e exigências externas para compatibilizá-las com as
possibilidades internas do nível operacional. Em outros termos, como o nível operacional geralmente é dotado
de pouca flexibilidade, cabe ao nível intermediário servir de bolso mediador que possa encompassar os ritmos
mais rápidos ou mais lentos das forças ambientais com as possibilidades rotineiras e quotidianas de acção do
nível operacional. Cabe ao nível intermediário administrar o nível operacional e cuidar das decisões
departamentais.
O nível operacional também chamado nível técnico ou núcleo técnico, é o nível localizado nas áreas
inferiores da empresa, e, portanto, na parte mais intima da empresa. Está relacionado com os problemas
ligados à execução quotidiana e eficiente das tarefas e operações da empresa e orientado quase que
exclusivamente para as exigências impostas pela natureza da tarefa a ser executada e com os materiais a
serem processados, nível onde as tarefas são executadas e as operações são realizadas: envolve o trabalho
básico relacionado directamente com a produção dos produtos ou serviços da empresa. É nele que estão as
máquinas e equipamentos, as instalações físicas, as linhas de montagem, os escritórios e os balcões de
atendimento, etc., cujo funcionamento deve atender a determinadas rotinas e procedimentos programados
dentro de uma regularidade e continuidade que assegurem a utilização plena dos recursos disponíveis e a
máxima eficiência das operações. Pata tanto, o nível operacional exige certeza e previsibilidade na sua
actuação.
Na realidade, não há uma separação nítida e permanente entre os três níveis da empresa, podendo
haver até superposicão entre eles.

A RACIONALIDADE EMPRESARIAL
Para melhor compreensão do funcionamento desses três diferentes níveis da empresa, convém lembrar o
conceito de racionalidade. Racionalidade implica adequação dos meios utilizados aos fins a que se deseja
alcançar. A racionalidade é o imperativo de todas as actividades administrativas de uma empresa e é o que leva
a uma infinidade de comportamentos diferentes para alcançar os seus objectivos. As empresas que alcançam
seus fins eficientemente são funcionalmente racionais. Em cada empresa existe uma racionalidade empresarial:
toda empresa se comporta de acordo com uma racionalidade que lhe é própria. A racionalidade está ligada aos
meios, métodos e processos que a empresa acredita serem capazes de proporcionar o alcance de determinados
fins ou resultados. A racionalidade se fundamenta em uma presunção sobre as relações de causa-e-efeito:
determinadas acções conduzem a certas consequências. Assim, uma acção ou um procedimento é racional, se é
consistente ou congruente com o alcance de objectivos que se pretende atingir ou se ajusta a presunções,
axiomas ou premissas previamente aceites e estabelecidas pela empresa. Existe racionalidade, porque o
comportamento da empresa é planeado e dirigido para certos objectivos que ela pretende alcançar. Para que
haja racionalidade, os meios, procedimentos, métodos e processos, etc., devem ser coerentes com o alcance
dos objectivos desejados. As teorias administrativas de Taylor. Fayol e Weber baseadas em conceitos de
empresa como sistema fechado, se restringiam a determinadas variáveis conhecidas, cujo comportamento era
previsível e situado dentro de relações de causa-e-efeito previamente determinadas. Essas teorias também se
restringiam quase tão somente ao nível operacional das empresas. E, acima de tudo, apregoavam uma
racionalidade total, própria de fenómenos típicos do sistema fechado. Na realidade, os fenómenos típicos do

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Gestão e Organização de Empresas

sistema fechado ocorrem nos processos mais íntimos e interiores da empresa, localizados no nível operacional e
mais protegidos da acção ambiental que impõe a mudança e incerteza. No nível operacional predomina uma
racionalidade total, a que denominamos racionalidade técnica, que utiliza a lógica de um sistema fechado e que
se fecha à medida que elimina ou limita a incerteza ambiental e reduz as operações ou tarefas a programas e
procedimentos estritamente previstos e rígidos, rotinizados e programados, para assegurar a maximização da
eficiência. Baseia-se na certeza e na previsibilidade. Todavia, o nível institucional se defronta com o ambiente
externo, operando como um sistema aberto, com grande absorção das incertezas produzidas pela interacção
com as múltiplas e complexas forças ambientais. Esse ambiente complexo e evanescente não revela
inteiramente as alternativas disponíveis e nem o desdobramento das consequências dessas alternativas. Para
lidar com tamanha complexidade e indefinição, o nível institucional tem uma capacidade limitada para reunir e
processar informações esparsas e incompletas ou para prever as consequências das alternativas numa situação
de impervisibilidade, onde nem todas as múltiplas variáveis são conhecidas e o seu comportamento dificilmente
revela as possíveis relações de causa-e-efeito. O nível institucional precisa, então, criar processos para procurar,
aprender e, principalmente, decidir. Se a complexidade fosse abordada e enfrentada em toda a sua enorme
complexidade, ela superaria a capacidade de compreensão da empresa. Esta precisa limitar suas definições de
situações, isto é, precisa tomar decisões dentro de uma racionalidade limitada. Esta exigência requer a
substituição do critério de máxima eficiência - típico da lógica de sistema fechado - pelo critério da eficiência
satisfatória ou relativa - típico da lógica de sistema aberto: a tomada de decisões deve relacionar-se antes com
a satisfação do que com a maximização de resultados. Para tomar uma decisão, a não pode colectar a
totalidade de dados a respeito de um problema, mas apenas os dados que ela tem capacidade e condições de
colectar, obter e processar. O ambiente externo não é captado e interpretado em sua imensa e complexa
totalidade, mas é percebido apenas naqueles aspectos mais relevantes que a empresa consegue descodificar e
interpretar na base da sua racionalidade. Daí, a racionalidade empresarial que predomina no nível institucional.
Assim, as empresas funcionam como sistemas abertos e; consequentemente necessitados de previsibilidade,
certeza e resolução. Para um melhor entendimento do funcionamento do nível institucional deve-se melhor
conceituar o ambiente, enquanto que o nível operacional requer uma melhor conceituação de tecnologia.
Começaremos por falar em ambiente e, posteriormente de tecnologia, a fim de amarrarmos estes dois
conceitos em um outro mais abrangente que é o de gestão de empresas.

O AMBIENTE EMPRESARIAL
As empresas não existem no vácuo e seu funcionamento nada tem de absoluto. Elas vivem dentro de um
complexo contexto caracterizado por mudanças e por uma multiplicidade de forças diferentes. Para se conhecer
adequadamente uma empresa, deve-se compreender também o contexto no qual ela está inserida. O ambiente
representa todo o universo que envolve externamente uma empresa tomada como ponto de referência; é tudo
aquilo que está situado fora da empresa. O ambiente é a própria sociedade maior, constituída de outras
empresas, organizações, grupos sociais, etc. Assim, as empresas não são totalmente auto-suficientes, nem
isoladas, mas funcionam dentro de um contexto, do qual dependem para sobreviver e crescer. É do ambiente
que as empresas obtém os recursos e informações necessários para sua subsistência e funcionamento, e é no

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Gestão e Organização de Empresas

ambiente que colocam os resultados de suas operações. Na medida em que o ambiente sofre mudanças, todo o
quadro habitual das operações das empresas é tremendamente influenciado por essas mudanças, pois as
condições ambientais externas às empresas contribuem fortemente para tudo aquilo que sucede dentro delas, a
ponto de alguns autores salientarem que as empresas constituem organizações inventadas pelo homem para se
adaptarem a circunstâncias ambientais a fim de alcançarem seus objectivos. Se essa adaptação é conseguida e
os objectivos são alcançados, então a empresa será considerada eficaz e terá condições de sobrevivência e de
crescimento, na medida em que o resultado proveniente de seus produtos e serviços sejam maior do que o
volume despendido na obtenção e aplicação dos recursos.
Como o ambiente é vasto e complexo, as empresas não podem absorvê-lo, conhece-lo e compreendê-lo
em sua imensa totalidade, o que seria inimaginável. O ambiente e um contexto externo que apresenta uma
enorme variedade de condições extremamente variáveis e complexas, difíceis de serem abordadas no seu
conjunto e analisadas com objectividade. Assim, as empresas precisam tactear, explorar e discernir o ambiente
onde estão colocadas para reduzir a incerteza a seu respeito. Em outros termos, a empresa precisa mapear seu
espaço ambiental. Para lidar com a complexidade ambiental, as empresas passam a seleccionar aspectos
relevantes do seu ambiente e a visualizar o seu mundo exterior apenas naqueles aspectos escolhidos e
seleccionados daquele enorme conjunto. É a chamada ―selecção ambiental‖: apenas uma pequena porção de
todas as inúmeras variáveis ambientais possíveis participam realmente do conhecimento e da experiência da
empresa. Assim, os dirigentes que actuam no nível institucional visualizam o ambiente da empresa através de
aspectos tomados como relevantes para a sua empresa. Por outro lado, esses dirigentes passam a perceber
subjectivamente seus ambientes de acordo com suas expectativas, suas experiências, seus problemas, suas
aflições, suas convicções e suas motivações. A maneira pela qual uma empresa percebe e interpreta os eventos
ambientais pode ser completamente diferente da percepção e interpretação que outra empresa tem a respeito
do mesmo ambiente. Em outros termos, um mesmo ambiente pode ser percebido e interpretado
diferentemente por duas ou mais empresas. É a chamada ―percepção ambiental‖, que é uma construção, um
conjunto de informações seleccionadas e estruturadas em função da experiência anterior, das necessidades e
das intenções da empresa. O que complica ainda mais as coisas é o facto de que as empresas são partes
integrantes dos ambientes de outras empresas e demais organismos da sociedade.
Para facilitar, pelo menos didacticamente, a análise ambiental faremos doravante uma diferenciação
entre ambiente geral e ambiente de tarefa.

Ambiente geral:
O ambiente geral é também chamado macroambiente e é constituído de um conjunto amplo e complexo de
condições e factores externos que envolve e influência difusamente todas as empresas. Não é uma entidade
concreta com a qual a empresa possa interagir directamente, mas um conjunto difuso de condições genéricas e
externas às empresas e que contribui de um modo geral para tudo aquilo que ocorre dentro de cada empresa.
O ambiente geral é constituído de factores económicos, políticos, tecnológicos, sociais, culturais, demográficos,
ecológicos que predominam em um determinado país ou continente.

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Gestão e Organização de Empresas

Ambiente de tarefa:
O ambiente de tarefa é o meio ambiente específico de cada empresa e corresponde ao segmento do ambiente
mais imediato e próximo de cada empresa. Se tomarmos a empresa como um sistema aberto, é do ambiente
de tarefa que a empresa extrai suas entradas e é nele que a empresa coloca suas saídas ou resultados. O
ambiente de tarefa é composto de quatro sectores principais:

1. os consumidores ou usuários dos produtos ou serviços da empresa. Geralmente, este sector é chamado
mercado de clientes ou de consumidores e se encarrega de absorver as saídas ou resultados da
actividade empresarial
2. os fornecedores de recursos para a empresa, isto é, os fornecedores de capital e dinheiro (que é o
mercado de capitais tratado pela área financeira), de materiais e matérias-primas (que é o mercado de
fornecedores tratado pela área de suprimentos e compras), de mão-de-obra (que é o mercado de
recursos humanos tratado pela área de pessoal, de serviços (composto pelas empresas prestadoras de
serviços, como propaganda, processamento de dados, etc.), de equipamento, de espaço de trabalho,
etc. Este sector é constituído do mercado ou mercados que suprem a empresa das entradas e, insumos
necessários às suas operações.
3. os concorrentes, tanto para as entradas (disputam fornecedores de recursos materiais, financeiros,
humanos, etc.), como para as saídas disputando clientes ou usuários. É constituído de empresas que
concorrem entre si, para a obtenção dos recursos necessários e para a conquista dos mercados para a
colocação dos seus produtos ou serviços.
4. os grupos regulamentadores, incluindo o governo, sindicatos, associações entre empresas, associações
de classe, organismos de controle e de fiscalização, etc. Este sector é constituído das instituições que,
de alguma maneira, impõem controles, limitações ou restrições às actividades da empresa, seja
especificando maneiras pelas quais ela deverá se conduzir, seja cerceando algumas de suas decisões,
seja fiscalizando ou controlando suas actividades, etc.
É no ambiente de tarefa que a empresa define o seu domínio, ou seja, a sua área de influência ambiental. É no
ambiente de tarefa que a empresa identifica os pontos em que ela depende de entradas do ambiente e os
pontos de saída para o ambiente. Para mudar seu domínio, a empresa precisa mudar um ou mais dos sectores
acima: clientes, fornecedores, concorrentes ou grupos reguladores. Para tanto, ela precisa alterar seu produto
ou serviço. O domínio de uma empresa é definido pelas suas relações de poder ou de dependência em relação
aos quatro sectores do seu ambiente de tarefa. A empresa tem poder quando as suas decisões influenciam as
decisões de seus clientes, fornecedores, concorrentes ou grupos reguladores, total ou parcialmente. A empresa
tem dependência quando as suas decisões estão subordinadas às decisões tomadas pelos seus clientes, ou
fornecedores, ou concorrentes ou grupos reguladores. Toda estratégia empresarial procura maximizar as
relações de poder e minimizar as relações de dependência, no sentido de garantir o seu domínio e, portanto, a
sua sobrevivência ou crescimento.
Dependendo do produto ou serviço que produza ou preste, a empresa pode ter um ambiente de tarefa
homogéneo: clientes semelhantes, fornecedores semelhantes, concorrentes semelhantes e agências

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Gestão e Organização de Empresas

reguladores como tal. A homogeneidade do ambiente de tarefa depende, portanto, do tipo de produto ou
serviço da empresa. Quando o ambiente é homogéneo e simples, a estrutura organizacional da empresa tende
também a ser simples e homogénea dotada de um departamento para cada área específica do ambiente.
Porém, quando face à diversidade de produtos ou serviços, o ambiente de tarefa (é heterogéneo e complexo,
da empresa a sua estrutura organizacional tende a ser altamente diferenciada e descentralizada, com
departamentos específicos para lidarem com as áreas específicas do ambiente de tarefa. Assim, o continuum
homogeneidade-heterogeneidade do ambiente de tarefa é importante na definição dos aspectos de
centralização-descentralização e de simplicidade-diferenciação na estrutura organizacional das empresas.
Por outro lado. o ambiente de tarefa apresenta uma dinâmica que pode variar da estabilidade à
instabilidade. O ambiente estável se caracteriza por um comportamento estático, rotineiro e previsível dos
clientes, fornecedores, concorrentes ou grupos reguladores. O ambiente instável já se caracteriza por um
comportamento mutável. reactivo e imprevisível dos clientes, fornecedores, concorrentes ou grupos reguladores,
impondo contingências que as empresas não tem condições de antecipar ou prever, chegando em alguns casos
às raias da turbulência e complexidade. Quanto mais estável o ambiente de tarefa mais rotineiras e padronizadas
as actividades da empresa, que tende a utilizar os princípios clássicos de administração ou o modelo burocrático
de organização. Como a estabilidade ambiental permite alguma previsibilidade e certeza à empresa, esta pode
dar-se ao luxo de internalizar sua atenção para a produção no sentido de aumentar ao máximo a sua eficiência.
Porém, quanto mais instável o ambiente de tarefa, as respostas empresariais precisam adaptar-se rapidamente
às novas demandas e exigências ambientais através da constante mudança organizacional. A empresa torna-
se extrovertida na medida em que tem de constantemente mapear as flutuações e alterações ocorridas no
ambiente de tarefa e providenciar rapidamente os ajustamentos internos para proporcionar respostas eficazes.
Assim, os princípios clássicos de administração e o modelo burocrático de organização não são adequados, pois
carecem da flexibilidade e da inovação necessárias, quanto mais dinâmico o ambiente de tarefa, maiores as
contingências e incertezas impostas à empresa. Assim, o ambiente apresenta coacções, contingências, restrições,
problema, desafios, pressões e, sobretudo, oportunidades às empresas. E toda essa gama variada de influências
ambientais penetra nas empresas através do nível institucional.

TECNOLOGIA
Enquanto o ambiente de tarefa constitui a principal fonte externa de coacções e contingências, a tecnologia
constitui a principal fonte interna. Todas as empresas utilizam alguma forma de tecnologia para executar suas
operações e realizar sua tarefa. A tecnologia adoptada pode ser rudimentar (como a faxina e limpeza através
da vassoura ou do escovão) ou sofisticada (como o processamento de dados através do computador). Porém,
uma coisa é certa: todas as empresas dependem de um tipo tecnologia ou de um conjunto de tecnologias para
poderem funcionar e alcançar seus objectivos. A tecnologia é uma variável, ao mesmo tempo, ambiental e
empresarial: externa e interna. A tecnologia é um componente do meio ambiente, na medida em que as
empresas adquirem, incorporam e absorvem tecnologias criadas e desenvolvidas pelas outras empresas dos eu
ambiente de tarefa em seus sistemas. Por outro lado, a tecnologia é um componente empresarial. na medida
em que faz parte do sistema interno da empresa, já incorporada a ele passando assim a influenciá-lo

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Gestão e Organização de Empresas

poderosamente, e, com isto, influenciando também o seu ambiente de tarefa. Assim, a tecnologia pode ser
compreendida como uma variável ambiental - influenciando a empresa de fora para dentro, como se fora uma
força externa e muitas vezes estranha à empresa, e sobre a qual a empresa possui muito pouco entendimento
e sobretudo controle - e como uma variável empresarial influenciando a empresa como se fora um recurso
próprio e interno influenciando os demais recursos e capaz de proporcionar melhor desempenho na acção e
maior capacidade para a empresa defrontar-se com as forcas ambientais, caracterizadas pelas contingências e
coacções vindas e pelas contingências e coacções vindas do ambiente externo. Daremos preferência, neste
tópico, ao tratamento da tecnologia como uma variável interna, como um recurso da empresa, operado em seu
íntimo através do nível operacional.
Existem tecnologias de capital intensivo (baseadas na utilização intensiva de máquinas e equipamentos,
com ênfase na mecanização e automação) e tecnologias de mão-de-obra intensiva (baseada na utilização
intensiva de pessoas com habilidades manuais ou físicas e com ênfase na manufactura). A tecnologia envolve
aspectos físicos e concretos (hardware) – bem como aspectos conceituais e abstractos (software) – como
políticas, directrizes, processos, procedimentos, regras e regulamentos, rotinas, planos, programas e métodos
de trabalho.
Existe a tecnologia incorporada, que está contida em bens de capital. matérias-primas básicas, matérias-
primas intermediárias ou componentes, etc. A tecnologia não incorporada encontra-se nas pessoas - como
técnicos, peritos, especialistas, pesquisadores – sob a forma de conhecimentos intelectuais ou operacionais,
habilidade mental ou manual para executar as operações, ou em documentos que a registam e visam assegurar
sua conservação e transmissão, como mapas, plantas, desenhos, projectos, patentes, relatórios, etc. Estas duas
formas de tecnologia geralmente se confundem e se entrelaçam.
Na realidade, a tecnologia não somente permeia toda a actividade industrial, como também participa
profundamente em qualquer tipo de actividade humana, em todos os campos de actuação. O homem moderno
utiliza no seu comportamento quotidiano e quase sem o perceber uma imensa avalanche de contribuições da
tecnologia: o automóvel, o relógio, o telefone, as comunicações, etc. Sem toda essa parafernália, o
comportamento do homem moderno seria completamente diferente. Assim, a tecnologia também envolve um
determinado tipo de conhecimento que, a despeito de sua origem, é utilizado na sentido de transformar
elementos materiais - matérias-primas, componentes, etc. - ou simbólicos – dados, informações, etc. - em bens
ou serviços, modificando sua natureza ou suas características. A tecnologia não e coisa, mas sim conhecimento
de como fazer as coisas, para alcançar objectivos humanos. Através dos artefactos que a tecnologia lhe
permite, o homem é capaz de produzir uma infinidade de coisas. Essas coisas em si não constituem tecnologia,
mas o produto dela.
Qualquer que seja o conceito de tecnologia, porém é inquestionável que a tecnologia conduz a uma
maior complexidade da empresa que a utiliza passando a condicionar a estrutura organizacional da empresa,
fazendo dela uma decorrência, uma variável dependente. Apenas para efeito desta exposição, podemos
classificar a tecnologia em dois tipos básicos:

1. Tecnologia flexível: quando as máquinas e equipamentos, as matérias-primas e o conhecimento dos

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Gestão e Organização de Empresas

métodos e processos podem ser usados para outros produtos e serviços diferentes. É o caso em que a
tecnologia deve adaptar-se; as demandas dos produtos ou serviços a serem executados, como no caso
das oficinas.
2. Tecnologia fixa: quando não há possibilidade de utilização de outros produtos ou serviços diferentes. É
o caso em que a empresa precisa escolher ou adaptar os produtos ou serviços a tecnologia de que
dispõe. As montadoras de automóveis dispõem de tecnologia fixa, cuja modificação exige elevados
investimentos. As siderúrgicas, as refinarias de petróleo e a grande maioria das indústrias químicas
constituem exemplos de tecnologias fixas.
3. A tecnologia fixa ou estável conduz a uma ênfase no produto e, o processo produtivo envolve tarefas
padronizadas e repetitivas, sujeitas a normas e procedimentos burocratizados, impondo
consequentemente condições de estabilidade e de previsibilidade do nível operacional da empresa.
Neste caso, os princípios da administração cientifica de Taylor (no caso de fábricas) e os princípios do
modelo burocrático de Weber (no caso de escritórios ou de bancos, por exemplo) são perfeitamente
aplicáveis ao nível operacional que funciona como um sistema mecanístico e rotineiro.

Por outro lado, a tecnologia flexível conduz a uma ênfase no cliente e processo produtivo envolve uma
variedade e heterogeneidade de técnicas, sujeitas a constantes modificações e alterações, impondo
consequentemente condições de mudanças e imprevisibilidade no nível operacional da empresa. Neste caso, os
princípios da administração científica ou do modelo burocrático são inviáveis, pois o nível operacional funciona
como um sistema orgânico e mutável.

GESTÃO DE EMPRESAS
A complexidade das empresas afigura-se maior à medida que se analisam as empresas, seja do ponto de vista
endógeno de suas características internas de diferenciação organizacional, de objectivos, de tecnologias utilizadas,
tamanho, descentralização, etc., seja do ponto de vista exógeno de seu contexto ambiental, repleto de
contingências, ameaças, restrições e oportunidades que se alteram e se revezam e jamais se revelam com
antecipação, com clareza ou com nitidez. Ademais, a acelerada mudança e instabilidade ambiental, tendo em
vista o universo de factores interagentes, como as condições económicas, políticas, tecnológicas, legais, sociais,
culturais, demográficas e ecológicas, a crescente limitação e escassez de recursos indispensáveis para assegurar
os insumos necessários às empresas e a concorrência nos mercados passam a exigir estratégias e respostas
empresariais capazes de assegurar a sobrevivência e eficácia empresarial em situações de difícil diagnóstico
e de incerteza. Para tanto, as empresas precisam continuamente realocar, reajustar e reconciliar seus recursos
disponíveis com seus objectivos e oportunidades percebidas no ambiente de tarefa. A moderna gestão de
empresas procura levar em conta três componentes básicos, a saber:

1. O ambiente: isto é, as oportunidades visualizadas no ambiente de tarefa e, mais especificamente bem


como as restrições, limitações, contingências, coacções e ameaças nele existentes. Daí, a análise
ambiental ou seja, a análise das condições e variáveis ambientais, suas perspectivas actuais e futuras,

51
Gestão e Organização de Empresas

percebidas no contexto ambiental.


2. A empresa, isto é, os recursos de que a empresa dispõe, sua capacidade e habilidades, bem como seus
pontos fortes e fracos, compromissos e objectivos e, sobretudo as tecnologias de que dispõe. Daí, a
análise empresarial, ou seja, a análise das condições actuais e futuras da empresa, recursos disponíveis
e recursos necessários (incluindo tecnologias), potencialidades, forças e fraquezas da empresa, sua
estrutura organizacional, sua capacidade e competência.
3. Adequação entre ambos: isto é, qual a postura a adoptar para compatibilizar seus objectivos, recursos,
potencialidades, limitações com as condições ambientais, no sentido de extrair o máximo das
oportunidades externas e expor-se o mínimo às ameaças, coacções e contingências ambientais.

Assim, cada empresa deve ser considerada sob o ponto de vista de eficácia e de eficiência, simultaneamente.
Eficácia é uma medida normativa do alcance de resultados, enquanto a eficiência é uma medida normativa da
realização dos recursos nesse processo. Em termos económicos, a eficácia de uma empresa se refere a sua
capacidade de satisfazer uma necessidade da sociedade através do suprimento de seus produtos (bens ou
serviços), enquanto a eficiência é uma relação técnica entre entradas e saídas. Nestes termos, a eficiência é
uma relação entre os custos e benefícios, quando abordamos, há pouco. a racionalidade empresarial, verificámos
que a eficiência representa a relação entre os recursos aplicados e o produto final obtido: é a razão entre o
esforço e o resultado, entre a despesa e a receita, entre o custo e o benefício resultante. Com a
Administração Científica de Taylor houve uma preocupação com a organização racional do trabalho e com os
métodos de trabalho para estabelecer padrões de desempenho: a eficiência dos operários passou a ser uma
relação entre o desempenho real e o padrão de desempenho estabelecido previamente e arbitrado como
eficiência ao nível de 100%. Assim, a eficiência está voltada para a melhor maneira (the best way) pela qual as
coisas devem ser feitas ou executadas (métodos), a fim de que os recursos (pessoas, máquinas, matérias-
primas) sejam aplicados da forma mais racional possível. A eficiência preocupa-se com os meios, com os
métodos e procedimentos mais indicados que precisam ser devidamente planeados e organizados a fim de
assegurar a optimização da utilização dos recursos disponíveis. A eficiência não se preocupa com os fins, mas
simplesmente com os meios. O alcance dos objectivos visados não entra na esfera de competência da
eficiência: é um assunto ligado à eficácia. À medida que o administrador se preocupa em fazer correctamente
as coisas, ele estará se voltando para a eficiência (melhor utilização dos recursos disponíveis). Porém, quando
ele utiliza estes instrumentos fornecidos por aqueles que executam para avaliar o alcance dos resultados, isto é,
para verificar se as coisas bem feitas são aquelas que realmente deveriam ser feitas, então ele estará se
voltando para a eficácia (alcance os objectivos através dos recursos disponíveis).
Contudo, nem sempre a eficácia e a eficiência andam de mãos dadas. Uma empresa pode ser eficiente
em suas operações (ao nível operacional) e pode não ser eficaz (ao nível institucional), ou vice-versa, pode ser
ineficiente em suas operações e, apesar disso, ser eficaz, muito embora a eficácia fosse bem melhor quando
acompanhada da eficiência. Pode também não ser nem eficiente nem eficaz. O ideal seria uma empresa
igualmente eficiente e eficaz. A eficiência se preocupa em fazer correctamente as coisas e da melhor maneira
possível. Daí a ênfase nos métodos e procedimentos internos, ao nível operacional. A eficácia se preocupa em

52
Gestão e Organização de Empresas

fazer as coisas adequadas para atender às necessidades da empresa e do ambiente que a circunda. Enquanto a
eficiência se concentra nas operações e tem a atenção voltada para os aspectos internos da organização, a
eficácia se concentra no sucesso quanto ao alcance dos objectivos e tem a atenção voltada para os aspectos
externos da organização. Daí a ênfase no mapeamento ambiental, ao nível institucional. Dentro de um ponto de
vista mais abrangente, a eficácia empresarial é a habilidade da empresa de explorar o seu meio ambiente para
obter recursos, mantendo, ao mesmo tempo, uma posição autónoma de negociação. O nível operacional está
voltado predominantemente para a busca da eficiência e esta constitui a sua preocupação fundamental. O nível
institucional está voltado predominantemente para a busca da eficácia, através da adequação da empresa às
necessidades e demandas do seu ambiente de tarefa.
O nível intermediário, por seu turno, está empenhado em compatibilizar as necessidades de eficácia do
nível institucional com as necessidades de eficiência do nível operacional.
Assim, a acção empresarial para ser eficaz e eficiente precisa de ser planeada, organizada, dirigida e
controlada. O planeamento, organização, direcção e controle constituem o chamado processo administrativo.
Quando consideradas separadamente, planeamento, organização, direcção e controle constituem funções
administrativas, quando tomadas em conjunto na sua abordagem global para o alcance de objectivos, formam
o processo administrativo. Processo significa qualquer fenómeno que apresente mudança contínua no tempo ou
qualquer operação que tenha certa continuidade ou sequência. O conceito de processo implica que os
acontecimentos e as relações entre eles sejam dinâmicos, em evolução, sempre em mudança. O processo não é
coisa imóvel, parada, estática, mas móvel, contínua, não tendo começo, nem fim, nem uma sequência fixa e
rígida de eventos. Os elementos do processo agem uns sobre os outros, isto é, cada um afecta todos os demais
e é afectado por eles. Assim, as funções administrativas de planeamento, organização, direcção e controle não
constituem entidades separadas e estanques, mas ao contrário, são elementos interdependentes e
interagentes, com influências recíprocas acentuadas.
Muito embora, a maioria dos autores que tratam do processo administrativo o vejam como uma
sequência ou ciclo repetitivo de funções, na realidade ele compõe um sistema onde o todo é maior do que a
soma das partes, face ao seu efeito sinergístico. Mas, o que é mais importante ainda, é que o processo
administrativo se desenrola diferentemente em cada um dos três níveis da empresa, a saber, no nível
institucional, no nível intermediário e no nível operacional.
Vejamos o planeamento em primeiro lugar. No nível institucional ocorre o planeamento estratégico,
geralmente dimensionado a longo prazo, abrangendo a empresa como uma totalidade. No nível intermediário
ocorre o planeamento táctico, geralmente dimensionado a médio prazo e abrangendo cada departamento ou
divisão da empresa, separadamente. No nível operacional ocorre o planeamento operacional, geralmente
dimensionado a curto prazo e abrangendo as rotinas, procedimentos, programações e regulamentos de cada
cargo ou tarefa.
Quanto à função administrativa de organizar ocorre o mesmo fenómeno. No nível institucional a
organização está voltada para o desenho organizacional da empresa como uma totalidade, principalmente em
termos de diferenciação (divisão de trabalho organizacional), formalização (explicitação das regras e
regulamentos da empresa), centralização (concentração ou disposição do poder), integração (coordenação de

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Gestão e Organização de Empresas

decisões e acções), etc. No nível intermediário, a organização está voltada para o desenho departamental e
para as opções de configuração de cada um dos departamentos. No nível operacional, a organização está
voltada para o desenho dos cargos e das tarefas.
Quanto à função administrativa de dirigir segue-se o mesmo caminho. No nível institucional a direcção
está voltada para a manutenção da autoridade e poder e para os estilos administrativas de direcção. No nível
intermediário, a direcção é efectuada em termos de gerência, calcada em conceitos de motivação humana,
liderança e comunicação. No nível operacional, a direcção é efectuada em termos de supervisão de primeira
linha.
O mesmo ocorre com a função administrativa de controlar. No nível institucional ocorre o controle
organizacional abrangendo a empresa como uma totalidade. e medindo o desempenho global da empresa,
principalmente através de mensurações contáveis ou índices financeiros. No nível intermediário, o controle está
voltado para o desempenho de cada departamento, seja através de controlo orçamentário, orçamento- programa,
etc.
O Processo Administrativo nos Três Níveis das empresas
Planeamento Organização Direcção Controle
Nível Planeamento Estratégico Desenho Organizacional Direcção e estilos de Controle Estratégico e
Institucional e Organizacional Administração Organizacional
Nível Planeamento Táctico e Desenho Departamental Gerência: Motivação, Controle Táctico
Intermediário Departamental Liderança e Departamental
Comunicação
Nível Planeamento Operacional Desenho de Cargos e de Supervisão de Primeiro Controle Operacional
Operacional Tarefas Nível

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Gestão e Organização de Empresas

TEXTO Nº 4
ESTRUTURA ORGANIZACIONAL: DIMENSÕES, DETERMINANTES E FORMATOS
Miguel Pina e Cunha

1. Introdução
A estrutura é uma das variáveis centrais em teoria das organizações. É fácil perceber
as razões dessa centralidade: se a estrutura pode ser entendida como o esqueleto da
organização, torna-se então evidente que o esqueleto influencia e constrange o
comportamento da e na organização. Neste capítulo serão abordados os seguintes pontos:
as funções da estrutura, as suas dimensões, determinantes e formatos. O texto conclui-se
com um breve exercício de «futurismo» no qual são contrastadas as linhas tradicionais e
emergentes de estudo da estrutura.

2. As funções da estrutura organizacional


À definição de organização subjaz por norma a ideia da existência de actividades
colectivas e coordenadas. E justamente para assegurar a coordenação das actividades que
existe uma estrutura. A medida que a organização evolui, assim vai coevoluindo a sua
estrutura, tal como ilustrado pelo bem conhecido excerto de Mintzberg, que a seguir se
apresenta:

A Sra. Raku fazia cerâmica na sua cave. Isso envolvia uma série de tarefas distintas —
amassar o barro, formar os potes, trabalhá-los enquanto ainda não estão totalmente secos,
preparar e aplicar o verniz e introduzi-los no fogo do forno de cerâmica. Porém, a
coordenação de todas estas tarefas não apresentava qualquer problema; era ela própria que
as fazia.
O problema residia na sua ambição e no facto de os seus potes serem tão atraentes:
as encomendas excediam a sua capacidade de produção. Então, ela contratou a Sra.
Bisque, que estava desejosa por aprender a fazer cerâmica. Mas isso significava que a Sra.
Raku tinha que dividir o seu trabalho. Uma vez que as lojas de artesanato pretendiam
cerâmica feita pela Sra. Raku, ficou decidido que a Sra. Bisque amassaria o barro e prepararia
o verniz, ficando a Sra. Raku encarregada do resto. E isto requeria coordenação do trabalho
— na verdade tratava-se de um pequeno problema, pois com duas pessoas numa oficina
de cerâmica, bastava-lhes simplesmente comunicar entre si informalmente. A combinação
resultou bem, tão bem que depressa a Sra. Raku estava atolada em encomendas. Tornava-
se necessário mais assistentes. Mas desta vez, para fazerem os seus próprios potes. A Sra.
Raku decidiu contratá-las logo que saíram da escola de cerâmica local. Deste modo, e
enquanto tinha levado algum tempo a treinar a Sra. Bisque, as três novas assistentes
sabiam exactamente o que fazer desde o começo e depressa se integraram; mesmo com
cinco pessoas, a coordenação não constituía um problema.
No entanto, à medida que foram precisas mais assistentes, começaram a surgir
problemas de coordenação. Um dia, a Sra. Bisque tropeçou num balde de verniz e quebrou
cinco potes; noutro, a Sra. Raku abriu o forno e descobriu que todos os vasos de pendurar
tinham sido envernizados por engano com a cor vermelha. Nessa altura compreendeu que
sete pessoas numa pequena oficina de cerâmica não conseguiam coordenar todo o seu
trabalho através de um mecanismo de comunicação informal. Para tornar as coisas piores, a
Sra. Raku, que agora se intitulava presidente da Ceramics, mc., era forçada a passar cada

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Gestão e Organização de Empresas

vez mais tempo com os clientes; nesses dias, era mais provável encontrá-la com um vestido
Marimekko do que usando um par de jeans. Assim, ela nomeou a Sra. Bisque para gestora
da oficina; deveria ocupar-se a tempo inteiro da supervisão e coordenação do trabalho das
cinco produtoras da sua cerâmica.
A empresa continuou a crescer. Grandes alterações aconteceram de novo quando foi
contratado um analista de estudo do trabalho. Ele recomendou mudanças, que implicavam
que cada pessoa desempenhasse apenas uma tarefa para uma das linhas de produtos
(potes, cinzeiros, vasos de pendurar e animais de cerâmica) — a primeira amassava o barro,
a segunda dava a forma, a terceira enfeitava e assim sucessivamente. Deste modo, a
produção adquiriu a forma de quatro linhas de montagem. Cada pessoa seguia um conjunto
de instruções estandardizadas, estudadas previamente por forma a garantir a coordenação
de todo o seu trabalho. Claro que a Ceramics, mc. deixou de vender para lojas de artesanato;
a Sra. Raku só aceitava encomendas de grossistas, a maior parte proveniente de cadeias
de supermercados.
A ambição da Sra. Raku era ilimitada, e quando surgiu a oportunidade de diversificar,
ela agarrou-a. Primeiro, azulejos, depois acessórios de casa-de-banho e finalmente tijolos de
barro. Subsequentemente, a empresa dividiu-se em três divisões — produtos para o
consumidor, produtos de construção e produtos industriais. A partir do seu escritório no
quinquagésimo quinto andar da Torre de Cerâmica, a Sra. Raku coordenava as actividades
das divisões através do balanço do seu desempenho em cada trimestre, tomando
pessoalmente medidas sempre que este e os valores de crescimento ficavam aquém do
previsto. Foi num dia em que estava à sua secretária analisando essas previsões
orçamentais, que a Sra. Raku decidiu dar um novo nome à sua empresa: «Ceramico»
(Mintzberg, 1983, pp. 1-2).

Tal como a descrição anterior permite verificar, a estrutura organizacional compreende


fundamentalmente duas componentes: (1) o modo como a organização divide o trabalho em
múltiplas tarefas, e (2) a forma como estabelece a coordenação entre elas (Mintzberg,
1979). Numa perspectiva próxima, Robbins (1990) refere a importância da estrutura como
decorrente do facto de ela permitir definir a atribuição das tarefas, as relações de autoridade
e os mecanismos de coordenação formal das actividades. Na estrutura ainda se englobam
os padrões de interacção resultantes dos pontos anteriores.
O estudo da estrutura organizacional tem-se baseado num conjunto de seis premissas,
que ajudam a compreender melhor quer o próprio conceito quer a forma como ele tem vindo
a ser investigado (Bolman & Deal, 1991):
1. As organizações existem para alcançar objectivos definidos
2. A estrutura de cada organização deve ser desenhada e implementada por forma a
ajustar-se às características específicas dessa organização (em termos de pessoas,
estratégia, produtos, tecnologia, etc.)
3. As organizações tendem a funcionar melhor quando a incerteza é controlada por
um conjunto de normas elaboradas com a finalidade precisa de evitar a
ambiguidade
4. A especialização facilita a obtenção de níveis elevados de desempenho,
nomeadamente por facilitar a cada indivíduo o conhecimento completo das suas
atribuições
5. A eficácia não é possível sem a correcta coordenação e controlo das actividades
individuais
6. Os problemas organizacionais resultam, muitas vezes, de estruturas pouco
apropriadas às reais necessidades da organização.

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Gestão e Organização de Empresas

Não se esgotando no conjunto de relações hierárquicas formalizadas no organigrama,


a estrutura cria linhas de comunicação e de relacionamento informais, que dão origem a
uma empresa «por detrás do organograma» (Krackhardt & Hanson, 1993), ou estrutura
informal. A estrutura informal corresponde ao lado não previsto e não planeado, mas não
necessariamente indesejado. Com efeito, a organização informal pode ser comparada ao
sistema nervoso central da organização (Krackhardt & Hanson, 1993), que entra em acção
sempre que é necessário resolver problemas inesperados e para os quais, portanto, não
existe uma resposta da estrutura formal. As redes sociais informais (que podem ser de
diversos tipos, como de aconselhamento, confiança e comunicação), são normalmente
estáveis ao longo do tempo e desconhecidas dos gestores.
Os anos 80 tornaram óbvia a importância da gestão do informal, ao realçarem a
importância de conceitos como a cultura organizacional (e.g. Peters & Waterman, 1982). A
comunicação informal pode funcionar, por outro lado, como uma fonte importante de
coordenação horizontal. A sua acção é indispensável porque se as organizações
prescrevem as linhas de comunicação verticais, elas tendem, nas abordagens clássicas, a
não considerar as comunicações horizontais.
Resumindo os respectivos objectivos, a estrutura da organização serve para (Daft,
1998):
1. Designar as relações de reporte formal
2. Identificar o agrupamento dos indivíduos por departamentos e estabelecer as
relações entre esses departamentos
3. Definir o desenho dos sistemas que asseguram a comunicação, coordenação e
integração do trabalho dos diversos departamentos.

3. Dimensões Estruturais

Com base no trabalho de Robbins (1990, pp. 82-83), é possível Considerar as


seguintes dimensões estruturais, isto é, o conjunto de dimensões que podem ser usadas
para caracterizar a estrutura de uma organização: amplitude de controlo, amplitude vertical,
autonomia, centralização, complexidade, componente administrativa, delegação,
diferenciação, especialização, estandardização, formalização, integração e
profissionalização.
Amplitude de controlo. Esta dimensão é talvez mais conhecida pela expressão inglesa
span of control, e refere-se ao número de indivíduos supervisionados por uma chefia. Trata-
se de uma dimensão relevante porque cada chefia deverá coordenar um número de
indivíduos suficientemente grande para não criar coordenadores em excesso, e
suficientemente pequeno para que a coordenação não deixe de existir por impossibilidade
de um mesmo indivíduo articular equipas demasiado grandes. Da mesma forma que não há
um número mágico para a quantidade ideal de membros de um grupo, não existe uma
solução universal para o número de subordinados por chefia. Assim sendo, a amplitude de
controlo de determinada chefia depende de um conjunto de variáveis que ajudam a encontrar
respostas caso a caso, nomeadamente (e com base em Vasconceilos e Sá, 1993):
(1) a diversidade das tarefas desempenhadas pelos subordinados, (2) a complexidade
associada a essas tarefas, (3) o grau de dispersão geográfica entre subordinados, (4) a
formação e motivação desses subordinados e (5) os mecanismos de controlo
organizacional.
É evidente, tendo em conta todas estas variáveis, que diferentes funções requerem
respostas adequadas para o seu caso particular, não se satisfazendo com generalidades

57
Gestão e Organização de Empresas

que apontem n como a amplitude de controlo aconselhada. Na GE, por exemplo, a


amplitude de controlo é actualmente de 10 a 12 empregados, o dobro de há vinte anos atrás.
Amplitude vertical. A amplitude vertical ou profundidade hierárquica refere-se ao
número de níveis hierárquicos que existem entre o topo e a base da organização (inclusive).
Quanto maior o número de níveis, maior a amplitude vertical e maiores as probabilidades de
surgimento do fenómeno social que Kanter (1983) apelida «mentalidade de elevador», um
fenómeno de conformação às regras instituídas, alimentado por uma longa e incontornável
cadeia hierárquica, a qual preza mais o respeito pelas regras do que os resultados obtidos e
que, por conseguinte, tende a privilegiar os comportamentos aos resultados de trabalho.
A tendência actual é a de considerar que a turbulência dos mercados aconselha as
organizações a adoptarem estruturas achatadas. Tais estruturas implicam a diminuição da
amplitude vertical, a qual pode apresentar inconvenientes graves ao nível da circulação da
informação e do processo de tomada de decisão. Estruturas mais achatadas, i.e., com
menor número de níveis hierárquicos, tendem a permitir maior rapidez e menos
enviesamentos no processo de circulação da informação. A introdução de tecnologias da
informação, por possibilitar a reestruturação dos processos de comunicação e a
deslocalização dos centros de decisão, será possivelmente uma causa a favor da diminuição
futura da amplitude vertical das organizações.
Autonomia. Refere-se à possibilidade de um indivíduo/grupo/departamento determinar
as suas próprias acções. A autonomia numa organização é sempre, em última análise,
limitada, porque cada unidade de decisão se deve submeter aos objectivos da própria
organização. Em todo o caso, diferentes organizações permitem diferentes margens de
influência das actividades. Correntes como a democracia industrial pugnaram, entre outros
objectivos, pelo aumento da autonomia no trabalho, e experiências conduzidas em vários
locais (particularmente nos países nórdicos) relevaram a importância da autonomia no
trabalho. Os grupos semiautónomos da Volvo representam, possivelmente, o exemplo mais
conhecido deste tipo de intervenção.
Centralização. A centralização refere-se, em termos simples, ao locus das decisões na
organização. Uma organização é tanto mais centralizada quanto mais concentra as decisões
nuns poucos lugares (indivíduos, departamentos). Pode-se dizer, deste modo, que a
centralização tem a ver com a dispersão decisional. Uma organização centralizada é aquela
que concentra as decisões num único ponto da organização (num indivíduo, grupo de
indivíduos, ou departamento) ou num número limitado de pontos, ao passo que uma
organização descentralizada é aquela que distribui a tomada de decisão por mais pontos.
Em vez de tomar as estruturas como centralizadas ou descentralizadas, é preferível falar em
grau de centralização/descentralização, uma vez que esta variável deve ser assumida como
percorrendo diversas gradações entre dois extremos possíveis.
Complexidade. A complexidade refere-se ao grau de diferenciação existente numa
organização: quanto mais diferenciada uma organização, mais complexa. A diferenciação
pode ser horizontal (a separação entre unidades do mesmo plano hierárquico, ao nível das
tarefas que executam, das qualificações dos seus profissionais, etc.), vertical (profundidade
hierárquica) ou espacial (grau de concentração / dispersão geográfica). Quando se aumenta
qualquer destes factores, aumenta-se o grau de complexidade da estrutura. A complexidade
é uma variável importante porque a ela estão ligados vários processos centrais para os
resultados da organização, nomeadamente a comunicação, a coordenação e o controlo.
Componente administrativa. A componente administrativa de uma organização diz
respeito à proporção do número de supervisores, gestores e pessoal de apoio, em relação
ao número total de trabalhadores. Algumas abordagens recentes da mudança
organizacional (como a reengenharia) têm atacado o excesso de componente administrativa
de muitas organizações, o qual multiplica o número de postos de trabalho, sorve uma

58
Gestão e Organização de Empresas

quantidade considerável de recursos e não tem um impacto significativo na quantidade ou


qualidade do trabalho produzido. As tecnologias da informação permitem redimensionar a
componente administrativa e, em caso de excesso, reduzi -l para níveis aceitáveis.
Delegação. A delegação refere-se à quantidade de decisões que o superior atribui
ao(s) subordinado(s). A delegação é normalmente conferida uma tónica positiva, a qual
resulta do facto de ela permitir o aumento da participação na organização. A semelhança
das demais técnicas organizacionais, a delegação não é boa nem má em si mesma: pode é
ser bem ou mal utilizada. Subordinados sem preparação ou com falta de vontade para
decidir ou participar na decisão, desaconselham obviamente a delegação. Estreitamente
relacionado com a delegação, encontram-se conceitos como os de empowerment e
autonomia. Todos eles, quando introduzidos de forma sistemática, implicam a redistribuição
do poder e a mudança do estilo de chefia (Leana, 1987). Tal como observado por Hoilander
e Offerman (1990), assiste-se no presente a um enfoque progressivo no empowerment dos
subordinados, por contraponto à centralização no poder dos líderes.
Diferenciação. Se uma organização pode ser entendida como um conjunto de pessoas
que trabalham de forma coordenada para o alcance de objectivos comuns, torna-se evidente
a necessidade de atribuir diferentes funções a pessoas diferentes. Esta divisão do trabalho
persegue o objectivo de distribuir tarefas diferentes por pessoas diferentes, de tal forma que
do trabalho de diversos especialistas resulte um produto / serviço que congregue as diversas
capacidades e especializações existentes na organização. Ao processo de divisão do
trabalho, pode-se chamar diferenciação, sendo esta entendida como a diferença entre as
orientações cognitivas e emocionais dos gestores dos diversos departamentos. Os autores
desta definição, Lawrence e Lorsch (1967), acrescentam o facto de organizações
competindo em envolventes mais instáveis e turbulentas precisarem de aceder a níveis de
maior diferenciação interna do que organizações competindo em ambientes mais plácidos.
Este mecanismo de diferenciação deverá ser contrabalançado por um mecanismo de
integração.
Especialização. Refere-se ao conjunto de actividades que um indivíduo deverá
executar no seu trabalho. A especialização pode ser funcional ou social. A especialização
funcional é normalmente mais conhecida como divisão do trabalho e consiste na separação
de uma unidade funcional em vários segmentos, os quais são depois distribuídos por vários
sujeitos. A especialização funcional promoveu, entre outros aspectos, a facilidade de
substituição dos empregados. Essa substituição torna-se mais difícil no caso da
especialização social. Aqui é o indivíduo que é especializado, e não o trabalho. Neste caso
contam-se principalmente aqueles especialistas cujos conhecimentos não são facilmente
substituíveis. Um médico especialista, um professor universitário ou um técnico comercial
perito numa determinada área, podem ser tomados como exemplos de especialização social.
Quanto maior for a especialização, maior será a complexidade, visto que organizações
com elevados níveis de especialização precisam normalmente de assegurar mecanismos
de coordenação mais sensíveis e apurados.
Estandardização. O desvio aceitável em relação àquilo que está previsto, é
denominado estandardização. Com a estandardização visam as organizações diminuir a
incerteza, rotinizar os procedimentos, e evitar afastamentos em relação ao planeado. Ao
recorrer a processos de estandardização, as organizações criam regras e regulamentos
capazes de constranger as condutas individuais e de limitar as alternativas comportamentais
disponíveis. Embora a estandardização se possa revestir de vantagens óbvias, ela pode
igualmente limitar as possibilidades de aprendizagem organizacional. Para ilustrar com uma
consequência positiva e outra negativa, dir-se-ia que se por um lado a estandardização
facilita o aumento da eficiência, ela diminui a capacidade de inovação e a busca de soluções
criativas para os problemas emergentes.

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Gestão e Organização de Empresas

Formalização. O grau em que as actividades do empregado se encontram definidas


por escrito. A formalização refere-se por isso ao maior ou menor grau em que o indivíduo
dispõe da possibilidade de realizar o seu trabalho «à sua maneira». Em funções /
organizações muito formais, a possibilidade de o indivíduo imprimir um toque pessoal ao
trabalho que executa é consideravelmente limitada, ao passo que em organizações menos
formais, essa possibilidade é acrescida. Quando formaliza o trabalho, uma organização
espera recolher benefícios decorrentes da previsibilidade das acções individuais; quando
evita a formalização, pretende tirar partido das capacidades individuais em termos de
criatividade e flexibilidade de resposta a problemas imprevisíveis, por exemplo. A
semelhança das restantes dimensões estruturais, a formalização não é, em si mesma, boa
ou má. Diferentes funções e diferentes organizações reclamam diferentes níveis de
formalização: se o trabalho de um professor universitário é pouco regulamentado por regras,
políticas ou procedimentos, o do empregado de uma multinacional de refeições rápidas
tende a obedecer a regras muito explícitas e relativas mesmo a aspectos que a maioria das
organizações tende a não formalizar.

QUADRO 1 — Ligações verticais e horizontais (Baseado em Daft, 1998)

Ligações verticais
Reporte hierárquico A cadeia de comando ilustrada pelas linhas verticais do organograma,
que indica para que nível um problema deve ser passado quando não
pode ser resolvido pelo nível inferior.
Regras e planos Documentos que estabelecem a forma de actuação corrente para
problemas previstos, permitindo dessa forma resolver um problema sem
o passar para um nível mais elevado na hierarquia; os planos, de que é
exemplo o orçamento, tornam possível a definição de limites para a
tomada de decisão a um determinado nível
Sistemas de informação verticais Visam aumentar a circulação de informação a diferentes níveis,
tornando mais verticais eficiente a comunicação ao longo da cadeia (por
exemplo, via e-mail).
Ligações horizontais
Sistemas de informação Servem para melhorar a facilidade e a rapidez de comunicação entre
diferentes departamentos, recorrendo por exemplo a tecnologias de
informação.
Contacto directo A comunicação directa entre pessoas de diferentes áreas (e.g. face-a-
face ou por telefone). Podem ser atribuídas funções formais de ligação,
o que significa que um indivíduo localizado num departamento assume
a responsabilidade de estabelecer a comunicação com outro
departamento (e.g. um engenheiro da área de investigação e
desenvolvimento pode ser designado como responsável pela articulação
com a produção).
Task forces Um comité temporário, que articula pessoas de diferentes
departamentos envolvidos num problema comum. Distingue-se das
formas anteriores por envolver mais do que dois departamentos. De
regresso ao seu departamento, cada representante deve apresentar as
conclusões e sugestões da task force.
Integradores Neste caso, é criada uma posição ou departamento responsável, a
tempo inteiro, por actividades de comunicação e coordenação. Esta
posição ou departamento, ao contrário das task forces, não reporta a
nenhum departamento funcional. Exemplos deste papel incluem os
gestores de produto ou de projecto.
Equipas Task forces permanentes, muitas vezes usadas em conjunto com
integradores. Constituem o mais poderoso instrumento de coordenação
horizontal e são aconselháveis quando se colocam necessidades
intensas de coordenação durante longos períodos de tempo.

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Gestão e Organização de Empresas

Profissionalização. O grau em que os trabalhadores usam uma Organização


profissional como referência; a dedicação que a sua área de trabalho lhes merece; a
autonomia a que consideram ter direito. Quanto mais profissionalizada for a organização,
mais os indivíduos que nela trabalham conhecem os limites esperados da sua conduta. Para
conseguir níveis elevados de profissionalização (que se refere, como tal, à normalização do
comportamento dos indivíduos de um determinado grupo profissional), uma organização
pode: (1) contratar indivíduos já profissionalizados, i.e., sujeitos a uma aprendizagem
intensiva, ou (2) ela própria investir na profissionalização dos seus colaboradores, definindo
comportamentos esperados, fluxos de trabalho, códigos profissionais, etc. Quanto maior for
o grau de profissionalização numa organização, menor será o nível de formalização
requerido: o profissional internalizou as regras e adquiriu uma cultura profissional, que
funciona ela própria como um mecanismo de controlo (Cunha & Cunha, 1999).

4. Determinantes
Nesta secção serão apresentadas as variáveis determinantes do tipo de estrutura de
uma dada organização, isto é, aquelas que influenciam a sua estrutura: dimensão,
tecnologia, envolvente e estratégia. A escolha, pela organização, de um arranjo organizativo,
não é portanto totalmente «desconstrangida», uma vez que o conjunto de imperativos que a
seguir se apresenta, limita as escolhas possíveis e estreita os graus de liberdade dos
gestores na escolha de um formato estrutural.
Dimensão. A dimensão de uma empresa, ou seja, o seu número de empregados,
reflecte-se inevitavelmente na estrutura por ela adoptada. A medida que uma organização
cresce, surge a necessidade de ajustar a estrutura a tal crescimento, uma vez que uma
empresa de média dimensão não pode funcionar de forma semelhante a uma empresa
familiar (recorde-se, a este propósito, o excerto de Mintzberg apresentado no início deste
capítulo). O crescimento tende a implicar um aumento dos níveis de formalização e
complexidade. A divisão do trabalho envolve um número progressivamente maior de
pessoas e de tarefas, que impossibilitam a gestão baseada na comunicação informal, e que
numa fase subsequente tornam necessária a evolução para um estágio mais complexo de
divisão e coordenação do trabalho. A dimensão da organização constrange portanto as
escolhas estruturais possíveis e os processos que nesse contexto estrutural tomam lugar.
Tecnologia. Seja qual for a dimensão da organização, a sua estrutura acaba por
depender, em alguma medida, da tecnologia em uso: diferentes meios tecnológicos implicam
diversos sistemas de divisão e integração do trabalho. Diferentes tecnologias envolvem a
organização em níveis distintos de previsibilidade e eficácia, requerem conhecimentos de
níveis diversos, estimulam níveis de participação mais altos ou mais baixos. Em regra, pode
afirmar-se que quanto maior a complexidade tecnológica de uma organização, maior a sua
complexidade estrutural (Bolman & Deal, 1991). Quanto menos exigente for a tecnologia (em
termos de conhecimentos, formação, autonomia, capacidade de decisão), menores serão os
esforços requeridos ao nível da especialização e coordenação. Comparem-se, por exemplo,
as exigências de coordenação dos empregados de um restaurante e dos membros de uma
equipa de cirurgia coronária. A variável tecnológica assume uma importância crucial no
funcionamento das organizações contemporâ neas na medida em que a actualização

61
Gestão e Organização de Empresas

tecnológica funciona como condição sine qua non para o desenvolvimento e sobrevivência
das organizações.
Envolvente. A envolvente interfere com o funcionamento das organizações. Dessa
influência decorre que as organizações que competem em envolventes muito instáveis e
turbulentas não deverão adoptar estruturas demasiado rígidas. Este facto foi observado pela
teoria contingencial (vide Lawrence & Lorsch, 1967), que defende que diferentes envolventes
favorecem diferentes tipos de estruturas. A ideia de contingência não deve, todavia, ser
tomada de uma forma determinista, pois que a uma envolvente não corresponde
necessariamente «uma melhor estrutura». Se assim fosse, teria que ser rejeitado o princípio
da equifinalidade dos sistemas abertos (Katz & Kahn 1978), e aceite um determinismo
ambiental que contraria a evidência.
Como regra, porém, estruturas mais orgânicas ou mecanicistas são mais ajustadas ou
menos em função das características da envolvente, como ilustrado pelo Quadro 2. Em
resumo, este quadro indica que envolventes mais instáveis recomendam estruturas de tipo
orgânico e que envolventes mais estáveis favorecem estruturas de tipo mecanicista.
Investigação recente, todavia, indicia que as empresas detentoras de melhor registo de
inovação misturam características orgânicas e mecanicistas, em vez de apresentarem um
modo de funcionamento puramente orgânico ou mecanicista (Brown & Eisenhardt, 1997).
Estes dados sugerem a necessidade de considerar a existência de organicismo-mecanicista
ou mecanicismo-organicista (sobre a necessidade de síntese.

QUADRO 2 — Características da estrutura, características da envolvente e grau


de ajustamento (retirado de Mabey, Salaman & Storey, 1998, p. 248)

Mecanicista Orgânica

Instável X Desajustada V’ Ajustada

Estável V’ Ajustada X Desajustada

Estratégia. De acordo com a famosa máxima de Chandler (1962), a estrutura deve


seguir a estratégia. Quer isto dizer que a estrutura é inevitavelmente constrangida pela
estratégia da organização, devendo articular e integrar funções por forma a facilitar o alcance
dos objectivos organizacionais. Deste modo, diferentes estratégias requerem diferentes
arranjos organizativos para responder adequadamente a diferentes necessidades. Assim,
organizações com estratégias defensivas, prospectoras ou analisadoras (Miles & Snow
1984a), acabam por ter modos de funcionamento profundamente diversos (ver Quadro 3).

