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CURSO MEGE

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Turma: PCSP – Pré-Edital
Material: Direito Administrativo – Ponto 1

1
RODADA 1
Direito Administrativo
(Ponto 01)
2
MENSAGEM DO MEGE
Oi, Megeano e Megeana.
Tudo bem com você?
Vamos dar início ao estudo de uma das disciplinas que faz parte do tripé para
aprovação em concurso de Delegado de Polícia de São Paulo: direito administrativo.
Conjuntamente com constitucional, penal (geral e especial) e processo Penal, estamos
diante de uma matéria abordada em todas as fases de certames públicos. A prova de
Delegado de São Paulo costuma pegar em pontos doutrinários específicos, por isso
estaremos bem alinhados aos melhores manuais, tudo para você não perder tempo
lendo livros e livros da matéria. Já fizemos isso, você só precisar revisar aqui: Maria Sylvia
Zanella Di Pietro; José dos Santos Carvalho Filho; Matheus Carvalho (mais conceitual e
objetivo); Alexandre Mazza; Fernando Ferreira Baltar e Ronny Charles Lopes de Torres.
Ademais, vamos beber hora outra da fonte de Rafael Carvalho Rezende Oliveira, de
forma bem pontual sobre aspectos que reputamos relevante para o seu Estado.
No estudo da matéria você nota aos poucos que temos pontos eminentemente
doutrinários, para isso, utilizaremos o acervo acima apresentado. Noutros pontos,
notará que estamos diante de matéria que possui forte viés legal (Licitação e Processo
Administrativo), e, por vezes, adentraremos em pontos mais complexos que exigem
forte carga doutrinária, jurisprudencial e legal.
Aos poucos vamos pontuando e destacando as linhas de enfrentamento.
3
Naquilo que for mais teórico, precisamos de uma atenção macro no sentido de absorver
conceitos e institutos – atos administrativos, por exemplo. Em temas como organização
da Administração Pública precisamos estar atentos a todos os eixos, por exemplo,
porquanto há novidades, legislação farta e jurisprudência simples e densa para todo
gosto.
Vamos agora adentrar em nosso primeiro ponto de direito administrativo.
Em caso de dúvidas, envie suporte.
SUMÁRIO

1. DOUTRINA (RESUMO) ................................................................................................ 5


1.1. INTRODUÇÃO AO ESTUDO DO DIREITO ADMINISTRATIVO ...................................... 5
1.2. ORIGEM DO DIREITO ADMINISTRATIVO .................................................................. 7
1.3. DISTINÇÃO ENTRE FUNÇÃO ADMINISTRATIVA E FUNÇÃO DE GOVERNO .............. 10
1.4. CRITÉRIOS PARA DEFINIÇÃO DO DIREITO ADMINISTRATIVO ................................. 11
1.5. SENTIDO OBJETIVO E SUBJETIVO DE ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA ........................... 13
1.6. CONCEITO DE DIREITO ADMINISTRATIVO .............................................................. 14
1.7. SISTEMAS DE CONTROLE: INGLÊS, FRANCÊS. QUAL O ADOTADO NO BRASIL? ...... 14
1.8. RESUMO HISTÓRICO DO DIREITO ADMINISTRATIVO – POR MARIA SYLVIA (2019) 18
1.9. FONTES DO DIREITO ADMINISTRATIVO ................................................................. 20
1.10. FONTES LEGISLATIVAS EM SENTIDO AMPLO........................................................ 22
1.11. FONTES ADMINISTRATIVAS.................................................................................. 22
1.12. FONTES JURISPRUDENCIAIS ................................................................................. 23 4
1.13. COSTUME ADMINISTRATIVO ............................................................................... 25
1.14. DOUTRINA............................................................................................................ 26
1.15. ADMINISTRAÇÃO BUROCRÁTICA, ADMINISTRAÇÃO GERENCIAL E ESTADO EM
REDE ............................................................................................................................. 26
2. JURISPRUDÊNCIA ..................................................................................................... 29
3. QUESTÕES ................................................................................................................ 30
4. GABARITO COMENTADO ......................................................................................... 34
1. DOUTRINA (RESUMO)
1.1. INTRODUÇÃO AO ESTUDO DO DIREITO ADMINISTRATIVO
Caro(a), Megeano(a)!

Você já deve ter ouvido falar em Separação dos Poderes. Não é mesmo?

A Carta Constitucional de 1988, que instituiu a nova ordem jurídica brasileira,


logo de início, anuncia a constituição de um Estado Democrático de Direito (artigo 1º,
CR/1988), que tem como objetivo precípuo concretizar o interesse público por meio da
distribuição de funções estatais em diferentes estruturas internas. Essas “funções
estatais” manifestam-se de três formas distintas: ora criando o direito novo, por meio
da função legislativa; ora resolvendo litígios em concreto, por meio da função
jurisdicional; ora atuando na gestão e satisfação concretas dos interesses coletivos e
finalidades estatais, aplicando a ordem constitucional e legal a que está submetida, por
meio da função administrativa (Executiva).

Tal clássica tripartição de funções, notadamente influenciada por


Montesquieu, permite que o Estado seja absorvido por blocos orgânicos especializados
denominados “Poderes”, naquilo que se compreende por “separação dos poderes
estatais”, nomeando cada estrutura com o próprio nome da função que exerce com
predominância: Poder Executivo, Poder Legislativo e Poder Judiciário. 5
Para nosso renomado autor Celso Antônio Bandeira de Mello, “tais unidades
orgânicas absorveriam, senão com absoluta exclusividade, ao menos com manifesta
predominância, as funções correspondentes a seus próprios nomes: Legislativo,
Executivo e Judiciário” (2005, p. 29).

Sobre este aspecto fundante do Poder Estatal, adverte André Ramos Tavares
que “embora esteja profundamente enraizada, deve ser entendida de maneira
meramente figurativa” (1999, p. 66/71), até mesmo porque, não passaria de
distribuição de função a diferentes órgãos do Estado (1999, p. 66).

Karl Loewenstein – com a maestria que lhe é típica – afirma que


contemporaneamente há uma superação da clássica separação de Montesquieu,
surgindo uma nova hipótese de divisão, também tripartite.

ATENÇÃO, MEGEANA(O)!

Olha o entendimento versátil de Loewenstein, que expõe essa divisão dos


Poderes Estatais:
Policy Determination
(Definição da
Política)

Policy Control Policy Execution


(Controle da (Execução da
Política) Política)

Apesar dessas críticas a respeito da clássica divisão, certo é que o nosso


legislador constituinte consagrou a separação dos poderes do Estado no artigo 2º da
Constituição da República, enunciando que “são Poderes da União, independentes e
harmônicos entre si, o Legislativo, o Executivo e o Judiciário”.

SE LIGA NO DETALHE!!!
Esse entendimento de Loewenstein não é comum em provas, o mais rotineiro é o 6
posicionamento estampado em nossa Constituição – logo acima afirmado. Então,
é muito provável que o examinador apresente junto com a abordagem dessa
temática a lógica traga por “De l’esprit des lois” (O Espírito das Leis) de Charles-
Louis de Secondat – nosso barão de Montesquieu. Tranquilo? Grave isso!

“Professor! E por que o ‘senhor’ está trazendo essa posição então?”

Ora, Megeano(a)! Estamos treinando você para além da prova objetiva.


Logo você enfrentará discursivas e orais, e é importante que possua conhecimento
distinto do tradicional. Beleza? Sigamos...

A CR/88 cuidou também de autorizar que cada estrutura desempenhasse,


paralelamente e quando necessário, as funções que “materialmente deveriam
pertencer a Poder diverso” (CARVALHO FILHO, 2017, p. 40). Para Marçal Justen Filho
(2015, p. 105) essa organização: “Conduz à autonomia relativa, em que cada um dos
poderes exercita preponderantemente, mas não exclusivamente, um tipo de função.
Ressalta-se que nenhum dos poderes é titular exclusivo de cada uma das funções nem
cada uma das funções é desempenhada exclusivamente por um dos poderes. Ou seja,
cada poder é investido de uma função principal, mas desempenha acessoriamente
outras funções” (grifo nosso).
• Assim, o Poder Legislativo exerce a função legislativa de forma típica, mas, por
exemplo, também exerce a função jurisdicional quando o Senado processo e
julga o Presidente da República nos crimes de responsabilidade (artigo 52, I,
CF/88), de forma atípica.
• O Poder Judiciário exerce a função jurisdicional de forma típica, mas, por
exemplo, também exerce função de criar norma quando elabora os regimentos
internos dos Tribunais (artigo 96, inciso I, a, CF/88), também de forma atípica.
• O Poder Executivo exerce a função administrativa (executiva) de forma típica,
mas, por exemplo, também exerce a função legislativa em sentido amplo quando
se vale do poder regulamentar (CR/88, art. 84, VI) ou quando edita medidas
provisórias (CR/88, art. 62): forma atípica.

Afim, sobre o apanhado geral acima, impende a nós, no estudo do Direito


Administrativo, nos aprofundar na análise da função executiva (dentro do espectro
administrativo), com suas nuances e variações, compreendo especificamente as
atividades de serviços públicos, intervenção estatal, fomento e poder de polícia –
pilares da função administrativa apontados por Maria Sylvia Zanella Di Pietro (2011).

1.2. ORIGEM DO DIREITO ADMINISTRATIVO

Segundo Marçal Justen Filho (2008) citado por Maria Sylvia Zanella Di Pietro
(2019):
7
“a organização do aparato administrativo do Estado se modela
pelas concepções napoleônicas, que traduzem uma rígida
hierarquia de feição militar do século XIX. A fundamentação
filosófica do Direito Administrativo ainda se reporta à clássica
disputa entre Duguit e Hauriou, ocorrida nos primeiros decênios
do século XX. Mais do que isso, predomina a influência do
pensamento de Hauriou muito mais intensamente do que a
visão de Duguit. O conteúdo do Direito Administrativo é
preenchido por institutos vinculados a concepções políticas de
um período distante. Ou seja, o Direito Administrativo continua
vinculado às concepções filosóficas, políticas e constitucionais
que vigoravam na primeira metade do século XX. A evolução
radical do constitucionalismo do final do século XX permanece
ignorada pelo Direito Administrativo”.

Em linhas gerais, o que o autor está a nos apontar – e isto é relevante para
nosso estudo – é que o direito administrativo, ainda, em sua essência, carrega consigo
nuances de seu período criador: do absolutismo monárquico a diante, com grande
influência do ideal liberal/burguês europeu. Crítica dura, heim?

O que é importante também saber, e guarde essa correlação, sobre essa


perspectiva dura de Marçal Justen é a posição de Maria Sylvia, para quem há uma
suavidade sobre o desenvolvimento do direito administrativo no Brasil. Vamos à sua
análise:
[...] já analisei o tema (2012:10-11) afirmando que,
paradoxalmente, o Estado de Direito, preocupado embora com
a liberdade do cidadão e a igualdade de todos perante o
Direito, trouxe em seu bojo o Direito Administrativo, como
ramo autônomo, composto por normas de direito público,
aplicáveis à Administração Pública e que, derrogando o direito
comum, a ela reconhece uma série de prerrogativas e
privilégios de que o particular não dispõe. E lembramos a lição
de Massimo Severo Giannini (1970:28), para quem a existência
de Estados com Direito Administrativo é o resultado de uma
síntese de pensamentos contrastantes e de experiências
político-jurídicas oriundos de todas as partes da Europa. O
Estado com Direito Administrativo recebe, do direito inglês, o
princípio constitucional da divisão de poderes e a ideia de não
arbítrio do poder público, que coloca como princípio o primado
da função normativa e do qual deriva o princípio da legalidade
da ação administrativa; do pensamento político-jurídico comum,
nasce o princípio constitucional do absolutismo da jurisdição, do
qual deriva o reconhecimento de situações jurídicas subjetivas
tuteláveis perante o juiz, criando-se a categoria dos direitos
subjetivos de conteúdo público; da estrutura estatal do
absolutismo iluminado recebe a ideia de legislação pública
especial para regular a atividade da administração pública,
8
transformando os poderes absolutos da coroa em poderes do
Estado regulados pela lei.

Um importante precedente que conduz ao nascimento desta disciplina – nessa


perspectiva de análise – é a criação do Estado de Direito, o qual, à luz das ideias
iluministas do final do século XVII e início do século XVIII, no embalo das revoluções
constitucionalistas Norte-Americana (1787) e Francesa (1789), estabeleceu que todos,
inclusive o Estado, estão submetidos ao direito posto.

Neste sentido, por meio da obra Teoria Pura do Direito, Hans Kelsen 1 expõe
que apenas é possível falar em Estado de Direito por causa de sua submissão
voluntariosa, ainda que existente como realidade social independente, ao próprio
Direito criado.

Compreende-se, então, que a organização e funcionamento dos órgãos


estatais, em suas relações internas e externas, não escapam à disciplina da lei.

A doutrina aponta a edição da Lei 28 de Pluvioso 2 do Ano VIII (algo em torno


de 1800), diploma normativo da organização da Administração Pública francesa, no
contexto da França Pós-Revolucionária, como marco inicial do Direito Administrativo.
Acrescenta-se, ainda, o importante trabalho da jurisprudência do Conselho de

1
Você vai ouvir falar bem deste rapaz em Direito Constitucional. Sigamos.
2
Megeano(a)! Tem que gravar esse dado. Beleza? Sigamos.
Estado francês, responsável pela construção de importantes institutos
administrativistas, a exemplo da noção de serviço público. Outrossim, em 1819, em
Paris, cria-se a primeira cátedra de Direito Administrativo, sendo que, no Brasil, ela
somente vem a surgir com o Decreto 608/1851. A primeira obra doutrinária brasileira
só veio a ser publicada apenas em 1857, em Recife, com o nome de “Elementos de
Direito Administrativo Brasileiro”, do autor Vicente Pereira do Rego.

Sobre este aspecto, Rafael Rezende (2019) nos apresenta os seguintes


parâmetros a respeito do nascedouro do direito administrativo – ATENÇÃO ao primeiro
parágrafo abordado pelo doutrinador, este dado já apareceu em provas:
A origem do Direito Administrativo remonta ao célebre
julgamento do caso Blanco (arrêt Blanco). Nesse caso, datado de
1873, uma criança de cinco anos, Agnès Blanco, havia sido
atropelada por uma vagonete pertencente à Companhia
Nacional de Manufatura de Fumo. O Tribunal de Conflitos, ao
apreciar uma espécie de conflito negativo de competência
entre o Conselho de Estado e a Corte de Cassação,
responsáveis, respectivamente, pela jurisdição administrativa
e pela jurisdição comum, fixou a competência do Conselho de
Estado para o julgamento da causa, tendo em vista a presença
do serviço público naquele caso e a necessidade de aplicação
de regras publicísticas, diferenciadas daquelas aplicáveis aos 9
particulares.
No campo normativo, a lei do 28 pluviose do ano VIII de 1800 é
apontada como a “certidão de nascimento” do Direito
Administrativo, pois estabeleceu, de forma pioneira, normas de
organização administrativa e de solução de litígios contra a
Administração Pública. Na célebre lição de Prosper Weil, o
Direito Administrativo seria “fruto de milagre”, pois o seu
surgimento decorreu da decisão do próprio Estado de se
autovincular ao Direito. Essa concepção parte da premissa de
ruptura e de descontinuidade com o Antigo Regime, mas, em
verdade, não é isenta de críticas.
• Guarde dois dados, Megeana e Megeano:
1. Caso Agnès Blanco; França; 1873.
2. Lei 28 pluviose do ano VIII; 1800.
Em matéria de história do Direito Administrativo você precisa ter isso na ponta
da língua. Beleza? Olha! Eu vou te perguntar isso no simulado. A prova para
Delegado/Delegada também, caso faça menção à parte histórica, certamente.
Sigamos.
1.3. DISTINÇÃO ENTRE FUNÇÃO ADMINISTRATIVA E FUNÇÃO DE
GOVERNO
Na ótica de divisão dos poderes constitucionalmente apresentada acima, cabe
ao Poder Legislativo a função típica legislativa, ao Poder Judiciário a função típica
jurisdicional, e ao Poder Executivo a função típica administrativa. Cabe lembrar que cada
um dos poderes exerce de forma atípica outras funções quando constitucionalmente
autorizados.
Ocorre que alguns atos não se enquadram nas funções estatais típicas e
atípicas. Por exemplo: quando o Presidente da República firma um tratado
internacional, nomeia Ministro de Estado, declara guerra com Estado estrangeiro, ou
decreta a intervenção federal nos Estados, o faz em razão do interesse e direção do
Estado, e não em razão da gestão concreta do interesse público decorrente do exercício
da função administrativa.
É justamente nesses atos relacionados à soberania da Nação e definição de
decisões políticas mais gerais que se identifica a manifestação da função de governo
(função política), exercida também preponderantemente pelo Poder Executivo, mas não
exclusivamente, segundo Maria Sylvia Zanella Di Pietro.
Para Celso Antônio Bandeira de Mello, “estão em pauta atos de superior gestão
da vida estatal ou de enfrentamento de contingências extremas que pressupõe, acima
de tudo, decisões eminentemente políticas” (2005, p. 35). Esses atos não estão
relacionados à satisfação concreta, prática, e imediata das necessidades coletivas. Não
que a função política esteja dissociada do interesse coletivo, muito pelo contrário, vez
10
que todos os atos decorrentes do exercício dessa função buscam o bem-estar do povo, e
jamais poderão limitar o catálogo de direitos fundamentais. Entretanto, o impacto não
é sentido pelos particulares de forma imediata e direta, como ocorre quando atua no
exercício da função administrativa na gestão concreta das necessidades públicas. Por
exemplo, quando o Estado presta um serviço público de saúde, a população sente
imediatamente os efeitos do exercício da função administrativa; já quando o
Presidente nomeia um Ministro de Estado, decisão política da presidência, os efeitos do
exercício da função não são sentidos pela população no primeiro momento.
Marçal Justen Filho (2015, p. 113), na mesma senda, diferencia por meio de
exemplos a função política da função administrativa:
“A competência do Presidente da República para assinar
tratados internacionais pode ser diferenciada, em termos
qualitativos, da atividade estatal de fornecimento de energia
elétrica. Numa hipótese, há a manifestação da existência do
Brasil no cenário internacional; no outro caso, existe
atendimento a necessidades essenciais”.
É neste panorama que é possível definir a função política, ou de governo,
como aquela que diz respeito à alta gestão da vida estatal, vinculadas a atos de
soberania da Nação e de definição de decisões políticas que decorrem diretamente da
Constituição.
1.4. CRITÉRIOS PARA DEFINIÇÃO DO DIREITO ADMINISTRATIVO
Na busca de tentar conceituar o Direito Administrativo e delimitar seu objeto,
diversos critérios surgiram ao longo da história, destacando-se:

1. Corrente legalista ou ESCOLA EXEGÉTICA = de forma


reducionista, entende que o Direito Administrativo se resume ao
conjunto da legislação administrava existente no país,
desconsiderando as contribuições da doutrina e jurisprudência.
2. Critério do PODER EXECUTIVO = identifica o Direito
Administrativo como complexo de leis disciplinadoras da
atuação do Poder Executivo, olvidando de que o Legislativo e o
Judiciário também desempenham, atipicamente, atividades
administravas, sem falar nos particulares que atuam por
delegação estatal ou em parceria com o Poder Público.
3. Critério das RELAÇÕES JURÍDICAS = disciplinaria as relações
jurídicas entre a Administração Pública e o particular, omitindo-
se quanto às outras ações administravas não interpessoais e à
existência dessas mesmas relações em outros ramos do Direito
(Tributário, p.ex.).
4. Critério do SERVIÇO PÚBLICO ou ESCOLA DO SERVIÇO PÚBLICO
= limita o Direito Administrativo à disciplina jurídica dos serviços 11
públicos, sendo insuficiente, contudo, à evidência de diversas
outras atividades da Administração Pública.
5. Critério TELEOLÓGICO ou FINALÍSTICO = o Direito Administrativo
se ocuparia da regulação das atividades do Estado para o
cumprimento dos seus fins;
6. Critério NEGATIVISTA: residual, caberia ao Direito
Administrativo normatizar todas as questões não contempladas
por outro ramo jurídico, vale dizer, todas as funções de Estado
que não fossem legislavas ou jurisdicionais.
7. Critério FUNCIONAL ou da Administração Pública = adotado pela
DOUTRINA MAJORITÁRIA BRASILEIRA, define a função
administrava como verdadeiro objeto do Direito Administrativo,
exercida por quaisquer Poderes Estatais ou mesmo por
particulares. CUIDA MEGEANA(O)! É aqui que, provavelmente,
reside a questão da prova.

Nas palavras de Maria Sylvia (2019):


A nossa definição também adota o critério da Administração
Pública. Partindo para um conceito descritivo, que abrange a
Administração Pública em sentido objetivo e subjetivo,
definimos o Direito Administrativo como o ramo do direito
público que tem por objeto os órgãos, agentes e pessoas
jurídicas administrativas que integram a Administração
Pública, a atividade jurídica não contenciosa que exerce e os
bens e meios de que se utiliza para a consecução de seus fins,
de natureza pública. Ao falar em “ramo do direito público”,
realça-se que o Direito Administrativo é composto por um corpo
de regras e princípios que disciplinam as relações entre a
Administração e os particulares, caracterizadas por uma posição
de verticalidade e regidas pelo princípio da justiça distributiva,
no que difere do direito privado, que regula relações entre
iguais, em posição de horizontalidade, regidas pelo princípio da
justiça comutativa. Com a expressão “órgãos, agentes e pessoas
jurídicas administrativas”, a referência é à Administração em
seu sentido subjetivo. São pessoas “administrativas”, porque se
excluem do conceito as pessoas jurídicas políticas (União,
Estados, Distrito Federal e Municípios), que constituem objeto
de estudo do direito constitucional.
A partir desse critério funcional ou da Administração Pública, pode-se dizer que
o Direito Administrativo tem por objeto:

Atividades de
Relações internas à Relações entre a Administração Pública 12
Administração Pública Administração e os em sentido material
(entre os órgãos e administrados exercidas por
entidades (reguladas particulares sob
administravas e entre predominantemente regime predominante
a administração e seus pelo direito público ou de direito público (a
agentes). pelo direito privado). exemplo da prestação
de serviços públicos
mediante contratos de
concessão).

