Você está na página 1de 31

Supremo Tribunal Federal

Ementa e Acórdão

Inteiro Teor do Acórdão - Página 1 de 31

27/09/2022 SEGUNDA TURMA

HABEAS CORPUS 214.908 RIO DE JANEIRO

RELATOR : MIN. GILMAR MENDES


PACTE.(S) : RAFAEL JOSEPH BELACIANO
IMPTE.(S) : DIOGO TEBET DA CRUZ
IMPTE.(S) : VICTOR VIEITES DO VALLE PIRES
COATOR(A/S)(ES) : SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA

Penal e processo penal. Habeas corpus. Crime contra as relações de


consumo. Venda de produtos impróprios para consumo – art. 7º, IX, da
Lei 8.137/90. Apreensão de isqueiros com supostos selos do Inmetro
falsificados. Alegação de ausência de justa causa pela falta de indicação
dos elementos não verdadeiros. Laudos periciais genéricos.
Descumprimento à norma do art. 170 do CPP. Destruição dos produtos
apreendidos. Quebra da cadeia de custódia da prova. Arts. 158-A e 158-B
do CPP. Doutrina e precedentes, inclusive anteriores à previsão legal e
vigentes à época dos fatos. Impossibilidade do controle epistêmico da
validade da prova. Inviabilização do exercício do direito de defesa.
Apresentação, por parte da defesa, das notas fiscais e do registro do
revendedor no Inmetro. Acolhimento da alegação de ausência de justa
causa para instauração e desenvolvimento válido do processo. Concessão
da ordem, com o trancamento definitivo da ação penal.
AC ÓRDÃ O
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros do
Supremo Tribunal Federal, em Segunda Turma, sob a presidência do
Senhor Ministro André Mendonça, na conformidade da ata de
julgamento e das notas taquigráficas, por unanimidade de votos,
conceder a ordem de habeas corpus confirmando a liminar anteriormente
deferida e determinando o trancamento definitivo da ação penal nº
0266372- 12.2018.8.19.0001, tendo em vista a ausência de justa causa e a
impossibilidade de desenvolvimento válido do processo, nos termos do
voto do Relator.
Brasília, 27 de setembro de 2022.
Ministro GILMAR MENDES

Documento assinado digitalmente conforme MP n° 2.200-2/2001 de 24/08/2001. O documento pode ser acessado pelo endereço
http://www.stf.jus.br/portal/autenticacao/autenticarDocumento.asp sob o código 907B-4C14-543B-4F88 e senha 4C9A-EBEB-99F0-03A3
Supremo Tribunal Federal
Ementa e Acórdão

Inteiro Teor do Acórdão - Página 2 de 31

HC 214908 / RJ

Relator
Documento assinado digitalmente

Documento assinado digitalmente conforme MP n° 2.200-2/2001 de 24/08/2001. O documento pode ser acessado pelo endereço
http://www.stf.jus.br/portal/autenticacao/autenticarDocumento.asp sob o código 907B-4C14-543B-4F88 e senha 4C9A-EBEB-99F0-03A3
Supremo Tribunal Federal
Relatório

Inteiro Teor do Acórdão - Página 3 de 31

27/09/2022 SEGUNDA TURMA

HABEAS CORPUS 214.908 RIO DE JANEIRO

RELATOR : MIN. GILMAR MENDES


PACTE.(S) : RAFAEL JOSEPH BELACIANO
IMPTE.(S) : DIOGO TEBET DA CRUZ
IMPTE.(S) : VICTOR VIEITES DO VALLE PIRES
COATOR(A/S)(ES) : SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA

RE LAT Ó RI O

O SENHOR MINISTRO GILMAR MENDES (RELATOR): Trata-se de


habeas corpus impetrado por Diogo Tebet da Cruz em favor de Rafael
Joseph Belaciano contra acórdão proferido pelo Superior Tribunal de
Justiça no RHC 120.068/RJ, assim ementado:

“PROCESSUAL PENAL. AGRAVO REGIMENTAL EM


EMBARGOS DE DECLARAÇÃO EM RECURSO EM HABEAS
CORPUS. CRIME CONTRA AS RELAÇÕES DE CONSUMO.
PRETENSÃO DE TRANCAMENTO DA AÇÃO PENAL.
INÉPCIA DA DENÚNCIA E AUSÊNCIA DE JUSTA CAUSA.
AGRAVO QUE SE LIMITA A REITERAR OS ARGUMENTOS
DA INICIAL. CONHECIMENTO. IMPOSSIBILIDADE.
SÚMULA 182/STJ. INCIDÊNCIA”. (eDOC 19)

O impetrante narra que o paciente foi denunciado pela prática do


crime do art. 7º, IX, da Lei 8.137/1990, em razão da apreensão de 280
(duzentos e oitenta) isqueiros impróprios para consumo expostos à venda
em sua loja, o “Armarinho Delmar”, localizada na região central do Rio
de Janeiro (eDOC 1).
Aduz o impetrante que a apreensão foi deflagrada, segundo as
autoridades policiais, para dar fiel cumprimento à petição protocolada na
Delegacia de Repressão aos Crimes contra a Propriedade Imaterial –
DRCPIM -, a qual noticiou a “presença de artigos falsificados no referido

Documento assinado digitalmente conforme MP n° 2.200-2/2001 de 24/08/2001. O documento pode ser acessado pelo endereço
http://www.stf.jus.br/portal/autenticacao/autenticarDocumento.asp sob o código F334-53BD-B3ED-5420 e senha E7EB-8D01-B374-CC8A
Supremo Tribunal Federal
Relatório

Inteiro Teor do Acórdão - Página 4 de 31

HC 214908 / RJ

estabelecimento comercial”, embora tal petição não tenha sido juntada aos
autos (eDOC 1, p. 2).
Relata que “foi lavrado laudo de exame de material, o qual consignou que
‘os isqueiros ostentam selo do Inmetro falsificado’, não se aduzindo contudo quais
elementos seriam falsos (número de série, cor, tamanho, etc.), nem acostando
imagens dos supostos selos falsificados” (eDOC 1, p. 3).
Afirma ainda que esse primeiro laudo foi complementado a pedido
do Ministério Público, o que resultou na segunda prova pericial carreada
ao processo, a qual descreve que “os isqueiros não ostentam selo genuíno do
Inmetro, o que caracteriza não terem passado por testes de segurança, tornando-
os assim impróprios para o consumo”. (p. 3)
Afirma que a denúncia seria inepta por não oferecer descrição
específica, concreta e efetiva da conduta delituosa imputada ao paciente
(eDOC 1, p. 5).
O impetrante também afirma não foi esclarecido como os isqueiros
poderiam trazer danos aos consumidores, nem teria sido descrito em que
consistiria a falsidade do selo do Inmetro, o que reforçaria a alegação de
inépcia (eDOC 1, p. 7).
Aduz ainda a ausência de justa causa para a deflagração e a
manutenção da ação penal, uma vez que a perícia realizada não teria
submetido os isqueiros apreendidos a qualquer teste de segurança e que
não teriam sido registradas imagens dos selos (eDOC 1, p. 10).
Além disso, os produtos teriam sido destruídos, o que inviabilizaria
a contraprova e prejudicaria a defesa do paciente (eDOC 1, p. 10).
Acresça-se que a defesa afirma ter apresentado a nota fiscal dos
isqueiros apreendidos, bem como o registro da importadora dos produtos
no Inmetro, o que reforçaria a conclusão pela ausência de justa causa
(eDOC 1, p. 11).
Com base nesses fundamentos, pleiteia o impetrante a concessão da
ordem de habeas corpus para determinar a extinção da ação penal, por
inépcia da denúncia e ausência de justa causa.
Recebidos os autos neste gabinete, determinei a abertura de vista à
Procuradoria-Geral da República (PGR). A PGR opinou pelo não

Documento assinado digitalmente conforme MP n° 2.200-2/2001 de 24/08/2001. O documento pode ser acessado pelo endereço
http://www.stf.jus.br/portal/autenticacao/autenticarDocumento.asp sob o código F334-53BD-B3ED-5420 e senha E7EB-8D01-B374-CC8A
Supremo Tribunal Federal
Relatório

Inteiro Teor do Acórdão - Página 5 de 31

HC 214908 / RJ

conhecimento do writ e pela denegação da ordem (eDOC 27).