62
Gestão e Organização de Empresas

QUADRO 3 — Estratégias e processos, segundo a tipologia de Miles e Snow (1984a, p. 48)

Defensiva Prospectora Analisadora

Linhas de produto
limitadas e estáveis
Linhas de produto alargadas
Linhas de produto estáveis e mutáveis
• Mercados previsíveis Mercados em mudança
Mercados previsíveis e em mudança.
Produto-mercado • Crescimento por • Crescimento por
• Crescimento principalmente por
penetração de desenvolvimento de produtos e
desenvolvimento do mercado Ênfase
mercado mercados Ênfase no
no foco e profundidade
alargamento
• Ênfase na
profundidade

• Extensiva • Focada
Investigação e • Limitada a melhorias
desenvolvimento de produto • Ênfase em ser o primeiro no • Ênfase em ser «o segundo no
mercado mercado»

• Grande volume-baixo
custo • Adaptada aos consumidores • Grande volume-baixo custo
Produção • Ênfase na eficiência Ênfase na eficácia e design do • Ênfase na engenharia de processo e
e na engenharia de produto na gestão de marcas ou produtos
processos

• Grande ênfase na pesquisa de • Uso extensivo de campanhas de


Marketing • Limitado às vendas
mercado marketing

Estrutura • Funcional • Divisional • Funcional e matricial

• Fundamentalmente centralizados
Processos de
• Centralizados • Descentralizados com descentralização nas áreas de
controlo
marketing e gestão de marcas

• Presidente-
Coligação produção- • Presidente-I&D- pesquisa de • Presidente-marketing -engenhari de
dominante mercado processo
-finanças

• Planeamento • Actuação • Avaliação


Sequência de
- actuação - avaliação - Planeamento
planeamento
- avaliação - planeamento - Actuação

Menos «proclamada» mas não despicienda é a ideia de que a estrutura também pode
constranger a estratégia. Embora tal suposição vá contra as regras enunciadas em qualquer
manual de gestão, a existência de níveis de inércia estrutural elevados (vide Cunha, 1996),
pode actuar como um obstáculo à mudança e como um contrapeso à redefinição da
estratégia. Dada a dificuldade de alterar aquilo que existe, as organizações acabam por
vezes por devotar as suas forças à defesa do modo de funcionamento corrente, mesmo que
se comecem a acumular os indícios de que esse funcionamento já não serve os propósitos
da organização. São diversos os sintomas de falha da estrutura de uma organização
relativamente à consecução dos objectivos para que foi criada. Entre eles encontram-se os
seguintes (Daft, 1998):

• Adiamento ou falta de qualidade das decisões. Tende a ocorrer quando a estrutura


canaliza uma quantidade excessiva de decisões para o topo da hierarquia, quando a

63
Gestão e Organização de Empresas

informação não chega às pessoas correctas, ou quando a informação que chega às


pessoas correctas não tem a qualidade requerida.
• Défice de inovação. A organização não se revela capaz de responder com inovação à
mudança da envolvente. Ocorre mais frequentemente na ausência de níveis adequados
de coordenação horizontal e de pontos suficientes de contacto com o exterior (Cunha,
1998). Pode também suceder que a organização não disponha de mecanismos
adequados de recolha ou de circulação interna de informação.
• Níveis demasiado elevados de conflitualidade. Ocorre quando os níveis de
coordenação e de ajustamento de objectivos interdepartmentais são insuficientes, o
que permite que cada departamento ponha a tónica em objectivos de nível
departamental, que dificultam o alcance dos objectivos da organização. Uma vez mais,
trata-se de um sintoma mais provável na ausência de mecanismos de coordenação
horizontais.

5. Formatos estruturais
A mudança das texturas ambientais, combinada com a evolução tecnológica e o
desenvolvimento de novas realidades socioeconómicas, tem obrigado as organizações a
adaptar as suas estruturas às novas características da envolvente.
Com base em trabalhos como os de Daft (1998), Hrebiniak ei’ ai. (1989, pp. 12-13) e de
Miles e Snow (1984b, pp. 38-41), é possível traçar a evolução das estruturas organizacionais,
e assim ficar com uma visão historicamente enquadrada do seu processo evolutivo.
Apresentam-se a seguir as principais formas estruturais identificadas na literatura. Esta
recolha não é exaustiva, por duas razões: por deixar de fora algumas formas menos
referidas (como a agência) e por não se deter na infinidade de formas híbridas que pontuam
a prática organizacional (Galbraith, 1995). Não obstante, a exposição deverá ser
representativa dos principais formatos estruturais, proporcionando uma visão rápida dos
principais arranjos organizativos, nomeadamente: estrutura funcional, estrutura divisional,
matriz, estrutura horizontal e estrutura em rede.

Estrutura funcional
Neste caso, as actividades são agrupadas por função (ver Fig. 1). Isto é, os empregados
com actividades de marketing são colocados num mesmo departamento, os de produção
noutro departamento e assim sucessivamente. Dentro de cada departamento, continua a
distribuição por áreas de actividade. A estrutura funcional racionaliza o trabalho dividindo
tarefas e atribuindo a sua gestão a especialistas na área. As diversas áreas funcionais
(produção, comercial, finanças, recursos humanos, etc.) são portanto separadas e
controladas centralmente por uma equipa de gestão que articula as suas actividades no
sentido de uma estratégia comum.
A estrutura funcional é um formato adaptado a envolventes estáveis. Pressupõe a
existência de centralização dos processos de controlo e de decisão, institucionaliza
sobretudo a comunicação vertical e encontra-se preparada para integrar níveis elevados de
especialização técnica. As linhas de produtos são limitadas e estandardizadas, e a escala de
negócio limitada.
A estrutura funcional apresenta diversos pontos fortes. Por um lado, consegue obter
níveis apreciáveis de eficiência e mostra-se capaz de dar resposta às exigências de
mercados para os quais é importante a estandardização e a quantidade. Por outro, o facto
de todos os profissionais de uma determinada área estarem agrupados, facilita o
desenvolvimento das respectivas competências. Em contrapartida, trata-se de um formato
que não estimula a exposição às actividades de outros departamentos, o que pode dificultar

64
Gestão e Organização de Empresas

a coordenação interdepartamental, criar alguma lentidão na resposta a mudanças na


envolvente e constituir uma barreira à inovação.
Algumas organizações têm procurado manter as vantagens deste formato, eliminando
os respectivos inconvenientes, recorrendo para isso à introdução de ligações horizontais
sobre a base funcional. O culminar deste tipo de prática poderá ser a organização
hipertextual. Na organização hipertextual (Nonaka & Ichijo, 1997), coexistem grupos
altamente flexíveis e um contexto hierárquico, o que prepara a organização para competir
em dois mundos (Rayport & Sviokla, 1995):
(1) um mundo tangível, do material, para o qual fora desenhada a forma estrutural
funcional; (2) um mundo imaterial ou virtual, que tem na informação o seu recurso
fundamental, e que é melhor abordado pelos formatos horizontalizados.

FIGURA 1 — Estrutura funcional

Director geral

Produção I&D Finanças Marketing

QUADRO 4 — Características da estrutura funcional


Contexto Sistemas internos Pontos fortes Pontos fracos

• Ênfase operacional
• Envolvente estável e pouco • Permite economias de • Respostas lentas à mudança
nos objectivos
incerta escala nos departamentos ambiental
funcionais

• Tecnologia de rotina e
• Pequena ou média • Aprofundamento dos
com baixos níveis de • Ênfase nos custos
dimensão conhecimentos
interdependênca

• Falta de comunicação
interdepartamental

• Facilita o alcance • Pouca inovação


• Autoridade formal dos objectivos funcionais
• Ênfase na eficiência e na
pelos gestores • Visão restrita dos objectivos
qualidade técnica
funcionais • Adapatada a um organizacionais
ou poucos produtos
• Pode amontoar as decisões
no topo e levar à sobrecarga
decisional da hierarquia

Estrutura divisional
Na estrutura divisional, o agrupamento é baseado nos resultados organizacionais. Trata-se
portanto de recriar a anterior estrutura funcional, agora no contexto de um determinado
grupo de produto (variantes deste formato incluem as estruturas geográfica e por mercado).
Cada um destes grupos será dotado de uma estrutura funcional (com os próprios
departamentos de marketing, produção, etc.), focalizada num grupo de produto específico, o
65
Gestão e Organização de Empresas

que permite decisões mais rápidas, visto que as linhas de autoridade convergem para um
nível hierárquico inferior (ver Fig. 2).
A necessidade de inovar e de dar resposta a novas exigências competitivas, obrigou as
grandes empresas a procurar este novo arranjo estrutural, mais flexível e mais dado à
inovação e à diversificação. Neste tipo de organização, são formadas divisões a um mercado
particular, lançar os seus próprios produtos/serviços e proceder ao seu próprio ajustamento
interno. Em termos simples, pode-se dizer que a estrutura divisional centraliza o planeamento
e descentraliza as operações.
Este tipo de estrutura foi a resposta de um conjunto de grandes empresas americanas
(General Motors, Du Pont, Standard Oil e Sears, Roebuk) às crises que as assolavam. Com
a estrutura divisional, cada subsistema faz face a problemas semelhantes aos que antes
eram enfrentados pela empresa-mãe, mas agora reduzidos a uma escala menor. Ao nível da
administração, os responsáveis ocupam-se de problemas como as relações
interorganizacionais, as decisões de investimento, a prospecção de novos mercados, etc.
Este tipo de estrutura permite, por exemplo, que o mesmo tipo de actividade possa ser
desenvolvido a dois níveis: ao nível da divisão e ao nível central. No caso da I&D, ao nível
central estudam-se problemas genéricos da indústria; ao nível da divisão, são considerados
aspectos de um produto específico para um determinado mercado. Esta forma estrutural
rasgava novos horizontes para as organizações que, aparentemente, podiam crescer
indefinidamente e na proporção da existência de novos mercados e de capital disponível
para inaugurar uma nova divisão. Nos anos 60 e 70, as organizações viram-se confrontadas,
todavia, com a necessidade de garantir níveis de eficiência razoáveis sem perder a
capacidade de responder às novas solicitações do mercado. Era necessário, como tal,
encontrar uma estrutura capaz de ajustar as vantagens das estruturas funcional e divisional:
a matriz.
Entre as desvantagens da estrutura divisional contam-se a perda de economias de
escala (visto que em que em cada divisão são desenvolvidas as mesmas funções), e a
dificuldade de coordenação entre linhas de produto, já que estas se encontram separadas
não apenas em diferentes divisões, mas também em localizações distintas. Nem sempre
este tipo de estrutura tem preparada, por exemplo, uma resposta integrada à exigência de
um cliente interessado em produtos de diferentes divisões da mesma empresa.

66
Gestão e Organização de Empresas

QUADRO 5 — Características da estrutura divisional


Contexto Sistemas internos Pontos fortes Pontos fracos

• Envolvente moderada ou • Ênfase • Elimina as economias de


altamente incerta e operacional na • Adaptada a envolventes em mudança escala nos departamentos
mutável linha de produtos funcionais

• Tecnologia não-
• Grande • Tende a aumentar a satisfação do
-rotineira e elevada • Pouca coordenação entre
importância dos cliente porque são claros os pontos de
interdependência linhas de produto
centros de custos contacto e as responsabilidades
departamental

• Grande dimensão, • Autoridade formal • Implica forte coordenação • Dificulta a especialização e


muitos produtos nos gestores de interfuncional o aprofundamento das
produto competências

• Ênfase na eficácia, • Permite a adaptação a diferentes • Dificulta a integração e a


adaptação e satisfação produtos, regiões ou mercados . estandardização entre linhas
do cliente Descentraliza a tomada de decisão de produto

Matriz
Para combinar eficiência e capacidade de resposta, algumas organizações adoptaram a
matriz como estrutura. A estrutura matricial (uma das variantes possíveis dos formatos
estruturais mistos) visa algo que se poderá descrever com um estado de eficiência elástica,
usando para o efeito um sistema múltiplo de comando (Davis & Lawrence, 1977). Ao
complementar a estrutura funcional com a divisional (isto é, ao implementar em simultâneo
estrutura funcional e divisão por produtos; ver Fig. 3), a matriz resulta numa estrutura
complexa e algo ambígua, que deverá ser usada apenas se existirem condições favoráveis
para a sua implementação.
A estrutura matricial assenta num par de princípios: (1) a autoridade dual, e (2) o
equilíbrio de poder. O primeiro refere-se ao facto de os trabalhadores poderem ter dois
supervisores; o segundo defende que o poder dos dois supervisores deve ser
aproximadamente semelhante (Daft, 1998). Com estes dois princípios, a organização visa
expor os trabalhadores a um chefe funcional e a um chefe de projecto. O poder destes dois
responsáveis deve ser equilibrado porque, quando tal não sucede, da matriz resta o nome.
Para equilibrar o poder dos dois supervisores, a organização deve proporcionar-lhes iguais
níveis de influência em termos das decisões de recompensa e promoção dos subordinados,
oportunidades de comunicação semelhantes, e a mesma importância no quadro do projecto.
Se a matriz for devidamente implementada, ela permite que sejam obtidos níveis de
coordenação e integração, comunicação lateral e circulação da informação, superiores quer
aos da estrutura funcional quer aos da divisional. Possibilita igualmente uma afectação
flexível dos recursos organizacionais e a aquisição, pelos gestores, de competências mais
gerais ou mais específicas, consoante os seus interesses e os da organização. Não custa
perceber a razão pela qual se referiu que a estrutura matricial necessita de condições muito
especiais para resultar: o equilíbrio necessário entre as componentes funcional e de projecto
não é fácil de atingir nem de preservar. Em caso de uma correcta implementação, são
potencialmente alcançados níveis elevados de qualidade técnica (tipicamente relacionada
com a estrutura funcional) e inovações de produto frequentes (associadas à estrutura
divisional). Os inconvenientes deste formato envolvem a dificuldade de manutenção do
equilíbrio entre linhas de autoridade, a possibilidade de os empregados se verem envolvidos

67
Gestão e Organização de Empresas

em situações de conflito entre as linhas vertical e horizontal (note-se que a unicidade de


comando, uma das regras da administração definidas por Fayol, é aqui «desrespeitada»), e
a possibilidade de ser despendido muito tempo em processos negociais entre as linhas
vertical e horizontal. Para ultrapassar este potencial desequilíbrio de autoridade, algumas
organizações ensaiaram a criação de matrizes funcionais ou de matrizes de projecto, nas
quais a chefia funcional ou a de projecto, respectivamente, toma a primazia. Nas primeiras, a
chefia de projecto serve sobretudo de instrumento de coordenação, ao passo que nas
segundas a chefia funcional coordena a afectação de pessoal e presta consultoria interna
em áreas da sua especialidade.

Contexto • Sistemas internos Pontos fortes Pontos fracos


• Envolvente muito incerta • • Ênfase • Permite os níveis de Experiência de autoridade
operacional função coordenação requeridos dual, potencialmente
e no produto para enfrentar exigências frustrante e confusa
duais da envolvente
• • Sistemas duais • Partilha flexível dos
• Tecnologia não rotineira e • Exige dos participantes
níveis muito elevados de de planeamento e recursos humanos entre boas competências
interdependência orçamentação: por produtos interpessoais
função e por
produto
Ênfase na especialização • • Autoridade formal • Ajustada ao caso de • Pode tomar muito tempo
técnica e na inovação de repartida entre os decisões complexas e na resolução de conflitos
produtos gestores mudanças frequentes na
funcionais e de envolvente
produto
• Dimensão moderada e • Permite desenvolvimento • Não funciona se for
poucas linhas de produtos funcional e por produto mantido um software
mental verticalista
Exige da envolvente
pressão para a manutenção
do equilíbrio entre poderes
QUADRO 6 — Características da estrutura matricial

Estrutura horizontal
Recentemente, por influência das diversas abordagens centradas no processo (Denison,
1997; Sutcliffe, Sitkin & Browning, 1997), tem ganho evidência um novo formato

68
Gestão e Organização de Empresas

organizacional: a estrutura horizontal, na qual a base da organização já não mais é a função


mas o processo.
Neste caso, a organização já não se estrutura de forma a obter os benefícios da
especialização funcional (por exemplo, maior eficiência e possibilidade de aprofundamento
da especialização), mas antes os da proximidade multifuncional (como uma maior
velocidade de resposta e maior agilidade decorrente da proximidade de profissionais com
diferentes especializações). Verifica-se neste formato um achatamento da hierarquia, sendo
as decisões delegadas até ao nível mais baixo possível.
Este tipo de organizações baseia-se na actividade de equipas, com um processo (e.g.
inovação de produtos, processamento de encomendas) a ser executado por várias equipas
(a Kodak, por exemplo, reorganizou a sua estrutura em torno de mais de 1000 equipas). As
equipas auto-dirigidas constituem, aliás, a unidade fundamental deste tipo de estrutura, por
vezes conhecida como organização baseada em equipas. Tais equipas devem: (1) ter acesso
ao conjunto de recursos necessários para executar a tarefa; (2) ser multifuncionais, ou seja,
incluir profissionais de diversas áreas, e (3) dotadas do poder suficiente para executar
correctamente o seu trabalho.
Este formato estrutural apresenta importantes vantagens ao nível da rapidez, do
contacto com o mercado e da comunicação interdepartamental, o que ajuda a aumentar os
níveis de inovação e flexibilidade. Todavia, pode ser de difícil adopção, na medida em que
requer uma clara mudança da filosofia de gestão. Essa mudança nem sempre é fácil, porque
muitos dos problemas das estruturas funcionais persistem na organização baseada em
equipas (e.g. mentalidade funcionalista e competição intergrupal; vide Korine, 1999). Os
papéis do líder, por exemplo, são severamente alterados, sendo que um incorrecto exercício
da liderança pode facilmente destruir as vantagens das equipas. No que se refere aos
empregados, aumenta significativamente o potencial de exposição ao mercado e o nível de
empowerment, o que rompe em muitos casos com a prática corrente da organização.

69
Gestão e Organização de Empresas

QUADRO 7 — Características da estrutura horizontal

Contexto Sistemas internos Pontos fortes Pontos fracos

• Ênfase operacional no • Achatamento da hieraquia, Exige uma mudança clara da filosofia de


• Envolvente
processo enquanto meio maior contacto gestão relativamente às formas
instável e incerta
de criação de valor multifuncional estruturais dominantes

• Ênfase na • Constituição de equipas


• Melhorias potenciais de
rapidez, multifuncionais para • O processo de transição pode ser
rapidez
proximidade do conduzir as subpartes do difícil e confuso para os envolvidos
e eficiência
cliente processo

• Busca de
vantagem
• Delegação do trabalho ao • Queda das barreiras • Nem sempre aos supervisores é fácil
competitiva
mais baixo nível possível interdepartamentais assumir um papel de coaching
em envolventes
turbulentas

• Exige uma mudança clara dos


sistemas de gestão, nomeadamente dos
Facilitação da colaboração
sistemas «moles» (e.g., sistemas de
recompensa)

• Forte exposição aos


clientes e
fornecedores
• Maior potencial motivador
do trabalho

Estrutura em rede
O mais recente produto evolutivo em termos de formatos organizativos é a estrutura em rede
(ver Fig. 5). Aproveitando o exemplo de Miles (1989), a essência da rede pode ser descrita
recorrendo à observação de uma peça de equipamento para hóquei no gelo: design
escandinavo, desenvolvida nos Estados Unidos de modo a adaptar-se às exigências dos
mercados americano e canadiano, fabricada na Coreia do Sul e distribuída inicialmente no
Japão. A rede pode assim ser descrita (Mabey et ai., 1998) como uma entidade económica
que engloba um conjunto de organizações ou unidades de negócio, com poucos níveis
hierárquicos e recurso extensivo à subcontratação (outsourcing). Trata-se de um formato
que releva a importância da confiança e que permite operacionalizar o conceito de cadeia de
valor ao reconfigurar a estrutura da organização de uma forma que lhe permite centrar-se
nas suas competências nucleares.
A rede (que existe em vários formatos; vide Miles & Creed, 1995), rompe
definitivamente com a velha ideia de organização. No exemplo acima apresentado, as funções
produtivas estão separadas por várias organizações, as quais por sua vez se podem
encontrar espalhadas por diversos países. Com este tipo estrutural, entra em cena uma
nova forma de organização, que se afasta radicalmente da estrutura piramidal habitualmente
usada para representar a organização (ver Fig. 5). Na rede, a organização procura reter
internamente as suas competências nucleares (Hamel & Prahalad, 1994), subcontratando
as demais actividades a organizações nelas especializadas. E claro que este formato
não deixa de levantar algumas questões que urge resolver, nomeadamente a assunção do
papel de integrador dos vários parceiros da rede (ao qual cabe a coordenação do fluxo de
trabalho ao longo da cadeia de valor), e a potencial ocorrência de comportamentos
oportunistas da parte de algumas organizações envolvidas.
70
Gestão e Organização de Empresas

A estrutura em rede, adoptada por organizações como a Nike ou a Benetton, é antes


de mais consequência directa dos avanços tecnológicos na área da informação e da
comunicação, que permitem dispersar o trabalho e, por isso, centralizar numa só
organização um conjunto de vantagens competitivas disseminadas por diversos países ou
mesmo continentes. Entre outros, tem este formato o objectivo de derrubar as barreiras intra
e interorganizacionais, ou seja, criar a organização sem limites, descrita por Jack Welch, da
General Electric, como se segue (Hirschhorn & Gilmore, 1992, p. 104): «o nosso sonho para
os anos 90 é uma empresa sem limites, na qual tenham sido derrubadas as barreiras
[estruturais e psicológicas] que internamente nos separam uns dos outros e dos nossos
parceiros no exterior». A construção de laços fortes com outras organizações tem
demonstrado ser um factor importante de adaptação e de redução da incerteza,
nomeadamente por aumentar a comunicação e facilitar a partilha de informação.

FIGURA 5 — Estrutura em rede

Para concluir esta discussão dos novos formatos organizativos, deve ser notado que as
redes não constituem uma solução para todos os problemas e desequilíbrios característicos
de formatos anteriores. Aliás, se se considerar o facto de uma empresa subcontratada numa
rede poder ter uma estrutura funcionalista, resulta claro que as expectativas podem dar lugar
a ilusões ou promessas não cumpridas (Kovács, 1999), nomeadamente a de que a rede
contribui para redistribuir o poder e democratizar o trabalho, ou para um melhor cumprimento
da responsabilidade social da organização.

QUADRO 8 — Características da estrutura em rede


Contexto Sistemas internos Pontos fortes Pontos fracos

• Substituição do controlo • Ênfase no conceito de • «Enxuta» ou «emagrece» • Perda de controlo (i.e., aumento
hierárquico pelo controlo do competência nuclear a organização da dependência) de actividades
mercado não nucleares

• Focalização da empresa nas • Grande importância • Pode favorecer o • Maior dificuldade com o
suas competências nucleares da rapidez e empreendimento interno controlo de qualidade de
flexibilidade operações não executadas pela
empresa
• Recurso a tecnologias de • Recurso a estratégias . Grande flexibilidade e • Maior instabilidade estrutural,
informação sofisticadas, para de parceria rapidez de resposta dado que os parceiros podem
efeitos, por exemplo, de mudar
coordenação
• Ajustada à exploração do • Poder centrado no • Permite o rearranjo e a • Dificuldade de criação de uma
conceito de cadeia de valor integrador da rede redistribuição rápida dos cultura «de rede» organizacional
recursos organizacionais

Evita a perda de tempo e o • Pode estimular


dispêndio de recursos em comportamentos oportunistas
actividades pouco • Possibilidade de competição
relevantes pelo papel de integrador da rede

71
Gestão e Organização de Empresas

6. Prospectivas
Tem sido rápida a evolução das estruturas organizacionais. Essa rapidez permite tecer
algumas considerações finais, que funcionam simultaneamente como conclusões e
prospectivas, dedicadas aos seguintes tópicos: a evolução conjunta de novas tecnologias,
novas envolventes e novos formatos; a vantagem de entender as estruturas como
configurações; a necessidade de rever alguns «dados adquiridos» da ciência organizacional.

Novas tecnologias, novas envolventes, novos formatos

A evolução dos formatos estruturais das organizações, estimulada pela coevolução das
tecnologias e das paisagens competitivas, tem ilustrado a existência de uma mudança
sensível na lógica estruturante: da hierarquia de controlo, passou-se à primazia do processo,
o que significa que as formas emergentes assentam já não na função mas na cadeia de
valor, definível como «a sequência de actividades que acrescentam valor ao longo do
processo que se inicia com a obtenção de matérias-primas e que culmina na colocação do
produto (ou serviço) à disposição do consumidor» (Almeida Costa, 1998, p. 79).
Com as estruturas centradas no processo, procuram as organizações aumentar o valor
proporcionado ao cliente. Para Nonaka e Ichijo (1995, p. 46), o valor da organização pode
ser entendido como:

«a criação de novo conhecimento que é o resultado das actividades da organização.


Este conhecimento pode ser a ideia para um produto, um novo processo de produção,
novas logísticas, novos sistemas de gestão ou outras inovações que acabem por
conduzir a preço baixo, qualidade elevada, excelência de serviço, ou características
inovadoras do produto. De acordo com a perspectiva da criação de conhecimento sobre
o valor, as organizações devem ser desenhadas por forma a serem capazes de criar
novo conhecimento. Por criação de conhecimento organizacional, referimo-nos à
capacidade da organização como um todo para criar novo conhecimento, disseminá-lo
através de toda a organização, e incorporá-lo nos seus produtos, serviços ou
sistemas».

Esta mudança de «quadro mental» trouxe uma série de alterações profundas à ideia de
estrutura e ao processo de estruturação, conforme indicado pelo Quadro 9. Com estas
mudanças visam as organizações adoptar estruturas que facilitem a criação de valor e que
aproximem a empresa do mercado. Organizações que aprendem, guiadas pelo mercado, ou
criadoras de conhecimento, são aquelas que usam a estrutura como uma alavanca para a
criação de valor — tal como referido por Nonaka e Ichijo — e não apenas como um
mecanismo de controlo.

72
Gestão e Organização de Empresas

QUADRO 9 — Estrutura organizacional: Perspectivas e prospectivas

Perspectiva (dominante) Prospectiva (emergente)


Estrutura Processo

Hierarquia Cadeia de valor

Verticalidade Horizontalidade

Controlo de empresas cada vez maiores Aumento da flexibilidade e adaptabilidade

Gestão intermédia: papéis de filtragem e controlo Comparação da visão do topo com a realidade do mercado
e da organização, servindo como catalisador
activo da mudança

Controlo interno pela hierarquia Controlo externo pelo mercado

Endo-esqueleto Exo-esqueleto

Mercado de vendedores Mercado de compradores

Mercados de massas Nichos fragmentados

Medidas objectivas de qualidade(e.g., % de defeitos) Medidas intangíveis (e.g., satisfação do consumidor)

Recursos materiais e financeiros Informação e tempo

Operações sequenciais Operações simultâneas

A necessidade de entender as estruturas como configurações


Uma nova perspectiva, configuracional, de análise das organizações tem vindo a ganhar
forma nos últimos anos. Por configuração, entende-se uma «constelação multidimensional
de características conceptualmente distintas, que normalmente ocorrem em conjunto»
(Meyer, Tsui & Hinings, 1993). Uma grande variedade de características e de processos
organizacionais parecem realmente agrupar-se de uma forma regular, o que permite reduzir
uma infinidade teoricamente possível de combinações, a um número limitado de
configurações. Ou seja: os elementos que se poderiam combinar num não acabar de
variações, acabam normalmente por se agregar num conjunto limitado de configurações.
Como explicar este fenómeno? Meyer, Tsui e Hinings (1993) adiantam que os atributos
organizacionais normalmente tidos como independentes, são na verdade interdependentes,
o que faz com que a enorme variedade possível no caso de cada atributo individualmente
considerado, acabe por ser constrangida pelos padrões de interdependência que entre esses
atributos se podem entretecer. Acresce que a maioria das soluções teoricamente possíveis
não são viáveis na prática, pelo que é possível reduzir uma enorme diversidade de
organizações a uma pequena taxonomia de configurações (e.g., Miles & Snow, 1978;
Mintzberg, 1979).
Qualquer processo capaz de aproximar entre si as características das diferentes
organizações é potencialmente capaz de contribuir para o aparecimento do número limitado
de configurações que acima se referiu. Processos como a estandardização de produtos e
mercados (Utterback, 1994), o isomorfismo decorrente da luta pela posse dos mesmos
recursos (Hannan & Freeman, 1977), a imposição de uma cultura organizacional e a
construção sociocognitiva da realidade (Weick, 1979), contribuem para o surgimento de
configurações. Procurando superar a perspectiva contingencial, cujas análises se limitam ao

73
Gestão e Organização de Empresas

estudo de um pequeno conjunto de variáveis, a abordagem configuracional procura


explicações mais completas e integrativas.
A perspectiva configuracional concebe portanto as organizações como gestalts
compostas por elementos que se constrangem mútua e intensamente. Dada esta relação de
interdependência entre elementos, defendem os partidários da perspectiva configuracional
que não faz sentido estudar componentes isolados em vez de configurações. Em termos
críticos é de referir, porém, que os atributos das organizações podem constranger-se de
forma mais ou menos intensa. Weick (1976), por exemplo, refere que algumas organiza
9ões podem funcionar como sistemas frouxamente acoplados.
E ainda de notar que o conceito de configuração é usado com um sentido mais
englobante pelos autores que estudam o design organizacional, e que o definem como o
agregado que inclui as configurações de estrutura, processo e tecnologia (Huber & Glick,
1993). Uma das áreas em que o pensamento configuracional deu origem a resultados
fecundos é a da estrutura. Particularmente importante neste campo, revelou-se o trabalho de
Henry Mintzberg, cujos livros The Structuring of Organizations (1979) e Structure in Fives
(1983) tiveram forte repercussão. As configurações apresentadas por Mintzberg são o
resultado da integração do saber acumulado, uma vez que todas elas apresentavam já
antecedentes na literatura das organizações. Só a título de exemplo, pode dizer-se que a
adhocracia equivale, grosso modo, à organização prospectiva de Miles e Snow (1978) e ao
tipo orgânico de Burns e Stalker (1961), e que a burocracia mecanicista havia sido
identificada, por exemplo, por Burns e Stalker como se tratando da organização mecanicista,
ou por Rosabeth Moss Kanter (1983), que a ela se refere como o tipo segmentalista.

Revendo os «dados adquiridos»


A evolução dos formatos organizacionais, e designadamente a substituição do controlo
hierárquico pela cadeia de valor, obrigam a repensar a validade de algumas lições da teoria
organizacional muitas vezes tidas como dados adquiridos. Dois exemplos:

• A ideia de que as organizações devem proteger o seu núcleo técnico da envolvente


(Thompson, 1967), não é necessariamente sustentável (Denison, 1997). Com efeito, se
desta forma se pode aumentar a efi— ciência, também é possível que se esteja a
proteger a ineficiência. As novas formas de produção estimulam uma maior abertura (e
não fecho) às exigências da envolvente.
• Com o conceito de cadeia de valor, torna-se possível, e de forma relativamente
simples, combinar transações hierárquicas e de mercado, o que baralha a separação
clássica, estabelecida por Williamson (1975) e neste livro discutida com profundidade
no capítulo inicial (Santos, neste volume). O surgimento de conceitos como o de
mercados internos mostra como as distinções clássicas podem ter que ser ajustadas às
características das actuais envolventes.
• A persistência da ideia de que a hierarquia constitui a única forma viável de
organização (vide Jacques, 1990), é posta em causa pelo sucesso de organizações
como a Nike, a Kodak ou a ABB, que recorrem a formatos alternativos e «modernos»,
com os quais procuram competir em envolventes globais.

Com o final do século, e aproveitando a oportunidade para proceder aos habituais


balanços, os observadores dos fenómenos organizacionais facilmente concluirão que a
análise dos próximos cem anos promete ser tão estimulante como a dos cem anos que
passaram e que conduziram à chamada sociedade das organizações. Nesses anos foi
possível assistir à ascensão e afirmação da burocracia (e à sua queda, argumentam alguns

74
Gestão e Organização de Empresas

[vide Lawler & Ledford, 19971), ao crescimento da dimensão, à defesa da beleza da pequena
dimensão, à síntese do pequeno dentro do grande, à dominação da função e da sua
substituição pelo processo, à criação de redes e de redes dentro de redes (Provan &
Sebastian, 1998), etc.
Os próximos anos parecem agora sugerir a necessidade de operar uma síntese entre
tensões ou opostos (exploração por investigação e exploração por utilização, controlo e
confiança [vide Cunha & Cunha, capítulo 17 neste volume]), pelo que se pode antecipar um
período estimulante para os exploradores dos novos formatos. Que, para melhor se
aventurarem na exploração deste novo terreno, talvez devam levar a sério a sugestão de
Weick (1996) e reflectir sobre a necessidade de deitar fora as ferramentas de exploração
usadas no passado. Ou, pelo menos, algumas delas.

75
TEXTO Nº 5
A MOTIVAÇÃO DOS RECURSOS HUMANOS NA EMPRESA
João Paulo Marques & Gabriel Silva

Introdução

Este trabalho, tem como principal objectivo analisar e dar a conhecer a importância da motivação dos Recursos
Humanos na empresa, procurando salientar os diversos contributos teóricos conhecidos e, complementá-los
com uma análise mais prática e concreta.
Assim, na secção 1 daremos uma sucinta definição de Empresa, fazendo, de seguida, na secção 2, uma breve
comparação das teorias organizacionais protagonizadas por Taylor, Fayol e Mayo, sob a perspectiva da
importância que o indivíduo foi assumindo na empresa ao longo da História.
Numa terceira parte, secção 3, procuraremos abordar as teorias das necessidades humanas e da motivação,
desenvolvidas por diversos psicólogos e gestores, visando, essencialmente identificá-las e compará-las. Na
secção 4, descreveremos as principais tendências actuais da motivação, e por último, na secção 5, tentaremos
caracterizar a Motivação, enquadrá-la na empresa, mostrar de que forma ela influencia ou não os resultados da
organização, salientando o papel que os gestores devem assumir neste processo, bem como indicar alguns
instrumentos ao seu dispor para motivar os colaboradores.
Em conclusão, tentaremos fazer uma relação entre as teorias apresentadas anteriormente e o nosso ponto de
vista pessoal.

1 - A empresa e a gestão dos recursos humanos


Existindo muitas definições de empresa, umas mais complexas que outras, torna-se importante neste artigo,
dar uma noção geral que sirva de base à compreensão e enquadramento do tema que pretendemos desenvolver.
Assim, e de acordo com Drucker (1991), a empresa não é mais que um agrupamento Humano
hierarquizado que mobiliza meios humanos, materiais, de informação e financeiros para extrair, transformar,
transportar e distribuir produtos ou prestar serviços e que, atendendo a objectivos definidos por uma direcção,
faz intervir nos diversos escalões hierárquicos, as motivações relacionadas com a satisfação das necessidades
dos clientes, ou seja, pelo bem estar da comunidade em geral, e a obtenção do lucro, devido pela necessidade
de remunerar o capital investido por parte dos accionistas.
Resumidamente, podemos concluir que os principais objectivos da empresa são a satisfação das
necessidades dos clientes e do bem estar social: e a obtenção de lucro.
A empresa precisa de obter lucros para que possa ter uma certa autonomia financeira, permitindo-lhe
responder às suas necessidades materiais, nomeadamente no que concerne ao alargamento de instalações,
aumento da capacidade de produção, implementação de novas tecnologias, entre outras.
Gestão e Organização de Empresas

Por outro lado, a satisfação das necessidades dos clientes e o bem-estar da comunidade, tem que estar
sempre presente, pois os bens que produz e/ou comercializa devem estar em sintonia perfeita com as
necessidades reais dos consumidores, sob pena de não garantir níveis satisfatórios de procura, e
consequentemente, não assegurar a rentabilidade a médio prazo.
A empresa, tem-se tornado num pólo de desenvolvimento das sociedades modernas, sobretudo nas
economias em regime capitalista, combinando três elementos fundamentais, o Financeiro, o Técnico e o
Humano para com eles atingir os seus objectivos com eficácia e eficiência, ou seja, com um custo mínimo,
obter o máximo rendimento.
Resta salientar que a combinação dos factores (ou elementos) é importante, mas saber distingui-los e
analisá-los é crucial. Dar uma atenção especial ao papel dos Recursos Humanos, uma vez que são estes que
condicionam o desenvolvimento da actividade, pode traduzir-se numa melhoria substancial da produtividade e
qualidade que fazem a diferença nas empresas dos nossos dias (Teixeira, 1998).

2 - TEORIAS DA ORGANIZAÇÃO EMPRESARIAL


2.1 - Taylor, Fayol e Elton Mayo
O papel dos Recursos Humanos na empresa, nem sempre foi encarado como fundamental na organização.
Com efeito, ao longo da História podemos encontrar diversos autores preocupados em estudar as organizações,
a sua estrutura e a melhor forma de maximizar os lucros, aumentar os índices de produtividade e minorar os
riscos de ruptura e desaparecimento das empresas.
Um dos primeiros autores que procurou ―dissecar‖ a organização foi Taylor, seguido de Fayol. Ambos
procuraram a melhoria da eficiência das actividades produtivas, enfatizando no entanto, aspectos diferentes da
empresa. Taylor centrou o seu estudo na análise das tarefas, dos tempos e movimentos na execução de cada
uma delas, procurando minimizar todos os ―tempos mortos‖ e rentabilizar a utilização das máquinas, inovação
introduzida pela Revolução Industrial e muito em voga aquando dos estudos destes autores. Com o estudo das
tarefas, Taylor alertou para a necessidade de adaptação do Homem à máquina, descurando a componente
humana que está sempre subjacente na execução da tarefa. Considerava-se que o trabalhador se orientava
apenas por vantagens financeiras - ―homo-economicus‖, tentando apenas maximizar os benefícios materiais.
Fayol, preocupou-se nos seus diversos estudos, com a melhoria da eficiência da empresa através do estudo e
estruturação da empresa - ênfase na estrutura. Contudo, a sua abordagem da organização, mantém uma
perspectiva mecanicista, desrespeitadora da condição humana e orientada unicamente para a busca da eficiência
técnica e material.
Com a implementação destas teorias, inicialmente verificou-se um acréscimo substancial nos índices de
produtividade das empresas. Porém, ao longo dos anos, estes índices começaram a baixar, as pessoas
apresentavam-se tristes, apáticas e desmotivadas no seu local de trabalho.
Preocupados com o rigor e racionalização máxima do trabalho, aliados às características apresentadas
pelos empregados, outros autores surgiram e procuraram estudar as causas destes problemas. Foi com Elton
Mayo e com a Escola das Relações Humanas criada na época do Humanismo, que se levaram a cabo algumas
experiências e se concluiu que o factor Humano, considerado até então um simples ―apêndice‖ da máquina, era

77
Gestão e Organização de Empresas

substancialmente mais importante que qualquer outro recurso da empresa. Procurou-se analisar o indivíduo e
estudar as suas reacções às diferentes condições de trabalho que se lhe apresentavam.
Mayo centrou o seu estudo na pessoa como trabalhador, designadamente na Motivação, Liderança, nas
comunicações e dinâmica de grupos; Recusou o uso exclusivo de incentivos financeiros para um
comportamento profissional adequado; Há que considerar os incentivos psicológicos (apoio, elogio,
consideração) que fazem parte do universo dos sentimentos Humanos e contribuem para um maior
empenhamento.
Podemos, agora, concluir que o desconhecimento das variáveis psicológicas conduz a percas de
produtividade. Deste modo, as organizações Tayloristas são rotineiras, monótonas, pouco criativas e providas
de uma programação excessiva, subutilizando aptidões humanas específicas.
Com Elton Mayo, embora não se formulem teorias concretas que possam conjugar de forma adequada todos os
factores de produção, privilegia-se o grupo, a equipe e coloca-se o ênfase nas relações entre pessoas no
trabalho, lançando-se as permissas para o estudo e a análise da alteração do comportamento Humano, face a
situações diversas.
Tanto Taylor com Fayol centraram o seu estudo nos aspectos formais da organização e nas relações
entre os métodos de trabalho e as máquinas. Elton Mayo preocupou-se mais com o Homem, com o grupo, com
o clima social no trabalho e com as relações informais que se estabelecem no seio das empresas.
As investigações de Mayo conduziram ao estudo da organização formal e informal. A primeira, segundo ele,
assenta numa estrutura de autoridade, com áreas funcionais, especialização, hierarquia, fixação de objectivos e
sobretudo numa administração do conjunto, não diferenciando os diferentes factores de produção. Por outro
lado, a organização informal assenta num conjunto de acções não previstas pela administração, nomeadamente
de afinidades, sentimentos e objectivos do grupo que não obedecem a qualquer hierarquia formal, mas que
resulta da convivência dos indivíduos no trabalho.
A estrutura informal não estava prevista na organização de Taylor, mas o seu estudo tem demonstrado
que ela é responsável por variações de produtividade directamente ligadas a questões laborais, e por isso, deve
ser tida em conta na análise das empresas.
Nenhum administrador pode ter sucesso se não tiver capacidade para associar as duas estruturas, o
que significa que a produtividade da empresa está ligada não só a questões económicas, mas também
psicológicas.

3 - TEORIAS DAS NECESSIDADES HUMANAS E MOTIVAÇÃO


3.1 - A Pirâmide de Maslow
As nossas atitudes são o resultado de diversos impulsos interiores que queremos satisfazer. Essas atitudes
designamos por necessidades e os impulsos por motivações para as satisfazer.
Convém, pois conhecer essas necessidades para compreender o que as motiva.
Segundo o Psicólogo Abraham Maslow, as necessidades do ser humano são basicamente semelhantes, podendo
ordenar-se numa hierarquia ou série de níveis ascendentes, que designamos por Hierarquia de necessidades
(Figura 1).

78
Gestão e Organização de Empresas

Figura 1 - Hierarquia das necessidades de Maslow


AUTO REALIZAÇÃO

ESTIMA

SOCIAIS / PERTENÇA

SEGURANÇA

NECESSIDADES FISIOLÓGICAS

As necessidades fisiológicas correspondem às necessidades básicas (descanso, alimentação) e por isso


são designadas por primárias, sendo as primeiras a ser satisfeitas;
As necessidades de segurança, embora também sejam primárias, surgem a seguir às fisiológicas,
porque só ocorrem depois daquelas estarem satisfeitas. No contexto de trabalho, desde que se obtenha um
rendimento mais ou menos confortável, procura-se manter esta situação, assegurando-a, por exemplo, com a
exigência de um contrato de trabalho, uma protecção suplementar ou até um seguro de vida.
As necessidades sociais ou de pertença, são classificadas como secundárias, bem como as restantes
hierarquicamente superiores, embora não sejam menos importantes. Elas surgem depois do indivíduo ter já
atingido uma certa segurança, procurando inserir-se num grupo social ou de trabalho com o qual se identifica.
As necessidades de estima aparecem acima das sociais porque, depois daquelas serem satisfeitas, o
indivíduo procura ser reconhecido como pessoa de pleno direito, e não apenas como membro de um dado
grupo. Tem necessidade de ser reconhecido, individualmente, pelas suas capacidades, talentos ou técnicas e
podem ser satisfeitas através de uma ocupação profissional adequada.
Esta necessidade, mais que qualquer outra, pode ser utilizada para motivar o pessoal, levando-o a
procurar atingir os objectivos do seu trabalho e da empresa.
As necessidades de auto-realização correspondem à ordem final das necessidades, por isso aparecem
no topo da hierarquia, só sendo satisfeitas depois de todas as outras. Será a realização plena do Homem, a
satisfação de todo o seu potencial. Esta necessidade, como é previsível, nunca é completamente satisfeita, pois
se isso se verificasse a vida tornar-se-ia monótona, além de que romperia com os pressupostos da essência
humana que assentam numa dinâmica constante e na criação de novas necessidades, sempre que se realizam
as outras.

3.2 - As Categorias de Alderfer (Teoria ERG)


Um outro psicólogo, Alderfer, classificou as necessidades humanas de forma bastante simples, dividindo-as em
três categorias, denominadas «As categorias de Alderfer», ou Teoria ERG, utilizando as iniciais das palavras
inglesas:
• EXISTÊNCIA - Necessidades existenciais que são as de sobrevivência e reprodução;
• RELACIONAMENTO - Necessidades de relacionamento que são de âmbito social;

79
Gestão e Organização de Empresas

• CRESCIMENTO - Necessidades de crescimento que correspondem ao desenvolvimento a nível


pessoal, estima e auto-realização.

Estas necessidades, operam simultaneamente e não numa sequência invariável, por isso, quanto menos uma
delas é satisfeita, mais importante se torna para o indivíduo conseguir realizá-la. E, realizando-a, mais importante
se torna realizar a seguinte; Quanto menos for satisfeita uma necessidade, maior relevo terá a outra.
Discordando ainda de Maslow (Teixeira, 1998), Alderfer, refere que há casos em que os empregados
podem activar as suas necessidades de nível mais elevado sem terem satisfeito completamente as necessidades
do nível inferior, e também, que, quando as necessidades de um nível elevado são frustradas as necessidades
de nível inferior retornam, mesmo já tendo sido satisfeitas.

3.3 - A Perspectiva de Charles Handy


Na obra «Understanding Organisations», Charles Handy, afirma que o Homem é variável e terá muitos motivos
e motivações que a qualquer momento podem constituir uma hierarquia, mas que esta sofre alterações em
determinados acontecimentos, ou até em função da situação particular de cada indivíduo.
Com efeito, para uma pessoa de meia idade a necessidade que lhe advém da empresa pode ser algo
relacionado com a sua reforma, portanto, ligado às necessidades de segurança, enquanto que um jovem em
início de carreira terá concerteza motivações e necessidades mais próximas do reconhecimento e aceitação
social e profissional do seu trabalho.
Embora sob o ponto de vista racional e imediato, as pessoas trabalhem por necessidade (de
sobrevivência económica e também devido à pressão social), existem outros factores, por vezes mais
importantes, e que são geradores de motivação nos trabalhadores, nomeadamente os apresentados na Figura
2, e que se relacionam com a realização , promoção, dinheiro, conhecimento de pessoas, segurança profissional,
satisfação e reconhecimento.

Figura 2 – factores geradores de motivação

Realização Promoção
Conhecer pessoas

TRABALHO Dinheiro

Segurança profissional Satisfação Reconhecimento


profissional

80
Gestão e Organização de Empresas

3.4 - As Teorias de Douglas MacGregor


Na sua obra «The Human side of the Enterprise», Douglas MacGregor, afirma que existem duas abordagens
muito diferentes da gestão e motivação que reflectem as razões pelas quais as pessoas trabalham.
A primeira designou por TEORIA X e baseou-a em três pressupostos:
1. O indivíduo médio tem um desagrado natural pelo trabalho e evitá-lo-á sempre que possível;

2. O trabalho tem importância secundária e os gestores devem coagir os empregados ou motivá-los com
salários ou mostrando consideração;

3. A maioria das pessoas, sendo preguiçosa e sem ambição prefere ser dirigida e evitar responsabilidades;

A segunda designou por TEORIA Y e baseou-a nos seguintes pressupostos:


1. O esforço mental e físico que o Homem faz no trabalho, é tão natural como o descanso, lazer, etc;
2. As pessoas desejam trabalhar e debaixo de circunstâncias correctas obtêm muita satisfação;

3. A maior parte dos indivíduos aprende a aceitar e até procura responsabilidades.

Pesquisas levadas a cabo por diversos psicólogos, sugerem que para a maior parte das pessoas, o trabalho não
é bem aceite apenas devido à necessidade económica ou à pressão da sociedade como pretendia a TEORIA X,
mas que a actividade de grupo também pode satisfazer uma gama de necessidades humanas que todos os
indivíduos partilham e, quando as pessoas têm oportunidade de as satisfazer através do seu trabalho, ficam
motivadas para aí exercer um esforço considerável no sentido de alcançarem esses objectivos, o que parece ir
ao encontro da TEORIA Y.

3.5 - A Teoria dos Dois Factores de Herzeberg


O psicólogo Americano Frederick Herzeberg, ao estudar as fontes de motivação e/ou desmotivação no trabalho,
encarava-as de um ponto de vista pragmático, perguntando a um dado grupo de trabalhadores:

―Quando está satisfeito no trabalho, o que é que o faz estar contente?‖


e
―Quando está insatisfeito no trabalho, o que é que o faz estar aborrecido?‖

Ao analisar os resultados, Herzeberg concluiu:


• As causas de satisfação no trabalho residem no conteúdo do próprio trabalho;
• As causas de insatisfação no trabalho residem no ambiente de trabalho;

Como os factores de contentamento no trabalho podem criar uma satisfação positiva (motivação), Herzeberg
designou-as por FACTORES MOTIVADORES.
Aos factores de ambiente de trabalho que precisavam de ser mantidos num padrão razoável a fim de
evitar a insatisfação, chamou-hes FACTORES DE HIGIENE OU MANUTENÇÃO, incluindo neles todos os aspectos

81
Gestão e Organização de Empresas

de base salarial, segurança no emprego, supervisão atenta, justa e apoio ao funcionário, condições de trabalho,
relacionamento interpessoal entre colegas e hierarquia, a gestão da empresa, organização e comunicações.
Enfim, todos os factores que possam ser fonte de descontentamento. A importância destes factores está na sua
possibilidade de causarem insatisfação se não forem adequados. No entanto, há que salientar que a sua
adequação, por si só não constitui uma fonte de motivação; apenas evitarão a insatisfação. Para que a equipe
esteja MOTIVADA, tem que se obter uma conjugação dos Factores Motivadores e dos Factores higiénicos, de
forma a que ambos estejam sempre presentes numa situação de trabalho. (Herzberg, 1967) Resumidamente,
temos:

FACTORES MOTIVADORES FACT. HIGIENE / MANUTENÇÃO


SATISFAÇÃO INSATISFAÇÃO

CONCRETIZAÇÃO CONDIÇÕES DE TRABALHO

RECONHECIMENTO POLÍTICA DA EMPRESA

O TRABALHO EM SI BUROCRACIA

CRESCIMENTO / RELAÇÃO COM COLEGAS


PROMOÇÃO
RELAÇÃO COM O SUPERIOR

RESPONSABILIDADE SALÁRIO

Figura 3 – Os factores Motivadores e Higiénicos de Herzberg

Os factores motivadores que Herzeberg identificou, parecem ter surgido do próprio conteúdo da tarefa. E deste
modo, estas motivações estão relacionadas com um nível social mais elevado e com as necessidades classificadas
como secundárias na pirâmide de Maslow, sobrepondo-se às necessidades que ele classificou como primárias.
Sugerem também que, mais uma vez, a TEORIA Y de MacGregor é uma abordagem mais frutífera da gestão de
pessoal do que a TEORIA X.
Os críticos de Herzeberg, referem que a distinção entre factores motivadores e de higiene não se
encontra com frequência nas situações reais de trabalho e que nem sempre se verifica uma relação directa
entre satisfação e produtividade no trabalho.
Pensamos que, a satisfação e produtividade não devem ser analisadas isoladamente, nem tão pouco
independentemente de todo o contexto empresarial, porque isso seria dar relevo apenas ao factor humano,
caindo no mesmo erro de parcialidade e racionalismo, apenas invertendo o factor mais importante (Homem /
Máquina).

82
Gestão e Organização de Empresas

No entanto, e atendendo ao contexto socio-económico actual, pensamos que é fundamental procurar


um ponto de equilíbrio, analisar as situações sob todos os ângulos, procurar inseri-las no todo que é uma
organização, mas nunca descurar qualquer dos factores que intervêm no processo produtivo, cedendo uma
atenção especial ao factor humano, uma vez que este é o único que reage de forma positiva ou não às
manifestações e mudanças do meio envolvente.

3.6 - As Necessidades humanas de McClelland


McClelland apresentou uma abordagem das necessidades humanas um pouco diferente. Ele defende que, de
entre as necessidades que as pessoas desenvolvem ao longo das suas vidas, há três que assumem particular
importância:

• Necessidade de Realização: traduz o desejo de atingir objectivos que signifiquem um desafio, de


fazer algo melhor ou com mais eficiência do que foi feito antes;
• Necessidade de Poder: desejo de controlar, influenciar ou ser responsável pelo desempenho de
outros;
• Necessidade de Afiliação: desejo de manter relações pessoais estreitas e amigáveis.

Assim, todas as pessoas possuem estes três tipos de necessidades, contudo, uma delas prevalecerá em cada
indivíduo como a de maior peso e aquela que mais se procura satisfazer. (Stoner, 1995)

4- Desenvolvimentos recentes da Teoria da Motivação


4.1 - Teoria da Equidade
Relativamente recente, a Teoria da Equidade foi desenvolvida por Stacy Adams e baseia-se na tese de que um
importante factor para a motivação, o desempenho e a satisfação no trabalho, é a avaliação que o indivíduo faz
sobre a equidade, razoabilidade ou a justiça da recompensa recebida (Stoner, 1995).
Para este autor, a recompensa mais dignificante em situações de trabalho é sem duvida o dinheiro.
Assim, e como corolário da sua teoria, considerava que, para a maioria dos indivíduos as recompensas devem
ser vistas como justas para que sejam motivadoras, o que de facto confirma a percepção generalizada, de que
a desmotivação dos empregados provem muitas vezes de injustiças salariais.

4.2 - Teoria da Expectativa


A Teoria da Expectativa teve os primeiros desenvolvimentos com Vroom, tendo recentemente registado novos
contornos com Nadler e Lawler.
Genericamente, esta teoria é um modelo de motivação que especifica que o alcance de um alto
desempenho, resulta de se perceber a possibilidade de que esse alto desempenho possa ser alcançado e
recompensado se alcançado, e que a recompensa vale o esforço dispendido (Stoner, 1995). Tenta assim, levar
em conta as diferenças entre indivíduos e situações.
Esta abordagem apoia-se nos seguintes pressupostos:
1. O comportamento é determinado por uma combinação de factores do indivíduo e do ambiente;

83
Gestão e Organização de Empresas

2. Os indivíduos têm necessidades e objectivos diferentes;


3. Os indivíduos decidem entre alternativas de comportamento, baseados nas suas expectativas de que
um determinado comportamento levará a um resultado desejado.

Estes autores, sintetizaram na seguinte fórmula a relação entre a expectativa e a motivação:

Força da motivação = Valência x Expectativa

Em que:
Valência: Valor previsto atribuido a um objectivo (valor da recompensa)

Expectativa: Probabilidade de uma acção conduzir a um resultado desejado

Para Nadler e Lawler, as recompensas que as pessoas podem auferir em situações de trabalho podem ser de
duas formas: intrínseca e extrínseca. A recompensa Intrínseca, assume o carácter de recompensa psicológica
ou interior, experimentada directamente por um indivíduo, enquanto que a Extrínseca é uma recompensa
proporcionada por um agente externo, como um supervisor, podendo assumir formas de expressão material,
monetária ou não.

4.3 - Teoria de Reforço


A Teoria de Reforço, desenvolvida pelo psicólogo Skinner, constitui uma abordagem motivacional de carácter
comportamental, baseada num princípio de aprendizagem, denominado ―condicionamento operante‖. Assim,
esta explicação da motivação apresenta as seguintes características:
1. Deixa de lado o objecto e o como da motivação para se concentrar nas formas pelas quais se aprende o
comportamento;
2. É uma abordagem da motivação baseada na lei do efeito, ou seja, a ideia de que o comportamento
com consequências positivas tende a ser repetido, enquanto o comportamento com consequências
negativas tende a ser evitado. (Robbins, 1998; Ferreira et al, 1996)

5 - A MOTIVAÇÃO NA EMPRESA
5.1 - A Importância da Motivação
A motivação dos Recursos Humanos na empresa assume hoje em dia, um factor de sucesso primordial, quer
para o indivíduo, quer para a obtenção dos objectivos da organização.
No entanto, ainda hoje é considerado um assunto secundário, pois exige uma observação contínua, procura da
identidade e das necessidades, aspirações e frustrações de cada indivíduo que compõem a organização. Por
isso, este processo requer, sobretudo, o tempo e a disponibilidade que a maioria das nossas empresas ainda
não está em condições de oferecer, criando por exemplo, um departamento de recursos humanos: o que não
acontece, porque a sua dimensão não permitiria suportar os custos que essa inovação traria; outras porque
ainda há muita falta de informação e sensibilização para esta necessidade.
84
Gestão e Organização de Empresas

A motivação pode ser analisada a dois níveis: Pessoal e Empresarial. Neste domínio, a experiência leva-nos a
concluir que, 90% da atitude dos indivíduos em contexto de trabalho é determinada pelo seu próprio espírito,
contra apenas 10% que se devem a forças exteriores.
Então, podemos deduzir que um dado indivíduo ao integrar uma equipe de trabalho já traz consigo uma
cultura própria, uma personalidade mais ou menos vincada, objectivos pessoais delineados e, sobretudo, uma
atitude particular perante tudo aquilo que o rodeia. Se apenas cerca de 10% dependem das forças exteriores,
há então que analisar o indivíduo, conhecê-lo cada vez melhor, para que dentro da organização ele se sinta
satisfeito e motivado (Robbins, 1998).
O tipo de satisfação e aquilo que motiva cada um difere de indivíduo para indivíduo; Enquanto uns
valorizam o esquema salarial, outros importam-se com a forma como a chefia valoriza o seu trabalho, a atenção
que lhes dispensa, o agradecimento que lhes mostra.
Exemplificando: Partindo do pressuposto que existem dois indivíduos numa dada organização, um que
valoriza mais o esquema salarial e outro as relações humanas. No que respeita à empresa, ela possui uma
política assente num esquema salarial racional, em função de medidas racionais de avaliação de quantidades de
trabalho realizadas, subvalorizando o indivíduo enquanto pessoa, pois raramente existe contacto directo
chefia/subordinado. A atitude dos dois trabalhadores perante a organização será a mesma? Certamente que
não. Iremos encontrar dois indivíduos a exercer funções semelhantes, mas o que valoriza o rendimento, terá
concerteza uma motivação maior, por isso obterá melhores resultados.
Analisando racionalmente os resultados obtidos, independentemente da importância dos Recursos
Humanos, enquanto pessoas e não máquinas, concluir-se-ia que o primeiro era mais eficiente que o segundo,
quando, se todos os factores fossem analisados, poderíamos deparar-nos com um resultado completamente
diferente: o segundo, desde que convenientemente motivado, poderia ser tão ou mais eficiente que o primeiro.
Este exemplo, simples, sem grandes conjecturas, serve apenas de ilustração ao qual pode na generalidade dos
casos, acontecer em centenas de empresas. Queremos assim, apenas mostrar que não raras vezes as
organizações falham porque não motivam os seus colaboradores e, sem sequer analisarem as causas, estudam
apenas os números e concluem que os indivíduos não se ajustam às suas necessidades, portanto não servem
para integrar esta ou aquela empresa. Esquecem-se, contudo, que o que faz agir, evoluir ou regredir uma
organização, são sobretudo os meios humanos. Sem estes o sistema não funciona (Ferreira et al, 1996).

5.2 2 A Motivação e a Eficiência


Muitas vezes, os gerentes e/ou gestores não se convencem que uma equipe convenientemente motivada pode
levar a um grau de aperfeiçoamento que se traduziria numa resposta atempada e mais correcta aos problemas
que envolvem a organização, e , consequentemente, isso revelar-se-ia na concretização dos objectivos da
maioria das empresas, ou seja, na satisfação das necessidades dos clientes de forma mais eficiente que a
concorrência e por conseguinte, num lucro cada vez maior.
Com efeito, estamos convencidos que a motivação e a eficiência de qualquer organização assumem
uma relação proporcional; À medida que os indivíduos se sentem mais motivados, a sua eficiência no trabalho
tende a aumentar, e por conseguinte a produtividade do todo da empresa.