Maria Sylvia Zanella Di Pietro (2019) afirma que o Direito Administrativo


[...] tem por objeto os órgãos, agentes e pessoas jurídicas
administravas que integram a Administração Pública, a atividade
não contenciosa que exerce e os bens de que se utiliza para a
consecução de seus fins, de natureza pública.
Dessa forma, definido o objeto do Direito Administrativo, podemos conceitua-
lo como ramo do Direito Público que disciplina a função administrava (serviços públicos,
poder de polícia, regulação e fomento estatais e controle administrativo) e a organização
e funcionamento dos agentes, órgãos e pessoas jurídicas administrativos que a
desempenham.
1.5. SENTIDO OBJETIVO E SUBJETIVO DE ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA

De início, já aponto que este conceito é bastante cobrado em provas para


concurso público – sobretudo para cargo de Delegado.
CESPE – DELEGADO PERNAMBUCO (2016), DELEGADO GOIÁS (2017),
DELEGADO MARANHÃO (2018), são exemplos de certames que já exigiram apenas este
conhecimento, que embora pareça simples, quando confundido entre si, pode render
uma questão.
→ SE LIGA! TEM QUE MEMORIZAR!

Sentido Formal = ORGÂNICO / SUBJETIVO

Sentido Material = FUNCIONAL / OBJETIVO

• Eu memorizei assim: FOR.SU.OR + OB.MA.FU

Tal classificação, proposta por Maria Sylvia Zanella Di Pietro, apresenta a


determinada concepção:

1. Administração Púbica em sentido subjetivo, orgânico ou formal é o


conjunto de agentes, órgãos e entidades públicas que exercem a função
administrativa.
13
2. Administração Pública em sentido objetivo, material ou funcional, mais
adequadamente denominada “administração pública” (com iniciais
minúsculas), é a atividade estatal consistente em defender
concretamente o interesse público.

No que diz respeito ao aspecto material da administração pública, isto é,


utilizada a expressão para designar uma atividade estatal, pode-se distinguir a
administração pública lato senso, compreendendo tanto a função administrativa
quanto a função política (ou de governo). Já a administração pública stricto senso
abrange exclusivamente o desempenho da função administrativa. (Mazza, 2017, p. 59).

Ainda nas palavras do Administrativista, atualmente há o destaque de três


tarefas precípuas da Administração Pública Moderna, que foram inseridas
historicamente na ordem apresentada durante os séculos XIX e XX. Quais sejam:

1. Exercício do Poder de Polícia = Foi a primeira missão


fundamental conferida à Administração Pública, ainda durante o
século XIX, período chamado “Estado-Polícia” ou “Estado-
Gerdame”. O poder de polícia consiste na limitação e no
condicionamento, pelo Estado, da liberdade e propriedade
privadas em favor do interesse público.
2. Prestação de serviços públicos = Na primeira metade do século
XX, especialmente após a primeira guerra mundial (1914-1918),
as denominadas Constituições Sociais (Mexicana de 1917, e
Alemã de 1919) – ABRE O OLHO, QUE ISSO CAI EM DIREITO
CONSTITUCIONAL – passaram a atribuir ao Estado as funções
positivas (o poder de polícia é função negativa, limitadora) de
prestação de serviços públicos, como o oferecimento de
transporte coletivo, dentre outros.
3. Fomento = Já na segunda metade do século XX, a Administração
Pública passou também a incentivar setores sociais específicos,
estimulando o desenvolvimento da ordem social e econômica.

1.6. CONCEITO DE DIREITO ADMINISTRATIVO

A partir de uma análise breve do ordenamento jurídico nacional podemos


chegar a variados conceitos a respeito da disciplina, todos convergentes quanto ao
interesse da coletividade como tarefa precípua da Administração Pública, guardando,
sempre, uma originalidade própria cada autor – vamos nos valer aqui Megeana(o) de
dois conceitos que são bastantes para nosso prosseguimento na disciplina!
1. Marçal Justen Filho “O Direito Administrativo é o conjunto
das normas jurídicas de direito público que disciplinam as
atividades administrativas necessárias à realização dos
direitos fundamentais e a organização e o funcionamento das
estruturas estatais e não estatais encarregadas de seu
desempenho”.
2. Maria Sylvia Zanella Di Pietro “O ramo do direito público que
14
tem por objeto os órgãos, agentes e pessoas jurídicas
administrativas que integram a administração pública, a
atividade jurídica não contenciosa que exerce e os bens de que
se utiliza para a consecução de seus fins de natureza”.

1.7. SISTEMAS DE CONTROLE: INGLÊS, FRANCÊS. QUAL O ADOTADO NO


BRASIL?
Os sistemas de jurisdição adotados no mundo ocidental dividem-se, grosso
modo, em: sistema inglês ou DE JURISDIÇÃO ÚNICA; e sistema francês ou do
CONTENCIOSO ADMINISTRATIVO.
A distinção entre esses sistemas de jurisdição é de fundamental importância
para a delimitação do controle da atuação administrava.
Vejamos:
No SISTEMA INGLÊS, também chamado de sistema judiciário ou de jurisdição
única/uma, o exercício da jurisdição é reservado ao Poder Judiciário, a quem cabe, com
exclusividade, aplicar o direito ao caso concreto com definitividade, com aptidão de
formação de coisa julgada material. Nesse sistema, a Administração Pública, conquanto
possua poder para controlar seus próprios atos (autotutela 3), não o faz de forma
definitiva, sempre cabendo ao Poder Judiciário examinar a legalidade e legitimidade dos
atos e processos administrativos. A decisão administrava, portanto, jamais formará a
chamada coisa julgada material, sendo amplo o acesso ao Poder Judiciário, a quem cabe
dar a última palavra.
Em José dos Santos Carvalho Filho (2019) encontramos:
Diverso delineamento tem o sistema da unidade de jurisdição,
também conhecido como sistema do monopólio de jurisdição ou
sistema inglês. Por essa modalidade de sistema, todos os litígios,
administrativos ou de caráter privado, são sujeitos à apreciação
e à decisão da Justiça comum, vale dizer, a que é composta de
juízes e tribunais do Poder Judiciário. Adotam o sistema da
unidade de jurisdição os Estados Unidos, o México e alguns
outros países, entre eles o Brasil. No sistema da unidade de
jurisdição – una lex una jurisdictio –, apenas os órgãos do
Judiciário exercem a função jurisdicional e proferem decisões
com o caráter da definitividade. Mesmo as raríssimas exceções
contempladas na Constituição, conferindo essa função ao
Congresso Nacional, não servem para desfigurar o monopólio da
jurisdição pelo Judiciário. O fundamento da adoção do sistema
da unidade de jurisdição pelo Brasil está sufragado pelos termos
do art. 5º, XXXV, da vigente Constituição: “A lei não excluirá da
15
apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito”. O
preceito é claro: nenhuma decisão de qualquer outro Poder que
ofenda direito, ou ameace ofendê-lo, pode ser excluída do
reexame, com foros de definitividade, por órgãos jurisdicionais.
A Administração Pública em nenhum momento exerce função
jurisdicional, de forma que seus atos sempre poderão ser
reapreciados no Judiciário. [...] O sistema da unidade apresenta
maior vantagem no que se refere à imparcialidade dos
julgamentos, porque o Estado-Administração e o administrado
se colocam, a todo o tempo, em plano jurídico de igualdade
quando seus conflitos de interesse são deduzidos nas ações
judiciais.
Pertinente destacar que, diante da garantia do amplo acesso ao Judiciário, não
se pode exigir, em regra, o esgotamento da via administrava para que aquele Poder
analise e controle a atuação administrava.
Ressalvam-se, contudo:
1. Ações relavas à disciplina e às competições desportivas (art.
217, § 1º, CF/88).

3
Esse princípio será tratado posteriormente, quando analisarmos o regime jurídico administrativo. Mas
se tiver curiosidade, leia a Súmula 473 e 346 do STF para entender do que se trata.
2. Ato ou omissão administrava que contrarie súmula
vinculante, para sua submissão ao STF por meio da
reclamação (art. 7º, § 1º, da Lei Federal nº 11.417/2006).
3. Habeas data, que, conforme entendimento do Supremo,
pressupõe o indeferimento ou a omissão administrava em
atender pedido de informações pessoais.
4. Ações judiciais contra o INSS para a concessão de benefícios
previdenciários.
Essas ressalvas precisam ir para o post it, beleza Megeano e Megeana? Isso será
mais passível de cobrança na fase objetiva e oral do concurso.
Sigamos.
Sem avançar no estudo do controle administrativo, registre-se que o Judiciário
jamais poderá examinar o mérito dos atos administrativos, cuja análise, em respeito ao
princípio fundamental da separação dos poderes (art. 2º, CF/88), é exclusiva da
Administração Pública responsável por sua edição.
Finalmente, importa explicar a noção de “coisa julgada administrava”, que se
traduz na definitividade de determinada matéria controvertida submetida ao exame da
Administração no âmbito administrativo, sem prejuízo, é claro, de sua revisibilidade pelo
Poder Judiciário.
A coisa julgada administrava vai ao encontro do princípio da SEGURANÇA 16
JURÍDICA 4 substancial e da estabilidade das relações jurídicas, impedindo que a
Administração rediscuta litígios por ela já solucionados segundo as normas de processo
administrativo, quebrando a boa-fé e a legítima expectava dos cidadãos.
A seu turno, o SISTEMA FRANCÊS ou de dualidade de jurisdição confere
jurisdição também à Administração Pública, atribuindo-lhe, com exclusividade (e
definitividade) competência para decidir sobre matérias administravas, tornando-as
infensas ao controle pelo Poder Judiciário.
Na França, a jurisdição administrava é encabeçada pelo Conselho de Estado,
órgão integrante da Administração Pública e que analisa com exclusividade matérias
relacionadas à função administrativa, retirando-a do âmbito de conhecimento da
chamada “jurisdição comum”, a quem cabe decidir sobre os demais litígios.
Neste sistema dual, não é possível o controle judicial dos atos administrativos.
Ademais, existe coisa julgada material propriamente dita no âmbito da Administração
Pública, a partir daquilo que é decidido pelo Conselho de Estado.
No Brasil, com a EC nº 7/77, chegou-se a prever o contencioso administrativo,
o qual, entretanto, jamais foi implantado.
A pergunta da prova é a seguinte:
No Brasil existe contencioso administrativo?

4
Calma: VAMOS ANALISAR ESTE PRINCÍPIO de forma mais detida, adiante.
Resposta: NÃO.
No Brasil já houve previsão do sistema contencioso administrativo?
Resposta: SIM
Sempre tenha atenção no comando da questão. O examinador pode tentar nos
passar a perna aqui – nós vamos captar a pegadinha, beleza?
• ACLARANDO COM DOUTRINA
Vejamos o posicionamento de José dos Santos Carvalho Filho (2019) sobre este tópico:
A expressão contencioso administrativo tem dois sentidos. Um
deles é a denominação dada ao sistema da dualidade de
jurisdição. O outro significa qualquer tipo de conflito que tramite
na via administrativa. Ou seja, mesmo nos países que não
adotam o sistema em foco, existe o contencioso administrativo
neste último sentido, porque em todos os lugares é permitido
que o indivíduo reclame da Administração junto a seus próprios
órgãos. Os recursos de reclamação e de representação, por
exemplo, formam um contencioso administrativo, porque
tramita na via administrativa. O sistema do contencioso
administrativo, também denominado de sistema da dualidade
de jurisdição ou sistema francês, se caracteriza pelo fato de que,
ao lado da Justiça do Poder Judiciário, o ordenamento
17
contempla uma Justiça Administrativa. Esse sistema, adotado
pela França e pela Itália, entre outros países sobretudo
europeus, apresenta juízes e tribunais pertencentes a Poderes
diversos do Estado. Em ambas as Justiças, as decisões proferidas
ganham o revestimento da res iudicata, de modo que a causa
decidida numa delas não mais pode ser reapreciada pela outra.
É desse aspecto que advém a denominação de sistema de
dualidade de jurisdição: a jurisdição é dual na medida em que a
função jurisdicional é exercida naturalmente por duas estruturas
orgânicas independentes – a Justiça Judiciária e a Justiça
Administrativa.

CUIDADO EXTRA, MEGEANO(A)!


A questão pode afirmar que já foi previsto, e isso estará correto, o sistema do contencioso
administrativo em nosso ordenamento jurídico. Neste caso, vamos nos lembrar desta
Emenda Constitucional, mas sempre tendo em mente a ideia posta e sufragada pela
doutrina majoritária sob nossa lógica constitucional de recepção do sistema uno/inglês.

Alfim, essa é a aposta do Professor pra 1ª fase do concurso que você vai fazer.
Tranquilo?
Vamos a um quadro legal de manual para analisar melhor ainda:

Sistema da Estrutura Jurisdicional Francesa. Por Alexandre Mazza (2017).

Poder Judiciário: Julga CAUSAS


Tribunal de Conflitos: localizado COMUNS.
acima das duas justiças, decide
conflitos de competência entre o
Judiciário e o contensioso Conselho de Estado: Órgão
administrativo. máximo do CONTENCIOSO
ADMINISTRATIVO); que julga
causas de interesse da
Administração Pública.

1.8. RESUMO HISTÓRICO DO DIREITO ADMINISTRATIVO – POR MARIA


SYLVIA (2019)

1. Nascimento do direito administrativo: teve início com o 18


Estado de Direito, estruturado sobre os princípios da legalidade
e da separação de poderes.
2. Direito administrativo do sistema de base romanística:
influência do direito francês, italiano e alemão, com alguma
influência do sistema da common law.
3. Fundamentos filosóficos: ideais da Revolução Francesa, que
deram origem aos princípios da legalidade, da separação de
poderes, da isonomia e do controle judicial. Mais recentemente:
influência da constitucionalização que atingiu os vários ramos
do direito, com a valorização dos direitos fundamentais
(centralidade da pessoa humana) e dos princípios
constitucionais.
4. Contribuição do direito francês, direito pretoriano, elaborado
pelo Conselho de Estado Francês, órgão de cúpula da jurisdição
administrativa: conceito de ato administrativo, noção de serviço
público com o atributo da autoexecutoriedade, teoria dos
contratos administrativos, teorias sobre responsabilidade civil
do Estado, ideia de um regime jurídico constituído por
prerrogativas e restrições.
5. Contribuição do direito italiano: conceito de mérito do ato
administrativo, de interesse público primário e secundário, de
autarquia, de entidade paraestatal.
6 . Contribuição do direito alemão, de formação mais teórica:
influência maior do direito civil, valorização dos direitos
fundamentais, teoria dos conceitos jurídicos indeterminados,
princípio da dignidade da pessoa humana, princípio da
proporcionalidade 5, princípio da razoabilidade, princípio da
proteção da confiança, princípio da reserva do possível.
7. Contribuição do direito anglo-americano (sistema da
common law), baseado no princípio do stare decisis (força
obrigatória do precedente judicial), que tem como fonte
primordial do direito a jurisprudência: sistema de unidade de
jurisdição, o mandado de segurança e o mandado de injunção, o
princípio do devido processo legal, inclusive em sua feição
substantiva, a agencificação, a ideia de regulação, o modelo
contratual das parcerias público-privadas.
8. Contribuição da doutrina social da igreja: princípio da função
social da propriedade e princípio da subsidiariedade.
9. Transformações do direito administrativo: constitucionalização,
redução da discricionariedade, democratização da
Administração Pública, processualização, agencificação, função
regulatória, ampliação da consensualidade, centralidade da
pessoa humana, fuga para o direito privado. 19
10. Fontes do direito administrativo: a Constituição, a lei, os
atos normativos da Administração Pública (regulamentos,
portarias, resoluções etc.), a jurisprudência, a doutrina, o
costume, os princípios gerais de direito.
11. Conceito de direito administrativo: embora baseado em
vários critérios, o mais relevante é o que leva em conta o
principal objeto da disciplina: a Administração Pública. Direito
administrativo é o ramo do direito público que tem por objeto
os órgãos, agentes e pessoas jurídicas administrativas que
integram a Administração Pública, a atividade jurídica não
contenciosa que exerce e os bens e meios de que se utiliza para
a consecução de seus fins, de natureza pública.
Agora volte e releia mais uma vez esses onze pontos elencados por Maria Sylvia.
No momento certo eu vou cobrar isso de você forte, beleza?
Sigamos.

5
Concurso para Delegado do Pará 2016 perguntou para o candidato qual a origem do princípio da
proporcionalidade.
1.9. FONTES DO DIREITO ADMINISTRATIVO
É tradicional na introdução do estudo de qualquer ramo didático da disciplina
jurídica o estudo das fontes, grosso modo entendidas como de onde advém o direito.

No direito administrativo não é diferente, ainda mais diante da complexidade


do operador que se depara com a ausência de codificação.

AUSÊNCIA DE CODIFICAÇÃO?

VAMOS EXPLICAR ISSO MELHOR

Há uma parte da doutrina (e conseguimos vislumbrar este


debate ainda na Universidade) que sustenta que o direito
administrativo não é codificado, citando, por exemplo, o Brasil
como referência característica desse movimento. Para estes
pensadores, é difícil lidar com um ramo autônomo do direito,
por possuir bases e raízes próprias, sem um código específico,
como o civil, penal, tributário, e etc. Sempre que se apresenta
essa característica do direito administrativo há a referência
específica a países que possuem uma codificação, mas sempre
sem fazer uma referência perfeita sob a condição organizacional
dessas nações e como funciona a práxis nessas ordens
constitucionais.
20
Ao entender melhor o direito administrativo, e esta é a pergunta
que devemos nos fazer, surge a indagação: Quem disse que no
Brasil não há codificação do direito administrativo? Dessa forma,
o que não há no país é uma reunião de todas as legislações em
prol de um único código. De toda sorte, é possível olhar para
nosso ordenamento jurídico e vislumbrar uma perfeita
codificação – extensa e complexa – que define variadas matérias
relacionadas à organização e interesse público. Há quem
defenda a reunião de todas as normas gerais em um modelo
único que fixe objetivos, princípios e regras gerais do direito
público – louvável. Contudo, ao lermos manuais e doutrinas que
tocam esse assunto, nunca podemos cair no erro de confundir
codificação unitária com o sistema de codificação de normas
administrativas que temos no Brasil.

Esta é uma explanação do Professor no sentido de irmos abrindo


a mente para raciocinar variantes do direito administrativo, que,
no momento oportuno – PROVA ORAL, por exemplo – pode ser
questionado a nós. Precisamos estar ávidos a debater e
enfrentar estes pontos se um dia nos forem apresentados.

Sigamos.
Ao identificar as fontes do direito administrativo, identifica-se também o bloco
de legalidade que submete a atividade do Estado, servindo de verdadeiro guia de ação
para o Administrador Público, na medida que possibilita verificar o que é permitido e
proibido, como também serve de instrumento de controle da Administração Pública
pelos administrados.

Sobre o tema, Thiago Marrara (2014), partindo das concepções de Fritz


Ossenbühl, assevera que o vocábulo “fontes” pode ter diversas significações:

1. Fontes de construção do direito = Entendidas como aquelas


que determinam o pensamento e o comportamento humano,
incluindo-se tanto fatores religiosos quanto morais.
2. Fontes de valoração do direito = Entendidas como os
princípios e valores da sociedade que servem de critério para
o ordenamento jurídico, como justiça, igualdade, dentre
outros.
3. Fontes de reconhecimento do direito = Entendidas como
fontes em sentido estrito, também conhecidas como veículos
introdutores de normas. São os atos ou fatos aos quais o
ordenamento atribui a aptidão de produzir normas jurídicas.

Ainda com fundamento em Marrara (2014), é possível classificar as fontes


conforme diversos critérios distintos:
21
QUANTO AO PROCEDIMENTO DE SUA EXPEDIÇÃO
•Fontes legislativas, fontes jurisprudenciais, fontes administrativas.

QUANTO À SUA FORMA DE MANIFESTAÇÃO NA REALIDADE


•Fontes escritas (lei) e não escritas (costume).

QUANTO AO SEU USO NO CASO CONCRETO


•Fontes de aplicação obrigatória (Constituição) e fontes de uso opcional
(jurisprudência administrativa no Brasil).

QUANTO AO PODER QUE EMANA DOS MANDAMENTOS QUE CONTÊM


•Fontes de normas vinculantes e fontes de normas indicativas.

QUANTO À SUA HIERARQUIA


•Fontes primárias (Constituição), secundárias (Resoluções) e subsidiárias.

Importa-nos, por enquanto, compreender as FONTES DE RECONHECIMENTO


do direito, isto é, os veículos introdutores de norma jurídica de Direito Administrativo,
valendo-nos, para tanto, de classificação didática que cuida das fontes conforme o
procedimento de expedição.
1.10. FONTES LEGISLATIVAS EM SENTIDO AMPLO
Nos termos da cabeça do artigo 1º da Constituição da República, o Estado
brasileiro se caracteriza por ser democrático e de Direito, motivo pelo qual a lei assume
papel relevante enquanto instrumento que limita a ação estatal e a direciona o
Administrador rumo à concretização dos interesses públicos.

Não sem razão, o direito administrativo tem como FONTE PRINCIPAL A LEI EM
SENTIDO LATO, compreendendo tanto a Constituição da República, quanto as
Constituições dos Estados, a Lei Orgânica do Distrito Federal, as Leis Orgânicas do
Município, as Leis Complementares, as Leis Ordinárias, as Leis Delegadas, e as próprias
Medidas Provisórias. Em relação a esta última, é importante destacar que não se trata
de lei propriamente dita, sendo ato normativo com força de lei que emana do Presidente
da República em caso de relevância e urgência, podendo ser utilizada em matéria
administrativa (artigo 62, CR/88).

IMPORTANTE, DELTA!
Verifica-se que a lei em sentido lato em todas as suas manifestações cria
obrigações originárias aos Administrados, inovando na ordem jurídica, pelo que
também podem ser compreendidas como fonte primária de direito administrativo.
22
Destaca-se que no Brasil não há uma codificação una do Direito Administrativo,
o que aumenta ainda mais a importância e multiplicação das fontes legisladas,
principalmente em sentido estrito. Existem, nessa linha, somente alguns códigos
esparsos que cuidam de temas específicos, como o Código das Águas, Código de
Mineração, Código de Caça, dentre outros.

1.11. FONTES ADMINISTRATIVAS


São os atos normativos expedidos por autoridade pública no exercício da função
administrativa que podem ser gerais e abstratos ou concretos e individuais,
incorporando o BLOCO DE LEGALIDADE que deve se pautar o Administrador.
Justamente por essa razão, por vezes as fontes administrativas, enquanto atos
infralegais, podem ser tratadas dentro da concepção de lei em sentido amplo.

Convém apresentar dois exemplos importantes de fontes administrativas, os


regulamentos executivos e os regulamentos autônomos – ESSA DIFERENÇA TEM QUE
MANJAR BEM DELTA! Importante para Constitucional também:
1. Decretos regulamentares executivos (regulamento
executivo) = São aqueles que dão fiel execução à lei,
detalhando lei ordinária ou complementar. É ato normativo
emanado do Chefe do Executivo, havendo a possibilidade de
outros entes da Administração também utilizarem decretos
regulamentares, como as agências reguladoras.
2. Decretos regulamentares autônomos (regulamento
autônomo) = Editado pelo Presidente da República para
matérias que não dependem de lei, inovando a ordem
jurídica, decorrendo diretamente da Constituição Federal,
sendo o seu vício torna o ato inconstitucional e não ilegal.
Geralmente vinculadas a questões simples de organização
administrativa. Pela Emenda Constitucional nº 32/2001, pode
ser utilizado para dispor sobre funcionamento e organização
da Administração Pública federal quando:
a) não implicar aumento de despesa; b) nem criar ou
extinguir órgãos públicos.