O impetrante colacionou aos autos petição na qual reitera a urgência
dos pedidos formulados e o pedido de suspensão da ação penal em
tramitação em primeira instância, tendo em vista a designação de data de
audiência de instrução e julgamento (eDOC 29).
Deferi o pedido liminar para determinar a suspensão da ação penal
até ulterior deliberação (eDOC 32). Na mesma decisão, solicitei a imediata
inclusão do feito para julgamento presencial.
A Procuradoria-Geral da República apresentou nova manifestação
na qual requer a denegação da ordem de habeas corpus.
É o relatório.

Documento assinado digitalmente conforme MP n° 2.200-2/2001 de 24/08/2001. O documento pode ser acessado pelo endereço
http://www.stf.jus.br/portal/autenticacao/autenticarDocumento.asp sob o código F334-53BD-B3ED-5420 e senha E7EB-8D01-B374-CC8A
Supremo Tribunal Federal
Voto - MIN. GILMAR MENDES

Inteiro Teor do Acórdão - Página 6 de 31

27/09/2022 SEGUNDA TURMA

HABEAS CORPUS 214.908 RIO DE JANEIRO

VOTO

O SENHOR MINISTRO GILMAR MENDES (RELATOR): No caso em


análise, reitero os fundamentos já expostos quando da concessão da
medida liminar para determinar o trancamento da ação penal nº 0266372-
12.2018.8.19.0001, tendo em vista a ausência de justa causa.
Com efeito, a fundamentação da decisão monocrática que desproveu
o recurso ordinário, a qual foi posteriormente integrada ao ato coator
proferido pelo órgão colegiado do STJ, promoveu uma análise
meramente formal da acusação, ao registrar que:

“Da atenta análise dos trechos transcritos, observa-se que


a denúncia logrou demonstrar o nexo de causalidade entre o
crime imputado e a conduta do recorrente, que, na condição de
responsável pelo estabelecimento comercial, permitiu a
manutenção em depósito e exposição à venda de produtos em
discordância com as normas vigentes”. (eDOC 15, p. 5)

Por sua vez, a decisão de primeiro grau que manteve o recebimento


da denúncia encontra-se baseada em fundamentos genéricos e
inespecíficos, senão observe-se (eDOC 9):

“Trata-se de ação penal pública proposta pelo Ministério


Público do Rio de Janeiro em face de Rafael Joseph Belaciano.
O denunciado, regularmente citado, apresentou defesa
prévia, alegando preliminarmente a ilicitude da prova, a
inépcia da denúncia, assim como a ausência de justa causa para
a deflagração da ação penal, requerendo sua absolvição
sumária.
As preliminares arguidas devem ser afastadas, haja vista
que a inicial aponta indícios de autoria e do crime em relação ao
acusado, o que justifica a deflagração da presente ação penal.

Documento assinado digitalmente conforme MP n° 2.200-2/2001 de 24/08/2001. O documento pode ser acessado pelo endereço
http://www.stf.jus.br/portal/autenticacao/autenticarDocumento.asp sob o código 59A7-51A6-5E0F-1A59 e senha 5DE9-56D6-00F9-AD64
Supremo Tribunal Federal
Voto - MIN. GILMAR MENDES

Inteiro Teor do Acórdão - Página 7 de 31

HC 214908 / RJ

Além disso, não há causa excludente de ilicitude do fato que


macule as provas obtidas nos autos, visto os policiais civis
adentraram ao local com o prévio consentimento do acusado.
Constata-se que a denúncia sob o aspecto formal é
perfeita. Estão presentes todos os requisitos legais inerentes ao
exercício da ação penal in casu, incluída a indispensável justa
causa. O processo está regular e válido, inexistindo vício a
ensejar o reconhecimento de nulidade. Portanto, não se trata o
caso em tela de hipótese de absolvição sumária.
Com efeito, os fatos e fundamentos deduzidos na defesa
escrita não afastam os indícios de autoria e materialidade
coligidos em sede extrajudicial, impondo-se a apuração dos
fatos narrados na exordial da presente ação penal, garantindo-
se ao acusado a ampla defesa e o contraditório.
Desta forma, as questões pertinentes ao mérito da ação
serão analisadas oportunamente, quando do julgamento do
mérito.
Por tais razões, mantenho o recebimento da denúncia”.

Pelo que se observa, não houve a efetiva análise das alegações


suscitadas pela defesa do paciente desde a primeira instância, as quais
abrangem relevantes argumentos fáticos e jurídicos.
Nessa toada, concluo que assiste razão ao impetrante ao aduzir a
ausência de justa causa para prosseguimento da ação penal, a qual deve
ser compreendida como condição da ação que requer a demonstração de
lastro probatório mínimo de autoria e materialidade delitiva capaz de
justificar a acusação.
De acordo com Aury Lopes Jr.:

“Em profundo estudo sobre o tema, ASSIS MOURA


adverte sobre a indefinição que paira em torno do conceito, na
medida em que ‘causa possui significado vago e ambíguo,
enquanto que justo constitui valor’. E prossegue lecionando
que a justa causa exerce uma função mediadora entre a
realidade social e a realidade jurídica, avizinhando-se dos
‘conceitos-válvula’, ou seja, de parâmetros variáveis que

Documento assinado digitalmente conforme MP n° 2.200-2/2001 de 24/08/2001. O documento pode ser acessado pelo endereço
http://www.stf.jus.br/portal/autenticacao/autenticarDocumento.asp sob o código 59A7-51A6-5E0F-1A59 e senha 5DE9-56D6-00F9-AD64
Supremo Tribunal Federal
Voto - MIN. GILMAR MENDES

Inteiro Teor do Acórdão - Página 8 de 31

HC 214908 / RJ

consistem em adequar concretamente a disciplina jurídica às


múltiplas exigências que emergem da trama do tecido social.
Mais que isso, figura como um ‘antídoto, de proteção contra o
abuso de Direito’. [...]
A justa causa identifica-se com a existência de uma causa
jurídica e fática que legitime e justifique a acusação (e a própria
intervenção penal).
Está relacionada, assim, com dois fatores: existência de
indícios razoáveis de autoria e materialidade de um lado e, de
outro, com o controle processual do caráter fragmentário da
intervenção penal”. (LOPES JR., Aury. Direito Processual
Penal).