85
Gestão e Organização de Empresas

Mas de que modo? Convém, então, esclarecer uma série de conceitos inter-relacionados, e que ajudarão a
compreender a ligação entre produtividade, eficiência e motivação. A Produtividade, para além de poder ser
calculada de forma quantitativa, pode também ser determinada analiticamente ou qualitativamente, da seguinte
forma:

Produtividade = F(Motivação x Organização x Tecnologia)

Deste modo, entendemos que, a produtividade pode ser determinada como função de três elementos da
empresa: Motivação, Organização e Tecnologia. Quanto melhores e mais bem cuidados eles forem, tanto maior
será a produtividade e a eficiência da empresa como um todo.
Assim, convém precisar os conceitos referidos:
• Motivação: conseguir dos colaboradores um maior grau de empenho, participação, iniciativa e
dedicação;
• Organização: estruturação e disposição dos recursos da empresa da forma mais eficiente;
• Tecnologia: conjunto de conhecimentos científicos ou empíricos, directamente aplicados à produção e
melhoria ou utilização de bens ou serviços (Caraça, 1993).
Como vemos, a motivação é apenas um factor influenciador da produtividade e da eficiência, e como tal deve
ser entendido, muito embora lhe devamos toda a atenção neste trabalho.

5.3 - O Papel do Gestor na Motivação


Mas afinal, a quem cabe a «árdua» tarefa de motivar?
A motivação parte de cada um, individualmente. Todo o ser humano, consciente ou inconscientemente,
estabelece as suas metas pessoais, cria as suas aspirações, elabora planos para as atingir. A atitude positiva
que cada um assume perante a vida e os outros pode ser fonte de motivação, não apenas para si próprio, mas
também para os que o rodeiam.
Porém, não raras vezes, nos deparamos com pessoas desprovidas desta capacidade, quer por razões de
personalidade, quer por dificuldades de adaptação ou falta de motivação.
Quando na empresa, nos deparamos com este tipo de pessoas, cabe sobretudo aos gestores e/ou
chefias directas, analisar e procurar compreender estes indivíduos e as razões da sua falta de iniciativa ou
apatia no trabalho. Há que elaborar planos, fases de acção, para se poder «descobrir» o indivíduo e os seus
potenciais máximos, sem interferir ou violar a sua personalidade. Daí referirmos esta tarefa como «árdua», pois
implica uma observação atenta e uma acção cautelosa; A observação atenta servirá para estudar o
comportamento do indivíduo, tentar descortinar o ―porquê‖ da sua atitude e elaborar os planos de acção mais
adequados a cada um. Por sua vez, a acção terá que ser faseada e cada plano terá que ser colocado em
prática, mais ou menos rapidamente, em função da resposta do indivíduo à fase anterior, sob pena de o retrair
ainda mais.
Podemos então afirmar que o maior ou menor grau de motivação que cada um pode atingir no
trabalho, depende em grande medida da actuação do seu superior hierárquico (Robbins, 1998; Luthans, 1998).

86
Gestão e Organização de Empresas

Este último, por sua vez, para além de motivador deve também ser uma pessoa motivada, revelando sempre
uma atitude positiva perante si, a organização e os outros. Para o gestor estar motivado e transmitir essa
posição aos outros, é necessário acreditar que não há obstáculos que não possam ser ultrapassados com
flexibilidade, criatividade e determinação.
Além disso, se não houver alternativas, trajectórias delineadas e planeadas, de que forma poderá o
Gestor motivar os outros?
A capacidade de resposta, a dinâmica da actuação do gestor na resolução dos problemas, criar-lhe-á
condições para analisar cada trabalhador e incutir nele, da forma mais apropriada e de acordo com os
objectivos definidos, o papel fundamental que cada um terá para que a estratégia resulte. O empenho e
vontade de contribuir, a interiorização de que a sua tarefa, ainda que por vezes rotineira, será importante para
a concretização dos objectivos, irão levar o indivíduo a procurar aperfeiçoar-se cada vez mais, sentindo cada
vez mais confiança nas suas capacidades, uma vontade constante em melhorar e uma alegria maior no
desempenho das suas tarefas.
Na sua função de motivação, o gestor, tem a possibilidade de escolher e utilizar alguns instrumentos,
chamados ―factores motivadores‖, segundo as denominações dos diversos autores estudados anteriormente.
Alguns desses factores são por exemplo, o Dinheiro, o Enriquecimento individual de tarefas, o Alargamento de
tarefas, uma maior Participação no trabalho, Horários flexíveis ou Horários comprimidos e Trabalho repartido,
etc (Teixeira, 1998).
Mas, como pode o gestor ou supervisor,do ponto de vista prático, estimular o interesse dos subordinados
pelo trabalho?

Ao seu alcance, encontram-se um conjunto de práticas que aqui se indicam como sugestões:

1. Dar-lhe participação no estabelecimento das suas metas de trabalho;


2. Conceder liberdade ao seu empregado para executar o seu serviço:
3. Fazer o subordinado participar da análise e da avaliação do seu próprio desempenho;
4. Encorajar as sugestões e melhorias;
5. Reconhecer um trabalho bem feito;
6. Confiar-lhes outras tarefas, fazer rotação de funções:
7. Despertar anseio e orgulho pela posse de habilidades e competências;
8. Criar-lhe a consciência de que participa, fazendo o empregado considerar-se membro da equipa, e
mostrar-lhe que a sua colaboração é valiosa para toda a organização. (Robbins, 1998; Teixeira, 1998)

Os indivíduos são seres complexos que é necessário estudar e estimular de modo fazê-los sentir como parte
integrante de um todo que sem eles não funcionaria da mesma forma. É pois, fundamental criar condições para
que cada um se sinta integrado e motivado dentro do todo que é uma organização.
Um bom sistema de recrutamento de pessoal, em que se conhecem minuciosamente as necessidades
da empresa e do cargo a ocupar, tendo em conta a personalidade do candidato, é um meio decisivo para evitar
desajustes entre o indivíduo e a organização, que se não forem convenientemente estudados, podem ser fonte
de desmotivação.
87
Gestão e Organização de Empresas

Igualmente, a criação de uma cultura de empresa, acompanhada de políticas próprias, comunicadas aos seus
colaboradores constituem também um factor de motivação muito importante (Robbins, 1998). Pois, mantendo
as pessoas informadas do rumo da empresa e daquilo que ela pretende atingir, fazendo-os sentir que aqueles
são também os seus objectivos porque participam no processo, são parte integrante e primordial do todo que
ajudam a construir, torná-los-á mais motivados e criar-se-á um elo de ligação Indivíduo/Indivíduo e
Indivíduo/Empresa, que irá manter a equipe junta, unida e disposta a lutar pela sobrevivência e
desenvolvimento da organização.

6 – Conclusões
Sintetizando, e relacionando a nossa opinião com a de Maslow e Alderfer, reforçada por Robbins (1998),
Luthans (1998) e Ferreira et al (1996), aplicada aos Gestores, o trabalho pode ser uma fonte importante de
satisfação (ou insatisfação) para os indivíduos, correspondendo (ou não) às necessidades de crescimento social
e pessoal que quase todo o ser humano manifesta.
Um indivíduo estará muito mais positivamente motivado para o trabalho, quanto maior grau de
satisfação obtiver na sua realização. Talvez, também por essa razão, Maslow e Alderfer pretendam que a
atenção empresarial seja dirigida no sentido de ir ao encontro das necessidades dos colaboradores, procurando
conciliá-las com o que a organização lhes pode proporcionar, de forma a alcançarem um proveito mútuo, ou
seja, simultaneamente, o mais elevado grau de satisfação para o indivíduo e a performance de trabalho mais
eficaz para a organização.
Criadas as condições e circunstâncias adequadas, e um clima social favorável, o pessoal tenderá a
sentir-se mais motivado para se comprometer com grupos e objectivos que lhe proporcionem maior grau de
satisfação.
O presente trabalho, procurou analisar e dar a conhecer as teorias existentes acerca da motivação dos
recursos humanos na empresa, e simultaneamente dar uma perspectiva prática, de acordo com o que se
considera ser fundamental para motivar os indivíduos, as condições em que essa motivação deve ocorrer e as
consequências nos resultados empresariais.
Com efeito, podemos concluir que os recursos humanos, ainda que sejam entre outros, um meio de
produção, conseguem fazer a diferença numa empresa.
Embora, a tecnologia, a estruturação, a organização e os meios monetários sejam fundamentais para
que a empresa se desenvolva, a atitude que os recursos humanos assumam é decisiva nesse desenvolvimento.
Não podemos jamais ignorar que os factores de produção são estáticos, enquanto o ser humano é dinâmico e
complexo, necessitando constantemente de incentivos não só financeiros, mas também psicológicos para agir
com eficiência e eficácia. Nesta perspectiva, concluímos que a motivação incutida nos indivíduos contribui para
a sua satisfação pessoal, para a redução do absentismo e rotatividade e maior produtividade da empresa, e ao
contrário, a sua desmotivação pode levá-la ao fracasso e ineficiência.

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Gestão e Organização de Empresas

Referências:
Caraça, João G. (1993), Do Saber ao Fazer: Porquê organizar a Ciência?, (―Trajectos‖), 1ª ed., Lisbon, Gradiva.

Drucker, Peter (1991), Introdução à Administração, 2ª ed., Pioneira, São Paulo.

Ferreira, J. M.C.; Neves, J.; Abreu, Nunes de, P. e Caetano, A.(1996), Psicosociologia das Organizações,
Lisboa, MCGraw-Hil de Portugal.

Herzberg, Frederick, (1967), ―One more time: How do you motivate employees?‖, Harvard Business Review.

Luthans, F. (1998), Organizational Behavior, Singapura, MCGraw-Hill Inc..

Robbins, Stephen P. (1998), Organizational Behavior, 8ª ed., New Jersey, Prentice-Hall, Inc..

Stoner, J.; Freeman E. e Gilbert Jr, D. (1995) Management, Prentice-Hall.

Teixeira, S. (1998) Gestão das Organizações, McGraw-Hill.

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Gestão e Organização de Empresas

TEXTO Nº 6
Liderança
A. Calheiros

A liderança é um dos temas mais populares da área da gestão, sendo igualmente foco da atenção do
mundo académico - Hiller, DeChurch, Murase, & Doty (2011) identificaram 1 161 estudos empíricos nos
25 anos anteriores – e do empresarial – o The Corporate Learning Factbook 2014: Benchmarks, Trends,
and Analysis of the U.S. Training Market (O'Leonard, 2014) diz-nos que 35% dos gastos em formação
nos EUA são aplicados na área da liderança.

Este texto pretende dar uma visão geral sobre as principais teorias sobre liderança, descrevendo a
evolução da análise deste conceito ao longo das últimas décadas, e assim permitindo aos leitores uma
maior compreensão sobre este tema de elevada relevância e complexidade.

1. Conceito

Um estudo de 1993 encontrou 221 definições de liderança diferentes em 587 trabalhos analisados (Bass,
2008). Quer isto dizer que não parece haver muito consenso sobre o conceito. Também se nota que, ao
longo dos anos, houve uma evolução no foco dessas definições de liderança. Nos anos 1920, definia-se
liderança essencialmente focando a capacidade do líder em impor a sua vontade aos seguidores e em
obter deles obediência, respeito, lealdade e cooperação. Nos anos 1930, liderança passou a ser definida
mais como um processo através do qual o grupo era orientado numa determinada direcção pelo líder.
Nos anos 1940, liderança era a capacidade de persuadir e dirigir para além do seu poder ou posição
formal. Nos anos 1950, o foco era a acção do líder no grupo e a autoridade que o grupo lhe reconhecia.
Na década de 1960, incidia sobre a influência para levar outros numa direcção partilhada. Nos anos
1970, a influência do líder era discricionária, sendo diferente para cada membro do grupo. Nos anos
1980, liderar era inspirar outros para prosseguir objectivos importantes. Na década de 1990, liderança
era a influência que o líder e os subordinados exerciam no sentido de uma mudança que reflectisse os
seus propósitos comuns. Neste século XXI, o líder é visto como a pessoa com maior responsabilidade
pelas acções da sua organização.

Há diversos desacordos entre as várias definições de liderança (Pina e Cunha, Rego, Campos e Cunha,
& Cabral-Cardoso, 2007). Enquanto uns autores defendem que a liderança é o papel em que um
elemento do grupo se especializa, outros argumentam que esse papel de influenciador poderá ser
desempenhado por pessoas diferentes em momentos diferentes, não havendo assim clara distinção entre
líder e seguidores. Outros apenas consideram liderança as tentativas de influência que suscitam o

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Gestão e Organização de Empresas
empenho entusiástico dos seguidores, não considerando liderança as que resultam em mera obediência,
ou que se baseiam na coerção e manipulação (exercício de autoridade). Outros autores apenas admitem
no âmbito da liderança os processos de influência com propósitos éticos e em benefício da organização,
excluindo os casos em que o líder exerce influência em benefício próprio ou contra os interesses da
organização. Apesar de todas estas divergências, Fleishman et al. (1991), identificaram 65 sistemas de
classificação das definições de liderança, a maioria das definições incide sobre a pessoa do líder, o
comportamento do líder, os efeitos do líder, ou o processo de interacção entre o líder e os subordinados.
Estas diferentes concepções de liderança podem criar desconforto nos estudantes e gestores
interessados no tema. No entanto, mais do que procurar encontrar a perspectiva correcta, o mais
importante será tentar compreender a complexidade do conceito e utilizar as diferentes perspectivas
para alimentar uma reflexão pessoal sobre o tema

2. Liderança versus Gestão

Um dos grandes debates na área da liderança é a diferença entre liderança e gestão. A maioria dos
investigadores do tema utiliza os dois termos de forma indistinta, referindo-se simplesmente a alguém
que gere / lidera / dirige / coordena uma equipa. No entanto, outros autores distinguem entre os
conceitos e, na linguagem popular, a aura de cada um deles é bastante diferente

Zaleznik (1977) considera que gestores e líderes são dois tipos diferentes de pessoas. Os gestores
definem objectivos a partir da necessidade e não do desejo, são excelentes a resolver conflitos entre as
pessoas ou departamentos, respondendo a todos e garantindo a eficiência da organização no dia-a-dia.
Os líderes, por seu lado, adoptam atitudes personalizadas e activas em direcção aos objectivos,
perscrutam oportunidades latentes e inspiram os subordinados e os processos criativos com a sua
energia. As suas relações com os subordinados são intensas e, muitas vezes, o seu ambiente parece
caótico.

Bennis e Nanus (apud Pina e Cunha et al., 2007) aventam que gerir consiste em provocar, realizar,
assumir responsabilidades, comandar. Diferentemente, liderar consiste em exercer influência, guiar,
orientar. Os gestores são aquelas pessoas que sabem o que devem fazer. Os líderes são as que sabem
o que é necessário ser feito.

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Gestão e Organização de Empresas

Fig 1 – Gestores e líderes


Fonte: Pina e Cunha et al. (2007)

Kotter (1990) defende que os gestores são importantes para as organizações lidarem com a sua
complexidade, enquanto que os líderes são necessários para as organizações se adaptarem à mudança.
A gestão traz ordem e previsibilidade à organização, focando-se em actividades de planeamento e
orçamentação, de organização e recrutamento, controlando e resolvendo problemas que surjam. Por
outro lado, a liderança pretende definir uma visão para o futuro, alinhar as pessoas com essa visão e
motivá-las para a atingir.

Num lógica contrária, Vasconcellos e Sá (Vasconcellos e Sá, 2012) considera que “Não existe liderança,
apenas boa gestão”. Ou seja, aquela distinção que fizemos nos parágrafos anteriores e que muitos
autores romanceiam não faz sentido dado que o que é apontado como liderança é meramente o bom
desempenho das funções da gestão.

3. Abordagens tradicionais à liderança

As abordagens tradicionais tinham como objectivo compreender o conceito de liderança de forma a


ajudar os líderes a serem mais eficazes na sua função. Neste ponto serão descritas as três abordagens
tradicionais à liderança: a dos traços (que defende que um líder eficaz será o que possui uma
determinada combinação de características pessoais), a comportamental (que defende que um líder
eficaz é aqueles que exibe determinado comportamento), e a situacional ou contingencial (que defende
que o líder mais eficaz é aquele que adapta o seu comportamento à situação de liderança em que está
inserido).

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Gestão e Organização de Empresas

3.1. Abordagem dos traços de liderança

Os primeiros estudos sobre liderança, efectuados até à II Guerra Mundial, fitaram descortinar traços
físicos (p.ex., estatura, aparência), características da personalidade (p.ex., autoestima, estabilidade
emocional, autoconfiança) e aptidões (p.ex., inteligência, fluência verbal) que discernissem entre os
líderes e os não-líderes, entre os líderes eficazes e os ineficazes (Pina e Cunha et al., 2007). A figura 2
sintetiza os traços mais comummente identificados como relevantes para a eficácia dos gestores.

Fig 2 – Traços mais relevantes para a eficácia dos gestores


Fonte: Pina e Cunha et al. (2007)

Esta abordagem à liderança tem sido muito criticada (Judge, Piccolo, & Kosalka, 2009) por diversos
estudos que a consideram simplista, fútil, e mesmo perigosa. Isto porque se verifica que (Pina e Cunha
et al., 2007) os indivíduos não se tornam necessariamente líderes nem são necessariamente líderes
eficazes devido à posse de uma determinada combinação de traços, nem um líder eficaz numa situação
é necessariamente eficaz em outras.

Recentemente, Daniel Goleman (Goleman, 1998) popularizou o conceito de inteligência emocional, tendo
proposto que este tipo de inteligência é crítica para a eficácia de um líder. Este modelo tem duas
particularidades que abonam em seu favor (Pina e Cunha et al., 2007): concilia traços e comportamentos

93
Gestão e Organização de Empresas
e advoga uma lógica contingencial segundo a qual diferentes traços e perfis podem ser eficazes em
diferentes situações. A figura 3 sintetiza as competências da inteligência emocional.

Fig 3 – Traços mais relevantes para a eficácia dos gestores


Fonte: Pina e Cunha et al. (2007)

3.2. Abordagens comportamentais

A génese das abordagens comportamentais remonta aos anos 50 do século XX, e resulta da desilusão
dos investigadores com a incapacidade das teorias dos traços de liderança em explicarem a eficácia de
liderança (Pina e Cunha et al., 2007). Alguns destes estudos procuravam apenas descrever o que faziam
os líderes ou gestores, outros pretendiam identificar quais os comportamentos que distinguiam os líderes
eficazes dos não eficazes.

A maioria das abordagens procurava identificar uma dimensão comportamental, tipificando


comportamentos antagónicos e depois analisando o desempenho ou os impactos dos líderes que
adoptavam esses comportamentos. Vários investigadores (Bass, 2008) estudaram diversas dicotomias:
entre liderança autocrática (líder com uma atitude baseada no poder, tomada de decisão arbitrária,
coercivo, controlador, punitivo) e liderança democrática (líder mais igualitário, que procura tomar
94
Gestão e Organização de Empresas
decisões baseadas no consenso e ouvindo as opiniões da equipa), entre liderança directiva (em que o
líder assume as tarefas de tomada de decisão e resolução de problemas e espera que os subordinados
sigam as suas instruções) e liderança participativa (em que o líder partilha com a equipa as tarefas de
tomada de decisão), entre orientação para as tarefas (líderes mais focados no trabalho, no planeamento,
nos resultados, e que colocam pressão sobre a equipa para atingir os objectivos) e orientação para as
pessoas / relação (líderes mais focados no bem-estar da equipa, na harmonização do ambiente e
prevenção de conflitos), e entre iniciativa (líder focado em iniciar novas actividades, organizar essas
actividades e definir como o trabalho deve ser feito, bem como em controlar os resultados dessas
iniciativas) e consideração (líder mais focado no bem-estar da equipa, em elogiar o bom desempenho,
em manter a satisfação e autoestima da equipa e em obter a sua aprovação antes de empreender novas
iniciativas).

A grande quantidade de estudos realizada não conduziu a consistência nos resultados (Bass, 2008; Pina
e Cunha et al., 2007). Quer isto dizer que não há nenhum comportamento ou estilo de liderança que
seja o melhor em todas as circunstâncias. Os comportamentos de consideração, foco na relação,
participativo e democrático geralmente conduzem a maior satisfação da equipa, mas não
necessariamente melhor desempenho ou produtividade. Verifica-se também que, de forma consistente,
os líderes descrevem-se mais focados na relação ou mais focados nas tarefas (classificam-se mais
decisivamente) do que os seus subordinados percepcionam.

3.2.1. Rensis Likert

A abordagem de Rensis Likert (Likert, 1961) é uma das mais conhecidas das teorias comportamentais.
Podemos designá-la como teoria “universal” pois propõe um estilo de liderança como o mais adequado
para todas as situações (Pina e Cunha et al., 2007).

Likert propõe quatro estilos de liderança típicos: autocrático explorador ou coercitivo, autocrático
benevolente, consultivo e democrático ou participativo. O líder autocrático explorador ou coercitivo
decide o que há para fazer, quem, como e quando deve ser feito. Baseia-se na intimidação e numa
comunicação meramente descendente. O líder autocrático benevolente já apresenta alguma
consideração pelas pessoas, numa postura mais paternalista. É um líder que já delega um pouco e ouve
os subordinados (embora estes geralmente apenas digam aquilo que julgam que o líder quer ouvir), mas
continua a ser ele a tomar as decisões mais importantes. Obtém a sua obediência não apenas através
da coerção, mas utilizando incentivos e recompensas. O líder consultivo consulta os subordinados antes
de definir objectivos e tomar decisões. Faz um esforço genuíno por envolver a equipa na tomada de
decisão. O líder participativo é aquele que envolve verdadeiramente os subordinados na tomada de
decisão. Todos os trabalhadores estão envolvidos e empenhados com a organização.

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Gestão e Organização de Empresas

Fig 4 – Os estilos de liderança de Likert e as teorias X e Y de McGregor


Fonte: Teixeira (2013)

Podemos ver na figura 4 como os quatro estilos correspondem a uma gradação entre um líder
completamente autocrático (e crente na teoria X de McGregor) e um líder completamente participativo
(e adepto da teoria Y). Segundo Likert, o estilo mais adequado seria o participativo, e ele defendia que
todos os líderes deviam procurar evoluir nesse sentido. Embora alguns estudos confirmem este
postulado, outros contrariam-no.

3.2.2. A Grelha de Gestão de Blake e Mouton

A Grelha de Gestão (Managerial Grid) de Blake e Mouton é uma proposta de intervenção e


desenvolvimento organizacional(Blake, Mouton, Barnes, & Greiner, 1964). Estes autores também
identificam duas dimensões no comportamento dos líderes (orientação para as pessoas e orientação para
as tarefas). No entanto, em vez de proporem uma dessas dimensões como o foco da acção do líder,
defendem que um líder verdadeiramente eficaz deverá dar elevada atenção a ambas.

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Gestão e Organização de Empresas

Fig 5 – A Grelha de Gestão de Blake & Mouton


Fonte: Teixeira (2013)

Conforme a atenção (máxima – 9, ou mínima - 1) que cada líder dá a cada uma das duas dimensões,
ele será posicionado na grelha (figura 5). Existem 5 posições base: (1,1) gestão empobrecida, em que
o líder dá mínima atenção a cada uma das preocupações, esforçando-se apenas o suficiente para garantir
um desempenho mínimo que não coloque em causa a sua posição na organização, (1,9) gestão country
club, em que o líder tem preocupação mínima com as tarefas, mas máxima com as pessoas, prestando
atenção às necessidades dos subordinados e criando uma atmosfera de trabalho confortável e amistosa,
(9,1) autoridade-obediência, em que os líderes manifestam preocupação máxima com as tarefas e
preocupação mínima com as pessoas, resultando numa organização eficiente do trabalho que implique
a mínima interferência do elemento humano, (5,5) meio do caminho, em que o líder está num ponto
intermédio entre as duas preocupações, conseguindo um desempenho adequado através do equilíbrio
entre a necessidade de produzir resultados e manter a satisfação dos subordinados a um nível
satisfatório, e (9,9) gestão de equipa, em que o líder obtém um elevado desempenho da equipa
resultante do seu forte empenho e comprometimento, existindo uma relação de interdependência,
confiança e respeito entre o líder e a equipa.

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Gestão e Organização de Empresas
A proposta dos autores é que cada líder faça o seu diagnóstico, posicionando-se na grelha. Após esse
diagnóstico, e através de formação, trabalho de desenvolvimento com a equipa, e definição de
objectivos, cada líder consiga evoluir para um desempenho (9,9). Essa gestão (9,9) pressupõe que o
líder tenho um estilo aberto e participativo, promova a resolução de conflitos, consensos, uma utilização
sinergística dos recursos, definição conjunta de objectivos, apoio mútuo e utilização de feedback como
catalisador de mudança e desenvolvimento. Com esta postura (9,9), os líderes conseguirão melhor
desempenho e produtividade da equipa, mas também maior satisfação e menor absentismo e
rotatividade. Os estudos conduzidos pelos autores também indicaram para que os gestores (9,9) têm
maiores probabilidades de obterem promoções do que os seus colegas com outros estilos.

3.3. Abordagens situacionais

As abordagens situacionais ou contingenciais partem do pressuposto de que não existe uma abordagem
ou estilo que seja mais eficaz em todas as situações. Significa isto que o comportamento mais eficaz de
um líder dependerá da situação de liderança em que este está inserido. Cada teoria contingencial
identifica um conjunto de factores que caracterizam a situação de liderança e propõe os comportamentos
que conduzirão aos melhores resultados em cada uma dessas situações tipificadas.

3.3.1. O Modelo Contingencial de Fiedler

O modelo contingencial de Fiedler (Fiedler, 1964) pressupõe que os líderes poderão utilizar um de dois
estilos (orientação para as tarefas ou orientação para as pessoas), cuja eficácia dependerá da
favorabilidade da situação de liderança, que é caracterizada por 3 factores: relação líder-subordinados,
estrutura da tarefa e posição de poder do líder.

Por relação líder-subordinados entende-se o respeito e consideração que a equipa tem pela pessoa que
as lidera. Quanto mais a equipa confiar na capacidade de quem a lidera para atingir os objectivos, mais
favorável é a situação de liderança. A estrutura da tarefa está relacionada com a facilidade com que a
execução da mesma pode ser planeada e organizada. Uma tarefa com um objectivo bem definido, em
que é fácil distinguir entre um bom ou mau desempenho e em que há uma metodologia conhecida para
a realizar torna a situação de liderança mais favorável do que quando o objectivo é vago e/ou o líder
não sabe quais são os passos a seguir para a completar nem consegue avaliar o desempenho da equipa
na tarefa. Finalmente, a posição de poder tem a ver com o poder formal que o líder tem sobre os
membros da equipa. Um líder que ocupe uma posição hierárquica superior à dos membros da equipa e
que tenha a possibilidade de recompensar bons desempenhos e punir maus desempenhos terá uma
situação de liderança mais favorável do que um líder que esteja no mesmo nível hierárquico que os
membros da equipa e que não tenha poder para os recompensar ou punir.

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Gestão e Organização de Empresas
Conjugando estes 3 factores, podemos classificar a situação de liderança quanto à sua favorabilidade,
conforme descrito na figura 6.

Segundo Fiedler, nas situações extremas, em que a situação é muito favorável ou muito desfavorável, o
comportamento mais eficaz é a orientação para as tarefas. Quando a situação é muito favorável
(situações 1, 2 e 3) qualquer dos comportamentos do líder teria resultados positivos, no entanto, a
orientação para as tarefas consegue esses resultados com menor utilização de recursos (nomeadamente
tempo), sendo assim mais eficaz. Na situação 8, uma orientação para as pessoas tendencialmente resulta
em inacção, pelo que a orientação para as tarefas será mais eficaz. Nas situações intermédias, a
orientação para as pessoas é mais eficaz pois o líder tem que conquistar o respeito da equipa (quando a
relação é fraca), conseguir que a equipa seja criativa e cooperante (quando a tarefa é pouco estruturada)
ou ser diplomático (quando a posição de poder é fraca).

Fig 6 – A Grelha de Gestão de Blake & Mouton


Fonte: Teixeira (2013)

Fiedler acreditava que cada pessoa tinha maior predisposição para um dos estilos, pelo que a
identificação da situação de liderança não serviria para o líder definir que estilo adoptar, mas sim para a
organização escolher uma pessoa com o perfil adequado à situação.

Fiedler (Fiedler, 1972; Pinha e Cunha et al., 2007; Bass, 2008) propõe também que a favorabilidade da
situação de liderança pode ser manipulada. Através da formação, as pessoas ganham novos
conhecimentos e podem ficar a conhecer novos métodos de trabalho que transformam uma tarefa pouco

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Gestão e Organização de Empresas
estruturada em muito estruturada. Também a experiência dos líderes pode alterar a favorabilidade da
situação, pois líderes mais experientes terão conhecimento sobre mais tarefas (uma tarefa pouco
estruturada para um líder pouco experiente pode ser estruturada para um líder experiente), entendem
melhor as expectativas sobre a tarefa e são mais reconhecidos pelos subordinados. Outra forma de
tornar uma situação mais favorável para um líder com uma posição de poder fraca será dar-lhe
autoridade para premiar e punir os membros da equipa.

3.3.2. A Teoria do Ciclo de Vida da Liderança de Hersey e Blanchard

O modelo de Hersey e Blanchard (Hersey & Blanchard, 1969) também preconiza que o líder deve adaptar
o seu estilo de liderança. Neste caso, os factores situacionais que influenciam o comportamento do líder
são a maturidade da sua equipa, a dois níveis: psicológico (autoconfiança, empenho e motivação) e
profissional (maturidade no cargo corresponde à competência e experiência para executar a função). A
combinação destes dois factores conduz a 4 situações distintas de liderança, em que o líder terá que
conjugar comportamentos de (elevada ou reduzida) orientação para as pessoas (relação) e (elevada ou
reduzida) orientação para a tarefa (figura 7).

Fig 7 – O comportamento do líder consoante a maturidade da equipa


Fonte: Teixeira (2013)

A Figura 8 ilustra a evolução que os autores consideram normal nos colaboradores, desde a fase M1, em
que não têm maturidade psicológica nem profissional, até à fase M4, em que têm maturidade profissional
e psicológica. Este modelo estabelece que, não apenas o líder se deve comportar de forma diferente com
subordinados com maturidades diferentes, mas também a forma como o líder deve ir adaptando o seu
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Gestão e Organização de Empresas
comportamento à medida que os subordinados vão ganhando maturidade.

Fig 8 – O comportamento do líder ao longo da evolução da maturidade da equipa


Fonte: Teixeira (2013)

Este modelo tem sido bastante criticado (Bass, 2008; Pina e Cunha et al., 2007) pelas suas
inconsistências internas e pelas suas contradições e ambiguidades conceptuais. Também vários estudos
questionam a validade das suas propostas. Apesar dessas críticas, o modelo é bastante popular (muito
simples e intuitivo) e continua a ser muito utilizado em contexto de formação.

3.3.3. A teoria dos caminhos para os objectivos de House

A teoria dos caminhos para os objectivos de Robert House (Robert J. House, 1971; R. J. House & Mitchell,
1974) é, porventura, o mais sofisticado (e abrangente) dos modelos contingenciais (Pina e Cunha et al.,
2007). O modelo baseia-se na teoria motivacional da expectativa e pretende explicar os impactos do
comportamento dos líderes na satisfação, motivação e desempenho dos subordinados. A motivação e
satisfação dos subordinados vai depender do quanto eles considerarem que (1) terão um bom
desempenho se exercerem um determinado esforço, (2) esse desempenho lhes permite obter
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Gestão e Organização de Empresas
recompensas, e (3) essas recompensas sejam consideradas valiosas. Acrescenta a essa relação os efeitos
moderadores das características dos colaboradores e da situação de liderança.

Fig 9 – Comportamentos de liderança propostos por Robert House


Fonte: Pina e Cunha et al. (2007)

Assim, House propõe 4 comportamentos que o líder pode adoptar (figura 9): directivo, apoiante,
participativo e orientado para o êxito. Esses comportamentos deverão ser adoptados consoante as
características dos subordinados e do ambiente de forma a maximizar as expectativas dos subordinados
de que os seus esforços conduzirão aos desempenhos pretendidos, de que esses desempenhos resultarão
em recompensas e de que essas recompensas têm valor para si. Ou seja, o líder terá que propor aos
subordinados objectivos (recompensas) valiosos para eles e facilitar o caminho (acesso) a essas
recompensas.

Por exemplo, quando a tarefa é não-estruturada e complexa e os subordinados são inexperientes, uma
liderança directiva aumentará a satisfação e esforço dos subordinados ao clarificar as expectativas, assim
diminuindo a sua incerteza quanto à tarefa e aumentando as expectativas de sucesso. Por outro lado,
quando a tarefa é rotineira e os subordinados são experientes, uma liderança directiva será
contraproducente.

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Gestão e Organização de Empresas

Fig 10 – O modelo do caminho para os objectivos de Robert House


Fonte: Pina e Cunha et al. (2007)

Em situações em que a tarefa é maçadora ou perigosa, uma liderança apoiante poderá aumentar a
satisfação e esforço dos subordinados, ao aumentar a sua autoconfiança e o valor intrínseco da tarefa.
Já quando a tarefa é intrinsecamente motivadora e agradável, uma liderança apoiante não terá impacto
positivo.

A liderança orientada para o sucesso aumenta o esforço e satisfação dos subordinados quando a tarefa
é não estruturada. Quando a tarefa é simples e repetitiva, este estilo tem pouco efeito.

Quando os subordinados denotam elevado locus de controlo interno (acreditam ter forte impacto nos
seus resultados), a liderança directiva pode aumentar a insatisfação e trazer desmotivação. Já quando
têm um locus de controlo externo (acreditam que os seus resultados dependem mais da sorte e de
factores externos ao seu controlo), um estilo directivo acaba por ter impacto positivo.

Pela sua complexidade (diversas variáveis com efeitos contrários nos resultados), este é um modelo
difícil de validar empiricamente, e não se tem conseguido obter resultados concludentes (Pina e Cunha
et al., 2007). No entanto, esta teoria trouxe preciosos contributos para a compreensão das dinâmicas
da liderança.

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Gestão e Organização de Empresas
4. Abordagens mais recentes

As abordagens mais recentes à liderança tentam compreender melhor a complexidade do conceito.


Parece claro que não há um estilo universalmente mais eficaz e que o fenómeno é demasiado complexo
para simples receitas situacionais. Assim, neste ponto serão descritas algumas abordagens mais
recentes, desde a liderança carismática e transformacional, passando pela importância da autenticidade
e pelos efeitos nefastos de algumas lideranças menos positivas, e chegando a um conjunto de
abordagens que retiram o foco do líder e relativizam a sua relevância.

4.1. Liderança Carismática

Vários autores (Antonakis, 2012; Bass, 2008; Pina e Cunha et al., 2007) apontam o sociólogo alemão
Max Weber como o responsável pela introdução do conceito de carisma na gestão, como uma forma de
influência não resultante da tradição ou autoridade formal, mas sim da personalidade magnética de uma
pessoa com capacidades extraordinárias e uma visão apelativa. Normalmente, as pessoas encontram-se
mais susceptíveis a valorizar e a seguir uma visão positiva de um futuro melhor em situações de crise.

Desta forma (Pina e Cunha et al., 2007), a liderança carismática compreenderá a interacção de 5
elementos: (1) uma pessoa com extraordinário dom e qualidades, (2) uma crise social ou situação de
desespero, (3) uma visão radical ou conjunto de ideias promissoras de solução para a crise, (4) um
conjunto de seguidores atraídos pelo dom do líder e crentes no seu poder e visão, e (5) a validação do
dom extraordinário da pessoa e da sua visão através de sucessos reiterados na gestão das crises
percepcionadas.

A figura 11 destaca os factores que funcionam como catalisadores da influência dos líderes carismáticos.
Estes aspectos criam um conjunto de efeitos sobre os seguidores: confiança na correcção das crenças
do líder, desenvolvimento de crenças semelhantes, aceitação incondicional, afecto pelo líder, obediência,
identificação, e envolvimento emocional na missão e nos objectivos ambiciosos por ele propostos. Estes
efeitos potenciam o desempenho dos seguidores e da organização.

104
Gestão e Organização de Empresas

Fig 11 – Factores potenciadores da liderança carismática


Fonte: Pina e Cunha et al. (2007)

Um líder é mais facilmente percepcionado como carismático (Conger & Kanungo, 1987) se: advogar uma
visão discrepante do status quo (embora não tão discrepante que se torne inaceitável para os
seguidores), incorrer em riscos, sacrifícios e custos pessoais na prossecução da sua visão, utilizar meios
inovadores e pouco convencionais, caracterizar a situação actual como negativa e intolerável e a sua
visão futura como desejável e alcançável, e se comportar de forma assertiva e confiante, projectando
competência e preocupação pelos outros. Os líderes carismáticos projectam poder através de um
comportamento elitista, empreendedor e exemplar, e não através de comportamentos directivos ou
através da procura de consensos.

A ocorrência dos efeitos carismáticos é facilitada quando (Pina e Cunha et al., 2007): (1) a visão do líder
e a missão da organização são congruentes com os valores e identidades dos seguidores, (2) quando o
trabalho é não estruturado, os objectivos de desempenho não podem ser especificados e claramente
medidos e as estratégias para os atingir não são evidentes, e (3) quando a organização vive dificuldades,
os seguidores não compreendem o que deve ser feito, e o ambiente interno se caracteriza por alguma
ansiedade e receio.

Um dos elementos essenciais de um líder carismático é a comunicação. Shamir, House e Arthur (1993)
identificam as características distintivas dos discursos dos líderes carismáticos (comparativamente aos
não carismáticos): contêm mais referências a valores e justificações morais, contêm mais referências ao
colectivo e à identidade colectiva do que ao interesse individual, contém mais referências à história,
tentando aí enquadrar as suas propostas, contêm mais referências positivas ao valor e à eficácia
individual e colectiva dos seguidores, contêm mais expressões de elevadas expectativas relativamente
105
Gestão e Organização de Empresas
aos seguidores, e contêm mais referências a objectivos distantes do que a metas próximas.

4.2. Liderança Transformacional

Uma liderança diz-se transaccional quando existe uma mera relação de troca entre o subordinado e o
líder, em que o subordinado tem os comportamentos solicitados ou desejados pelo líder na expectativa
de obter recompensas e evitar punições. Por outro lado, uma liderança diz-se transformacional quando
o líder “mexe” com a autoeficácia dos subordinados e os motiva a fazer mais do que inicialmente previam
e pensavam possível (Bass, 2008). A liderança transformacional é um processo através do qual os líderes
fomentam o empenhamento dos seguidores e os induzem a ultrapassar os seus autointeresses em prol
dos objetivos da organização, assim conseguindo obter o seu empenhamento e produzindo grandes
mudanças e elevados desempenhos (Pina e Cunha et al., 2007).

Fig 12 – Componentes da liderança transacional e transformacional


Fonte: Pina e Cunha et al. (2007)

A figura 12 clarifica as diferenças entre a liderança transacional e a liderança transformacional,


descrevendo também os quatro componentes da liderança transformacional: influência idealizada,
liderança inspiracional, estimulação intelectual e consideração individualizada.

106
Gestão e Organização de Empresas

Fig 13 – Comparação entre dois tipos de líderes transformacionais


Fonte: Pina e Cunha et al. (2007)

A liderança transformacional é uma das teorias de liderança mais popular e mais estudada, por toda a
aura positiva (em termos de motivações, comportamentos e impactos) que irradia. No entanto, essa
aura é ensombrada por alguns casos de líderes que querem parecer transformacionais, mas na realidade
não são, ao falhar na componente ética. Bass & Steidlmeier (1999) propõem que uma liderança
verdadeiramente transformacional deve assentar em bases morais e introduzem o conceito de
autenticidade no estudo da liderança. A figura 13 apresenta as diferenças entre os líderes autenticamente
transformacionais e os líderes pseudo-transformacionais.

4.3. Liderança Autêntica

O conceito de Liderança Autêntica emergiu na última década como resposta a uma degradação aparente
da componente moral da liderança contemporânea (B.J. Avolio & Mhatre, 2011), que exige uma nova
abordagem de liderança que coloque os valores e a autenticidade no seu núcleo (George, 2003). É uma
nova perspetiva sobre a liderança, que a assume como um processo em que o líder deverá possuir um
conjunto de competências psicológicas positivas bem desenvolvidas, mas agir de forma autêntica.
(Calheiros, 2015).

107
Gestão e Organização de Empresas

Fig 14 – Dimensões da Liderança Autêntica

Luthans e Avolio (2003) definem Liderança Autêntica como “um processo alicerçado em capacidades
psicológicas positivas e num contexto organizacional altamente desenvolvido, que resulta em maior
autoconhecimento e em comportamentos positivos autorregulados da parte do líder e dos seus colegas,
promovendo um autodesenvolvimento positivo”. Walumbwa et al (2008) refinam essa definição ao
propor que Liderança Autêntica é “um padrão de comportamento do líder que se alimenta de e promove
capacidades psicológicas positivas e um clima ético positivo, fomentando um maior autoconhecimento,
uma perspetiva moral interna, um processamento equilibrado de informação, e transparência relacional
da parte dos líderes para com a sua equipa, promovendo um autodesenvolvimento positivo”.

Fig 15 – Modelo de Liderança Autêntica e comportamentos dos seguidores


Fonte: Avolio et al. (2004)

A Liderança Autêntica não pressupõe um estilo de liderança único e específico. Pressupõe sim que o líder

108
Gestão e Organização de Empresas
se vê como líder e assume de forma consciente as responsabilidades desse papel, agindo de forma
autêntica e transparente, sempre coerente com os seus valores (que tem bem presentes e claros). Num
contexto organizacional bem desenvolvido, em que exista identificação pessoal e social, este
comportamento do líder resultará num conjunto de atitudes e comportamentos dos membros da equipa,
que trazem como resultado uma performance mais elevada, maior satisfação, maior bem-estar, maior
compromisso e envolvimento, mais comportamentos de cidadania organizacional, maior criatividade,
mais capital psicológico, e uma redução no bullying e nos estados psicológicos negativos, como o
burnout, o cinismo, a exaustão emocional (Calheiros, 2015).

4.4. Liderança Destrutiva

Liderança destrutiva é o termo escolhido por um grupo de investigadores noruegueses para designar “o
comportamento sistemático de um líder, supervisor ou gestor, que viola o legítimo interesse da
organização ao sabotar os objectivos, tarefas, recursos e eficácia organizacionais e/ou a motivação, bem-
estar ou satisfação dos seus subordinados” (Einarsen, Aasland, & Skogstad, 2007). É um conceito
agregador que pretende incluir várias práticas destrutivas previamente estudadas, como “supervisão
abusiva”, “tirania mesquinha”, “gestão tirânica”, “bullying laboral”, “assédio moral”, “liderança tóxica” e
outros (Calheiros, 2013). Para um líder ser considerado destrutivo, não é necessário haja uma intenção
maliciosa do líder. Ou seja, um líder pode ser destrutivo sem querer ou sem ter noção disso (casos de
incompetência, por exemplo). É aqui considerado o impacto dos comportamentos (negativo para a
organização ou para os subordinados) e não a sua motivação. E um líder pode ser destrutivo através de
comportamentos agressivos ou meramente passivos (inacção, não tomada de decisões, etc.). No
entanto, para um líder ser considerado destrutivo, deverá ter esses comportamentos de forma repetida
e sistemática

109
Gestão e Organização de Empresas

Fig 16 – Modelo de Liderança Construtiva e Destrutiva


Fonte: Einarsen et al. (2007)

Os autores tipificam os comportamentos dos líderes num modelo conceptual a duas dimensões:
comportamento face à organização e comportamento face aos subordinados (Einarsen et al., 2007). O
comportamento que os autores preconizam é a liderança construtiva (comportamento favorável aos
interesses da organização que simultaneamente estimula positivamente a motivação, bem-estar e
satisfação dos subordinados). Todos os outros comportamentos são considerados destrutivos.
Comportamentos favoráveis aos interesses da organização, mas adversos para os subordinados, são
designados pelos autores como liderança tirânica. Quando o líder tem comportamentos favoráveis aos
subordinados, mas contrários aos interesses da organização, é designada de liderança de apoio / desleal
(apoio aos subordinados, mas desleal para a organização). Nos casos em que o comportamento do líder
é prejudicial tanto à organização como aos subordinados, essa liderança é designada de descarrilada.
Mesmo uma liderança laissez-faire é considerada destrutiva, já que se considera que o líder “peca por
omissão”, ou seja, é uma liderança negativa pelo custo de oportunidade de não ter aplicado os recursos
da organização e as capacidades das pessoas de forma construtiva.

Este lado negro da liderança deve preocupar-nos, dado que um estudo recente indica que (Aasland,
Skogstad, Notelaers, Nielsen, & Einarsen, 2010) que o fenómeno afeta muitas pessoas (83,7% dos
respondentes indicaram já ter tido contacto com comportamentos de liderança destrutiva, e 33,5% a
61% referiram que esses comportamentos eram consistentes e frequentes), e de forma severa (Schyns
& Schilling, 2012). Outros estudos indicam que, quando a liderança tem impactos positivos, estes são
moderados, mas quando os impactos são negativos, tendem a ser mais extremos.

4.5. A teoria dos Substitutos da liderança


110
Gestão e Organização de Empresas
A teoria dos substitutos de liderança diz que a função do líder consiste em potenciar a eficácia dos
subordinados, através de dois tipos de interacções: orientação (do seu trabalho, definindo estratégias e
métodos, ensinando e partilhando os seus conhecimentos com o subordinado) e motivação (incentivos
e recompensas, feedback, etc.). No entanto, os autores (Kerr & Jermier, 1978) propõem que esta
orientação e motivação podem surgir de outras fontes que não necessariamente o líder, substituindo-o
nesse papel. Propõem também a existência de factores neutralizadores da acção do líder, que o impedem
de agir de determinada forma ou de conseguir os resultados pretendidos com as suas acções. A figura
17 sistematiza esses factores.

Fig 17 – Trocas no endogrupo e no exogrupo


Fonte: Pina e Cunha et al. (2007)

Esta teoria mostra-nos que há outros factores, para além dos líderes, que têm impacto relevante no
desempenho das equipas e que podem potenciar ou boicotar a acção desses mesmos líderes.

4.6. Trocas líder-membros

A teoria das trocas líder-membros (G. Graen, Dansereau Jr, & Minami, 1972; G. Graen & Schiemann,
1978; G. B. Graen & Uhl-Bien, 1995) é uma proposta de abordagem tendente a uma liderança mais
eficaz através da geração e manutenção de relações de liderança de elevada qualidade. As relações entre
o líder e os subordinados evoluem de uma situação de liderança transacional, em que tanto líder como
subordinado procuram apenas o seu próprio interesse, para uma situação de liderança transformacional,
através do desenvolvimento de confiança, respeito e lealdade. A figura 18 descreve as duas situações,

111
Gestão e Organização de Empresas
distinguindo entre o exogrupo (relações de baixa qualidade, meramente formais) e o endogrupo
(relações de elevada qualidade, que ultrapassam o formalmente estabelecido).

Fig 18 – Trocas no endogrupo e no exogrupo


Fonte: Pina e Cunha et al. (2007)

Os benefícios das relações do endogrupo são imensos e nas duas direcções (líder e subordinados). No
entanto, este tipo de relação exige bastante do líder. Esta relação especial pode também gerar
sentimentos discriminatórios e ressentimentos da parte dos membros do exogrupo ou hostilidade entre
os membros do exogrupo e do endogrupo (Pina e Cunha et al., 2007). Para o evitar, o líder deve oferecer
a todos os subordinados estas relações de elevada qualidade, podendo estes aceitar ou rejeitar a
proposta. A figura 19 descreve a fase inicial (antes da proposta de relações de elevada qualidade) e final
(após a aceitação e desenvolvimento de confiança, respeito e lealdade) deste processo de construção de
liderança.

112
Gestão e Organização de Empresas

Fig 19 – Fases inicial e final do processo de construção da liderança


Fonte: Pina e Cunha et al. (2007)

4.7. Seguidança (followership)

As teorias até aqui descritas olham para o processo da liderança da perspectiva do líder, como que
assumindo que ele é o único elemento activo neste processo, e ignorando um pouco o papel dos
seguidores / subordinados / equipa. No entanto, vários investigadores contrariam esta ideia, destacando
a relevância dos seguidores na aceitação, acção e resultados do processo de liderança.

Robert Kelley (1988) criou um pequeno modelo de classificação bidimensional (figura 20), em que
classifica os seguidores consoante a sua capacidade de pensar criticamente e de tomar iniciativa.
Defende que um seguidor eficaz deve ser entusiasta, inteligente e participativo na prossecução de
objectivos organizacionais. Como qualidades deve ser capaz de se auto-gerir (trabalhar de forma eficaz
sem supervisão próxima), deve ser comprometido com a organização (ou com um seu produto, causa
ou ideia), deve ser competente em áreas úteis para a organização e deve ser corajoso (pensador crítico,
credível e honesto, em cujo conhecimento e opinião se pode confiar).

113
Gestão e Organização de Empresas

Fig 20 – Classificação dos seguidores


Fonte: Kelley (1988)

Warren Bennis (2010) apelida esta “seguidança” de arte, referindo-se à vacuidade dos rótulos de líder e
apelidando os seguidores de verdadeiros heróis, nomeadamente quando “enfrentam” líderes tóxicos (ou
destrutivos). Bennis considera que os subordinados tradicionalmente valorizados (obedientes e acríticos)
são pouco valiosos e, até, perigosos para as organizações. E, reconhecendo que por vezes é mais difícil
ser um bom seguidor do que um bom líder, defende que o que define os bons seguidores é a coragem.
A coragem de ser capaz de transmitir notícias desagradáveis e dar opiniões contrárias à do líder,
ajudando-o a tomar melhores decisões e a ser mais eficaz.

Vários autores (Padilla, Hogan, & Kaiser, 2007; Thoroughgood, Padilla, Hunter, & Tate, 2012) que
estudam a Liderança Destrutiva também aludem ao papel dos seguidores na potenciação dos efeitos
negativos destes líderes, incluindo-os no triângulo tóxico (líderes destrutivos, seguidores susceptíveis e
ambientes propiciadores) da liderança destrutiva. Estes autores classificam os seguidores susceptíveis
em 5 tipos: autoritários (aceitam a liderança destrutiva pois acreditam que os líderes têm o direito de
exercer a liderança à sua maneira), acólitos (associam-se ao líder porque concordam com as suas ideias
e comportamentos), oportunistas (associam-se ao líder destrutivo na expectativa de obter benefícios),
espectadores (subordinados que se reduzem à passividade por medo) e almas perdidas (pessoas com
baixa autoestima, que procuram validação através da associação a líderes carismáticos).

5. Notas finais

O objectivo deste texto era o de apresentar uma visão geral sobre o tema da liderança. Discutiu-se o

114
Gestão e Organização de Empresas
conceito, apresentou-se uma possível distinção face ao conceito de gestão e depois apresentaram-se as
principais teorias, começando com as abordagens mais tradicionais até chegarmos a uma abordagem
que retira o foco dos líderes, colocando-o nos seguidores.

Parecem, no entanto, ter ficado algumas questões em aberto:


• Afinal, qual é o melhor estilo de liderança?
• O que deve fazer um líder para ser eficaz?

Estas questões são colocadas há muitas décadas e será impossível encontrar uma resposta que satisfaça
todas as pessoas. Hiller et al. (2011) dão o exemplo de uma formação interna da General Electric, que
pedia aos participantes para debater a veracidade das duas frases seguintes:

1. Jack Welch é o melhor líder da história da General Electric


2. Jack Welch é um cretino
A verdade é que, consoante as nossas concepções de liderança, podemos considerar qualquer das frases
verdadeira, ou mesmo as duas. Analisando o desempenho económico-financeiro da General Electric
durante a gestão de Jack Welch, é óbvio que ele conseguiu valorizar imenso (o valor em bolsa
multiplicou-se 400 vezes) a organização e guiá-la com sucesso durante 20 anos. Por alguma razão foi
considerado o melhor gestor do século XX pela revista Fortune. Por outro lado, o lado irascível de Jack
Welch é bem conhecido, sendo acusado de colocar imensa pressão nos seus colaboradores e de não
mostrar empatia pelo trabalhador comum (foi dos executivos que liderou mais processos de
despedimento e que muito contribuiu para o agravamento do fosso entre os salários dos executivos e
dos trabalhadores médios). Ou seja, podemos também considerar Jack como um líder destrutivo
(tirânico, no caso), o que faz com que não avaliemos muito positivamente a sua liderança. Significa isto
que o que consideramos um bom líder dependerá do que consideramos ser o objectivo da liderança. No
entanto, se tradicionalmente o que era valorizado eram apenas os resultados (lucros, sucesso em
projectos, etc.), cada vez mais a sociedade valoriza a forma como os resultados são atingidos. A
emergência e crescente relevância, nomeadamente, das teorias da liderança autêntica e da liderança
destrutiva prova-o. Mesmo em contextos teoricamente mais objectivos e calculistas (bolsa de valores e
mercado de trabalho dos executivos), quando os resultados são ambíguos (não se consegue classificar
objectivamente o desempenho do executivo como positivo ou negativo), a apreciação dos executivos é
feita pelo seu estilo, sendo valorizado o seu carisma (Jacquart & Antonakis, 2015).

Não há uma teoria que explique melhor o fenómeno da liderança. O fenómeno é complexo e cada teoria
faz incidir a luz num aspecto dessa complexidade. E, como vimos, há uma dimensão moral muito
relevante na questão, com impactos na aceitação do líder pela equipa, na sua adequação à situação de
liderança e na forma como avaliamos o desempenho dos líderes.

Para terminar, em vez de conclusões que tentem encerrar artificialmente o tema, ficam antes 6 reflexões
(Bass, 2008) com a intenção de enriquecer um pouco mais a vossa perspectiva sobre a liderança: (1) a
liderança não é exclusivo do responsável máximo da organização; (2) a liderança deve procurar potenciar

115
Gestão e Organização de Empresas
a excelência nos outros; (3) liderar não é a mesma coisa que gerir; (4) a liderança envolve uma dimensão
de sensibilidade humanista; (5) os líderes devem adoptar uma postura holística, utilizando uma
variedade de competências e técnicas; (6) a liderança é a arte de antecipar, iniciar e implementar a
mudança.

116
Gestão e Organização de Empresas

TEXTO Nº 7
Inovar sem Risco
Eurico Neves

CAPÍTULO I – INOVAR: COMO, QUEM E PORQUÊ?


A vontade de inovar é seguramente comum à totalidade das empresas. A moda recente em torno do conceito
«inovação» mais não tem feito do que aguçar este desejo. Na inovação as empresas procuram a resposta aos
problemas que as afligem diariamente ou a possibilidade de ultrapassar as suas concorrentes e de aumentar as
suas vendas. Inovar pode ser ainda uma oportunidade de diversificar a produção e de atacar novos mercados
ou uma forma de as empresas melhorarem a sua imagem de marca, tornando-se um símbolo apetecível de
modernidade e eficiência.
Para a maior parte das empresas «inovação» significa novas tecnologias. Embora o conceito de
inovação seja bastante mais vasto e atinja todas as áreas de actividade de uma empresa, neste livro tomaremos
este conceito como bom e abordaremos apenas a inovação tecnológica. É um facto que a inovação não tem que
ser necessariamente tecnológica e pode ser apenas uma nova forma de apresentar, distribuir ou vender um
produto (e veja-se como exemplo a inovação das crescentes redes de «franchising» que revolucionaram os
conceitos estabelecidos de distribuição). Mas é igualmente verdade que nos dias de hoje não há absolutamente
nenhum domínio de actividade que não repouse nalguma forma de tecnologia, e no qual uma inovação
tecnológica não possa representar ganhos significativos de competitividade. Dando razão às empresas,
«inovação» significa cada vez mais «novas tecnologias».
Se todas as empresas desejam inovar e aceder a novas tecnologias, muito poucas são as que sabem
como. Para a maioria a inovação tecnológica aparece como algo de quase inabordável, apenas ao alcance dos
grandes grupos industriais dotados de departamentos de investigação próprios. Inovação e investigação são
conceitos que andam normalmente de mãos dadas. Isto acontece porque o modelo de inovação que prevalece
no espírito da maior parte dos gestores de empresas é o designado modelo linear de inovação. Segundo este
modelo, ilustrado na Figura 1, um processo inovador é sempre desencadeado por um projecto de investigação
básica1, a que se segue, caso tenham sido obtidos resultados interessantes, uma fase de desenvolvimento da
tecnologia. Concluída esta etapa, que visa transformar os resultados de investigação em algo de
comercializável, a nova tecnologia daí resultante é produzida e finalmente vendida.