1.12. FONTES JURISPRUDENCIAIS


A jurisprudência pode ser compreendida como o julgamento reiterado pelos
Tribunais que, diante da multiplicação de demandas idênticas ou semelhantes, firma 23
orientação a respeito de determinadas questões. No direito administrativo brasileiro,
trata-se de importante fonte secundária que influencia a consolidação do direito.

Ganhou ainda mais destaque após a Emenda Constitucional nº 45/2004, o


direito brasileiro passou a prever a figura das SÚMULAS VINCULANTES que trazem
manifestações sobre validade, interpretação e eficácia de determinadas normas,
vinculando todo o Poder Judiciário e a Administração Pública.

Também há no ordenamento as decisões vinculantes proferidas pelo STF


em Ação Direta de Inconstitucionalidade e Ação Declaratória de
Constitucionalidade que impactam diretamente o direito administrativo ao
produzirem efeitos gerais (erga omnes) e abstratos.

Dentro do impacto das decisões dos Tribunais no direito administrativo,


destaca-se também figura do Mandado de Injunção, que pode ser manejado sempre
que “a falta de norma regulamentadora torne inviável o exercício dos direitos e
liberdades constitucionais e das prerrogativas inerentes à nacionalidade, à soberania
e à cidadania” (art. 5º, inciso LXXI CF/88).
Como exemplo, tem-se a decisão do Supremo Tribunal Federal
no MANDADO DE INJUNÇÃO Nº 708 6 em aplicar as normas
referentes à Lei de Greve ao servidor público até a edição de lei
específica pelo Congresso Nacional que desse concretude ao
disposto no artigo 37, inciso VII da Constituição.

TRECHOS DO JULGADOS: A permanência da situação de não-


regulamentação do direito de greve dos servidores públicos civis
contribui para a ampliação da regularidade das instituições de
um Estado democrático de Direito (CF, art. 1º). Além de o tema
envolver uma série de questões estratégicas e orçamentárias
diretamente relacionadas aos serviços públicos, a ausência de
parâmetros jurídicos de controle dos abusos cometidos na
deflagração desse tipo específico de movimento grevista tem
favorecido que o legítimo exercício de direitos constitucionais
seja afastado por uma verdadeira “lei da selva”. Apesar das
modificações implementadas pela Emenda Constitucional no
19/1998 quanto à modificação da reserva legal de lei
complementar para a de lei ordinária específica (CF, art. 37, VII),
observa-se que o direito de greve dos servidores públicos civis
continua sem receber tratamento legislativo minimamente
satisfatório para garantir o exercício dessa prerrogativa em
consonância com imperativos constitucionais. Tendo em vista as 24
imperiosas balizas jurídico-políticas que demandam a
CONCRETIZAÇÃO 7 do direito de greve a todos os trabalhadores,
o STF não pode se abster de reconhecer que, assim como o
controle judicial deve incidir sobre a atividade do legislador, é
possível que a Corte Constitucional atue também nos casos de
inatividade ou omissão do Legislativo. A mora legislativa em
questão já foi, por diversas vezes, declarada na ordem
constitucional brasileira. Por esse motivo, a permanência dessa
situação de ausência de regulamentação do direito de greve dos
servidores públicos civis passa a invocar, para si, os riscos de
consolidação de uma típica omissão judicial” (MI 708,
Relator(a): Min. GILMAR MENDES, Tribunal Pleno, julgado em
25/10/2007).

Neste caso, observa-se que a inoperância de lei específica em matéria


administrativa exigiu que a Suprema Corte fizesse as vezes do legislador, além da típica

6
Vai e vem, o entendimento sobre este MANDADO DE INJUNÇÃO aparece em provas. Seja para discutir
análise constitucional do posicionamento sobre os efeitos da decisão para o Supremo Tribunal Federal,
seja para deflagração de análise histórica e legal que culmina com o surgimento da Lei nº 13.300/16 –
LEITURA OBRIGATÓRIA em seu cronograma de estudos = “VAI CAIR EM DIREITO CONSTITUCIONAL”.
Concurso Delegado de Polícia de Minas Gerais exigiu o conhecimento.
7
Olha aqui a mudança de paradigma para a corrente CONCRETISTA quanto aos efeitos da decisão em
Mandando de Injunção – CUIDA NISSO MEGEANO(A)!!!
natureza de fonte secundária. Por vezes, a atuação atípica dos Tribunais torna as
decisões abstratas verdadeiras fontes de integração do ordenamento.

Há indicação de leitura extra ao final.

1.13. COSTUME ADMINISTRATIVO

O costume pode ser compreendido como a prática reiterada no tempo que,


em razão de ser reconhecidamente necessária pela coletividade, é dotada de poder
normativo.

Muito embora tenha relevância em outras disciplinas jurídicas, como no direito


internacional público em que figura como fonte válida, no direito administrativo
somente terá relevância se incorporado ao ordenamento mediante regular processo
legislativo, servindo tão somente de fonte indireta. Resta saber se o mesmo tratamento
é conferido ao costume administrativo, isto é, se a prática reiterada de agentes públicos
em determinada instituição ou do Estado em relação aos particulares, podem ser
considerados fonte de direito administrativo.

Nesse sentido, Hely Lopes Meireles, (2008) considera o costume administrativo


como FONTE SUPLETIVA utilizada em situação de lacuna no ordenamento. No entanto,
pela Constituição da República, o Brasil é Estado Democrático de Direito que submete a
atuação do Administrador Público à vontade do povo, expressa na lei. Estranho,
portanto, admitir que o costume administrativo, fonte não-escrita e não inserida nem
25
mesmo no conceito de lei em sentido amplo, possa criar norma que obrigue a ação
estatal.

Thiago Marrara (2014) destaca:

Ao se aceitar, de modo integral, a prática reiterada pelo Estado


ou dentro do Estado como fonte de direito administrativo, estar-
se-á dizendo que essa prática pode criar normas que guiarão a
ação estatal a despeito de sua legitimação democrática direta
por uma lei superior. Essa conclusão não é possível, porém, em
virtude do Estado Democrático de Direito, o qual impõe a
aprovação da conduta do Estado pelo Legislativo em nome do
povo (democracia) e, por via, a vinculação constante da atuação
do Estado a essa vontade (legalidade). Disso se conclui que a
prática reiterada no âmbito da Administração Pública, mesmo
que respaldada na opinio juris, jamais seria fonte de normas
vinculantes e que ultrapassem ou contrariem as fontes
legislativas que regem a ação do Estado. O argumento “nós
sempre fizemos assim” jamais pode ser lançado pelo Estado para
contrariar a lei ou mesmo ultrapassá-la. Isso vale tanto para os
atos interna corporis da Administração Pública, quanto para os
atos administrativos – praticados em relação a outros sujeitos de
direito, especialmente os cidadãos.
Do excerto se extrai que o costume administrativo somente será
admissível quando estiver de acordo com a lei, servindo-se nesse caso como fonte
de orientação/indicação ao Administrador, sem gerar direito novo.

1.14. DOUTRINA
Também fonte informal, indireta ou mediata, a doutrina consiste no arcabouço
teórico elaborado pelos estudiosos do Direito Administrativo, que, conquanto não
possua aptidão para criar normas jurídicas administrativas, serve de norte para a
elaboração de leis e para a formação de entendimento dos órgãos judiciários e
administrativos sobre os diversos institutos.
É destaque – ainda sobre fontes – para Matheus Carvalho (2019):

PRINCÍPIOS GERAIS DO DIREITO TRATADOS INTERNACIONAIS


São normas não escritas que servem de São fontes do Direito Administrativo
base para ele, configurando vetores pátrio, após incorporação ao
genéricos que informam o ordenamento ordenamento jurídico,
do Estado, sem previsão legal expressa. independentemente do rito de
São apontados, como exemplos, a tramitação.
máxima que define que ninguém deve De fato, os tratados internacionais que 26
ser punido sem ser ouvido previamente, versem sobre direito administrativo não
a de que não se pode permitir que devem, necessariamente, passar pelo rito
alguém se beneficie da sua própria referente à incorporação dos tratados
torpeza. internacionais que versem sobre direitos
humanos, visto que o rito deste último é
especial para a incorporação com status
de Emenda Constitucional. Rito do art. 5º,
§3º da CF/88.

1.15. ADMINISTRAÇÃO BUROCRÁTICA, ADMINISTRAÇÃO GERENCIAL E


ESTADO EM REDE
Conhece esses termos, Megeano(a)?
Vamos debater um pouco eles, porquanto é possível que contribua muito para
seu certame, seja diretamente em questões, seja indiretamente pela compreensão de
nossa REFORMA ADMINISTRATIVA pós EC 19/98.
Sigamos!
A diferença entre o modelo de administração burocrática e o modelo de
administração gerencial, nas palavras de Mazza (2017), não é tema do Direito
Administrativo, propriamente dito, mas da Ciência da Administração.
São características do modelo burocrático de administração:
1. Toda a autoridade baseada na legalidade;
2. Relações hierarquizadas de subordinação entre órgãos e
agentes;
3. Competência técnica como critério para seleção de pessoal;
4. Remuneração baseada na função desempenhada, e não
pelas realizações alcançadas;
5. Controle de fins;
6. Ênfase em processos e ritos.
Com o surgimento da Reforma Administrativa – acima elencada – patrocinada
pela Emenda Constitucional nº 19/98 e fortemente inspirada em uma concepção
neoliberalista de política econômica, pretendeu-se implementar outro modelo de
administração pública: GERENCIAL 8.
Chamada também de governança consensual, ela objetivou atribuir maior
agilidade e eficiência (OLHA O GANCHO AQUI – ESSE PRINCÍPIO EXPLÍCITO DA
ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA SURGE COM EC 19/98 – JÁ CAIU) na atuação administrativa,
enfatizando a obtenção de resultados em determinados processos e ritos, e estimulando
a participação popular na gestão pública.
O que reflete esse novo modelo e que pode ser apontado como surgimento
em seu auge:
1. Princípio da eficiência;
2. Contrato de gestão (calma!!! Vamos entender isso melhor lá
27
na frente);
3. Agências executivas (calma aqui também!!!);
4. Instrumentos de parceria da administração pública;
5. Redução de custos com pessoal;
6. Descentralização administrativa.
A ótica da administração GERENCIAL é pautada no princípio da subsidiariedade,
pelo qual não se deve atribuir ao Estado as funções e atividades que podem ser
realizadas pela iniciativa privada.
Vamos a um quadrinho trazido por Mazza (2017) que nos ajudará bastante?
(Com adaptações)
BUROCRÁTICA GERENCIAL
PERÍODO Antes de 1988 Pós 1988
NORMA PADRÃO Lei nº 8.666/93 EC nº 19/88
PARADIGMA Lei Resultado

8
APENAS PARA APROFUNDAR UM POUCO NESTE TEMA, DELTA!!! Alexandre Mazza (2017) apresenta
que a Reforma foi promulgada pelo governo FHC, na onda do processo de privatizações, promovendo
mudanças no Direito Administrativo pátrio pautadas, sobretudo, pela lógica empresarial de eficiência
neoliberal de Estado mínimo. A baixa qualidade técnica das reformas propostas e a antipática insistência
em reduzir controles legais tornaram a EC 19/98 um diploma mal visto por administrativistas nacionais.
Sobre isso, esse modelo é acusado por muitos escritores de servir como pretexto para diminuir os controles
jurídicos sobre a Administração Pública. Sigamos acima!
VALORES Hierarquia, processo, Colaboração, eficiência,
forma parceria, gestão
CONTROLE Sobre os meios Sobre o resultado
INSTITUTOS Licitação, Processo Contratos de Gestão,
RELACIONADOS Administrativo, Concursos Agências Executivas,
Públicos Eficiência
CARACTERÍSTICAS Autorreferente Orientada para o cidadão

Lembra do aprofundamento apresentando no rodapé da página anterior?


Então, é exatamente por críticas como essa que surgiu a ideia do ESTADO EM
REDE, que foi uma tentativa de aperfeiçoamento do modelo de administração gerencial.
Superando a busca pelo resultado, este Estado deve realizar uma gestão para a
cidadania, transformando os indivíduos destinatários de polícias pública em
PROTAGONISTAS na definição de estratégias Estatais. A expressão chave aqui, pois, é
PARTICIPAÇÃO POPULAR NA GESTÃO DA “COISA PÚBLICA”.
Boa questão de prova discursiva, heim?
Discorra sobre o Estado em Rede. Cite nascedouro, influências e caráter
democrático em sua resposta: (30 linhas)
Também de prova oral do seu concurso:
28
Candidato/Candidata, do que se trata o Estado em Rede? Fundamente.
Abre o olho Delta – Vamos dar uma revisada nesse assunto. Beleza?
2. JURISPRUDÊNCIA

SÚMULAS DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL


473 – A administração pode anular seus próprios atos, quando eivados de vícios que os
tornam ilegais, porque deles não se originam direitos; ou revogá-los, por motivo de
conveniência ou oportunidade, respeitados os direitos adquiridos, e ressalvada, em
todos os casos, a apreciação judicial.
346 – A administração pública pode declarar a nulidade dos seus próprios atos.

29
3. QUESTÕES

1. (FUNDATEC / PC-RS / DELEGADO 2018) Acerca da formação histórica do Direito


Administrativo, analise as seguintes assertivas:
I. O Direito Administrativo tem origem na Idade Média, período histórico em que a vontade
do monarca passa a se subordinar à lei.
II. O direito francês se notabiliza como a principal influência na formação do Direito
Administrativo brasileiro, de onde importamos institutos importantes como o conceito de
serviço público, a teoria dos atos administrativos, da responsabilidade civil do estado e da
submissão da Administração Pública ao princípio da legalidade.
III. Devido à organização do Estado brasileiro, composto por diferentes entes políticos
dotados de competências legislativas próprias para disciplinar suas atividades
administrativas, a codificação do Direito Administrativo em âmbito nacional se torna
inviável.
Quais estão corretas?
a) Apenas I.
b) Apenas III.
c) Apenas I e II. 30
d) Apenas II e III.
e) I, II e III.

2 – (FAPEMS / PC-MS / DELEGADO 2017) De acordo com o texto a seguir o direito público
tem como objetivo primordial o atendimento ao bem-estar coletivo. [...] em primeiro
lugar, as normas de direito público, embora protejam reflexamente o interesse
individual, têm o objetivo primordial de atender ao interesse público, ao bem-estar
coletivo. Além disso, pode-se dizer que o direito público somente começou a se
desenvolver quando, depois de superados o primado do Direito Civil (que durou muitos
séculos) e o individualismo que tomou conta dos vários setores da ciência, inclusive a do
Direito, substituiu-se a ideia do homem como fim único do direito (própria do
individualismo) pelo princípio que hoje serve de fundamento para todo o direito público
e que vincula a Administração em todas as suas decisões [...]. DI PIETRO, Maria Sylvia
Zanella. Direito Administrativo. 30.ed. São Paulo: Atlas, 2017, p 96.
Diante disso, as "pedras de toque" do regime jurídico-administrativo são
a) a supremacia do interesse público sobre o interesse privado e a impessoalidade do
interesse público.
b) a supremacia do interesse público sobre o interesse privado e a indisponibilidade do
interesse público.
c) a indisponibilidade do interesse público e o princípio da legalidade.

d) a supremacia da ordem pública e o princípio da legalidade.

e) a supremacia do interesse público e o interesse privado e o princípio da legalidade.

3 – (ACAFE / PC-SC / DELEGADO 2014) Considere a definição de Direito Administrativo e


assinale a alternativa correta.
a) É o conjunto dos princípios jurídicos de direito público que tratam da Administração
Pública, suas entidades, órgãos e agentes públicos.
b) É o conjunto dos princípios jurídicos de direito público que têm como estudo o Serviço
Público.
c) É o conjunto dos princípios jurídicos de direito público que regem as relações jurídicas
entre órgãos do Estado.
d) É o conjunto dos princípios jurídicos de direito público e privado que tratam da
Administração Pública, suas entidades, órgãos e agentes públicos.
e) É o conjunto dos princípios jurídicos de direito público e privado que têm como estudo
os atos do Poder Executivo. 31
4 – (VUNESP / PC-SP / DELEGADO 2014) O conceito de Direito Administrativo é peculiar
e sintetiza-se no conjunto harmônico de princípios jurídicos que regem os órgãos, os
agentes e as atividades públicas tendentes a realizar concreta, direta e imediatamente os
fins desejados pelo Estado. A par disso, é fonte primária do Direito Administrativo
a) a jurisprudência.
b) os costumes.
c) os princípios gerais do direito.
d) a lei, em sentido amplo.
e) a doutrina.

5 – (FUMARC / PC-MG / DELEGADO 2011) Em relação à interação do direito


administrativo, com os demais ramos de direito, analise as afirmativas a seguir:
I. O direito administrativo é que dá mobilidade ao direito constitucional.
II. O direito administrativo tem vínculo com o direito processual civil e penal.
III. As normas de arrecadação de tributos podem ser tidas como de direito administrativo.
IV. A teoria civilista dos atos e negócios jurídicos têm aplicação supletiva aos atos e
contratos administrativos.
Marque a alternativa CORRETA.
a) apenas as afirmativas I, II e III estão corretas.
b) apenas as afirmativas II e IV estão corretas.
c) apenas as afirmativas I e II estão corretas.
d) as afirmativas I, II, III e IV estão corretas.

6 – (CESPE / PF / DELEGADO 2004) No que se refere a fontes do direito administrativo,


julgue os itens seguintes.
A jurisprudência é fonte do direito administrativo, mas não vincula as decisões
administrativas, apesar de o direito administrativo se ressentir de codificação legal.
( ) Certo ( ) Errado

7 – (PUC-PR / JUIZ SUBSTITUTO 2014) Sobre o conceito do direito administrativo e a sua


formação histórica no Brasil, analise as assertivas abaixo e assinale a
alternativa CORRETA.
32
I. A primeira cadeira de direito administrativo no Brasil foi criada em 1851 e com a
implantação da República acentuou-se a influência do Direito Público Norte-Americano,
adotando-se todos os postulados do rule of law e do judicial control.
II. O Brasil adotou, desde a instauração da primeira República, o sistema da jurisdição única,
com exceção do período de vigência da Emenda Constitucional nº. 07/77, com a instalação
dos dois contenciosos administrativos por ela estabelecidos.
III. O direito administrativo tem como fontes a lei, a doutrina, os costumes e a
jurisprudência, vigorando entre nós, desde o início da República, dado a influência sofrida
do direito norte-americano, o princípio do stare decises.
IV. A interpretação do direito administrativo, além da utilização analógica das regras do
direito privado que lhe foram aplicáveis, há de considerar, necessariamente, três
pressupostos: 1º) a desigualdade jurídica entre a Administração e os administrados; 2º) a
presunção de legitimidade dos atos da administração; 3º) a necessidade de poderes
discricionários para a Administração atender ao interesse público.

a) Apenas as assertivas III e IV estão corretas.

b) Apenas as assertivas I e III estão corretas.

c) Apenas as assertivas I e II estão corretas.

d) Apenas as assertivas I e IV estão corretas.


8 – (FMP Concursos / Juiz de Direito TJMT) Em face da formação histórica do Direito
Administrativo e do modelo de Estado vigente, é correto afirmar que:
a) a noção de coisa julgada nas esferas administrativa e judicial tem a mesma dimensão e
conteúdo.

b) as decisões proferidas por órgãos públicos de natureza superior não podem ser revistas
pelo Poder Judiciário

c) o processo administrativo somente pode ser instaurado mediante provocação do


interessado, por representação escrita endereçada ao agente competente para a solução
da controvérsia.

d) o regime jurídico juspublicista, no todo ou em parte, somente pode ser aplicado às


pessoas jurídicas de direito público.

e) tem por objeto os órgãos, agentes e pessoas jurídicas administrativas que integram a
Administração Pública, a atividade não contenciosa que exerce e os bens de que se utiliza
para a consecução de seus fins, de natureza pública.

33
4. GABARITO COMENTADO

1. D
O surgimento do direito administrativo, historicamente falando, está ligado ao
desenvolvimento do Estado Democrático de Direito, sobretudo pela ótica da legalidade
advinda pós movimentos revolucionários incentivados pelo ideário iluminista
(Revolução Francesa é um marco histórico para esse surgimento). Não assiste acerto a
afirmação de que o Direito Administrativo tem origem na idade média. Na verdade, o
que temos é a vigência de um absolutismo que não permite o controle por meio da lei
dos atos da administração. Não falamos, inclusive, na idade média, em controle
administrativo como nos tempos atuais. Quanto à alternativa II, de fato, a influência
francesa ditou a formação de institutos modernos brasileiro como: serviços públicos,
atos administrativos, responsabilidade civil do Estado, princípio da legalidade, dentre
outros. A afirmação III pode nos parecer mais complexa, mas, com o cuidado necessário
podemos perceber que ela não está tratando de uma generalização, mas de
inviabilidade de codificação. Há países que possuem código de direito administrativo –
assim como nosso código penal, por exemplo –, mas esta ação, levando em conta nossa
divisão de competências constitucionais, torna deveras complexa possível junção. É esta
a análise que a questão nos exigiu. Ademais, por eliminação, fecharíamos o raciocínio
exigido pela FUNDATEC.
34
2. B
A questão chama de Pedras de Toque os SUPRAPRINCÍPIOS da supremacia do interesse
público e da indisponibilidade do serviço público – assim considerados por Celso de
Mello. Os superprincípios são os princípios dos quais derivam todos os demais princípios
e normas do Direito Administrativo (Curso de Direito Administrativo, p. 69). A existência
desses dois supraprincípios é o reflexo de uma dualidade permanente no exercício da
função administrativa: a oposição entre os poderes da Administração Pública
(supremacia do interesse público) e os direitos dos administrados (indisponibilidade do
interesse público). Esses dois, nas palavras de Mazza (2017), são relativos e não
absolutos, porquanto, não existe supremacia absoluta do interesse público sobre o
privado, nem indisponibilidade absoluta dos interesses públicos. Vamos estudar
princípios em nossos próximos pontos, mas já salve essa informação aí Megeana e
Megeano.