Veja-se que a justa causa exerce essa importante função de conexão


entre os elementos jurídico de uma denúncia com a realidade prática
subjacente, de modo a exigir mais que a mera descrição formal de fatos
típicos.
Ressalte-se ainda que a ausência de justa causa constitui hipótese de
rejeição da denúncia ou queixa, nos termos do art. 395, III, do CPP (“A
denúncia ou queixa será rejeitada quando: III – faltar justa causa para o exercício
da ação penal”).
No caso em análise, toda a etapa investigativa realizada desde a
busca e apreensão dos produtos supostamente falsificados, a qual se
iniciou a partir de petição protocolada na Delegacia de Repressão aos
Crimes contra a Propriedade Imaterial que estranhamente não foi juntada
ao processo, apresenta graves falhas probatórias que repercutem sobre a
fase judicial de instrução e julgamento.
Nesse sentido, é importante pontuar que nenhum dos laudos
periciais juntados aos autos (eDOCs 5 e 6) indicam, de forma clara, os
elementos que justificariam a acusação de falsidade de selos do Inmetro
que tornariam os produtos vendidos impróprios para consumo.
O primeiro laudo se limita a registrar, por exemplo, que “os isqueiros
ostentam selo do Inmetro falsificado” (eDOC 5, p. 2), sem indicar quais
elementos seriam falsos, ou seja, se houve contrafação no número de

Documento assinado digitalmente conforme MP n° 2.200-2/2001 de 24/08/2001. O documento pode ser acessado pelo endereço
http://www.stf.jus.br/portal/autenticacao/autenticarDocumento.asp sob o código 59A7-51A6-5E0F-1A59 e senha 5DE9-56D6-00F9-AD64
Supremo Tribunal Federal
Voto - MIN. GILMAR MENDES

Inteiro Teor do Acórdão - Página 9 de 31

HC 214908 / RJ

série, no logotipo, em outros elementos visuais ou em marcas de


segurança dessas etiquetas e sem juntar ao laudo fotos dos selos com a
indicação dos elementos não verdadeiros.
Tal fato gerou inclusive um requerimento de laudo complementar
por parte da promotora de justiça responsável pelas investigações, no
qual requisitou-se a elaboração de prova pericial que ateste “se os isqueiros
apreendidos são impróprios para consumo” (eDOC 6, p 2).
Ocorre que a dúvida suscitada pela promotora de justiça não foi
esclarecida no laudo complementar. Com efeito, a nova prova pericial se
limitou a dizer, mais uma vez de forma absolutamente genérica, que “os
isqueiros não ostentam selo genuíno do Inmetro, o que caracteriza não terem
passado por testes de segurança, tornando-os assim impróprios para o consumo”
(eDOC 6, p. 3), mais uma vez sem apontar quais evidências indicariam a
falsidade dos selos de segurança e sem juntar as imagens dos elementos
não verdadeiros.

Transcrevo, para fins de clareza e elucidação, a cópia da imagem dos


referidos laudos:

laudo original – eDOC 5, p. 2

Documento assinado digitalmente conforme MP n° 2.200-2/2001 de 24/08/2001. O documento pode ser acessado pelo endereço
http://www.stf.jus.br/portal/autenticacao/autenticarDocumento.asp sob o código 59A7-51A6-5E0F-1A59 e senha 5DE9-56D6-00F9-AD64
Supremo Tribunal Federal
Voto - MIN. GILMAR MENDES

Inteiro Teor do Acórdão - Página 10 de 31

HC 214908 / RJ

laudo complementar – eDOC 6, p. 3

Além dos vícios acima descritos, consta dos autos que houve a
destruição de todos os produtos apreendidos, com a inutilização dos 280
(duzentos e oitanta) isqueiros que foram acautelados pela autoridade
policial (eDOC 20), sem a manutenção de contraprova capaz de
evidenciar a higidez das afirmações contidas nos laudos periciais e/ou de
permitir o exercício do contraditório e do direito de defesa por parte do
paciente.
Tal conduta importa na violação do claro comando normativo
estabelecido pelo artigo 170 do Código de Processo Penal, o qual
estabelece que “nas perícias de laboratório, os peritos guardarão material
suficiente para a eventualidade de nova perícia. Sempre que conveniente,
os laudos serão ilustrados com provas fotográficas, ou microfotográficas,
desenhos ou esquemas”.
Constitui, ainda, um claro descumprimento às regras legalmente
previstas que impõem a garantia e a manutenção da cadeia de custódia
da prova, tal como se observa dos arts. 158-A e 158-B do CPP:

Art. 158-A. Considera-se cadeia de custódia o conjunto de


todos os procedimentos utilizados para manter e documentar a

Documento assinado digitalmente conforme MP n° 2.200-2/2001 de 24/08/2001. O documento pode ser acessado pelo endereço
http://www.stf.jus.br/portal/autenticacao/autenticarDocumento.asp sob o código 59A7-51A6-5E0F-1A59 e senha 5DE9-56D6-00F9-AD64
Supremo Tribunal Federal
Voto - MIN. GILMAR MENDES

Inteiro Teor do Acórdão - Página 11 de 31

HC 214908 / RJ

história cronológica do vestígio coletado em locais ou em


vítimas de crimes, para rastrear sua posse e manuseio a partir
de seu reconhecimento até o descarte.
§ 1º O início da cadeia de custódia dá-se com a
preservação do local de crime ou com procedimentos policiais
ou periciais nos quais seja detectada a existência de vestígio.
§ 2º O agente público que reconhecer um elemento como
de potencial interesse para a produção da prova pericial fica
responsável por sua preservação.
§ 3º Vestígio é todo objeto ou material bruto, visível ou
latente, constatado ou recolhido, que se relaciona à infração
penal.

Art. 158-B. A cadeia de custódia compreende o


rastreamento do vestígio nas seguintes etapas:
I - reconhecimento: ato de distinguir um elemento como
de potencial interesse para a produção da prova pericial;
II - isolamento: ato de evitar que se altere o estado das
coisas, devendo isolar e preservar o ambiente imediato, mediato
e relacionado aos vestígios e local de crime;
III - fixação: descrição detalhada do vestígio conforme se
encontra no local de crime ou no corpo de delito, e a sua
posição na área de exames, podendo ser ilustrada por
fotografias, filmagens ou croqui, sendo indispensável a sua
descrição no laudo pericial produzido pelo perito responsável
pelo atendimento;
IV - coleta: ato de recolher o vestígio que será submetido à
análise pericial, respeitando suas características e natureza;
V - acondicionamento: procedimento por meio do qual
cada vestígio coletado é embalado de forma individualizada, de
acordo com suas características físicas, químicas e biológicas,
para posterior análise, com anotação da data, hora e nome de
quem realizou a coleta e o acondicionamento;
VI - transporte: ato de transferir o vestígio de um local
para o outro, utilizando as condições adequadas (embalagens,
veículos, temperatura, entre outras), de modo a garantir a

Documento assinado digitalmente conforme MP n° 2.200-2/2001 de 24/08/2001. O documento pode ser acessado pelo endereço
http://www.stf.jus.br/portal/autenticacao/autenticarDocumento.asp sob o código 59A7-51A6-5E0F-1A59 e senha 5DE9-56D6-00F9-AD64
Supremo Tribunal Federal
Voto - MIN. GILMAR MENDES

Inteiro Teor do Acórdão - Página 12 de 31

HC 214908 / RJ

manutenção de suas características originais, bem como o


controle de sua posse;
VII - recebimento: ato formal de transferência da posse do
vestígio, que deve ser documentado com, no mínimo,
informações referentes ao número de procedimento e unidade
de polícia judiciária relacionada, local de origem, nome de
quem transportou o vestígio, código de rastreamento, natureza
do exame, tipo do vestígio, protocolo, assinatura e identificação
de quem o recebeu;
VIII - processamento: exame pericial em si, manipulação
do vestígio de acordo com a metodologia adequada às suas
características biológicas, físicas e químicas, a fim de se obter o
resultado desejado, que deverá ser formalizado em laudo
produzido por perito;
IX - armazenamento: procedimento referente à guarda, em
condições adequadas, do material a ser processado, guardado
para realização de contraperícia, descartado ou transportado,
com vinculação ao número do laudo correspondente;
X - descarte: procedimento referente à liberação do
vestígio, respeitando a legislação vigente e, quando pertinente,
mediante autorização judicial.

Ressalte-se que embora os dispositivos legais relativos à cadeia de


custódia da prova somente tenham sido positivados em 2019, com a
aprovação do pacote anticrime, ou seja, após o auto de apreensão, as
diretrizes estabelecidas por essa teoria já se encontravam consolidadas no
âmbito da doutrina e da jurisprudência, razão pela qual entendo serem
aplicáveis ao caso.
Com efeito, a doutrina estabelece que a preservação das fontes de
prova é fundamental, em especial em relação aos elementos produzidos
fora do processo, sendo importante destacar que a alteração das fontes
pode contaminar os meios e os resultados, de modo a impactar na
credibilidade da atividade probatória e no próprio juízo condenatório
eventualmente proferido com base nesses elementos (LOPES JR., Aury.
Direito Processual Penal. 15ª ed. São Paulo: Saraiva Educação, 2018. p.

