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CETOACIDOSE DIABÉTICA (CAD)

1. CONCEITO

É causada por: diminuição da insulina circulante associada ao aumento dos hormônios


contrarregulatórios: glucagon, cortisol, GH, catecolaminas.
É um estado catabólico, onde há aumento da produção de glicose pelo fígado e pelos rins
(glicogenólise e gliconeogênese). Mas essa glicose produzida também não entra nas
células (pois não há insulina suficiente) para ser usada, então aumenta ainda mais a
hiperglicemia sérica e a hiperosmolaridade. Como resposta à hiperosmolaridade, há
aumento de hormônio antidiurético (ADH).
O organismo sofre concomitantemente lipólise e cetogênese, causando a cetonemia e a
acidose metabólica.
A hiperglicemia acima de 180mg/dl (ou acima de 10mmol/L), está acima do valor que os
nossos rins são capazes de filtrar. Associada à cetonemia, causa: diurese osmótica,
desidratação, perda de eletrólitos (Na, K, P, Mg), vômitos. Há muita perda de potássio por
vômitos e diurese osmótica. Além disso, o hiperaldosteronismo provoca aumento da
excreção urinária de potássio. A perda de fosforo também devido à diurese osmótica,
diminuição da reabsorção renal, e saída do meio intracelular para o extracelular, e além
disso, durante a insulinoterapia o fosforo volta para o meio intracelular e cai mais ainda,
fazendo com que 50-60% das crianças tenham hipofosfatemia, tendo como principal
determinante o grau de acidose.
A cetoacidose diabética corresponde à deficiência severa de água e eletrólitos nos meios
intracelular e extracelular.
Aumenta assim o estresse metabólico, piorando a hiperglicemia e a cetoacidose.
Além disso, a hiperglicemia é um estado inflamatório que aumenta ainda mais a
resistência insulínica.
Portanto, se este ciclo não for interrompido com administração de insulina e reposição de
fluidos e eletrólitos, levará a acidose e desidratação fatais.
Mas a administração de volume/ fluidos junto com a administração de insulina revertem a
acidose. A insulina consegue parar a produção de cetoácidos, e o volume melhora a
perfusão tecidual e a função renal. Apesar de, se administrar apenas hidratação, já
diminuir a concentração de glicose no sangue, a insulinoterapia é essencial para restaurar
o metabolismo celular e para suprimir a lipólise e a cetogênese, a fim de manter a
glicemia em concentrações normais. Durante o tratamento, o potássio (que já estava
baixo) cai rapidamente, predispondo o paciente a arritmias. Também durante o
tratamento, desenvolve uma hipercloremia assintomática que se resolve
espontaneamente. Estudos não mostram vantagens com a infusão de bicarbonato, e além
disso, corrigir a cetoacidose muito rapidamente com a infusão de bicarbonato pode causar
hipocalemia. A administração de bicarbonato apenas tem efeito benéfico nas seguintes
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condições especiais: hipercalemia crônica; pH < 6,9 com comprometimento da


contratilidade cardíaca.
Na maioria das vezes, a causa da cetoacidose diabética costuma ser:
- Primodescompensação (não havia sido diagnosticado ainda com diabetes);
- Falha na adesão ao tratamento – insulinoterapia;
- Falha na bomba de insulina (nos pacientes que usam bomba de insulina);
- Manejo inadequado de infecções no paciente diabético.
A maioria dos casos de diabetes mellitus tipo 1 são diagnosticados com a
primodescompensação por cetoacidose diabética. E entre 5 a 25% de todos os casos de
CAD ocorrem ao momento do diagnóstico.
Os pacientes que já tem diagnóstico de diabetes mellitus tipo 1 conhecido, tem um risco
entre 1 a 10% ao ano de apresentar episódio de cetoacidose diabética, e quando tem,
muito provavelmente está relacionada a: falha de adesão ao tratamento, falha na bomba
de insulina, infecções agudas (entre estas, as infecções agudas são uma causa rara, mas
a infecção aguda mais comummente associada é a gastroenterite aguda (GECA).
Durante a pandemia COVID-19, registrou-se atraso nos diagnósticos de diabetes mellitus
tipo 1. A incidência da diabetes mellitus tipo 1 e também do tipo 2 está aumentando na
população pediátrica no mundo.

2. OBJETIVO

Diagnosticar a cetoacidose diabética em tempo hábil e manejá-la adequadamente, de


forma a: corrigir desidratação, reverter cetoacidose, restaurar osmolaridade e glicemia
sérica, ver risco de complicações agudas e tratar possíveis complicações.

3. AGENTE

Pediatras, intensivistas, residentes de pediatria e UTI pediátrica.

4. QUANDO

Ao admitir paciente no pronto socorro infantil.