3. A
Vamos nos reportar aqui ao conceito trazido por Marçal Justen Filho. O direito
administrativo é “O conjunto das normas jurídicas de direito público que disciplinam as
atividades administrativas necessárias à realização dos direitos fundamentais e a
organização e o funcionamento das estruturas estatais e não as estatais encarregadas
de seu desempenho” (Curso de Direito Administrativo, 7ª ed., 2011). Abrimos mão,
ainda, do esboço de Maria Sylvia Zanella Di Pietro, que afirma que este é “O ramo do
direito público que tem por objeto os órgãos, agentes e pessoas jurídicas
administrativas que integram a administração pública, a atividade jurídica não
contenciosa que exerce e os bens de que se utiliza para a consecução de seus fins de
natureza pública” (Direito Administrativo, 21ª ed., 2008). A questão apresentada pela
ACAFE foi doutrinária e conceitual, apenas. Vamos nos ater ao exposto por estes dois
doutrinadores para analisarmos as demais questões que possam surgir com este mesmo
enfoque.

4. D
Fonte é o local de onde algo se provém. No direito, as fontes são os fatos jurídicos de
onde as normas emanam. As fontes jurídicas podem ser de dois tipos: a) primárias,
maiores ou diretas: são o nascedouro principal e imediato das normas; e) secundárias,
menores ou indiretas: constituem instrumentos acessórios para originar normas,
derivadas de fontes primárias. No Direito Administrativo, somente a lei constitui fonte
primária na medida em que as demais fontes (secundárias) estão a ela subordinadas:
doutrina, jurisprudência, costumes.

5. D
José dos Santos Carvalho Filho apresenta em sua obra – Manual de Direito
35
Administrativo – que o direito administrativo é o lado dinâmico do Direito
Constitucional. Quanto à alternativa II, de fato, o direito administrativo guarda relação
com variados ramos da ciência do direito: civil, tributário, constitucional, trabalho,
processual civil, penal e processo penal, dentre outros. Para a assertiva IV podemos
aplicar o entendimento do art. 54 da Lei nº. 8.666/93 “Os contratos administrativos de
que trata esta Lei regulam-se pelas suas cláusulas e pelos preceitos de direito público,
aplicando-se-lhes, supletivamente, os princípios da teoria geral dos contratos e as
disposições de direito privado”.

6. CERTO
O cuidado com esta questão, ela está relacionada à EC 45/04, que incluiu o art. 103-A à
CR/88, prevendo “O Supremo Tribunal Federal poderá, de ofício ou por provocação,
mediante decisão de 2/3 dos seus membros, após reiteradas decisões sobre matéria
constitucional, aprovar súmula que, a partir de sua publicação na impressa oficial, terá
efeito vinculante em relação aos demais poderes órgãos do Poder Judiciário e à
administração pública direta e indireta, nas esferas federal, estadual e municipal, bem
como proceder à sua revisão ou cancelamento, na forma estabelecida”. Nesse sentido,
as decisões administrativas estão vinculadas à construção sumular vinculante do
Supremo Tribunal. A questão do CESPE é do ano de 2004, e, nessa época, de fato
constava como correta a afirmação do enunciado. Mas hoje, em cobrança idêntica por
qualquer banca, essa ressalva teria que ser feita, o que tornaria nosso gabarito errado.
7. D
Aqui estamos diante de uma questão mais tormentosa Delta. Contudo, pelos
ensinamentos aqui apresentados é possível chegar a uma conclusão coerente exigida
pela PUC do Paraná. Vou colacionar o trecho de nosso material a respeito da afirmação
I: A doutrina aponta como marco inicial do Direito Administrativo a edição, na França
Pós-Revolucionária, da Lei 28 de Pluvioso 9 do Ano VIII (algo em torno de 1800), diploma
normativo da organização da Administração Pública francesa. Acrescenta-se, ainda, o
importante trabalho da jurisprudência do Conselho de Estado francês, responsável pela
construção de importantes institutos administrativistas, a exemplo da noção de serviço
público. Outrossim, em 1819, em Paris, cria-se a primeira cátedra de Direito
Administrativo, sendo que, no Brasil, ela somente vem a surgir com o Decreto 608/1851.
A primeira obra doutrinária brasileira só veio a ser publicada apenas em 1857, em Recife,
com o nome de “Elementos de Direito Administrativo Brasileiro”, do autor Vicente
Pereira do Rego. Quanto à afirmação II você lembra que citamos que não houve
implementação deste sistema em nosso ordenamento jurídico? O que houve foi uma
PREVISÃO, e a afirmação está a nos indicar uma instalação: ERRADO. Quanto à III, não
adotamos desde o início da República o princípio do stare decisis. IV está correta,
porquanto, realmente são características do direito administrativo: 1º) a desigualdade
jurídica entre a Administração e os administrados; 2º) a presunção de legitimidade dos
atos da administração; 3º) a necessidade de poderes discricionários para a
Administração atender ao interesse público. Neste sentido, seria necessário outros
conhecimentos para se chegar à resposta, mas, trata-se de uma boa questão sobre a 36
parte histórica da disciplina.

8. E
Ótima questão sobre a conceituação do direito administrativo. Em que pese haver
referência a outros temas que ainda serão estudados, podemos chegar à resolução com
o abordado aqui.
(A) INCORRETA. Não há a mesma noção sobre estes dois pontos, porquanto, temos
coisa julgada material apenas nas decisões emanadas do Poder Judiciário, uma vez que
estamos diante do sistema inglês em nosso ordenamento jurídico.
(B) INCORRETA. O Poder Judiciário pode revisar toda e qualquer matéria – desde que
obedeça ao postulado da inércia; então, não há essa vedação quanto às decisões
emanadas por órgãos públicos do alto escalão.
(C) INCORRETA. Veremos isso melhor quando analisarmos a Lei nº 9.784/99 – há um
ponto inteirinho só sobre ela; mas antemão já saiba que não há essa limitação para
deflagração de um processo administrativo; não estamos, nesta lei, diante de um rol tão
engessado, pelo contrário, há uma abertura ao cidadão, até, como legitimado.
(D) INCORRETA. Veremos melhor isso quando estudarmos organização da
administração pública, contudo, tenha em mente que o Banco do Brasil, por exemplo, é

9
Megeano(a)! Tem que gravar esse dado. Beleza? Sigamos.
pessoa jurídica de direito privado (Lei nº 13.303 de 2016 – no momento certo você lerá
essa belezinha de lei na íntegra); ou seja, não há essa restrição.
(E) CORRETA. É nosso conceito apresentado durante o ponto - Marçal Justen Filho “O
Direito Administrativo é o conjunto das normas jurídicas de direito público que
disciplinam as atividades administrativas necessárias à realização dos direitos
fundamentais e a organização e o funcionamento das estruturas estatais e não estatais
encarregadas de seu desempenho”. Maria Sylvia Zanella Di Pietro “O ramo do direito
público que tem por objeto os órgãos, agentes e pessoas jurídicas administrativas que
integram a administração pública, a atividade jurídica não contenciosa que exerce e os
bens de que se utiliza para a consecução de seus fins de natureza”.

37
CURSO MEGE

Site para cadastro: www.mege.com.br


Celular / Whatsapp: (99) 982622200 (Tim)
Turma: PCSP (Delegado de Polícia)
Material: Direito Constitucional (Ponto 1)

RODADA 1
Direito Constitucional
1
(Ponto 01)
Constitucionalismo e Teoria da Constituição1

1
Temáticas que resumem elementos diversos da parte inicial do último edital da PCSP para Delegado de
Polícia.
2
MENSAGEM DO MEGE

Para prova de Delegado de Polícia de São Paulo é necessário fazer uma


revisão básica da parte geral de direito constitucional. No último concurso não tivemos
uma prova simples, inclusive a doutrina esteve presente (de forma decisiva) em 11 de
14 questões aplicadas. O que nos fez reunir alguns assuntos relevantes iniciais de base
teórica para melhor domínio em questões mais complexas. Fiquem cientes: não
estamos diante de uma prova meramente de lei seca.

Há um maior preciosismo na polícia civil de São Paulo para temas doutrinários


na primeira fase. O que significa que você precisa atuar em dois pontos nessa revisão
inicial. O primeiro é sem dúvidas a lei seca. O segundo são pontos específicos de
direito constitucional que merecem mais atenção conceitual, e isso o curso vai te
oferecer no decorrer das próximas semanas.

Vamos aos estudos!


Equipe Mege. 3
SUMÁRIO

1. DOUTRINA (RESUMO) ................................................................................................ 5

1.1. DIREITO CONSTITUCIONAL: NOÇÕES GERAIS........................................................... 5

1.2. CONCEITO DE CONSTITUCIONALISMO ..................................................................... 6

1.3. NEOCONSTITUCIONALISMO................................................................................... 16

1.4. CONSTITUCIONALISMO E SOBERANIA POPULAR ................................................... 20

1.5. CONCEITO, CLASSIFICAÇÃO E ELEMENTOS DA CONSTITUIÇÃO.............................. 24

1.6. ESTRUTURA DAS CONSTITUIÇÕES .......................................................................... 34

1.6.1. PREÂMBULO ....................................................................................................... 34

1.6.2. PARTE DOGMÁTICA ............................................................................................ 35

1.6.3. PARTE TRANSITÓRIA ........................................................................................... 35 4


1.7. NORMAS CONSTITUCIONAIS PROGRAMÁTICAS .................................................... 35

1.8. PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS .............................................................................. 36

1.9. DISPOSIÇÕES CONSTITUCIONAIS TRANSITÓRIAS ................................................... 42

2. QUESTÕES ................................................................................................................ 44

3. GABARITO COMENTADO ......................................................................................... 49


1. DOUTRINA (RESUMO)

1.1. DIREITO CONSTITUCIONAL: NOÇÕES GERAIS

De acordo com a teoria clássica, o Direito se divide em dois grandes ramos:


Direito Público e Direito Privado. Modernamente, porém, a divisão do direito em
público e privado vem sendo remodelada, entendendo-se que o direito é uno e
indivisível. Assim, o direito deve ser definido e estudado como um grande sistema, em
que tudo se harmoniza. Dessa forma, a divisão tem efeitos apenas acadêmicos, de
forma a facilitar o estudo de cada ramo do direito.
O Direito Constitucional está incluído no ramo do Direito Público (conforme a
teoria clássica).
Trata-se de um direito público fundamental, tanto se observado na concepção
kelseniana – como fundamento de validade para a estrutura hierarquizada do
ordenamento jurídico – como se tomado na concepção material, consagrador da ideia
de direito que se expande na interpretação e aplicação das normas jurídicas (processo
de constitucionalização do direito).
A noção resumida de direito constitucional indica o estudo da Teoria Geral das
Constituições e os ordenamentos jurídicos de cada Estado.
A noção detalhada de Direito Constitucional compreende a ordenação 5
sistemática e organizada das normas supremas que estruturam o Estado e as relações
de poder, que como disciplina-síntese, exerce influência sobre todos os ramos do
direito.
O objeto do Direito Constitucional é o estudo sistematizado das Constituições:
organização do Estado, forma de governo, estruturação do poder, liberdades
públicas e princípios.
Ressalte-se que a doutrina afirma a existência de um direito privado
constitucional. Dessa forma, mais adequado seria falar, então, em um Direito Civil-
Constitucional, estudando-se o Direito Civil à luz das regras constitucionais e, em
muitos casos, reconhecendo-se a aplicação dos direitos fundamentais nas relações
privadas (eficácia horizontal dos direitos fundamentais).
Fica evidente que, para além da discussão dogmática e doutrinária, a
constitucionalização do direito privado revela efeitos práticos, com reflexos
jurisprudenciais como o citado acima.
Dentro desta perspectiva, autores trazem o Princípio da dignidade da pessoa
humana como núcleo axiológico da Constituição, e por consequência de todo o
ordenamento jurídico, promovendo uma revolução em diversos institutos e conceitos
do direito, tornando-os mais maleáveis ao diálogo com o direito constitucional.
Aspecto salutar e que tende a ser cobrado (sobretudo nas fases mais agudas)
não só em Direito Constitucional, como também em Direito Civil, refere-se justamente
ao movimento de despatrimonialização do Direito Civil, promovido pela força
normativa dos princípios constitucionais, com enfoque na dignidade da pessoa
humana.
É que tal princípio funciona como verdadeira matriz de todos os direitos
fundamentais, os quais são responsáveis por alçar a pessoa a um patamar distinto do
que se vislumbrava no Estado Liberal, de modo que o Direito Civil, ao receber esta
influência, passa a se preocupar com o indivíduo não só sob a ótica patrimonial,
passando a tutelar com primazia interesses existenciais. Trata-se, em resumo, de um
movimento de releitura dos institutos tipicamente de direito privado sob a ótica dos
princípios constitucionais.

1.2. CONCEITO DE CONSTITUCIONALISMO

O Constitucionalismo comporta duas acepções:


a) em sentido amplo, relacionado à existência de Constituição
como garantia dos governados (Platão) e estruturação do
sistema de poder. Refere-se à existência de uma Constituição
básica que confere poderes ao soberano, mesmo que
tacitamente.
b) em sentido estrito, técnica jurídica, social, política e
ideológica de tutela das liberdades públicas surgida no final do
século XVIII. 6
O Constitucionalismo em sentido estrito confunde-se com a própria evolução
do Direito Constitucional, surgindo como técnica jurídica de combate ao absolutismo e
busca pela limitação do poder. Foi a “arma do liberalismo contra o absolutismo”.
Nessa busca, três ideias principais sempre se encontram presentes, que são
conhecidas como “axiomas” do Constitucionalismo: garantia de direitos, separação
dos poderes e princípio do governo limitado (art. 16, Declaração dos Direitos do
Homem e do Cidadão).
Vejamos alguns conceitos doutrinários de Constitucionalismo em sentido
estrito:
Canotilho – É a teoria que ergue o princípio do governo
limitado, indispensável à garantia dos direitos em dimensão
estruturante da organização político-social de uma comunidade.
Neste sentido, o Constitucionalismo moderno representará
uma técnica de limitação do poder com fins garantísticos.
Kildare Gonçalves – Perspectiva Jurídica/Sociológica – O
Constitucionalismo se trata de um sistema normativo,
enfeixado na Constituição, e que se encontra acima dos
detentores do poder; sociologicamente, representa um
movimento social que dá sustentação à limitação do poder,
inviabilizando que os governantes possam fazer prevalecer seus
interesses e regras na condução do Estado.
André Ramos Tavares – Determina quatro sentidos para o
Constitucionalismo: 1) Limitar o poder arbitrário; 2) Imposição
de que existam cartas constitucionais escritas; 3) Evolução
histórica-constitucional de um determinado Estado; e 4)
Prevalência dos direitos fundamentais como proteção ao
regime autoritário.
Pedro Lenza – O Constitucionalismo é um meio de limitação do
poder autoritário e de prevalência dos direitos fundamentais,
afastando-se da visão autoritária do antigo regime (aproxima-
se da posição de Ramos Tavares).

Podemos resumir Constitucionalismo como “a busca do homem político pela


limitação do poder arbitrário” (Karl Loewenstein).

1.2.1. MARCOS NA EVOLUÇÃO HISTÓRICA DO CONSTITUCIONALISMO


A. Constitucionalismo primitivo

O Constitucionalismo primitivo identifica-se com a acepção ampla do termo e


remonta à organização consuetudinária dos povos sem escrita na Antiguidade
Clássica.
O principal exemplo é do povohebreu: os profetas dotados de legitimidade
7
popular, no Estado Teocrático, fiscalizavam e puniam os atos dos governantes que
ultrapassavam os limites bíblicos. Alguns autores entendem que com o povo hebreu
houve a primeira experiência, ainda que embrionária, de Constitucionalismo, pois os
detentores do poder eram limitados pela lei do “Senhor”.
De maneira geral, as principais características do Constitucionalismo primitivo
são: normas consuetudinárias, influência direta da religião - especialmente pelo
influxo dos valores cristãos - e meios de constrangimento (ordálias).

B. Constitucionalismo antigo

No Constitucionalismo antigo, há duas experiências importantes: Grécia e


República Romana. Autores destacam, no ponto, a organização das cidades-Estado
gregas e o surgimento da democracia direta.
Grécia: O regime político da Grécia se preocupava com a limitação do poder
das autoridades e a contenção do arbítrio, porém essa limitação estava ligada à busca
do bem comum da polis, e não exatamente à garantia de liberdades individuais.
Roma: Também não havia o sentido de Constitucionalismo nas bases
modernas como limitação ao poder do governante e defesa dos direitos individuais.
Contudo, alguns institutos romanos demonstravam certa preocupação com a
separação de poderes, repartindo-o em instituições como o Consulado, o Senado e a
Assembleia.
São características do Constitucionalismo antigo:
i) inexistência de uma Constituição escrita;
ii) forte influência da religião; e
iii) supremacia do monarca ou do Parlamento.

No Constitucionalismo antigo não havia controle de constitucionalidade.


Sequer se falava na existência de um Poder Judiciário. As Constituições eram
consuetudinárias e os doutrinadores apontam pela “eficácia social zero do
Constitucionalismo”. As normas eram destituídas de obrigatoriedade, formando-se
uma cultura do ceticismo quanto ao valor da Constituição do ponto de vista de sua
concretização.

C. Constitucionalismo medieval

A era medieval, caracterizada pelo feudalismo, pela fragmentação do poder


político e pela separação de classes, foi marcada pelas concepções jusnaturalistas de
limitação do poder, lastreadas no pensamento de que as leis precediam ao homem.
A título de contextualização histórica, vale lembrar que nenhuma instituição
existente à época possuía uma espécie de soberania semelhante ao que se vê nos
Estados Modernos, razão pela qual é difícil falar em Constitucionalismo na Idade 8
Média, tal qual entendido atualmente.
No entanto, no final da Idade Média, sobretudo na Inglaterra, foram
realizados pactos entre os reis e seus súditos de estamentos mais privilegiados,
reconhecendo certas prerrogativas. Tal concessão de direitos e a respectiva limitação
que isto trazia ao poder do Monarca são traços iniciais do que se passou a entender
como constitucionalismo (em sentido estrito).
Existiram, portanto, alguns documentos garantidores das liberdades públicas:
Magna Carta, Petition of Right; Habeas Corpus Act; Bill of Rights (Inglaterra).
Vejamos um quadro-resumo:

A Magna Carta de 1215 representou uma


Magna Charta (1215):
limitação do poder real.

Reconhecimento de direitos e liberdades para os


Petition of Rights (1628): súditos do Rei. – firmada entre o Parlamento e o
Rei Carlos.

Habeas Corpus Act (1679): Anulava as prisões arbitrárias.

Submetia a monarquia à soberania popular,


Bill of Rights (1689):
transformando-a numa monarquia constitucional.
Desses documentos, interessante destacar a Magna Carta inglesa de 1215,
que, em suma, limitou o poder do rei, o que é ínsito ao próprio conceito de
Constituição, razão pela qual até hoje verificamos a Constituição de 1988 ser
“apelidada” em textos jurídicos de Carta Magna ou Texto Magno.
São características do Constitucionalismo medieval:
i) Constituições consuetudinárias;
ii) Concepções jusnaturalistas da limitação do poder;
iii) Forte influência da religião;
iv) Existência de alguns direitos oponíveis ao Monarca;
v) Supremacia do Parlamento (especialmente na Inglaterra).

D. Constitucionalismo moderno

O Constitucionalismo moderno é o movimento jurídico, político e cultural do


fim do século XVIII que pregava uma Constituição escrita para frear o arbítrio dos
poderes públicos.
Segundo J.J Gomes Canotilho, o Constitucionalismo moderno é o movimento
político social e cultural que, sobretudo a partir de meados do século XVIII, questiona
nos planos político, filosófico e jurídico os esquemas tradicionais de domínio político,
sugerindo, ao mesmo tempo, a invenção de uma nova forma de ordenação e 9
fundamentação do poder político (definição cobrada na prova do TJMT-2009).
Conforme ensina Pedro Lenza, “Dois são os marcos históricos e formais do
constitucionalismo moderno: a Constituição norte-americana de 1787 e a
Constituição francesa de 1791 (que teve como preâmbulo a Declaração Universal dos
Direitos do Homem e do Cidadão de 1789), movimento este deflagrado durante o
Iluminismo e concretizado como uma contraposição ao absolutismo reinante, por meio
do qual se elegeu o povo como titular legítimo do poder”.
O principal diferencial do Constitucionalismo moderno, em relação à fase
anterior, é o aparecimento das primeiras Constituições escritas, rígidas e formais. A
partir delas, surgem as noções de rigidez constitucional (o que define a rigidez das
Constituições é o processo diferenciado de modificação, e não a presença de cláusulas
pétreas) e supremacia da Constituição.
Também estavam presentes, simultaneamente, as ideias de limitação do
poder do soberano, com a repartição de poderes, a preocupação com direitos
individuais e a necessidade de legitimação do governo pelo consentimento dos
governados.
Assim, alguns autores entendem que somente a partir do Constitucionalismo
moderno, podemos falar em Constitucionalismo propriamente dito (em sentido
estrito).
Frisa-se que o Constitucionalismo moderno foi fundamental para o
desenvolvimento da ideia de Estado de Direito, tal qual conhecida hoje: Estado em
que o poder exercido é limitado pela ordem jurídica vigente.
Características do Constitucionalismo moderno:
i) Superação do absolutismo;
ii) Surgimento das primeiras Constituições escritas (constituição
no sentido formal);
iii) Primeiras ideias de rigidez constitucional e supremacia
constitucional;
iv) Influências do Iluminismo, a partir das ideias de John Locke
(ideias de liberalismo), Jean Jacques Rousseau (valorização da
lei como expressão da vontade geral do povo) e Montesquieu
(divisão de poderes);

ATENÇÃO! John Locke, Rousseau e Montesquieu são influenciadores do


Constitucionalismo MODERNO. Já foi considerado errado em provas assertiva no
sentido que os pensadores seriam precursores do Constitucionalismo
contemporâneo.

v) Garantia de direitos individuais;


vi) Separação dos poderes;
vii) Limitação do poder estatal. 10
Importante destacar que os marcos do Constitucionalismo moderno são o
absenteísmo estatal (viés liberal do período) e a proteção das liberdades públicas
clássicas (direitos civis e políticos), relacionando-se, portanto, aos direitos
fundamentais de primeira geração/dimensão.
Esse movimento pode ser didaticamente subdividido em duas fases:
Constitucionalismo moderno liberal e Constitucionalismo moderno social.