1
Por investigação básica entendem-se os projectos destinados a adquirir, aprofundar ou desenvolver conhecimentos científicos, em
oposição à investigação aplicada destinada a converter tais conhecimentos em produtos, processos ou serviços comercializáveis. A
investigação aplicada é neste livro mais correntemente designada por «desenvolvimento» (o «D» de I&D).
117
Gestão e Organização de Empresas

Segundo este modelo linear o número de inovações que finalmente chegam ao mercado está
directamente condicionado pelo volume de investigação científica efectuada. Um grande investimento em
investigação (por exemplo com objectivos militares) deverá assim conduzir a um número elevado de descobertas
que mais tarde ou mais cedo encontrarão o seu caminho até ao mercado. A períodos de grande agitação
científica (como por exemplo os motivados pelas guerras mundiais ou pela conquista espacial) seguem-
se assim fases de introdução rápida de inovações no mercado, de que são exemplos o avião a jacto, o radar ou
os computadores.
Não sendo o único modo possível de representar a introdução de novos produtos, processos ou serviços
no mercado (como se verá mais à frente), o modelo linear ajusta-se contudo a uma grande parte das inovações
importantes das últimas décadas. Mas isto não significa de modo algum que só as empresas «investigadoras»
possam inovar. Não é necessário «inventar» para «inovar». Por vezes basta aproveitar as invenções de outros.
Com uma parte de leão da investigação básica a ser desempenhada pelos (ou para) os poderes públicos, e sem
que estes tenham o interesse ou a capacidade de levar as eventuais descobertas até ao mercado, o caminho
fica aberto para quem o souber aproveitar. Nem a Boeing nem a Airbus inventaram o avião a jacto e contudo
estas duas empresas dominam actualmente o mercado deste tipo de aviões para transporte de passageiros. A
Compaq nem existia quando apareceram os primeiros computadores e é agora um gigante na área dos
computadores pessoais. O sucesso destas empresas assentou em grande parte em saberem construir as suas
inovações sobre as descobertas que o mundo científico lhes ofereceu.
Uma empresa que queira inovar não está portanto obrigada a percorrer todas as etapas do modelo
linear. Diferentes empresas poderão, de acordo com as suas diferentes culturas tecnológicas e os seus distintos
recursos, empreender o processo em diferentes fases do seu percurso linear. Poderão iniciá-lo desde o ponto
de partida, desempenhando elas mesmas a investigação básica que se espera conduza a descobertas de
impacto nos mercados, ou poderão «apanhar o comboio em andamento» numa das suas etapas intermédias. É
claro que quanto maior for a base tecnológica de uma empresa, mais a montante poderá esta iniciar o processo
(e assim deter um maior controle sobre este e os seus resultados). Pelo contrário, quanto mais pobre tecnologi-
camente ela for, mais a jusante terá que efectuar a sua entrada no processo e mais dependente fica de
terceiros. Mas só fica de fora quem quiser. A etapa do modelo linear pela qual uma empresa inicia o seu
processo inovador condiciona o seu modo de aceder à inovação. Dando nomes às diferentes formas de abordar
o processo, obtemos o gráfico da figura seguinte, com cinco dos principais modos de obter inovações:

118
Gestão e Organização de Empresas

Podem-se ilustrar as diferentes possibilidades de aceder à inovação que se deparam às empresas com
um exemplo simples:
Imagine-se um distraído proprietário de uma vivenda, que sempre que sai de casa se esquece de
desligar as luzes e o aquecimento e de liga o alarme.
Se ao feitio distraído se associar um espírito empreendedor, poderá tal personagem pensar em instalar
em sua casa um sistema inovador capaz de lhe resolver o problema. Por exemplo um circuito electrónico que
quando accionado pela volta da chave na fechadura da porta, no sentido de a fechar, dispara automaticamente
os disjuntores da iluminação e do aquecimento central da residência, e activa o relé de comando do sistema de
alarme. Se possuir os conhecimentos suficientes de electrónica para desenhar um tal circuito, e a habilidade
para o montar e instalar, então terá «feito» a sua própria inovação. Se esta resultar em pleno poderá mesmo
vendê-la aos vizinhos.
Se lhe faltarem os conhecimentos para desenhar o circuito, mas lhe sobrar a habilidade para o instalar,
poderá sempre «encomendar» o projecto a um gabinete de engenharia e depois montá-lo ele próprio. Ou então
comprar um circuito próximo do que necessita (por exemplo um vulgar circuito de um sistema de abertura e
fecho de um portão de garagem por comando remoto) e adaptá-lo ao seu caso particular.
No caso de os seus conhecimentos de electrónica e electricidade serem demasiado reduzidos para lhe
permitir aceder a uma das soluções acima descritas, mas continuando o proprietário com vontade de resolver
ele próprio o seu problema, poderá tentar «aprender» rapidamente o suficiente sobre sistemas semelhantes ao
que deseja, de modo a ser então capaz de montar uma solução.
Finalmente, se não dispuser do tempo, da vontade, ou dos meios para optar por uma destas soluções
resta a este homem contentar-se unicamente com o que o mercado lhe oferece, mesmo correndo o risco de a
solução oferecida não ser exactamente a que resolve o seu problema particular. O proprietário da nossa história
terá neste caso que «comprar» um sistema já pronto e aprender a trabalhar com ele. Mas tendo sido o primeiro
da sua rua a instalar um tal sistema, não terá deixado de inovar. Provavelmente tornar-se-á mesmo uma
referência para os vizinhos que lhe virão pedir conselho antes de comprarem sistemas semelhantes.
Tal como este empreendedor proprietário também as empresas deverão procurar o modo de inovar adaptado
aos seus meios, competências e disponibilidades.
Uma empresa «investigadora» com capacidades próprias de investigação e desenvolvimento (I&D) e
recursos materiais e humanos suficientes, poderá assim «fazer» a sua própria tecnologia, cumprindo uma a
uma todas as etapas do processo de inovação.
Já empresas tecnologicamente menos evoluídas, sem departamentos internos de investigação, mas
ainda assim dotadas de recursos técnicos razoáveis (empresas «tecnologicamente competentes»), podem
apanhar o «comboio da inovação» na segunda estação, seja «encomendando» a etapa anterior a um organismo
especializado de I&D, seja adquirindo os direitos de uma ideia e «adaptando-a» à sua situação particular.
As empresas poupam-se assim à fase mais demorada e arriscada do processo, sendo que em contrapartida
devem compensar de algum modo a organização responsável por essa fase. Deverão assim pagar um preço a
acordar pelo trabalho de investigação «encomendado», mais elevado se quiserem ficar com a exclusividade
dos resultados, mais baixo se não se importarem de os partilhar com outras empresas. De

119
Gestão e Organização de Empresas

qualquer forma, menos do que teriam de gastar para chegarem elas próprias a esses mesmos resultados.
Organizações sem capacidade de desenvolvimento, mas «tecnologicamente despertas», podem por sua vez
«aprender» as especificidades de uma nova tecnologia de modo a passarem a produzi-la elas próprias
(eventualmente com algum valor acrescentado) e comercializá-la em seguida, pagando os direitos respectivos
ao seu criador. Esta modalidade é interessante para empresas em fase de despertar tecnológico pois permite-
lhes rotinar o seu pessoal em processos inovadores, sem terem de arcar de início com os riscos do seu
desenvolvimento. Em contrapartida os acordos de licenciamento podem ser bastante limitativos em termos de
crescimento de mercado ou no domínio oferecido sobre a tecnologia licenciada, mas tudo dependerá das
capacidades de negociação das empresas.
Se uma empresa quiser rapidamente tornar-se dona de uma nova tecnologia (seja para comercializá-la
num dado mercado, seja para consumo interno) sem passar pelas fases do seu desenvolvimento ou produção,
resta «comprá-la» a quem a comercialize. É o que se passa quando uma firma adquire os direitos de
representação de uma tecnologia «chave na mão» ou quando compra uma nova máquina para a sua linha de
montagem. Nestes casos, o domínio da firma sobre a nova tecnologia é reduzido e consequentemente é
também limitada a sua capacidade de evoluir tecnologicamente em resultado do uso da inovação. Pelo contrário
o risco é reduzido e os resultados comerciais podem ser rápidos. Os maiores benefícios poderão contudo ser
ainda alcançados pelas empresas que forem capazes de assegurar um maior domínio e intervenção sobre a tec-
nologia que adquiriram. Empresas «adormecidas tecnologicamente» podem desta forma despertar para as
vantagens da inovação tecnológica.
Mas para além das possibilidades tecnológicas de «quem» inova, um outro factor terá que ser levado
em linha de conta quando da escolha do modo de inovar pelas empresas. Quando prestes a iniciar um processo
de inovação, uma empresa não se pergunta apenas «como é que eu posso inovar?», mas principalmente «por
que é que eu quero inovar?». Porquê iniciar um processo arriscado, onde se vão pôr em jogo uma boa parte
dos recursos materiais e humanos de uma empresa com resultados incertos?
A resposta a esta pergunta terá que ser procurada no mercado (normal num mundo cada vez mais
aberto e liberal) e é ao tentar analisar esta componente crucial da inovação que o modelo linear, em que nos
temos baseado até aqui, revela as suas limitações. Existe um grande número de inovações que não resultam
directamente do desenvolvimento comercial de descobertas científicas, antes seguem um percurso quase
inverso. São inovações cuja origem se encontra numa atempada detecção de necessidades do mercado, muitas
vezes passíveis de serem satisfeitas com uma simples evolução de tecnologias já existentes. Por sua vez, esta
evolução, baseada em conhecimentos tecnológicos já existentes, pode abrir novos caminhos à investigação e
conduzir ao alargamento do conhecimento científico. A inovação deixa assim de poder ser exclusivamente
representada como o resultado de uma sucessão linear de etapas para passar a aparecer como um processo
interactivo em que novas tecnologias necessitam de ser constantemente desenvolvidas e aperfeiçoadas, não só
no seu desempenho técnico mas igualmente em termos da sua aceitação no mercado. Os exemplos clássicos de
um percurso não-linear da inovação incluem casos como o da invenção do aeroplano pelos irmãos Wright – sem
nenhuns conhecimentos de aerodinâmica e coroados de sucesso à custa de melhorias sucessivas no desenho
do seu engenho – ou o desenvolvimento da computação paralela como uma tentativa de resolver as limitações

120
Gestão e Organização de Empresas

em termos de velocidade impostas por um único processador.


O reconhecimento das limitações do modelo linear na explicação de algumas inovações conduziu ao
aparecimento de modelos não-lineares, em que as diferentes fases do processo interagem umas com as outras
em vez de simplesmente se sucederem. Num tal modelo, cada nova etapa na direcção da comercialização de
um produto põe em questão as etapas anteriores, à medida que parâmetros como competitividade, «design»,
preço final e aceitação pelos mercados vão sendo introduzidos. Estes parâmetros complementam as questões
puramente técnicas, obrigando em cada etapa à reconcepção total ou parcial do projecto. O mercado e as suas
exigências aparecem assim como constantes de todo o processo. Nestes modelos já não é a investigação
tecnológica, conduzida no interesse público ou privado, a originar forçosamente o desenvolvimento de novos
produtos comercializáveis, mas sim o mercado que os pede, estimulando o engenho dos cientistas nas
empresas.
Um possível modelo não linear de inovação é o que se representa na figura seguinte:

O modelo não linear da inovação aplica-se particularmente bem no caso de «pequenas» inovações,
normalmente simples melhoramentos de tecnologias já existentes. Ao contrário o desenvolvimento da maioria
das inovações radicais continua a poder representar-se por modelos lineares.
A adopção por uma empresa de uma prática de inovação de acordo com um modelo não linear, não
representa por si só nenhuma nova forma de acesso a novas tecnologias. Para obtê-las uma empresa terá que
continuar por optar entre «fazê-las», «encomendá-las», «adaptá-las», «aprendê-las» ou «comprá-las». Mas ao
introduzir a componente «mercado» na origem e ao longo de todo o processo, tal prática de inovação introduz
121
Gestão e Organização de Empresas

pela primeira vez o factor motivação. Ou a resposta à pergunta «porquê inovar?».


Segundo esta nova óptica mercantilista, o modo como uma empresa irá inovar deixa de ser apenas função dos
seus recursos tecnológicos para passar a ser igualmente dependente dos objectivos pretendidos com a inovação.
Objectivos que estão por sua vez directamente relacionados com a atitude da empresa perante os seus
mercados.
Esta atitude pode por exemplo ser uma atitude ofensiva, pela qual uma empresa pretende com a
inovação melhorar a sua posição no mercado, superando tecnologicamente as suas concorrentes.

«Empurrão tecnológico» versus «Puxão do mercado»


Os conceitos de «empurrão tecnológico» do inglês 'technology push' – e «puxão do mercado» – de
"market-pull" – são usados frequentemente para descrever o processo de inovação. Segundo o primeiro a inovação é
provocada pela investigação científica, a que se segue a comercialização de descobertas tecnológicas. De acordo com o
segundo as inovações resultam principalmente de necessidades do mercado que «aguçam o engenho» dos investigadores.
Não é claro qual dos dois conceitos predomina actualmente no total de inovações registado na Europa. Estudos
contraditórios existem quanto à influência de cada um deles, mas existe uma relativa unanimidade quanto à prevalência
do «empurrão tecnológico» nas grandes inovações enquanto o «puxão de mercado» é responsável por mais de 90% das
pequenas inovações.

É a atitude típica dos líderes de mercado, das empresas que aspiram a sê-lo ou daquelas com um
rápido padrão de crescimento à custa da frequente introdução de inovações. Como a empresa dinamarquesa
Bang & Olufsen, por exemplo, produtora de equipamento áudio, que tem como lema: «uma inovação importante
cada dois anos».
Mas a atitude pode ser também uma atitude imitativa, pela qual uma empresa ao inovar se limita a
seguir os passos das suas competidoras directas, de modo a não se deixar atrasar irremediavelmente. É a
atitude a que estão obrigadas todas as empresas inseridas em áreas de actividade de grande dinamismo, e que
devem rapidamente adaptar-se às últimas modas do seu sector. A electrónica de consumo é uma dessas áreas.
Sempre que a Sony ou a Phillips (os líderes de mercado) introduzem uma inovação absoluta (como o leitor de
CDs, o walkman ou o vídeo gravador) inicia-se entre os seus competidores uma corrida a inovações semelhantes
e se possível, ainda mais perfeitas.
Finalmente a motivação para inovar pode provir ainda de uma atitude defensiva, quando uma empresa
necessita de inovar para resolver os problemas que lhe aparecem pela frente. É a atitude mais frequente entre
as pequenas empresas, confrontadas diariamente com problemas de diversa índole, muitos dos quais só podem
ser resolvidos pelo recurso a inovações. Sendo que por vezes há males que vêm por bem. A urgência de
resolver um problema pode constituir uma boa oportunidade de modernizar uma empresa e adaptá-la às novas
tendências do mercado. A indústria portuguesa de moldes surgiu em parte por essa razão.
Consoante a atitude de uma empresa perante os mercados, a sua justificação para empreender um
processo de inovação tecnológica terá assim uma motivação ofensiva, imitativa ou defensiva. Ao «como» e ao
«quem» da inovação vem agora juntar-se o «porquê». A tabela representada abaixo (Fig. 4) resume as
respostas possíveis a cada uma destas três perguntas: como, quem e porquê inovar?
118
Gestão e Organização de Empresas

Inovar, como? Inovar, quem? Inovar, porquê?


• Fazendo: desenvolvendo • Investigadores: Empresas com • Para responder a um problema
internamente, através de projectos departamento de I&D ou importante da empresa: Inovação
de I&D, novas tecnologias. equivalente, capazes de uma visão defensiva;
• Encomendando: cooperar com tecnológica a longo prazo. • Para assegurar o crescimento a
instituições de I&D em projectos • Tecnologicamente com- médio/longo prazo e ultrapassar os
adaptados às necessidades da petentes: Empresas com uma concorrentes: Inovação
empresa. forte componente de engenharia, ofensiva;
• Adaptando: desenvolver e sem grandes limitações financeiras • Para acompanhar os seus
aplicar, de uma forma inovadora, e com ligações tecnológicas exte- concorrentes: Inovação imi-
tecnologias já existentes, de riores. tativa;
acordo com as necessidades e • Tecnologicamente despertas:
competências da empresa. Empresas com entre um a cinco
• Aprender: adquirir o saber-fazer engenheiros (em funções
(licenças) necessário para produzir técnicas), capazes de adoptar e
inovações. adaptar soluções integradas,
• Comprar: Comprar tecnologias eventualmente com recurso a
já adaptadas às necessidades da aconselhamento exterior.
empresa. • Adormecidas: Empresas sem
capacidade tecnológica e ainda
sem percepção da necessidade de
a criar.
Fig. 4 - Inovar: Como, Quem e Porquê

No exemplo do proprietário empreendedor, dado anteriormente a propósito das diferentes formas de


aceder à inovação, a motivação assentava claramente numa atitude defensiva. No caso a necessidade de
resolver um problema prático do dia-a-dia, com consequências nefastas na conta da electricidade e na
segurança do potencial inovador. Mas podemos igualmente considerar o mesmo exemplo com uma das duas
outras motivações apresentadas acima, seja a imitativa (o desejo de seguir o exemplo de um vizinho) ou a
ofensiva (identificar a necessidade de um tal sistema entre os vizinhos e desenvolvê-lo tendo em vista
fundamentalmente a sua venda).
Ao introduzir o factor motivação estamos contudo a condicionar as opções relativas à forma de inovar
que se apresentam ao proprietário. Se por exemplo a sua motivação para inovar for ofensiva fica
automaticamente excluída a hipótese de compra do sistema, uma vez que dificilmente alguém comprará a um
vizinho um sistema que pode comprar directamente nas lojas, sem ter que recorrer a um intermediário extra.
Reconhece-se assim que a escolha do modo de inovar (ou a resposta à pergunta «como inovar?») não é
unicamente função das capacidades de quem inova mas igualmente dos objectivos pretendidos com a inovação
(a resposta à pergunta "porquê inovar?»). Podemos assim representar o «como inovar» como função de uma
tabela de duas entradas: o «quem» e o «porquê».

119
Gestão e Organização de Empresas

A análise desta matriz permite-nos uma aproximação ao processo inovativo muito mais completa do
que a fornecida pela simples relação entre a capacidade tecnológica da empresa e o modo de inovar. De facto a
inovação é sempre um fenómeno complexo, incerto e arriscado o que justifica que as empresas utilizem para o
abordar os meios mais convenientes às suas necessidades e não apenas aqueles para os quais se julgam natu-
ralmente adaptadas. O facto de uma empresa possuir um competente departamento de investigação, não quer
assim dizer que deva recorrer à investigação básica para resolver todos os problemas que se lhe deparam no
caminho. Por vezes pode ser mais prático recorrer a tecnologias já desenvolvidas (por organismos públicos por
exemplo, ou mesmo por empresas concorrentes) e construir a partir de dados já conhecidos, do que perder
tempo a investigar o que já foi investigado. No caso oposto, uma empresa «adormecida» não está
necessariamente limitada apenas a comprar tecnologia. Se desejar tomar uma atitude ofensiva, destacando-se
no seu sector por uma oferta tecnológica superior à da concorrência, pode optar por produzir e vender sob
licença um produto, processo ou serviço que seja inovador para a sua região ou no seu sector. Se tiver sucesso
na sua inovação, esta empresa poderá eventualmente passar mesmo a ocupar um lugar de liderança no seu
sector. Mas se quiser continuar nessa posição não poderá manter a sua atitude «adormecida». As suas novas
responsabilidades de líder obrigá-la-ão a assumir uma atitude tecnologicamente mais desperta de modo a poder
defender-se (e contra-atacar) dos assaltos da concorrência.
Este exemplo mostra claramente que a inovação não é um fenómeno estático. A sua adopção por uma
empresa terá como efeitos previsíveis causar, ou forçar, uma evolução na sua cultura tecnológica. Esta mesma
evolução pode ser conseguida igualmente sem inovação, à custa do investimento em recursos materiais e
principalmente humanos. Uma empresa tecnologicamente adormecida pode por exemplo passar para um
estado de vigília tecnológica pela simples contratação de um engenheiro dotado de hábitos regulares de leitura
de revistas técnicas. Oportunidades tecnológicas que até aí passavam despercebidas a esta empresa podem
assim começar a ser regularmente avaliadas. Mas, a menos que ao novo engenheiro sejam dados reais poderes
na gestão da empresa (o que é raro, e normalmente apenas acontece com as mudanças de gerações dirigentes
nas empresas familiares), dificilmente tal contratação será suficiente para que a empresa passe a aproveitar
essas oportunidades. Estando as decisões nas mãos da administração e continuando esta «adormecida», bem
lhe podem apresentar boas oportunidades tecnológicas que o mais provável é que elas continuem a ser
ignoradas.

120
Gestão e Organização de Empresas

Maiores possibilidades de ser bem sucedida tem a progressão tecnológica da empresa mercê de um
processo inovador por ela própria desencadeado. A tomada da decisão de inovar e a sua consequente
implementação na empresa devem contribuir para uma mudança sustentada na sua cultura tecnológica que lhe
permitirá passar de um modo definitivo para um escalão tecnológico superior e deste modo alargar os seus
horizontes de inovação. Sendo assim o «como inovar» deixa de ser uma simples variável de saída do «quem» e
do «porquê» para ir por sua vez condicionar estas duas variáveis. A progressão tecnológica ideal de uma
empresa será contudo a resultante da combinação das duas componentes de mudança acima descritas: as
mudanças culturais forçadas pela adopção de uma inovação e as provocadas pelo investimento em infra-
estruturas materiais e humanas.
A compra de uma nova tecnologia, por exemplo, terá como efeito provável o de fazer evoluir uma
empresa «adormecida» para um estado de maior atenção às novas tecnologias. Tal dever-se-á ao normal tra-
balho de pesquisa de mercado e comparação da oferta que precede qualquer investimento importante num
novo equipamento. Poder-se-á dizer que no fim desse trabalho de pesquisa, a empresa estará num estado
tecnológico «semidesperto». Mas se essa (semi) evolução não for acompanhada de um esforço em assegurar
de uma forma permanente o acesso a informação sobre novas tecnologias, a empresa voltará ao estado de
«adormecida» passado pouco tempo. O mesmo acontece com cada um dos outros estados tecnológicos como
se representa na figura seguinte.
É contudo importante referir que o sentido da progressão tecnológica das empresas, como resultado da
incorporação de inovações, pode nem sempre ser o ascendente. Tal como um processo de inovação bem
sucedido «empurra» uma empresa para cima na escala tecnológica, um processo de resultados infelizes pode
muito bem «puxá-la» para baixo. Um processo de inovação mal gerido (com resultados abaixo das expectativas
e custos bastante acima) deixa normalmente marcas indeléveis nas empresas, especialmente nas mais pequenas
e menos habituadas a lidar com processos semelhantes. O que implicará, mais do que uma estagnação
tecnológica, um provável retrocesso. Isto é, uma empresa desperta para a inovação pode, após um projecto
falhado, tornar-se na mais adormecida das empresas, a força de tão cedo não querer tornar a ouvir falar de
inovação ou novas tecnologias.

121
Gestão e Organização de Empresas

Antes de iniciar um processo de inovação uma empresa deve, deste modo, estar consciente dos riscos
do mesmo e dotar-se dos meios necessários para os enfrentar. No Capítulo III abordar-se-á a minimização do
risco da inovação, enquanto o Capítulo IV trata dos mecanismos presentemente colocados à disposição das
empresas para as ajudar na sua procura de novas tecnologias. Mas principalmente uma empresa deve ser
capaz de se relacionar de uma forma familiar com as várias maneiras de «fazer» tecnologia, como com as de as
«encomendar», «adaptar», «aprendê-las» ou «comprá-las» de forma a poder escolher a que mais lhe convêm
em cada momento. Com esse objectivo, o Capítulo II analisa um a um os diferentes modos de inovar,
fornecendo exemplos práticos de sucesso da sua aplicação.

CAPÍTULO II – INOVAR: DO FAZER AO COMPRAR


No capítulo anterior abordaram-se as diferentes formas de aceder à inovação, obtendo uma matriz possível dos
modos de inovar de acordo com as capacidades tecnológicas das empresas e com a sua atitude perante o
mercado.
Referiu-se também que, uma vez iniciado o processo inovador, este poderá afectar toda a cultura e
posicionamento da empresa, aumentando as suas capacidades tecnológicas e alterando a sua maneira de se
comportar nos mercados. Estas transformações por sua vez aumentarão as possibilidades da empresa de inovar
mais e melhor e motivarão novas evoluções no seu funcionamento e atitude.
A escolha do modo de aceder à inovação é assim um fenómeno em permanente evolução, onde
caminhos que antes pareciam vedados às empresas se podem abrir mais cedo do que o esperado, ou onde
soluções antes menosprezadas podem afinal revelar-se como as mais eficazes. Se não é credível pretender que
uma empresa sem pessoal técnico qualificado se decida de um dia para o outro a conduzir projectos de
investigação básica, ou esperar que um líder de um mercado competitivo abdique da pesquisa científica e
mantenha a sua posição só a comprar tecnologia, não é menos verdade que muitas boas oportunidades são
perdidas por falta de ponderação sobre todas as possibilidades existentes.
Não se devem mistificar as exigências e as dificuldades dos projectos de I&D destinados a «fazer»
novas tecnologias, como também não se devem menosprezar as possibilidades de evolução tecnológica abertas
por uma simples compra de um equipamento inovador. Ambos os processos, tal como todos os outros situados
entre estes dois extremos, apresentam vantagens e inconvenientes e cabe a cada empresa optar em cada
momento pelo modo de aceder à inovação que mais se ajusta às suas capacidades e que melhor satisfaz os
seus objectivos.
Se será melhor fazer ou comprar, encomendar, adaptar ou aprender, é algo que cabe às empresas
decidir. Mas será que estas estão suficientemente familiarizadas com estes processos de forma a tomarem a
decisão mais correcta?
O mais provável é que muitas delas se ponham a elas próprias perguntas do género de: «como posso
colaborar com os meus clientes na investigação de melhores soluções?», «a quem é que posso encomendar
novas tecnologias?» ou «existem apoios para a adaptação de inovações pela minha empresa?».
Nas páginas seguintes tenta dar-se respostas a perguntas como estas, analisando um por um os diferentes
modos de acesso à inovação e ilustrando-os com exemplos da sua aplicação com sucesso por parte de

122
Gestão e Organização de Empresas

empresas portuguesas.

O Fazer
«Fazer» tecnologia utilizando os seus próprios meios técnicos e humanos, percorrer uma a uma todas as fases
do processo inovador e no final ser a única detentora dos seus resultados, é sem dúvida a forma mais
prestigiosa e atraente de inovar que se apresenta às empresas. Apresenta decerto inúmeras vantagens, entre
as quais a menor não será certamente a possibilidade de a empresa se estar a colocar um passo à frente de
todos os seus competidores. Mas apresenta também dois inconvenientes de peso: a investigação é gulosa e
caprichosa. É gulosa porque é terrivelmente exigente em termos de recursos necessários e imprevisível em
termos de estimação de custos ou de duração previstos para um projecto. E é caprichosa uma vez que os seus
resultados são bastante incertos, com taxas de sucesso a rondar os 10% ou inferiores.
Pode assim muito bem acontecer que uma empresa portuguesa que pensa gastar 10 000 contos
durante um ano e meio para desenvolver internamente um novo sistema automático para afinação e mistura de
componentes de fabrico de lápis, chegue ao fim de três anos tendo gasto 20 000 contos para desenvolver um
sistema com capacidade para fabricar apenas metade dos lápis previstos. Ou pior ainda, que não tenha
chegado a nenhum resultado.
E não se pense que falhanços destes apenas acontecem a pequenas ou médias empresas (PME). Os
gigantes japoneses da electrónica de consumo andaram durante mais de vinte anos a desenvolver aplicações
de televisão de alta definição analógica, gastando milhões de ienes no processo, até descobrirem finalmente
que o futuro da televisão estava no digital e que era preciso recomeçar tudo outra vez.
Tudo isto para dizer que o caminho da inovação, quando percorrido desde a investigação básica até à
comercialização final dos seus resultados, é longo, tortuoso e carregado de riscos. O que não quer dizer que
não valha a pena iniciá-lo. Uma vez concluído com sucesso a recompensa poderá ser de modo a fazer esquecer
as agruras do caminho.
O caminho da investigação básica é tão rico em ensinamentos e tão recheado de atalhos, que mesmo
que os resultados não sejam os esperados o balanço final pode ser bastante positivo. Não é impossível que
uma empresa que investiga à procura da solução para o problema "A" termine por encontrar a solução para o
problema ‗B‘, onde se calhar ‗B‘ é mais importante que ‗A‘. Afinal a penicilina foi descoberta dessa forma.
E, como se viu no capítulo anterior, se uma empresa inserida num sector de actividade competitivo deseja
assumir uma atitude ofensiva (procurar o que os outros não têm) então a investigação torna-se uma necessidade
e não uma opção. É o caso das empresas inseridas em mercados tão dinâmicos como os dos computadores
pessoais ou da electrónica de consumo, onde as novidades se sucedem sem descanso e onde as empresas
aparecem e desaparecem num abrir e fechar de olhos. Se uma empresa se encontra num segmento de mercado
menos dinâmico, mas visa melhorar a sua posição ultrapassando em cota de mercado empresas com tantos
ou mais recursos que ela própria, a investigação surge igualmente como a solução mais óbvia. Nestes casos
em que a investigação surge como um imperativo, a dimensão da empresa não é um óbice ao processo.
Mercados extremamente dinâmicos como o da produção de software são caracterizados pela existência

123
Gestão e Organização de Empresas

de inúmeras empresas de reduzido tamanho e forte capacidade de investigação. O que é importante é que a
empresa dimensione o projecto de investigação de acordo com a sua própria dimensão. Os milhões de ienes
perdidos pela Sony a investigar a tecnologia errada para a televisão do futuro podem não ter tido reflexos de
relevo na estratégia da empresa, mas os 10 000 contos a mais gastos pela fábrica de lápis podem muito bem
levá-la ao fundo. Tal como uma micro-empresa de três engenheiros pode correr o risco de ter um deles um ano
cometido a 100% a um projecto de desenvolvimento de um software revolucionário (a custo de uma sobrecarga
de trabalho corrente sobre os outros dois), mas dificilmente poderá aguentar mais do que um mês com dois
dos engenheiros a trabalhar no projecto. Ao contrário, um grande grupo industrial pode sempre aumentar
as suas equipas de investigação se necessário sem que a sua laboração se ressinta disso.
Um importante trabalho de cálculo e redução do risco impõe-se portanto, antes da decisão final de
embarque num projecto de I&D, de modo a não empenhar a sobrevivência da empresa a algo de tão incerto
como os resultados de uma investigação básica. Se o risco tiver sido correctamente analisado (dentro das
limitações naturais que projectos deste tipo impõem), e principalmente minimizado na sua máxima possível
extensão, então, mesmo que o projecto não forneça resultados assinaláveis, dificilmente a empresa o poderá
encarar como um falhanço total, uma vez que a sua capacidade tecnológica terá progredido e as hipóteses de
sucesso numa nova tentativa serão maiores.
No Capítulo III abordar-se-á a questão da minimização do risco inerente à inovação, particularmente
importante no caso da investigação tecnológica. Mas antes é importante focar as diversas facetas dos projectos
de I&D e o seu interesse para as empresas.
Normalmente, quando se pensa em empresas investigadoras, a primeira imagem que vem à cabeça é a
de grandes grupos industriais desenvolvendo as suas ideias no maior segredo em laboratórios recheados de
pessoas de bata branca. Este modelo aproxima-se bastante da realidade em casos como o da indústria
farmacêutica. Um mercado caracterizado por uma concorrência feroz, onde a progressão tecnológica é constante
e onde a mínima vantagem sobre os concorrentes pode valer uma progressão espectacular em termos de
cota de mercado (ou não estivesse em jogo a saúde de todos nós).
As características deste mercado são de modo a que todas as importantes indústrias farmacêuticas
(incluindo as nacionais, como a Bial ou a Atral-Cipan) disponham de estruturas de I&D permanentes e em cons-
tante actividade e que uma grande parte dos seus projectos seja desempenhado em «stand-alone», ou seja,
sem a colaboração de nenhuma outra firma. O que em termos gráficos, e socorrendo-nos do modelo linear (por
uma questão de simplicidade, embora muitas das inovações do campo farmacêutico, como doutros sectores
«investigadores», possam ser representadas por modelos não lineares) pode ser representado da forma
seguinte:

124
Gestão e Organização de Empresas

Tal tipo de investigação exige obviamente grandes recursos por parte das empresas. Conhecendo-se a
reduzida taxa de sucesso da investigação tecnológica (em termos de projectos iniciados versus resultados colo-
cados no mercado) uma empresa que queira apresentar um produto novo todos os anos deverá ter algo como
várias dezenas de projectos de investigação básica a decorrer de forma simultânea. O que exige grandes meios
técnicos e humanos fora do alcance da maioria das PME e mesmo de muitos grupos industriais importantes.
A investigação básica é tão cara e tão arriscada que mesmo muitas das empresas citadas no nosso
exemplo – indústrias farmacêuticas – têm que pôr por vezes de lado o seu desejo de secretismo e cooperar
com outras empresas em grandes projectos, demasiado importantes, ou urgentes, para uma só empresa. É o
caso presente da luta contra a SIDA, travada conjuntamente pelos mais importantes laboratórios farmacêuticos
mundiais.
A este tipo de cooperação em I&D dá-se normalmente a designação de cooperação horizontal. Duas ou
mais empresas do mesmo ramo compartilham os custos e os riscos da investigação básica, após o que cada
uma procede ao desenvolvimento dos eventuais resultados. Isto virá a dar origem ao surgimento no mercado
de produtos que compartilham a mesma base científica mas apresentam características diferentes de acordo
com a empresa que os desenvolveu. O modelo linear da inovação aplicado a um consórcio horizontal encontra-
se na figura seguinte:

O estabelecimento de consórcios horizontais entre várias PME, ou entre uma ou mais PME e empresas
de maior porte, é uma primeira abordagem realista da possibilidade de «fazer» inovação por parte das
pequenas e médias empresas, desde que dotadas de estruturas de I&D. O que é muito arriscado para uma só
pequena empresa pode tornar-se abordável a um grupo equilibrado delas. Principalmente se for possível dispor
de ajudas públicas.

Exemplos de sucesso: Servotrol


Casos de participação em projectos de investigação por parte de empresas como a Servotrol contribuem para a
desmistificação dos programas de I&D como uma reserva exclusiva dos grandes grupos industriais.
Sendo uma pequena empresa baseada quase exclusivamente nas competências técnicas do seu director e
principal quadro técnico, operando na área dos sistemas de comando automático, a Servotrol foi o principal motor de
um projecto apoiado pelo programa europeu Esprit – o programa europeu de investigação na área das tecnologias de
informação, e um dos mais importantes programas de I&D europeus.
O projecto, desenvolvido por um consórcio europeu onde para além da Servotrol pontificavam uma fábrica de
vidros portuguesa (como potencial utilizador) e indústrias e organismos de investigação portugueses, ingleses,
espanhóis e alemães, visou o desenvolvimento de um sistema multi-sensor inteligente para fornos e caldeiras destinado
a controlar a viscosidade do vidro no estado líquido. Partindo das ideias da Servotrol, no final recompensada com os
direitos de comercialização da tecnologia, o projecto foi conduzido a bom termo, com o desenvolvimento de um sensor
inovador, sem concorrência, no mercado, e com um potencial de utilização considerável na indústria vidreira.

125
Gestão e Organização de Empresas

E neste campo a investigação em consórcios horizontais é uma das modalidades mais apoiadas pelos
poderes públicos, que dispõem neste tipo de projectos de uma maior margem de manobra para conceder sub-
sídios às empresas, uma vez que os resultados vão beneficiar um conjunto de empresas ou um sector, e não
uma única organização.
Os programas de I&D apoiados pela Comissão Europeia são na sua maioria deste tipo, com a
obrigatoriedade de o consórcio incluir pelo menos empresas de dois países diferentes. Estes projectos
transnacionais de cooperação horizontal podem ser bastante interessantes para as empresas, que compartilham
mais depressa os seus segredos com uma organização estrangeira (potencialmente com mercados-alvo
diferentes) do que com uma empresa concorrente do mesmo país.
Uma terceira possibilidade de empreender projectos de I&D, talvez a mais interessante para as PME, é
a associação em consórcios verticais entre uma grande empresa, realizadora de investigação pré-competitiva, e
os seus fornecedores. Nestes consórcios, a grande empresa, uma vez na posse dos primeiros resultados da sua
investigação (ou na necessidade de criar os meios para os obter) transfere competências e conhecimentos para
os seus fornecedores para que estes desenvolvam processos ou produtos compatíveis com a sua nova
tecnologia.
Esta é uma modalidade extremamente interessante para as pequenas empresas, porque lhes permite
simultaneamente fidelizar um cliente e manter-se a par da evolução tecnológica, aumentando e modernizando
as suas competências, processos ou produtos. Por outro lado apresenta também vantagens para as grandes
empresas, permitindo-lhes repartir parte dos custos da sua investigação e integrar os seus fornecedores no
novo processo desde o seu início.
A representação gráfica da investigação em consórcios verticais encontra-se na Figura 9:

Uma grande vantagem deste tipo de colaboração vertical é o de ser um passo no sentido de resolver
um dos principais entraves que se colocam ao sucesso das inovações tecnológicas: a falta de tecnologias com-
plementares que permitam um melhor aproveitamento da nova tecnologia. Um estudo americano2 revelava que
este era mesmo o factor mais importante no retardar do aparecimento de novas tecnologias no mercado. Esta
2
J. Langrish et al., Wealth from Knowledge. A Study of Innovation in Industry (New York, NY Haslted/John Wiley, 1972). Factores de maior relevância
no retardar da introdução de novas tecnologias no mercado: 32.5% – insuficiente desenvolvimento de uma tecnologia complementar; 22.5% – falta de
mercado; 7.6% – falta de visão empresarial para inovar.

126
Gestão e Organização de Empresas

dificuldade era particularmente notória nas inovações menos abruptas, simples evoluções de tecnologias já
existentes, enquanto no caso de inovações maiores, ou revoluções, a falta de mercado ganhava tanta importância
como a falta de tecnologias complementares. A cooperação em I&D entre grandes empresas e os seus
fornecedores pode permitir resolver ou minorar este problema através do desenvolvimento paralelo de uma
tecnologia principal e das tecnologias que a irão permitir explorar. Empresas como a Bosch na Alemanha têm
desenvolvido e estimulado este sistema através de uma colaboração estreita com os seus fornecedores da região
de Baden-Wurttenberg, sob os bons auspícios do governo regional (um dos mais activos na Alemanha no apoio
à inovação tecnológica). Em Portugal a constituição de clubes de fornecedores de grandes empresas (como
aconteceu recentemente com os fornecedores da Auto-Europa) pode, se devidamente apoiada e incenti- vada
pela empresa compradora e pelas estruturas tecnológicas nacionais, ser um trampolim para um aumento deste
tipo de cooperação tecnológica.
A investigação em consórcios verticais ou horizontais é sempre uma boa solução para que empresas
dotadas de um bom potencial tecnológico mas recursos limitados, possam desenvolver de raiz as suas próprias
inovações. O que não quer dizer que seja uma modalidade acessível. O número de organizações capazes de
«fazer» as suas próprias inovações, mesmo em consórcio, é reduzido, e para uma empresa poder integrar este
«clube exclusivo» é importante que consiga reunir as seguintes condições:
• Poder cometer pessoal a 100% ao projecto de investigação. Uma condição que afasta logo um
importante número de empresas, especialmente PME, onde os recursos humanos não abundam.
• Entre clientes, fornecedores e parceiros estratégicos, contar com empresas investigadoras entre as suas
relações.
• Possuir necessidades tecnológicas a longo prazo. A investigação demora tempo e não é seguramente
uma solução para problemas que exigem uma solução imediata.
• Estar familiarizado com os programas públicos de apoio à investigação, ou saber a quem recorrer para
obter os conhecimentos que lhe faltem nesta área. Uma condição essencial para obter os
financiamentos públicos que podem aliviar a empresa de parte dos custos do projecto.
Se uma empresa não reunir pelo menos três das quatro condições expostas acima, então deve interrogar-
se seriamente sobre as suas eventuais vantagens em «fazer» investigação, comparativamente com as das
outras formas de aceder a inovações. Para que um consórcio de investigação seja bem sucedido, é de facto
importante que as empresas nele participantes detenham uma cultura «investigadora», e que possam trazer
valor acrescentado ao projecto em curso. Se essa cultura não existir, e o interesse da empresa for
unicamente o de dispor dos resultados da maneira mais conveniente possível, então o melhor é mesmo chamar
os especialistas. Ou seja, encomendar o trabalho de investigação a quem o faz por vocação.

O Encomendar
Se as ideias de potenciais inovações fervilham numa empresa mas esta não dispõe do equipamento, das
pessoas, da cultura científica ou da vontade necessárias para empreender um processo de investigação, então
só tem a ganhar em associar-se com quem o faça por ela. Como por exemplo uma universidade, ou um centro
de investigação.

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Gestão e Organização de Empresas

Este é um dos tipos de colaboração científica mais divulgados e promovidos entre as PME. Pela sua proximidade
dos mercados uma empresa inovadora está em óptima posição para identificar tecnologias em falta no seu
sector. Tecnologias que lhe permitiriam, por exemplo, facilitar a produção, melhorar a distribuição de produtos,
ou aumentar a eficiência e o desempenho destes, melhorando a sua aceitação por parte dos consumidores.
Outras empresas deparam no seu dia a dia com problemas que não conseguem solucionar só com as
tecnologias existentes e que requerem novos conceitos técnicos. As empresas com um maior espírito inovador
conseguirão, quando confrontadas com uma destas necessidades tecnológicas, definir com precisão as condições
de entrada (os dados do problema) e de saída (o que a tecnologia deve oferecer) da inovação em falta. Resta-
lhes encontrar quem lhes forneça uma base científica que faça funcionar a «caixa preta» capaz de lhe solucionar
os problemas.

Tome-se por exemplo o caso do sector de pedras decorativas, sector no qual as empresas portuguesas
são responsáveis por um quarto da produção europeia. Uma empresa mais inovadora poderá reparar numa
procura acentuada para pedras de formatos mais sofisticados, e identificar a necessidade de um sistema de
corte mais eficiente do que os sistemas mecânicos tradicionais, de modo a permitir obter as pedras desejadas.
Uma empresa mais capaz tecnologicamente poderá mesmo definir os níveis de produtividade e de precisão
necessários para um tal sistema, e até sugerir possíveis soluções, nomeadamente o laser ou o jacto de água.
Mas seguramente que não poderá conceber ela própria o sistema, pois não domina tais tecnologias. Mas
organizações como o Instituto Nacional de Engenharia e Tecnologia Industrial (INETI) ou o Instituto de
Soldadura e Qualidade (ISQ) dominam-nas e têm como principal actividade a condução de projectos de
investigação nesta e noutras áreas.
A associação entre uma empresa, ou um grupo de empresas, de um dado sector e um ou mais
organismos de investigação aparece assim como uma solução vantajosa tanto para as empresas (que beneficiam
dos resultados) como para as instituições de I&D (que desempenham a função para a qual foram concebidas).
A aplicação do modelo linear a este tipo de projectos de I&D terá a forma representada na figura seguinte:

128
Gestão e Organização de Empresas

Exemplos de sucesso: Mecanova


A inovação através da cooperação entre instituições de I&D e empresas, em que as primeiras
fornecem os meios e as segundas os objectivos, é uma das soluções interessantes para as PME sem
capacidade de investigação própria, mas com uma ideia clara quanto às suas necessidades tecnológicas. É
também uma das modalidades mais apoiadas no nosso país, o que é normal atendendo à concentração dos
meios de I&D nas universidades e outros organismos públicos.
A Mecanova foi uma das empresas portuguesas que soube aproveitar as potencialidades desta
forma de inovação. Esta firma foi criada por um grupo de engenheiros, na sua maioria provenientes da
firma Mecânica Exacta, que viram uma oportunidade de mercado no desenvolvimento de uma máquina de
fabrico de rolhas de cortiça «inteligente», capaz de observar a cortiça e decidir o melhor ângulo de
brocagem de modo a melhorar a produtividade do processo.
Com uma excelente visão tecnológica mas sem os conhecimentos de tecnologias de informação
que lhes permitissem o desenvolvimento integral da máquina, os criadores da Mecanova souberam procurar
ajuda qualificada e encontrá-la no INETI levando ao surgimento de um projecto comum onde o INETI se
encarregou da pesquisa básica no campo optoelectrónico e a Mecanova da sua aplicação prática numa
máquina «comercializável», disponível no mercado desde 1995.

Se este sistema permite a uma empresa, ou a um grupo de empresas, libertar-se da componente mais
onerosa do processo, as fases seguintes, nomeadamente a de desenvolvimento, não deixam por isso de lhes
exigir uma forte capacidade tecnológica.
A investigação cooperativa não deve assim ser encarada como uma poção mágica, capaz de transformar
empresas adormecidas tecnologicamente em empresas inovadoras da noite para o dia. Deverá antes ser
entendida como uma forma de administração inteligente de recursos por parte de empresas dotadas de fortes
conhecimentos técnicos na sua área de actuação.
O sucesso de este tipo de projectos assenta fortemente na capacidade de as empresas neles envolvidas
definirem correctamente as variáveis da tecnologia que necessitam. Mas igualmente em serem capazes de
transformar os resultados científicos, que lhes são fornecidos pelos institutos de investigação, em aplicações
práticas suficientemente desenvolvidas e testadas, e passíveis de serem produzidas e comercializadas a preços
atraentes.
Dependendo das estruturas que os organismos de investigação disponham para suportar a venda das
suas capacidades científicas, o auxílio por estes prestado às empresas pode ultrapassar a simples fase científica
e estender-se a fases mais a jusante do processo inovador. Como por exemplo ao desenho de protótipos do
produto final, ao teste e validação das aplicações ou mesmo à realização de estudos de mercado e de
viabilidade da tecnologia. Ou então a colaboração pode versar fases a montante da investigação científica como
a identificação das necessidades tecnológicas das empresas. Evidentemente, quanto mais completa for a
colaboração do organismo de investigação, menor terá que ser a participação tecnológica da empresa e mais

129
Gestão e Organização de Empresas

acessível será este tipo de cooperação científica a empresas de menores conhecimentos técnicos (e maior será
o número de PME a quem os organismos de I&D podem vender os seus serviços de investigação). Mas é
importante não esquecer que sendo a empresa a usuária e a proprietária do resultado final, é a ela que lhe
cabe a definição do produto e a sua afinação tendo em vista o mercado em que se insere. Quanto menor for a
participação da empresa no processo inovador, menor será o seu domínio da tecnologia desenvolvida e por
conseguinte menores serão as possibilidades de que o produto esteja suficientemente amadurecido e adaptado
ao mercado quando do seu lançamento.
Para dar um exemplo concreto, uma instituição de pesquisa científica do campo biotecnológico pode
desenvolver para uma pequena empresa de cosméticos uma nova pasta de dentes com excelentes
propriedades anticárie mas dotada de um sabor tão intragável que ninguém é capaz de a usar. Se a empresa se
limitar a recolher a receita de preparação desenvolvida pelos cientistas, produzi-la em grande escala e embalá-
la em bisnagas, guiada por uma fé cega nos resultados científicos, está condenada a um fracasso certo. Cabe à
empresa testar em condições de mercado os resultados científicos e desenvolvê-los nas direcções indicadas por
tais testes, mesmo que para isso se tenham que sacrificar algumas das suas propriedades.
Em Portugal, de qualquer forma, o papel das empresas nos projectos cooperativos está destinado a ser
importante pois são ainda poucas as instituições de I&D que fazem acompanhar os seus serviços científicos por
serviços de validação, consultadoria ou informação de apoio à inovação. Organizações como o INESC ou o ISQ
têm dado alguns passos nesse sentido, mas a inter-relação entre os diferentes serviços oferecidos é ainda
fraca, tal como o é o conhecimento e o interesse das empresas por estes serviços «paralelos», portanto de uma
importância primordial na obtenção de resultados. Voltar-se-á a esta questão no Capítulo V, quando se abordar
os sistemas de inovação no nosso país.
Pese embora a carência de serviços complementares ao trabalho de I&D, o «encomendar» uma
inovação continua a ser uma excelente solução, principalmente para empresas possuidoras de um espírito
inovador, mas com carências científicas numa dada área. É verdade que o risco e o investimento necessários a
este tipo de projectos são ainda importantes, uma vez que estes implicam uma aposta numa tecnologia ainda
não existente. No fundo é de «fazer» tecnologia que se continua a tratar, embora agora quem «faça» e quem a
«utilize» sejam entidades distintas.
Resta dizer, como compensação, que os projectos de I&D cooperativa são dos mais apoiados pelos
poderes públicos, quer por via indirecta através do financiamento das instituições de I&D (reduzindo assim os
custos de utilização destas para as empresas), quer por via directa, através da participação nos custos totais de
projectos deste tipo. O que ajuda fortemente a torná-los atractivos para as empresas.
E que empresas estão aptas a participar em projectos deste tipo? Um leque bem mais vasto do que as capazes
de «fazer» inovações, mas constituído principalmente por empresas que apresentem o seguinte perfil:
• Possuam necessidades tecnológicas a médio/longo prazo. Como se referiu anteriormente a
investigação, seja em consórcios horizontais verticais ou cooperativos, não é solução para problemas
urgentes.
• Dispondo de pessoal com capacidade para acompanhar os projectos de investigação e liderar o seu
desenvolvimento.

130
Gestão e Organização de Empresas

• Com uma sólida relação estabelecida com as estruturas tecnológicas da sua região, nomeadamente
com as universidades.
• Familiarizadas com os programas públicos de apoio a esta forma de inovação, ou que saibam a quem
recorrer para preparar as propostas a estes programas.
As empresas que reúnam as condições acima são sem dúvida aquelas que melhores resultados podem
retirar dos projectos de investigação cooperativa. Ao contrário, para uma empresa com necessidades tecno-
lógicas a curto/médio prazo, podem ser mais vantajosas outras formas de aceder à inovação. Como por
exemplo a adaptação de tecnologias.

O Adaptar
«Fazer» ou «encomendar» novas tecnologias são duas formas de aceder a inovações, distintas na forma e nos
recursos exigidos, mas similares na atitude requerida e no risco envolvido. Ambos são processos complexos que
para serem levados a bom termo exigem das empresas uma cultura orientada para a inovação e uma atitude
claramente ofensiva perante os mercados.
Mas como se viu anteriormente a necessidade de inovar não se limita a este tipo de empresas. A
inovação pode surgir como a resposta a um problema prático do dia-a-dia, seja ele a necessidade de diminuir
os custos de produção ou de melhorar as características de um produto para satisfazer um cliente importante.
Problemas cujo carácter urgente não se compadece com o ritmo de um projecto de investigação ou cuja solu-
ção não será suficientemente compensadora para que se corram os riscos que os projectos de I&D sempre
acarretam mas que por outro lado são problemas para os quais não existe uma solução «chave-na-mão» no
mercado.
A solução para estes casos poderá estar na adaptação às necessidades da empresa de resultados de
projectos de investigação conduzidos por outros. Esta é uma solução mais rápida, mais barata e menos arris-
cada do que desenvolver uma nova tecnologia de raiz. A adaptação de novas tecnologias poderá até nem ser
motivada pela necessidade de resolver um problema particular, mas ser antes provocada pela constatação de
como uma inovação concebida para um determinado fim poderia, com algumas modificações, ser adaptada
igualmente a outros objectivos. Ou seja, empurrão tecnológico e puxão de mercado, podem igualmente motivar
a adaptação de resultados de investigação pelas empresas.
O que torna a possibilidade da adaptação de tecnologias tão interessante é fundamentalmente a
profileração de matéria-prima. Neste preciso momento milhares de organizações em todo o mundo estão a
trabalhar em projectos de I&D com vista à obtenção de determinados resultados. Muitas delas são organizações
públicas que mesmo que cheguem a resultados interessantes não dispõem da capacidade de os comercializar.
Outras são organizações privadas que vão atingir resultados diferentes dos que esperavam e desadaptados às
suas necessidades e que por isso vão abandonar os projectos sem os desenvolver. Outras ainda são organizações
que uma vez atingidos os seus objectivos técnicos, esperam alcançar o máximo retorno do investimento
realizado e por isso se dispõem a transferir os resultados alcançados para empresas não concorrentes.
Como consequência de tudo isto existem milhares de descobertas tecnológicas, fruto de grandes

131
Gestão e Organização de Empresas

investimentos, que se encontram totalmente ou parcialmente desaproveitadas. E que podem ser aplicadas em
fins diferentes daqueles para as quais foram concebidas, com proveito tanto de quem aplica como de quem
detém os direitos por um processo de transferência de tecnologia que pode ser representado de acordo com o
modelo seguinte:

Esta forma de aceder à inovação permite às empresas inovadoras rentabilizarem os seus resultados
tecnológicos e às adaptadoras superarem as suas carências e investir em produtos, processos ou serviços já
desenvolvidos e eventualmente com provas dadas. Por vezes com um sucesso estrondoso. Veja-se o exemplo
da Microsoft: o famosíssimo MS-DOS, na base do seu enorme sucesso como empresa, teve origem na
adaptação de um sistema operativo desenvolvido inicialmente por uma outra empresa.
A diminuição do risco que resulta deste processo de transferência de tecnologia, permite que mesmo
empresas sem nenhum perfil tecnológico possam aceder a inovações, desde que saibam criar as condições
necessárias à sua adaptação e implementação, por exemplo através do recurso a ajudas externas.
O dono de uma mercearia de bairro, por exemplo, sente diariamente a perda de clientes para as
grandes superfícies e pressente que algo de inovador tem que ser feito para prender os seus clientes, mas
provavelmente não lhe passa pela cabeça que essa inovação possa ter uma base tecnológica. Mas porque não?
Um sistema baseado em computadores pessoais, equipados de aparelhos de leitura óptica, poderia, a um custo
unitário bastante baixo, substituir as velhas máquinas registadoras com enormes ganhos em termos de
eficiência, tempo e, principalmente, de capacidade de gestão de stocks.
O desenvolvimento de um tal equipamento por uma associação nacional ou regional de pequenos
comerciantes permitiria dotar todos os seus membros do respectivo hardware e software a um preço acessível.
Tal prática já é utilizada com sucesso pela associação de farmácias de Portugal, mas apesar da aparente
simplicidade da transferência do sistema para os pequenos minimercados e da crise que estes atravessam,
motivada por uma concorrência agressiva que por enquanto as farmácias não têm que enfrentar, esta ainda
não se realizou.

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Gestão e Organização de Empresas

Exemplos de sucesso: Tecnotron


A Tecnotron Sistemas de Automação S.A. é uma pequena empresa com cerca de 30 pessoas, fundada em
1991, e com uma atenção aos programas europeus de Investigação e Desenvolvimento Tecnológico superior à média.
Sendo assim, a Tecnotron soube aproveitar as oportunidades abertas pelo programa europeu «VALUE» (com o
objectivo de promover a exploração de resultados de projectos europeus de I&D) para adquirir os direitos de
exploração e comercialização para Portugal de uma tecnologia de controle integrado de facilidades de produção,
adaptada a diferentes sectores, e desenvolvida por um consórcio integrado pelo INESC no âmbito de um projecto
ESPRIT (programa europeu de I&D na área das tecnologias de informação).
Sem capacidades de investigação próprias para desenvolver um produto semelhante, mas com recursos
técnicos para o seu desenvolvimento e «customização» a Tecnotron conseguiu, apostando na valorização de um
resultado ainda não testado de um projecto de I&D, obter um produto competitivo e perfeitamente integrado na sua
estratégia empresarial em condições muito mais competitivas do que se, por exemplo, se candidatasse à representação
para Portugal de um produto comprovado.
Tal estratégia permitiu-lhe ainda desenvolver as suas potencialidades tecnológicas duma forma que a simples
venda de uma tecnologia não lhe permitiria.
A tecnologia da Tecnotron encontra-se implementada em fabricantes nacionais de componentes para a
indústria automóvel desde 1993.

A ligação do computador de cada comerciante a um organismo central que recebesse a informação de


stocks disponíveis de todos os associados de uma forma automática, permitiria ainda como vantagem adicional
a constituição de centrais de compras de média dimensão o que permitiria o acesso dos comerciantes às
mercadorias a preços mais baixos, com o consequente aumento de competitividade. No fundo, a reprodução a
uma escala associativa dos avançados sistemas de informação electrónica já utilizados pela maioria das grandes
superfícies.
Se parece óbvio que o preço final de venda de qualquer um destes sistemas não seria de molde a
afastar nem a mais pequena das mercearias, atendendo aos baixos preços actualmente praticados para
equipamentos informáticos, já os custos de desenvolvimento seriam incomportáveis para o dono de uma
pequena loja de bairro, cujos únicos recursos humanos disponíveis são os seus familiares chegados. Mas
decerto que o dono desta pequena loja estaria disposto a contribuir moderadamente para os esforços de
investigação aplicada de uma associação sectorial, que (utilizando os seus próprios meios ou procurando
competências externas) poderia aplicar as contribuições dos seus associados num projecto de inovação de
benefícios para todos, e candidatar-se ainda a um financiamento nacional ou comunitário de pelo menos 50%
dos custos totais do projecto.
Se um exemplo como o acima descrito parece perfeitamente viável, não deve deixar de ser dito que
quem mais pode ganhar com a adaptação de novas tecnologias não são as empresas «adormecidas
tecnologicamente» mas sim aquelas que se encontram em rápida ascensão tecnológica. Tipicamente, empresas
de constituição recente, dotadas de pessoal capaz e atento aos fenómenos da inovação, mas ainda sem as
possibilidades de conduzirem os seus próprios projectos de investigação.
Para estas empresas a «adaptação» é um meio de rapidamente se afirmarem como empresas de alta
tecnologia e de iniciarem uma escalada que mais cedo ou mais tarde as levará ao clube das «investigadoras».
Outro grupo tipicamente utilizador da adaptação como forma de acesso à inovação é o constituído pelas
«spin-off» das universidades, empresas propositadamente criadas para adaptar, desenvolver e comercializar os
resultados mais interessantes dos projectos de I&D conduzidos pelas universidades.
E mesmo empresas com um perfil nitidamente investigador podem chegar por vezes à conclusão de
133
Gestão e Organização de Empresas

que lhes é mais compensador adaptar resultados da investigação de outros do que perder tempo a tentar des-
cobrir o que já foi descoberto e patenteado.
A adaptação de tecnologias é particularmente vantajosa para empresas com necessidades tecnológicas
a médio prazo, que disponham de uma prática regular de vigília tecnológica e que estejam habituadas a
recorrera ajudas externas, nomeadamente na área da mediação tecnológica. É ainda importante que disponham
no seu seio das competências técnicas capazes de desenvolver a tecnologia no sentido que interessa à
empresa. Ou seja, nada que esteja completamente fora do alcance de uma grande número de firmas. Mas
se estas exigências ainda parecerem exageradas, é sempre possível inovar «aprendendo», como se vai ver a
seguir.

O Aprender
Ao abordar a adaptação de tecnologias na secção anterior, após se ter descrito anteriormente a realização e a
encomenda de novas tecnologias, concluiu-se a descrição dos modos de inovação mais complexos. Qualquer
uma destas formas de aceder à inovação conduzirá ao aparecimento de novos produtos, processos ou serviços,
que tanto podem ser radicalmente novos como pequenos melhoramentos de técnicas já existentes. A intro-
dução destas inovações, quando bem aceites pelos mercados, trará benefícios directos às empresas que as
originaram, colocando-as em vantagem sobre as outras empresas do mesmo sector. Às restantes empresas,
assim colocadas em desvantagem, restam apenas duas formas de reagir. Ou iniciam também elas um processo
inovador semelhante, na esperança de que este as conduza a resultados iguais ou se possível ainda superiores,
ou optam por se aliar aos seus concorrentes aprendendo com eles os segredos das novas tecnologias, pagando
por isso o preço justo.
Uma empresa que opte por esta segunda solução pode adquirir desta forma o conhecimento ou o
saber-fazer de uma nova tecnologia, após o que passa a poder produzi-la e comercializá-la ela própria, com a
sua própria marca. Uma possibilidade que pode apresentar vantagens para ambas as partes envolvidas.
Para a detentora da inovação poderá ser uma forma de rentabilizar o investimento efectuado no seu
desenvolvimento. Mas ao fazê-lo necessita de assegurar-se de que ao transferir os seus conhecimentos tecno-
lógicos não está a favorecer um concorrente directo. É assim normal que, como condições do negócio, imponha
como limitação o uso da tecnologia transferida apenas em certos mercados que, ou não lhe interessam
especialmente (por falta de rede comercial, por especificidades próprias) ou lhe estão vedados (por
regulamentos políticos, por exemplo). É também possível que imponha limitações à outra parte no seu domínio
sobre a tecnologia, através, por exemplo, da proibição de lhe introduzir alterações.
Para a empresa mais atrasada tecnicamente, o licenciamento é uma forma rápida e segura de dar um
pulo tecnológico. Mas pelo seu lado necessita assegurar-se de que as condições impostas pela outra parte não
são demasiado limitativas em termos comerciais e especialmente em termos de domínio sobre a tecnologia. O
«aprender» dos segredos de uma nova tecnologia deve assim ser encarado por uma empresa não apenas como
uma possibilidade de alargar a sua oferta de produtos, processos ou serviços, mas como uma forma de
enriquecer a sua cultura tecnológica. Como o início de um processo que idealmente a colocará num outro
patamar de conhecimentos técnicos e lhe permitirá no futuro desenvolver as suas próprias tecnologias liberta

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Gestão e Organização de Empresas

de quaisquer condições impostas por outrem. Um processo que se pode representar na figura seguinte:

Este processo de transferência de tecnologia é muitas vezes utilizado por grandes empresas, de perfil
investigador, para penetrar em mercados fechados, onde os concursos públicos impõem uma quota mínima de
incorporação nacional. Para contornar as limitações políticas, transferem tecnologia para empresas locais.