Documento assinado digitalmente conforme MP n° 2.200-2/2001 de 24/08/2001. O documento pode ser acessado pelo endereço
http://www.stf.jus.br/portal/autenticacao/autenticarDocumento.asp sob o código 59A7-51A6-5E0F-1A59 e senha 5DE9-56D6-00F9-AD64
Supremo Tribunal Federal
Voto - MIN. GILMAR MENDES

Inteiro Teor do Acórdão - Página 13 de 31

HC 214908 / RJ

458).
De acordo com Geraldo Prado, “um dos aspectos mais delicados da
aquisição de fontes de prova consiste em preservar a idoneidade de todo o trabalho
que tende a ser realizado sigilosamente, em um ambiente de reserva que, se não
for respeitado, compromete o conjunto de informações que eventualmente
venham a ser obtidas dessa forma”. (PRADO, Geraldo. Prova penal e sistema
de controles epistêmicos. São Paulo: Marcial Pons, 2014. p. 77).
Em casos de descumprimento da norma que estabelece a
manutenção da cadeia de custódia da prova, não resta outra solução à
autoridade judicial além de declarar a ilicitude da prova produzida em
virtude da violação ao dispositivo previsto pelo art. 5º, LVI, da CF/88
(“são proibidas, no processo, as provas obtidas por meio ilícito”), tendo em vista
a ausência de garantias epistêmicas que possibilitem a averiguação da
validade da prova.
Essa, aliás, é a conclusão que se extrai do precedente firmado pelo
Superior Tribunal de Justiça no Habeas Corpus 160.662, que foi julgado
em 2014, senão observe-se:

“PENAL E PROCESSUAL PENAL. HABEAS CORPUS


SUBSTITUTIVO DE RECURSO ORDINÁRIO. UTILIZAÇÃO
DO REMÉDIO CONSTITUCIONAL COMO SUCEDÂNEO DE
RECURSO. NÃO CONHECIMENTO DO WRIT.
PRECEDENTES DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL E DO
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. QUEBRA DE SIGILO
TELEFÔNICO E TELEMÁTICO AUTORIZADA
JUDICIALMENTE. SUPRESSÃO DE INSTÂNCIA COM
RELAÇÃO A UM DOS PACIENTES. PRESENÇA DE INDÍCIOS
RAZOÁVEIS DA PRÁTICA DELITUOSA.
INDISPENSABILIDADE DO MONITORAMENTO
DEMONSTRADA PELO MODUS OPERANDI DOS DELITOS.
CRIMES PUNIDOS COM RECLUSÃO. ATENDIMENTO DOS
PRESSUPOSTOS DO ART. 2º, I A III, DA LEI 9.296/96.
LEGALIDADE DA MEDIDA. AUSÊNCIA DE PRESERVAÇÃO
DA INTEGRALIDADE DA PROVA PRODUZIDA NA
INTERCEPTAÇÃO TELEFÔNICA E TELEMÁTICA.

Documento assinado digitalmente conforme MP n° 2.200-2/2001 de 24/08/2001. O documento pode ser acessado pelo endereço
http://www.stf.jus.br/portal/autenticacao/autenticarDocumento.asp sob o código 59A7-51A6-5E0F-1A59 e senha 5DE9-56D6-00F9-AD64
Supremo Tribunal Federal
Voto - MIN. GILMAR MENDES

Inteiro Teor do Acórdão - Página 14 de 31

HC 214908 / RJ

VIOLAÇÃO AOS PRINCÍPIOS DO CONTRADITÓRIO, DA


AMPLA DEFESA E DA PARIDADE DE ARMAS.
CONSTRANGIMENTO ILEGAL EVIDENCIADO.
HABEAS CORPUS NÃO CONHECIDO. ORDEM
CONCEDIDA, DE OFÍCIO.
[...]
X. Apesar de ter sido franqueado o acesso aos autos, parte
das provas obtidas a partir da interceptação telemática foi
extraviada, ainda na Polícia, e o conteúdo dos áudios
telefônicos não foi disponibilizado da forma como captado,
havendo descontinuidade nas conversas e na sua ordem, com
omissão de alguns áudios.
XI. A prova produzida durante a interceptação não pode
servir apenas aos interesses do órgão acusador, sendo
imprescindível a preservação da sua integralidade, sem a qual
se mostra inviabilizado o exercício da ampla defesa, tendo em
vista a impossibilidade da efetiva refutação da tese acusatória,
dada a perda da unidade da prova.
XII. Mostra-se lesiva ao direito à prova, corolário da
ampla defesa e do contraditório - constitucionalmente
garantidos -, a ausência da salvaguarda da integralidade do
material colhido na investigação, repercutindo no próprio
dever de garantia da paridade de armas das partes adversas.
XIII. É certo que todo o material obtido por meio da
interceptação telefônica deve ser dirigido à autoridade
judiciária, a qual, juntamente com a acusação e a defesa, deve
selecionar tudo o que interesse à prova, descartando-se,
mediante o procedimento previsto no art. 9º, parágrafo único,
da Lei 9.296/96, o que se mostrar impertinente ao objeto da
interceptação, pelo que constitui constrangimento ilegal a
seleção do material produzido nas interceptações autorizadas,
realizada pela Polícia Judiciária, tal como ocorreu, subtraindo-
se, do Juízo e das partes, o exame da pertinência das provas
colhidas. Precedente do STF.
XIV. Decorre da garantia da ampla defesa o direito do
acusado à disponibilização da integralidade de mídia,

Documento assinado digitalmente conforme MP n° 2.200-2/2001 de 24/08/2001. O documento pode ser acessado pelo endereço
http://www.stf.jus.br/portal/autenticacao/autenticarDocumento.asp sob o código 59A7-51A6-5E0F-1A59 e senha 5DE9-56D6-00F9-AD64
Supremo Tribunal Federal
Voto - MIN. GILMAR MENDES

Inteiro Teor do Acórdão - Página 15 de 31

HC 214908 / RJ

contendo o inteiro teor dos áudios e diálogos interceptados.


[...]
XVII. Ordem concedida, de ofício, para anular as provas
produzidas nas interceptações telefônica e telemática,
determinando, ao Juízo de 1º Grau, o desentranhamento
integral do material colhido, bem como o exame da existência
de prova ilícita por derivação, nos termos do art. 157, §§ 1º e 2º,
do CPP, procedendo-se ao seu desentranhamento da Ação Penal
2006.51.01.523722-9”.
(HC 160.662/RJ, Rel. Min. Assusete Magalhães, Sexta
Turma, julgado em 18.2.2014, DJe 17.3.2014)

No caso em análise, os vícios dos laudos periciais e a completa


destruição dos produtos apreendidos torna absolutamente impossível o
controle epistêmico da validade da prova produzida, seja para fins de
admissão da acusação, para o exercício do direito de defesa ou para o
julgamento da ação penal.
Além disso, mesmo sem possuir o ônus de comprovar a sua
inocência, já que a obrigação de demonstrar a ocorrência do delito recai
sempre sobre a acusação, a defesa do paciente colacionou aos autos cópia
da nota fiscal e do registro do Inmetro da empresa revendedora dos
produtos apreendidos (eDOCs 21 e 22), o que constitui importante
elemento negativo de autoria e materialidade delitiva que reforça a
conclusão quanto à ausência de justa causa para instauração e
prosseguimento da ação penal.
Registre-se que consoante assentei ao julgar o HC 107.263/SP,
Segunda Turma, DJe 5.9.2011, e tenho reiteradamente afirmado, não se
deve banalizar o uso e a admissão de persecuções penais, pois tal atitude
afronta não só as normas legais e jurisprudenciais vigentes, mas também
o princípio da dignidade da pessoa humana, o qual, entre nós, tem base
positiva no artigo 1º, III, da Constituição Federal.
Nesse sentido, o uso excessivo do aparato estatal viola a acepção
originária deste princípio, que proíbe a utilização ou a transformação do
homem em mero objeto dos processos e das ações estatais. É dever do