D.1. Constitucionalismo moderno CLÁSSICO ou LIBERAL

O Constitucionalismo clássico ou liberal começa no fim do século XVIII, com as


revoluções liberais, e estende-se até o fim da Primeira Guerra Mundial (1918).
No Constitucionalismo clássico, duas experiências constitucionais merecem
destaque, com características peculiares: a norte-americana e a francesa.

a) Constitucionalismo norte-americano
A carta americana de 1787 nasceu em substituição aos Articles Of
Confederation, a partir da reunião de onze das trezes colônias norte-americanas que
adquiriram independência. Suas marcas principais estão na instituição do federalismo,
da rígida separação de poderes e do presidencialismo. Seguem alguns pontos
principais:
i) Criação da primeira Constituição escrita, elaborada em 1787:
trata-se de uma Constituição sintética e concisa, que contém
apenas os elementos estruturantes do Estado e do poder.
Desde seu nascimento, tratou de um conjunto de NORMAS,
que impunham obrigatoriedade aos poderes instituídos.
Constatou-se, portanto, a existência de uma Constituição
dogmática, escrita e sistematizada por um órgão constituinte
soberano.
ii) Surgimento do controle de constitucionalidade difuso: O
controle de constitucionalidade está ligado às ideias de
supremacia e rigidez constitucionais, tendo como parâmetro
uma Constituição escrita, com a diferenciação entre
supremacia formal e material das constituições. O controle de
constitucionalidade DIFUSO, como conhecido hoje, surgiu do
famoso caso Marbury vs. Madison (1803), fruto, portanto, da
experiência do Constitucionalismo norte-americano.
iii) Fortalecimento do Poder Judiciário: Na obra “Os
Federalistas”, Hamilton ensina que o Poder Judiciário é o mais
fraco dos poderes, por não possuir nem a espada nem o cofre.
Os norte-americanos tinham bastante medo dos abusos
perpetrados pelo Parlamento inglês, razão pela qual optaram
11
pelo fortalecimento do Judiciário.
iv) Importante contribuição para as noções de separação dos
poderes, forma federativa de Estado, sistema republicano e
presidencialista e regime democrático.
v) Existência de declarações de direitos: a Declaração de
Direitos da Virgínia é anterior à própria constituição (1776).

b) Constitucionalismo francês
O marco inicial do Constitucionalismo francês é a Revolução Francesa, de
1789. A primeira Constituição francesa escrita é de 1791. Duas ideias que constam da
Declaração Universal dos Direitos do Homem e do Cidadão, de 1789 são fundamentais
para a compreensão do Constitucionalismo francês: garantia de direitos e separação
dos poderes.
São características fundamentais do Constitucionalismo francês:
i) Consagração do princípio da separação dos poderes:
Montesquieu foi estudar no direito britânico a separação dos
poderes. Os franceses, que não entendiam esse sistema,
originário de um país de common law, foram buscar inspiração
nos EUA, onde a separação dos poderes foi bem recebida. Na
verdade, os sistemas francês e norte-americano se
interpenetraram reciprocamente em seu surgimento.
ii) Distinção entre poder constituinte originário e derivado: O
francês Abade Emmanuel Joseph Sieyès foi o teórico do poder
constituinte (“Qu’est-ce que le tiers état?” – O que é o terceiro
Estado? A Constituinte Burguesa). Nesta obra, Sieyès, com base
na doutrina do contrato social (John Locke, Jean-Jacques
Rousseau), vislumbrava a existência de um poder imanente à
nação, superior aos poderes ordinariamente constituídos e por
eles imodificáveis: o poder constituinte. Além de legitimar a
ascensão do Terceiro Estado (o povo) ao poder político, a obra
traçou as linhas mestras da Teoria do Poder Constituinte, ainda
hoje relevante para o estudo do Direito Constitucional.
iii) Supremacia do Parlamento: No modelo francês de
Constitucionalismo clássico, o Parlamento era considerado o
poder supremo. Há, portanto, a característica de valorização do
Legislativo, acarretando o enfraquecimento do controle de
constitucionalidade das leis (curiosidade: a primeira vez que um
tribunal francês exerceu o controle repressivo de
constitucionalidade foi em 2010). Isso ocorre, pois, os
revolucionários franceses viam o Poder Judiciário com
desconfiança, associando-o ao antigo regime monarquista.
Além disso, o Legislativo era valorizado como a expressão da
vontade geral do povo.
iv) Surgimento da escola da exegese, a partir do Código de 12
Napoleão de 1804: Para a escola da exegese, a interpretação
era uma atividade mecânica, e ao Judiciário cabia somente
dizer o que já estava na lei. O juiz deveria somente expressar o
que a lei continha, e não interpretar. Os adeptos dessa teoria
entediam que o Código de Napoleão já era algo perfeito e
acabado e não tinha de ser interpretado, muito menos
complementado.
v) Constituição analítica, extensa ou expansiva: Enquanto a
Constituição dos EUA é concisa ou sintética, a experiência
constitucional francesa demonstrou ser extensa, e regulou
situações que poderiam ser tratadas por normas
infraconstitucionais (não se limitou às matérias
substancialmente constitucionais, que são os direitos
individuais, a separação dos Poderes e a organização do Estado).

D.2. Constitucionalismo moderno SOCIAL

Fase do Constitucionalismo moderno que surge com o fim da 1ª Guerra


Mundial (1918). A crise econômica instaurada e o aumento das desigualdades sociais
levaram à derrocada do liberalismo clássico. Dessa forma, as Constituições passaram a
prever não só limitações ao poder do Estado e garantias individuais, mas também a se
preocupar com o desenvolvimento social das nações.
O movimento do Constitucionalismo social coincide com o surgimento da
segunda dimensão de direitos fundamentais e liga-se essencialmente a direitos sociais,
econômicos e culturais. Tratam-se de direitos coletivos vinculados à IGUALDADE e que
em geral possuem um caráter positivo, demandando uma atuação estatal (e não
somente o absenteísmo típico dos direitos fundamentais de primeira dimensão e do
constitucionalismo liberal).
Destaca-se, portanto, a ideia de Estado-Social, ou seja, Estado intervencionista,
atuando na produção e distribuição de bens e riqueza, de modo a garantir um mínimo
de bem-estar social.
IMPORTANTE: A doutrina aponta a Constituição Mexicana de 1917 e a
Constituição Alemã de 1919 (Constituição de Weimar) como experiências marcantes
do período, especialmente por imporem ao Estado a obrigação de ofertar prestações
positivas aos indivíduos.

E. Constitucionalismo contemporâneo

No Constitucionalismo contemporâneo, o valor constitucional supremo e


fundamental passa a ser a dignidade da pessoa humana. Essa é a grande mudança de
paradigma: a preocupação com o ser humano e sua dignidade, independentemente de
qualquer condição pessoal. Em outras palavras, todos os homens possuem o mesmo
grau de dignidade, pelo simples fato de sua humanidade (valor apriorístico). 13
As principais características dessa nova fase são:
a) Reconhecimento definitivo da força normativa da
constituição (Konrad Hesse): ideia de que a Constituição tem o
poder de conformar a realidade social.
b) Rematerialização das constituições: no Constitucionalismo
contemporâneo, as Constituições são mais semelhantes às
Constituições francesas do que à americana (que é concisa,
como visto acima), em termos de assuntos tratados. Os fatores
de origem do fenômeno de rematerialização foram as
experiências autoritárias ocorridas na América e na Europa
(ditaduras militares da América Latina e Regimes totalitários da
Europa). A ideia, então, foi constitucionalizar inúmeros
assuntos com o objetivo de mais proteger – proteção
qualificada – certos assuntos. As Constituições do segundo pós-
guerra (Constitucionalismo contemporâneo) são, em geral,
prolixas, tratando de vários temas e os especificando de
maneira mais pormenorizada.

ATENÇÃO! O Constitucionalismo contemporâneo é visto por alguns autores como


uma amálgama das experiências francesa e americana. A ideia de rematerialização
é inspirada na experiência francesa. A força normativa da Constituição é uma clara
influência da Constituição americana.
c) Centralidade da Constituição e dos Direitos Fundamentais,
o que acarreta:
i) consagração de normas de outros ramos do direito no texto
das constituições;
ii) filtragem constitucional, ou seja, interpretação das normas
de outros ramos do direito à luz da Constituição;
iii) eficácia horizontal dos direitos fundamentais (eficácia dos
direitos fundamentais não somente nas relações particular-
Estado, mas também nas relações entre particulares);
iv) fortalecimento do Poder Judiciário e da jurisdição
constitucional, o que tem causado o fenômeno chamado
“judicialização da política e das relações sociais”.
d) Maior abertura da interpretação e aplicação da
Constituição.

APROFUNDANDO: Além dessas características principais, identifica-se no


Constitucionalismo contemporâneo a presença de normas programáticas de
conteúdo social (normas que estabelecem um programa de Estado de conteúdo
social), o que, segundo a doutrina majoritária, acarreta os seguintes fenômenos
constitucionais:
- Totalitarismo Constitucional - Refere-se à existência de textos 14
constitucionais amplos, extensos e analíticos, que encarceram
temas próprios da legislação ordinária.
- Dirigismo Comunitário - Refere-se à capacidade do texto
constitucional de fixar regras para dirigir as ações
governamentais.
- Constitucionalismo Globalizado - Refere-se à busca da
expansão e da proteção dos direitos humanos mundialmente.
- Direitos de segunda e terceira dimensão.

Destaca-se que o movimento do Constitucionalismo contemporâneo está


relacionado ao surgimento dos direitos fundamentais de terceira dimensão, ligados à
fraternidade ou solidariedade.
Tratam-se de direitos transindividuais, de titularidade difusa ou coletiva, por
exemplo: direito ao desenvolvimento ou progresso, autodeterminação dos povos,
meio ambiente, comunicação, propriedade sobre o patrimônio comum da humanidade.

F. Constitucionalismo do Futuro (José Roberto Dromi)

Para o autor, o Constitucionalismo deve buscar consolidar os direitos de


fraternidade e solidariedade. Baseia-se na esperança de dias melhores da evolução
humana e no encontro do ponto de equilíbrio entre as concepções do
constitucionalismo moderno e os excessos do constitucionalismo contemporâneo.
Características da Teoria do Constitucionalismo do Futuro - São
características que as Constituições devem observar:
- Verdade (crítica às normas programáticas) - Determina que a
Constituição somente poderá prever aquilo que é possível ser
atingido.
- Solidariedade - Refere-se à igualdade sedimentada na
solidariedade entre os povos, na dignidade e na justiça social.
- Consenso (democrático) - A Constituição do futuro deve ser
fruto de consenso democrático.
- Continuidade - Ao se reformar uma Constituição, não pode
haver um abandono dos direitos já conquistados.
- Participação - Refere-se à efetiva participação dos corpos
intermediários da sociedade, consagrando-se a noção de
democracia participativa e de Estado Democrático de Direito.
- Integração (órgãos supranacionais) - Trata-se da previsão de
órgãos supranacionais para a implementação de uma
integração espiritual, moral, ética e institucional entre os povos
(“transnacionalização dos povos”).
- Universalidade (dignidade da pessoa humana) - Consagra os 15
direitos fundamentais internacionais nas Constituições futuras,
fazendo prevalecer o princípio da dignidade da pessoa humana
de maneira universal e afastando, assim, qualquer forma de
desumanização.

G. Constitucionalismo abusivo

O conceito de Constitucionalismo abusivo não se relaciona com o movimento


de limitação do poder do Estado, ora estudado, mas é uma classificação doutrinária
que merece nossa atenção, especialmente por já ter sido citada pelo STF.
Constitucionalismo abusivo é uma expressão cunhada por David Landau e que
pode ser conceituada como o uso de institutos de origem constitucional para ceifar a
democracia.
Trata-se de um fenômeno caracterizado pela edição de atos normativos com
aparência de legalidade, mas que provocam retrocessos democráticos, a exemplo de
atos que concentram poderes no chefe do Executivo, retiram a transparência,
impedem mecanismos de controle social e diminuem a esfera de atuação da sociedade
civil organizada.
Modernamente, a maioria dos regimes autoritários ou semiautoritários foram
instalados a partir de medidas pontuais, aparentemente válidas do ponto de vista
formal, mas que, em conjunto e progressivamente, corroem a tutela de direitos e
neutralizam outras instâncias de controle e deliberação política.
Em outras palavras, ao contrário dos golpes autoritários experimentados no
século passado (ex.: ditaduras latino-americanas), fala-se, atualmente, em engenhosos
“golpes institucionais”, efetivados por meio do uso abusivo de mecanismos
constitucionais.
A expressão “Constitucionalismo abusivo” foi utilizada pelo Ministro Roberto
Barroso na concessão da medida liminar na ADPF 622, que suspendeu dispositivos do
decreto do Executivo que, na prática, esvaziavam a participação da sociedade civil
junto ao Conselho Nacional da Criança e do adolescente - CONANDA.

1.3. NEOCONSTITUCIONALISMO

De início, vale destacar que o termo “Neoconstitucionalismo” não tem sentido


único (alguns doutrinadores identificam, inclusive, como sinônimo de
Constitucionalismo contemporâneo).
Tratam-se, em verdade, de “Neoconstitucionalismos”, no plural, em alusão à
obra do jurista Miguel Carbonell. Nesse material, contudo, traçamos algumas diretrizes
gerais do fenômeno, com enfoque especial no que é mais cobrado em provas.
A ideia geral é a Constituição como centro do sistema. A CF passa a ser uma
norma jurídica dotada de imperatividade e superioridade (deixa de ser apenas uma
16
carta política). Busca-se, dentro dessa nova realidade, não mais apenas atrelar o
Constitucionalismo à ideia de limitação do poder político, mas, acima de tudo, busca-
se a eficácia da Constituição, deixando o texto de ter um caráter meramente retórico e
passando a ser mais efetivo, especialmente diante da expectativa de concretização dos
direitos fundamentais.
O Neoconstitucionalismo possui como principais características, as seguintes:
1) Positivação e concretização de um catálogo de direitos
fundamentais;
2) Onipresença dos princípios e das regras;
3) Inovações hermenêuticas. O formalismo jurídico e a
aplicação automática da lei são substituídos por novos cânones
interpretativos, pela argumentação jurídica e pela ponderação;
4) Densificação da força normativa do Estado; e
5) Desenvolvimento da Justiça Distributiva.
Para o Neoconstitucionalismo, a CF possui uma carga valorativa (axiológica)
fundamentada na dignidade da pessoa humana e nos direitos fundamentais. Assim,
não se fala apenas em uma simples hierarquia entre a CF, mas sim em uma
ponderação de valores entre suas próprias regras e princípios.
Dessa forma, a CF possui efeito irradiante em relação aos poderes e mesmo
aos particulares. Assim, seus efeitos se aplicam a todos os poderes e às relações entre
particulares (eficácia horizontal).
De acordo com Luís Roberto Barroso, o Neoconstitucionalismo possui os
seguintes marcos fundamentais:

- Marco Histórico – Teve seu início depois do pós-guerra, com o


destaque das Constituições escritas. Dessa forma, foi um
momento de redemocratização e de efetivação do Estado
Constitucional de Direito.
- Marco Filosófico - Teve como marco o Pós-positivismo. Assim,
não era suficiente a simples implementação da norma. Esta
deveria ser aplicada e efetivamente cumprida. Com isso, houve
o desenvolvimento das ideias de direitos fundamentais e uma
busca pelo direito mais próximo da ética. Dessa forma,
buscou-se uma concretização dos direitos previstos nas
Constituições. A doutrina aponta que o pós-positivismo foi o
fundamento filosófico de reaproximação entre o Direito e a
Moral.
- Marco Teórico - Teve como fundamento as ideias de:
i) Força Normativa da CF, especialmente a partir dos estudos de
Konrad Hesse (buscou-se o seu cumprimento forçado, sua
imperatividade);
ii) Expansão da jurisdição constitucional (supremacia da CF); e 17
iii) Nova Dogmática de interpretação da CF (voltada para a
implementação de valores e de uma interpretação das normas
conforme a Constituição).

ATENÇÃO! Neoconstitucionalismo NÃO é sinônimo de pós-positivismo. O pós-


positivismo é apenas o marco filosófico do Neoconstitucionalismo (conforme Luis
Roberto Barroso).

O Neoconstitucionalismo pode ser resumido, então, como uma nova


perspectiva de olhar e discutir o direito (em suas dimensões ontológica,
fenomenológica e epistemológica), fundada na força invasiva geral da Constituição e
na centralidade jurídica da tutela dos direitos fundamentais.
Destacam-se, assim, dois conceitos:
- Constitucionalização-inclusão: inclusão na Constituição de
temas anteriormente não tratados, com a incorporação de
valores e opções políticas nos textos constitucionais, como a
tutela do meio ambiente e do consumidor;
- Constitucionalização-releitura: impregnação de todo o
ordenamento jurídico pelos valores constitucionais. Técnica da
interpretação conforme a Constituição e da filtragem
constitucional do direito.
Verifica-se uma tendência à chamada judicialização da política e das relações
sociais, de forma que o Poder Judiciário é chamado a intervir, ainda que de maneira
excepcional, para sanar a omissão dos outros poderes, atuando na concretização de
direitos e princípios constitucionais.
Em outras palavras, é como se ao clássico princípio da separação dos poderes
fosse agregada uma interpretação mais flexível, capaz de transpor os rígidos limites da
tradição francesa e admitir o controle jurisdicional de políticas públicas de caráter
fundamental.

• Críticas ao Neoconstitucionalismo

Para fins de provas, especialmente de primeira fase, o mais importante é


compreender o conceito de Neoconstitucionalismo e sua influência na jurisdição
constitucional.
Sabe-se, contudo, que alguns excessos interpretativos geraram críticas
doutrinárias, notadamente por fundamentarem um “ativismo” judicial exacerbado.
Daniel Sarmento aponta as principais críticas ao Neoconstitucionalismo como
sendo:
(a) a de que seu pendor judicialista é antidemocrático. Com
efeito, como o Poder Judiciário não é submetido diretamente à
18
soberania popular, por meio do voto, haveria uma espécie de
“déficit” democrático no que tange à concretização de direitos
fundamentais pela via judicial.
(b) a de que sua preferência por princípios e ponderação, em
detrimento de regras de subsunção, é perigosa, sobretudo no
Brasil, em função de singularidades de nossa cultura.

No ponto, destaco que a Lei 13.655/2018 acrescentou o art. 20 à Lei de


Introdução às Normas do Direito Brasileiro, in verbis:
Art. 20. Nas esferas administrativa, controladora e judicial, não
se decidirá com base em valores jurídicos abstratos sem que
sejam consideradas as consequências práticas da decisão.

A lei consagrou o chamado princípio da responsabilidade decisória, que


obriga o julgador a avaliar, na motivação, as consequências práticas de sua decisão,
notadamente de natureza econômica, em aproximação à teoria da análise econômica
do direito, de tradição norte-americana.
A ideia é evitar decisões meramente retóricas, que aplicam valores jurídicos
abstratos sem analisar os fatos e seus impactos. Devem ser ponderados, assim, os
efeitos sistemáticos de determinado entendimento judicial, com vocação expansiva
diante de inúmeros casos semelhantes.
A novidade legislativa foi interpretada como uma tentativa de mitigação da
força normativa dos princípios e de frear o ativismo judicial.

(c) a de que ele pode gerar uma panconstitucionalização do


Direito, em detrimento da autonomia pública do cidadão e da
autonomia privada do indivíduo. Com efeito, uma atuação
desenfreada na “microjustiça” (justiça do caso concreto) pode
comprometer a fruição de direitos e a correta alocação de
recursos públicos.

ATENÇÃO! A perspectiva crítica ao Neoconstitucionalismo deve ser abordada em


provas apenas se expressamente perguntada ou direcionada.

• Transconstitucionalismo (Marcelo Neves)

Em aprofundamento doutrinário, especialmente para as provas mais


avançadas do concurso, traço a seguir linhas gerais sobre o conceito de
“Transconstitucionalismo”.
Neoconstitucionalismo não se confunde com Transconstitucionalismo. 19
Transconstitucionalismo é o fenômeno pelo qual diversas ordens jurídicas de
um mesmo Estado ou de Estados diferentes se entrelaçam para resolver problemas
constitucionais. O componente novo não é o entrelaçamento entre a pluralidade de
ordenamentos, mas o modo como são travadas as conversações.
É inevitável o fenômeno da “globalização do Direito constitucional”, que não
propugna uma Constituição global ou internacional, mas propõe uma “globalização do
direito constitucional doméstico”.
Não se confunde com Constitucionalismo transnacional, que propugna a
criação de uma Constituição internacional, como forma de solução dos problemas
decorrentes da globalização, ou seja, o Direito Constitucional doméstico estaria
hierarquicamente vinculado a uma Constituição global, nas questões comuns aos
Estados envolvidos.
No Brasil, o principal autor que trata sobre Constitucionalismo é o professor
Marcelo Neves. Ele explica que o conceito de Transconstitucionalismo não tem nada a
ver com o conceito de Constitucionalismo internacional, transnacional, supranacional,
estatal ou local. O conceito está relacionado à existência de problemas jurídico-
constitucionais que perpassam às distintas ordens jurídicas, sendo comuns a todas
elas, como, por exemplo, os problemas associados aos direitos humanos (“questões
transconstitucionais”).
O Transconstitucionalismo propõe, assim, a existência de Constituições que
dialogam entre si, não como precedente, mas como autoridade persuasiva (o que o
autor denomina de “fertilização constitucional cruzada” ou “relação transversal
permanente”).
Um exemplo prático, na jurisprudência brasileira, do diálogo entre
Constituições foi o reconhecimento do “Estado de Coisas Inconstitucional”
relativamente às prisões brasileiras, instituto originário da Corte Constitucional
Colombiana (STF. Plenário. ADPF 347 MC/DF, Rel. Min. Marco Aurélio, julgado em
9/9/2015). Outro exemplo foi a utilização do precedente argentino (caso “Verbitsy”)
como um dos argumentos para legitimar o cabimento de habeas corpus coletivo,
mesmo sem previsão legal expressa (HC 143641).

• Multiculturalismo (Boaventura de Souza Santos)

Os conceitos acima tratados (Neoconstitucionalismo, transconstitucionalismo)


também não podem ser confundidos com o fenômeno do multiculturalismo trazido
por Boaventura de Souza Santos.
Em síntese, o autor propõe uma verdadeira “fuga para o Sul” no âmbito da
teoria constitucional, objetivando a construção de um novo Constitucionalismo latino-
americano, por meio do que denomina “hermenêutica diatópica”.
A tônica do autor é a “descolonização do Direito Constitucional”,
especialmente nos países sul-americanos, por intermédio do diálogo intercultural, do
enfoque nos valores dos povos tradicionais, da concepção mestiça de direitos e da 20
valorização da participação democrática.