Exemplos de sucesso: EFACEC Sistemas de Electrónica, S.A.


Em 1988 a firma inglesa de equipamentos de automação para redes de energia Westinghouse ganhou o
concurso para automação do despacho nacional de energia da EDP, e de acordo com os regulamentos do mesmo, viu-
se forçada a encontrar um parceiro português, que assegurasse uma forte incorporação nacional no projecto. A escolha
recaiu na EFACEC, na altura com um nome feito em sistemas de energia e transformadores, mas sem experiência
relevante na área da automação. A incorporação da tecnologia Westinghouse deu origem a uma divisão autónoma
dentro do grupo, e a partir de 1991 a uma companhia: a EFACEC Sistemas de Electrónica, S.A..
Com os sistemas licenciados pela Westinghouse, a EFACEC arrebatou a maior parte dos projectos de
automação da EDP a partir de 1989. Em 1993, quando terminou a limitação de exportação de sistemas imposta pelo
acordo de licenciamento, os conhecimentos ganhos pelos seus engenheiros já lhe tinham permitido desenvolver um
novo sistema de comando e evoluir as unidades remotas de base Westinghouse, tomando a empresa competitiva em
concursos internacionais, contra empresas da dimensão da Siemens ou ABB.
Em 1996 a EFACEC Sistemas de Electrónica é uma das principais empresas do grupo EFACEC e um dos
maiores investidores nacionais privados em I&D.

Algo de semelhante ao que se passa presentemente no nosso país com a possível transferência da
tecnologia de fabrico de comboios pendulares da Fiat Ferroviária (vencedora do concurso para o fornecimento
do novo equipamento para a linha do norte) para a Sorefame, com vista a aumentar a integração nacional no
projecto, ou ao passado nos anos oitenta entre a Westinghouse inglesa e o grupo EFACEC, com a transferência
da tecnologia de equipamento de automação de redes de energia, num processo que é descrito em caixa
separada.
Em casos como estes cabe à empresa «importadora» da tecnologia saber aproveitá-la em função dos
seus próprios interesses, e não só em função dos da empresa «exportadora».
O caso da EFACEC é exemplar por resultar numa evolução tecnológica desta empresa graças à incorporação da
tecnologia da Westinghouse.

135
Gestão e Organização de Empresas

Uma evolução amadurecida no mercado nacional, a que a EFACEC estava limitada por imposição do
acordo de transferência de tecnologia, e que lhe permitiu, uma vez o prazo contratual terminado, ter de
imediato um novo sistema mais evoluído pronto para competir com sucesso nos mercados externos. Muitas
outras empresas inovadoras começaram o seu percurso pelo licenciamento de tecnologias. O primeiro automóvel
produzido pela BMW nos finais dos anos vinte era de facto um Austin Seven construído sob licença. E não deixa
de ser curioso que nos anos noventa a BMW tenha comprado o grupo Austin-Rover, fechando assim um ciclo
na sua história de constante progressão tecnológica.
Mas para que uma empresa possa efectivamente progredir com as tecnologias que assimila, à imagem
da EFACEC ou da BMW, é essencial que durante a fase de negociação das condições de transferência, dedique
pelo menos tanta atenção à margem de manobra a obter sobre o uso da tecnologia como às condições
comerciais. É importante lembrar que as limitações sobre o uso da tecnologia podem pesar muito menos a
curto prazo do que os royalties a pagar por cada equipamento produzido sob licença, mas arriscam-se a ter
consequências bem mais negativas a longo ou mesmo a médio prazo.
Quanto maior for a possibilidade de introduzir valor acrescentado na tecnologia cuja licença de fabrico
se adquiriu, mais rápida será a evolução tecnológica da empresa e mais depressa esta estará pronta a desen-
volver as suas próprias inovações. Ao mesmo tempo essa possibilidade aumenta a sua capacidade de penetração
no mercado, pois permite à companhia alterar ou evoluir a tecnologia de acordo com as mudanças e os gostos
do seu mercado, algo que não poderá fazer se o acordo a impedir de «mexer» na tecnologia.
As limitações de mercado podem também ter efeitos mais negativos do que uma empresa pode supor à
primeira vista. Muitos dos acordos de transferência proíbem à empresa licenciadora a exportação da tecnologia
durante um certo período de tempo. Algo que poderá pôr a empresa em dificuldades à medida que esta for
evoluindo e descobrir, por exemplo, que o seu mercado nacional ou regional não evolui à velocidade desejada e
a exportação aparece como a única solução.
Em resumo, aprender sim mas não a qualquer preço, aparece como a filosofia mais correcta para
empresas com uma visão tecnológica, e não puramente comercial, da inovação. Encarado nesta óptica o
licenciamento de novas tecnologias pode revelar-se como uma estratégica arma de inovação, com importantes
vantagens na poupança de custos e na diminuição do risco de inovar. De tal importância que mesmo empresas
habituadas a desenvolver as suas próprias inovações não hesitam por vezes em recorrer a ela. É assim que o
novo Mazda 121 é de facto um Ford Fiesta construído sob licença (como se pode constatar comparando os dois
modelos). O «aprender» não deve ser encarado como uma rendição de uma empresa à superioridade tecnológica
de outra, mas sim como uma forma de aliança estratégica com vantagens mútuas. E particularmente
adaptada às empresas com bom domínio do seu mercado, ou confrontadas com uma oportunidade tecnológica
a curto prazo que não podem deixar passar em claro.

A Compra
Após se ter percorrido os diferentes modos de aceder à inovação, chega-se agora ao modo mais simples,
menos exigente e que mais rápidos resultados pode apresentar: a compra de tecnologia já desenvolvida e
pronta a utilizar. Ultrapassadas as etapas da «realização», «encomenda», «adaptação» ou «licenciamento» de

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Gestão e Organização de Empresas

novas tecnologias, a modalidade de compra representa a última oportunidade das empresas para embarcarem
no «comboio da inovação». Perdê-la significa ficar remetido de vez ao mundo das velhas tecnologias. A compra
de tecnologia é pois um derradeiro «apeadeiro» a não perder, caso não se tenha conseguido (ou não se tenha
querido) entrar no comboio mais cedo.
Comprar tecnologia é por exemplo adquirir um novo sistema de desenho baseado em computadores
(CAD – Computer Aided Design) a um fabricante especializado. Mas é também assegurar uma representação
para Portugal de um software inovador de gestão de fabrico e vendê-lo «tal-qual», ou configurado para os
parâmetros de cada cliente (mas sem desenvolvimento próprio).
Este é sem dúvida o modo mais banalizado de inovar. Tão banalizado que muitas empresas, ao
comprarem por exemplo um novo equipamento para modernizar a sua linha de produção, nem sequer se dão
conta de que estão a inovar. O que muitas vezes as leva a menosprezar o risco inerente à introdução dessa
inovação e a comprometer dessa forma o sucesso da sua implementação na empresa. Porque se o risco da
compra de tecnologia é bastante menor do que o risco das modalidades abordadas anteriormente, ele não
deixa por isso de ser real. Para além do risco financeiro, que pode ser calculado à priori com mais ou menos
exactidão (investimento efectuado versus resultados esperados) outros riscos existem bem mais difíceis de
estimar, como os de uma eventual impreparação do pessoal, ou da própria cultura da empresa, para assimilar a
inovação. Mas não são só os riscos que as empresas ignoram. Frequentemente as oportunidades oferecidas por
uma compra de tecnologia também lhes passam despercebidas.
Tal como acontece com as outras modalidades de aceder à inovação, a compra de tecnologia, como
processo inovativo que é, deve ser abordada não só pela sua componente comercial mas igualmente no âmbito
da estratégia tecnológica da empresa e da contribuição que pode dar para a evolução desta. A introdução de
um novo equipamento numa fábrica obriga normalmente à formação técnica do pessoal que com ela vai lidar:
operários, mas igualmente pessoal de manutenção ou de supervisão. Esta formação vai seguramente aumentar
a cultura tecnológica dos empregados da fábrica e possivelmente também o seu interesse por novas tec-
nologias. Se este interesse for devidamente aproveitado e estimulado é toda a cultura tecnológica da empresa
que pode sair beneficiada. A empresa torna-se mais aberta e atenta às inovações.
Uma empresa poderá assim pela simples compra de um novo equipamento passar de um estado
«adormecido» para um estado pelo menos «semi-alerta» em termos de novas tecnologias. Em alguns casos o
aumento do nível técnico de algum do seu pessoal pode ser o primeiro passo para a constituição na empresa de
um núcleo «inovador», que passa a estudar regularmente outras formas de melhorar a produtividade desta. Por
vezes este núcleo pode mesmo atrever-se a propor e a implementar soluções próprias, concebidas e
desenvolvidas internamente, e a empresa pode tornar-se num modelo de inovação quase sem dar por isso. No
seu núcleo «inovador» poderá encontrar-se mesmo o embrião de um futuro departamento de I&D. Este
processo pode parecer demasiado ambicioso, mas muitas das empresas hoje tidas como inovadoras começaram
desta forma (como é o caso da Chitas, cujo exemplo é descrito em caixa).
A compra de tecnologia como forma de evolução técnica da empresa pode ser representada da
seguinte maneira:

137
Gestão e Organização de Empresas

Uma evolução semelhante poderá acontecer em firmas ocupadas com a representação de tecnologias
exteriores, mesmo que estas não disponham de capacidades produtivas próprias. Nestes casos é
frequentemente o serviço pós-venda que beneficia da formação recebida, quando do estabelecimento do
acordo de representação, para aumentar as suas competências técnicas. No contacto directo com os clientes, e
com os seus problemas, estes técnicos poderão começar a propor evoluções do produto ou sistema vendido,
para numa fase posterior passarem a ser eles próprios a conceber novas tecnologias especialmente adaptadas à
resolução dos problemas encontrados. Tal como para o licenciamento de tecnologias, também quando da sua
compra é essencial que as empresas não se concentrem apenas nas condições comerciais da transferência e
assegurem para si o máximo grau de domínio e intervenção sobre a inovação que vão adquirir. Neste sentido a
intensidade e qualidade da formação prestada quando da venda, a liberdade de introduzir futuros
melhoramentos ou adaptações e a garantia de receber informação sobre futuras evoluções introduzidas pelo
fabricante da tecnologia, podem ser tão ou mais importantes do que o simples preço a pagar.
Uma atenção especial a estes factores contribui ainda para assegurar uma mais eficaz absorção da
tecnologia na empresa, ajudando a ultrapassar possíveis barreiras culturais ou técnicas. No caso da introdução
de novidades mais radicais é mesmo aconselhável que as empresas façam preceder a compra da inovação de
uma auditoria tecnológica à empresa, de modo a aconselhar-se sobre os acertos da compra e sobre a estraté-
gia a seguir para a sua implementação. Em Portugal existem organizações, parcialmente financiadas por
projectos europeus, que desempenham auditorias desse tipo sem qualquer custo para as empresas e lhes
podem prestar assistência durante a fase de negociação do contrato de compra e venda de tecnologia. Essas
organizações e as suas actividades são descritas em pormenor no Capítulo IV.

Exemplos de sucesso: Chitas


A compra pura e simples de tecnologia não deve ser menosprezada como factor de inovação, desde que
realizada de uma forma que permita à empresa compradora alargar os seus horizontes tecnológicos, e não seja só um
trocar de equipamento velho por novo.
A empresa Chitas – do sector de metalomecânica de precisão, com menos de 30 empregados – é disso um
bom exemplo. Criada em 1983 por José Chitas, com apenas cinco operários, a empresa decide dar um salto tecnológico
em 1990 com a compra de duas máquinas computorizadas, com um índice de produtividade cinco vezes superior à do
equipamento convencional. A instalação do equipamento foi acompanhada por um processo de formação específica de
seis operários no CEMFIM (Centro de Formação Profissional da Indústria Metalúrgica e Metalomecânica) e por uma
aposta, na internacionalização, traduzida na participação em feiras no estrangeiro e mailing directo a potenciais
clientes.
Tal aposta revelou-se frutuosa a partir de 1993, ano em que ganhou os seus primeiros clientes internacionais,
entre os quais se conta presentemente o CERN (Centro Europeu de Pesquisas Nucleares), sendo o objectivo para 1996
de atingir 20% de facturação em exportação.

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Gestão e Organização de Empresas

Sendo a mais simples das formas de aceder à inovação, a compra de tecnologia não deve assim ser
menosprezada nem nos seus riscos, nem nas suas potencialidades.
Para uma empresa de pequenos recursos o impacte (seja ele positivo ou negativo) da compra de um novo
sistema pode comparar-se ao da decisão de empreender um projecto de I&D de grande orçamento para um
grupo industrial de grande dimensão.
A maior vulnerabilidade das pequenas empresas, limitadas à opção de compra de tecnologia como
forma de inovar, faz mesmo com que estas tenham tantas ou mais razões de que as organizações investiga-
doras para tentar diminuir o risco associado ao processo de inovação.

CAPÍTULO V – INOVAR: A PEÇA QUE FALTA


No início deste livro foi dito que as empresas portuguesas são tão inovadoras como quaisquer outras e elogiou-
se o espírito inventivo dos portugueses. Viu-se em seguida que a inovação está ao alcance de qualquer
empresa, independentemente dos seus recursos e da sua cultura tecnológica, uma vez que há sempre um meio
de aceder à inovação adaptado às características de cada um. Finalmente falou-se dos diversos mecanismos
existentes para apoiar as empresas na sua busca de inovações tecnológicas e referiu-se a vantagem temporária
de que gozam as empresas portuguesas em relação às suas concorrentes estrangeiras ao disporem de uma
série de programas nacionais financiados pelos fundos estruturais «injectados» no nosso país.
Então o que falta afinal às empresas portuguesas para inovarem mais e melhor do que as suas
congéneres além fronteiras? Se há em Portugal um espírito inovador, modos de inovar adaptados às
especificidades de cada um e mecanismos financeiros suficientes, qual é a peça que falta no «puzzle» da
inovação nacional para que se complete um quadro de sucesso?
Na realidade a peça fundamental em falta é um conjunto de peças mais pequenas: organizações
intermediárias. Organismos que aproximem as empresas da inovação encurtando a distância que as separa do
acesso a novas tecnologias.
Viu-se neste livro que o caminho a percorrer até uma inovação bem sucedida, não sendo nunca
inabordável, é ne cessariamente longo. A figura seguinte resume as etapas mais importantes d este percurso.

Fig. 29 - O percurso de uma empresa até uma inovação bem sucedida


139
Gestão e Organização de Empresas

O cumprimento de cada uma das etapas capaz representadas acima exige por parte dos intervenientes
no processo, a implicação de esforços e recursos distintos para cada etapa. Para inovar não basta às empresas
possuir os recursos técnicos necessários para desenvolver ou implementar novas tecnologias, são-lhes
igualmente exigidas uma série de outras capacidades. Uma empresa capaz de uma inovação de sucesso tem
que ser capaz de olhar simultaneamente para dentro de si mesma, para a sua estratégia e posicionamento, e
para fora, para os movimentos dos mercados em que se insere, por forma a ser capaz de identificar as suas
necessidades tecnológicas. Deve igualmente estar apta a especificar ou seleccionar as tecnologias que satisfaçam
essas necessidades, por entre todos os conhecimentos científicos, resultados de investigação e tecnologias
já existentes ou em vias de desenvolvimento. Em seguida deve ser capaz de «vender» as suas ideias e
projectos a eventuais parceiros com quem possa dividir os riscos da inovação, a contento de todas as partes.
E finalmente deve estar preparada para gerir com sucesso o desenvolvimento e a implementação da sua inovação.
Não é difícil compreender que muitas empresas, portanto potencialmente inovadoras, desanimem
perante um tão vasto quadro de exigências. Reunir no seu seio um conjunto tão amplo de competências, em
áreas tão distintas como as que vão do conhecimento científico ao marketing e da perspectiva tecnológica à
gestão de processos inovadores, não está ao alcance de muitas empresas. A inovação fica assim muito longe,
demasiado longe, para uma larga maioria delas.
Se por estes motivos as empresas não se conseguem aproximar da inovação, a única solução, a empreender
pelos responsáveis pelo sistema de inovação (ou seja pelos poderes públicos), será a de aproximar a inovação
das empresas. Como? Colocando «à sua porta» as competências que lhes faltam para inovar. Ou seja, criando
os tais intermediários da inovação.

Fig. 30 - Um caminho mais curto até à inovação

A qualidade de um sistema de inovação está assim em larga escala associada ao número e ao tipo dos seus
organismos intermediários.

Organizações de transferência de tecnologia na Alemanha


Organizações
Englobadas em estruturas de I&D:
Oficinas de «transferência de tecnologia» em universidades 161
Oficinas de «transferência de tecnologia» em institutos não universitários 125

140
Gestão e Organização de Empresas

Centros de homologação e controle técnico 14


Centros de consultadoria e desenvolvimento 110
Centros de demonstração e aplicação 105

Englobadas em associações industriais ou comerciais: 239


Autónomas:
Agências de transferência de tecnologia 49
Redes de transferência de tecnologia 7
Agências de informação 51
Centros de Inovação empresarial ou tecnológica 177

TOTAL: 1038

A absorção de novas tecnologias numa dada região, particularmente por parte de pequenas empresas,
está com efeito intimamente ligada ao número de organizações intermediárias existentes nessa mesma região
ou país e com o tipo de serviços por elas prestado. O que justifica a atenção prestada a estas organizações nos
países tecnologicamente mais desenvolvidos.
A tabela representada na caixa acima, demonstrativa do caso alemão (onde existem mais de 1000
organizações deste tipo, entre as quais já mais de 200 na antiga RDA) fornece-nos igualmente uma amostra da
variedade do tipos de organismos intermediários existentes.
Sendo vários os aspectos a levar em ponta num processo inovador é normal que em sistemas mais
desenvolvidos se assista a uma especialização dos agentes intermediários que, sujeitos a uma elevada procura,
se concentram em áreas específicas desse mesmo processo: a prestação de informação especializada, por
exemplo, ou os testes de novas tecnologias, a sua homologação, etc.
Independentemente do seu grau de especialização, os agentes intermediários podem ser divididos em
três grandes categorias, correspondentes às três necessidades básicas das empresas no seu percurso até à
inovação, como se r epresenta na figura seguinte:

Fig. 31 — Os principais tipos de intermediários em função das necessidades das empresas


141
Gestão e Organização de Empresas

Em toda a Europa uma importante percentagem dos agentes intermediários destinados a facilitar a
absorção de tecnologia pelas empresas encontra-se ligada a instituições de I&D. Esta é uma situação natural
atendendo à concentração de competências científicas e técnicas verificada nestas instituições, nomeadamente
nas universidades, ao seu papel de centros regionais de excelência tecnológica e aos elevados montantes de
financiamentos públicos que normalmente recebem. Por outro lado a maior parte dos organismos públicos ou
semipúblicos que desenvolvem acções de I&D não têm nem condições nem vocação para explorar eles próprios
os eventuais resultados dos seus projectos e têm por isso todo o interesse em transferi-los para a indústria. E
os organismos públicos que financiaram parte dessas acções têm também todo o interesse em ver tais
resultados serem aproveitados de modo a beneficiar a economia da região. Dessa conjugação de interesses
resultou, em vários países europeus, o apoio público à criação de agências de transferência de tecnologia nas
instituições de I&D, principalmente nas universidades. Vocacionadas inicialmente apenas para a promoção da
transferência dos seus próprios resultados, muitas dessas estruturas evoluíram desde a sua função inicial de
simples self-service de tecnologias para passarem a oferecer uma gama completa de serviços de apoio às PME.
Um exemplo típico desta situação é fornecido pelo caso espanhol. No âmbito do programa nacional de
I&D foi criada uma rede de 76 OTRI (Oficinas para a Transferência dos Resultados de Investigação) espalhadas
pelas universidades públicas ou privadas, centros públicos de investigação ou associações industriais. Cada
OTRI dispõe normalmente de um pessoal de 2 ou 3 técnicos, a tempo inteiro ou parcial. A rede é administrada
por um organismo central em Madrid que gere uma base de dados onde os resultados científicos provenientes
das diversas instituições são partilhados por todas as OTRI. Estas têm assim por missão não só a promoção dos
seus próprios resultados, mas também os de outras organizações que se revelem mais adequados às
necessidades da indústria local. Várias destas OTRI souberam aproveitar as oportunidades deste projecto para
treinar pessoal qualificado em transferência de tecnologia e montar progressivamente uma completa gama de
serviços de inovação que as empresas da região souberam aprender a reconhecer. Este salto qualitativo
permitiu-lhes participar noutros projectos, nomeadamente a nível europeu como a rede dos Innovation Relay
Centres, o que lhes permitiu aumentar ainda mais a sua gama de serviços e concluírem a sua progressão de
centros de informação especializada para agentes intermediários completos.
Os centros de homologação, demonstração e aplicação são por sua vez um dos tipos de agentes
intermediários de implementação mais recente à escala europeia. Na sua maioria, este tipo de actividade é
albergado por organizações que desempenham simultaneamente actividades próprias de investigação. Os
benefícios da existência deste tipo de centros para as empresas é evidente. A demonstração ou homologação
pública de tecnologias, permite às importadoras de tecnologia conhecer previamente as suas características,
potencialidades e eventuais problemas, enquanto as exportadoras vêem facilitada a penetração no mercado dos
seus novos produtos, processos ou serviços. Para serem eficientes é contudo necessário que estes centros
sejam em primeiro lugar independentes dos fornecedores de tecnologia (o que nem sempre acontece,
especialmente se o centro de demonstração é simultaneamente uma instituição de I&D) e em seguida que
ofereçam serviços complementares que facilitem a absorção de inovações pelas empresas, tais como a prestação
de informação e aconselhamento sobre o uso de novas tecnologias.
Ao contrário do que acontece na Alemanha, nem todos os centros de demonstração europeus são

142
Gestão e Organização de Empresas

albergados por instituições de investigação. Mais de metade do número de centros deste tipo existentes na
Europa são orientados sectorialmente e muitos são albergados por associações sectoriais regionais. Mas o
principal papel normalmente desempenhado pelos agentes intermediários existentes em associações industriais
ou comerciais é o de ajudarem os seus membros a identificar as suas necessidades tecnológicas. Sendo que
estas são normalmente comuns a um mesmo sector, uma associação de industriais de um determinado ramo
de actividade encontra-se numa óptima posição para identificar as inovações que podem dar maior
competitividade à generalidade dos seus associados. Por estes motivos as associações sectoriais têm-se
especializado na perspectiva e vigília tecnológica, desenvolvendo igualmente competências na prestação de
serviços de assistência à participação dos seus membros em programas nacionais ou comunitários de incentivo
à inovação. Tal como acontece com os intermediários localizados em estruturas de I&D, também alguns dos
agentes albergados por associações sectoriais têm sabido alargar as suas competências sobre o processo da
inovação para passarem a oferecer uma gama completa de serviços aos seus clientes (se bem que numa escala
menor do que a verificada com, por exemplo, as universidades). É o caso, entre outras, da poderosa associação
alemã de engenheiros electrotécnicos e electrónicos (VDI/VDE), actualmente uma das principais organizações
de inovação no seu país.
Se os intermediários localizados em organizações de I&D se especializam principalmente no campo da
divulgação da oferta tecnológica e aqueles localizados em associações sectoriais se concentram na identificação
da procura, a actividade mais genérica de conciliar oferta e procura e de assistir as empresas a obter meios de
financiamento que lhes permitam custear os seus projectos (as chamadas actividades de «corretagem
tecnológica») é idealmente desempenhada por organizações independentes quer dos exportadores, quer dos
importadores de novas tecnologias: os organismos autónomos. Para além das actividades mencionadas acima,
estas organizações têm ainda um papel importante no aconselhamento das empresas sobre direitos de
propriedade intelectual ou na assistência à preparação de propostas para programas públicos. Em países de
tradição mais liberal, como o Reino Unido, um grande número de intermediários deste tipo são organizações
privadas, que vivem de cobrar percentagens sobre os acordos de transferência de tecnologia por eles facilitados,
ou sobre os montantes públicos recebidos graças à sua assistência. Mas na maior parte dos outros países
europeus, nomeadamente em Portugal, os agentes intermediários privados são quase inexistentes, uma vez que
as empresas ainda não estão mentalizadas para pagarem por este tipo de serviços, e este papel tem
forçosamente que ser desempenhado por organismos públicos.
Aliás, o panorama português no que respeita a qualquer um dos três tipos de intermediários referidos
(englobados em organizações de I&D, em associações sectoriais ou organismos autónomos) é, verdade seja
dita, desanimador.
As universidades nacionais têm vindo progressivamente a criar centros de serviços de investigação
aplicada para a indústria (como é o caso do INESC de Lisboa e Porto, associados respectivamente ao Instituto
Superior Técnico e à Faculdade de Engenharia do Porto), mas tais centros limitam-se ao papel de
investigadores, não desempenhando de forma alguma o papel de intermediários para a inovação, uma vez que
não disponibilizam serviços de informação, de disseminação de tecnologias externas ou de aconselhamento
sobre a absorção de inovações. Mais avançada nesta área encontra-se a Universidade do Minho, que com a

143
Gestão e Organização de Empresas

Tecminho dispõe de um efectivo organismo intermediário ao serviço da indústria da sua região e que participa
já em projectos europeus neste campo. Mas com uma ou outra excepção, os organismos intermediários de
inovação existentes em universidades são raros e sem coordenação entre eles. O que atendendo à
disponibilidade de pessoal qualificado, à existência de infra-estruturas telemáticas e à disponibilidade de
matéria--prima nelas existente (em termos de resultados para divulgação), não deixa de constituir uma
oportunidade perdida, quer para as universidades, quer para o seu tecido industrial envolvente.
O estado das coisas em Portugal neste aspecto pôde ser recentemente observado quando a Agência de
Inovação, no âmbito das suas actividades como Innovation Relay Centre (ou seja financiadas por fundos
comunitários) levou a cabo um exaustivo levantamento dos resultados existentes em nove universidades ou
centro públicos de investigação, com vista à sua posterior valorização junto e potenciais clientes nacionais ou
estrangeiros. Uma acção sem dívida interessante, principalmente na falta de qualquer esforço púbico nesse
sentido, mas que deparou com grandes dificuldades devido à falta de estruturas existentes nos organismos de
I&D que servissem de interface a um trabalho deste tipo. Na falta delas, os consultores da Agência de Inovação
apenas puderam contar com a colaboração dos departamentos de relações exteriores, sem o mínimo de
conhecimentos, quer sobre os resultados, quer sobretudo sobre as especificidades dos processos de
transferência de tecnologia. Por sua vez as únicas pessoas que poderiam verdadeiramente fornecer indicações
úteis (os chefes de projecto, na sua maioria professores catedráticos) dispunham de pouca disponibilidade de
tempo para ajudar na tarefa. Alguns encontravam-se também apenas capazes de fornecer explicações técnicas
e quando inquiridos sobre possíveis condições comerciais e de propriedade intelectual para a transferência da
tecnologia, eram incapazes de fornecer uma resposta devido à inexistência de uma estratégia da sua organização
para estes casos. Outros mostravam-se exageradamente motivados, esperando um imediato sucesso
comercial para a «sua» tecnologia e desanimando totalmente quando confrontados com as dificuldades naturais
destes processos. Em pouquíssimos casos foi uma universidade ou centro de investigação capaz de acompanhar
eficientemente um processo de valorização de um seu resultado, mesmo que só até à fase de disseminação
de um perfil comercial da sua tecnologia. Este projecto revelou a falta que estruturas do tipo OTRI fazem
nas universidades portuguesas, bem como a falta de uma base de dados nacional com todos os resultados
dos projectos de I&D co-financiados pelos poderes públicos. Com este projecto a Agência de Inovação
espera contribuir para a criação de seis novas empresas destinadas a explorar os resultados mais interessantes
entre os identificados. Quantas poderiam ter sido já criadas se este mesmo exercício fosse regularmente
conduzido pelas próprias universidades?
Os poucos organismos não-públicos de I&D existentes no nosso país, têm pelo seu lado dedicado uma
maior atenção à transferência dos seus resultados, quanto mais não seja porque, ao contrário das
universidades, necessitam de os rentabilizar. Organizações deste tipo, como por exemplo o Instituto de
Soldadura e Qualidade, com um bom registo de participação em projectos comunitários do programa dos
Materiais Industriais, têm apostado cada vez mais na transferência de tecnologia. Mas para o fazerem, e na
falta de apoios nacionais, tiveram que socorrer-se mais uma vez dos apoios comunitários — no caso a
participação na rede dos Innovation Relay Centre. Uma atitude que em alguns casos lhes possibilitou verem
75% dos custos das suas actividades de transferência das suas próprias tecnologias para a indústria, cobertos

144
Gestão e Organização de Empresas

pela União Europeia! Com benefícios para as empresas (que receberam as tecnologias), para o ISQ (que as
transferiu) e para a própria União Europeia que viu reforçar-se a competitividade de uma das suas zonas
economicamente mais atrasadas. E, claro, para o estado português, apesar de este não ter contribuído para a
história. A situação é assim potencialmente melhor entre as organizações de I&D privadas do que entre as
públicas, no que respeita à transferência de resultados mas, infelizmente, o volume de investigação privada em
Portugal é tão baixo que o panorama global não se altera significantemente.
A situação entre as associações sectoriais não é muito melhor. A maior parte das organizações deste
tipo existentes em Portugal orgulha-se de possuir actividades de transferência de tecnologia, e são elas as
responsáveis por que Portugal apresente uma «performance» razoável nos indicadores europeus de
intermediários de inovação. Mas quantas de entre elas possuem pessoal com formação específica em
transferência de tecnologia? Quando da convocatória pública para a selecção de organizações nos estados-
membros para a rede europeia de «Innovation Relay Centres», que permitiria a organizações com actividades
nesta área verem uma importante parte dos seus custos cobertos pela União Europeia e os seus meios
substancialmente alargados, nenhuma associação deste tipo se apresentou a concurso, o que diz bem da
importância relativa que as actividades de transferência representam para as associações sectoriais nacionais.
Finalmente, no campo dos intermediários albergados por agentes autónomos apenas se pode identificar
uma organização nacional cujas actividades se situam por inteiro na promoção tecnológica e na transferência
de tecnologia: a Agência de Inovação. Criada em 1993, como uma sociedade anónima de capitais inteiramente
públicos (com 50% do capital a pertencer à JNICT e os outros 50% ao IAPMEI), provenientes na sua maioria
dos fundos europeus de coesão através do programa STRIDE, o percurso da Agência da Inovação até hoje não
tem sido propriamente um estímulo para o surgimento de mais iniciativas privadas nesta área. Tendo na sua
concepção a intenção de se autofinanciar com a venda de serviços à indústria, rapidamente a Agência se viu a
sobreviver apenas da sua participação em projectos europeus como o dos Centros de Suporte à Inovação
(Innovation Relay Centres), projecto em que foi a pioneira em Portugal, e da gestão financeira do seu capital
social. Actualmente a Agência de Inovação procura ainda o seu rumo, orientando-se progressivamente para a
gestão de projectos racionais no campo da inovação, como algumas medidas do programa PRAXIS XXI ou o
plano tecnológico regional do Norte, mas abandonando a estratégia de venda de serviços às empresas,
reconhecidamente pouco rentável.
Qual é então o panorama global dos agentes intermediários para a inovação no nosso país? Alguns
(poucos) esforços isolados por parte de organizações de I&D, associações sectoriais pouco activas e com
poucos recursos e um único organismo autónomo. Se há uma peça em falta no «puzzle» da inovação
portuguesa é sem dúvida ao nível do sistema de organizações intermediárias.

145
Gestão e Organização de Empresas

TEXTO Nº 8
A Mudança Organizacional e a Inovação
João Paulo Marques e Paulo Santos

INTRODUÇÃO

É hoje perfeitamente reconhecido que o nível de vida de uma nação depende da Ciência
e da Tecnologia. Os progressos significativos alcançados a nível mundial com as novas
tecnologias da micro-electrónica e dos computadores, por exemplo, têm proporcionado
avanços em todas as áreas da actividade humana, quer a nível social, económico e
particularmente a nível empresarial. Assim, a elevada taxa de mudança tecnológica imprimida
pela concorrência entre as indústrias a nível internacional, tem obrigado as empresas,
concretamente uma grande parte das empresas portuguesas, a deterem as suas atenções nos
aspectos tecnológicos como factores potenciadores da produtividade.
Nesta linha, as dificuldades decorrentes do mercado único europeu, bem como a
crescente concorrência e competitividade das empresas estrangeiras que actuam no mercado
português, tem levado as empresas nacionais a uma maior preocupação entre outros, pelos
aspectos de melhoria dos seus parques tecnológicos, bem como a deterem as suas atenções
sobre os mecanismos internos que lhes permitam ter acesso, de forma mais barata e eficaz, aos
novos processos tecnológicos e know-how, ou seja, à inovação. É testemunho desta realidade,
por exemplo, o estudo evidenciado em Marques (1998).
Este trabalho visa, fundamentalmente, descrever do ponto de vista teórico, os principais
elementos enquadradores da temática da mudança organizacional, a sua relação com a cultura
da empresa ligados intimamente ao conceito de inovação e aos seus diferentes processos.
Assim, a importância deste tema está directamente ligada à constante mudança que se
está a operar ao nível de todo o mundo económico, e em particular à taxa elevada de mudança
tecnológica.
A preocupação de garantir uma abordagem ampla do assunto, determinou a
estruturação do presente trabalho em cinco secções, para descrever a problemática do tema em
análise e o seu enquadramento de acordo com alguma literatura existente.
A secção 1, de natureza introdutória, visa apresentar os conceitos fundamentais sobre a
problemática da mudança organizacional, as suas causas, o contexto e a necessidade de uma
adaptação permanente através do planeamento.
Descrevemos, depois, nas secções 2 e 3, as diversas contribuições teóricas sobre a
cultura para a mudança e a gestão das resistências individuais e organizacionais à mudança,
assim como a discussão do processo de mudança.
A análise da mudança de cultura será apresentada na secção 4, fazendo-se uma ênfase
especial nos aspectos particulares deste processo, bem como da importância de uma liderança
forte.
Finalmente, na secção 5, discutir-se-á a temática da Inovação, do seu conceito, fontes
de inovação e cultura inovadora.

146
Gestão e Organização de Empresas

1. – O CONCEITO, CONTEXTO E CAUSAS DE MUDANÇA.


1.1. - Conceito de mudança

Vivemos num mundo de instabilidade e de incerteza, provocados pela velocidade das


transformações que a todos os níveis, evoluem na nossa sociedade.
Neste contexto, as organizações redescobrem-se diariamente na árdua tarefa da
sobrevivência, na sua análise permanente do mercado. Novas tarefas são exigidas às pessoas e
às empresas, visando melhorar os processos de decisão e as respectivas capacidades de resposta
às exigências dos mercados. Na sua permanente interacção com o meio envolvente, a empresa
tem de se certificar que produz bens ou serviços que correspondam ao que pretendem os
consumidores, em condições competitivas.
Segundo Câmara et al (1997), quando surge uma disfunção entre aquilo que a empresa
produz ou fornece e o que o mercado está disposto a absorver, entra-se numa zona de risco,
devendo repensar a sua forma de actuação e, se necessário, mudar para sobreviver.
«O sucesso tem que ser assumido como um conceito passageiro e substituído pelo
conceito de sobrevivência. A competitividade atinge os limites do suicídio organizacional e
nem todas as organizações conseguem sobreviver» (Ferreira, 1994, p.8).
«A mudança pode, pois, ser definida como a alteração da estrutura e de forma de
funcionamento de uma organização, com o propósito de a tornar mais competitiva e ajustada
às realidades do mercado» (Câmara, et al, 1997, p. 165).
Mas, se um contexto de mudança pode significar perigo devido à instabilidade,
incerteza e competitividade, também poderá representar oportunidade, se a mudança for
encarada como um desafio colectivo a vencer pela organização.
De acordo com Ferreira (1994), a sobrevivência e o sucesso não vai passar por quem
tem recursos, mas sim pelas pessoas e pelas organizações que melhor souberem combinar e
optimizar os seus recursos e souberem construir climas motivadores, criativos e solidários.
Torna-se então necessário que, a cultura da empresa seja "sólida" e "forte" e que potencie e pri-
vilegie um clima saudável com dinâmica de mudança.

1.2. - Contexto e causas da mudança


O mundo hoje, é cada vez mais global, em que cada país é um pequeno mundo interagindo
com o mundo global. A sociedade pós-industrial está a ser substituída por uma sociedade
onde a matéria-prima se chama informação. As imagens diárias de um mundo sem fronteiras
reflectem uma clara percepção de um novo mundo em construção.
«O mundo entendido como uma "aldeia global", a partir da década de 70, continua de
forma imparável a caminho de uma "completa" globalização» (Ferreira, 1998, p.4).
Para Santos (1994), globalização significa que os mercados são globais, isto é, que em
cada mercado estão presentes grandes e pequenas empresas oriundas de todo o globo e que,
portanto, as regras do jogo estratégico em cada mercado se caracterizam por uma globalização
do lado da oferta.
De acordo com Ferreira (1998), o mundo global surge como resultado de uma profunda
reorganização económica e social a nível mundial (quer a nível das economias "ocidentais",
mas também nas economias ex-comunistas, nos países sub-desenvolvidos e países asiáticos
emergentes).
Na mesma linha de pensamento encontra-se Kotter (1996), quando afirma que a
147
Gestão e Organização de Empresas

globalização, tem origem na associação de um conjunto de factores de natureza económico-


social (figura 15), tais como:
• O desenvolvimento tecnológico – Desenvolvimento rápido das comunicações, das
auto-estradas da informação cada vez mais globais e as novas tecnologias da
informação.
• Integração económica internacional - O acordo "GATT" e os grandes fluxos globais
de capitais que levam a um capitalismo global.
• Maturidade dos mercados domésticos nos países desenvolvidos - Crescimento
lento dos mercados domésticos das economias desenvolvidas que levaram as
empresas a entenderem o mercado global como um mercado natural para o seu
desenvolvimento.
• Colapso do comunismo a nível mundial - Mais países aderiram ao sistema
capitalista e como consequência a privatização de muitas empresas dos países com
anteriores regimes socialistas.

Figura 1. Contexto de mudança na organização

Desenvolvimento Integração Maturidade dos Colapso do


Tecnológico económica mercados nos comunismo e
internacional países regimes socialistas
desenvolvidos

Globalização dos mercados e da concorrência

Mais perigos Mais oportunidades

Grandes mudanças nas organizações

Fonte: Adaptado com as mínimas alterações de Kotter (1996, p. 19)

Com a globalização da economia e dos mercados surgem mais perigos (mais e maior
concorrência), mas também mais oportunidades (maiores mercados) para as empresas,
forçando-as a fortes melhoramentos, não só para competir e prosperar, mas também para
simplesmente sobreviver (Kotter, 1996).
Neste contexto de grande concorrência a nível global, por forma a diminuir o risco e o
perigo e/ou para capitalizar nas oportunidades, as empresas, têm então de se tornar fortemente
competitivas. Para isso, segundo Kotter (1996), as empresas terão de proceder a mudanças
internas em larga escala. Ainda segundo o mesmo autor, as modalidades típicas de mudança

148
Gestão e Organização de Empresas

organizacional incluem, os programas objectivando a qualidade, reengineering, fusões e


aquisições, a mudança estratégica e a mudança de cultura.
Na opinião de Robbins (1998), os factores de mudança resumem-se a seis forças
(apresentando alguns exemplos) que estão na origem da mudança nas organizações, a saber:
• Natureza da força de trabalho - maior diversidade cultural associado a fenómenos
migratórios; mobilidade da força de trabalho entre empregadores; novos
colaboradores que, devido ao ritmo da mudança, possuem inadequadas aptidões, etc.
• Novas tecnologias - Informática, telecomunicações e robotização; implementação
de programas de total quality management assim como de reengineering, etc.
• Choques económicos - Choques petrolíferos; crash da bolsa; flutuações cambiais e
de cotações bolsistas, etc.
• Concorrência - Concorrentes a nível global; concorrência a nível de pequenas
empresas que desenvolvem produtos inovadores e com muita diferenciação;
fenómenos de concentração empresarial, etc.
• Alterações sociais - Aumento da taxa de divórcios; casamento tardio pelos jovens;
mudanças de hábitos, etc.
• Política internacional - Colapso da União Soviética; invasão iraquiana ao Kuwait;
reunificação da Alemanha, etc.

1.3. - Causas intrínsecas e causas extrínsecas


A mudança poder-se-á classificar em dois grandes grupos tendo em conta a origem da
mudança (Câmara et al, 1997): As mudanças intrínsecas que são as que decorrem da própria
estrutura da empresa e das normas que regem a sua organização e a prestação de trabalho. A
mudança, neste caso, é imposta pela própria empresa, por motivos intrínsecos que podem ter a
ver com a sua continuidade e sobrevivência ou por necessidade de aumentar a sua
competitividade. A mudança será extrínseca, quando é imposta por alterações radicais do
meio envolvente. É o caso dos choques económicos e da mudança de hábitos de consumo, por
exemplo.

1.4. - Mudança planeada


Por seu lado, Robbins (1998, p. 629) opõe À mudança ocasional, acidental ou
espontânea, o conceito de mudança planeada, definindo esta última como «change activities
that are intentional and goal oriented». Tratam-se das mudanças que são proactivas e
propositadas, intencionalmente implementadas pela gestão da empresa e orientadas para um
determinado objectivo. Têm como objectivo central melhorar as vantagens competitivas da
empresa, adaptando-as às mudanças "ambientais", assim como mudar o comportamento dos
colaboradores.

2. - A CULTURA PARA A MUDANÇA E AS RESISTÊNCIAS À MUDANÇA


2.1. - A cultura de mudança

Em trabalhos anteriores, explicitámos a razão de ser da cultura organizacional,


concluindo que algumas funções desta, passavam por conferir um sentimento comum de
149
Gestão e Organização de Empresas

identificação aos colaboradores, melhorando a eficácia destes e da própria organização. Vimos


que, a cultura em harmonia com os seus valores, permitiria o alinhamento e o direccionamento
em relação à missão e objectivos da empresa. Verificámos também que, os valores em que
assenta a cultura de empresa, deveriam ser percebidos, partilhados e colocados em prática (e
não ficarem no papel). Dissemos que, a atitude da empresa e seus colaboradores face à mu-
dança, tinham como subjacente o tipo de cultura prevalecente e que, uma atitude de abertura
pela empresa face à mesma, era um requisito essencial para a sobrevivência e o seu sucesso.
Face à necessidade imposta à empresa de se voltar para o exterior, para antecipar as
alterações do mercado, deve a empresa possuir uma cultura e estrutura flexíveis, por forma a
proporcionar rapidez na resposta ao mercado e alinhada com os seus objectivos estratégicos
(Câmara et al, 1997).
Segundo este autor, deste modo, há necessidade de reinventar a forma como as empresas
funcionam, em particular, no trabalho em equipa e na polivalência. Assim, para melhor
responder ao mercado, deverão as empresas caminhar para modificações na repartição do poder
dentro das mesmas, dando à hierarquia não tanto um papel decisor e autoritário, mas sobretudo
um papel de coordenação e de alocação dos recursos disponíveis, de acordo com as prioridades
estratégicas.
De facto, a cultura pode ser usada como uma alavanca da mudança para garantir que a
organização se mova na direcção dos objectivos e das finalidades que a empresa pretende
alcançar.
Para que a organização institucionalize e entenda a mudança como um fenómeno natural,
sendo a abertura e a apetência pela mesma, característica importante da sua cultura, torna-se
necessário que, esta assente numa matriz de valores que traduzam uma cultura "forte", de
valorização focalizada no mercado e no cliente. Esses valores passam por uma gestão
participativa, humanista, potenciadora do desenvolvimento das pessoas e que aposte na sua
formação, em conjugação com uma liderança democrática e visionária, em que a visão seja
também comunicada e partilhada.
Parece-nos evidente que, uma cultura que privilegie esses valores terá como
consequências:
- Maior identificação e comprometimento dos colaboradores para com a empresa.
- Maior produtividade e empenho.
- Motivação e moral elevados.
- Flexibilidade dos colaboradores e da organização.
O tipo de cultura enunciada, assim como as suas benéficas consequências, levará a
empresa a uma predisposição natural para a mudança e para enfrentar processos contínuos de
melhoria.
Para melhor sustentar esta afirmação, Roldão (1996), estabelece uma relação entre a
motivação proveniente de uma cultura de empresa, que promova um clima aberto e se
caracterize por uma filosofia de enriquecimento de tarefas e por uma qualificação dos
colaboradores, como muito relevantes na estrutura da flexibilidade. O mesmo autor e Moura
(1997), realçam o factor flexibilidade como característica essencial da pessoa que
institucionaliza a mudança e que aprende ao longo da vida.
Por outro lado, Rousseau (1998), preconiza que uma cultura em que os seus valores
fomentem a identificação e o comprometimento dos colaboradores, fará com que estes aceitem
com maior facilidade a mudança. Este autor acrescenta que, uma identificação forte promove a
flexibilidade para a mudança.

150
Gestão e Organização de Empresas

Como vimos, a cultura para a mudança exige flexibilidade a todos os níveis,


identificação pelos colaboradores para com a empresa e sua cultura, motivação e moral elevados
e qualificação dos colaboradores. Tal não se compadece com uma cultura de exclusão das
pessoas, que afaste a participação, iniciativa e criatividade, como também, com uma
organização formal virada para si própria, em que a decisão não é partilhada e uma liderança
autocrática com deficiências de comunicação. Uma empresa com uma caracterização deste
tipo, apresentará concerteza dificuldades de mudança (Moura, 1997).
Se este tipo de empresa pretender alterar o status quo, concerteza que irá encontrar
barreiras à mudança e esta será lenta e dolorosa. É o que acontece também em empresas com
culturas antigas ou “fortes” mas caracterizadas por não serem flexíveis (Luthans, 1995;
Williams, 1993).

2.2. - Resistências à mudança


A resistência é por um lado, positiva, porque dá ao comportamento das organizações
previsibilidade e estabilidade. Se não houvesse um certo grau de resistência à mudança, o
comportamento organizacional tornava-se imprevisível e caótico (Robbins, 1998).
Segundo este autor, também a resistência à mudança pode ser uma fonte de conflito
funcional e diminuir a capacidade de adaptação e o progresso organizacional.
A resistência à mudança pode não se manifestar de forma aberta e reconhecível, podendo
muitas vezes ser invisível, sabotando os planos de mudança. Essa resistência, pode traduzir-
se em perdas de lealdade à organização, desmotivação para o trabalho, aumento do número
de erros e maior absentismo (Robbins, 1998).
A gestão da resistência à mudança, tem que ser feita de forma muito cuidadosa,
procurando desarmar os mecanismos de resistência através da comunicação, da participação
e da partilha da visão de futuro por todos os membros da organização.
Segundo Robbins (1998), os factores de resistência à mudança dividem-se em
individuais (pelos colaboradores) e organizacionais (pelas próprias empresas ou organizações).

2.2.1. - Resistência individual


A resistência individual à mudança reside em regra nas seguintes causas (figura 2):

Figura 2. Fontes de resistência individual à mudança

Resistência
Individual

Fonte: Robbins, 1998, p.633.

151
Gestão e Organização de Empresas

• O hábito - o ser humano é um animal de hábitos. Para lidar com a complexidade da


vida quotidiana, todos nós recorremos a comportamentos habituais ou respostas
programadas. Quando confrontados com a mudança, a necessidade de alterar esses
hábitos ou rotinas, estes aparecem como uma fonte de resistência.
• A segurança - todas as pessoas têm necessidade de se sentir seguras, e a mudança
constitui uma ameaça a essa segurança. A mudança pode criar nas pessoas o receio
de desempenhar novas tarefas e de não serem capazes de as desempenhar
(especialmente com novos equipamentos, computadores por exemplo).
• Factores económicos - a mudança pode constituir uma ameaça à manutenção do
posto de trabalho, ou a redução de benefícios.
• Medo do desconhecido - a mudança representa insegurança e incerteza face àquilo
que é conhecido.
• Informação selectiva - todos nós filtramos a realidade através da nossa percepção.
Por isso, todos os indivíduos têm tendência para processar a informação recebida,
por forma a manter intactas as suas percepções procurando ignorar a informação que
ponha em causa o mundo que criaram. Perante uma situação de mudança, tentam
ignorar ou minimizar os aspectos destas que põem em causa o seu mundo.

2.2.2. - Resistência organizacional


A generalidade das empresas são por natureza conservadoras, sendo por isso refractárias
à mudança. Robbins (1998), aponta seis causas principais de resistência organizacional de
acordo com a figura 3:

Figura 3. Fontes de resistência organizacional à mudança

Resistência
organizacional

Fonte: Robbins, 1998, p.635.

152
Gestão e Organização de Empresas

• Inércia estrutural - as organizações têm mecanismos estruturais para garantir


estabilidade. Por exemplo, cada empresa tem as suas próprias políticas que procuram
assegurar a integração das pessoas na cultura da empresa. Uma modificação dessa
cultura ou det al parâmetros funcionais irá contar com a resistência da própria
cultura ou estrutura, que tenta manter a estabilidade criada. Assim, a própria cultura
pode ser ela mesmo, fonte de resistência à mudança.
• Âmbito da mudança - se o processo se circunscrever a um ou poucos subsistemas
da organização, o seu âmbito limitado tende a anular os efeitos da mudança, que são
neutralizados pelos sistemas mais vastos e poderosos em que se integrem e que
ficaram de fora do processo.
• Inércia de grupo - mesmo que alguns membros dos grupos aceitem modificações
das suas responsabilidades, ditadas pela gestão, se o grupo, como tal, resistir a essas
mudanças, a disponibilidade individual para as aceitar é neutralizada pela pressão de
grupo.
• Ameaça aos conhecimentos técnicos (Know how) - a mudança pode pôr em causa
os conhecimentos técnicos de membros da organização por se tornarem numa
situação de redundância. Essa obsolescência do Know how de membros da
organização, vai ditar uma resistência orgânica à adopção de novos métodos de
trabalho.
• Ameaça à estrutura de poder existente - uma empresa como estrutura de poder
que é, qualquer mudança que ponha em causa a repartição do poder no seu interior,
encontrará resistências individuais e institucionais.
• Ameaça à alocação de recursos - um processo de mudança organizacional, que
envolva uma alteração nas prioridades de negócio, determinará que há sectores que
ganham mais recursos que outros que ficam mais limitados nas suas dotações. Daí
que os sectores potencialmente afectados resistam ao processo de mudança que os
vai prejudicar.

Embora as organizações sejam assediadas por muitas forças exigindo mudanças, é


importante reconhecer que forças opostas mantêm a organização num estado de equilíbrio e
apoiam a estabilidade ou o Status quo.
Para compreender como isso acontece, Kurt Lewin elaborou a teoria do "campo de
forças" (Stoner, et al, 1995). De acordo com esta teoria, cada comportamento é resultado de
um equilíbrio entre forças "impulsionadoras" e "restritivas". As forças impulsionadoras
empurram para um lado e as restritivas para o outro. O desempenho resultante é uma con-
ciliação dos dois conjuntos de forças. Um aumento nas forças impulsionadoras pode aumentar
o desempenho, mas também pode aumentar as forças restritivas. Portanto, a redução nas forças
restritivas é normalmente um meio mais eficaz de encorajar a mudança do que o aumento nas
forças impulsionadoras.
A teoria de Lewin poder-se-á sintetizar no seguinte modelo (figura 4).

Figura 4. Diagrama do campo de forças (baseado na teoria do campo de forças de Kurt


Lewin)

153
Gestão e Organização de Empresas

Forças de mudança Forças que mantêm o status quo

Nova tecnologia
Normas de desempenho do grupo
Forças impulsionadoras

Matérias-primas melhores

Forças restritivas
Medo da mudança

Concorrência de outros grupos

Complacência dos membros

Pressões do supervisor

Habilidades bem aprendidas

Nível actual Nível mais alto


de desempenho de desempenho

Nota: O tamanho da seta equivale ao tamanho da força.


Fonte: Stoner, et al, 1995, p.414.

2.3. - Como superar a resistência à mudança?


Robbins (1998), sugere um conjunto de tácticas aos responsáveis pela mudança, para
melhor lidarem com a resistência à mesma, isto é, para conseguirem neutralizar ou mesmo
inverter os comportamentos e atitudes que se opõem à mudança.
• A comunicação - a resistência pode ser reduzida através de acções de comunicação
dirigidas aos colaboradores, explicando o sentido e a lógica da mudança. Esta táctica
parte do princípio que a resistência radica na falta de comunicação ou numa
comunicação deficiente. Se os colaboradores conhecerem os factos e se os mal-
entendidos forem esclarecidos, a resistência dissipar-se-á.
• A participação - se os colaboradores puderem dar o seu contributo à preparação da
mudança, o seu envolvimento pode assumir grande importância, reduzindo a
resistência. É difícil às pessoas resistirem a um processo de mudança em que
participaram.
• A facilitação e apoio - os condutores da mudança podem colocar à disposição dos
colaboradores envolvidos na mudança, um conjunto de meios para os auxiliar a
ultrapassar a insegurança, o medo e o stress. Por exemplo a terapia, dispensas de
trabalho etc.
• A negociação - se a resistência à mudança partir de um grupo organizado e poderoso,
que tenha poder para a bloquear, pode ser necessário negociar com alguns indivíduos
ou grupos, certas adaptações ao processo de mudança.
• A coacção - trata-se de uma medida de último recurso e consiste em tentar vencer a
resistência à mudança pela força ou pela ameaça do seu uso. Esta medida desacredita
totalmente o processo de mudança, criando um espírito de desconfiança e revolta em
relação a ele.

154
Gestão e Organização de Empresas

3. GESTÃO DA MUDANÇA

3.1. - Os agentes da mudança nas empresas


Robbins (1998), aponta quatro componentes ou agentes essenciais da mudança:
• A estrutura da empresa
• As tecnologias utilizadas
• As pessoas que constituem a organização
• O Layout do espaço físico da empresa

As estruturas organizacionais não são imutáveis. As alterações do ambiente externo e a


forma de organização do trabalho, internamente, exigem alterações de estrutura.
Uma mudança da estrutura da empresa implica, uma modificação das relações do poder,
dos mecanismos de controlo e de coordenação, do perfil das funções e do número de níveis
hierárquicos, com o consequente aumento da autonomia de cada função. Desta forma, poder-
se-á alargar o âmbito de actuação de cada gestor eliminar escalões hierárquicos, tornar a or-
ganização mais horizontal e menos burocrática. Poderá ainda, aumentar-se a descentralização
para obter maior rapidez na tomada de decisões.
Um segundo vector de mudança, pode consistir na tecnologia utilizada no
desenvolvimento do negócio da empresa. Hoje em dia, as alterações tecnológicas levam as
empresas a introduzirem novos equipamentos ou métodos de trabalho. A introdução de novas
tecnologias é frequentemente provocada por inovação ou factores de competitividade. Essas
tecnologias residem na automação e computorização na gestão da informação.
A terceira componente da mudança prende-se com as pessoas. Consiste em mudar as
pessoas, as suas mentalidades, comportamentos, atitudes e a forma como trabalham em
conjunto. Por vezes há necessidade de mudar as tarefas, perspectivando o enriquecimento das
mesmas, por forma a desenvolver pessoal e profissionalmente os colaboradores, estimulando-
os para a criatividade, iniciativa e autonomia.
Por fim, o layout. Este aspecto deve ser tido em conta na mudança nos espaços físicos
de trabalho, em particular, as necessidades sociais, segurança no trabalho, ergonomia e
decoração, etc.

3.2. - Gestão das reacções à mudança


Num processo de mudança, existem interesses, sentimentos e pensamentos
contraditórios numa organização.
De acordo com Ragen (1999), por um lado, os líderes acreditam que a mudança é no
melhor interesse do negócio e da empresa e acham que, dever-se-ia implementar o processo o
quanto antes.
Por outro lado, os colaboradores normalmente não vêem ou não querem ver as
vantagens da mudança; de qualquer modo não conseguem visualizar de imediato as vantagens
que possam existir. Daí que, pelas várias razões focadas no ponto anterior, resistam à mudança.
A acrescentar que, os colaboradores vêem na mudança, o "fantasma" da perda do posto de

155
Gestão e Organização de Empresas

trabalho (muitas vezes com razão), não reconhecendo muitos líderes que, se trata de um valor
fundamental para os primeiros: a segurança do emprego.
De acordo com Ragen (1999), normalmente, mudanças organizacionais significativas,
provocam muitas vezes ansiedade e stress, confusão, revolta e medo. Se porventura essas
reacções não forem geridas, a organização irá ter muitos custos com esse facto, entre outros,
aumento do turnover, perdas de produtividade, redução da credibilidade na gestão da empresa
e diminuição do moral e motivação.
Também neste sentido, Difonzo e Bordia (1998), afirmam que os colaboradores vivem
com muita incerteza e insegurança um processo de mudança organizacional. Este facto, tem
como consequências a generalização de rumores, a redução dos níveis de confiança e moral,
assim como o aumento da ansiedade.
Consideram estes os autores e Ragen (1999) que, se os condutores do processo de
mudança deixarem que isso aconteça, é porque há lacunas graves na estratégia de comunicação
da mudança, devendo a mesma comunicação ser clarificada, utilizada eficazmente na difusão
da visão, objectivos, valores e das decisões relacionadas com a mudança.
Minorar e superar as reacções adversas e ambiguidades num processo de
implementação da mudança, passa não só pela comunicação e informação, como também
promover espaços de discussão sobre o futuro da empresa e sobre a mudança em particular.
Passa de igual modo, pela indispensável colaboração e cooperação de "todos" no
planeamento colectivo da mudança e pela instauração ou continuação da confiança entre
gestores e colaboradores (Difonzo e Bordia, 1998).
É certo que, estas medidas: comunicação, abertura à discussão, colaboração e iniciativa,
são importantes no sucesso de um processo de implementação de mudança, mas só existirão
se, a cultura da empresa assim o permitir (se forem práticas correntes), isto é, se forem
coerentes e convergentes com a sua cultura. Dito por outras palavras, se a cultura de uma em-
presa for caracterizada por valores como a participação, iniciativa, autonomia etc. então o
processo de mudança tem mais garantias de ter sucesso (Difonzo e Bordia, 1998).
Para superar obstáculos (relacionados com atitudes e comportamentos) à gestão de um
processo de mudança, Kurt Lewin (Luthans, 1995; Robbins, 1998; Stoner et al, 1995),
desenvolveu um modelo sequencial de três etapas, igualmente aplicável a indivíduos, grupos
ou organizações inteiras. Este implica "descongelar" o padrão actual de comportamento,
"mudar" ou desenvolver um novo padrão e em seguida "recongelar" ou reforçar o novo
comportamento.

