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AS CLÁSULAS DE MATCHING

CREDIT E TAX SPARING


no contexto da União Europeia

TRABALHO REALIZADO NO ÂMBITO DA UNIDADE DE DIREITO FISCAL


ESPECIAL, LECIONADA PELA DOUTORA MARIA ODETTE DE OLIVEIRA

Jéssica Correia de Almeida


AS CLÁSULAS DE MATCHING
CREDIT E TAX SPARING
A fiscalidade assume-se como um dos esteios básicos da construção do projeto
europeu, não só para a arrecadação de receitas, mas também para consolidar o vínculo
entre os Estados-membros, cuja dinâmica fiscal - com a liberação e globalização do
comércio e a busca por estratégias fiscais eficientes – suscita desafios e oportunidades
para a cooperação fiscal da UE.
As negociações que versam sobre matérias e disposições tributárias traduzem-se em
verdadeiros ensejos para melhorar a eficiência e a justiça do sistema europeu,
nomeadamente para a mitigação da dupla tributação e cooperação fiscal entre os
Estados-membros. porém, a desunião fiscal sentida no óbice crucial da comunidade
europeia - isto é, na sua fiscalidade - acarreta com várias problemáticas e faz urgir
uma harmonização (em sede de tributação direta) que se demonstra destoante com a
última reserva de soberania nacional dos EM.
A TRIBUTAÇÃO DIRETA
A HETEROGENEIDADE DO PROJETO EUROPEU: CONSIDERAÇÕES GERAIS.

. A União Europeia empenha-se, desde os seus primórdios, em consolidar e


sedimentar uma identidade europeia, através de uma integração económica
e social e progressiva.
. Após escândalos como o Lux Leaks, que envolvem auxílios estatais e
práticas fiscais questionáveis, a UE vem a priorizar medidas para prevenir
práticas fiscais abusivas.
. Porém, a soberania fiscal dos EM, que lhes permanece desde o tratado
fundador, limita o poder de atuação da UE e, por sua vez, a coexistência de
diversos regimes fiscais, com a facilidade de circulação de capitais geram
uma concorrência fiscal que colide com o projeto europeu.
A TRIBUTAÇÃO DIRETA
A DUPLA TRIBUTAÇÃO: FOCO NO SEIO EUROPEU.

. Sendo a tributação direta da UE caracterizada por uma heterogeneidade, cabe-nos


colocar a questão se a fiscalidade do projeto europeu vem a fazer jus a uma União que se
configura una.
. A intensificação das relações económicas de pessoas, serviços , capitais e mercadorias
entre os EM configuram um ambiente altamente propício a situações irregulares de
tributação, como a dupla tributação e a concorrência fiscal prejudicial.
. A dupla tributação é um fenómeno indesejável, cuja eliminação é prevista no artigo 293º
TUE, e que ocorre quando duas normas, de diferentes Estados incidem sobre o mesmo
contribuinte, em relação ao mesmo capital e no mesmo período tributário, fazendo apelo
simultâneo aos elementos de conexão para a tributação do mesmo rendimento.
. Carga fiscal excessiva sobre os contribuintes;
. Colocar em causa a eficiência e competitividade interno;
OS MÉTODOS
“ANTI-
BITRIBUTAÇÃO”

A União Europeia vem a adotar uma postura ativa e


comprometida para combater a dupla tributação dentro
do mercado único, promovendo uma tributação justa e
equitativa entre os EM, por meio de uma combinação de
métodos unilaterais e bilaterais,

Entre as várias medidas adotadas, designam-se as diversas


diretivas emitidas,  assim como a adoção de regras
comuns para combater as práticas fiscais prejudicais,
como a erosão da base tributária e a transferência de
lucros (BEPS) e, ainda, a promoção uma abordagem
internacional e maior transparência fiscal.
Porém, os próprios países podem adotar medidas
unilaterais e bilaterais, dependendo se os mesmos
negociam qual o método adotado ou, se pelo contrário se
trata de uma medida refletida de uma política fiscal
doméstica, sem a necessária correspondência em outros
ordenamentos.
OS MÉTODOS
“ANTI-
BITRIBUTAÇÃO”