1.4. CONSTITUCIONALISMO E SOBERANIA POPULAR

A Constituição Federal de 1988 dispõe que todo poder emana do povo, que o
exerce por meio de seus representantes eleitos ou diretamente, nos termos desta
Constituição. Dessa forma, a titularidade do poder é do povo, podendo seu exercício se
dar de forma direta ou indireta.
A CF prevê como regra a Democracia Indireta (representativa), que é
exercida pelos representantes eleitos pelo voto popular.
Contudo, há mecanismos de exercício da Democracia Direta previstos
constitucionalmente, que possibilitam o exercício do poder diretamente pelo povo.
São estes: o referendo, o plebiscito, a iniciativa popular e a ação popular.
Confiram a previsão contida no art. 14 do texto constitucional:
“Art. 14. A soberania popular será exercida pelo sufrágio
universal e pelo voto direto e secreto, com valor igual para
todos, e, nos termos da lei, mediante:
I - plebiscito;
II - referendo;
III - iniciativa popular.”
1.4.1. PLEBISCITO

Regulado pela Lei 9.709/98, o plebiscito é uma consulta prévia à população,


convocado com anterioridade a ato legislativo ou administrativo, cabendo ao povo,
pelo voto, aprovar ou denegar o que lhe tenha sido submetido.
O plebiscito deve ser convocado por Decreto-Legislativo editado pelo
Congresso Nacional por proposta de no mínimo 1/3 de qualquer das casas.
A votação se dá por maioria simples e não passa por sanção do Presidente
(matéria exclusiva do Congresso, conforme art. 49, XV, da CF).
A doutrina diverge sobre a vinculação do Congresso à decisão do plebiscito.
Segundo Ayres Britto:
“O resultado do plebiscito não vincula o poder legislativo. E, de
fato, não vincula porque o Poder Legislativo não pode ser
obrigado a legislar. É diferente do Poder Judiciário, que é
obrigado a julgar. Enquanto no referendo quem dá a última
palavra é a população, a eficácia fica dependendo da aprovação,
no plebiscito, é diferente. O povo dá a primeira palavra, mas a
última é do parlamento”.
São exemplos de PLEBISCITO realizados no Brasil, sob a égide da Constituição
de 88: o plebiscito para escolha entre a forma de governo (República/Monarquia) e o
sistema de governo (Presidencialismo/Parlamentarismo) (1993) - Art. 2º do ADCT; o 21
plebiscito no Estado do Pará para decidir sobre a formação dos Estados de Carajás e do
Tapajós (2011).

1.4.2. REFERENDO

Também regulado pela Lei 9.709/98, o referendo é uma consulta posterior


que confirma uma decisão já tomada, devendo ser autorizado por Decreto-Legislativo
editado pelo Congresso (art. 49, XV, da CF) por proposta de no mínimo 1/3 de
qualquer das casas.
A votação se dá por maioria simples e não passa por sanção do Presidente
(matéria exclusiva do Congresso).
São exemplos de REFERENDO realizados no Brasil, sob a égide da Constituição
de 88: o referendo para a manifestação do eleitorado sobre a manutenção ou rejeição
da proibição da comercialização de armas de fogo e munição (2005) - Lei 10.826/2003
- Estatuto do Desarmamento; o referendo no Estado do Acre para decidir sobre o fuso
horário (2010).
1.4.3. INICIATIVA POPULAR

A iniciativa popular se dá por meio de projeto de lei encaminhado


diretamente pelo povo para seus representantes, também regulada pela Lei 9.709/98.
Fundamento:
- Lei Federal - art. 61, § 2º, da CF;
- Lei Estadual e Distrital - art. 27, § 4º, da CF; e
- Lei Municipal - art. 29, XIII, da CF.

Procedimento para Lei Federal - O projeto deve ser encaminhado para a


Câmera dos Deputados, por 1% do eleitorado nacional, distribuído em 5 Estados e em
cada um desses estados por 0,3% dos seus eleitores.

ATENÇÃO! DICA para memorização: número 1503.


1% do eleitorado, distribuído em 5 Estados, com 0,3% do eleitorado em cada um deles.

- Limitação de Assunto - art. 13, § 1º, da Lei nº 9.079/98 - O


projeto de iniciativa popular deve circunscrever-se a somente
um assunto.
22
- Impossibilidade de Vício de Forma - art. 13, § 2º, da Lei nº
9.079/98 - O projeto não poderá ser rejeitado por vício de
forma. A Câmara dos Deputados irá corrigi-lo formalmente.
Ressalta-se que em matéria de iniciativa reservada não cabe
iniciativa popular.
- Início do Processo de Votação e Vinculação - A casa iniciadora
é sempre a Câmara e o Senado é a casa revisora. A Câmara ou o
Senado não são obrigados a aprovar o projeto e o Presidente
pode vetá-lo. Dessa forma, o projeto não vincula o legislativo
nem o executivo.

Procedimento Estadual - A iniciativa estadual e distrital será definida pela


Lei. Normalmente, elas vêm utilizando simetria e aplicando o percentual 1% da mesma
forma que a Lei Federal. Entretanto, seria razoável flexibilizar esse valor.
Procedimento Municipal - No âmbito municipal o projeto deve ser subscrito
por no mínimo 5% do eleitorado municipal (art. 29, XIII, da CF).
OBSERVAÇÕES FINAIS:
PEC de Iniciativa Popular - O §2º do art. 60 da Constituição Federal não prevê
a possibilidade de PEC de iniciativa popular.
Pedro Lenza entende que, embora a Carta Política não tenha admitido de
forma expressa a iniciativa popular para PEC, tal situação é perfeitamente cabível. O
doutrinador em questão valeu-se da interpretação sistemática, fundamentando que o
art. 1º, parágrafo único, da CF, permite o exercício do poder de forma direta pelo
próprio povo, além de que o art. 14, III, da CF, estabelece que a soberania popular será
exercida mediante a iniciativa popular. Tal opinião também é comungada por José
Afonso da Silva, embora se trate de tema que divide a doutrina, sendo opinião
doutrinária minoritária.
Nesse sentido, muitas Constituições Estaduais permitem a propositura de
emenda à Constituição por iniciativa popular, o que foi considerado compatível com a
Constituição Federal, conforme recente julgado do Supremo Tribunal Federal:
“A iniciativa popular de emenda à Constituição Estadual é
compatível com a Constituição Federal, encontrando
fundamento no art. 1º, parágrafo único, no art. 14, II e III e no
art. 49, XV, da CF/88. Embora a Constituição Federal não
autorize proposta de iniciativa popular para emendas ao
próprio texto, mas apenas para normas infraconstitucionais,
não há impedimento para que as Constituições Estaduais
prevejam a possibilidade, ampliando a competência constante
da Carta Federal”.
STF. Plenário. ADI 825/AP, Rel. Min. Alexandre de Moraes,
julgado em 25/10/2018. 23
O julgado, frisa-se, refere-se à compatibilidade de dispositivo de Constituição
Estadual, que prevê PEC de iniciativa popular, com a Constituição Federal. Ainda não
houve o enfrentamento do tema quanto à possibilidade de emenda à própria
Constituição Federal por meio de iniciativa popular. Assim, atenção para o objeto de
eventual questionamento: se a questão se refere à literalidade da Constituição
Federal ou ao entendimento jurisprudencial/doutrinário específico.
Objeto da Iniciativa Popular - A iniciativa popular pode ser aplicada nas
seguintes espécies normativas do art. 59 da CF:
- PEC - Há controvérsia doutrinária, havendo precedente
admitindo para Constituição Estadual, como visto acima;
- LC e LO - Previsão expressa no art. 61, caput, da CF;
- Leis Delegadas - Não cabe, pois a competência é do Presidente;
- Medidas Provisórias - Não cabe, pois a competência é do
Presidente;
- Decretos Legislativos - Não cabe, pois a competência é do
Congresso Nacional;
- Resoluções - Não cabe, pois a competência é privativa do
Senado ou da Câmara.
Exemplos de leis decorrentes de iniciativa popular:
- Projeto do Fundo Nacional para a Moradia Popular - Lei
11.124/2005 - Foi de iniciativa popular;
- Lei da Ficha Limpa - LC 135/2010 - Foi de iniciativa popular

1.5. CONCEITO, CLASSIFICAÇÃO E ELEMENTOS DA CONSTITUIÇÃO

1.5.1. CONCEITOS DE CONSTITUIÇÃO


A. Concepções de constituição (doutrina clássica)

São inúmeras as classificações das Constituições. Neste material, vou me ater


às mais cobradas em provas, especialmente considerando o perfil do concurso da
Magistratura.
Sentido Sociológico - Ferdinand Lassale - A Constituição deve refletir as forças
sociais, sob pena de ser apenas uma “simples folha de papel” (sem valor). Dessa forma,
a Constituição é a somatória dos fatores reais do poder (forças econômicas, sociais,
políticas, religiosas), dentro de uma sociedade.
Sentido Político - Carl Schmitt - A Constituição é o documento que determina
as normas fundamentais e estruturais do Estado. A Constituição é decisão política
fundamental do titular do poder constituinte (teoria decisionista ou voluntarista). A
24
validade da Constituição, nesse sentido, basear-se-ia na decisão política que lhe dá
existência.
Dessa forma, as normas presentes na Constituição que não tratam da
estruturação e dos fundamentos do Estado são apenas uma lei constitucional, mas não
uma Constituição propriamente dita.
Este sentido se aproxima do conceito material de Constituição, que determina
que Constituição é aquilo que tem matéria de Constituição. Entretanto, o Brasil adota
o sentido formal, ou seja, aquilo que está na CF é Constituição, independentemente de
seu conteúdo.
APROFUNDANDO:
Atualmente, conforme parte da doutrina, o Brasil caminha para
um critério misto, assim, depende da forma e da matéria.
Isto ocorreu com a equiparação dos tratados internacionais
sobre direitos humanos aprovados com o quórum de emenda
(art. 5º, § 3º, da CF). Ex.: Decreto Legislativo 186/2008 e
Decreto 6.949/2009 - Convenção sobre os Direitos das Pessoas
com Deficiência e o seu protocolo facultativo (NY em 30 de
março de 2007).
Os tratados de direitos humanos aprovados antes da emenda
45 e aqueles não aprovados pelo quórum de emenda
constitucional têm caráter supralegal (Pacto de São José da
Costa Rica). Quaisquer outros tratados que tratem de matéria
diferente de direitos humanos têm natureza de lei ordinária.

Sentido Jurídico - Hans Kelsen - Esse autor aloca a Constituição no mundo do


“dever ser”, e não no mundo do “ser”, caracterizando-a como fruto da vontade
racional do homem. Para ele, o sistema normativo está organizado em uma pirâmide,
assim, cada norma busca sua validade na norma imediatamente superior. Dessa forma,
a concepção de Kelsen toma a Constituição em dois sentidos:
- Plano Lógico-jurídico (plano suposto) - Existência de uma
norma fundamental hipotética (plano da norma suposta). Essa
norma é o fundamento lógico transcendental da validade da
norma posta ou positivada.
- Plano Jurídico-positivo - Existência de norma posta,
positivada. A Constituição é a norma positivada suprema, que
serve para regular a criação de todas as outras.

Em resumo, para Kelsen, criador da Teoria Pura do Direito, a validade da


Constituição não se apoia na realidade social do Estado. O fundamento de validade da
Constituição está na norma hipotética fundamental, que é norma posta, pressuposta,
imaginada.
É como se Kelsen fizesse um “corte epistemológico” em sua teoria: cada 25
norma inferior retira seu fundamento de validade da norma imediatamente superior,
em um sistema escalonado de normas, até a Constituição. Ex.: o decreto regulamentar
retira seu fundamento de validade da lei que retira seu fundamento de validade da
Constituição, topo da pirâmide. E a Constituição, retira seu fundamento de onde? Da
norma hipotética fundamental, que estaria no campo da política e, portanto, não
interessaria ao Direito (Teoria Pura do Direito).
APROFUNDANDO:
A professora Flávia Piovesan sustenta o abandono do sistema
piramidal de Kelsen para a adoção de um sistema em formato
de trapézio. Nesse sistema, a Constituição divide o “topo” com
os tratados internacionais de direitos humanos (Human Rights
Approach).

Sentido Culturalístico - J. H. Meirelles Teixeira - Nessa acepção, a


Constituição é produto de um fato cultural produzido pela sociedade e que sobre ela
pode influir. A Constituição decorre de uma formação objetiva de cultura, incluindo
aspectos econômicos, sociológicos, jurídicos e filosóficos. Segundo o autor, esse
conceito conduz a uma Constituição total, a fim de abranger o seu conceito em uma
perspectiva unitária. Em resumo, para lembrar dessa classificação: “Constituição
condicionada e condicionante da cultura”.
Contraposta à Constituição unitária está a ideia de Constituição aberta. Esta é
a Constituição que permite uma constante atualização por meio de um processo de
interpretação (hermenêutica). Dessa forma, a Constituição evolui para evitar o
desmoronamento da sua força normativa (mutação constitucional - processo informal
de mudança interpretativa).

ATENÇÃO! MUTAÇÃO CONSTITUCIONAL.


Deriva do chamado “Poder Constituinte Derivado Difuso”. É possibilidade de
alteração informal do texto constitucional (mutação constitucional) de acordo
com a evolução histórica, política e social da comunidade. Em outras palavras, o
texto da Constituição permanece o mesmo, não houve emenda ou revisão
constitucional, mas a norma resultante de sua interpretação se alterou ao longo
do tempo.
Segundo o STF, três situações legitimam a mutação constitucional:
i) mudança na percepção do direito;
ii) modificação da realidade fática;
iii) consequência prática negativa de determinada linha de entendimento.
Exemplo de mutação constitucional, fruto do poder constituinte derivado difuso,
foi o novo entendimento dado ao art. 52, X, da Constituição Federal. Atualmente,
entende-se que quando o STF declara uma lei inconstitucional, ainda que em
controle difuso, a decisão tem efeito erga omnes e vinculante, cabendo ao Senado
Federal apenas dar publicidade à decisão (ADI 3406/RJ e ADI 3470/RJ). 26
Segundo Barroso, para que seja legítima, a mutação precisa ter lastro democrático, isto é,
deve corresponder a uma demanda social efetiva por parte da coletividade, estando
respaldada, portanto, pela soberania popular.

Constitucionalização Simbólica - Marcelo Neves – O Professor Marcelo Neves


alerta para o fato de que, na atividade legiferante, muitas vezes, há o predomínio da
função simbólica (ideológica, moral e cultural) sobre a função jurídico-instrumental
(força normativa), gerando um déficit de concretização das normas constitucionais. A
legislação simbólica se tipifica de acordo com um modelo tricotômico (Harald
Kindermann):
1) Confirmação dos Valores Sociais - Refere-se à vitória de um
determinado grupo social em relação a outro segmento social
conflitante (ex.: protestantes e católicos quanto à Lei Seca nos
EUA). Dessa forma, o grupo prestigiado procura influenciar a
atividade legiferante, fazendo prevalecer os seus valores contra
os do grupo adversário. É uma espécie de “superioridade social”
a partir das vitórias legislativas.
2) Demonstrar a Capacidade de Ação do Estado - Tem o
objetivo de assegurar confiança nos sistemas jurídico e político.
Configura-se por meio da chamada “legislação álibi” (são
respostas rápidas do governo diante de uma insatisfação da
sociedade, com pouca possibilidade de serem efetivas).
- Esta prática pode levar a sociedade a uma descrença no
sistema jurídico.
- Na CF, as normas programáticas podem ser consideradas
como “legislação álibi”, sendo o MI e a ADO um meio de
implementar essas normas.
3) Adiar a solução de conflitos sociais por meio de
compromissos dilatórios - A legislação busca conformar partes
conflitantes (lei aparentemente progressista), mas não acaba
com o conflito, apenas o envia para o futuro (compromissos
dilatórios).

Como base nessas premissas, Marcelo Neves define Constituição como uma
via de prestações recíprocas, um mecanismo de interpenetração entre política e
direito.
Atenção para mais uma classificação:
1) Constituição simbólica em sentido negativo: o texto
constitucional, de forma geral, não seria suficientemente
concretizado normativo-juridicamente de forma generalizada.
2) Constituição simbólica em sentido positivo: a atividade
constituinte e a linguagem constitucional desempenhariam
relevante papel político-ideológico, servindo para encobrir 27
conflitos e problemas sociais.

B. Outras concepções de constituição (UADI LAMMEGO BULOS)

As concepções de Constituição vistas no item anterior são as mais cobradas


em provas.
Contudo, importante atentar também para os seguintes conceitos que podem
ser cobrados em provas com maior aprofundamento doutrinário, e também em fases
mais avançadas do concurso.
Concepção jusnaturalista: A Constituição é concebida à luz dos princípios do
direito natural, principalmente no que concerne aos direitos humanos fundamentais.
Concepção positivista (Jellinek): A Constituição é o conjunto de normas
emanadas do poder do Estado, positivadas pela ação do homem, independentemente
de qualquer outro critério metajurídico.
Concepção marxista: A Constituição é o produto da superestrutura ideológica
condicionada pela infraestrutura econômica. É o exemplo de Constituição balanço, que
registra os estágios da relação de poder, ou seja, a cada passo da evolução, haverá
uma nova Constituição. É um conceito inverso da Constituição-garantia ou
Constituição-moldura.
Concepção compromissória: É aquela que reflete a pluralidade de forças
políticas e sociais, típica de uma sociedade plural e complexa e de conflitos profundos.
O procedimento constituinte envolve um tumultuado jogo de correntes divergentes,
mas que ao fim encontram o “compromisso constitucional”.
IMPORTANTE! Concepção suave ou dúctil (Zagrebelsky): É aquela que não
contém exageros, não fazendo promessas baseadas na demagogia política, porque
tem ambição de ser efetivamente realizada. As palavras chaves são equilíbrio e
moderação. Constituição-garantia é o principal modelo. Reflete o pluralismo social,
político e econômico.
As Constituições dúcteis veiculam conteúdos tendencialmente contraditórios
entre si, sem que se lhes possa traçar uma hierarquia rigorosa. Pelo contrário, eles
devem ser assim preservados, de modo a conceder ampla margem à configuração
legislativa, além de abertos a possíveis ponderações judiciais. Assim, estabelecem-se
mútuas relações entre legislador e juiz, política e justiça.
Constituição em branco: É aquela que não consagra limitações explícitas ao
poder de reforma constitucional. O processo de sua mudança subordina-se à
discricionariedade dos órgãos revisores. Um exemplo são as Constituições fixas.
Constituição plástica (Raul Machado Horta): É aquela que apresenta uma
mobilidade, projetando sua força normativa na realidade social, política, econômica e
cultural do Estado. Revela uma maleabilidade que permite a adequação de suas
normas. Tanto as cartas rígidas como as flexíveis podem ser plásticas, já que a
possibilidade de adequação nada tem a ver com o procedimento de reforma. O seu
quid caracterizador é sempre a adaptação das normas constitucionais às oscilações
da vida real. Interligam-se profundamente com o fenômeno da mutação 28
constitucional.
Constituição como ordem material e aberta da comunidade (Hesse): As
Constituições devem criar fundamentos e normatizar os princípios diretores da
unidade política do Estado, regulando o processo de solução de conflitos da
comunidade historicamente construídos. Possui, nesse viés, um conteúdo vago,
impreciso, aberto e material, que deve se adaptar às necessidades do tempo,
garantindo o exercício das liberdades. O texto aberto, atuando diretamente na
realidade social, atribui à Constituição efetividade e força normativa.
Liga-se ao conceito de “sociedade aberta dos intérpretes da Constituição”,
que pressupõe que todo aquele que vive no contexto regulado por uma norma e que
vive com este contexto é, indireta ou até mesmo diretamente, intérprete dessa norma.
Em outras palavras, o destinatário da norma também é participante ativo do processo
hermenêutico, não sendo monopólio dos intérpretes jurídicos.
Constituição dirigente (Canotilho): A Constituição dirigente considera que os
problemas econômicos, sociais e científicos são, simultaneamente, problemas
constitucionais suscetíveis de conformação e resolução por meio de decisões político-
constitucionais vinculativas das decisões tomadas pelo poder político, reconhecendo o
caráter de impulso e incentivo ao bloco normativo-programático contemplado em seu
texto. Contempla definição programático-constitucional dos fins e tarefas do Estado
que não elimina o poder de conformação da maioria simples em que eventualmente
se apoia um governo, nem impede a renovação da direção política e a confrontação
pluripartidária. Por essa razão, enseja a dedução de pretensões à legislação e o
correspondente direito de ação perante os tribunais, que, todavia, não resultam na
substituição do juiz ao legislador com a consequente emanação judicial de uma norma
nem pela correção incidental da omissão legislativa. O objetivo, portanto, é dirigir a
ação governamental do Estado a partir de um programa de ação. A Constituição é o
“estatuto jurídico político”, que adota uma filosofia de ação normativa para o Estado e
sociedade. Por traçar diretrizes para a atuação estatal, a constituição-dirigente está
relacionada às chamadas normas programáticas e aos direitos fundamentais de
segunda geração/dimensão, que exigem atuação positiva do Estado.
Constituições subconstitucionais ou subconstituições (Kruger): As
Constituições são programas de integração e representação nacionais, que devem
entrar na consciência dos cidadãos. E por isso, somente devem trazer aquilo que
interessa à sociedade como um todo. O totalitarismo constitucional incha a
constituição e foge do sentido exato da palavra. O autor explica que o excesso de
normas constitucionais forma as subconstituições, que podem ser definidas como
conjunto de normas que, mesmo elevadas formalmente ao patamar constitucional,
são limitadas nos seus objetivos e na sua efetividade. Revelam uma espécie de
“constituição necessidade” preocupada com problemas momentâneos.
Constituição como documento regulador do sistema político (Luhmann): A
Constituição é instrumento que serve para reduzir a complexidade do sistema político,
buscando uma reflexão de funcionalidade do direito. Não basta analisar o vínculo de
conformidade das leis com a constituição – juízos de constitucionalidade – sendo
necessário que a constituição funcione como campo de contingência de autofixação do
sistema político.
Constituição como processo público (Haberle): A Constituição é o documento
29
fundamental de uma sociedade pluralista e aberta, obra de vários partícipes. A
Constituição é uma ordem fragmentária, passível de interpretação e descontínua. É o
reflexo de um processo interpretativo aberto e conduzido à luz da força normativa da
publicidade.
Constituição.com (crowdsourcing): É o projeto que conta com a opinião
maciça dos usuários da internet, permitindo maior participação popular, consciência
dos temas constitucionais e o princípio da transparência. A primeira foi a Carta
Islandesa.

1.5.2. CLASSIFICAÇÃO DAS CONSTITUIÇÕES

O tema foi abordado na última prova objetiva da PCSP!