Descongelar - implica tornar óbvia a necessidade de mudança a ponto do indivíduo, do


grupo ou da organização poder facilmente vê-la e aceitá-la. Para isso é necessário
que exista um clima de abertura e confiança.
Mudar - a mudança implica indicar um agente de mudança treinado, que irá liderar os
indivíduos, os grupos ou toda a organização durante o processo. No decorrer desse
processo o agente de mudança irá alimentar novos valores, atitudes e
comportamentos através de processos de identificação e interiorização.
Recongelar - significa transformar em norma o novo padrão de comportamento, usando
para isso mecanismos de apoio ou reforço.

156
Gestão e Organização de Empresas

3.3. - O processo de mudança


Quer a mudança tenha causas intrínsecas ou extrínsecas, o ponto de partida para a
mudança, é a situação presente (Status quo), que é insatisfatória e que cria um estado de
frustração, suficientemente forte para gerar uma massa crítica que faça desencadear a mudança
(figura 5).
De acordo com Câmara et al (1997), essa insatisfação activa e potenciadora de mudança
na empresa está necessariamente ligada à existência de uma visão futura, que se afigura
alcançável embora com esforço, e que se traduz num cenário muito mais positivo e desejável
que assegurará o sucesso continuado da empresa.
O aspecto crítico da mudança consiste no processo de transição entre a situação presente
e a visão futura, a qual não só exige uma liderança forte, como pressupõe um adequado
controlo do rumo e do ritmo da mudança.

Figura 5. O processo de mudança

Situação Transição Visão


actual futura

Insatisfação Estimular Atraente

Frustração Orientar Apelativa

Massa crítica Direccionar Alcançável


para mudar

MUDANÇA

Fonte: Câmara et al, 1997, p.169.

Num processo de mudança, há certos factos a ter em conta:


• Necessidade de manter o consenso de base sobre a necessidade de mudar, "base
social de apoio" à mudança.
• Não se deve abrandar o ritmo, ao ponto de por em causa esse consenso e de regresso
ao estádio anterior.
• O processo de mudança não deve ser implementado a uma velocidade que não se
consegue acompanhar, correndo o risco de distorções no processo.

Hoje, poucas são as empresas que não estejam de alguma forma envolvidas nalgum tipo
de transformação.
A probabilidade dos programas de mudança fracassarem é grande, porque, segundo
Kotter (1996), as empresas são sobregeridas e sublideradas. É que a mudança e um processo de
mudança que necessita muito mais de liderança do que de gestão.
O sucesso de um processo de mudança passa pela liderança porque, de acordo com
Kotter (1996), está na sua essência a resposta à melhor condução do processo, porque este,
deve ser liderado mais do que gerido. À liderança compete neste processo, estabelecer o rumo,
desenvolver a visão e as estratégias para a sua execução. Compete-lhe ainda, alinhar as pessoas
à sua visão, levando-as a entendê-la, assim como as estratégias para a executar, por forma a
157
Gestão e Organização de Empresas

aceitá-las como válidas. Cabe à liderança motivar e inspirar as pessoas para a necessidade de
mudança.
Este autor, durante a década de 80, observou os esforços de mais de uma centena de
empresas que pretendiam tornar-se mais competitivas implementando processos de mudança,
concluindo que há oito erros típicos cometidos pelas empresas.
• Permitir demasiada complacência - "deixar-se andar na onda", "sem querer andar
na crista da onda", isto é, enredadas na sua própria inércia e rotina, sem ambição
nem emoção, sem dar entender a urgência de mudança.
• Inexistência de uma equipa coesa de interessados na mudança - não deve ser a
mudança personalizada por uma só pessoa - o líder, devendo este circundar-se por
uma equipa motivada e que tenha poder para pôr em prática a mudança.
• Subestimar o poder da visão - sem uma visão, os esforços de mudança diluem-se
por uma série de projectos confusos, por vezes incompatíveis.
• Não comunicar a visão - a mudança requer sacrifícios que as pessoas só aceitarão
se compreenderem a razão da sua necessidade.
• Permitir obstáculos à nova visão - muitas iniciativas falham devido às barreiras
com que deparam as pessoas que tentam agir. As mais comuns são a burocracia e o
sabotadores influentes.
• Inexistência de vitórias de curto prazo - os esforços perdem ímpeto se não houver
objectivos de curto prazo para celebrar.
• Declarar vitória cedo de mais - depois de trabalharem empenhadamente, as pessoas
são tentadas a declarar vitória à primeira grande melhoria. A concentração e o
empenho afrouxam e a empresa pode regressar ao passado.
• Não enraizar a mudança na cultura da empresa - a mudança só sobrevive se
estiver enraizada na cultura da empresa. Há comportamentos e valores que têm de
acompanhar as mudanças.

Para rectificar ou evitar estes erros típicos, Kotter (1996), afirma que a empresa deve
adoptar um processo de oito etapas sequenciais para liderar a mudança.

As oito etapas da liderança da mudança

1. Criar um sentimento de urgência


Fazer crer às pessoas que a mudança é urgente porque a velocidade das transformações
no ambiente a isso obrigam. Levar as pessoas a não relaxarem sobre o sucesso e a
precaverem-se quanto a eventuais crises e a estarem atentas a novas oportunidades para
a empresa. Se não transformar a complacência num sentimento de urgência, não se con-
seguirá a cooperação necessária para que a mudança aconteça.
2. Criar uma Equipa (team) de interessados na mudança
Ninguém consegue liderar sozinho um processo de mudança. Os oito passos para a
liderança da mudança exigem uma equipa de líderes. Mas uma equipa cuidadosamente
seleccionada e com espírito de equipa.
3. Definir e desenvolver uma visão e a estratégia para a executar
A visão é essencial num processo de mudança porque clarifica a direcção que a empresa
está a tomar, motiva as pessoas a agir e ajuda a coordenar as acções.
4. Comunicar a visão (da mudança)
158
Gestão e Organização de Empresas

Para mobilizar a força de trabalho em torno da visão é essencial comunicá-la


eficazmente. A má comunicação é a melhor forma de desmotivar os empregados e
matar qualquer transformação.
5. Levar as pessoas a agir
Nesta fase do processo deve-se revestir de autoridade (empowerment) um conjunto
alargado de pessoas, para que ajam, removendo as barreiras que podem impedir a
mudança. Encorajar um conjunto de pessoas a chamarem a si a responsabilidade da
tomada da decisão e a aceitarem o risco, sendo devidamente compensadas por isso.
6. Criar vitórias de curto prazo
Dever-se-á planear a mudança faseadamente, com objectivos a atingir. As vitórias de
curto prazo são importantes para a motivação dos colaboradores empenhados, dando-
lhes um feedback positivo e para minar os resistentes, mostrando-lhes que a mudança
está em marcha e a produzir resultados.
7. Consolidar a transformação
Embora as vitórias de curto prazo sejam importantes, celebrá-las excessivamente pode
ser contraproducente. Dever-se-á utilizar as vitórias de curto prazo para motivar todos
para desafios e projectos mais ambiciosos, na linha do desenvolvimento da visão da
mudança.
8. Ancorar a mudança à cultura da empresa
O maior impedimento para criar e desenvolver a mudança num grupo ou empresa, é a
cultura. A maior parte da mudança nas normas e valores num processo de mudança,
deve ser levada a cabo no fim do processo de transformação e não no princípio.

Nenhum processo de mudança pode ter sucesso sem lidar com a cultura da empresa,
porque esta tem uma influência profunda na forma como as pessoas se comportam.
Há quem defenda que os projectos de mudança devem iniciar-se pela mudança da
cultura. No entanto, a cultura não é algo que se possa mudar facilmente. Só fazendo primeiro a
mudança convencendo as pessoas a tentarem novas práticas e produzindo resultados, se pode
ancorar essas novas atitudes e hábitos na cultura da empresa.
Influente e difícil de mudar, a cultura de empresa pode constituir uma ameaça a um
esforço de transformação que faça apelo a diferentes valores ou normas de comportamento. É,
nestes casos necessário mudá-la para a adequar às novas práticas. A tarefa exige acção e
paciência: acção para encorajar as pessoas a aceitarem a nova cultura; paciência para esperar
que a nova cultura se consolide. Mas nem todos os programas de transformação exigem o
desmantelar da totalidade da cultura. Em muitos casos o essencial pode manter-se válido.

.4. - A MUDANÇA DE CULTURA


4.1. - O contexto da mudança de cultura
Num processo de transformação ou mudança, há que eventualmente mudar a cultura,
isto se esta for incompatível com a nova visão e estratégia (Kotter, 1996).
Como vimos no ponto anterior, a cultura deverá ser o último passo na implementação /
liderança de um processo de mudança. Foi o que aconteceu na transformação levada a cabo
pela A.T.&T., uma das maiores empresas do mundo; Segundo Goshal (1995), neste processo
de transformação que necessitou de alguns anos para se concretizar, só após as fases de
159
Gestão e Organização de Empresas

reposicionamento estratégico e da reestruturação das operações, finalmente desenvolveu-se a


"revolução cultural". O processo foi difícil e moroso, mas com sucesso, só possível por uma
liderança forte (Goshal, 1995). Facto este que, está em consonância com Kotter (1996), quando
este afirma que a mudança necessita muito mais de liderança do que de gestão.
Se por um lado, a mudança só terá sucesso se estiver enraizada e interiorizada na cultura
da empresa (Kotter, 1996), por outro, para que haja uma predisposição ou abertura à(s)
mudança(s), necessário se torna que, na cultura da empresa se encontrem certas características
relevantes para considerá-la uma cultura de ou para a mudança.
Poder-se-á dizer que, para se encarar a mudança como um fenómeno natural, uma
empresa possuidora de uma cultura (caracterizada) de mudança, terá mais facilidade de
adequar-se ou adaptar-se às exigências da envolvente, não só ao nível estrutural, tecnológico,
mas também ao nível cultural. É o caso da organização que é focalizada externamente (no mer-
cado e no cliente), estará mais apta a alterar a sua cultura do que a que está focalizada
internamente (Williams, 1993).
Se a cultura da empresa não for possuidora de características potenciadoras de
flexibilidade, então mais dificuldades terá em adaptar-se à velocidade da mudança e assim,
sempre que se justificar implementar a mudança, ter-se-á que eventualmente proceder à
mudança de cultura.

4.2. - Conceito de mudança de cultura


Por definição, a mudança de cultura é o processo de formação ou modelagem da cultura
de uma organização, em ordem a melhorar a sua eficiência, ajudando-a a gerir com benefício
das mudanças ocorridas no seu ambiente, nos seus mercados, na sua propriedade
(administração), na sua liderança, nos seus produtos ou na sua tecnologia (Williams, 1993).

4.3. - Factores que influenciam a mudança de cultura


Os factores que podem influenciar a mudança da cultura de empresa nas organizações
são, segundo Williams (1993) os seguintes: crises financeiras, segmentação do mercado,
mudanças nas expectativas dos clientes, iniciativas da concorrência, mudança na legislação ou
tendência para a privatização.
De acordo com Thévenet (1986) e Luthans (1995), os factores que podem provocar a
mudança de cultura são, os líders, ou melhor, a mudança do líder e as forças em torno do
mercado que podem colocar a empresa numa situação de sobrevivência.
Isto está na linha de pensamento de Schein (1985), quando afirma que, o líder é o único
verdadeiro criador de cultura e é o principal actor na mudança da mesma. Por isso, quando
uma empresa muda de líder, é natural que mude de cultura. Por outro lado, se a empresa deseja
mudar de cultura, é natural que seja necessário mudar de líder, embora não seja condição
obrigatória.
De acordo com Robbins (1998), a evidência sugere que a mudança de cultura será tanto
mais "fácil" de implementar, se a maior parte, ou todas as seguintes condições se verificarem:
• Crise grave (Crise financeira, perda de grande parte dos clientes, obsolescência da
tecnologia face a um grande concorrente) - trata-se de um choque que afecta

160
Gestão e Organização de Empresas

inevitavelmente o Status quo e põe em causa a cultura actual, como que ineficaz
para enfrentar tal crise.
• Mudança na liderança - como vimos, um novo líder na empresa influenciará
concerteza a cultura existente numa empresa, já que é portador de novos valores e
experiências.
• Novas ou pequenas organizações - nas pequenas organizações é mais fácil
implementar uma nova cultura devido à simplicidade da estrutura das primeiras,
permitindo a comunicação de valores com maior facilidade. Nas novas organizações,
torna-se mais fácil a implementação de uma nova cultura, porque a cultura ainda não
está suficientemente sedimentada.
• Cultura "fraca" ou "débil" - as culturas "fracas" são mais permeáveis à mudança pela
simples razão que, quanto mais "forte" ou antiga for a cultura, mais consolidada e
interiorizada está nas pessoas.

4.4. - Processo de mudança de cultura


Ao pretender-se implementar um processo de mudança de cultura de empresa, torna-se
necessário previamente conhecer as forças relacionadas com a propensão da empresa para
mudar a sua cultura. Williams (1993), com base na análise que fez de algumas organizações,
foi-lhe possível evidenciar uma relação de forças, que se estabelecem num processo de mu-
dança de cultura, conforme explicitado na figura seguinte.

Figura 6. Modelo de campo de forças relacionado com a propensão de uma organização


para mudar de cultura
FORÇAS INCENTIVANDO A MUDANÇA DE FORÇAS RESTRINGINDO A MUDANÇA DE
CULTURA CULTURA

Mudança para o topo Organização baseada na carreira

Influências do poder externo Baixa rotação

Visão do futuro Sucesso

Poder do líder Ambiente estável

Aceitação da necessidade de mudar Critério de sucesso não visível

Externamente focalizada Vazio de autoridade


Crise ou oportunidade

Fonte: Williams, 1993, p. 106.

Robbins (1998), sugere por seu turno, um conjunto de considerandos a ter em conta no
processo de mudança da cultura:
- Ter gestores de topo que compreendam, interiorizem e que considerem como válidos
os novos valores da nova cultura a ser implementada, para que sirvam de modelos de
161
Gestão e Organização de Empresas

comportamento.
- Criar novas histórias, símbolos e rituais para substituir os actuais.
- Seleccionar, cativar e apoiar colaboradores que adoptem e defendam os novos
valores numa fase de validação.
- Redesenhar todo o processo de socialização, por forma a adequar-se aos novos
valores.
- Mudar o sistema de recompensas com vista a encorajar a aceitação dos novos
valores.
- Trabalhar para obter um clima de grande confiança, através da cooperação e
participação de "todos" na construção da nova cultura.
- Afastar subculturas ou comportamentos não consensuais localizados, através de
rotação de pessoal, transferência ou limitações nas tarefas.
- Substituir comportamentos, normas formais e regulamentos que sejam muito rígidos.

Por seu lado, Luthans (1995) acrescenta ainda:


• Sensibilizar para a necessidade da mudança de cultura explicando o contexto da sua
mudança.
• Possibilitar espaços de discussão da nova visão, futuro e estratégia da empresa, as
quais sem uma cultura compatível não terá sucesso.
• Enfatizar a comunicação como instrumento imprescindível da gestão da cultura.

4.5. - O líder e a gestão da cultura


Nem sempre é necessário mudar de líder para mudar a cultura porque, esta pode ser
gerida, adaptada e sofrer evoluções. Depende afinal do perfil do líder, no que concerne à sua
capacidade de gestão da cultura.
A gestão da cultura numa empresa, pressupõe o desenvolvimento de valores partilhados
pelos seus membros, fomentando a identidade comum. Por outro lado, esta gestão da cultura,
terá que fundamentar-se no desenvolvimento de uma forte identidade através de uma partilha
de valores que se manifestem em padrões de actuação desejáveis ao contexto organizacional e,
simultaneamente, gerir o efeito da transformação dos valores em pressupostos básicos que não
sejam mais tarde indutores de perda de flexibilidade organizacional (Schein, 1985). Segundo
este autor, o líder é o principal actor da mudança e gestão da cultura.
Neste contexto e de acordo com Thévenet (1986) e Schein (1985), o papel do líder na
gestão da cultura é diferente, consoante se trate dos diferentes estádios ou fases de
desenvolvimento da empresa.
Assim, na primeira fase - criação da empresa, o líder transfere as suas hipóteses básicas
e a visão da empresa que idealiza. Os seus valores serão "transportados" para a jovem
organização, tendo como objectivo assegurar a sua estabilidade e fortalece-la em torno de um
equilíbrio social e emocional (Thévenet, 1986).
Na fase de crescimento da empresa, a cultura toma um papel mais activo, em particular
quanto às formas de funcionamento, políticas e decisões (consolidação da cultura). Neste
estádio precisa Schein (1985), o líder deve averiguar em que medida a cultura pode ajudar ou
servir de obstáculo à organização no desempenho da sua missão. Em último caso, o líder deve
ser capaz de utilizar as suas capacidades para proceder às adaptações necessárias. Resta saber,

162
Gestão e Organização de Empresas

se o líder terá a capacidade ou perfil para proceder a essa adaptação. Aqui, o líder é um
observador da cultura, encarregado de explorá-la, de utilizar os seus pontos fortes e prevenir
incoerências em relação às hipóteses fundamentais (Thévenet, 1986).
Na fase de maturidade, a cultura desempenha plenamente o seu papel. Os problemas
surgem se se descobre que, esta não permitiu que a empresa pudesse enfrentar os desafios da
organização. Neste caso, o líder deve munir-se de uma grande força psicológica e de uma
motivação e ter consciência do que ocorre com a organização, para desempenhar o seu papel
de "motor" da evolução da cultura (Schein, 1985); (Thévenet, 1986).
O líder proporá novas direcções para a empresa, mas tendo em consideração, a
importância da segurança e estabilidade dos seus membros. É este o paradoxo do papel de
gestor da cultura que desempenha ou deve desempenhar o líder: este deve impulsionar e gerar
um sentimento de segurança durante todo o processo de mudança de cultura (Thévenet, 1986).
Estas três fases correspondem às três funções de gestor da cultura do líder: criação,
consolidação e maturação.
De referir que, e segundo Schein (1985), o modelo das três etapas de Kurt Lewin
(modelo este desenvolvido por Schein), é válido e indispensável num processo de mudança de
cultura.
A cultura organizacional, como vimos, pode simplesmente evoluir e adaptar-se. Caso o
não tenha feito, a empresa terá mesmo de mudar a sua cultura, numa tentativa de responder
mais eficientemente às necessidades do mercado numa perspectiva de sobrevivência. Por
vezes, essa mudança tem subjacente a eliminação de constrangimentos à criatividade e
inovação.

5. - CULTURA E INOVAÇÃO
5.1. - A necessidade de inovar
A rapidez da difusão tecnológica no mundo, a explosão do comércio mundial, a evolução
das tecnologias da informação, entre outros aspectos, tudo isto faz com que a empresa actual
viva sob uma pressão concorrencial nunca antes conhecida.
Os produtos e os serviços são postos em causa cada vez mais rapidamente. Para assegurar
a sua continuidade, a empresa “está condenada” a fazer evoluir a sua oferta em permanência.
É que, «é preciso que nos convençamos de que é o produto que faz o êxito da empresa. Uma
marca, mesmo que conhecida e apreciada, não consegue viver se os seus produtos
envelhecerem. Quando já não se possui o produto competitivo, nem o material, nem a marca e
a sua notoriedade, nem os meios poderão fazer nada» (Prouvost, 1992, p. 19).
Inova-se antes de mais, para assegurar a continuidade e a sobrevivência da empresa.
Peters (1987), assim o entende quando afirma, que as empresas que têm conseguido
sobreviver ao caos por terem optado por um ritmo de inovação rápida e constante, são as
únicas com grandes probabilidades de sobrevivência nos próximos anos. Nesta linha de
pensamento, Kanter et al (1997) acrescenta ainda que, de facto, a inovação sistemática e
perpétua passou a fazer parte da cultura e actividade destas empresas, como forma de assegurar
o sucesso futuro.
Inovar não é um fim em si mesmo. É um meio de assegurar os objectivos de
continuidade, desenvolvimento e rentabilidade da empresa.

Afirma Prouvost (1992) que, quando corre tudo bem na empresa, quando os seus
163
Gestão e Organização de Empresas

produtos de hoje têm sucesso, "ninguém" põe em causa que esses mesmos produtos, no futuro,
já não se venderão. Quando isso acontecer, será talvez demasiado tarde.
Deverá porventura existir na empresa, um sentimento de urgência como diz Kotter
(1996), isto é, uma atitude permanente da empresa que examine o mercado e a realidade
competitiva que a envolve, identificando potenciais crises, assim como eventuais
oportunidades.
Afinal, inovar também porque, como diz Prouvost (1992), devemos ser os primeiros a
chegar ao mercado. O primeiro agarra uma parte que em seguida, será muito difícil aos outros
conquistar.

5.2. - Definição de inovação


Após análise à diversa bibliografia constatámos que, vários autores concentravam as
suas definições nas fases do processo de inovação, isto é, a ideia, tradução da ideia em novos
produtos, etc, e colocação dos mesmos no mercado com grande sucesso.
Assim é em Philips (1991, p.484) que, considera inovação como «the movement of an
idea from its conception to commercial sucess, either as a product or a process».
Essa associação de conceitos está também patente em Kanter et al (1997) quando
afirmam que, a inovação é o processo de dar às ideias utilização prática e produtiva,
acrescentando que, se trata do desenvolvimento de ideias em produtos, que resultam após
colocação no mercado, num grande sucesso.
Para Prouvost (1992), trata-se do lançamento no mercado, com sucesso de um produto
ou de um serviço novo após um processo de desenvolvimento de uma ideia.
Das definições anteriores resulta que, a inovação se avalia pela bitola do cliente e não
pela do produtor, isto é, pelo comportamento dos clientes e não pela tecnologia integrada.
Concluir-se-á que, para que seja inovação, para além da concretização da ideia, é necessário
que esta tenha resultado num sucesso comercial. Doutra forma não será inovação. Estas
definições têm conteúdo muito preciso e limitado, ao contrário das seguintes.
Assim, Kuczmarski (1996, p.1), refere-se a inovação como «a mindset, a pervasive
attitude, or a way of thinking focused beyond the present into the future».
Este autor, entende inovação como uma atitude natural e permanente que permite à
empresa ver para além do presente e criar a visão do futuro. Esta definição tem como subjacente,
que a empresa e os seus negócios, são conduzidos por uma lógica e atitude de inovação
extensível à empresa como um todo e não só ao produto ou serviço.
Por outro lado Drucker (1998), define inovação como, o esforço para criar uma mudança
intencional e centrada no potencial económico ou social de uma empresa.
Nesta definição está implícito que a inovação é resultante de um espírito empreendedor,
da personalidade e capacidades empresariais não só dos líderes, mas também da empresa no
seu conjunto, dirigidos para a prática sistemática da inovação.
A este propósito, isto é, que a inovação resulta duma prática sistemática e intencional
enquadra-se na primeira classe da taxonomia proposta por Freeman e Perez (1988) que integra
quatro classes (Dosi et al, 1988):
1. Inovações incrementais: ocorrem quase continuamente em qualquer indústria
sobretudo como resultado de invenções e melhorias sugeridas por técnicos da
produção ou utilizadores.
2. Inovações radicais: são o resultado descontínuo de actividades de I.&D. nas
empresas ou em organismos universitários e estatais.
164
Gestão e Organização de Empresas

3. Mudanças de sistema de tecnologia: são grandes mudanças tecnológicas que afectam


vários sectores da economia ou originam outros. Baseiam-se numa combinação de
inovações radicais e/ou incrementais e de inovações organizacionais e de gestão que
afectam várias empresas. Foram o caso das inovações em materiais sintéticos, na
petroquímica e no equipamento usado na estrusão na indústria de plásticos.
4. Mudanças no "paradigma técnico-económico": correspondem às revoluções
tecnológicas que ocorrem nos sistemas de tecnologia e conduzem à emergência de
uma nova gama de produtos, serviços e indústrias, afectando directa ou
indirectamente quase todos os outros sectores da economia.

Caraça (1986, p.335), apresenta uma visão também abrangente do conceito de inovação,
alargando as suas fronteiras até à àrea do social, do serviço à comunidade, considerando-a
como, «a primeira introdução de um novo produto, processo ou sistema na actividade
comercial ou social normal de um país».

5.3. - Fontes e determinantes de inovação


Hoje é necessária uma inovação regular e permanente, para todas as empresas de todos
os tamanhos e feitios (Peters, 1990).
Existem obviamente, inovações que provêm de rasgos de genialidade. No entanto, a
maioria destas e, especialmente, as de maior sucesso, resultam de uma procura consciente e
intencional de oportunidades de inovação (Drucker, 1998).
Na linha deste último autor, está Philips (1991) quando afirma que, em muitas
indústrias, as inovações ocorrem através dos esforços de investigação incremental no interior
das empresas, quer seja em produtos ou processos, e raramente inovações do tipo radical que
signifiquem um corte radical com a tecnologia existente. Assim, as preocupações com a
inovação centram-se antes de mais nos pequenos melhoramentos que são introduzidos, sem
esquecer contudo, a pressão do mercado sobre as actividades da empresa (Marques, 1998).
Kline e Rosenberg (1986) identificaram dois tipos de forças que afectam a actividade da
inovação que interactuam entre si. De um lado está a força do mercado, que proporciona
mudanças contínuas nas oportunidades de comércio para categorias específicas de inovações;
aliás a grande maioria de inovações tecnológicas foram realizadas em resposta às condições de
mercado (Stoner et al, 1995); por outro lado, encontra-se a força do progresso nas áreas
científicas e tecnológicas de ponta, sugerindo por vezes possibilidades para novos produtos, ou
melhoramentos na performance dos mais antigos, ou ainda produzindo outros produtos a mais
baixo custo.
Esta força do progresso tecnológico e científico por sua vez, é fruto da experiência e
aprendizagem do processo de inovação no interior das empresas. É que, e de acordo com
Drucker (1987), à medida que se cresce no processo de aprendizagem, os intervenientes,
engenheiros, investigadores, terão muitas oportunidades de acumular em Know-how
experiências necessárias a uma evolução potencial.
Nesta mesma linha de pensamento, Drucker (1998), para quem uma inovação
sistemática e intencional inicia-se com a análise das fontes de novas oportunidades, identificou
sete fontes de oportunidade inovadora que se encontram facilmente no interior das empresas
ou das indústrias:
1. Ocorrências inesperadas - o sucesso ou fracasso inesperados, podem revelar
mudanças latentes, no mercado, nos produtos, na tecnologia, etc., e por isso
165
Gestão e Organização de Empresas

oportunidades a explorar, fazendo-nos afastar as noções pré-concebidas, os nossos


pressupostos, as nossas certezas;
2. Incongruências - as incongruências, de natureza qualitativa, reflectem realidades
económicas contraditórias, onde determinados valores e expectativas dos
consumidores se contradizem com a realidade concreta:
3. Necessidades de processo - baseia-se nas necessidades sentidas pelas empresas
relativamente aos processos produtivos, dependendo da existência de conhecimento
científico e técnico novos;
4. Estrutura de sector empresarial ou do mercado - reflecte as alterações e
mudanças na estrutura das indústrias, derivada de um rápido crescimento de um
sector económico (ex: sector automóvel), ou quando esse sector atinge o dobro do
seu tamanho, ou devido a convergências de tecnologias que até então eram vistas
separadamente;
5. Alterações demográficas - relaciona alterações na estrutura etária da população, na
sua composição, no aumento ou diminuição das taxas de mortalidade ou natalidade,
no emprego, etc., que possam constituir oportunidade inovadora;
6. Alterações na percepção - prende-se com as diferenças de percepção que podem
ocorrer, por parte das empresas, derivadas do enfoque perspectivado pela expressão:
"o copo está meio cheio, ou o copo está meio vazio";
7. Novos conhecimentos - engloba as formas tradicionalmente entendidas como fontes
de inovação, podendo ter ou não carácter científico. Esta fonte é a mais arriscada,
incerta e imprevisível, já que quase nunca se baseia em um só factor, mas na
convergência de vários tipos de conhecimentos, e nem todos eles científicos ou
tecnológicos.

5.4. - Princípios da inovação


Drucker (1998) elegeu cinco essenciais princípios que devem enquadrar a actividade
inovadora, para permitir que as organizações inovem com maior eficácia:
• Atenção ao mercado - como a inovação é conceptual e perceptiva, os possíveis
inovadores precisam de ver, perguntar e ouvir. Seguidamente, devem procurar
potenciais utilizadores para estudarem as suas expectativas e necessidades.
• Simplicidade - para ser eficaz, uma inovação deve ser simples e centralizada. O
maior elogio que uma inovação pode receber mede-se pelas seguintes palavras: «Isto
é óbvio! Por que motivo não pensei nisso? É tão simples!» Mesmo a inovação que
cria novos utilizadores e mercados deverá ser direccionada para uma aplicação
específica.
• Especificidade - as inovações eficazes começam por ser pequenas. Tentam fazer
algo específico. Poderá ter sido a ideia elementar de colocar o mesmo número de
fósforos em todas as caixas (costumavam ser 50) que deu aos suecos um monopólio
mundial durante meio século. Pelo contrário, ideias que «revolucionam uma
indústria» dificilmente funcionam.
• Aspirações à liderança - ninguém poderá prever ser uma determinada inovação se
transformará num grande negócio ou num feito modesto. Mas uma inovação de
sucesso deverá aspirar, desde o início, a representar um standard, a determinar a
direcção de uma nova tecnologia ou indústria. Se uma inovação não aspira à

166
Gestão e Organização de Empresas

liderança desde o início, é pouco provável que seja inovadora o suficiente.


• Persistência - acima de tudo, uma inovação requer mais trabalho do que
genialidade. Exige conhecimento. Os inovadores raramente trabalham em mais do
que uma área. Thomas Eddison, por exemplo, trabalhava estritamente no campo
eléctrico. Na inovação, existe talento, ingenuidade e conhecimento. Mas quando
tudo está dito e feito, o que a inovação exige é trabalho árduo, centralizado e
intencional.

5.5. - A cultura e o ambiente de inovação


A criatividade e a inovação dependem do elemento humano e da cultura organizacional
existente. Assim, mais e mais organizações buscam meios de encorajar e estimular a
criatividade e a inovação tanto ao nível individual quanto ao nível organizacional (Peters,
1990). Explicitamente, o autor considera a cultura e os recursos humanos da empresa, como
factores essenciais ao desenvolvimento da inovação.
Nesta linha, encontra-se Robbins (1998), quando considera para além destes, também a
variável estrutural, como de significativa importância à criação de um clima propício à inovação
na organização.
Na nossa perspectiva, consideramos que a cultura terá igualmente influência nos outros
factores, estrutura organizacional e recursos humanos. Todas estas variáveis em conjunto,
contribuem dinamicamente para a criação de um ambiente interno que possibilite um clima
para a exploração de novas ideias e novos modos de realizar as coisas.
Poder-se-á então considerar que, possa existir uma cultura para a inovação, isto é, uma
cultura que dada as suas características, catalize o desenvolvimento da inovação.
Uma cultura será orientada para a inovação se o líder e os gestores o forem. Como disse
Drucker (1998), a organização será inovadora se o líder tiver visão inovadora e capacidade
empresarial para levar a cabo a inovação.
Também Prouvost (1992) refere que, um líder animado de espírito inovador é uma
condição necessária, mas não suficiente para a inovação na empresa. Considera o autor que, na
empresa todos devem sentir-se investidos do poder e do dever de contribuir para a inovação.
Kuczmarski (1996) partilha desta última opinião, isto é, que deverá existir um total
envolvimento de todos os membros da empresa; os gestores de inovação, que dirigem as
equipas de inovação; os gestores de topo, que dirigem essas equipas, devendo estes actuar
positivamente e proactivamente, apoiando e motivando os gestores de inovação; as equipas de
inovação que devem possuir optimismo, auto-confiança e paixão pela inovação.
Como vimos, para se criar um ambiente de inovação na empresa, ter-se-á de atender a
três ordens de factores: estrutura organizacional, recursos humanos e cultura organizacional,
esta última como que inspiradora das primeiras.

5.5.1. - Estrutura organizacional


Representa um papel muito importante numa estratégia de inovação, porquanto as
organizações com estruturas rígidas e pesadas, com elevada formalização com a decisão
centralizada, inibem a comunicação interna entre departamentos e bloqueiam a iniciativa
individual. Autores como Stoner et al (1995), Robbins (1998), Prouvost (1992), Kuczmarski
(1996) e Clark (1995), sublinham esse facto.
Numa estratégia de inovação, torna-se necessário um alto grau de integração entre as
167
Gestão e Organização de Empresas

várias unidades da organização, ou seja, estruturas horizontais constituídas por equipas


multidisciplinares e multifuncionais de inovação, que poderão incluir representantes da
investigação, marketing, produção, engenharia e vendas. O objectivo deste tipo de estrutura, é
o de encorajar formal e até informalmente, a comunicação inter-departamental e a partilha de
informações acerca de projectos, ideias e tecnologias. Com este facto obtém-se maior
performance, rapidez e qualidade a menor custo (Kanter et al, 1997).
Deverão as organizações apostar em estruturas flexíveis, com grande mobilidade que
possibilitem o nascimento e desenvolvimento de ideias, assim como a iniciativa individual e
autonomia versus responsabilidade. Isto, só poderá acontecer se, a cultura da empresa o
possibilitar, isto é, se a sua cultura estiver em consonância com tais valores e princípios.

5.5.2. - Recursos humanos


Trata-se de um elemento-chave numa estratégia de inovação ou mudança. Se queremos
uma organização inovadora, dever-se-ão recrutar pessoas imaginativas, criativas e produtivas,
assim como possuidoras de bons conhecimentos técnico-científicos.
Às pessoas envolvidas no processo de inovação, pedir-se-á apetência pelo risco e pela
aprendizagem contínua, que não tenham medo de errar, iniciativa, proactividade, flexibilidade,
responsabilidade e disciplina, gosto pelo trabalho em equipa, empenho pela excelência e
confiança em si e nos outros. Oferecer-se-á segurança de emprego, motivação baseada num
sistema de recompensas com base na performance, mas também numa cultura organizacional
aberta, de valorização, participativa, que proporcione autonomia e "independência", que por
sua vez favoreça a criatividade e auto-estima. (Stoner et al, 1995; Kanter et al, 1997).
Segundo Stoner et al (1995), são seis os princípios que deveriam fazer parte duma
cultura que estimule a criatividade e motivação dos recursos humanos para a inovação.
1. Desenvolver aceitação às mudanças. Os membros da organização têm que acreditar
que a mudança tanto irá beneficiá-los como beneficiará a organização. Essa crença terá
mais probabilidade de surgir se os membros participarem com seus superiores na tomada
de decisões, e se questões como a estabilidade no trabalho forem tratadas com cuidado
durante o planeamento e a implementação de mudanças.
2. Encorajar novas ideias. Dos gestores de topo aos superiores de nível mais baixo têm
que deixar claro através de palavras e acções que novas abordagens serão bem-vindas.
Para encorajar a criatividade, os gestores devem estar dispostos a ouvir as sugestões dos
subordinados e a implementar as que sejam promissoras - ou levá-las aos gestores de
nível mais alto.
3. Permitir mais interacção. Um clima permissivo e criativo é estimulado quando se dá
aos indivíduos a oportunidade de interagir com membros do seu próprio grupo ou det al
grupos de trabalho. Essa interacção encoraja a troca de informações úteis, o livre fluxo
de ideias e novas perspectivas sobre os problemas.
4. Tolerar o fracasso. Muitas ideias novas mostram-se pouco práticas ou inúteis. Os
gestores eficazes aceitam e permitem o facto de que tempo e recursos serão investidos
experimentando novas ideias que não vão funcionar.
5. Estabelecer objectivos claros e dar a liberdade para alcançá-los. Os membros da
organização devem ter um propósito e um direccionamento para a sua criatividade.
Fornecer directrizes e restrições razoáveis também dará aos gestores algum controlo
sobre a quantidade de tempo e de dinheiro investidos no comportamento criativo.

168
Gestão e Organização de Empresas

6. Mostrar reconhecimento. Os indivíduos criativos motivam-se para trabalhar duro em


tarefas que lhes interessam. Mas, como todos os indivíduos, eles gostam de ser
recompensados por uma tarefa bem realizada. Ao mostrar reconhecimento através de
coisas tangíveis como bonificações e aumentos de salário, os gestores demonstram que
o comportamento criativo é valorizado na sua organização.

5.5.3. - Cultura organizacional


Parece evidente que a propensão para a inovação numa organização, assim como, esta
poder tornar-se mais inovadora, passa pela dinâmica, caracterização e pelo desenho da cultura
organizacional, sendo esta e a inovação factores de sucesso na gestão das empresas.
Peters (1997) faz alusão a este trinómio, cultura-inovação-sucesso, quando afirma que, a
inovação sistemática e perpétua passou a fazer parte da cultura e criatividade das empresas
como forma de assegurar o sucesso futuro (Kanter et al, 1997).
A cultura é importante para fomentar um clima e um espírito de animação e motivação
em torno da inovação, podendo apoiar ou inibir o desenvolvimento e o uso de ideias criativas.
Deverá promover um ambiente que encoraje a exploração de novas ideias e novos modos de
realizar as coisas (Stoner et al, 1995). A cultura para a inovação deverá:
• Ser capaz de encorajar a participação, a iniciativa individual, o espirito de equipa e de
cooperação.
• Caminhar no sentido de homogeneizar comportamentos de forte cumplicidade,
comprometimento e identificação em torno do objectivo de inovação, assim como
fomentar o espírito inovador.
• Promover a comunicação interna de forma horizontal, eficiente e descentralizada por
forma a procurar obter sinergias entre os envolvidos na inovação, tal como divulgar o
espírito inovador.
• Procurar a descentralização da decisão, privilegiando a autonomia a níveis hierárquicos
mais baixos.
• Ser valorizadora das potencialidades das pessoas, humanista e de desenvolvimento
pessoal.
• Proteger e incentivar quem queira correr riscos a pensar criativamente.
• Focalizar-se no mercado e no cliente, o que exige flexibilidade a todos os níveis.
• Ser adaptativa, flexível, propensa à mudança e fomentar a aprendizagem contínua quer a
nível individual ou organizacional (learning organization).
Uma cultura para a inovação, assente nestes princípios, só será possível se, as "faces visíveis
da cultura organizacional", forem coerentes entre si potenciando uma cultura de acção
inovadora. Desta forma, a liderança deverá ser democrática, transformacional e visionária, e
com a sua visão partilhada, orientar estrategicamente a empresa para a inovação. Deverá ainda
ter capacidade empreendedora e espírito inovador.
Por outro lado, o estilo de gestão do líder deverá ser participativo e com abertura às
sugestões e às contribuições de todos, possibilitando a descentralização da decisão e a
autonomia.
Assim, podemos concluir que a inovação deverá estar alicerçada na cultura da empresa
para ganhar consistência. Esta por sua vez, consubstanciar-se-á na estratégia através de valores,
sendo um desses valores estratégicos - a inovação.

169
Gestão e Organização de Empresas

De acordo com Kuczmarski (1996), a inovação é um estado de espírito, é uma nova


forma de pensar a estratégia e as práticas da empresa.
Para o mesmo autor, a inovação não deverá só caracterizar a gestão da empresa, mas
mais do que isso, um valor cultural com poder para ganhar vantagem competitiva.
No actual contexto competitivo, as empresas deverão então considerar, a inovação
permanente e sistemática e a abertura e apetência pela mudança, conjugada com a
indispensável flexibilidade organizacional, como valores prevalecentes da sua cultura e de base
da sua estratégia e visão de futuro, sob pena de perder poder concorrencial.

CONCLUSÕES

É já um lugar comum, a definição de que vivemos actualmente num contexto altamente


instável, onde as verdades de hoje não o serão amanhã. Esta mudança permanente, que se
verifica a todos os níveis, social, económico, político e tecnológico, etc., tem-se manifestado
com características e consequências imprevisíveis. Nesta linha, poder-se-á dizer que o contexto
tecnológico actual é um contexto altamente incerto, já que, o seu dinamismo e a sua
complexidade são muito elevados.
O conceito de dinamismo do contexto tem a ver com a taxa e frequência de mudança,
que, no caso da inovação tecnológica se caracteriza, como ficou dito anteriormente, por um
sem número de pequenas inovações com características iminentemente incrementais e
raramente de natureza radical, que suponham um corte com a tecnologia anterior.
A complexidade do contexto da inovação tecnológica tem a ver com a diversidade das
influências com que a empresa tem de se confrontar, com o nível de conhecimentos
necessários para tratar tais influências, e com a inter-relação existente entre as diversas
influências do contexto.
Assim, já não basta dispor de tecnologia avançada, de uma sólida estrutura financeira,
de uma boa posição no mercado ou de Know-How, para assegurar o sucesso ou mesmo a
sobrevivência a tais influências contextuais. Torna-se necessário que essas vantagens sejam
sustentadas por uma estratégia apoiada na visão, na cultura e baseada na inovação, tal como na
institucionalização da mudança pela empresa.
Em síntese, no mundo dos negócios de hoje, em constante efervescência, a apetência, a
atitude e o espírito com que as empresas encaram a inovação e a mudança, são requisitos
estratégicos-chave para o sucesso e sobrevivência das organizações.

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Gestão e Organização de Empresas

TEXTO Nº 9
Conceitos Fundamentais de Marketing
Madalena Eça de Abreu

O presente documento pretende ajudar os alunos da unidade curricular de Introdução à


Gestão de Empresas na compreensão do fenómeno e disciplina de marketing. Mais ainda, espera-
se conseguir um texto fácil e ágil de ser apreendido para que o estudante se sinta motivado para
aprofundar esta área e até, de futuro, trabalhar com paixão nesta área do marketing.

1. Síntese histórica

O marketing é hoje uma realidade incontornável no mundo das organizações. Isto é, quer
estejamos na presença de uma empresa, seja ela micro ou uma multinacional, quer estejamos a
trabalhar numa instituição como uma escola pública ou um hospital, o marketing é uma área
fundamental para a sobrevivência e bom funcionamento da organização.

A importância da disciplina e da função de marketing não foi sempre avaliado da mesma


forma. Com efeito, a importância, seriedade e valor desta disciplina só recentemente foram
notados. A sua história, enquanto conceito estudado de forma consciente e sistemática e área
fundamental de qualquer organização, desenvolve-se apenas no século passado, embora a
discussão sobre a sua prática seja uma constante entre os académicos desta área. Por
conseguinte, é comum ouvir-se a questão: até quando se viaja no tempo para situar a emergência
das práticas do marketing. E esta discussão é tanto mais empolgante e intrincada quanto é
iniciada com a problemática do se entende por marketing.

Por exemplo, Abratt e Sacks (1988) afirmam que o marketing “enquanto sistema de troca
económica... existe desde tempos imemoriais.” (p. 497). Se levarmos em linha de conta um livro
americano que aplica as práticas do marketing às diferentes igrejas, o livro Marketing for
Congregations (Shawchuck et al., 1992),o leitor confronta-se com a argumentação de que a “...
bíblia está repleta de exemplos de técnicas de marketing por indivíduos que perseguem objetivos
honoráveis.” (p. 43) e o histórico Moisés já fazia investigação de mercado. Os autores Kotler e
Roberto (1989) postulam que as campanhas sociais atuais, e cada vez mais em voga, remontam
a tempos imemoráveis. São exemplo disso as campanhas nas antigas Grécia e Roma para se
libertar os escravos, as campanhas sociais durante o período da Revolução Industrial
Gestão e Organização de Empresas

em Inglaterra com o intuito de melhorar as condições de trabalho de mulheres e crianças, ou


ainda as campanhas políticas na América do final do século XVIII. Outro autor, Fullerton (1988),
refere que as práticas de marketing de meados do século passado já eram, ainda que de formas
incipientes, utilizadas no tempo de Cristóvão Colombo. Outros autores, como é o caso de Stanton
(1978), já situam o nascimento do marketing moderno na Revolução Industrial, mas ainda assim,
reiterando que outras formas de práticas semelhantes ao marketing dos tempos atuais já podiam
ser identificadas desde que há registos históricos de trocas de produtos entre diferentes pessoas.

Mas é só no início do século XX que o marketing começa a ser objeto de estudo. Com efeito,
o marketing surge conceptualizado enquanto tendência e suporte da economia (Cochoy, 1999;
Sheth e Parvatiyar, 2000), com o intuito de se aprofundarem aspetos do comportamento de
mercado e funções da distribuição (fenómenos que se enquadram na macroeconomia). Quer
dizer, o objetivo pretendido é a integração dos termos comércio e distribuição. Nas décadas de
vinte e trinta o contexto do marketing é ainda a economia mas com o enfoque claro na distribuição
e na eficiência dos canais de distribuição.

Ao mesmo tempo, outros acontecimentos anunciam outras áreas que mais à frente, serão
incorporadas no corpo do marketing. É assim que em 1915 surge a primeira associação de
publicitários, iniciada por um professor de publicidade, de nome Walter Scott. Em 1916 L. Weld
escreve o primeiro manual de marketing e em 1923 convoca economistas com interesse nas áreas
comerciais para o início da primeira associação de professores desta nova área. E é já 1937 que
surge a famosa American Marketing Association (AMA). Os anos trinta do século passado são
também o palco do crescimento das diferentes estratégias de preços, fruto da exponencial
concorrência, poder dos consumidores e, claro, fruto direto dos efeitos catastróficos da Grande
Depressão.

Após a famigerada II Grande Guerra Mundial, na década de cinquenta do século passado, o


marketing passa a ser uma disciplina dentro da gestão de empresas ensinada nas universidades,
utilizando uma metodologia científica (Sherry, 1995; Cochoy, 1999; Silva, 2008). Agora, a questão
central do marketing passa a ser “o fenómeno de determinação de valor, intimamente
ligado à troca” (Sheth e Parvatiyar, 2000, p. 9). Ainda é em meados da década de cinquenta,
que surge o marketing concept (ou a filosofia do marketing), passando a função do marketing
a ser considerada como a principal dentro de várias empresas.

Mas o que vem a ser esta nova filosofia, ainda hoje uma atitude básica de qualquer empresa
ou outra organização. Em suma, a satisfação do cliente passa a ser a própria máxima da
organização, tendo em vista a obtenção de lucro; portanto, o marketing é olhado como uma
filosofia de satisfação do cliente, e também como um conjunto de técnicas da função

174
Gestão e Organização de Empresas

empresarial (Mestre, 1996). Dito de outra forma, o marketing concept postula a orientação para
o consumidor da parte da empresa, tendo como moldura o marketing integrado dentro da
empresa, sendo os dois objetivos perseguidos em estreita sinergia: a satisfação do consumidor
como meio de obter um lucro de longo prazo.

A evolução desta atitude, ou filosofia, do marketing pode ser perspetivada através da seguinte
evolução (querendo dizer que alguns autores utilizam um critério evolucionista para explicar esta
“revolução”): o modelo produção-vendas-marketing - orientação para a produção de 1900 a 1930,
uma orientação para as vendas entre 1930 e 1950, uma orientação para o mercado a partir de
1950 (Abratt e Sacks, 1988; Cochoy, 1999).

Já Lambin (2000) discorda em parte desta visão contrapondo com a seguinte categorização:
marketing passivo, marketing operacional ou da organização e marketing estratégico ou ativo. E,
na sua opinião, a empresa deve adotar uma atitude relativamente ao marketing dependendo do
que considera prioritário, admitindo que em cada momento histórico podem coexistir estas
diferentes fases em diferentes empresas.

Ainda em 1954 Peter Druker afirmou que a criação de um cliente satisfeito é a única definição
válida do objetivos do negócio e que o marketing é toda a empresa vista pelo cliente, sendo uma
responsabilidade a ser partilhada por todos quanto trabalham na empresa. Atualmente, a relação
entre a satisfação do consumidor e o desempenho financeiro no longo prazo de uma empresa
está definido pela academia do marketing (Raithel et al., 2012). Já em 1960 Levitt declarou que
a orientação ao cliente é a única forma de estar no negócio que pode viabilizar uma empresa;
portanto, o marketing é uma preocupação de toda a organização, não é apenas uma função.

CONCEITO DE MARKETING

Orientação para
o cliente
Actividades
Satisfação
coordenadas
do cliente
de marketing
Objectivos de
desempenho da
organização
Sucesso da
Organização

Em suma, nos anos sessenta acentua-se a orientação para o cliente e ainda a importância
do “marketing-mix”, um conceito central à gestão do marketing (que será exposto mais à

175
Gestão e Organização de Empresas

frente).

Em 1969 Kotler e Levy propõem novos sectores de aplicação para o marketing no famoso
artigo "Broadening the Concept of Marketing" (publicado no Journal of Marketing), o que
significa que o marketing não se limita às “transações do tipo compra/venda”. Agora, principia-
se uma era na qual o marketing é visto como uma ferramenta essencial e extremadamente útil
para um conjunto vasto de atividades sociais. Estas atividades, com efeito, vão desde a política
às escolas, passando por causas sociais. Em suma, o marketing é declarado como sendo de
utilidade social, já que pretende servir e satisfazer as necessidades humanas, antecipando os
produtos que vão ser necessários e é aplicado em organizações que têm em comum o servir os
interesses de grupos particulares.

Nos anos setenta começa a desenvolver-se o denominado o marketing social. “O termo


“social marketing” foi introduzido em 1971 para descrever o uso dos princípios e técnicas de
marketing para ajudar uma causa, ideias ou comportamentos sociais.”… O marketing social quer
dizer, então, “uma tecnologia de gestão para uma mudança social envolvendo a conceção,
implementação, e controlo de programas que têm o objetivo de aumentar a aceitação de uma
ideia ou prática social em um ou mais grupos de audiências (adaptantes) alvo (Kotler e Roberto,
1989, p. 24). Quer isto dizer, faz-se uso dos princípios e técnicas de marketing para apoiar uma
causa social, ideia ou comportamento, o que implica que se trata de uma estratégia para mudar
o comportamento.

É também por esta altura que o marketing passa a ser tarefa do nível de direção da empresa
iniciando-se uma tendência de centralização. Nos anos oitenta, a função de marketing
descentraliza-se nas grandes empresas. É por esta altura que surgem as chamadas unidades
estratégicas de negócio e com e a função do marketing tem de adaptar-se e, em algumas
situações, é absorvida pelo nível de direção. Em consequência discute-se agora a natureza e
forma de inserção do marketing nas organizações (Doyle, 1995; Moorman e Rust, 1999) já que
a função do marketing passa a ser, em alguns casos, integrada a nível estratégico; quer dizer, a
importância do marketing enquanto filosofia cresce mas tem como consequência o esvaziamento
do marketing enquanto função (Cravens, 1998; Bagozzi et al., 1998; Moorman e Rust, 1999).

E é já na década de 90 do século passado que o interesse pela aplicação e desenvolvimento


da disciplina de marketing são um caminho que se multiplica exponencialmente. Com efeito,
numa sociedade e ambiente económico cada vez mais complexos, instáveis e globalizados, a

176
Gestão e Organização de Empresas

disciplina e atitude de marketing e as suas variadas ferramentas operacionais, são cada vez
mais determinantes do sucesso de qualquer organização (Chapman e Cowdell, 1998).

O marketing aplica-se agora a qualquer estrutura organizacional como as agências públicas


governamentais (Cousins, 1990; Snavely, 1991; Chapman e Cowdell, 1998), as organizações de
arte (Kotler e Scheff, 1997), as organizações não lucrativas (Kotler e Roberto, 1989) as
organizações de caridade (Bennet e Gabriel, 2000), as instituições de ensino (Kotler e Fox, 1994),
ou ainda as organizações religiosas (Mehta e Mehta, 1995; Evans e Moutinho, 1999). Tratando-
se este caso de uma denominada expansão horizontal, isto é, a multiplicação da gestão do
marketing em vários tipos de organizações.

A disciplina marketing também prolifera em diferentes tios de atividade como é o caso do


marketing dos serviços, o marketing social (Andreason, 1996), o marketing internacional, o
marketing político (Newman, 1999), o marketing público (Crompton e Lamb Jr, 1986), o
marketing ambiental, o marketing bancário, o marketing turístico (Pender, 1999), o marketing
desportivo, o marketing da saúde (McMullan, 1996), o marketing agrícola, o marketing do ensino,
o marketing das ideias, o marketing dos lugares (Kotler et al., 1993), entre outros. Quando estas
atividades dizem respeito apenas a um tipo de organização, atente-se nos exemplos já referidos
na expansão horizontal do marketing. Nesta situação, o fenómeno é intitulado de uma expansão
vertical, quer dizer, uma expansão em vários tipos de atividade.

Atualmente, no referente à evolução da ciência do marketing, diferentes autores de assinalam


a nova tendência do ‘marketing das relações’ (customer relationship), ou ‘marketing
relacional’ (Christopher 1994; Gronroos 2004; Sheth e Parvatiyar, 2000; Zeithaml e Bitner, 2000).
De forma sumária, o marketing de relações “é uma filosofia de fazer negócio, uma orientação
estratégica, que focaliza o desenvolvimento e a manutenção dos clientes atuais, em vez da
aquisição de novos clientes.” (Zeithaml e Bitner, 2000, p. 138). Quer isto dizer que o marketing
de relações pretende valorizar a relação de longo prazo a estabelecer essencialmente com os
clientes, relações cooperativas e colaborativas, passando para um marketing que se estabelece
“com” o cliente em substituição de um marketing “para” o cliente (Sheth e Parvatiyar, 2000).

O marketing relacional passa a ser característico dos anos 1990, surgindo por oposição ao
marketing transacional, tendo este último sido o paradigma em anos anteriores. Na opinião de
vários autores, como Gummesson (1987), o anterior paradigma e conceito de marketing devia
ser substituído de forma a dar novas respostas a um ambiente cada vez competitivo.

Era necessário um novo conceito cujos pilares devem ser (Gummesson, 1987):

• a relação – o marketing deve estar orientado para a criação, manutenção e desenvolvimento de


relações com os clientes;

177
Gestão e Organização de Empresas

• a interatividade das diferentes partes – as relações entre vendedores e clientes para a criação e
entrega de valor mútuo exigem um estreito e grande processo de comunicação entre ambos;

• o longo prazo – para criar, manter e desenvolver as relações é necessário um longo espaço temporal.

Outra tendência atual é o marketing com orientação para o mercado (Kholi e Jaworski,
1990; Narver e Slater, 1990; Day, 1994), i.e., a filosofia de marketing é disseminada por toda a
organização, com ações consistentes com essa filosofia, vivendo-se um clima de negócio
enquanto orientação cultural, com uma atenção constante às mudanças do ambiente; e, por
conseguinte, as organizações procuram compreender as necessidades quer expressas quer
latentes dos consumidores, desenvolvendo respostas superiores para essas mesmas
necessidades. A orientação para o mercado tem sido objeto de muita atenção nos últimos vinte
anos por parte de investigadores de marketing (Kohli e Jaworski, 1990; Narver e Slater,1994).
Segundo estes autores a implementação desta postura estratégica faz com que as empresas
ganhem um conjunto de benefícios, incluindo uma rentabilidade crescente (Slater e Narver, 1994;
Webster, 1992), atitudes mais proactivas por parte dos colaboradores (Jaworski e Kohli, 1993) e
uma força de vendas mais orientada para o cliente. Este conceito foi amplamente debatido e nos
dias de hoje várias empresas desenvolveram e implementaram ferramentas consistentes com o
que é preconizado por estes diferentes autores. Trata-se de práticas que muitos de nós,
consumidores, também podemos reconhecer nas relações que as empresas, e outras
organizações, desenvolvem com os seus clientes e com o público em geral.

Por exemplo, Narver e Slater (1990) defendem a partilha de informação pelas várias áreas da
organização e o seu envolvimento na resposta aos clientes (orientação ao cliente, orientação à
concorrência e integração e coordenação das funções). Day (1994) sublinha a sensibilidade ao
mercado, as atividades de ligação ao cliente e o uso da tecnologia. Cravens (1998) especifica as
características de estratégias com orientação ao mercado da seguinte forma: desenvolvimento
da visão partilhada das mudanças, seleção de caminhos para proporcionar valor aos clientes,
posicionamento da organização usando competências distintivas, desenvolvimento de parcerias
para colaborar com vários grupos interessados na organização (incluindo a concorrência),
reinventando a estrutura da organização para as estratégias futuras. Devido a um possível
exagero na forma com as empresas desenvolve o esforço na orientação para o consumidor, têm
surgido críticas a esta tendência. Mas os autores proponentes como Slater e Narver, Kholi e
Jaworski, afirmam que é desta forma que as empresas poderão sobreviver neste ambiente
competitivo. E isto porque a orientação ao mercado pressupõe uma atenção ao mercado no seu
conjunto, incluindo concorrentes, e também no longo prazo, e nas necessidades dos
consumidores quer sejam expressas, quer nas necessidade latentes.

178
Gestão e Organização de Empresas

Podemos sintetizar os aspetos mais relevantes de cada um destas posturas:

Marketing Transacional Marketing Relacional

• Ênfase nas vendas individuais; • Ênfase na retenção dos clientes;

• Ênfase nas características dos produtos; • Ênfase no valor do cliente;

• Visão a curto prazo; • Visão de longo prazo;

• Reduzida atenção no serviço ao cliente; • Muita atenção no serviço ao cliente,

• Contacto descontínuo com o cliente; • Contacto contínuo com o cliente

• Nível de compromisso reduzido com os • Nível de compromisso elevado com os clientes,


clientes;
• Nível elevado de contactos com os clientes;
• Nível moderado de contactos com o cliente;
• A qualidade é uma preocupação de todo o
• A qualidade é uma preocupação do pessoal da pessoal.
produção.

Fonte: Adaptado de Christopher et al. (1991) e Payne et al. (1998).

Outro importante conceito é a oferta de valor. Este conceito está intrinsecamente ligado às
vantagens competitivas e à cadeia de valor, princípios basilares na proposta de Michael Porter no
âmbito da estratégia empresarial (Silva, 2008). Segundo Porter (Silva, 2008) referir a criação de
valor significa a criação de valor económico, o que quer dizer que uma empresa apresenta
rendimentos ou resultados acima da média, fora do que é considerado um resultado normal.
Atualmente, os clientes têm cada vez mais importância na criação do valor de uma empresa, ou
organização (Gronroos, 2009). Implica isto que o valor, nesta perspetiva do marketing, é também
criado pela participação do cliente na cocriação da oferta, acontecendo este nova tendência nos
serviços; quer isto dizer que o cliente é cocriador com a empresa.

Não alongando mais esta análise, é importante recordar a máxima sobre o valor: o valor é
sempre unicamente e fenomenologicamente determinado pelo seu beneficiário (Vargo e Lush,
2007).

179
Gestão e Organização de Empresas

2. Um conceito de marketing

Pós esta síntese história, estamos em condições de afirmar que e o marketing é um conjunto
de teorias que explicam a troca de valor ou relações de transação e pretende desenvolver leis,
teorias, de forma a explicar e predizer os fenómenos de troca.

Nesta definição de marketing estamos a considerar a transação como a unidade de medida


do marketing. Aqui a troca significa simplesmente “a transferência de coisas com valor entre duas
ou mais partes.” (Bagozzi et al., 1998, p. 4). As partes envolvidas têm que cooperar para obterem
aquilo de que necessitam, pois através deste tipo de relação exclui-se sistemas de ameaça ou
sistemas sentimentais (Kotler e Andreasen, 1996); aliás, as trocas voluntárias, com benefício para
ambas as partes, são uma característica das organizações contemporâneas, descrevendo a
realidade diária de indivíduos, empresas ou diferentes organizações.