Cumpre evidenciar que, sendo as deduções e isenções fiscais


medidas frequentemente limitadas a nível nacional, podem
resultar em inconsistências entre os países membros.
Assim, a par de Sanches, entendemos que a aplicação unilateral
das normas fiscais é uma fonte potencial de conflitos, o que nos
torna apologistas de métodos onde vigora a regra da
reciprocidade, isto é, onde os ocorre uma derrogação bilateral
da soberania por parte dos Estados.
Reconhecendo que a diversidade dos sistemas tributários
tornam a luta contra a dupla tributação e práticas de elisão
fiscal num desafio constante, onde estes métodos bilaterais
fornecem uma estrutura sólida para a cooperação e
coordenação fiscal entre os países membros – que se
comprometem em termos legislativos e políticos a estabelecer
mecanismos de troca de informações e de resolução de disputas
- promovendo, indiretamente, a ansiada harmonização.
AS CONVENÇÕES PARA EVITAR
A DUPLA-TRIBUTAÇÃO

As CDT são acordos bilaterais, ou multilaterais, intencionalmente celebrados entre dois Estados[1], por meio dos quais
estes regulam entre si a forma de tributar situações que, por força dos elementos de conexão utilizados, se abrangem
no âmbito de aplicação tributária de ambos os Estados[2], de modo a eliminar a dupla tributação internacional.
Estes acordos de bitributação são geralmente elaborados com base em modelos, que apresentam estruturas
semelhantes, nomeadamente com recurso à Convenção Modelo da OCDE, que tivemos por base no decorrer do
estudo..
Neste sentido, a OCDE menciona, na introdução aos Comentários à Convenção Modelo, que os efeitos nocivos da
dupla tributação jurídica sobre as trocas de bens e serviços e sobre os movimentos de capital, tecnologia e pessoas são
de tal forma conhecidos que é desnecessário apontar a importância da remoção dos obstáculos que a dupla tributação
representa ao desenvolvimento das relações económicas entre os Estados.
Na disciplina dos acordos celebrados para evitar a dupla tributação internacional sobre os rendimentos, de modo geral,
encontram-se previstos os dois métodos de eliminação suprarreferidos, assim como um outro método eliminação da
dupla tributação desvinculado do imposto pago que se pode revestir em duas modalidades: o método do crédito
presumido (matching credit) e o método do crédito fictício (tax sparing).
AS CLÁUSULAS DE TAX SPARING E
MATCHING CREDIT
. Estas modalidades surgem com o propósito de conceber um sistema de compensação, de modo assegurar a repercussão de
benefícios fiscais, através de diferentes métodos, de modo a captar investimento estrangeiro.
. O crédito fictício, ou taxa sparing, ocorre quando o Estado de residência atribui um crédito ao contribuinte no valor do imposto
que deveria ser pago no Estado da fonte mas que este, por sua vez, a fim de incentivar o investimento estrangeiro, deixou de
cobrar.
. Vejamos que, se o estado de residência tributar a renda com base na universalidade, o incentivo fiscal cedido pelo país da fonte não
traria resultados.
. Tal sucede na CDT de Portugal com a Noruega, onde as isenções ou reduções fiscais concedidas por Portugal não são tidas em
conta para a estipulação do respetivo crédito de imposto a esses rendimentos ou capitais isentos a uma tributação mais favorável.  
. Porém se, ainda que hipoteticamente, configurarmos uma situação onde o Estado de residência cede um benefício fiscal
previamente, facilmente entendemos que esta cláusula é débil de ser utilizada de forma a camuflar subsídios indiretos,
nomeadamente quando um país da fonte concede isenções ou reduções significativas de imposto a empresas estrangeiras que
investem em determinados setores económicos, levando a que o contribuinte usufrua no país de rendimento de isenções e reduções
significativas do país do fonte, no país de residência.
. Um exemplo concreto desta problemática é o caso “LuxLeaks”, onde o Luxemburgo (país membro da UE), foi acusado de oferecer
acordos fiscais secretos a empresas multinacionais, concedendo-lhes benefícios fiscais significativos por meios destas clausulas.
Esses acordos permitiam que as empresas pagassem uma taxa de imposto substancialmente mais baixa em comparação com as
taxas aplicadas a outras empresas no país.
AS CLÁUSULAS DE TAX SPARING E
MATCHING CREDIT