Quanto à Origem:
a) Promulgadas - São as Constituições que têm origem
democrática. Alguns chamam de votada ou popular (ex.: CF
1891; 1934; 1946; e 1988). Elaboradas por uma assembleia
nacional constituinte em nome do povo, pelo povo e para o
povo.
b) Outorgadas - São aquelas que foram impostas de maneira
unilateral por um agente revolucionário, assim não recebem
legitimidade popular (ex.: CF 1824, 1937, 1967 e emenda 1/69).
c) Cesaristas - Existe uma autorização popular por meio de
plebiscito ou referendo, mas o texto da Constituição é forçado
por um poder ditatorial (ex.: plebiscito napoleônicos e de
Pinochet no Chile). Também chamadas de napoleônicas ou
bonapartistas.
d) Pactuadas - Estas decorrem de um pacto entre os vários
titulares de poder (ex.: Magna Carta de 1215 na Inglaterra -
Decorreu de um pacto entre Realeza e Burguesia).

Quanto à Forma:
a) Escritas (instrumentalizada) - São aquelas sedimentadas em
documentos solenes, formais (ex.: CF 1988). Em algumas
Constituições escritas existe uma grande influência dos
costumes, como nos EUA. Podem ser codificadas ou legais.
b) Não escritas - Estas não trazem regras em um único texto
solene e codificado. É formada por textos esparsos,
reconhecidos pela sociedade como fundamentais. Além disso,
baseiam-se nos usos, costumes, jurisprudência e convenções
(ex.: Constituição Inglesa).
30

Quanto à Extensão:
a) Sintéticas (concisas, breves, sumárias, sucintas, básicas) - O
texto da Constituição é principiológico e não se funda em
detalhes. Esta espécie de Constituição tem maior manutenção
do texto no ordenamento (ex.: EUA).
b) Analíticas (amplas, extensas, largas) - O texto da
Constituição é minucioso. Esta espécie de Constituição está
sujeita a uma maior modificação dada a evolução social (ex.: CF
1988).

Quanto ao Modo de Elaboração:


a) Dogmáticas - Estas se fundam nos grandes dogmas que são
sedimentados no texto escrito (ex.: CF 1988). São escritas,
elaboradas por um órgão constituído para esta finalidade,
segundo os dogmas e valores então em voga.
b) Históricas - São formadas por um processo lento e contínuo
ao longo do tempo, reunindo a história e as tradições de um
povo. Obs.: as Constituições históricas são juridicamente
flexíveis, mas normalmente são política e socialmente rígidas.
Quanto à Alterabilidade (mutabilidade ou estabilidade):
a) Rígidas - Estas são alteradas por um processo mais solene e
mais dificultoso que o processo de alteração das demais
espécies normativas infraconstitucionais (ex.: CF de 1988 - art.
60). Segundo o STF, a Constituição de 1988 é considerada rígida.
Obs.: A Constituição rígida é sempre escrita, mas a recíproca
não é verdadeira.
b) Flexíveis - Estas são alteradas por um processo igual ao das
espécies normativas infraconstitucionais. Dessa forma, a
Constituição tem a mesma hierarquia da lei. Nesse caso, não
existe controle de constitucionalidade, pois um dos
pressupostos do controle de constitucionalidade é justamente
a rigidez constitucional.
c) Superrígidas - Estas são alteradas por um processo mais
solene e mais dificultoso que o processo de alteração das
demais espécies normativas infraconstitucionais. Além disso,
possuem um núcleo duro imutável (alguns autores afirmam
que a CF de 1988 é superrígida).
d) Semirrígidas ou semiflexíveis - Estas Constituições possuem
processo diferenciado para algumas normas e processo comum
para outras (CF de 1824 - art. 178).
e) Fixas (silenciosas) - Kildare - Estas somente podem ser 31
alteradas por um procedimento igual ao que as criou (ex.:
Estatuto do Reino da Sardenha de 1948 e Carta Espanhola). São
consideradas silenciosas, pois não mencionam sua forma de
alteração.
f) Transitoriamente Flexíveis - São aquelas que durante um
período são flexíveis e depois se tornam rígidas (ex.: Carta
Irlandesa de 1937).
g) Imutáveis (permanentes, graníticas) - Aquelas que
pretendem ser inalteráveis e eternas (são apenas históricas).

Quanto à Sistemática (Pinto Ferreira):


a) Reduzidas (unitárias) - São aquelas que se materializam por
meio de um só código básico (ex.: CF de 1988).
- Paulo Bonavides as chama de “Codificadas”.
b) Variadas - São aquelas que se materializam por meio de
textos esparsos (ex.: Inglesa).
- Paulo Bonavides as chama de “Legais” ou “Escritas não
formais”.
Quanto à Dogmática (Paulino Jacques):
a) Ortodoxas - São aquelas formadas por uma só ideologia (ex.:
URSS de 1977).
b) Ecléticas/heterodoxas - São aquelas formadas pela
conciliação de várias ideologias (ex.: CF de 1988).
- Segundo Canotilho, é aqui que reside o caráter
compromissório da CF. Este se evidencia na busca pela
conciliação entre ideologias diferentes (ex.: Liberalismo vs.
Estado Social).
IMPORTANTE! Quanto à Essência (Loewenstein) ou correspondência com a
realidade política e social (classificação ontológica):
a) Normativas - O processo de poder está de tal forma
disciplinado que as relações políticas e os agentes do poder
subordinam-se às determinações do seu conteúdo e do seu
controle procedimental (espera-se do texto 1988).
b) Nominalistas (ou nominais) - Contêm disposições de
limitações e controle de dominação política, sem ressonância
na sistemática de processo real de poder, e com insuficiente
concretização constitucional.
c) Semânticas - São simples reflexos da realidade política,
servindo como mero instrumento dos donos do poder e das 32
elites políticas, sem limitação do seu conteúdo (texto de 1937 e
1967).
- Marcelo Neves prefere a expressão instrumentalista.

Quanto ao Sistema (Diogo de Figueiredo Moreira Neto):


a) Principiológicas - Prevalecem os princípios, identificados
como normas constitucionais providas de alto grau de
abstração, consagradores de valores, pelo que é necessária a
mediação concretizadora (ex.: CF de 1988).
b) Preceituais - Prevalecem as regras individualizadoras de
princípios, pelo que é possível a aplicação coercitiva (ex.:
Constituição mexicana).

Classificação de Manoel Gonçalves F. Filho:


a) Garantia - Estas buscam garantir a liberdade limitando o
poder (ex.: CF de 1988). O objetivo da Constituição-garantia é
proteger as liberdades públicas contra a arbitrariedade do
Estado (correspondem ao primeiro período de surgimento dos
direitos humanos).
b) Balanço - Estas fazem um balanço de tempos em tempos da
evolução socialista (ex.: URSS). A Constituição-balanço visa
reger o ordenamento durante um certo tempo. Transcorrido
esse prazo, é elaborada uma nova Constituição e seu texto é
adaptado. Também chamada de Constituição-registro.
c) Dirigente - Estas são compostas por normas programáticas
(planos e programas a serem cumpridos) - (ex.: CF de 1988).
- Possui inspiração Marxista, ou seja, preza por um “ideal a ser
concretizado”.

Classificação de Ramos Tavares - Quanto ao Conteúdo Ideológico:


a) Liberais (negativas) - Surgem com o triunfo das ideologias
burguesas (ideias liberais). Dessa forma, privilegiam direitos de
primeira dimensão. São, assim, Constituições negativas
(absenteísmo estatal).
b) Sociais (dirigentes) - São ligadas ao Estado Social de Direito
(ex.: CF 1988). Consagram atuações sociais do Estado.
Privilegiam direitos de segunda dimensão.

Teoria de Raul Machado Horta - Expansividade da Constituição - A


expansividade da CF de 1988, em função dos temas novos e da ampliação conferida a
temas permanentes, como no caso dos direitos e garantias fundamentais, pode ser
aferida em três planos distintos: 33
a) Conteúdo anatômico e estrutural da CF (anatomia) -
Expansiva é aquela que está bem dividida em capítulos, títulos
etc.
b) Comparação constitucional interna - Considera as
Constituições brasileiras precedentes, considerando a extensão
de cada uma e as suas alterações. A CF de 1988 comparada
com as outras brasileiras é expansiva.
c) Comparação constitucional externa - Considera as
Constituições internacionais. A CF de 1988 comparada com
outras internacionais também é expansiva.

Outras classificações:
a) Constituição-lei: tem status de lei ordinária.
b) Constituição-fundamento: liberdade do legislador é apenas
dar efetividade às normas constitucionais.
c) Constituição-quadro/constituição-moldura: legislador só
pode atuar dentro de determinado espaço estabelecido pelo
poder constituinte. Cabe à jurisdição constitucional verificar se
esses limites foram obedecidos.
1.5.3. ELEMENTOS DA CONSTITUIÇÃO

Definição - São critérios de classificação das normas de José Afonso da Silva.


Buscam agrupar as normas que tenham a mesma origem e a mesma finalidade.
Segundo o autor, a CF tem uma natureza polifacética, pois possui normas que
apresentam valores distintos.
Elementos Orgânicos - São normas que regulam a estrutura do Estado e do
Poder. Ex.: Título III - Organização do Estado; Título IV - Organização dos poderes.
Elementos Limitativos - São normas que estabelecem direitos e garantias
fundamentais limitadores dos poderes estatais. Ex.: Título II - Dos Direitos e Garantias
Fundamentais (excetuando-se os direitos sociais).
Elementos Socioideológicos - Revelam o compromisso da Constituição entre
o Estado Individualista e o Estado Social Intervencionista. Ex.: Capítulo II do Título II -
Dos Direitos Sociais; Título VII - Da Ordem Econômica e Financeira.
Elementos de Estabilização - Normas que definem mecanismos de
estabilização diante de crises. São destinadas a solucionar conflitos e buscam a defesa
da CF, do Estado e das Instituições Democráticas. Ex.: Art. 102, I, “a”, da CF - ADIN; Art.
34 a 36 da CF - Da Intervenção nos Estados e Municípios.
Elementos Formais de Aplicabilidade - Referem-se às normas de aplicação da
Constituição. Ex.: Preâmbulo, ADCT, Art. 5º, § 1º, da CF.
34
1.6. ESTRUTURA DAS CONSTITUIÇÕES

1.6.1. PREÂMBULO

O preâmbulo é a parte que antecede o texto constitucional e define as


intenções do legislador constituinte, sintetizando a ideologia do poder constituinte.
Serve de integração e orienta a interpretação.
O preâmbulo, embora parte integrante da Constituição, com a mesma origem
dos demais dispositivos constitucionais, costuma ser diferenciado por sua eficácia e
papel desempenhado.
De acordo com o entendimento do Supremo Tribunal Federal (STF), por ser
destituído de valor normativo e força cogente, o preâmbulo não pode ser invocado
como parâmetro para o controle de constitucionalidade de leis e atos normativos.
Vejamos:
“Preâmbulo da Constituição: não constitui norma central.
Invocação da proteção de Deus: não se trata de norma de
reprodução obrigatória na Constituição estadual, não tendo
força normativa.” (grifo nosso)
[ADI 2.076, rel. min. Carlos Velloso, j. 15-8-2002, P, DJ de 8-8-
2003.]
Segundo o STF, o preâmbulo não tem caráter vinculante, situando-se no
âmbito da política. Adota-se, portanto, a teoria da irrelevância jurídica do preâmbulo.

1.6.2. PARTE DOGMÁTICA

É o texto constitucional propriamente dito, o corpo permanente da Constituição.

1.6.3. PARTE TRANSITÓRIA

A parte transitória visa a integrar a ordem jurídica antiga à nova. É


formalmente constitucional, embora no texto da Constituição apresente numeração
apartada. Assim como a parte dogmática, pode servir de paradigma para o controle de
constitucionalidade.

1.7. NORMAS CONSTITUCIONAIS PROGRAMÁTICAS

Luis Roberto Barroso destaca que, com o surgimento do Estado


intervencionista e a consequente introdução de normas de cunho social na
Constituição, foram estabelecidos direitos a serem concretizados no presente, que são 35
os denominados direitos sociais. Contemplaram-se, também, certos interesses, de
caráter prospectivo, orientadores de posições, desde logo observáveis, e foram
implantadas projeções de comportamentos, a serem efetivadas de forma progressiva,
dentro das possibilidades do Estado e da sociedade. Surgiram, assim, as denominadas
normas programáticas. As normas programáticas destinam-se aos órgãos estatais com
a finalidade de fixar os programas que guiarão os poderes públicos, e relacionam-se à
concepção de Constituição Dirigente.
A norma constitucional programática possui eficácia limitada, necessitando de
um ato normativo para sua concretização (lei integrativa infraconstitucional) e para
produzir plenos efeitos. Contudo, mesmo tendo eficácia mediata, as normas
programáticas são dotadas de eficácia jurídica, uma vez que revogam as leis anteriores
com ela incompatíveis, condicionam a atuação da administração pública e a edição de
legislação futura, servem de vetores de interpretação e aplicação das demais leis pelo
Poder Judiciário etc.
Assim, apesar de não gerarem imediatamente um direito público subjetivo
para o indivíduo, as normas programáticas consagram um “direito subjetivo negativo”,
resultando na possibilidade de se exigir que o poder público se abstenha de praticar
atos que com elas colidam.
1.8. PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS

O tema foi abordado na última prova objetiva da PCSP!

A CF/88 consagra, no Título I, os Princípios Fundamentais da República


Federativa do Brasil, os quais estabelecem a forma, a estrutura e os fundamentos do
Estado brasileiro (CF, art. 1.º), a divisão dos poderes (CF, art. 2.º), os objetivos
primordiais a serem perseguidos (CF, art. 3.º) e as diretrizes a serem adotadas nas
relações internacionais (CF, art. 4.º).
A) Princípios Estruturantes:
CF, art. 1.º A República Federativa do Brasil, formada pela união
indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal,
constitui-se em Estado Democrático de Direito (...).
Os princípios estruturantes constituem e indicam as diretrizes fundamentais
informadoras de toda a ordem constitucional. Assim, passaremos a analisar os
princípios estruturantes consagrados no caput do artigo 1º da Constituição da
República, os quais expressam as decisões políticas fundamentais do legislador
constituinte em relação à forma e à organização do Estado brasileiro.
i. Princípio republicano 36
No Brasil, a proclamação da República ocorreu em 15 de novembro de 1889,
resultando no fim do regime imperial. Como já visto, no âmbito constitucional, essa
forma de governo é inaugurada com o advento da Constituição de 1891, tendo todas
as posteriores cartas políticas brasileiras seguido o mesmo caminho.
A República (do latim res publica: “coisa do povo”) surgiu como uma forma de
governo em oposição à Monarquia, com a finalidade de retirar a concentração de
poder das mãos do Rei.
A República se caracteriza pelo caráter representativo dos governantes,
inclusive do Chefe de Estado (representatividade), pela necessidade de alternância no
poder (temporariedade ou alternância) e pela responsabilização política, civil e penal
de seus detentores (responsabilidade). A forma republicana de governo possibilita a
participação dos cidadãos, direta ou indiretamente, no governo e na administração
pública.
ii. Princípio federativo
A forma federativa de Estado tem sua origem a partir de um pacto celebrado
entre Estados que cedem sua soberania para o ente central e passam a ter autonomia
nos termos estabelecidos pela Constituição. Há, portanto, a incidência de mais de uma
esfera de poder sobre a população e dentro de um mesmo território.
O princípio federativo, que tem como núcleo essencial o respeito à autonomia
constitucionalmente conferida a cada ente integrante da federação, deve ser
observado tanto no âmbito de elaboração quanto no de aplicação das normas.
iii. Princípio da indissolubilidade do pacto federativo
O princípio da indissolubilidade do pacto federativo tem por finalidade
conciliar a descentralização do poder político com a preservação da unidade nacional.
Ao estabelecer que a República Federativa do Brasil é formada pela união indissolúvel
dos Estados, Distrito Federal e Municípios, a Constituição veda, aos entes que
compõem a federação brasileira, o direito de secessão.
Caso ocorra tentativa de rompimento da unidade da federação brasileira, é
permitida a intervenção federal com o objetivo de manter a integridade nacional (CF,
art. 34, I).

OBSERVAÇÃO: a forma federativa de Estado é uma cláusula pétrea explícita,


prevista no inciso I do § 4º do artigo 60 da CF/88.

iv. Princípio do Estado democrático de direito


De acordo com a doutrina, a primeira institucionalização, com certo caráter
geral, do Estado de Direito ocorre com a Revolução Francesa. A limitação do Estado
pelo direito com distribuição das funções em órgãos distintos (separação dos poderes)
é um dos aspectos distintivos em relação ao modelo anterior.
Com o fim da Segunda Guerra Mundial, surge um novo modelo de Estado que
tem como notas distintivas a introdução de novos mecanismos de soberania popular, a 37
garantia jurisdicional da supremacia da Constituição, a busca pela efetividade dos
direitos fundamentais e ampliação do conceito de democracia. A tensão entre a nova
configuração do Constitucionalismo e o conceito meramente formal de democracia,
tradicionalmente associado às forças majoritárias, promove o desenvolvimento de
uma dimensão substancial da democracia, a fim de assegurar que os direitos
fundamentais sejam efetivamente usufruídos por todos, inclusive pelas minorias
perante a vontade majoritária.
A fim de destacar a mudança do paradigma de Estado, anteriormente,
associado à ideia de “império da lei” (Estado de direito), passa-se a ter na supremacia
da Constituição sua característica nuclear (Estado constitucional). No Estado
constitucional de direito, a Constituição é a norma mais elevada, não apenas sob o
ponto de vista formal, mas também substancial.
B) Fundamentos da República Federativa do Brasil:
CF, art. 1.º A República Federativa do Brasil (…) tem como
fundamentos:
I - a soberania;
II - a cidadania;
III - a dignidade da pessoa humana;
IV - os valores sociais do trabalho e da livre-iniciativa;
V - o pluralismo político.
ATENÇÃO! DICA para memorização dos fundamentos: So-Ci-Di-Va-Plu.

Os fundamentos de um Estado devem ser compreendidos como os valores


essenciais que compõem sua estrutura. A consagração expressa da soberania, da
cidadania, da dignidade da pessoa humana, dos valores sociais do trabalho e da livre
iniciativa e do pluralismo político como fundamentos da República Federativa do Brasil
atribui a esses valores especial significado dentro de nossa ordem constitucional.
Os princípios nos quais esses fundamentos se materializam desempenham um
importante papel, seja de forma indireta, atuando como diretriz para a elaboração,
interpretação e aplicação de outras normas do ordenamento jurídico, seja de forma
direta, quando utilizados como razões para a decisão de um caso concreto.
i. Soberania
Atualmente, a soberania estatal passou a ser definida como um poder político
supremo e independente. Supremo, por não estar limitado por nenhum outro poder
na ordem interna (soberania interna); independente, por não estar submetido, na
ordem internacional, a regras que não sejam voluntariamente aceitas e por estar em
igualdade com os poderes supremos dos outros povos (soberania externa).
Vale ressaltar que o desenvolvimento dos meios de comunicação e de
informação, bem como a globalização política e econômica, fizeram com que o 38
conceito de soberania fosse flexibilizado, causando uma crise na delimitação deste
conceito e impondo sua reavaliação.
ii. Cidadania
A cidadania decorre do princípio do Estado Democrático de Direito e consiste
na participação política do indivíduo nos negócios do Estado e, até mesmo, em outras
áreas de interesse público.
iii. Dignidade da pessoa humana
Núcleo axiológico do Constitucionalismo contemporâneo, a dignidade da
pessoa humana é considerada o valor constitucional supremo e, enquanto tal, deve
servir, não apenas como razão para a decisão de casos concretos, mas principalmente
como diretriz para a elaboração, interpretação e aplicação das normas que compõem a
ordem jurídica.
O reconhecimento e a proteção da dignidade da pessoa humana pelas
Constituições em diversos países ocidentais tiveram aumento após a Segunda Guerra
Mundial, como forma de reação às práticas ocorridas durante o nazismo e o fascismo,
bem como durante as ditaduras ao redor do mundo.
O fato de a dignidade ter um caráter absoluto - isto é, não comportar
gradações no sentido de existirem pessoas com maior ou menor dignidade - não
significa que a dignidade humana seja um princípio absoluto. Apesar de ter um peso
elevado na ponderação, o seu cumprimento, assim como o de todos os demais
princípios, ocorre em diferentes graus, de acordo com as possibilidades fáticas e
jurídicas existentes.
É possível afirmar que a dignidade da pessoa humana, enquanto fundamento
da República Federativa do Brasil, possui tripla dimensão normativa:
i. atua como diretriz a ser observada na criação e interpretação
de outras normas;
ii. é um princípio que impõe aos poderes públicos o dever de
proteção da dignidade e de promoção dos valores, bens e
utilidades indispensáveis a uma vida digna; e
iii. é uma regra, a qual determina o dever de respeito à
dignidade, seja pelo Estado, seja por terceiros.

Existe uma relação de mútua dependência entre a dignidade da pessoa


humana e os direitos fundamentais. A dignidade é o fundamento, a origem e o ponto
comum entre os direitos fundamentais, os quais são imprescindíveis para uma vida
digna.
Vale ressaltar que existe corrente doutrinária segundo a qual a dignidade da
pessoa humana não seria classificada como princípio, mas sim como postulado
normativo (metanorma), que serve para aplicação e interpretação geral de todo o
Direito. Em alguns julgados do STF, inclusive, verifica-se a adoção da expressão
“postulado da dignidade da pessoa humana”.
iv. Valores sociais do trabalho e da livre iniciativa
Além do reconhecimento dos valores sociais do trabalho como um dos 39
fundamentos do Estado brasileiro, a Constituição também reconhece o trabalho como
um direito social fundamental (CF, art. 6º), conferindo uma extensa proteção aos
direitos dos trabalhadores (CF, arts. 7º ao 11). A consagração dos valores sociais do
trabalho impõe, ainda, ao Estado o dever de proteção das relações de trabalho contra
qualquer tipo de aviltamento ou exploração.
A livre iniciativa é um princípio básico do liberalismo econômico. Além de
fundamento da República Federativa do Brasil, a livre iniciativa está consagrada como
princípio informativo e fundante da ordem econômica (CF, art. 170), sendo
constitucionalmente “assegurado a todos o livre exercício de qualquer atividade
econômica, independentemente de autorização de órgãos públicos, salvo nos casos
previstos em lei” (CF, art. 170, parágrafo único). A ordem econômica tem por
finalidade assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social
(CF, art. 170).
v. Pluralismo político
Consagrado na Constituição de 1988 como um dos fundamentos da República
Federativa do Brasil (CF, art. 1º , V), o pluralismo político, em sentido amplo,
compreende: o pluralismo econômico (economia de mercado; concorrência de
empresas entre si; setor público distinto do privado); o pluralismo político-partidário
(existência de vários partidos ou movimentos políticos que disputam entre si o poder
na sociedade) e o pluralismo ideológico (diversas orientações de pensamento; diversos
programas políticos e opinião pública não homogênea).
C) Objetivos Fundamentais (art. 3º)
CF, art. 3º Constituem objetivos fundamentais da República
Federativa do Brasil:
I - construir uma sociedade livre, justa e solidária;
II - garantir o desenvolvimento nacional;
III - erradicar a pobreza e a marginalização e reduzir as
desigualdades sociais e regionais;
IV - promover o bem de todos, sem preconceitos de origem,
raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de
discriminação.