10

Documento assinado digitalmente conforme MP n° 2.200-2/2001 de 24/08/2001. O documento pode ser acessado pelo endereço
http://www.stf.jus.br/portal/autenticacao/autenticarDocumento.asp sob o código 59A7-51A6-5E0F-1A59 e senha 5DE9-56D6-00F9-AD64
Supremo Tribunal Federal
Voto - MIN. GILMAR MENDES

Inteiro Teor do Acórdão - Página 16 de 31

HC 214908 / RJ

Estado respeitar e proteger o indivíduo contra a exposição a ofensas ou


humilhações.
Não é por outro motivo que entendo que a análise meramente
formal de acusações destituídas de justa causa ou o recurso a adágios
jurídicos como o “in dubio pro societate” representam graves riscos de
ofensa à liberdade e à dignidade dos indivíduos.
Na situação sob exame, a não realização de uma rigorosa análise da
admissão formal e material da acusação representa, por si só, uma grave
ameaça e ofensa à liberdade individual e à dignidade do paciente. Aliás,
ninguém garante que uma ação instaurada e admitida com tantos vícios,
um verdadeiro processo kafkaniano, não vai resultar em uma condenação
injusta.
É por esses motivos que entendo que deve ser inclusive refutada a
última manifestação apresentada pela PGR, quando defende a denegação
da ordem de habeas corpus (eDOC 37).
Com a devida vênia, há equívoco por parte da PGR ao sustentar a
validade em abstrato dos laudos acima transcritos com base na
idoneidade e expertise dos responsáveis pela sua elaboração, sem se
atentar para os seus demonstrados e concretos vícios.
Da mesma forma, o argumento de que “as notas fiscais somente foram
apresentadas após a apresentação da ação penal, não se sabendo sequer se são
verdadeiras” (eDOC 37, p. 3), representa verdadeira inversão das
premissas do processo penal e de todo o contexto probatório coligido até
o presente momento, no qual as falhas acusatórias são inúmeras e tão
graves a ponto de praticamente inviabilizar o exercício do direito de
defesa, enquanto que o o acusado, ainda assim, trouxe ao processo
relevantes elementos excludentes de autoria e materialidade delitiva.
Destarte, entendo que não restam dúvidas no que se refere à
ausência de justa causa para a instauração e o desenvolvimento válido do
processo, razão pela qual deve ser concedida a ordem de habeas corpus.

Conclusão

11

Documento assinado digitalmente conforme MP n° 2.200-2/2001 de 24/08/2001. O documento pode ser acessado pelo endereço
http://www.stf.jus.br/portal/autenticacao/autenticarDocumento.asp sob o código 59A7-51A6-5E0F-1A59 e senha 5DE9-56D6-00F9-AD64
Supremo Tribunal Federal
Voto - MIN. GILMAR MENDES

Inteiro Teor do Acórdão - Página 17 de 31

HC 214908 / RJ

Ante todo o exposto, voto pela concessão da ordem de habeas corpus,


com a confirmação da liminar anteriormente proferida e o trancamento
definitivo da ação penal nº 0266372-12.2018.8.19.0001, tendo em vista a
ausência de de justa causa e a impossibilidade de desenvolvimento válido
do processo.
É como voto.

12

Documento assinado digitalmente conforme MP n° 2.200-2/2001 de 24/08/2001. O documento pode ser acessado pelo endereço
http://www.stf.jus.br/portal/autenticacao/autenticarDocumento.asp sob o código 59A7-51A6-5E0F-1A59 e senha 5DE9-56D6-00F9-AD64
Supremo Tribunal Federal
Voto - MIN. NUNES MARQUES

Inteiro Teor do Acórdão - Página 18 de 31

27/09/2022 SEGUNDA TURMA

HABEAS CORPUS 214.908 RIO DE JANEIRO

VOTO

O SENHOR MINISTRO NUNES MARQUES: Trata-se de habeas


corpus impetrado contra acórdão do Superior Tribunal de Justiça assim
ementado:

PROCESSUAL PENAL. AGRAVO REGIMENTAL EM


EMBARGOS DE DECLARAÇÃO EM RECURSO EM HABEAS
CORPUS. CRIME CONTRA AS RELAÇÕES DE CONSUMO.
PRETENSÃO DE TRANCAMENTO DA AÇÃO PENAL.
INÉPCIA DA DENÚNCIA E AUSÊNCIA DE JUSTA CAUSA.
AGRAVO QUE SE LIMITA A REITERAR OS ARGUMENTOS
DA INICIAL. CONHECIMENTO. IMPOSSIBILIDADE.
SÚMULA 182/STJ. INCIDÊNCIA.
1. É inviável o agravo regimental que deixa de atacar
especificamente os fundamentos da decisão agravada (Súmula
182/STJ).
2. No caso, o agravante limitou-se a reiterar os argumentos
da inicial do recurso ordinário sem atacar o fundamento central
que ensejou o indeferimento liminar da inicial.
3. Agravo regimental não conhecido.
(RHC 120.068 EDcl-AgRg, Relator o ministro Sebastião
Reis Júnior)

Busca-se, na presente impetração, o trancamento da ação penal que


tramita em desfavor do paciente. Alega-se, para tanto, a inépcia da
denúncia e a ausência de justa causa para o prosseguimento da
persecução penal.

O Ministério Público Federal opinou pela denegação da ordem, em


parecer assim ementado:

PROCESSO PENAL. HABEAS CORPUS. CRIME

Documento assinado digitalmente conforme MP n° 2.200-2/2001 de 24/08/2001. O documento pode ser acessado pelo endereço
http://www.stf.jus.br/portal/autenticacao/autenticarDocumento.asp sob o código AC18-C457-3FE7-9121 e senha 9866-0816-0CB6-7C99
Supremo Tribunal Federal
Voto - MIN. NUNES MARQUES

Inteiro Teor do Acórdão - Página 19 de 31

HC 214908 / RJ

CONTRA AS RELAÇÕES DE CONSUMO. TRANCAMENTO


DA AÇÃO PENAL. INÉPCIA DA DENÚNCIA. AUSÊNCIA DE
JUSTA CAUSA. INOCORRÊNCIA. AUSENTE FLAGRANTE
ILEGALIDADE. REVOLVIMENTO DO CONJUNTO FÁTICO-
PROBATÓRIO. INVIABILIDADE. PARECER PELO NÃO
CONHECIMENTO DO HABEAS CORPUS E, CASO
CONHECIDO, PELA DENEGAÇÃO DA ORDEM.

O ministro Gilmar Mendes, Relator, entendendo pela irregularidade


da denúncia, deferiu o pedido liminar formulado pela defesa, para
determinar a suspensão da ação penal n. 0266372-12.2018.8.19.0001 até
ulterior deliberação.

Na mesma decisão, o eminente Relator solicitou à Presidência da


Segunda Turma a imediata inclusão deste habeas corpus na pauta de
julgamentos presenciais.

É o relatório. Passo ao voto.

Sabe-se que está consolidada a jurisprudência desta Corte pelo


descabimento de habeas corpus quando o Tribunal apontado como coator
não houver apreciado as razões apresentadas pela parte impetrante, sob
pena de ficar configurada inadmissível supressão de instância (HC
192.077 AgR, ministra Cármen Lúcia; HC 157.575 AgR, ministro Dias
Toffoli; HC 164.611 AgR, ministro Edson Fachin; HC 190.387, ministro
Gilmar Mendes; HC 189.201 AgR, ministro Luiz Fux; HC 190.319 AgR,
ministro Ricardo Lewandowski; e HC 188.702 AgR, ministro Roberto
Barroso).