. O crédito presumido, ou matching credit consubstancia-se na concessão, pelo


Estado de residência, de um crédito superior ao imposto estabelecido pela
legislação do Estado da fonte.
. A título de exemplo, este é configurado na CDT estabelecida entre Portugal e
Alemanha, na qual é pressuposto o valor do imposto português sobre dividendos
e juros de 15%, ainda que tenha havido isenções e esta não sido a taxa de
retenção na fonte que incidiu sobre os mesmos rendimentos
. Ressalve-se, por fim, que sendo esta clausula é relativa a atribuição de um
crédito presumido, quando a redução simultânea do mesmo é desconsiderada
pelo Estado da residência, se a mesma for aplicada de forma ampla, resulta num
benefício fiscal excessivo para o contribuinte, que efetivamente pagaria impostos
a uma taxa mais baixa do que a geralmente aplicada no seu país de residência.
A URGE POR UMA
SOLUÇÃO COMUM
Ainda que as clausulas de tax sparing e matching credit tenham sido concebidas para evitar a dupla tributação e promover a
cooperação fiscal (adiando uma necessária harmonização direta) o seu uso inadequado pode resultar em benefícios fiscais
excessivos e gerar interpretações conflitantes.

Se, num primeiro momento, a Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico (OCDE) recomendou a
utilização das cláusulas de tax sparing nos acordos, num segundo momento, reviu a sua posição inicial, passando a ver com
ressalvas a prática do tax sparing, criticando o seu (ab)uso e recomendando o seu uso especialmente para acordos entre países
desenvolvidos e em desenvolvimento como forma de atrair investimentos para os países menos desenvolvidos. Por contraposto, a
doutrina vem a entender que esta cláusulas beneficia ambos os Estados, ao ampliar o tamanho das transações financeiras.

Os auxílios fiscais caracterizam-se como um instrumento de aplicabilidade minuciosa, na medida em que pressupõem a
existência de uma vantagem fiscal imputável ao Estado, e às empresas desse Estado, através de fundos públicos , tornando-se
essencial garantir que os mesmos não afetam o interesse comum, assim como garantir que as cláusulas objeto de estudo não se
traduzem nestas deliberações negativas.

O próprio modelo da OCDE não está isento de críticas, sendo que vem a ser discutido no âmbito da UE um Modelo Fiscal de
Convenções de Tributação de Rendimentos comum a todos os EM (Resolução do Parlamento Europeu, de 10 de março de 2022,
sobre «Um quadro europeu em matéria de retenção na fonte» ).
CONCLUSÕES

Considerando a heterogeneidade e relevo da fiscalidade direta, entendemos que os países


devem adotar uma conduta cautelosa e consistente, apelando-se sobretudo a uma conduta
conjunta da União .
Os métodos bilaterais para evitar esta problemática, como as convenções de dupla
tributação a que nos referimos previamente, permitem uma consciência de repartição do
ónus financeiro, isto é, possibilitam que a tributação não recaia sobre apenas um país.
Porém, as clausulas de tax sparing e matching credit consagram um território débil. 
A celebração de CDT é efetivamente um método viável e eficaz para o combate da
bitributação, porém, questiona-se se, num projeto com a índole e características do
europeu, a aproximação a uma identidade europeia una no âmbito da fiscalidade direta
não será a próxima de etapa de integração europeia que urge para fazer desconsiderar
problemas desta índole, o que leva a ponderar a insistência de uma concorrência que pode
tornar o projeto europeu numa utopia.

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