5. CONDIÇÕES NECESSÁRIAS

- Exames laboratoriais
- Soro
- Insulina

6. DESCRIÇÃO DO PROCEDIMENTO

Manifestações clínicas que geram suspeita de CAD:


- Desidratação;
- Taquipneia, respiração de kussmaul;
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- Náuseas e vômitos;
- Dor abdominal (que pode variar de discreta a intensa);
- Confusão mental, sonolência.
Apesar da desidratação severa, a pressão arterial pode estar normal ou até elevada.
Fraqueza, pulso periférico impalpável, hipotensão arterial, oligúria: sugerem desidratação
com perda maior que 10%/ desidratação grave.

Critérios diagnósticos da CAD:


- Glicemia > 200mg/dl (ou > 11mmol/L)
- PH venoso < 7,3 ou BIC < 18
- Cetonemia ou cetonuria moderada a grave.

Classificação da gravidade da CAD:


LEVE: pH < 7,3 ou BIC < 18;
MODERADA: pH < 7,2 ou BIC < 10;
GRAVE: pH < 7,1 ou BIC < 5.

Manejo ao chegar na emergência:


- Glicemia capilar;
- Obter sinais vitais (incluindo pressão arterial) e peso do paciente;
- Obter 2 acessos venosos;
- Avaliar nível de consciência e escala de Glasgow – ver necessidade de intubação
orotraqueal e/ou oferta de oxigênio (Protocolo PALS);
- Solicitar exames: gasometria venosa ou arterial (preferencialmente a primeira
gasometria arterial), corpos cetônicos na urina, glicemia sérica, eletrólitos (K, Na, Mg, P,
Cai), ureia e creatinina;
- Se não tiver dosagem de potássio rápida disponível: fazer eletrocardiograma;
Podem sugerir hipocalemia: prolongamento do intervalo PR, onda T alargada ou invertida,
depressão do segmento ST, onda U, intervalo QT longo;
Podem sugerir hipercalemia: onda T apiculada (alta) e simétrica, intervalo QT curto;
- Monitorização cardíaca: ver arritmias; ver onda T que pode sugerir hipocalemia ou
hipercalemia;
- Iniciar reposição de fluidos;
- História clinica (anamnese) e exame físico detalhados;
- Se suspeita de infecções: antibioticoterapia e acrescentar exames: hemocultura,
urocultura, radiografia de tórax. Não colher hemograma em vigência de desidratação, pois
mesmo que não houver infecção, pode apresentar-se com leucocitose com desvio à
esquerda.
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1- EXPANSÃO VOLÊMICA INICIAL:

Infundir 1 ou mais bolus de cristaloide isotônico (soro fisiológico 0,9%) 10-20 ml/kg em 20-
30 minutos!
Se choque: fazer 20ml/kg e correr aberto.
A fim de restaurar a circulação periférica.
A expansão volêmica deve ser iniciada antes de iniciar a insulina.

2- CALCULAR RESTANTE DO VOLUME SUBSEQUENTE:

Classificar a perda volêmica através do grau de desidratação:


LEVE: perda até 5% do peso;
MODERADA: perda de 7% do peso;
GRAVE: perda de 10% do peso.
Volume do soro de reposição de perdas:
Porcentagem de perda ponderal X peso em Kg X 10.
A este valor do cálculo acima, adicionar o volume de soro de manutenção pela regra de
Holliday Segar para este paciente em 24 horas:
Regra de Holliday Segar:
Até 10kg: 100 X peso em Kg
Entre 10-20Kg: 1000 + (50 X Kg que ultrapassarem 10)
Acima de 20Kg: 1500 + (20 X Kg que ultrapassarem 20)
Dividir o volume total em 6 partes: para serem corridas cada uma em 4h, dentro de 24h.
Adicionar potássio conforme indicado abaixo, a cada parte do soro.
Usar soro fisiológico 0,9% (pode usar soro com concentração de NaCl de 0,45 até 0,9%).
Junto com este volume subsequente, corrigir os distúrbios eletrolíticos.
Planejar infundir todo o fluido em 24 horas (pode ser entre 24 a 48 horas).
Quando a cetoacidose estiver resolvida: iniciar a insulina subcutânea, suspender a terapia
endovenosa e repor o restante do volume por via oral!

3- INSULINA:

Começar com: 0,05 a 0,1 UI/kg/hora de insulina regular via endovenosa (Se pH > 7,15:
pode começar com 0,05 UI/kg/hora).
Em bomba de infusão endovenosa.
Existem varias formas de preparo desta insulina que podem ser feitas, uma das formas de
fazer: 50 UI insulina regular + 50 ml SF0,9% (1ml=1UI).
Iniciar pelo menos 1 hora após ter iniciado a hidratação.
A insulina regular sempre deve ser diluída, nunca em bolus.

4- POTÁSSIO:
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- Se hipocalemia < 3,5: começar reposição de potássio junto com a expansão inicial, mas
em um acesso venoso separado, e antes da insulina.
- Se potássio entre 3 – 5,5: começar após hidratação inicial, junto com volume
subsequente de reposição de perdas e manutenção. Iniciar com 40 mEq por litro de soro,
depois adequar conforme potássio sérico.
- Se hipercalemia > 5,5: postergar a reposição de potássio para depois que o paciente
apresentar diurese. Iniciar com 40 mEq por litro de soro, depois adequar conforme
potássio sérico.