É certo, também, que este Tribunal firmou entendimento no sentido


de que o trancamento da ação penal só é viável por meio de habeas
corpus em casos excepcionais, de evidente atipicidade da conduta,
extinção da punibilidade ou ausência de justa causa (HC 186.154 AgR,
Segunda Turma, Relator o ministro Gilmar Mendes; HC 187.227 AgR,

Documento assinado digitalmente conforme MP n° 2.200-2/2001 de 24/08/2001. O documento pode ser acessado pelo endereço
http://www.stf.jus.br/portal/autenticacao/autenticarDocumento.asp sob o código AC18-C457-3FE7-9121 e senha 9866-0816-0CB6-7C99
Supremo Tribunal Federal
Voto - MIN. NUNES MARQUES

Inteiro Teor do Acórdão - Página 20 de 31

HC 214908 / RJ

Segunda Turma, Relator o ministro Ricardo Lewandowski):

1. O trancamento da ação penal, por meio do habeas


corpus, só é possível quando estiverem comprovadas, de plano,
a atipicidade da conduta, a extinção da punibilidade ou a
evidente ausência de justa causa. Precedentes.
(HC 191.216 AgR, Primeira Turma, Relator o ministro
Roberto Barroso)

Ocorre, porém, que há casos excepcionais aptos à concessão da


ordem de habeas corpus para trancar ação penal, nos termos do art. 654, §
2º, do Código de Processo Penal.

Por isso mesmo, a despeito dos óbices inicialmente abordados no


meu voto, convém destacar a relevância do exame das razões externadas
pela parte impetrante quanto à instauração de persecução penal
temerária, a partir de denúncia inepta ou mediante ausência de justa
causa, o que, segundo penso, representaria verdadeiro impedimento ao
direito à ampla defesa, a violar o princípio constitucional do devido
processo legal, extremamente caro ao Estado de Direito.

Pois bem. O paciente responde pela suposta prática de crime contra


as relações de consumo (Lei n. 8.137/1990, art. 7º, IX), perante o Juízo de
Direito da 35ª Vara Criminal da Comarca da Capital/RJ (processo n.
0266372-12.2018.8.19.0001).

Após denegação da ordem de habeas corpus impetrado ao Tribunal de


Justiça fluminense, o Superior afastou a alegada inépcia da denúncia ao
fundamento de ter ficado demonstrado o nexo de causalidade entre o
crime imputado e a conduta do ora paciente, que, na condição de
responsável pelo estabelecimento comercial, mantinha em depósito e
expunha à venda produtos em discordância com as normas vigentes.

Como se sabe, a denúncia oferecida contra o acusado deve observar

Documento assinado digitalmente conforme MP n° 2.200-2/2001 de 24/08/2001. O documento pode ser acessado pelo endereço
http://www.stf.jus.br/portal/autenticacao/autenticarDocumento.asp sob o código AC18-C457-3FE7-9121 e senha 9866-0816-0CB6-7C99
Supremo Tribunal Federal
Voto - MIN. NUNES MARQUES

Inteiro Teor do Acórdão - Página 21 de 31

HC 214908 / RJ

todas as exigências formais do art. 41 do Código de Processo Penal,


evidenciando os elementos essenciais da figura típica do delito imputado
e permitindo a compreensão da defesa quanto aos fatos atribuídos na
peça acusatória, o que possibilitaria o pleno exercício do direito de defesa.

Essa foi a ótica adotada pela Segunda Turma ao julgar o HC 89.427,


do qual transcrevo este fragmento:

A denúncia – enquanto instrumento formalmente


consubstanciador da acusação penal – constitui peça processual
de indiscutível relevo jurídico. Ela, antes de mais nada, ao
delimitar o âmbito temático da imputação penal, define a
própria res in judicio deducta. A peça acusatória, por isso
mesmo, deve conter a exposição do fato delituoso, em toda a
sua essência e com todas as suas circunstâncias. Essa narração,
ainda que sucinta, impõe-se ao acusador como exigência
derivada do postulado constitucional que assegura, ao réu, o
exercício, em plenitude, do direito de defesa. Denúncia que
não descreve, adequadamente, o fato criminoso e que também
deixa de estabelecer a necessária vinculação da conduta
individual de cada agente ao evento delituoso qualifica-se
como denúncia inepta.
(HC 89.427, Relator o ministro Celso de Mello – grifei)

Cito, por oportuno, o inteiro teor da denúncia oferecida pelo


Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro:

No dia 26 de abril de 2018, entre 12h e 12h30 min, na Rua


Senhor dos Passos, nº 279, Centro, RJ, nesta cidade, o
denunciado, de forma livre e consciente, tinha em depósito para
vender e expunha à venda mercadorias impróprias ao
consumo, quais sejam, 280 (duzentos e oitenta) isqueiros
impróprios para o consumo, devidamente escritos nos laudos
periciais de exame de material de contração ICCE-RJ-SPE
014463/2018 e ICCE-RJ-SPE 028145/2018 (fls. 41/42 e 60).

Documento assinado digitalmente conforme MP n° 2.200-2/2001 de 24/08/2001. O documento pode ser acessado pelo endereço
http://www.stf.jus.br/portal/autenticacao/autenticarDocumento.asp sob o código AC18-C457-3FE7-9121 e senha 9866-0816-0CB6-7C99
Supremo Tribunal Federal
Voto - MIN. NUNES MARQUES

Inteiro Teor do Acórdão - Página 22 de 31

HC 214908 / RJ

De acordo com o laudo pericial que, conforme laudo


pericial ICCE-RJ-SPE028145/2018 (fl. 60) acima referido, “Os
isqueiros não ostentavam selo genuíno do INMETRO, o que
caracteriza não terem passado por testes de segurança,
tornando-os, assim, impróprios para o consumo”.
Policiais lotados na Delegacia de Repressão aos Crimes
Contra a Propriedade Material – DRCPIM e na 19ª Delegacia da
Polícia compareceram ao endereço mencionado por
determinação da Autoridade Policial na data e horário acima
descritos e lograram apreender as mercadorias impróprias para
o consumo, os quais estavam sob responsabilidade do
denunciado (fls. 24/27).
Assim agindo, está o denunciado incurso nas sanções
penais do art. 7º, inciso IX, da Lei nº 8.137/90.
(Grifei)

Observo que, no caso, a peça acusatória é genérica, pois deixou de


identificar e descrever de maneira satisfatória elemento essencial
integrante do tipo penal em referência, notadamente pela ausência de
efetiva demonstração do modo de falsificação do selo do Inmetro e da
decorrente impropriedade do material para consumo.

De outro lado, ainda que considere apta a peça acusatória, entendo


não haver justa causa para a continuidade da persecução penal.

Conforme bem evidenciado pelo Ministro Relator na decisão


concessiva de liminar, nenhum dos laudos periciais juntados aos autos
(eDocs 5 e 6) “indicam, de forma clara, os elementos que justificariam a
acusação de falsidade de selos do Inmetro que tornariam os produtos
vendidos impróprios para consumo”.

Nessa linha, o primeiro laudo não evidencia de que maneira se teria


dado a falsificação, apenas registrando que “os isqueiros ostentam selo do
Inmetro falso”. Já a segunda perícia foi resultado de um pedido de laudo
complementar pelo membro do Ministério Público fluminense que atuou

Documento assinado digitalmente conforme MP n° 2.200-2/2001 de 24/08/2001. O documento pode ser acessado pelo endereço
http://www.stf.jus.br/portal/autenticacao/autenticarDocumento.asp sob o código AC18-C457-3FE7-9121 e senha 9866-0816-0CB6-7C99
Supremo Tribunal Federal
Voto - MIN. NUNES MARQUES

Inteiro Teor do Acórdão - Página 23 de 31

HC 214908 / RJ

nas investigações. Ainda assim, não foi capaz de esclarecer de que modo
ocorrera a falsificação e a consequente impropriedade para o consumo.