E a partir da centralidade do fenómeno da troca, podemos afirmar, que o marketing enquanto


filosofia é o resultado da compreensão do fenómeno da troca voluntária (Stanton, 1978; Mestre,
1996; Kotler, 1997). Mais ainda, está-se a declarar que o marketing se aplica a todas as
organizações e que as partes envolvidas terão interesse numa relação com benefícios mútuos no
longo prazo (Snavely, 1991; Bagozzi et al., 1998).

Podemos, então, afirmar, que a essência do marketing está na troca de valor por valor. E que
as trocas são efetuadas por empresas, mas também por outras organizações e indivíduos.

Por conseguinte, devem existir 4 condições para que possa ocorrer uma troca:

• Duas ou mais pessoas/organizações envolvidas.

• As partes devem estar envolvidas voluntariamente.

• Cada parte deve ter algo com valor para trocar e devem acreditar que ambas vão beneficiar
com a troca.

• As partes devem ser capazes de comunicar entre si.

Ainda podemos avançar que o marketing também é analisado no âmbito disciplinar de prática
da gestão (micro-management segundo Sheth e Parvatiyar, 2000). Assim sendo, o marketing
consiste no conjunto de ações de gestão que operacionalizam essa atitude de atenção ao
consumidor e suas necessidades. Estamos aqui a dizer que o marketing é uma disciplina de gestão
e, por conseguinte, incorpora, como em qualquer processo de gestão, a análise, o planeamento,
a implementação e o controlo.

Pelo exposto, podemos partir para uma definição do conceito de marketing por duas vias ou

180
Gestão e Organização de Empresas

paradigmas:

• a troca de valor voluntária entre partes e o processo desenvolvido no âmbito da


microeconomia (Snavely, 1991);

• ou sistema de pensamento e sistema de ação (Lambin, 2000); ou, dito de outra forma, por
uma atitude mental e um conjunto de métodos e instrumentos (Lendrevie et al., 1996).

A partir destes dois paradigmas, e como seria de esperar, podem ser encontradas diferentes
definições do conceito de marketing. Com certeza, todas estas definições são válidas,
acrescentado, cada uma delas, um detalhe ou sublinhando um aspeto em particular.

Com o intuito de encontrarmos uma linguagem comum, possibilitando o diálogo futuro, uma
definição de marketing proposta é “O conjunto dos métodos e meios de que uma organização
dispõe para promover, pelos públicos pelos quais se interessa, os comportamentos favoráveis à
realização dos seus próprios objetivos.” (Lendrevie et al., 1996). Podemos ainda considerar uma
outra definição de marketing mais integradora: combinando o paradigma da troca de valor e o
microeconómico, o marketing é definido como um processo social e de gestão, através do
as necessidades de uma sociedade são (Kotler e Roberto, 1989; Kotler e Levy in Enis
et al., 1990; Lendrevie et al., 1996).

Ainda segundo a American Marketin Association (AMA) o marketing foi sendo definido de
formas diferentes, acompanhando o pensamento sobre esta disciplina.

Atualmente, a partir de 2004, a definição é: “Marketing is an organizational function and a set


of processes for creating, communicating, and delivering value to costumers and for managing
customer relationships in ways that benefit the organization and its stakeholders.”

181
Gestão e Organização de Empresas

3. A ação de Marketing
Este capítulo inicia-se com uma síntese dos diferentes passos da ação de marketing numa
empresa. E de seguida, avançamos para uma explicação mais pormenorizada das fases mais
importantes deste trabalho, bem como discorremos sobre alguns dos conceitos mais relevantes
nesta disciplina.

A gestão de marketing desdobrando-se nas fases sequenciais de análise, decisão,


implementação e controlo (Lendrevie et al., 1996; Kotler, 1997; Lambin, 2000), como qualquer
ferramenta de gestão:

• na análise do mercado (descrição e análise do ambiente de marketing, macro e micro, e


desenvolvimento dos sistemas de informação);

• nas decisões estratégicas de marketing (os objetivos gerais e a estratégia de segmentação e


posicionamento);

• no marketing operacional (operacionalização das estratégias através das ferramentas próprias, i.e.,
desenvolvimento do marketing-mix, podendo, ainda, enquadrar-se aqui o controlo das atividades do
marketing).

As fases de análise e decisão têm fundamentalmente impacto no médio e longo prazo e o


marketing operacional incide sobretudo no curto prazo.

182
Gestão e Organização de Empresas

De forma com um pouco mais de detalhe podemos introduzir nestas fases sequenciais da
gestão aplicada à disciplina e operacionalização do marketing como a seguir se apresenta:

Planeamento estratégico da empresa


1. Definir missão da org. 3. Fixar objectivos da org.
2. Conduzir análise da 4. Seleccionar estratégias
situação adequadas

Planeamento estratégico de marketing


1. Conduzir análise da situação 4. Seleccionar mercados-alvo,
2. Desenvolver obj. de marketing medir procura do mercado
3. Determinar posição e 5. Desenhar um mix de
vantagem diferencial marketing estratégico

Plano anual de marketing


Preparar um plano anual de
marketing para cada produto
principal e cada divisão da empresa

IMPLEMENTAÇÃO E AVALIAÇÃO

Quando se inicia o trabalho na área do marketing, como seria de esperar, o primeiro passo
deve consistir numa análise cuidada à missão da empresa em causa. E também, adicionalmente,
se deverá entender a natureza da troca e os seus elementos constituintes.

Antes de iniciar qualquer atividade na área do marketing, devemos também levar em linha
conta a sua política global, a seguir à análise da missão da empresa.

Provavelmente, e de seguida, a grande questão reside na ligação da estratégia de


marketing à estratégia global da organização. Existe uma clara diferença entre ambas: enquanto
a estratégia do negócio ou da organização implica a definição da missão, dos produtos e
mercados, ou seja, diz respeito essencialmente à obtenção de vantagens competitivas, a
estratégia de marketing de uma organização é uma estratégia funcional, “é um conjunto
integrado de decisões através do qual um negócio alcança os seus objetivos de marketing e
satisfaz as exigências de valor dos seus clientes.” (Slater e Olson, 2001, p. 1056).

A estratégia de marketing é, com as estratégias de produção, finanças, recursos humanos,


investigação e desenvolvimento, uma estratégia funcional destinada à unidade de negócios, e
não ao nível corporate (Webster Jr., 1991). Segundo as conclusões da investigação nesta área,

183
Gestão e Organização de Empresas

as organizações que têm uma estratégia de marketing e uma estratégica do negócio consistentes
são mais eficazes (Slater e Olson, 2001) e, assim, o gestor o gestor de marketing deve iniciar o
seu trabalho respeitando e desenvolvendo as linhas estratégicas da organização.

De outra forma, podemos afirmar ainda que o marketing de uma organização é influenciado
pelas forças internas que são controladas pela gestão geral: Produção, Financeira, Pessoal. Estas
áreas departamentais de uma empresa são fundamentais e devem estar intrinsecamente com o
próprio processo de marketing. Esta situação é tanto mais óbvia de ser apercebida quanto se está
a desenvolver o processo de um novo produto a ser apresentado ao mercado.

Será ainda importante referir que atualmente os públicos mais próximos da organização são
designados como os stakeholders, quer dizer “os interessados”, ou seja, pessoas ou grupos que
têm interesse pela organização. Este grupo pode incluir funcionários, fornecedores, distribuidores,
empresas de fornecimento de serviços de publicidade, governo, comunidade, grupos de defesa,
entre outros.

De forma simples, podemos começar por olhar para os diferentes mercados que interessam
ser analisados na oferta de uma empresa ao mercado. Assim, no âmbito do marketing, mercado
significa o conjunto de todos os atuais e potenciais compradores de um produto. Acrescentamos
ainda que os compradores potenciais têm 3 características: interesse, rendimento e acesso.
Podemos, então, apresentar 5 tipos de mercados decorrentes do que foi agora mesmo exposto:

• Mercado potencial (quem tem interesse);

• Mercado disponível (quem tem interesse e rendimento);

• Mercado disponível e qualificado (quem tem interesse, rendimento e acesso);

• Mercado servido;

• Mercado penetrado.

Para chegar a qualquer mercado, isto é, para desenvolver um mercado, a empresa tem de
começar pelos “primórdios” da própria logicado do marketing… quer dizer: a necessidade do
consumidor.

Se o marketing tem como objetivo primeiro a atração de clientes novos e a manutenção dos
atuais, através de uma oferta superior à da concorrência, é fundamental compreender o que atrai
esse conjunto de clientes. Isto é, quem trabalha no marketing de uma empresa deve conhecer
com o máximo de pormenor quais são os desejos e necessidades dos clientes. Sem

184
Gestão e Organização de Empresas

compreender as necessidades e desejos dos consumidores, a empresa não tem possibilidade de


concorrer no mercado. Mas o que vêm a ser os desejos e as necessidades dos clientes?

A necessidade diz respeito à carência, à privação que alguém experimenta relativamente ea


algo já experimentado. As pessoas têm necessidades físicas (como por exemplo, alimentação),
sociais (de comunicação ou de relacionamento), ou de conhecimento. E quando a necessidade
não se encontra satisfeita, a pessoa tenta encontra o meio de a satisfazer, ou de com capacidade
para minorar essa experiência de privação. Os desejos são algo que se conceptualiza de forma
distinta, pelo menos no âmbito da disciplina de marketing. Poderemos dizer que os desejos são
as formas que as necessidades assumem à medida que são moldadas pela cultura, contexto,
capacidades e personalidade do indivíduo. Que isto dizer que os desejos são descritos em termos
das formas concretas, dos objetos (matérias ou imateriais) que irão satisfazer as necessidades
do indivíduo. Ou, dito de outra forma, os desejos são as respostas que conhecemos num tempo
e espaço concretos para as nossas necessidades.

É importante, então, considerar que, quase sempre, o consumidor tem ao seus dispor
diferentes objetos para satisfazer um desejo e, por último, a necessidade que originou esse
desejo. Mais ainda, os desejos dos indivíduos são quase ilimitados ao contrário dos recursos que
são limitados. Assim, a escolha de produtos recai naqueles que forneçam maior valor e satisfação
para o dinheiro despendido.

Portanto, transmitir a ideia da satisfação através de determinada oferta de uma empresa


versus as ofertas da concorrência torna-se fundamental para a sobrevivência da empresa. E,
claro, perceber como satisfazer o cliente é trabalho vital para o departamento de marketing.

Uma previsão de vendas é uma estimativa ou probabilidade de vendas de uma marca de um


produto da empresa, durante um determinado período de tempo, num segmento de mercado
específico, assumindo o uso de um plano de marketing pré-determinado. A previsão de vendas
deve basear-se num plano de marketing específico, pode expressar-se em escudos ou em
unidades do produto, cobrindo tipicamente 1 ano. Depois de feita, torna-se um factor-chave de
controlo em todo o planeamento operacional, em toda a empresa.

Como seria de esperar, esta previsão de vendas deve decorrer após se estimar o potencial do
mercado e o potencial de vendas. Por sua vez, a previsão de vendas deve decorrer do
estabelecimento dos objetivos de marketing e as grandes estratégias.

Para estimar a procura total de um mercado é necessário começar por definir as seguintes
variáveis: volume total de um produto, consumidor específico, área geográfica definida, num

185
Gestão e Organização de Empresas

determinado tempo, ambiente de marketing e determinado esforço do mix de marketing para


esse produto.

Estima-se a quantidade total esperada pela igualdade:


– Q=n*q*p
(n=nº de compradores, q=quant. média por comprador/ano, p=preço médio)

Em termos gerais, a procura pode ser medida e estimada em diferentes níveis


– Seis diferentes níveis do produto
– Por item
– Por forma
– Por linha
– Vendas da empresa
– Vendas da indústria
– Vendas totais
– Cinco diferentes espaços
– Cliente
– Território
– País
– Região
– Mundo
– Três horizontes temporais
– Curto prazo
– Médio prazo
– Longo prazo

Um dos conceitos basilares na estratégia de marketing é a segmentação.

A segmentação envolve dividir o mercado em segmentos, ou seja, dividir esse mercado maior
em conjuntos de públicos com necessidades e desejos semelhantes, com características e
comportamentos de aquisição comuns, ou padrões de consumo semelhantes, através de formas
que são relevantes para o planeamento em marketing. Neste processo estratégico de marketing
torna-se fundamental, para uma melhor eficácia na sua operacionalização, entender a sua origem.
A segmentação encontra-se baseada em princípios como: os clientes diferem uns dos outros de
alguma forma; as pessoas procuram os benefícios e não os produtos em si (Srivastava et al.,
1984); os clientes podem ser agrupados em segmentos relativamente homogéneos, dispondo
esses clientes de características idênticas outros (Lovelock, 2001). Com efeito, a partir destas
premissas, o entendimento das várias fases da segmentação torna-se quase evidente.

A segmentação do mercado constitui o primeiro pilar sob o qual se desenvolvem as restantes


decisões. Por conseguinte, após a obtenção dos resultados do estudo da segmentação e descrição
dos segmentos, a empresa precisa de selecionar os segmentos alvo. Para escolher os alvos mais
adequados, a empresa necessita de critérios, de forma a medir a atração dos segmentos, critérios
que dependem, obviamente, da empresa e o seu contexto; e apesar de

186
Gestão e Organização de Empresas

serem numerosos e variáveis consoante o ambiente e a própria organização, podem ser


sumariados em três grupos (Kotler, 1997):

• Dimensão e crescimento do segmento;

• Atratividade estrutural do segmento (a empresa procura servir os segmentos onde o número e


dimensão das ofertas concorrentes seja mínimo ou insuficiente para as necessidades detetadas), por
conseguinte a empresa deve procurar mercados que possam gerar lucros quando analisada a oferta
semelhante que as empresas concorrenciais fazem ao mercado.

• Objetivos, imagem e recursos da empresa, isto é, os mercados-alvo devem ser compatíveis com os
objetivos, imagem e recursos da organização.

Após a seleção dos segmentos compatíveis, a empresa escolhe a forma base como vai
concorrer nesse mercado, a forma de cobrir esse mercado e as estratégicas específicas que
melhor se adequam às suas características e à competição existente.

Assim, ao selecionar os mercados-alvo, a empresa pode seguir uma (ou mais, se opera em
mercados diferenciados) das seguintes três grandes estratégias:

• Agregação de mercado (marketing indiferenciado) — tratar o mercado total como sendo


um único segmento.

• Concentração de um único segmento — ênfase em apenas um segmento.

• Segmentação de segmentos múltiplos — selecionar 2 ou mais segmentos e escolher mixes


de marketing diferentes para cada um.

Os segmentos alvo servem para que a empresa possa focalizar nesses mesmos grupos um
posicionamento consistente.

O posicionamento é uma ferramenta estratégica da empresa possibilitando que esta determine a


forma como se pretende ser conhecido junto dos públicos-alvo, de maneira a ser diferenciado face à
competição. Dito de outra forma, é o conjunto da imagem (os seus traços salientes e distintivos) e
atributos substantivos, permitindo ao público situar o produto no universo dos produtos análogos e
distingui-lo dos outros (Aaker e Shansby, 1982; Doyle e Saunders, 1985; Shostack, 1987; Kotler, 1997;
Lovelock, 2001) podendo referir-se a um produto, um serviço, uma organização, uma marca, ou outra
entidade relevante. Esta definição contém os dois eixos fundamentais para as organizações aplicarem
este conceito: a identificação do produto e a sua diferenciação face a outros produtos do mesmo género
(Lendrevie et al, 1996).

Quando falamos em diferenciação vis-a-vis com a competição, estamos diretamente a implicar um


quadro de referência e isso é usualmente a competição. “Uma posição descreve como uma
187
Gestão e Organização de Empresas

pessoa ou grupo percebe uma instituição em relação a outras.” (Kotler e Fox, 1994, p. 172): o
trabalho que é feito sobre as dimensões e os aspetos que fazem parte da declaração de
posicionamento de uma organização são passíveis de serem comparados (Aaker e Shansby,
1982).

É importante referir também que a formalização do conceito de posicionamento surgiu como


uma nova abordagem à comunicação, desenvolvida por dois publicitários: Ries e Trout declaram
que “O posicionamento não é o que se faz a um produto. Posicionamento é o que se faz na mente
da pessoa. Isto é, posiciona-se o produto na mente da pessoa.” (Ries e Trout, 1986, p. 2).
“Posicionamento é um sistema organizado para encontrar uma janela na mente.” (Ries e Trout,
1986, p. 19), o que quer dizer que este modelo é ancorado na psicologia e sociologia, mais
especificamente nas teorias comportamentais. Atualmente, outros autores questionam este
conceito, sustentando que o posicionamento não é apenas uma decisão da comunicação mas
também diz respeito aos atributos substantivos do produto que sustentam a imagem pretendida,
integrando o processo do posicionamento na estratégia do marketing. De qualquer forma, a
definição de posicionamento avançada por estes dois autores é ainda hoje a melhor: apesar de
não ser uma definição académica e ter surgido no campo da atividade publicitária, é a partir dela
que emerge o conceito de posicionamento (Myers, 1996).

De forma resumida, para se avaliar o trabalho desenvolvido na estratégia de marketing, poder-


se-á assegurar que uma boa estratégia de marketing deve responder a cinco perguntas simples:
quem, o quê, quando, onde e como... quer isto dizer: os segmentos que a empresa deseja servir...
que necessidades precisam de ser satisfeitas... as características temporais dos padrões de
compra dos clientes... meio de acesso dos consumidores... como expandir...

Ao dar resposta a estas cinco perguntas, a estratégia de marketing estabelece o


enquadramento geral para o posterior desenvolvimento de programas e ações detalhadas de
marketing... Podemos ainda afirmar que uma estratégia de marketing desempenha o seu papel
de interface entre a estratégia geral da empresa e a evolução do mercado. (Lendrevie, et al.,
1996).

Ainda inserido nas decisões estratégicas, será fundamental referir um conceito que é hoje
intransponível na realidade do mundo comercial, das empresas e até das outras organizações.

Como efeito, a realidade das organizações é marcada por fenómenos como a crescente
competitividade, o decréscimo da procura ou a soberania do consumidor. O que torna
fundamental que as empresas e outras organizações consigam levar ao mercado produtos
diferenciados. Se até à década de oitenta a forma de diferenciar a oferta dependia diretamente

188
Gestão e Organização de Empresas

dos bens físicos ou serviços que as organizações possuíam, a partir desta década compreende-
se que o valor das organizações está em ativos intangíveis como o conhecimento e a marca.

Mas o que vem a ser a marca? Segundo Kotler (1997), e de acordo com a American Marketing
Association, “a marca é um nome, um termo, um sinal, um desenho ou uma combinação destes
elementos, com o objetivo de identificar os bens e serviços de um vendedor, ou de um grupo de
vendedores, de forma a diferenciá-los dos concorrentes.” (p. 443).

A gestão da marca adquiriu atualmente uma importância capital na própria responsabilidade


de quem trabalha o marketing de ume empresa. O que implica que, para as organizações, as
marcas já não são apenas vistas como parte do produto mas tornam-se ativos estratégicos a
serem geridos, especialmente atendendo à complexidade atual do mercado, com canais de
comunicação e distribuição múltiplos, com trocas à escala global e ambientes extremamente
mutáveis (Aaker, 1991; 1996; 2000). As marcas já não são apenas vistas como parte do produto
mas tornam-se ativos estratégicos a serem geridos. Os custos da marca, quer da criação,
aquisição, ou manutenção, são muito mais elevados que há três décadas atrás.

Pelo exposto, é mais que legítimo afirmar que a gestão da marca adquire uma importância
capital para qualquer organização.

E o que vem a ser o marketing-mix?

Após revermos conceitos, a análise do mercado, e a consequente elaboração de estratégias,


estamos na possibilidade de proceder agora à sua aplicação através de decisões sobre as
variáveis: Produto, Preço, Comunicação, e Distribuição. Estas quatro variáveis são conhecidas por
marketing-mix.

O termo de marketing-mix é atribuído a Borden (nos anos 60), tendo sido popularizado por
Jerome McCarthy (em 1975) nos quatro P’s de produto, preço, comunicação (do inglês,
promotion) e lugar (do inglês, place) ou distribuição, implicando a noção de mix “que todas as
variáveis se encontram interrelacionadas e dependentes umas das outras de alguma forma e que
existe um mix óptimo dos quatro fatores para um determinado segmento num determinado ponto
do tempo.

Portanto, as decisões operacionais ou ‘marketing-mix’, são as que viabilizam e concretizam as


opções estratégicas, devendo assegurar-se a sua coerência e consistência Interna e com as
demais variáveis do Plano de Marketing

189
Gestão e Organização de Empresas

MARKETING-MIX

CONSISTÊNCIA INTERNA CONSISTÊNCIA EXTERNA COM A


ENTRE AS POLITICAS ESTRATÉGIA DE MARKETING

PRODUTO DISTRIBUIÇÃO MERCADOS


SELECCIONADOS

COMUNICAÇÃO PREÇO NEGÓCIO


DEFINIDO

OBJECTOS
ESCOLHIDOS

Provavelmente avariável mais importante no marketing-mix é o produto (Kotler, 1998): é esta


variável com que o consumidor se relaciona com a empresa…o produto é a variável capaz de
satisfazer a necessidade do consumidor. Todas as outras variáveis são “apenas” facilitadoras para
que a relação de estabelece e, assim, o consumidor possa obter os benefícios que só produto
pode trazer. Dito de outra forma, quando se olha o produto na perspetiva de marketing, o
comprador não compra um produto, ele compra a solução para um problema.

Segundo Kotler (1997), produto “é qualquer coisa que pode ser oferecida a um mercado para
satisfazer uma necessidade ou desejo.” (p. 430). Entende-se produto como um conjunto de
atributos tangíveis e / ou intangíveis, que incluem a qualidade, as características, a marca, o
desenho, a embalagem, a cor, o preço, e mais os serviços e reputação do vendedor. Quando se
olha o produto na perspetiva de marketing, percebe-se que o comprador não compra um produto:
ele compra a solução para um problema (Lambin, 2000).

Das várias decisões no que concerne ao produto, podemos referir dois exemplos.

Por exemplo, relativamente à embalagem, esta é cada vez mais um decisão que poderá
distinguir um produto e torná-lo muito atrativo face à concorrência. Neste seguimento, a Tetra-
Pack revolucionou o sector das embalagens. Associou dois processos: a ultra pasteurização, e a
embalagem asséptica.

Outra decisão fundamental em relação ao produto diz respeito à atenção e consequente


análise da fase de desenvolvimento em que se encontra no mercado. Não há dúvida de que

190
Gestão e Organização de Empresas

qualquer produto é introduzido num determinado momento e depois passa por várias fases até
que é “retirado da prateleira”. Este fenómeno dá pelo nome de Ciclo de vida. Assim, podemos
dizer simplesmente que um ciclo de vida do produto consiste na procura agregada do produto ao
longo do tempo.

Um CVP (PLC) consiste em 4 etapas:

• Introducão—mais arriscada e dispendiosa.

• Crescimento—tanto as vendas como os lucros sobem, frequentemente com rapidez.

• Maturidade—as vendas aumentam a uma velocidade decrescente e os lucros descem.

• Declínio—a procura desce, frequentemente devido à evolução de outro produto.

Isto implica também que é fundamental a empresa introduzir novos produtos no mercado. E,
por conseguinte, deve estar atenta e desenvolver um processo de inovação. A inovação chamada
tecnológica refere-se às características físicas do produto (processo, novas componentes, novos
materiais, novos produtos acabados). A inovação de natureza do marketing refere-se
essencialmente aos modos de organização (distribuição, comunicação – ex: Amazon).

O preço refere simplesmente a quantia de dinheiro que os consum idores terão de pagar ou,
numa ótica de marketing, o conjunto de valores de que esses consumidores estão dispostos a
abdicar em troca do produto. Ou seja, para um consumidor o preço a pagar por um determinado
produto consiste num conjunto de custos, como sejam custos monetários , custos de riscos
percebidos (psicológicos e sociais) e custo do tempo despendido para a obtenção do produto.

A sensibilidade dos consumidores ao preço pode diferir segundo diferentes critérios, que
dependem de consumidor para consumidor, e de comprar para compra. Por exemp lo, eles podem
consistir em:

• Montante da compra (… preço global):

• Percepção do risco associado à compra;

• Valor da imagem;

• Existência de produtos de substituição;

• Pagamento parcial do produto.

Relativamente à empresa em consideração, é fundamental que esta se inicie o processo de


marcação de preços, estabelecendo os objetivos desses mesmos preços. Isto é, a gestão deve
decidir sobre o objetivo dos preços antes de determinar o próprio preço.

191
Gestão e Organização de Empresas

Os objetivos com orientação para o lucro são os seguintes:

• Atingir um alvo — atribuir um preço ao produto de modo a obter um retorno percentual


específico nas vendas ou no investimento.

• Maximizar lucros — seguido pela maior parte das empresas.

Os objetivos com orientação para as vendas são essencialmente:

• Aumentar o volume de vendas.

• Manter ou aumentar a quota de mercado.

Os objetivos de Status quo:

• Estabilizar os preços.

• Satisfazer a concorrência.

A distribuição diz respeito às várias atividades desenvolvidas por uma organização de forma
a tornar o produto acessível e disponível para os clientes alvo. “Um canal de distribuição é uma
rede de “instituições e agências envolvidas na tarefa de mudar produtos dos pontos da produção
para os pontos do consumo.” (Stern in Kotler e Roberto, 1989, p. 161). Nos mercados dos bens
físicos, e para a maioria das situações, os produtos não são vendidos diretamente ao cliente
final, recorrendo-se a intermediários, os quais desempenham uma série de funções relevantes
para o marketing como a disseminação de informação, a promoção, a negociação, as operações
relativas às ordens e o pagamento.

Em síntese, o papel da distribuição é colocar o produto no mercado alvo da empresa, o que


implica:

• Providenciar a sua venda e a transferência de propriedade.

• Promover o produto.

• Armazenar o produto.

• Assumir alguns riscos durante a distribuição.

Os intermediários executam frequentemente estas actividades para o produtor ou o


consumidor.

Assim, considera-se que os intermediários são empresas que oferecem serviços relacionados
diretamente com a compra e/ou venda de um produto à medida que flui do produtor para o
consumidor:

• Intermediários distribuidores dão o título à mercadoria que ajudam a comercializar.

• Intermediários agentes nunca dão título mas assistem ativamente na transferência do título.

192
Gestão e Organização de Empresas

Atualmente, para a distribuição de mercadorias, utilizam-se muitos tipos diferentes de canais.


E o mais comum é que os próprios produtores não se contentam em utilizar um único canal de
distribuição e usam canais múltiplos, incluindo o canal e-commerce.

No caso dos serviços, a distribuição é quase sempre feita diretamente ao cliente.

A comunicação é fundamental e a empresa deve, dentro das suas possibilidades, planear e


desenvolver formas eficazes de comunicar com os seus públicos. Aliás, uma organização pode
ter um conjunto de produtos muitíssimo satisfatórios para os seus clientes e falhar redondamente
ao não comunicar numa base regular esta informação (McLeish, 1995). A comunicação é então
o elemento do mix de marketing de uma empresa que serve para informar, persuadir e /ou
lembrar o mercado da empresa e dos seus produtos. É uma tentativa de influenciar sentimentos,
crenças ou comportamentos. E inclui todos os meios através dos quais a empresa comunica
diretamente com os clientes potenciais.

A comunicação é fundamental numa economia de livre mercado por causa de factpres como:

• Diferenciação do produto.

• Comportamento emocional do comprador.

• Informação de mercado incompleta.

As formas de comunicar com os públicos podem ser distribuídas em cinco grupos (Kotler,
1998): as vendas pessoais, a publicidade, a promoção de vendas, as relações públicas e o
marketing direto.

As Vendas pessoais significam a apresentação direita de um produto a um cliente potencial


por meio de um representante da organização de vendas. A publicidade é um tipo de
comunicação em massa, impessoal e a pagar, em que o patrocinador está claramente
identificado. A promoção de vendas consiste essencialmente numa actividade estimuladora da
procura que se destina a complementar a publicidade e facilitar a s vendas pessoais. As relações
públicas são consideradas um esforço de comunicação planeado por uma organização para
contribuir para atitudes geralmente favoráveis e opiniões dirigidas à organização e aos seus
produtos. Por último, o marketing direto significa um conjunto de técnicas de comunicação
individualizada e interativa geralmente pedindo uma resposta direta do consumidor.

A função de controlo é, muitas das vezes, desenvolvida pelo departamento de marketing da

193
Gestão e Organização de Empresas

empresa. Com efeito, cabe ao departamento de marketing monitorar e controlar continuamente


as atividades de marketing. E, desta forma, assegurar que se atingem objetivos de vendas,
participação no mercado, e despesas de marketing orçadas. E, ainda, procura-se aumentar a
eficiência da força de vendas, das outras ferramentas de comunicação, da distribuição.

De seguida, apresentam-se exemplos de indicadores para o controlo:

• Eficiência da força de vendas

– nº médio de visitas por vendedor

– custo médio da visita

– nº de novos clientes por período

• Eficiência da publicidade

– custo da publicidade por mil consumidores-alvo atingidos

– % do público que memorizou

– a atitude face ao produto pós publicidade

• Eficiência da promoção de vendas

– % das vendas obtidas com promoções

– percentagem de cupões devolvidos


Gestão e Organização de Empresas

TEXTO Nº 10
A Função Recursos Humanos
António Calheiros

Este pequeno texto pretende servir de apoio ao estudo da matéria relativa à Função
Recursos Humanos, no âmbito da disciplina de Introdução à Gestão de Empresas, do
Instituto Superior de Contabilidade e Administração de Coimbra.

Começa-se o texto por clarificar o conceito de Função/Gestão de Recursos Humanos.


Seguidamente, apresenta-se um pequeno resumo da evolução da função nas empresas
desde o início do século XX até aos nossos dias. Conclui-se o texto com uma
caracterização das principais tarefas desenvolvidas pela Função Recursos Humanos nas
empresas: Planeamento, Recrutamento e Selecção, Desenvolvimento e Formação,
Avaliação de Desempenho e Gestão da Compensação

1. Conceito
Para Gonçalves das Neves (2007: 12), a Gestão de Recursos Humanos “é, simultaneamente,
um conjunto de conhecimentos e uma actividade, estruturando-se cada um em estreita
dependência”. Esta é uma forma comum de caracterizar uma função empresarial, pois a
mesma congrega sempre, além da actividade de gestão em si, um conjunto de
conhecimentos estruturados, ou repositório de técnicas e instrumentos, que pretendem
auxiliar os profissionais a aumentar a eficácia e eficiência da sua actividade. Olhemos então
agora para as tarefas ou processos que compõem essa actividade.

Donnelly et al. (2000: 404) definem Gestão de Recursos Humanos como “o processo de
concretizar objectivos organizacionais pela captação, retenção, despedimento,
desenvolvimento e utilização adequada dos recursos humanos numa organização”,
enquanto que Dessler (2009: 28) considera que Gestão de Recursos Humanos “é o processo
de aquisição, formação, avaliação e compensação dos funcionários, bem como da gestão
das suas preocupações com as relações laborais, higiene e segurança e equidade”.

Temos então que, tal como para as outras funções empresariais, a Função Recursos
Humanos tem como objectivo concretizar objectivos organizacionais (ou contribuir para a
sua concretização). O seu contributo consistirá na gestão de todas as actividades/processos
relacionados com as pessoas da organização, desde a sua captação ou aquisição,
Gestão e Organização de Empresas

passando pelo seu desenvolvimento/formação, utilização adequada e retenção (que passa


pela avaliação e compensação), até ao despedimento, se tal se afigurar necessário. A
Função de Recursos Humanos deve também funcionar como uma espécie de “provedor
dos funcionários”, ao gerir as suas diversas preocupações nas relações laborais, higiene e
segurança e equidade, procurando sempre maximizar a sua motivação e satisfação no
trabalho.

Para além destas “tarefas básicas”, Câmara et al. (2001) identificam como desafios da Função
Recursos Humanos o coaching dos restantes gestores, bem como a gestão dos processos de
mudança e desenvolvimento organizacional e a manutenção/gestão da cultura e clima
organizacionais.

2. Evolução e enquadramento
Besseyre des Horts (1987, apud Gonçalves das Neves, 2007) sistematizou a evolução da Função
Recursos Humanos nas organizações em 5 fases. A primeira fase situa-se entre o início do século
XX e a primeira Guerra Mundial e caracteriza-se pela existência, nas organizações, de alguns
serviços especializados no tratamento de questões de recrutamento e treino, sendo a maioria das
outras questões relacionadas com as pessoas (disciplina, motivação, remuneração) geridas pela
hierarquia. Nessa fase, a função era designada por “Administração de Pessoal”.

Entre as duas guerras mundiais situa-se a segunda fase, em que houve uma agudização do conflito
entre trabalho e capital. Como consequência, as questões sociais revelavam-se mais complexas,
sendo necessária a existência nas empresas de uma função cuja atribuição consistia em assegurar
e disciplinar a organização do trabalho. Direcção das Relações Sociais ou Industriais era a
designação habitual da função nesta fase.

Durante as décadas de 50 e 60 encontra-se a terceira fase, em que existe uma grande evolução
na legislação de natureza social e laboral. Nesta fase, o Função de Recursos Humanos passa a
ser desempenhada por administrativos com formação jurídica e a grande preocupação é a
motivação e satisfação das pessoas, através da gestão das remunerações e promoções. A função
é designada por Direcção de Relações Humanas.

Entre o final da década de 60 e meados da década de 80, desenvolve-se a quarta fase da


evolução da Função de Recursos Humanos, caracterizada por uma ruptura em relação às fases
anteriores, enfatizando a atenção às pessoas e à lógica qualitativa relativamente à quantitativa.
A Função de Recursos Humanos passa a ocupar-se da gestão dos recursos ao nível do emprego,
da remuneração, da formação, da higiene e segurança, dos regulamentos de trabalho, etc.,
adquirindo os profissionais o estatuto de gestores e surgindo instrumentos e consultadoria
especializados de apoio à gestão dos assuntos de pessoal. Nesta fase, a designação mais frequente
Gestão e Organização de Empresas

é a de Direcção de Pessoal, tendo por principal finalidade assegurar a motivação das pessoas na
produtividade global da organização através, fundamentalmente, da minimização dos custos.

A quinta fase inicia-se em meados da década de 80 e prolonga-se até hoje. Como principais
características são referidas: a aquisição do estatuto de função estratégica em virtude da pressão
da competitividade e adaptação aos desafios tecnológicos, económicos, sociais, etc.; a valorização
das pessoas como recurso decisivo da competitividade; e o fomento da participação mediante
o uso de práticas organizacionais de apoio (círculos de qualidade, gestão pela qualidade total,
gestão por objectivos, etc.). A designação mais habitual nesta fase é a de Direcção de
Recursos Humanos, cuja principal missão consiste em desenvolver o mobilizar as pessoas, as
quais são encaradas mais como um investimento do que como um custo.

A importância estratégica que a Função Recursos Humanos ganhou resulta essencialmente da


importância estratégica que as pessoas actualmente têm para as organizações. Já não são os
investimentos em equipamentos ou a capacidade financeira que garantem a competitividade às
empresas. Actualmente, num Mundo em constante mudança, com fácil circulação de bens,
serviços e informação, os recursos mais valiosos são aqueles que são raros, difíceis de imitar
e criam valor (Barney, 1991) e algumas pessoas têm estas características sendo, em consequência,
um recurso crítico para o desenvolvimento e implementação da estratégia para obter vantagens
competitivas.

Outrora a parte fraca da relação laboral, as pessoas com conhecimentos especializados e capazes
de criar valor tornaram-se o recurso escasso de que as empresas necessitam para criar vantagem
num ambiente cada vez mais competitivo. Assim, tal como a função de Marketing é crítica para
procurar conhecer as necessidades e expectativas dos clientes e para criar produtos e serviços
mais adequados que consigam captar a sua preferência, também a Função Recursos Humanos
se torna crítica para a empresa compreender que profissionais necessita para se dotar das
competências necessárias ao seu negócio e para se tornar uma empresa apelativa a esses
profissionais.

1. As tarefas da Função Recursos Humanos


Como foi debatido no ponto 1, podemos identificar como propósito da Função Recursos Humanos
contribuir para a concretização dos objectivos organizacionais através da dotação da empresa
de pessoas com as competências adequadas às suas necessidades, da sua alocação às funções
onde possam desenvolver melhor o seu potencial, da gestão do seu desenvolvimento, da sua
motivação e retenção na empresa. Podemos assim identificar as seguintes tarefas da função
Gestão e Organização de Empresas

Recursos Humanos:

1. Planeamento

2. Recrutamento e Selecção

3. Desenvolvimento de Recursos Humanos e Gestão da Formação

4. Avaliação de Desempenho

5. Gestão da Compensação

3.1. Planeamento de Recursos Humanos

O Planeamento de Recursos Humanos é o processo através do qual as organizações avaliam


a sua procura e oferta futura de Recursos Humanos, providenciando mecanismos para eliminar as
lacunas que possam existir. Portanto, o Planeamento de Recursos Humanos determina o número
e características das pessoas a contratar ou dispensar. Este planeamento pretende alcançar
uma utilização mais eficaz e eficiente dos Recursos Humanos, bem como obter trabalhadores
mais satisfeitos e motivados.
O processo inicia-se com o planeamento estratégico da organização, que analisa o
ambiente para analisar as tendências que irão afectar a sua actividade, identificando oportunidades
e ameaças. A partir dessa análise, a empresa define a sua estratégia e faz o planeamento global
das suas actividades. Deste planeamento resultará um conjunto de informações (negócios em que
a empresa estará presente, actividades que vai desenvolver interna ou externamente, etc.)
que permitem à Função de Recursos Humanos prever as necessidades organizacionais de
pessoas, em termos de quantidades, perfis de competências e estrutura funcional. Isso
corresponde à procura ou às necessidades de Recursos Humanos da Empresa. Seguidamente,
compara-se essa procura com a oferta, que consistirá nos quadros de pessoal actuais da empresa,
considerando a rotação (saída de funcionários) prevista e a evolução de competências dos
restantes. Dessa comparação poderá resultar uma adequação perfeita entre o que a empresa
precisa e o que a empresa tem ou poderão ser identificadas diferenças, que poderão ser excesso
de procura (a empresa irá precisar de mais funcionários do que aqueles de que dispõe) ou excesso
de oferta (a empresa tem mais funcionários do que aqueles de que irá necessitar no futuro).
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Figura 1 – Planeamento de Recursos Humanos

Caso exista excesso de oferta, a empresa terá que encontrar formas de diluir esse excesso, que
poderão passar pela flexibilização de horários, pela decisão se não substituir os funcionários
que saiam da empresa, pela promoção de reformas antecipadas, pela reconversão de trabalhadores
para outras funções, pelo incentivo à criação de empresas próprias pelos funcionários ou pelo
recurso ao outplacement (apoio aos trabalhadores despedidos na procura de novos empregos).

Caso o problema seja excesso de procura (escassez de pessoal), a empresa tem também
várias soluções à sua disposição, nomeadamente a utilização de horas extraordinárias e
trabalho temporário caso o excesso de procura seja de duração limitada, formação dos
funcionários quando haja falta de competências, mas pessoas em número suficiente, promoções
ou recorrer ao recrutamento.
Gestão e Organização de Empresas

3.2. Recrutamento e Selecção

Segundo Ivancevich, o recrutamento refere-se às “actividades organizacionais que têm por


objectivo obter um número de candidatos suficiente para que a organização possa seleccionar os
mais adequados às suas necessidades” (2008: 187) e a selecção é o “processo através do qual a
organização escolhe, de entre uma lista de candidatos, aqueles que melhor se enquadram no perfil
definido para as funções em aberto, tendo em conta as condições ambientais do momento” (2008:
214).

O recrutamento classifica-se em interno ou externo, consoante se procurem candidatos para a


função ou funções que se pretendem preencher entre as pessoas que já são colaboradores da
empresa ou se se procuram pessoas sem ligação prévia à organização. O recrutamento interno
significará uma transferência ou promoção para o colaborador seleccionado. Consideram-se que o
recrutamento interno apresenta como vantagens o facto de ser mais rápido e barato do que o
recrutamento externo e o permitir uma avaliação mais válida dos candidatos, pois as fontes de
informação são em maior número e fiabilidade. Também se garante à partida que não há
risco de inadaptação à empresa, pois a pessoa já é funcionária da mesma. O recrutamento
interno pode também ser uma espécie de válvula de segurança da organização, permitindo que
pessoas válidas mas integradas em funções ou equipas de trabalho que não lhes permitem
expressar o seu potencial possam ter oportunidade de procurar outra função a que se adaptem
melhor. Finalmente, o recrutamento interno é uma fonte de motivação para os trabalhadores, pois
eles sabem que se tiverem um bom desempenho terão hipótese de obter promoções e permite
também que a empresa rentabilize os investimentos que faz na formação dos seus colaboradores.
Existem, no entanto, também algumas desvantagens do recrutamento interno que devem ser
consideradas. Em primeiro lugar, se é verdade que o recrutamento interno cria motivação nas
pessoas com a possibilidade de obterem promoções, também pode criar conflitos internos entre
os
colaboradores que obtêm a promoção e os colegas que são preteridos. Outro factor a
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considerar é o chamado “Princípio de Peter”, segundo o qual os trabalhadores são promovidos


sucessivamente até atingirem o seu nível de incompetência na empresa, onde depois estagnam.
Também se pode dar o caso de o recrutamento interno não permitir obter um conjunto
suficientemente interessante de candidatos, devido à inexistência na empresa de colaboradores
com as competências necessárias para a função em aberto. Finalmente, o recrutamento interno
pode ver as suas vantagens limitadas quando a promoção de uma pessoa acaba por obrigar a
empresa a iniciar um novo processo de recrutamento para a função que ela deixa em aberto.

Quanto ao recrutamento externo, podemos identificar como vantagens o facto de trazer sangue
novo e novas competências para a organização, bem como o facto de permitir incorporar
competências sem os respectivos custos de formação e permitir à empresa desenvolver uma base
de dados de profissionais. Como sangue novo identificam-se as novas ideias, procedimentos,
métodos de trabalho, etc. que uma pessoa que vem de fora traz para a empresa e que a pode
ajudar a melhorar a sua eficiência. A aquisição de novas competências resulta da contratação
de pessoas com valências inexistentes nas pessoas da organização e que implicariam um custo
elevado em formação. Para além disso, ao fazer auscultações ao mercado de trabalho, a empresa
fica com informação sobre várias pessoas que lhe poderão interessar não só no momento
presente como para o futuro e ganhará também alguma sensibilidade face ao mercado. As
desvantagens do recrutamento externo correspondem às vantagens do interno: é mais lento e
mais caro e corre-se o risco de os candidatos não se conseguirem adaptar ao ambiente
organizacional.

Para atrair os candidatos, as empresas têm diversos meios à sua disposição: anúncios em jornais
e revistas, anúncios na portaria da empresa, recurso à Base de Dados da empresa, contratação de
agências de recrutamento, contactos com Centros de emprego, ficheiro de candidaturas
espontâneas, site da empresa, sites de emprego, contactos com universidades, contactos com
sindicatos ou associações profissionais, eventos de recrutamento, referências de empregados, etc.
A selecção dos meios deverá ser feita tendo em conta, nomeadamente, a função que se pretende
preencher, a imagem da empresa, a urgência no preenchimento do cargo e o orçamento disponível.
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Figura 2 – Exemplo de um processo de Recrutamento e Selecção

O processo de selecção visa, como vimos, escolher o melhor candidato dos vários que são
gerados no processo de recrutamento. Este é um processo crítico, pois a diferença de
produtividade entre um bom e um mau funcionário pode ter impactos muito significativos no
desempenho da organização. Para além da avaliação dos aspectos relacionados com as
competências técnicas dos candidatos, é importante analisar o seu perfil comportamental para
tentar perceber como se irá integrar na cultura da empresa. A empresa deve também procurar
realizar várias provas ou fases no processo, que lhe permitam avaliar de ângulos distintos o
máximo de
Gestão e Organização de Empresas

parâmetros, de forma a que a avaliação que é feita tenha a maior validade possível, ou seja, que
consiga ser um bom indicador do desempenho futuro dos candidatos no desempenho da função.
Entre os meios de avaliação que as empresa utilizam, podemos destacar a entrevista de
recrutamento, a avaliação curricular, os testes psicotécnicos e os testes de grupo. Uma
tendência mais recente é a utilização de Assessment Centers, que consistem na aplicação de
múltiplos testes aos candidatos, avaliando todas as competências que serão necessárias na função
em aberto através de testes variados mas adaptados à realidade da função e utilizando múltiplos
avaliadores.

Figura 3 – Grelha de testes e competências avaliadas num Assessment Center

Teste
role-play role-play Exercício de
Competência in-tray "avaliação "telefonema Estudo de caso
Discussão de
raciocínio
grupo
performance de vendas" matemático

Comunicação escrita ** **

Planeament
** * ** **
o financeiro

Controlo operacional ** ** **

Negociação * ** ** ** **

Orientação para o
** * ** * *
trabalho
Desenvolvimento de
* **
colaboradores

Networking ** **

Perseverança * ** ** **

O processo de Recrutamento e Selecção não se deve concluir sem incluir uma fase de acolhimento
e integração do recém contratado na organização, de forma a que a sua socialização seja rápida e
eficaz e o novo colaborador se familiarize rapidamente com os procedimentos e métodos de
trabalho da organização e compreenda a cultura organizacional, de forma a que possa dar um
contributo válido à organização.

3.3. Desenvolvimento e Formação

A formação profissional é uma experiência de aprendizagem que busca uma mudança


relativamente permanente numa pessoa, a fim de melhorar a sua capacidade no desempenho do
cargo. Pode envolver a mudança de habilidades,
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conhecimentos, atitudes ou comportamentos. O desenvolvimento do funcionário, por outro lado,


focaliza os cargos futuros na organização, ou seja, pretende preparar o funcionário para uma
promoção futura.

A formação pode-se classificar em interna ou externa, conforme seja ministrada por formadores
que pertencem aos quadros da empresa ou por formadores sem vínculo laboral permanente à
organização. A formação pode ser em sala (quando é realizada numa sala de formação), on the
job (quando é realizada no posto de trabalho), outdoor (quando é realizada ao ar livre) ou
online (quando é realizada via Internet).

A formação pode ter diversos objectivos, nomeadamente o nivelamento dos conhecimentos da


base dos funcionários (quando existe bastante disparidade entre as formações de base), a
actualização das competências (funcionários com formação numa determinada área fazem
formação para se familiarizarem com novos métodos de trabalho), a aquisição de novas
competências (novos conhecimentos que passaram a ser necessários para o bom desempenho da
sua função), a finalização e aplicação à função (quando os funcionários têm uma formação de base
generalista e se dá formação mais específica da função que vão desempenhar, a integração na
cultura (quando um novo funcionário entra na empresa), a reconversão (quando se pretende que
o funcionário adquira competências para assumir uma função distinta da que desempenhava
anteriormente).

O processo de formação deve iniciar-se com um Diagnóstico de Necessidades de Formação,


em que se identificam as competências necessárias para o correcto desempenho de cada função
na organização e se avaliam as competências detidas pelos funcionários que desempenham
essas funções. As lacunas identificadas e as dificuldades sentidas pelos trabalhadores no
desempenho das suas funções serão as necessidades de formação. A fase seguinte é a concepção
da formação. Nesta fase, serão concebidos os conteúdos e metodologias da formação, de
forma a que os funcionários possam adquirir as competências de que necessitam. A fase seguinte
é a da implementação, em que a formação concebida é ministrada aos seus destinatários. Nesta
fase, o trabalho da Função Recursos Humanos é gerir a logística do processo. No final da
implementação, há um momento de pré-avaliação, em que se inquirem os funcionários que
receberam a formação para avaliar a sua satisfação com os conteúdos e as metodologias e testar
a aquisição dos conhecimentos. Mas o processo não termina aqui. É importante haver um
acompanhamento do desempenho dos funcionários, para garantir que não há obstáculos à
aplicação dos novos conhecimentos e para os apoiar na modificação dos comportamentos. Algum
tempo mais tarde dá-se a avaliação do processo, que consistirá em analisar o impacto da
formação no desempenho dos trabalhadores (se os comportamentos
Gestão e Organização de Empresas

foram modificados da forma consistente e se os colaboradores estão a ter um desempenho


melhor do que apresentavam antes da formação).

3.4. Avaliação de Desempenho

O sistema formal de avaliação de desempenho de uma empresa consiste na forma pela qual
uma organização mede e avalia a eficácia dos desempenhos dos seus colaboradores. Este
sistema pretende actuar no sentido da maximização dos níveis de produtividade, motivação e
satisfação dos colaboradores. É um processo que interage com outras práticas de recursos
humanos nas organizações, como sejam a formação profissional (é na avaliação de desempenho
que se identificam muitas dificuldades no desempenho das funções e lacunas na formação), a
promoção (serão os colaboradores com melhores níveis de desempenho que serão escolhidos
para promoção), o desenvolvimento de carreiras (a avaliação de desempenho permite identificar
as áreas de melhor desempenho do colaborador e identificar potenciais percursos de evolução
na empresa) e a retribuição (que deverá ser justa face ao desempenho evidenciado pelos
colaboradores).

O processo de avaliação de desempenho deve iniciar-se com a definição dos critérios de avaliação
que irão ser utilizados, isto é, deve-se definir à partida o que vai ser avaliado no desempenho,
para que os funcionários saibam o que se espera deles e possam ter os comportamentos
desejados. Os critérios deverão ser fiáveis (garantir que diferentes avaliadores apresentarão
avaliações consistentes), relevantes (estar relacionados com aspectos importantes do trabalho),
sensíveis (permitir distinguir entre bons e maus desempenhos) e aplicáveis (mensuráveis, com
dados objectivos e fáceis de obter). Deverão ser definidos critérios de esforço e critérios de
resultado. Seguidamente, devem ser definidos padrões de desempenho nos vários critérios.
Consoante os critérios (quantitativos ou qualitativos), estes padrões de desempenho serão
definidos em termos de comportamentos desejáveis e objectivos a alcançar. A fase seguinte
consiste na medição do desempenho. Esta medição deverá ser feita de forma consistente ao longo
do ano e não apenas num único momento de avaliação. Os resultados dessa medição consistente
do desempenho deverão ser comparados com os padrões de desempenho definidos e deverá ser
dado feedback aos colaboradores sobre o seu desempenho para que eles possam corrigir os
comportamentos indesejados e acompanhar a evolução do seu desempenho. A medição do
desempenho pode ser feita utilizando escalas ancoradas em traços de personalidade, escalas
ancoradas em comportamentos, escalas de escolha forçada, escalas de ordenação e gestão por
objectivos.
Gestão e Organização de Empresas

Figura 4 – Instrumentos de Avaliação de Desempenho

3.5. Gestão da Compensação

O Sistema de Recompensas consiste no “conjunto de contrapartidas materiais e imateriais que


os empregados recebem, em razão da qualidade do seu desempenho, do seu contributo de longo
prazo para o desenvolvimento do negócio e da sua identificação com os valores (…) da empresa”
(Câmara et al., 2001: 383).

O objectivo primário deste sistema e, por conseguinte, da Gestão da Compensação, é ser uma
ferramenta de alinhamento e reforço da estratégia da empresa. Ou seja, a compensação deve garantir
que são recompensados os comportamentos e resultados consistentes com a estratégia da empresa,
sendo assim um forte apoio na sua implementação. Para além deste objectivo genérico, são também
objectivos da compensação atrair e reter pessoas competentes (o mercado de trabalho é muito
competitivo e as pessoas talentosas tenderão a ir trabalhar para as empresas que lhes ofereçam
melhores recompensas), motivar os trabalhadores (oferecendo recompensas adequadas às
expectativas e preferências dos trabalhadores) e reforçar a cultura (ligando as recompensas aos
comportamentos desejados). Para que consiga alcançar estes objectivos, o sistema de recompensas
deve garantir competitividade externa (ser tão atractivo para os trabalhadores como os sistemas dos
concorrentes) e equidade interna (recompensar as pessoas na devida medida do seu contributo para
a organização.
Gestão e Organização de Empresas

Utilizando a terminologia de Herzberg, podemos classificar as recompensas em intrínsecas (quando


estão relacionadas com o trabalho em si e podem gerar motivação) e extrínsecas (quando se
relacionam apenas com o contexto do trabalho e apenas podem gerar insatisfação ou ausência de
insatisfação). A Gestão da Compensação visa construir um Sistema de Recompensas adequado às
pessoas da empresa, ao seu negócio e à sua capacidade de o suportar.
Nas recompensas intrínsecas podemos identificar o tipo de trabalho (satisfação que proporciona e
grau de autonomia com que é executado, o reconhecimento pelo trabalho realizado e o
desenvolvimento pessoal e progressão na carreira. As recompensas extrínsecas incluem o salário, os
benefícios (subsídios e complementos, carro de serviço, cartão de crédito, etc.) e os símbolos de
estatuto (regalias visíveis, que servem para distinguir os seus beneficiários dos restantes
funcionários).

1. Referências bibliográficas
Barney, J. (1991) “Firm Resources and Sustainable Competitive Advantage”. Journal of
Management, Vol 17, nº 1, 99-120.

Besseyre des Horts, C-H. (1987) “Typologies des pratiques de gestion des ressources humaines”.
Revue Francaise de Gestion, Nov-Dez., 149-155.

Câmara, P., Balreira Guerra, P e Vicente Rodrigues, J (2001) Humanator – Recursos


Humanos e Sucesso Empresarial, 4ª edição revista e actualizada. Dom Quixote.

Dessler, G. (2009) Fundamentals of Human Resource Management. Prentice Hall

Donnelly, J., Gibson, J. e Ivancevich, J. (2000) Administração – Princípios de Gestão


Empresarial, 10ª edição. McGraw-Hill

Gonçalves das Neves, J. (2007) “Gestão de Recursos Humanos: Evolução do Problema


em Termos dos Conceitos e das Práticas”, in António Caetano e Jorge Vala (orgs.)

Gestão de Recursos Humanos – contextos, processos e técnicas. RH Editora, 3-30.


Ivancevich, J. (2008) Gestão de Recursos Humanos, 10ª edição. McGraw-Hill
Gestão e Organização de Empresas

TEXTO Nº 11
Conceitos Fundamentais de Estratégia
Gabriel Silva

A ESTRATÉGIA
Pretendemos, com este texto, apresentar um conjunto de notas pedagógicas que facilitem o acompanhamento e estudo
da matéria de Estratégia Empresarial no âmbito da disciplina de Introdução à Gestão de Empresas. Será assim, como
que a abertura de caminhos para a compreensão dos principais conceitos e ferramentas que se usam neste domínio.
A partir deste ponto usa-se o termo estratégia em vez de estratégia empresarial.

1 – As origens da Estratégia
Reconheceu-se, desde sempre, a necessidade de coordenar as diferentes funções empresariais, tal como foram
definidas pela primeira vez por Fayol. Aliás a função coordenação era assumida por este autor como uma das funções
de gestão. Desde cerca de os primeiros anos do século XX que na Universidade de Harvard se ensinava uma disciplina
de Política da Empresa, que procurava, justamente integrar as diferentes funções que eram exercidas por diferentes
responsáveis. Esta tarefa era normalmente cometida ao director geral, que coordenava os diferentes directores
funcionais.
Estes cursos académicos eram leccionados ou por líderes de grandes empresas que se tinham entretanto reformado
ou pelos professores mais experientes dos departamentos de gestão, normalmente docentes que estavam já na recta
final da sua actividade docente devido à sua grande experiência e conhecimentos consolidados de gestão. Nestes cursos
procurava-se descrever as experiências de directores gerais bem-sucedidos na condução dos negócios das suas
empresas e utilizava-se o método do caso como ferramenta essencial para a aprendizagem através da análise e
discussão de casos.
No entanto, as empresas iam crescendo, diversificando as suas actividades e a gestão tornava-se mais complexa,
sobretudo em empresas do sector automóvel, petróleo, químico e distribuição e os gestores iam desenvolvendo
métodos próprios para gerirem as suas empresas. A necessidade de pensamento estratégico explícito foi articulado,
pela primeira vez pelos gestores de topo dessas empresas. Alfred Sloan, por exemplo, presidente da General Motors
entre 1923 e 1946, criou uma estratégia de sucesso baseada nas forças e fraquezas do maior concorrente da sua
empresa, a Ford (Ghemawat, 1999).
Do ponto de vista teórico, o nascimento da gestão estratégica pode ser atribuído a três trabalhos publicados na década
de sessenta Strategy and Structure de Alfred Chandler Jr. (1962), Corporate Strategy de Igor Ansoff (1965) e Business
Policy: Text and Cases de Learned, Christensen, Andrews e Guth (1965), cuja parte de texto é atribuída a Andrews
(Rumelt et al., 1998).