OBS: a cada 1 ml de KCl 19,1% = 2,5 mEq de potássio.


O potássio deve ser sempre reposto, exceto se injuria renal.
A presença de hipocalemia severa < 2,5 é um marcador individual de falha no tratamento
e aumento da mortalidade.
Concentração máxima de potássio que pode ser infundida: 0,5 mEq/kg/hora.

5- MANEJO DURANTE O VOLUME SUBSEQUENTE:

Documentar a cada 1 hora:


- Glicemia capilar, frequência cardíaca, frequência respiratória, pressão arterial, nível de
consciência pela escala de Glasgow.

Documentar a cada 2 a 4 horas:


- Eletrólitos (K, Na, Mg, Cai, P), glicemia sérica, cetonuria, gasometria.
Se os resultados dos exames não forem imediatos, usar eletrólitos da gasometria.

6- SORO GLICOSADO:

Quando a glicemia cair para 250 mg/dl: trocar o soro fisiológico por soro ao meio:
metade do volume em soro fisiológico 0,9% e a outra metade em soro glicosado 5%.
Para diminuir risco de hipoglicemia.

COMO MONTAR O SORO, NA PRÁTICA:

1) Expansão inicial (em casos de desidratação moderada a grave);


2) Calcular soro de reposição (déficit (%) X peso em Kg X 10) + soro de manutenção
para 24h;
3) Deste volume total (reposição + manutenção), subtrair o que já foi feito na
expansão inicial;
4) Organizar o volume subsequente total: para que seja administrado nas próximas
24 horas. Iniciar a contar estas horas assim que acabar a expansão e for iniciar o
volume subsequente total. Dividir todo este volume em 6 partes iguais: as quais
cada uma será feita em 4 horas (para que complete as 24h).
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5) A gasometria venosa e o dextro serão feitos a cada 2 horas até a resolução


completa da CAD (pH > 7,3 e BIC > 18), sendo que:
- Se dextro < 250 mg/dL:
Reduzir velocidade de infusão de insulina para 0,03 a 0,05 UI/kg/h, se estiver
superior a isto;
Trocar soro fisiológico por soro ao meio;
- Se resolução da CAD: suspender protocolo e repor o restante do volume por
TRO via oral.

SINAIS DE ALARME PARA INJÚRIA CEREBRAL:


Cefaleia e vômitos após começar o protocolo de CAD;
Queda de saturação;
Alteração do estado neurológico: irritabilidade, letargia, confusão mental, queda do nível
de consciência.
SE NECESSÁRIO: iniciar terapia hiperosmolar com manitol ou salina hipertônica
imediatamente:
Manitol 0,5 a 1g/kg EV em 20 minutos, repetir após 60 minutos se não houver resposta;
OU salina hipertônica 3% de 3,5 a 5ml/kg em 15 minutos.

COMPLICAÇÕES DA CAD:
Mortalidade ou sequelas por injúria cerebral, lesão renal aguda, tubulopatias, hipocalemia,
hipocalcemia, hipomagnesemia, hipofosfatemia severa, acidose hiperclorêmica, alcalose
hipoclorêmica, hipoglicemia, hemorragia intracraniana, AVE isquêmico, trombose em
vasos do SNC, prolongamento de intervalo QT, TVP, embolia pulmonar, pneumonia por
broncoaspiração, insuficiência renal, pancreatite aguda, rabdomiólise, pneumomediastino,
pneumotórax, enfisema subcutâneo.

CRITÉRIOS DE RESOLUÇÃO DA CAD: PH > 7,3 e BIC > 18


Após resolução:
Programar troca da insulina regular via endovenosa por via subcutânea.
A hora mais adequada para isto é antes de uma refeição.
Para prevenir hiperglicemia de rebote: a primeira dose de insulina regular subcutânea
deve ser feita 15 a 30 minutos antes de parar a insulina regular endovenosa.

8. HISTÓRICO DA REVISÃO
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Revisão nº ALTERAÇÕES Última Revisão

01 Alterado item: descrição do procedimento/coleta de urina

02 Alterado todo conteúdo

03 Revisão bianual

04 Revisão bianual

9. REFERÊNCIAS

“ISPAD Clinical Practice Consensus Guidelines 2022: Diabetic Ketoacidosis and Hyper-
glycemic Hyperosmolar State”. Nicole Glaser. Department of Pediatrics, Section of En-
docrinology, University of California, Davis School of Medicine, Sacramento, California,
USA.

10. PREENCHIMENTO DA PLANILHA: ELABORADOR(ES), REVISOR(ES),


APROVADOR(ES)

Elaborado por: Categoria Profissional Serviço/Setor

Médico Pediatria

Médico

Revisado por: Assinatura/Carimbo Categoria Profissional Serviço/Setor

Médico Pediatria

Aprovado por: Assinatura/Carimbo Categoria Profissional Serviço/Setor

Elza Akiko Natsumeda Utino Médico Pediatria

Data Aprovação:
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