Com efeito, anota o ministro Relator que “a nova prova pericial se


limitou a dizer, mais uma vez de forma absolutamente genérica, que ‘os
isqueiros não ostentam selo genuíno do Inmetro, o que caracteriza não
terem passado por testes de segurança, tornando-os assim impróprios
para o consumo’ (eDOC 6, p. 3), mais uma vez sem apontar quais
evidências indicariam a falsidade dos selos de segurança e sem juntar as
imagens dos elementos não verdadeiros”.

Como se vê, a denúncia transcrita teve suporte probatório apenas em


laudos periciais deficientes (eDocs 5 e 6).

Ocorre que, como elucidou o Ministro Relator, além da insuficiente


demonstração da falsificação do selo do Inmetro, “consta dos autos que
houve a destruição de todos os produtos apreendidos, com a inutilização
dos 280 isqueiros que foram acautelados pela autoridade policial (eDOC
20), sem a manutenção de contraprova capaz de evidenciar a higidez das
afirmações contidas nos laudos periciais”.

Tal conduta estatal representa flagrante violação ao art. 170 do


Código de Processo Penal, que assim dispõe:

Art. 170. Nas perícias de laboratório, os peritos guardarão


material suficiente para a eventualidade de nova perícia.
Sempre que conveniente, os laudos serão ilustrados com provas
fotográficas, ou microfotográficas, desenhos ou esquemas.

Ao comentar o referido dispositivo legal, Guilherme de Souza


Nucci1, menciona que:

1 NUCCI, Guilherme de Souza. Código de Processo Penal comentado. 15. ed. rev., atual. e
ampl. Rio de Janeiro: Forense, 2016.

Documento assinado digitalmente conforme MP n° 2.200-2/2001 de 24/08/2001. O documento pode ser acessado pelo endereço
http://www.stf.jus.br/portal/autenticacao/autenticarDocumento.asp sob o código AC18-C457-3FE7-9121 e senha 9866-0816-0CB6-7C99
Supremo Tribunal Federal
Voto - MIN. NUNES MARQUES

Inteiro Teor do Acórdão - Página 24 de 31

HC 214908 / RJ

[…] determina a lei que os expertos, ao findarem o exame,


guarde material suficiente do produto analisado, para a
realização, se for o caso, da contraprova, que significa uma nova
perícia para confirmar a primeira, quando nesta se encontrarem
falhas insuperáveis, ou para que algumas das partes possam
questionar a conclusão obtida pelos peritos, através de uma
segunda verificação.

Cabe anotar, por isso mesmo, a importância da observação da cadeia


de custódia, com o objetivo de manter e documentar a história
cronológica do vestígio coletado, de modo a assegurar seu rastreamento
em todas as etapas de reconhecimento, isolamento, fixação, coleta,
acondicionamento, transporte, recebimento, processamento,
armazenamento e descarte, em consonância com o disposto nos arts. 158-
A a 158-E do Código de Processo Penal.

O dever de observância desse conjunto legal de procedimentos para


a válida coleta de dados na fase investigatória, com o objetivo de
resguardar a legitimidade e autenticidade dos elementos extraídos e,
assim, possibilitar a ampla defesa do acusado, também foi ressaltado pelo
Ministro Relator ao destacar que, “em casos de descumprimento da
norma que estabelece a manutenção da cadeia de custódia da prova, não
resta outra solução à autoridade judicial além de declarar a ilicitude da
prova produzida em virtude da violação ao dispositivo previsto pelo art.
5º, LVI, da CF/88 (“são proibidas, no processo, as provas obtidas por meio
ilícito”), tendo em vista a ausência de garantias epistêmicas que
possibilitem a averiguação da validade da prova. “.

Ademais, como se sabe, as acusações penais não se presumem


demonstradas, incumbindo exclusivamente a quem acusa o ônus da
prova concernente aos elementos constitutivos do pedido (autoria e
materialidade do fato delituoso).

Tem sido esse o entendimento em sede de habeas corpus, em ambas as

Documento assinado digitalmente conforme MP n° 2.200-2/2001 de 24/08/2001. O documento pode ser acessado pelo endereço
http://www.stf.jus.br/portal/autenticacao/autenticarDocumento.asp sob o código AC18-C457-3FE7-9121 e senha 9866-0816-0CB6-7C99
Supremo Tribunal Federal
Voto - MIN. NUNES MARQUES

Inteiro Teor do Acórdão - Página 25 de 31

HC 214908 / RJ

Turmas do Supremo (HC 107.801, Redator do acórdão o ministro Luiz


Fux; HC 173.892 AgR-ED, ministro Gilmar Mendes; e RHC 138.715,
ministro Ricardo Lewandowski).

Na espécie, entendo que o órgão acusador não reuniu provas aptas a


formarem, para além de qualquer dúvida razoável, o juízo de certeza
necessário à condenação, nem mesmo um lastro probatório mínimo de
autoria e materialidade delitiva suficientes para formalizar uma acusação
criminal, notadamente porque “os vícios dos laudos periciais e a
completa destruição dos produtos apreendidos torna absolutamente
impossível o controle epistêmico da validade da prova produzida, seja
para fins de admissão da acusação, para o exercício do direito de defesa
ou para o julgamento da ação penal”, conforme consta da decisão do
Ministro Relator.

Finalmente, ainda que o ônus probatório recaia sobre a acusação, a


defesa do paciente trouxe aos autos cópia da nota fiscal e do registro do
Inmetro da empresa revendedora dos produtos apreendidos (eDocs 21 e
22), o que, além de revelar boa-fé, esvazia os indícios de autoria e de
materialidade necessários para o oferecimento da denúncia e a tramitação
de uma persecução penal.

Os fatos, segundo penso, inviabilizam o pleno exercício do


contraditório e do direito de defesa por parte do paciente, atraindo a
ausência de justa para a continuidade da persecução penal, com a
rejeição da denúncia e o consequente trancamento da ação penal, nos
termos do art. 395, III, do Código de Processo Penal.

Desse modo, também eu vislumbro ilegalidade evidente apta a


justificar a concessão da ordem de habeas corpus de ofício.

Do exposto, pedindo vênia a quem pensa de modo diverso,


acompanho o eminente Relator e concedo a ordem de ofício para trancar

Documento assinado digitalmente conforme MP n° 2.200-2/2001 de 24/08/2001. O documento pode ser acessado pelo endereço
http://www.stf.jus.br/portal/autenticacao/autenticarDocumento.asp sob o código AC18-C457-3FE7-9121 e senha 9866-0816-0CB6-7C99
Supremo Tribunal Federal
Voto - MIN. NUNES MARQUES

Inteiro Teor do Acórdão - Página 26 de 31

HC 214908 / RJ

a ação penal n. 0266372-12.2018.8.19.0001, que tramita contra o paciente


na 35ª Vara Criminal da Comarca da Capital/RJ, em razão da ausência de
justa causa.

É como voto.