208
Gestão e Organização de Empresas
Em 1962 Chandler publica a sua obra “Strategy and Struture: Chapters in the History of the American Entreprise” em
que analisa a crescimento “evolução das grandes empresas e explorava a forma como as suas estruturas administrativas
tinham sido adaptadas para sustentar o seu crescimento. Ao descrever a história do crescimento e das alterações
administrativas ocorridas na General Motors, na Sears, na Standard Oil of New Jersey (Exxon) e na DuPont, Chandler
evidenciou como os executivos dessas empresas descobriram e desenvolveram regras para eles próprios utilizarem
no processo de tomada de decisões de longo prazo acerca da orientação das suas empresas e como, resultado disso,
procediam em relação a investimentos e a modificações da estrutura organizacional de modo a permitir que as
estratégias funcionassem.
Ao formular as suas conclusões Chandler entendeu ser conveniente definir os conceitos de estratégia e de estrutura:
“A tese segundo o qual diferentes formas de organização resultam de diferentes tipos de crescimento pode ser descrita
mais precisamente se o planeamento e a condução desse planeamento forem considerados uma estratégia, e a
organização concebida para administrar essas actividades e recursos, uma estrutura. A estratégia pode ser definida
como a determinação das metas e dos objectivos básicos de longo prazo de uma empresa e a adopção de cursos de
acção e afectação dos recursos necessários para conseguir estes objectivos (pp. 15-16)
Posteriormente Ansoff (1965) sistematizou o conceito em função dos produtos e mercados, dos vectores de
crescimento – em que considerou quatro opções: penetração no mercado, extensão de produtos, extensão de
mercados e diversificação – vantagem competitiva e sinergia. A preocupação fundamental de Ansoff era garantir que a
empresa tivesse uma estratégia global coerente e distinguiu as decisões em estratégicas, administrativas e operacionais.
Procurando as primeiras estabelecer um equilíbrio entre a empresa e a sua envolvente externa.
Na universidade de Harvard na mesma altura um conjunto de professores de política da empresa liderados por
Kenneth Andrews e C. Roland Christensen levantavam questões essenciais para a formulação da estratégia. A
estratégia era, de acordo com estes autores, “o conjunto dos objectivos, finalidades, metas, directrizes fundamentais
e os planos para atingir esses objectivos, postulados de forma a definir em que actividades se encontra a empresa, que
tipo de empresa é ou deseja ser”. Os componentes da estratégia seriam: oportunidades de mercado; capacidade,
competências e recursos da empresa; valores e aspirações dos dirigentes e reconhecimento de obrigações para com
outros segmentos além dos accionistas, isto é, responsabilidade social.
Em esquema, de acordo com Andrews (1971) o processo seria o seguinte:

208
Gestão e Organização de Empresas

Estavam lançadas as bases em que iria assentar a evolução da estratégia até à actualidade.
Os anos setenta foram caracterizados pelo desenvolvimento de ferramentas para gerir carteiras de negócios por
empresas de consultoria, de que destaco a contribuição do Bóston Consulting Group (BCG) e da McKinsey e pelos
estudos pioneiros na Pardue University sobre estratégia e desempenho (Schendel e Haten) na indústria cervejeira dos
Estados Unidos e pela aplicação de métodos estatísticos na investigação em Estratégia, em que se destaca a tese de
doutoramento de Richard Rumelt (1974) na Universidade de Harvard em que testa as teses de Chandler. As sucessivas
teses de doutoramento sobre estratégia que se seguiram entre asquais se destaca a de M. Porter, vieram consolidar e
estabelecer a estratégia como ramo autónomo na gestão de empresas.
O domínio da estratégia foi influenciado, a partir dos anos oitenta, pelo trabalho de M. Porter (1979, 1980, 1985) que
introduziu conceitos inovadores tais como a estratégia competitiva cujos conceitos nucleares são a análise do sector,
a análise da concorrência e o posicionamento estratégico, precisou o conceito de vantagem competitiva definindo-o
em função de custos e diferenciação e ligou-o à rentabilidade. Para sustentar vantagens competitivas introduziu o
conceito de cadeia de valor.
As empresas, sustenta Porter (1980), “devem ver o seu contexto competitivo com clareza e devem construir e
proteger uma posição que possam defender”. Para isso, defende este autor que “existem benefícios substanciais através
de um processo explícito de formulação da estratégia, assegurando-se que, ao menos, as políticas... sejam coordenadas
e visando os mesmos objectivos” 1, no entanto, não existe “uma metodologia abrangente... visando auxiliar as empresas
como um todo e a prever a futura evolução da empresa, compreender a concorrência e a sua própria posição e
traduzir esta análise numa estratégia competitiva” 2. É justamente para responder a estas insuficiências que Porter
escreve esta obra e em particular desenvolve e aplica como conceitos centrais: o Modelo das Cinco Forças, para analisar
a atractividade de uma indústria e as estratégias genéricas, para o posicionamento dentro de uma indústria, para obter

1
“Competitive Strategy”, Free Press, 1980.
2
Idem ponto anterior.
208
Gestão e Organização de Empresas
um retorno acima da média. Refira-se que têm sido realizados inúmeros trabalhos de investigação teórica e
experimental sobre as estratégias genéricas e sobre a relevância do sector para explicar diferenças na rentabilidade.
O pensamento de Porter dominou claramente a investigação e prática da estratégia ao longo dos anos oitenta.
Finalmente, desenvolveu-se a partir de meados dos anos oitenta uma nova teoria baseada nos recursos e capacidades
das empresas (Wernerflet, 1984; Rumelt, 1984 e Barney, 1986), que se vai consolidar nos anos noventa (Barney, 1991;
Connor, 1991; Peteraf, 1993) que vai procurar explicar diferenças na rentabilidade das empresas com base nos factores
internos, justamente os recursos e capacidades. Esta perspectiva da estratégia, de acordo com Barney (2004), domina
claramente a investigação actual na área.
Afinal o que é a estratégia? Numa primeira aproximação e de uma forma intuitiva e largamente consensual no meio
académico, será o caminho de longo prazo que a empresa vai percorrer para atingir os seus objectivos. Numa asserção
mais profunda e na esteira de Rumelt et al., (1998) “as empresas, se não mesmo todas as organizações, encontram-se
em concorrência – concorrência por factores de inputs, concorrência por clientes e, em última instância, concorrência
por receitas que cubram os custos dos meios utilizados para sobreviverem. Mas para sobreviverem, devido à
competição as empresas têm de fazer escolhas: a selecção de objectivos; a escolha de produtos e serviços a serem
oferecidos; o desenho e configuração das políticas que determinam o modo como a empresa se posiciona para
competir nos mercados (e.g., estratégia competitiva); a escolha de um nível apropriado de amplitude e diversidade; e
o desenho da estrutura organizacional, dos sistemas administrativos, e das políticas utilizadas para definir e coordenar
o trabalho. É uma proposição básica da área da estratégia que estas escolhas têm influência crítica no sucesso ou
insucesso da empresa, e que devem ser integradas. É a integração (ou o padrão da sua aplicabilidade) destas escolhas
que faz deste conjunto uma estratégia” (pp. 27-28).
É consensual neste domínio de conhecimento que o objectivo da estratégia é perceber como é que algumas empresas
conseguem obter, de forma consistente no tempo, resultados mais elevados que os seus concorrentes e conseguem
criar valor económico, isto é, obtêm rendimentos ou resultados acima da média, ou seja resultados supra normais
(Teece et al., 1997).
Para que isso aconteça as empresas procuram ser diferentes e, neste sentido, a estratégia também é a procura de
diferenças que possam persistir no tempo (em ambientes mais estáveis) ou que se possam ir conseguindo e obtendo
constantemente (em ambientes hiper-competitivos). Estas diferenças podem advir dos mercados que as empresas
escolhem ou da dotação de recursos que cada empresa acumula no tempo.

2. Principais correntes do pensamento em Estratégia

Vamos agora abordar as duas principais correntes da estratégia explicando cada uma delas como se podem obter
vantagens competitivas. Uma parte da análise do ambiente externo (modelo I/O) a outra do interior da empresa (RBV).
Na realidade, estas duas perspectivas não são antagónicas mas antes, como assinala Wernerfelt (1984), são duas faces
da mesma moeda.

208
Gestão e Organização de Empresas

Modelo I/O

Dos anos 60 até aos 80, o ambiente externo era considerado o principal determinante das estratégias a serem
seleccionadas pela empresa. O modelo de organização industrial (I/O) explica a influência dominante do ambiente externo
sobre as acções estratégicas da empresa. O modelo especifica que o sector no qual uma empresa decide actuar exerce
maior influência no seu desempenho do que as decisões tomadas internamente pelos seus gestores. Considera-se que
esse desempenho seja determinado basicamente por um conjunto de características do sector, economias de escala,
barreiras à entrada no mercado, diversificação, diferenciação de produto e grau de concentração de empresas nesse
sector.

Baseando-se na economia, o modelo I/O parte dos seguintes pressupostos:

• que o ambiente externo impõe pressões e limitações que determinam as estratégias capazes de gerar
retornos superiores à média;

• que quase todas as empresas que actuam em um determinado sector ou segmento deste controlam
recursos semelhantes e estrategicamente pertinentes e adoptam estratégias semelhantes;

• que os recursos empregues na implementação de estratégias são altamente móveis de empresa para
empresa; desta forma eventuais diferenças em recursos que se possam desenvolver entre empresas serão
rapidamente eliminados;

• que os gestores que detêm o poder de decisão organizacional são racionais e têm o compromisso de actuar
nos melhores interesses da empresa, como demonstra o seu comportamento de maximização de lucros.

Nesta lógica a principal decisão dos gestores é escolher o sector (ou indústria) mais atraente para actuar. Pelo facto de se
supor que muitas delas possuam recursos estratégicos semelhantes e que se podem mudar rapidamente de acordo
com as necessidades da empresa. A rentabilidade será aumentada se a empresa encontrar um sector atractivo (e.g.,
que proporcione elevados retornos) e souber utilizar os seus recursos na implementação das estratégias exigidas
pelas características estruturais desse sector. O modelo das cinco forças de Porter é uma ferramenta analítica que
pode ser usada nessa tarefa. Para empresa obter retornos acima da média, no sector escolhido, deve seguir claramente
uma das estratégias genéricas sugeridas por Porter (1980) liderança em custos, diferenciação ou focalização.

Como mostra a Figura 1, este modelo sustenta que seja possível auferir retornos superiores à média quando a
empresa implementa uma estratégia ditada pelas características dos ambientes geral, da indústria e da concorrência. A
probabilidade de êxito é maior para as empresas que conseguem desenvolver ou adquirir as competências internas
necessárias à implementação das estratégias ditadas pelo ambiente externo. Assim, retornos superiores à média resultam
de características externas e não de recursos e capacidades únicos da empresa.

Estas conclusões são apoiadas por investigações recentes, que demonstraram que cerca de 20% da rentabilidade das
empresas era devida ao sector em que actuavam. Mas, esta investigação também demonstrou que 36% da variação
na rentabilidade poderia ser atribuída às características e acções dessa empresa. Os resultados das pesquisas sugerem que
tanto o ambiente quanto as características da empresa desempenham um importante papel na determinação do nível
208
Gestão e Organização de Empresas
específico de sua rentabilidade Assim, é provável que haja uma relação recíproca entre o ambiente e a estratégia
da empresa e que essa relação afecte o seu desempenho.

Segundo essas investigações, para que uma firma tenha sucesso no cenário competitivo do século XXI, é essencial que
ela constitua um conjunto único de recursos e capacidades. Entretanto, essa tarefa deve ser levada a cabo segundo a
estrutura da dinâmica do sector (ou sectores) de actuação da empresa. Nesse contexto, ela é vista como um conjunto
de actividades de mercado e de recursos. As actividades de mercado serão entendidas mediante a aplicação do modelo
I/O. O desenvolvimento e o uso eficaz dos recursos capacidades e competências são entendidos através da aplicação do
modelo baseado em recursos. Usando uma combinação eficaz dos resultados adquiridos pelo uso do modelo I/O e
do modelo baseado em recursos, a empresa poderá ampliar dramaticamente a probabilidade de alcançar vantagem
competitiva sustentável e de auferir retornos superiores à média, em longos períodos.

208
Gestão e Organização de Empresas

Modelo dos Recursos e Capacidades (RBV)

Nos anos noventa, a investigação para explicar a persistência de resultados elevados deslocou-se da análise do poder
de mercado para o estudo dos recursos e características idiossincráticas das empresas e em especial para a
identificação dos activos que sustentam desempenhos superiores (Hoskisson et al. 1999). Esta teoria denominada
teoria de recursos e capacidades (em inglês, Resource-based View, RBV) vê a empresa como sendo uma colecção de
recursos produtivos e administrativos única, por isso, cada empresa tem condições particulares, que permanecem e
se consolidam ao longo do tempo, e assenta em dois pressupostos:
• Pode existir heterogeneidade entre empresas em relação aos recursos e capacidades em que
baseiam as suas estratégias;

• Os recursos e capacidades podem não ser perfeitamente móveis entre os participantes na indústria,
admite-se que existam barreiras à movimentação de recursos (Spanos e Lioukas, 2001).

Desta forma as diferenças de desempenho entre empresas são explicadas mais pela diferença de recursos e
capacidades, de origem interna entre empresas do que pelas características estruturais do sector. Com o passar do
tempo as empresas são capazes de adquirir ou desenvolver um conjunto de recursos e capacidades de características
únicas. Por sua vez os produtos e serviços oferecidos no mercado são condicionados pelas características dos recursos
e capacidades da empresa e são estes que determinam o carácter único da oferta da empresa na resposta às
necessidades e desejos dos clientes.
Os recursos são os inputs ao processo de produção da empresa, como equipamentos importantes, habilidades
individuais dos funcionários, patentes, finanças e gestores detalento. Em geral, podem ser classificados em três categorias:
físicos, humanos e capital organizacional. Podem ser de natureza tangível ou intangível. Aumentando-se a eficácia, o
conjunto de recursos disponível para a empresa tende a ampliar-se.

Não é muito provável que os recursos individuais por si sós consigam gerar uma vantagem competitiva. Por exemplo, um
equipamento de fabricação sofisticado apenas poderá tornar-se um recurso estrategicamente pertinente quando a sua
utilização for integrada com eficácia a outros aspectos das operações da empresa (tais como: marketing e o trabalho
dos empregados). De um modo geral, as vantagens competitivas são constituídas pela combinação e integração
dos conjuntos de recursos. Capacidade é a condição que um conjunto de recursos possui de desempenhar uma
tarefa ou actividade de forma integrada. Por meio do uso continuado, as capacidades ficam fortalecidas e tornam-se mais
difíceis de serem entendidas e imitadas pela concorrência. Nem todos os recursos e capacidades de uma empresa têm
potencial para servir de base para uma vantagem competitiva. Esse potencial será realizado se os recursos e capacidades
forem valiosos, raros, dispendiosos de imitar e insubstituíveis. Então os recursos são considerados:

• Valiosos, quando permitem à empresa beneficiar-se das oportunidades ou neutralizar as ameaças


em seu ambiente externo;

• Raros, de oferta limitada no mercado;


208
Gestão e Organização de Empresas
• De imitação dispendiosa, quando outras empresas não conseguem obtê-los ou necessitam
incorrer em custos elevados para os obtêr, em comparação com uma outra que já os possui;

• Insubstituíveis, quando não existam outros que possam fazer a mesma função.

Os recursos e capacidades que têm estas características vão servir de base à estratégia, quer à formulação, quer à
sua implementação, denominando-se por isso recursos ou capacidades centrais.

Exemplos de competências centrais: marketing, gestão (capacidade de organizar e administrar com eficácia
operações complexas e variadas e a capacidade de criar e comunicar uma visão estratégica) relacionadas com o
produto (capacidade de desenvolver novos produtos inovadores e de trabalhar de novo os já existentes para
satisfazer às preferências do consumidor em constante fase de mudança), capacidade para gerar competências
dinâmicas (são especialmente importantes em ambientes sujeitos a mudanças rápidas, como os dos sectores de alta
tecnologia).

O modelo de recursos e capacidades (Figura 2), pressupõe que o ambiente interno da empresa, em termos de seus
recursos e capacidades, seja factor mais crítico na determinação das medidas estratégicas, do que o externo. A estratégia
seleccionada deverá permitir que a empresa faça o melhor uso de suas competências centrais em relação às
oportunidades do ambiente externo.

208
Gestão e Organização de Empresas

3 - O processo da gestão estratégica


3.1 - As 5 tarefas da estratégia

O processo de gestão estratégica é a forma como os estrategas ou gestores de topo das organizações determinam os
objectivos das suas empresas, escolhem as estratégias para os atingir, as implementam e controlam de forma a garantir
que alcançam as metas a que se propõem. Este processo pode ser descrito em conformidade com o esquema seguinte
(Thompson e Strickland, 1998), em cinco tarefas:

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Gestão e Organização de Empresas
As Cinco Tarefas
da Estratégia
T. 1 T. 2 T. 3 T. 4 T. 5
Desenvolver Conceber a
Implementar Avaliar e
Missão e Definir Estratégia
e Executar Efectuar
Visão Objectivos para atingir
Estratégia Correcções
Estratégica Objectivos

Rever se Rever se Melhorar/ Melhorar/ Renovar se


Necessário Necessário Alterar Alterar Necessário

A primeira tarefa é então desenvolver a Missão e Visão Estratégica, o que significa que se começa por pensar
estrategicamente sobre a imagem da empresa no futuro e para onde se quer conduzir a empresa. Consiste em criar o
caminho para o futuro da empresa, em decidir qual a futura posição no negócio a atingir e os recursos e capacidades
que se devem planear desenvolver, dando à empresa uma forte identidade.
Os conceitos de Missão e Visão já foram abordados anteriormente, quando se tratou do planeamento no entanto só
para relembrar, a Missão focaliza-se as actividades de negócios actuais, nos negócio(s) em que a empresa está agora,
nas necessidades de clientes servidas actualmente. Por outro lado a Visão estratégica refere-se a caminhos futuros
dos negócios, ao tipo de empresa a ser no futuro, às necessidades de clientes a servir no futuro, aos recursos e
capacidades a desenvolver.

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Gestão e Organização de Empresas

Missão vs. Visão Estratégica


l A declaração de l A visão estratégica
missão focaliza as refere-se a caminhos
actividades de futuros dos negócios
negócios actuais 4 Tipo de empresa a
4 Negócio(s) em ser no futuro
que a empresa 4 Necessidades de
está agora clientes a servir no
4 Necessidades de futuro
clientes servidas
actualmente
10

Apresentam-se exemplos de Missão e Visão:


Para a McDonald’s a sua visão é dominar a indústria global de restauração. Isto significa estabelecer os standards de
performance para a satisfação dos clientes enquanto aumentam a quota de mercado e rentabilidade através da
Estratégia de Conveniência, Valor e Execução.
Para os Elevadores Otis, a sua missão é fornecer a qualquer cliente meios para movimentar pessoas e coisas em
distâncias curtas com mais credibilidade que qualquer outra empresa no mundo.

A segunda tarefa é Estabelecer Objectivos, trata-se de converter a visão em metas específicas de performance, algo
que permita acompanhar a performance e progresso da empresa. Desta forma criam-se métricas para acompanhar a
performance e para focalizar a empresa naquilo que é essencial. O processo de estabelecimento de objectivos já foi
desenvolvido em ponto anterior da disciplina, no entanto, devem-se estabelecer objectivos equilibrados para toda a
empresa: financeiros, de clientes, de processos internos e de aprendizagem e desenvolvimento, tal como sugerem
Kaplan e Norton (1992, 1996, 2000), ou em alternativa, como sugerem Thompson e Strickland (1998), relacionados
com a performance financeira (de curto prazo) e objectivos centrados na melhoria da competitividade e na posição
do negócio a longo prazo.

208
Gestão e Organização de Empresas

Tipos de Objectivos

Financeiros Estratégicos

Resultados centrados
Resultados centrados
na melhoria da
na melhoria da
competitividade e na
performance financeira
posição do negócio a
longo prazo
$

15

A terceira tarefa do processo de gestão da estratégia é conceber uma estratégia que se traduza num conjunto de
acções e perspectivas de negócio que os gestores aplicam para alcançar as metas de performances pretendidas.
Normalmente estas acções e decisões têm a ver com decisão de diversificação ou concentração num negócio, com a
forma de crescimento produto-mercado escolhida (penetração, extensão de produto, extensão de mercado ou
diversificação), com a escolha da estratégia competitiva para cada negócio (liderança em custos, diferenciação ou
focalização num segmento de mercado) e com o método seleccionado para desenvolver a estratégia (desenvolvimento
orgânico, aquisições e fusões e alianças).
As decisões estratégicas podem ser o resultado de um processo de planeamento (decisões planeadas) ou em alternativa
podem ser reacções adaptativas a alterações inesperadas no contexto externo (e que se apoiam na experiência anterior
dos gestores).
Se quisermos perceber a estratégia da empresa devemos então procurar as seguintes decisões e acções, que estão no
quadro “Compreender a Estratégia Empresarial”:
A quarta tarefa do processo de gestão da estratégia é a Implementação, que se traduz, de uma forma elementar
num conjunto de actividades voltadas para acção e que visam desenvolver capacidades, conceber uma estrutura
organizacional adequada, construir o plano estratégico, desenvolver políticas e orçamentos de suporte, envolver e
motivar os principais intervenientes alinhando os sistemas de incentivos com o atingir das metas estratégicas, conceber
sistemas e informação adequados, construir uma cultura organizacional que facilite a implementação e melhoria
continua e liderar todo o processo através do envolvimento e participação da gestão de topo.

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Gestão e Organização de Empresas

Compreender a Estratégia empresarial


-- O que procurar
Diversificação
Acções para fortalecer Acções de Respostas
Recursos e capacidades às mudanças

Com é que as Manobras


actividades ofensivas para
funcionais estão a Modelo de
Acções que obter lucros
ser geridas
definem a
Estratégia Alterações em
Manobras linhas de produtos,
defensivas Qualidade ou
Serviço
Detectar novas
oportunidades Alterar Cobertura
Geográfica, Integração
Aquisições ou Fusões
Montante e Jusante ou
Alianças, ou
obter nova posição
Colaboração 22

Finalmente a quinta tarefa é a Avaliação da Performance para que se garanta que se atingem os objectivos e se
procedam aos ajustamentos necessários.

3.2 - Níveis de estratégia corporativa, unidade estratégica de negócio (SBU)


e funcional

As estratégias existem a vários níveis numa organização sendo possível distinguir pelo menos 3 níveis distintos de
estratégia organizacional. A estratégia corporativa refere-se ao objectivo e âmbito geral da organização para responder
às expectativas dos detentores do capital e dos stakeholders e à forma de acrescentar valor aos diversos componentes
(negócios individuais) da empresa. Trata-se de conceber uma estratégia global para todos os negócios que estão na
empresa diversificada para que se crie valor.

Uma questão importante é qual deverá ser a dimensão da organização em termos de tipos de negócio e cobertura
geográfica. Isto é decisões sobre o âmbito da diversificação e de internacionalização da empresa. Também é ao nível
corporativo que se tomam as decisões de distribuição de recursos pelas várias sucursais em todo o mundo. Para fazer
isso, o nível corporativo deve considerar que forma pode acrescentar valor aos diversos negócios do grupo. Pode-se
considerar que isso se faz com a prestação de serviços por parte do núcleo e a delineação de uma estratégia coerente
para todo o mundo. A estratégia de nível corporativo também deverá considerar as expectativas dos detentores do
capital.

Em empresas cotadas em bolsa, a estratégia corporativa é fortemente influenciada pelas expectativas dos accionistas e

208
Gestão e Organização de Empresas
dos mercados de capitais. Uma estratégia corporativa clara é importante porque é a base para outras decisões
estratégicas. Esta estratégia corporativa pode resultar numa declaração de missão, implícita ou explícita, que reflecte
essas expectativas.

O segundo nível da estratégia pode ser estruturado em termos da unidade estratégica de negócio. Neste nível,
a estratégia define-se como a forma de competir com sucesso num dado mercado. Assim, este nível da estratégia
preocupa-se com a forma de alcançar uma vantagem sobre os concorrentes, com novas oportunidades que possam
ser identificadas ou criadas no mercado, que produtos e serviços devem ser oferecidos em cada mercado, e de que
forma estes satisfazem as necessidades dos consumidores para permitir alcançar os objectivos da organização,
nomeadamente lucratividade a longo prazo, crescimento do mercado ou parâmetros de eficiência. Assim, enquanto a
estratégia corporativa envolve decisões acerca da organização como um todo, a este nível, as decisões estratégicas
referem-se à unidade estratégica de negócio (UEN). Uma UEN é uma parte da organização para a qual existe um
mercado externo para bens e serviços distinto (de outras UENs). Assim, é importante haver uma percepção clara das
necessidades dos clientes e de quem são os concorrentes de cada UEN. Aqui pode surgir alguma confusão porque
uma UEN pode não estar necessariamente definida na estrutura organizacional.

O terceiro nível da estratégia é o nível operacional. Aqui encontramos estratégias operacionais que estão
relacionadas com a forma como as várias componentes da organização, recursos, processos, pessoas e as suas
competências, realmente colocam em prática as estratégias de nível corporativo e de negócio. De facto, na maioria
das organizações, as estratégias de sucesso dependem, em larga medida, de decisões que são tomadas e de actividades
que decorrem ao nível operacional. A integração das decisões operacionais e da estratégia é, portanto, de grande
importância.

4 - A análise estratégica

A análise estratégica fundamenta a escolha da estratégia que visa atingir os objectivos decorrentes da missão e da visão.
Como vimos atrás, no ponto 1, há quem defenda que a origem de superior performance decorre dos recursos e
capacidades, outros defendem, que ao contraio, é necessário começar por estudar o contexto em que as empresas
operam. Temos então duas visões complementares que explicam como se obtêm o sucesso que, é como vimos, o
objectivo da estratégia. Então para se formular a estratégia de uma empresa é necessário proceder a uma análise
interna, para detectar as forças e fraquezas da empresa, as suas possibilidades de actuação e é indispensável, também,
proceder a uma análise externa para identificar as oportunidades e ameaças com que a empresa se defronta.

4.1 - Análise interna: “recursos e capacidades” e “cadeia de valor”

Como vimos atrás os recursos e capacidades, de acordo com a Teoria de recursos e Capacidades, são um elemento

208
Gestão e Organização de Empresas
central para explicar diferenças de performance entre as empresas. Neste sentido a atenção e acção dos empresários
e quadros superiores, no desenvolvimento da estratégia, centra-se na alavancagem dos recursos: identificar
recursos únicos e desenvolver capacidades centrais, originando heterogeneidade potencial entre empresas e escolher
os mercados onde se possam aplicar com sucesso as capacidades centrais e em consequência obter desempenho
superior.
Para isso é importante efectuar uma análise interna à empresa para identificar os recursos e capacidades da empresa
que permitam sustentar estratégias eficazes. Os recursos e capacidades determinam as actividades e estas agrupam-se
em processos internos que geram valor para os clientes e margem para a empresa.

Em 1985 Porter desenvolveu o conceito de cadeia de valor para ajudar a perceber como é que os recursos e
capacidades estão a ser utilizados nas actividades realizadas em qualquer empresa. Desta análise podem-se identificar
os pontos de força (actividades ou processos que a empresa executa melhor que a concorrência) e de fraqueza
(actividades ou processos que a empresa executa pior que a concorrência) da empresa.
A cadeia de valor é um método útil de relacionar os recursos com os objectivos estratégicos para os quais esses
recursos devem ser canalizados. São a chave para compreender a capacidade estratégica, já que exige uma análise que
faça uma auditoria profunda e, procure detalhadamente como é que os recursos estão a ser utilizados, controlados e
ligados. Normalmente as razões para um bom ou mau desempenho encontram-se mais aqui do que nos recursos
isoladamente.
O estudo da capacidade estratégica pode degenerar facilmente numa listagem de recursos e dar origem a uma falha na
identificação dos aspectos determinantes em termos estratégicos. Evitar isto é um dos atributos ou potencialidades da
Cadeia de Valor, metodologia fundamental para a selecção estratégica e para o planeamento dos recursos aquando da
implementação estratégica.
Em última instância a capacidade estratégica de uma organização é definida e julgada pelos clientes finais ou utilizadores.
Ser-lhe-á atribuído mais valor de acordo com as várias funções (projecto, produção, marketing, distribuição, etc.). A
análise apoiar-se-á:
• Valor, conceito que se estabelece através da análise que os clientes fazem do produto/serviço face à concorrência.
Terá de se analisar como é que essas diferenças são conseguidas ao longo do percurso na cadeia de valor;
• Parte das actividades são desenvolvidas fora da organização (fornecedores, cadeias dos clientes, etc.) sendo
essencial considerá-las, numa visão alargada circuito da cadeia de valor;
• As ligações (internas e externas) são fundamentais sendo, muitas vezes, a chave da vantagem.
A situação de “vantagem concorrencial” não pode der devidamente apreendida encarando a empresa na sua
globalidade.
Com efeito ela poderá resultar das mais diversas actividades que a empresa correntemente desenvolve para conceber,
produzir, comercializar, distribuir e prestar assistência aos seus produtos. Cada uma destas actividades pode contribuir
para uma determinada posição relativa no domínio dos custos ou para criar uma base da diferenciação. Uma das
vantagens no domínio dos custos poderá resultar, por exemplo, de origens tão díspares como um sistema de
distribuição física de baixo custo, um processo de montagem altamente eficiente ou uma utilização eficiente da força

208
Gestão e Organização de Empresas
de vendas. A diferenciação poderá radicar em factores tão diversos como por exemplo, o aprovisionamento de
matérias-primas de alta qualidade, um sistema interactivo de lançamento de encomendas ou uma concepção avançada
do produto.
Nestas circunstâncias torna-se indispensável desagregar a empresa nas suas actividades estrategicamente relevantes a
fim de se compreender de forma adequada o comportamento dos custos e as fontes actuais ou potenciais de
diferenciação. O instrumento fundamental para proceder a esta análise de modo sistemático é a chamada cadeia de
valor.

Infra-estrutura
Gestão de Recursos Humanos
Actividades
apoio Desenvolvimento de Tecnologia Margem
Aquisições

Logística Operaçõe Logística Marketing Serviço


Entrada saída e Vendas

Actividades
Primárias
Cadeia de Valor

Porém, a cadeia de valor de uma empresa está integrada num fluxo mais vasto de actividades designado por “sistema de
valor” que se pode representar de acordo com os esquemas que se apresentam.

208
Gestão e Organização de Empresas
Cadeia Valor Cadeia Valor Cadeia Valor
Fornecedores Canais Clientes

Cadeia Valor
Organização

Sistema de Valor

Na realidade, os fornecedores controlam igualmente “cadeias de valor” (valor a montante) que compreendem a criação
e distribuição dos “inputs” utilizados na cadeia da empresa. Por outro lado, muitos produtos passam através de cadeias
de valor de canais de distribuição (valor de canal) a caminho do cliente final. Estes canais executam actividades que não
só afectam o comprador como influenciam as próprias actividades da empresa.
Em última análise, o produto da empresa acaba por fazer parte integrante da “cadeia de valor” do cliente.
Ganhar e sustentar uma vantagem concorrencial dependerá, por conseguinte, não só de um claro entendimento da
cadeia de valor da empresa como igualmente do seu enquadramento no sistema global de valor em que está inserida.
A “cadeia de valor” explicita a globalidade do valor formado, consistindo basicamente em actividades de valor e
margem. As actividades que concorrem para a formação de valor podem ser de dois tipos: actividades principais e
actividades de apoio. As primeiras dizem respeito à criação física do produto e à sua venda e transferência para o
comprador bem como à assistência pós-venda. As segundas apoiam as actividades principais e apoiam-se igualmente
entre si proporcionando “inputs” adquiridos ao exterior, tecnologia, recursos humanos e várias funções a nível da
empresa na sua globalidade.
As linhas a tracejado reflectem o facto de os aprovisionamentos, o desenvolvimento tecnológico e a gestão de recursos
humanos poderem estar associados a actividades principais específicas ou apoiarem a cadeia na sua globalidade. A infra-
estrutura da empresa (abrangendo essencialmente a gestão global, o planeamento, as finanças, a contabilidade, os
assuntos legais e a gestão da qualidade) não está associada a nenhuma actividade principal em particular, mas apoia, em
geral, toda a cadeia de valor.
Actividades primárias:
• Logística Interna: actividades relacionadas com a recepção armazenagem e distribuição dos inputs ao
produto/serviço.
• Produção: Transformação dos inputs em produto final (produção, embalagem);
• Logística Externa: recebe, armazena e distribui o produto aos clientes;
• Marketing e Vendas: meios para divulgar e vender os produtos aos clientes;
208
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• Serviços: todas as actividades que realçam ou mantêm o valor do produto ou serviço.

Actividades de suporte:
• Aquisição: processo de aquisição de inputs para as actividades primárias;
• Tecnologia: pode estar relacionada com o produto, com o processo ou com um recurso particular;
• Gestão de Recursos Humanos: é uma actividade fundamental que transcende todas as actividades primárias
(recrutamento, formação, desenvolvimento e recompensa);
• Infra-estrutura da empresa: sistemas de planeamento, controlo de qualidade, finanças, contabilidade, etc.).

O levantamento de recursos não se processa através de uma simples listagem de todos os itens ou actividades
da empresa mas, embora tenha de ser um trabalho de compreensão, apenas sobre aquelas em que assenta a capacidade
competitiva, isto é, aquelas que fazem a diferença na óptica dos clientes.
Podemos dizer que os recursos das empresas se encontram dispersos pelas actividades primárias, sendo
conduzidos pelas actividades de suporte para um objectivo estratégico definido.

4.2 - Análise externa

É aceite que o contexto em que as empresas actuam influencia o seu desempenho, vejam-se as teorias baseadas na
economia industrial e em particular o trabalho de Porter (1979, 1980, 1990) sobre estes assuntos.
De facto condições mais favoráveis, as chamadas oportunidades, facilitam atingir os objectivos da organização, ao
contrário condições adversas, as ameaças, dificultam a consecução das metas definidas.
Nesta sequência a acção e atenção dos empresários e responsáveis de topo das empresas, no desenvolvimento da
estratégia concentra-se no ajuste: identificar oportunidades no contexto e desenvolver capacidades estratégias para
tirar partido dessas oportunidades. Vamos, nos ponto seguintes fazer uma breve incursão em dois modelos que ajudam
a perceber o contexto em que se actua, o modelo PESTAL e o modelo das 5 forças de Porter

4.2.1 - Nível Macro: análise PESTAL

Os factores do macro ambiente influenciam quase todas as empresas. No entanto, influenciam-nas de forma diferente.
Para algumas uma subida das taxas de juros implica maiores custos (empresas com dívida remunerada), para outras, as
que têm excedentes de tesouraria, aumentam os proveitos.
Estes factores costumam agrupar-se em nos seguintes seis grupos: Políticos, Económicos, Sociais, Tecnológicos,
Ambientais e Legais e que se desagregam nos quadros seguintes:

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Gestão e Organização de Empresas

1. Que factores do contexto externo afectam a


organização?
2. Quais desses são mais importantes actualmente?
E nos próximos anos?
Políticos Económicos
• Políticas Socias • Ciclos Económicos
• Política Fiscal • Tendências do PNB
• Regulamentação • Taxas de juro
comercio externo • Oferta de moeda
• Estabilidade de governo • Inflação
• Desemprego
• Rendimento disponível

Análise PESTAL influencias do contexto externo

Gestão Estratégica 2006-2007 ISCAC

1. Que factores do contexto externo afectam a


organização?
2. Quais desses são mais importantes actualmente?
E nos próximos anos?
Socioculturais Tecnológicos
• Demografia • Despesas governamentais em
• Distribuição do rendimento I+D.
• Mobilidade social • Atitude do governo e empresas
• Mudança de estilos de vida no esforço tecnológico.
• Atitudes perante o trabalho e • Novas descobertas
tempos livres /desenvolvimento
• Consumismo • Velocidade da tecnologia.
• Nível de educação • Taxas de obsolescência.

Análise PESTAL das influencias do contexto externo

Gestão Estratégica 2006-2007 ISCAC

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Gestão e Organização de Empresas

1. Que factores do contexto externo afectam a


organização?

2. Quais desses são mais importantes actualmente?


E nos próximos anos?

Ambientais Legais
• Consumo e disponibilidade de • Leis Laborais
Energia
• Legislação anti-monopólios
• Leis de protecção ambiental
• Segurança produtos
• Desperdício
• Saúde e segurança

Análise PESTAL influencias do contexto externo

Gestão Estratégica 2006-2007 ISCAC

4.2.2 - Nível Micro: as “5 forças da concorrência” de Porter

De acordo com Porter “os fundamentos da formulação da estratégia competitiva residem no relacionamento da
empresa com a envolvente” e em especial “na indústria em que compete”. Identificou então cinco forças que
determinam a rendibilidade de uma indústria: ameaça de novos concorrentes; ameaça de substitutos; poder negocial
dos clientes; poder negocial de fornecedores e rivalidade na indústria.
Trata-se então de identificar as indústrias mais atractivas, isto é, aquelas que possibilitem maiores retornos sobre o
investimento.
Foi, no entanto, preciso esperar pelos anos oitenta para Porter (1980) definir o contexto relevante para análise do
ambiente competitivo: a indústria. Este modelo de análise fundamentou-se nos trabalhos de economia industrial cujos
percursores foram, sem dúvida, os trabalhos de Mason (1939) e Bain (1956) nos quais se referia que o desempenho
era determinado pela estrutura do mercado. Partindo desta perspectiva Porter pretende identificar os factores que
determinam a estrutura do mercado, ou na terminologia de Porter, os factores que influenciam o potencial ou
atractividade de uma indústria. Para o efeito é necessário identificar as principais forças que determinam o retorno
sobre o investimento a longo prazo. Porter (1980) identificou cinco forças, rivalidade entre os concorrentes, ameaça
de novas entradas, ameaça de substitutos, poder de negociação de clientes e de fornecedores. É a atractividade que
determina a rendibilidade a longo prazo de uma indústria. As empresas, reafirma Porter (1991), “devem ver o seu
contexto competitivo com clareza e devem construir e proteger uma posição que possam defender”.

Modelo das cinco forças


Porter (1980) defende que “existem benefícios substanciais através de um processo explícito de formulação da

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Gestão e Organização de Empresas
estratégia, assegurando-se que, ao menos, as políticas... sejam coordenadas e visando os mesmos objectivos”3, no
entanto, não existe “uma metodologia abrangente... visando auxiliar as empresas como um todo e a prever a futura
evolução da empresa, compreender a concorrência e a sua própria posição e traduzir esta análise numa estratégia
competitiva”4 e continua o autor mais à frente “a essência da formulação da estratégia competitiva é relacionar a
empresa com o seu meio ambiente… o aspecto principal do meio” que “tem uma forte influência na determinação
das regras competitivas… assim como das estratégias potencialmente disponíveis.
Tratar-se-ia então de determinar que factores ou forças influenciam a estrutura da indústria e qual vai ser a sua
evolução no futuro. Porter identifica cinco forças que determinam a rendibilidade de uma indústria: ameaça de novos
concorrentes; ameaça de substitutos; poder negocial dos clientes; poder negocial de fornecedores e rivalidade na
indústria.

Produtos
Substituto

Rivalidade
Fornec
Entre
edores Cliente
Concorrentes

Potenciais
Concorrentes

Figura1 Forças que determinam a estrutura da indústria (Porter, 1980)

Vamos analisar em detalhe cada uma das cinco forças competitivas que, condicionam as estratégias competitivas. De
forma que se possa concluir sobre o poder de cada força competitiva (forte? médio? fraco?). A seguir deve-se explicar
como é que cada força age para criar pressão competitiva e finalmente deve-se decidir se a concorrência global é
brutal, intensa, forte, normal/moderada ou fraca.

• Ameaça de novos concorrentes: a entrada de novos concorrentes vai aumentar a intensidade da concorrência
e ocorre quando os factores são acessíveis e imitáveis. Depende das barreiras à entrada, entre as quais destacamos

3
“Competitive Strategy”, Free Press, 1980.
4
Idem ponto anterior.
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Gestão e Organização de Empresas
as economias de escala 5, diferenciação de produto, necessidades de investimentos, custos de mudança de
fornecedor, acesso aos canais de distribuição, necessidade de conhecimentos especializados, dificuldade no acesso
às matérias-primas, dificuldades no acesso a subsídios e das ameaças de retaliação, que já se verificaram quando
entraram novas empresas. Quando existem ameaças de entradas fortes de novos concorrentes aumenta a pressão
competitiva e os preços tendem a descer o que diminui a rentabilidade potencial da indústria. Se não existirem
ameaças de novas entradas então o mercado fica mais estabilizado e a rentabilidade manter-se-á.

• Poder negocial dos clientes: os clientes procuram apoderar-se de parte do valor criado na indústria forçando
à baixa nos preços e/ou ao aumento da qualidade dos produtos e dos serviços. O seu poder depende da
concentração dos clientes, do volume de compras, da diferenciação dos fornecedores, da ameaça de integração
dos clientes a montante, do conhecimento pelos clientes da estrutura de custos da indústria, dos lucros dos clientes,
da poupança de custos que os produtos adquiridos proporcionam, da importância do produto fornecido para a
qualidade do produto final dos clientes e da percentagem dos custos totais do cliente dispendidos nos produtos
fornecidos. Poder de negociação de clientes forte significa que as condições de fornecimento (preços, prazos de
entrega, qualidade e serviços) serão determinadas pelos clientes que se apoderam de uma parte significativa do
valor criado.

• Poder negocial dos fornecedores: os fornecedores procuram apoderar-se de parte do valor criado na indústria
tentando aumentar os preços dos seus produtos, baixando a qualidade dos seus produtos e/ou serviços. O poder
dos fornecedores depende da concentração relativa dos fornecedores, da disponibilidade de produtos substitutos,
diferenciação dos seus produtos e serviços, da importância do cliente para o fornecedor, do custo da mudança de
fornecedor e da ameaça de integração a jusante destes.

• Rivalidade na Indústria: uma rivalidade elevada traduz-se no facto de não existir um concorrente possuindo uma
posição dominante e em consequência os diversos concorrentes vão esmagando as margens. Esta é normalmente
a força mais poderosa da indústria. A intensidade da rivalidade depende do número de concorrentes, da taxa de
crescimento da indústria, dos custos fixos, dos custos de armazenagem, da diferenciação de produtos e serviços,
das barreiras à saída e da concentração equilíbrio entre os concorrentes.

• Ameaça de produtos substitutos: os produtos substitutos limitam o preço a que a indústria pode vender os
seus produtos. Depende da rendibilidade da indústria que produz os substitutos e da melhoria da relação entre o
preço e o desempenho dos substitutos.

Podemos então concluir que um ambiente competitivo é pouco atractivo quando: Rivalidade é forte; Barreiras de
entrada são baixas; Competitividade dos substitutos é forte e; Fornecedores e Clientes têm considerável poder
negociação.
Em alternativa o ambiente competitivo é ideal quando: Rivalidade é moderada; as Barreiras Entrada são altas; não
existam bons Substitutos e; Clientes e Fornecedores têm posição de negociação fraca.

5
Todos os factores utilizados em cada uma das cinco forças foram retirados da obra de Dess, G. G. e Miller, A. “Strategic
Management”, McGraw-Hill, 1993.
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Gestão e Organização de Empresas
Em consequência o objectivo de qualquer empresa é conceber uma estratégia que isole a empresa das forças
competitivas, que influencie pressões competitivas a favor da empresa e que possa construir vantagens competitivas
sustentáveis.
De qualquer forma, quando se efectua uma análise à indústria devemos ter em conta os seguintes aspectos: Dimensão
de mercado e potencial crescimento; as condições competitivas estão a levar ao Aumento/queda da rentabilidade da
indústria; as forças competitivas tornar-se-ão Fortes ou Fracas; impacto favorável ou desfavorável das forças chave do
macro ambiente na indústria; potencial de entrada/saída das principais empresas; estabilidade/dependência da procura;
a importância dos problemas colocados à indústria e; grau de risco e incerteza futuros da indústria.
Devemos recordar que é necessário uma análise cuidadosa à indústria, isto é, não devemos reduzir as condições
competitivas a uma mera fórmula e devemos periodicamente (entre um e três anos) efectuar uma nova análise.
Johnson e Scholles (2002) referem como fundamentais as seguintes questões ao modelo das cinco forças, desde logo,
que se identifiquem as forças chave no ambiente competitivo, para que se acompanhe mais de perto a sua evolução,
quais os factores do macro ambiente subjacentes que influenciam as forças competitivas, como é que as forças
competitivas mudam, isto é, o poder de clientes vai aumentar ou vai-se intensificar a rivalidade? Quais são as forças e
fraquezas dos concorrentes em relação às forças competitivas? E finalmente pode a estratégia competitiva influenciar
as forças competitivas (por exemplo, induzindo barreiras à entrada ou reduzir a rivalidade)?

5 - A escolha da estratégia

5.1 - A Matriz Produto-Mercado de Ansoff

Uma decisão fundamental na empresa é escolher uma clara orientação comercial, centrada nos clientes, e baseada nos
produtos a vender em cada um dos seus mercados alvo.
Igor Ansoff (1965) desenvolveu uma matriz produto-mercado que vai ser de base à reflexão sobre possíveis vias de
crescimento.

Matriz de Ansoff

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PRODUTOS

Actuais Novos

A B
PENETRAÇÃO MERCADO EXTENSÃO DE PRODUTO
– Conquistar quota – Aumentar a gama
Actuais
– Aumentar Utilização – Criar novos produtos

MERCADOS
C D
EXTENSÃO DE MERCADO DIVERSIFICAÇÃO
Novos – Servir + segmentos – Sinergias comerciais
– Converter não-clientes
– Sinergias tecnológicas

Nesta matriz procura-se relacionar a empresa com os seus mercados alvo e encontrar possíveis vias de crescimento
coerentes nesta lógica.
Uma primeira via de crescimento e normalmente a mais óbvia e menos arriscada é a penetração no mercado em
que a empresa continua a vender os mesmos produtos nos mesmos mercados, quer aumentando a utilização do
produto quer através da conquista de quota de mercado. É possível implementar esta estratégia em mercados em
crescimento, porque existe espaço para crescimento seja, através do aumento do consumo actual de clientes seja,
através da conquista de quota de mercado, retirando clientes à concorrência.
A segunda opção de crescimento passa pela extensão do produto em que a firma vai aumentar a gama de produtos
ou introduzir novos produtos dirigidos ao mercado actual. Esta opção é mais arriscada e implica que a empresa tenha
capacidade para lançar novos produtos adequados ao seu mercado actual ou que possa construir competências
necessárias para lançar novos produtos.
A terceira opção, extensão do mercado, passa por encontrar novos mercados para os produtos da empresa, sejam
novos segmentos ou novas áreas geográficas ou que consiga converter potenciais clientes. Esta opção exige elevadas
capacidades de marketing para que se consiga implementar com sucesso.
Finalmente a quarta opção, diversificação, baseada em sinergias tecnológicas e comerciais, é a mais exigente uma vez
que é necessário combinar capacidades para lançar novos produtos com as comerciais.
De qualquer forma é fundamental que exista uma perspectiva dinâmica de ajustamento às alterações do mercado,
aproveitando-se as oportunidades do contexto para que se garanta um crescimento sustentado da empresa. As
empresas que registam taxas de crescimento acima da média, aproveitando as circunstâncias externas, são
normalmente apreciadas pelos diferentes stakeholders.

4.2 - As estratégias genéricas de Porter


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Gestão e Organização de Empresas

De acordo com Porter (1980) e (1985), podemos encontrar três estratégias genéricas internamente consistentes,
Liderança através dos Custos, Diferenciação e Focalização - esta última com duas variantes, Focalização baseada nos custos
ou Focalização baseada na diferenciação - (que podem ser usadas isoladamente ou de forma combinada), para criar uma
posição sustentável a longo prazo e superar os concorrentes numa indústria.
A sustentabilidade de uma estratégia exige que as empresas possuam algumas barreiras que dificultem a
imitação da estratégia mas, como estas não são realmente intransponíveis, é necessário que a empresa actue,
constantemente, no sentido de tornar a sua estratégia cada vez mais complexa e difícil de imitar, através de
investimentos continuados, que reforcem o comprometimento com a orientação seguida e melhorem a posição,
oferecendo, deste modo, um alvo móvel à concorrência. Vamos agora desenvolver cada uma das estratégias genéricas.

Liderança através dos custos


Nesta estratégia é fundamental atingir a liderança no custo total numa indústria, através de um conjunto de
políticas funcionais orientadas para esse objectivo básico, embora a qualidade, a assistência e outras áreas não possam
ser ignoradas. Em geral, estes produtores vendem um produto padrão, indiferenciado, e dão ênfase considerável à
obtenção de vantagens de custo absoluto e de escala de todas as fontes. O Líder nos Custos deve obter paridade ou
proximidade com base na diferenciação relativamente aos seus concorrentes. Paridade com base na diferenciação
permite que um líder no custo traduza a sua vantagem directamente em lucros mais altos do que os da concorrência.
A proximidade na diferenciação significa que o desconto de preço que um concorrente deve oferecer para
obter uma quota de mercado aceitável, não compensa a vantagem no custo, oferecida pelo líder através dos custos
que obtém lucros acima da média. Para se poder sustentar a posição de Liderança através dos Custos deve-se ser o Líder
e não um, entre vários, a disputar a posição. Esta posição, permite obter retornos acima da média porque protege a
empresa contra todas as cinco forças competitivas e porque, a negociação só pode continuar a erodir os lucros até
ao ponto em que os lucros do próximo concorrente mais eficiente tenham sido eliminados. A Liderança através dos
Custos permite obter margens altas que podem ser reinvestidas em equipamentos e instalações mais modernas,
sustentando-se, desta forma, a liderança pelos custos.
Assinalam-se os principais riscos desta estratégia: liderança não sustentada porque os concorrentes a imitam,
a tecnologia muda ou outras bases para a liderança através dos custos sofrem alteração; perda de proximidade na
diferenciação; e os Focalizados nos custos obtêm custo ainda mais baixo em segmentos específicos.

Diferenciação
Esta orientação estratégica consiste em diferenciar o produto ou serviço oferecido pela empresa, ao longo de
algumas dimensões amplamente valorizadas pelos clientes, criando algo que seja considerado único no âmbito de toda
a indústria, estando os clientes dispostos a pagar um prémio no preço pela singularidade. A diferenciação pode ser
obtida de diversas formas: projecto ou imagem de marca, tecnologia, características específicas, serviços por
encomenda, rede de fornecedores, ou outras dimensões. Para que a estratégia não seja facilmente imitada, a empresa

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deve diferenciar-se ao longo de várias dimensões. Embora os custos não sejam o alvo estratégico primário, não podem
ser ignorados pois, de outra forma, as vantagens da diferenciação seriam absorvidas pelos acréscimos de custos
suportados. Uma empresa diferenciada deve, em consequência, obter paridade ou proximidade de custos em relação
aos seus concorrentes, reduzindo o custo em todas as áreas que não afectem a diferenciação.
A Diferenciação proporciona retornos acima da média da indústria e cria uma posição defensável para enfrentar
as cinco forças competitivas. No entanto, é muitas vezes incompatível com uma elevada quota de mercado.
Ao contrário da Liderança no Custo, pode haver mais que uma estratégia de diferenciação com sucesso numa
indústria, desde que existam uma série de atributos muito valorizados pelos clientes.
Os riscos desta estratégia são: a diferenciação não ser sustentada porque os concorrentes a imitam ou as
bases para a diferenciação passam a ser menos importantes para os clientes; a perda de proximidade no custo; e, os
Focalizados com base na Diferenciação obtêm diferenciação ainda maior em segmentos específicos.

Focalização
A última estratégia genérica é a focalização num determinado grupo de clientes, num segmento da linha de
produtos, ou num mercado geográfico.
Esta estratégia procura atender muito bem um alvo determinado, e cada política funcional é desenvolvida
levando isto em consideração. Assume-se que a empresa é capaz de servir o seu alvo estratégico mais eficientemente
do que os concorrentes que estão a concorrer com alvos mais amplos. Consequentemente, a empresa atinge a
diferenciação por satisfazer melhor as necessidades do seu alvo particular, ou os custos mais baixos neste alvo, ou ambos,
e por isso pode obter retornos acima da média.
Se o segmento alvo não for diferente de outros segmentos, então esta estratégia não terá êxito.
Normalmente há lugar para diversas estratégias de focalização sustentáveis, numa indústria, desde que os
focalizados escolham segmentos alvo diferentes.

A Focalização determina que se aceitem limitações na quota de mercado, por que estamos a servir um alvo
específico, por isto se defende que esta opção envolve necessariamente um “trade-off” entre a rendibilidade e o volume
de vendas. Pode implicar ou não um “trade-off” com a posição global de custo.
Esta estratégia comporta os seguintes riscos: a estratégia de Focalização ser imitada; o segmento alvo tornar-
se não atractivo em termos estruturais.
Na figura 2 estão representadas as três estratégias genéricas, com as duas variantes na Focalização. Na figura
3 estão representados os diferentes recursos, capacidades e requisitos organizacionais exigidos por cada estratégia.

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Gestão e Organização de Empresas
Vantagem Competitiva

Custos Baixos Diferenciação

Amplo 1. Liderança nos Custos 2. Diferenciação

Alvo
Estratégico
Limitado
3A. Focalização com 3B. Focalização com base
base nos Custos na Diferenciação

Figura 2: Porter (1985)

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ESTRATÉGIA RECURSOS E CAPACIDADES REQUISITOS ORGANIZACIONAIS
GENÉRICA REQUERIDOS

Liderança nos • Investimento sustentado em • Controlo de custos rígido


custos capital e acesso a meios de • Relatórios de controlo frequentes e
financiamento detalhados
• Boa capacidade de engenharia de • Organização e responsabilidades
processo estruturadas
• Supervisão intensiva da mão-de- • Incentivos baseados em metas
obra estritamente quantitativas
• Produtos concebidos para
facilitar a fabricação
• Sistemas de distribuição de
baixos custos

Diferenciação • Fortes capacidades em marketing • Forte coordenação entre funções


• Engenharia de produto em I&D, desenvolvimento do
• Capacidade criativa produto e marketing
• Grande capacidade em pesquisa • Avaliações e incentivos subjectivos
básica em vez de medidas quantitativas
• Reputação como líder em • Ambiente agradável para atrair mão
qualidade ou tecnologia de obra altamente qualificada,
• Grande tradição na indústria ou cientistas ou pessoas criativas
combinação de capacidade ímpar
trazidos de outros negócios
• Forte cooperação com canais de
distribuição

Focalização • Combinação das políticas acima • Combinação das políticas acima


descritas dirigidas para um alvo referidas para um segmento
particular particular

Figura 3 : Porter (1980)

5 - Implementação da Estratégia
5.1 - O Ajustamento da estrutura e da estratégia

Desde as investigações iniciais sobre estratégia de Chandler (1962) e Andrews (1971), sabemos que

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Gestão e Organização de Empresas
a estratégia e a estrutura determinam os resultados da empresa e, como sabemos, o objectivo central da
estratégia é melhorar os resultados e a competitividade das empresas (Teece et al., 1997). Andrews (1971)
distinguia os aspectos analíticos da formulação da estratégia dos aspectos administrativos da
implementação que se fazia através da estrutura organizativa (Chandler, 1962). A seguir vamos analisar as
relações que se estabelecem entre a estratégia, a estrutura e os resultados, de acordo com a Figura 1.

Estratégia
Resultados
Estrutura
Figura 1 – Relação E-E-R

Estrategia ↔ Estructura
Para Chandler (1962) estratégia era “a determinação das metas e objectivos de longo prazo e a
adopção de cursos de acção e a alocação dos recursos necessários para alcançar essas metas” (p. 13) e a
estrutura era “o desenho organizacional através do qual a empresa é dirigida” (p.14). Considerava-se que
organização como uma ferramenta para dirigir o curso de acção necessário aos planos de acção e, neste
sentido, compreende-se a tese de Chandler de que a estrutura seguia a estratégia. Para reforçar esta
posição diversos autores, com diferentes perspectivas sobre estratégia, como Penrose (1959), Ansoff
(1965), Andrews (1971), Williamson (1975), Porter (1980) e Nelson (1991) aceitavam a tese de Chandler,
pelo que se compreende a posição de Porter (Hodgetts, 2000) de que “pensámos sempre que a organização
deveria seguir e reforçar a estratégia”.
Diversos autores verificaram a hipótese de Chandler noutros mercados (Donaldson, 1987, 1990;
Hamilton y Shergill, 1992, 1993) e Fouraker e Stopford (1968) efectuaram a sua extensão às multinacionais.
Recentemente, Amburgey e Dacin (1994) concluíram que uma alteração na estratégia para a
diversificação aumenta a probabilidade de um incremento na descentralização na estrutura, e a estratégia
é mais determinante da estrutura do que a estrutura da estratégia.
Por sua vez, a teoria das organizações defende que a estratégia segue a estrutura devido às
limitações impostas por esta nos processos de decisão estratégicos e às opções disponíveis para os gestores.
Além do mais, as políticas internas, que se originam na estratégia e pretendem facilitar a sua implantação,
têm influência na tomada de decisões estratégicas ou tácticas (Bower, 1970; Child, 1972; Galbraith e
Nathanson 1978; Fredrickson, 1986; Eisenhardt e Bourgeois, 1988). Os resultados obtidos por Burton e Huhn
(1979), Grinyer e Yasai-Ardekani (1981) e Donaldson (1982, 1987) põem em causa a direcção da relação
estratégia/estrutura.
Finalmente, diversos autores assinalam que a influência entre estrutura/estratégia é recíproca (Hill
e Hoskisson, 1987; Hoskisson, 1987, Kazanjian e Drazin, 1987; Mintzberg, 1990; Pitts, 1977; Steer e Cable,
1978; Thompson, 1981). Simon (1976) considera que não é realista separar meios (estrutura) e fins (metas

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e objectivos) já que todas as decisões geram ou podem gerar acções interdependentes e juízos de valor.
Reconhecemos que a distinção de Andrews (1971) entre a formulação (estratégia) e a implementação
(estrutura) não é mais que uma tentativa de aplicar a hipótese Taylorista de separar o planeamento e a
execução.
Mintzberg (1990, p. 183) expressa bem a relação entre estratégia e estrutura quando defende que
“nenhuma tem precedência, cada uma precede a outra e segue-a... a estrutura segue a estratégia... como
o pé esquerdo segue o direito... a formação da estratégia é um sistema integrado, não é, ao contrário,
uma sequência arbitrária”. Ou como referem Galán e Suárez (1997) “as relações entre estratega e estrutura
não devem ser concebidas como estritamente causais nem deterministas, mas ambas variáveis interactuam
e influenciam-se uma a outra no tempo”.

Estratégia ↔ Resultados
A estratégia é apropriada, pressuposto na sua formulação, quando se ajusta ou é congruente com
o contexto ou contingências organizativas com que a empresa se defronta (Andrews, 1971) e têm impacto
significativo nos resultados.
Por sua vez, se os resultados que se obtêm não são satisfatórios, existe uma forte pressão para
alterar a estratégia.

Estructura ↔ Resultados
Harris e Ruefli (2000) concluem que a alterações na estrutura permitem aumentar mais os
resultados que em empresas que mantêm a estrutura, e que mudanças ou adaptações na estrutura são
importantes para implementar com sucesso as alterações na estratégia. Esta conclusão apoia-se na teoria
de recursos e capacidades. Na verdade, na perspectiva de Chandler (1962, p. 14), a estrutura é um
mecanismo concebido para coordenar e manter juntos as várias habilidades do pessoal e é, exactamente,
o capital humano que a estrutura organizacional procura integrar. A teoria de recursos e capacidades
defende a existência de activos específicos da empresa e que a utilização desses activos únicos está na
base de melhores resultados financeiros (Wernelfelt, 1984; Barney, 1986, 1991; Conner, 1991; Peteraf,
1993). Em particular, as capacidades das empresas, a habilidade para utilizar recursos, baseiam-se no
desenvolvimento, manutenção e intercâmbio de informações através do capital humano da empresa (Amit
e Schoemaker, 1993). O factor humano é o activo mais relevante que uma empresa possui para obter
vantagens competitivas (Grant, 1996) e estas traduzem-se em resultados persistentes acima da média. Na
verdade, o conhecimento das organizações está no seu capital humano e Simon (1991) defende que “todo
o conhecimento reside na cabeça das pessoas”. Por isso, as empresas criam valor através da selecção,
desenvolvimento e uso do capital humano (Lepak e Snell, 1999). Nesta sequência, Hitt et al. (2001)
destacam o capital humano como factor determinante das diferenças nos resultados empresariais.
De acordo com Becker e Huselid (1999) assiste-se à emergência de um novo paradigma económico
que se baseia no capital humano como fonte de vantagem competitiva. Trata-se, portanto, de um dos

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recursos e capacidades fundamentais que sustentam as respostas às necessidades que se manifestam nos
mercados de hoje e que condicionam as respostas potenciais às necessidades futuras (Wernerfelt, 1984;
Barney, 1986, 1991; Prahalad e Hamel, 1990; Grant, 1991; Hamel e Prahalad, 1994; Teece et al., 1997).
Se concebermos a estrutura como um mecanismo de governo actuando como alavanca da gestão na
utilização dos recursos, então, a concepção de empresa de Conner (1991) de que a melhoria de dos
resultados deriva mais de alterações na estrutura do que a mudanças na estratégia.

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