Documento assinado digitalmente conforme MP n° 2.200-2/2001 de 24/08/2001. O documento pode ser acessado pelo endereço
http://www.stf.jus.br/portal/autenticacao/autenticarDocumento.asp sob o código AC18-C457-3FE7-9121 e senha 9866-0816-0CB6-7C99
Supremo Tribunal Federal
Voto - MIN. EDSON FACHIN

Inteiro Teor do Acórdão - Página 27 de 31

27/09/2022 SEGUNDA TURMA

HABEAS CORPUS 214.908 RIO DE JANEIRO

VOTO
O SENHOR MINISTRO EDSON FACHIN - Senhor Presidente,
muito obrigado! Cumprimento Vossa Excelência, Ministro André
Mendonça, Sua Excelência o eminente Ministro-Relator deste Habeas
Corpus 214.908/RJ, Gilmar Mendes, Sua Excelência o eminente Ministro
Ricardo Lewandowski e Sua Excelência o eminente Ministro Kassio
Nunes Marques, que vem de proferir voto congruente com a conclusão
que o eminente Ministro-Relator traz à colação. Cumprimento também o
Senhor Subprocurador-Geral da República e os Advogados que se fazem
aqui presentes.
Senhor Presidente e eminentes Pares, do exame aqui levado a efeito,
eu houvera tomado diversas notas do estudo que fiz do caso, mas
considero o voto de Sua Excelência o eminente Ministro Gilmar Mendes
exauriente - mais do que eu mesmo poderia deduzir -, esgota todas as
circunstâncias que levam à conclusão lógica, acertada e justa que Sua
Excelência traz à colação.
Além disso, a questão específica dos selos do Inmetro e os isqueiros,
objeto dessa circunstância, envolvem, de um lado, como diz Sua
Excelência, a cadeia de custódia. De outro, é preciso reconhecer que
efetivamente há precedentes que demandam necessidade de que se faça a
perícia, mas a perícia precisa ser esclarecedora. O fundamental é ter o
objeto a ser periciado, e um objeto suficientemente apto a ter uma perícia
esclarecedora.
Eu houvera até mesmo anotado para citar, apenas à guisa de
acrescer, já que estamos aqui na Segunda Turma, um precedente da
Primeira Turma, da relatoria do eminente Ministro Carlos Ayres Britto,
Habeas Corpus 90.779, um julgamento de 2008. Disse Sua Excelência:
"§ 6° São impróprios ao uso e consumo:
I - ...
II - ... aqueles em desacordo com as normas regulamentares de
fabricação, distribuição ou apresentação;"

Documento assinado digitalmente conforme MP n° 2.200-2/2001 de 24/08/2001. O documento pode ser acessado pelo endereço
http://www.stf.jus.br/portal/autenticacao/autenticarDocumento.asp sob o código E86E-418F-039E-5975 e senha 8E54-7A50-029D-F7A3
Supremo Tribunal Federal
Voto - MIN. EDSON FACHIN

Inteiro Teor do Acórdão - Página 28 de 31

HC 214908 / RJ

Esta é a premissa; a premissa e a regra. Sua Excelência acrescentou:


"A criminalização da conduta, todavia, está a exigir do titular da
ação penal a comprovação da impropriedade do produto para uso. Pelo
que imprescindível, no caso, a realização de exame pericial para aferir a
nocividade dos produtos apreendidos."
Aqui, é a citação que faço desse habeas corpus, cujo julgamento foi
publicado em 24 de outubro de 2008.
Por essas singelas razões, Senhor Presidente e eminentes Pares, estou
integralmente de acordo, votando na mesma linha do voto de Sua
Excelência o eminente Ministro-Relator.

Documento assinado digitalmente conforme MP n° 2.200-2/2001 de 24/08/2001. O documento pode ser acessado pelo endereço
http://www.stf.jus.br/portal/autenticacao/autenticarDocumento.asp sob o código E86E-418F-039E-5975 e senha 8E54-7A50-029D-F7A3
Supremo Tribunal Federal
Voto - MIN. RICARDO LEWANDOWSKI

Inteiro Teor do Acórdão - Página 29 de 31

27/09/2022 SEGUNDA TURMA

HABEAS CORPUS 214.908 RIO DE JANEIRO

VOTO

O SENHOR MINISTRO RICARDO LEWANDOWSKI - Senhor


Presidente, boa tarde! Cumprimento Vossa Excelência e, assim o fazendo,
cumprimento todos os integrantes desta Segunda Turma, o eminente
representante do Ministério Público, os senhores advogados, servidores e
demais presentes.
A matéria já está bem discutida, Senhor Presidente. O relator e os
demais Ministros que me antecederam demonstraram que o rito, o
cuidado, previsto nos arts. 158-A e 158-F do Código de Processo Penal,
que disciplinou o conjunto de procedimentos a serem observados durante
a coleta de provas em investigação criminal, não foi observado. Temos
aqui duas perícias absolutamente imprestáveis, e, ademais, as
mercadorias apreendidas foram inutilizadas, portanto não há como
provar a materialidade do tipo penal imputado ao ora paciente.
Por essas singelíssimas razões, Senhor Presidente, acompanho o
relator e concedo também a ordem de habeas corpus.

Documento assinado digitalmente conforme MP n° 2.200-2/2001 de 24/08/2001. O documento pode ser acessado pelo endereço
http://www.stf.jus.br/portal/autenticacao/autenticarDocumento.asp sob o código 1A2C-7407-3400-BB27 e senha C0B3-B4EA-C9A2-184B
Supremo Tribunal Federal
Voto Vogal

Inteiro Teor do Acórdão - Página 30 de 31

27/09/2022 SEGUNDA TURMA

HABEAS CORPUS 214.908 RIO DE JANEIRO

RELATOR : MIN. GILMAR MENDES


PACTE.(S) : RAFAEL JOSEPH BELACIANO
IMPTE.(S) : DIOGO TEBET DA CRUZ
IMPTE.(S) : VICTOR VIEITES DO VALLE PIRES
COATOR(A/S)(ES) : SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA

VOTO-VOGAL

O SENHOR MINISTRO ANDRÉ MENDONÇA (PRESIDENTE) -


Também de forma bastante sintética, entendo por acompanhar o
eminente Relator, fazendo também justiça, como já o fizeram os
eminentes Pares, à qualidade, à profundidade e, penso também, à justiça
de suas conclusões.
Entendo não haver razões suficientes e justa causa para não só o
oferecimento da denúncia, mas também, de modo especial, para o
recebimento da correspondente denúncia.
Também voto pela concessão da ordem e trancamento da ação penal
correspondente.

Documento assinado digitalmente conforme MP n° 2.200-2/2001 de 24/08/2001. O documento pode ser acessado pelo endereço
http://www.stf.jus.br/portal/autenticacao/autenticarDocumento.asp sob o código 31CD-34A8-3A98-4BF0 e senha CFC4-6F17-BB1A-17AC
Supremo Tribunal Federal
Extrato de Ata - 27/09/2022

Inteiro Teor do Acórdão - Página 31 de 31

SEGUNDA TURMA
EXTRATO DE ATA

HABEAS CORPUS 214.908


PROCED. : RIO DE JANEIRO
RELATOR : MIN. GILMAR MENDES
PACTE.(S) : RAFAEL JOSEPH BELACIANO
IMPTE.(S) : DIOGO TEBET DA CRUZ (127188/RJ)
IMPTE.(S) : VICTOR VIEITES DO VALLE PIRES (178718/RJ)
COATOR(A/S)(ES) : SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA

Decisão: A Turma, por unanimidade, concedeu a ordem de habeas


corpus confirmando a liminar anteriormente deferida e determinando
o trancamento definitivo da ação penal nº
0266372-12.2018.8.19.0001, tendo em vista a ausência de justa
causa e a impossibilidade de desenvolvimento válido do processo,
nos termos do voto do Relator. Presidência do Ministro André
Mendonça. 2ª Turma, 27.9.2022.

Presidência do Senhor Ministro André Mendonça. Presentes à


sessão os Senhores Ministros Gilmar Mendes, Ricardo Lewandowski,
Edson Fachin e Nunes Marques.

Subprocurador-Geral da República, Dr. Luiz Augusto Santos


Lima.

Hannah Gevartosky
Secretária

Documento assinado digitalmente conforme MP n° 2.200-2/2001 de 24/08/2001. O documento pode ser acessado pelo endereço
http://www.stf.jus.br/portal/autenticacao/autenticarDocumento.asp sob o código B78A-D0A5-347E-F696 e senha 6102-C144-62BA-C2DC

Você também pode gostar