Diversamente dos fundamentos (art. 1º), que são valores estruturantes do


Estado brasileiro, os objetivos fundamentais consistem em algo a ser perseguido pelo
Estado na maior medida possível.
De acordo com o professor Novelino, “a construção de uma
sociedade justa e solidária (princípio da solidariedade) e a
busca pela redução das desigualdades sociais e regionais estão
associadas à concretização do princípio da igualdade, em seu
aspecto substancial (igualdade material). Nesse sentido,
legitimam a adoção de políticas afirmativas (ações afirmativas
ou discriminações positivas) por parte do Estado. A promoção 40
do bem de todos, sem quaisquer formas de preconceito e
discriminação, está diretamente relacionada à proteção e
promoção da dignidade da pessoa humana e ao respeito às
diferenças, como exigência do pluralismo. A erradicação da
pobreza é uma das muitas concretizações do princípio da
dignidade da pessoa humana, por estar indissociavelmente
relacionada à promoção de condições dignas de vida”.

Ainda, vale ressaltar que o rol de objetivos fundamentais constante do artigo


3º da Constituição é apenas exemplificativo.

ATENÇÃO! Dica para provas objetivas: observe que os objetivos fundamentais da


República iniciam-se com verbos, como “construir, garantir, etc.”.

D) Princípio da Separação dos Poderes:


CF, art. 2º São Poderes da União, independentes e harmônicos
entre si, o Legislativo, o Executivo e o Judiciário.
No sistema de freios e contrapesos (checks and balances), a repartição
equilibrada dos poderes entre os diferentes órgãos é feita de modo que nenhum deles
possa ultrapassar os limites estabelecidos pela Constituição sem ser contido pelos
demais.
A Constituição de 1988, além de consagrar expressamente o princípio da
separação dos poderes (CF, art. 2º) e protegê-lo como cláusula pétrea (CF, art. 60, § 4º,
III), estabeleceu atribuições de controle recíproco, de forma a garantir a independência
entre os Poderes, bem como evitar o abuso e o arbítrio por qualquer um deles.
Em regra, a aplicação do princípio em questão é casuística, sendo necessário
extrair da própria Constituição a marca essencial para fins de controle de
constitucionalidade.

E) Princípios a serem observados nas relações internacionais (art. 4º)


CF, art. 4º A República Federativa do Brasil rege-se nas suas
relações internacionais pelos seguintes princípios:
I - independência nacional;
II - prevalência dos direitos humanos;
III - autodeterminação dos povos;
IV - não intervenção;
V - igualdade entre os Estados; 41
VI - defesa da paz;
VII - solução pacífica dos conflitos;
VIII - repúdio ao terrorismo e ao racismo;
IX - cooperação entre os povos para o progresso da
humanidade;
X - concessão de asilo político.
Parágrafo único. A República Federativa do Brasil buscará a
integração econômica, política, social e cultural dos povos da
América Latina, visando à formação de uma comunidade latino-
americana de nações.
José Afonso da Silva identifica quatro inspirações para este rol de princípios
que devem reger o Estado brasileiro em suas relações internacionais: a de caráter
nacionalista, expressa nas ideias de independência nacional, de autodeterminação dos
povos, de não intervenção e de igualdade entre os Estados; a de caráter
internacionalista, revelada na determinação de prevalência dos direitos humanos e de
repúdio ao terrorismo e ao racismo; a de caráter pacifista, exteriorizada nos
dispositivos que determinam a defesa da paz, de solução pacífica dos conflitos e a
concessão de asilo político; e a de caráter comunitarista, observada nas ideias de
cooperação entre os povos para o progresso da humanidade e no estímulo à formação
de uma comunidade latino-americana de nações.
1.9. DISPOSIÇÕES CONSTITUCIONAIS TRANSITÓRIAS

Conforme visto acima, a finalidade do ADCT é estabelecer regras de transição


entre o antigo ordenamento jurídico e o novo, instituído pela manifestação do poder
constituinte originário.
Por natureza, portanto, diante de sua eficácia temporária, após produzirem os
seus efeitos, ou diante do advento da condição ou termo estabelecidos, esgotam-se,
tornando-se normas de eficácia exaurida.
De acordo com o doutrinador Raul Machado Horta, "norma permanente nas
Disposições Transitórias é norma anômala”.

1.9.1. CLASSIFICAÇÃO DAS DISPOSIÇÕES DO ADCT

Raul Machado Horta identificou as seguintes categorias:


a) normas exauridas: aquelas que já desapareceram, em virtude
da realização da condição ou do ato nela previstos;
b) normas dependentes de legislação e de execução;
c) normas dotadas de duração temporária expressa. Ex.: art. 40
do ADCT, que manteve, por 25 anos, a partir da promulgação
da Constituição, a Zona Franca de Manaus (prazo esse
42
acrescido de 10 anos pela EC n. 42/2003);
d) normas de recepção. Ex.: art. 34, § 5º; art. 66 etc.;
e) normas sobre benefícios e direitos. Ex.: arts. 53 e 54.

Por sua vez, Luís Roberto Barroso, identificando espécies distintas de


disposições transitórias, estabeleceu três categorias:
a) disposições transitórias propriamente ditas: são as
disposições típicas que regulam de modo transitório
determinadas relações, estando sujeitas à condição resolutiva
ou termo.
b) disposições de efeitos instantâneos e definitivos: essas
disposições não aguardam uma condição ou um termo,
operando imediatamente ou no prazo estabelecido. Como
exemplo, temos o art. 13, caput, do ADCT, que criou o Estado
do Tocantins, ou o art. 15, que extinguiu o Território Federal de
Fernando de Noronha, reincorporando a sua área ao Estado de
Pernambuco;
c) disposições de efeitos diferidos: são aquelas que “sustam a
operatividade da norma constitucional por prazo determinado
ou até a ocorrência de um determinado evento”. Como
exemplo, temos o art. 5º, caput, do ADCT.
O ADCT tem natureza jurídica de norma constitucional e poderá, portanto,
trazer exceções às regras colocadas no corpo da Constituição.
As normas constantes do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias
possuem a mesma hierarquia daquelas consagradas na parte permanente e podem ser
paradigma de controle de constitucionalidade concentrado.
Neste sentido:
“Como cediço, o preâmbulo da CF não pode servir de
parâmetro para o controle de constitucionalidade, ao passo
que as normas que compõem o Ato das Disposições
Constitucionais Transitórias, salvo as que tenham sua eficácia
exaurida, podem ser usadas como paradigma de controle em
razão de sua natureza de norma constitucional.” (STF, RE
215.107/PR, Segunda Turma, Rel. Min. Celso de Mello, j.
21/11/2006, p. DJ 02/02/2007)
Assim, em virtude de sua natureza constitucional, a alteração das normas do
ADCT ou o acréscimo de novas regras dependerão da manifestação do poder
constituinte derivado reformador, ou seja, necessariamente por meio de emendas
constitucionais que, por sua vez, deverão observar os limites ao poder de reforma.

43
2. QUESTÕES

1. A ressignificação das Constituições provocou deslocamentos importantes na


compreensão da ordem jurídica dos Estados democráticos de direito. Acerca do
impacto dessas transformações sobre o conceito de Constituição, assinale a opção
correta.
a) Segundo a doutrina pertinente, a Constituição normativa, ou jurídica, é aquela na
qual o processo político é regido pelas normas constitucionais, independentemente
das contingências históricas.
b) O neoconstitucionalismo importa a ampliação da eficácia irradiante dos direitos
fundamentais aos poderes públicos constituídos, porém, não aos particulares, cuja
autonomia se sobrepõe àqueles direitos.
c) Em sentido sociológico, a Constituição deve ser entendida como a norma que se
refere à decisão política estruturante da organização do Estado.
d) De acordo com o conceito de Constituição-moldura, o texto constitucional deve
apenas apresentar limites para a atividade legislativa, cabendo ao Poder Judiciário
avaliar se o legislador agiu conforme o modelo configurado pela Constituição.

2. O “constitucionalismo moderno”, com o modelo de Constituições normativas, tem


sua base histórica: 44
a) a partir das revoluções Americana e Francesa.
b) a partir da Magna Carta inglesa e no Bill of Rights da Inglaterra.
c) com o advento do “Estado Constitucional de Direito”, com uma Constituição rígida,
estabelecendo limites e deveres aos legisladores e administradores.
d) a partir das Constituições do México e de Weimar, ao estabelecer o denominado
“constitucionalismo social”.

3. A expressão “constitucionalização do Direito” tem, de modo geral, sua origem


identificada pela doutrina:
a) na Constituição Federal brasileira de 1988, com seu conteúdo analítico e casuístico.
b) nos julgamentos dos MI 712/PA, 670/ES e 708/DF, pelo Supremo Tribunal Federal,
alterando entendimento anterior para reconhecer sua competência para editar texto
normativo diante da omissão legislativa, a fim de concretizar previsão constitucional.
c) nos EUA, com o precedente firmado no julgamento do caso Marbury v. Madison, em
1803.
d) na Alemanha, especialmente sob a égide da Lei Fundamental de 1949.

4. Considerando os diferentes conceitos de Constituição, abordados sob a ótica


peculiar de diversos doutrinadores, analise as seguintes manifestações sobre o tema:
I. Constituição é a soma dos fatores reais de poder que regem uma determinada nação.
II. Constituição é a decisão política fundamental sem a qual não se organiza ou funda
um Estado.
Assim, é correto afirmar que os conceitos I e II podem ser atribuídos,
respectivamente, a:
a) Ferdinand Lassale e Hans Kelsen.
b) Hans Kelsen e Konrad Hesse.
c) Konrad Hesse e Carl Schimitt.
d) J.J. Canotilho e Hans Kelsen
e) Ferdinand Lassale e Carl Schimitt.

5. Sobre o conceito de Constituição, assinale a alternativa CORRETA.


a) É o estatuto que regula as relações entre Estados soberanos.
b) É o conjunto de normas que regula os direitos e deveres de um povo.
c) É a lei fundamental e suprema de um Estado, que contém normas referentes à
estruturação, à formação dos poderes públicos, direitos, garantias e deveres dos
cidadãos.
d) É a norma maior de um Estado, que regula os direitos e deveres de um povo nas
suas relações.
45
6. A respeito das constituições classificadas como semânticas, assinale a opção
correta.
a) São aquelas que se estruturam a partir da generalização congruente de expectativas
de comportamento.
b) São aquelas cujas normas dominam o processo político; e nelas ocorrem adaptação
e submissão do poder político à constituição escrita.
c) Funcionam como pressupostos da autonomia do direito; e nelas a normatividade
serve essencialmente à formação da constituição como instância reflexiva do sistema
jurídico.
d) São aquelas cujas normas são instrumentos para a estabilização e perpetuação do
controle do poder político pelos detentores do poder fático.
e) São aquelas cujo sentido das normas se reflete na realidade constitucional.

7. Assinale a alternativa correta a respeito da Constituição e do Constitucionalismo.


a) Nos Estados Unidos, diferentemente da França, a constituição americana deu pouca
relevância ao papel do juiz, dada a aversão à sua figura pelos revolucionários,
reduzindo a função do Judiciário a mero emissor da voz da lei.
b) A Constituição francesa de 1791 construiu um sistema fundado na supremacia do
legislativo, restando ao executivo a função de dispor dos meios aptos à aplicação da
lei.
c) O modelo de constitucionalismo praticado no mundo contemporâneo segue, nas
suas linhas gerais, o padrão que foi estabelecido pela Constituição francesa de 1791,
especialmente no que diz respeito à função do Judiciário.
d) A Constituição norte-americana de 1787 e a Constituição francesa de 1791 são os
dois marcos mais importantes do Neoconstitucionalismo.
e) Influenciada pela revolução francesa e pelas revoluções americanas, a Constituição
brasileira de 1824 continha importante rol de direitos civis e políticos, tendo adotado a
separação tripartite de Montesquieu na divisão e no exercício do poder político.

8. A concepção que compreende o texto da Constituição como não acabado nem


findo, mas como um conjunto de materiais de construção a partir dos quais a política
constitucional viabiliza a realização de princípios e valores da vida comunitária de
uma sociedade plural, caracteriza o conceito de Constituição:
a) em branco.
b) semântica.
c) simbólica.
d) dúctil.
e) dirigente.

9. Assinale a alternativa correta a respeito do constitucionalismo. 46


a) O constitucionalismo antigo teve início com a Magna Carta de 1215, não havendo
antes desse período indícios de experiências democráticas que contrastassem com os
poderes teocráticos ou monárquicos dominantes.
b) No constitucionalismo moderno, as Constituições de sintéticas passam a analíticas,
consagrando nos seus textos os chamados direitos econômicos e sociais, e a
democracia liberal-econômica dá lugar à democracia social, mediante a intervenção do
Estado na ordem econômica e social.
c) A transição da Monarquia Absolutista para o Estado Liberal, em especial na Europa,
no final do século XVIII, que traçou limitações formais ao poder político vigente à
época, é um marco do constitucionalismo moderno.
d) John Locke, Montesquieu e Rousseau são reconhecidos como os principais
precursores do constitucionalismo contemporâneo, em virtude de concepções
revolucionárias que defendiam a unificação e consagração dos ideais e valores
humanos universais.

10. O constitucionalismo representa uma série de movimentos históricos, culturais,


sociais e políticos cujo objetivo central é a limitação do poder estatal mediante o
estabelecimento de uma Constituição. Sobre a sua evolução histórica e caraterísticas,
é correto afirmar:
a) o constitucionalismo espartano foi marcado por uma organização política de base
civil e democrática, assim como Atenas, permitindo-se a ampla participação dos
cidadãos nos assuntos públicos da polis.
b) no Brasil, o denominado Constitucionalismo social teve início com a Constituição de
1946, a qual passou a consagrar não apenas os direitos sociais ao trabalho, educação e
previdenciário mas também defendeu a impossibilidade de exercício do direito de
propriedade contra o interesse coletivo ou social.
c) as Revoluções liberais do Século XVIII e início do Século XIX, promovidas na Europa
Ocidental, são fruto do denominado constitucionalismo moderno, e foram
caracterizadas, dentre outros elementos, pela consagração das liberdades individuais e
defesa da igualdade em sentido formal.
d) o constitucionalismo hebreu, identificado na fase medieval, era representado pela
conduta dos profetas, responsáveis pela verificação da compatibilidade dos atos do
poder público com o texto sagrado.
e) a Revolução Gloriosa instaurada na Inglaterra, no âmbito do desenvolvimento do
constitucionalismo moderno, contribuiu de maneira exponencial para o
desenvolvimento de variados aspectos do constitucionalismo contemporâneo,
destacando-se, dentre eles, a ideia de federalismo e também a visão da constituição
como um documento sagrado político.

11. Sobre as principais concepções a respeito da Teoria das Constituições, assinale a


alternativa correta.
47
a) Hans Kelsen defende a Constituição como uma decisão política fundamental, o que
traz como consequência a obrigação do Estado em respeitar o texto constitucional,
mas permitindo-lhe que, em situações excepcionais, deixe de atender a Lei
Constitucional.
b) José Joaquim Gomes Canotilho adota uma concepção jurídica sobre o sentido de
Constituição, aduzindo que o fundamento de validade de uma norma apenas pode ser
a validade de outra norma.
c) Konrad Hesse adota o denominado sentido sociológico da Constituição e aduz que,
para que possa obter eficácia normativa, é preciso que constituição escrita e
constituição real estejam alinhadas como única substância.
d) Peter Häberle adota uma visão da Constituição como um processo político, o que
conduz à afirmação de que a verdadeira constituição resulta de um processo
interpretativo conduzido à luz da publicidade.
e) Niklas Luhmann, sociólogo alemão, define a Constituição como importante
mecanismo de determinação Estatal direcionando-o num plano de transformação
social e implementação de política públicas na ordem socioeconômica, o que passou a
denominar de Constituição dirigente.
12. Sobre os enunciados contidos no preâmbulo da Constituição Federal de 1988,
assinale a afirmativa correta.
a) Não têm valor normativo, não podendo ser considerados na interpretação dos
dispositivos constitucionais, porque não é obrigatório.
b) Não têm valor normativo e somente podem ser considerados na interpretação dos
dispositivos constitucionais, se estes admitirem expressamente a interpretação.
c) Devem ser observados na interpretação das normas constitucionais, por se tratarem
de vetores adotados pela Constituição.
d) São promessas do legislador originário para o futuro, e não podem orientar a
interpretação, pois dependem da mudança gradativa do pensamento da sociedade.

13. No tocante ao neoconstitucionalismo, ao conceito de Constituição e às normas


constitucionais, assinale a opção correta.
a) O neoconstitucionalismo está associado a diversos fenômenos reciprocamente
implicados, seja no campo empírico, seja no plano da dogmática jurídica, como
reconhecimento da força normativa dos princípios jurídicos e da separação entre o
direito e a moral.
b) A Constituição Federal de 1988 é considerada exemplo típico de constituição
compromissória, uma vez que, na constituinte, houve a atuação das mais diversas
forças políticas, inspiradas em diferentes ideologias.
c) Nas constituições flexíveis, o conflito entre a norma constitucional anterior e a lei
48
superveniente resolve-se não pelo critério hierárquico, mas pelo critério de
especialidade.
d) Prevalece a adoção da teoria da dupla revisão no sistema constitucional brasileiro.
e) No sentido sociológico, a constituição é entendida como a decisão política
fundamental do titular do poder constituinte.
3. GABARITO COMENTADO

1. D
(A) INCORRETA. Embora jurídica, a Constituição normativa não desconsidera as
contingências histórias, sendo um erro tal afirmação.
(B) INCORRETA. As relações entre particulares também sofreram alterações
decorrentes do neoconstitucionalismo e da centralidade atribuída aos direitos
fundamentais, no que a doutrina designa “eficácia horizontal dos direitos
fundamentais”, razão pela qual a assertiva é incorreta.
(C) INCORRETA. A afirmativa diz respeito ao sentido político da Constituição, conforme
teoria de Carl Schimitt.
(D) CORRETA. A alternativa D está correta, não havendo qualquer reparo a ser feito.

2. A
(A) CORRETA. O Constitucionalismo Moderno tem como marcos as Constituições
americanas (1787) e francesa (1791), sendo esta a afirmativa correta.
(B) INCORRETA. A Carta Magna (1215) inaugura o Constitucionalismo Medieval, razão
pela qual a alternativa está incorreta.
(C) INCORRETA. A assertiva trata de característica do neoconstitucionalismo, razão 49
pela qual a assertiva está incorreta.
(D) INCORRETA. O constitucionalismo social difere do constitucionalismo moderno
clássico, com marcos históricos distintos, razão pela qual a assertiva está incorreta.

3. D
A doutrina entende de forma majoritária que o marco inicial do processo de
constitucionalização do Direito foi estabelecido na Alemanha, com a Lei Fundamental
de 1949, que endossou desenvolvimentos doutrinários expressos na jurisprudência do
Tribunal Constitucional Federal, notadamente de proteção aos direitos fundamentais.

4. E
A questão, embora de baixa complexidade, exigiu sólidos conhecimentos a respeito de
teorias e seus autores, não desafiando aquele/a que estuda a parte doutrinária, pois
tomou como afirmação duas teorias bastante conhecidas de Ferdinand Lassale e Carl
Schimitt, que são cobradas de forma recorrente. Assim, a parte doutrinária não deve
ser negligenciada, já que a cobrança de questão muitas vezes exige conhecimentos
básicos, mas desconhecidas de quem não estuda de forma sistemática toda a matéria.
5. C
A alternativa C é a que melhor esboça a finalidade de uma Constituição de acordo com
o entendimento da doutrina majoritária, sendo certo que a Constituição de 1988
atende às finalidades precípuas descritas na assertiva, que não merece qualquer
reparo.

6. D
Inicialmente, o conceito mais conhecido de constituição semântica foi desenvolvido
por Karl Loewenstein, seguindo o critério ontológico, segundo o qual, nas palavras de
Bernardo Gonçalves Fernandes (Curso de direito constitucional, 7ª ed, Juspodivm,
2015, p. 51), As constituições semânticas são aquelas que traem o significado de
Constituição (do termo Constituição). Sem dúvida, Constituição, em sua essência, é e
deve ser entendida como limitação de poder. A Constituição semântica trai o conceito
de Constituição, pois ao invés de limitar o poder, legitima (naturaliza) práticas
autoritárias de poder. A Constituição semântica vem para legitimar o poder autoritário
(sendo, portanto, Constituições tipicamente autoritárias).
Portanto, se adotado tal critério de classificação, a resposta “D” é a que mais se
enquadra dentro do conceito trazido.
No entanto, outros conceitos foram desenvolvidos para o termo “constituições
semânticas”. Para alguns autores, são as constituições nas quais o texto não é dotado
de uma clareza e especificidade e que, portanto, não vão trabalhar apenas o método
gramatical, exigindo outros métodos de interpretação (ou outras posturas
50
interpretativas) (Bernardo Gonçalves Fernandes, Curso de direito constitucional, 7ª ed,
Juspodivm, 2015, p. 47).
Por fim, Canotilho conceitua tal espécie de Constituição, como sendo aquelas que
podem ser entendidas como Constituições fechadas de cunho meramente formal que
não consagram um conteúdo mínimo de justiça em termos materiais. Estas, para o
autor de Coimbra, diferenciam-se das Constituições normativas, que são aquelas
Constituições que trazem um conjunto de normas dotadas de bondade material que
garantem direitos e liberdades, bem como impõem limites aos poderes. (Bernardo
Gonçalves Fernandes, Curso de direito constitucional, 7ª ed, Juspodivm, 2015, p. 47).

7. B
(A) INCORRETA. Ao contrário! A aversão ao juiz está na França.
(B) CORRETA. Exato! A Constituição francesa de 1791 construiu um sistema fundado
na supremacia do Parlamento, restando ao executivo a função de dispor dos meios
aptos à aplicação da lei.
(C) INCORRETA. De jeito nenhum. No modelo francês, o Judiciário só diz o que a lei diz
(boca da lei) – impensável um controle judiciário das leis.
(D) INCORRETA. Aqui vigia o Constitucionalismo CLÁSSICO ou liberal! O
Neoconstitucionalismo vem após a 2ª Guerra Mundial.
(E) INCORRETA. A Constituição de 1824 adota a teoria dos 4 Poderes, incluindo o Real
ou Moderador (Benjamin Constant).
8. D
(A) INCORRETA. Em branco é a Constituição que NÃO veicula limitações explícitas ao
poder de reforma.
(B) INCORRETA. Semântica, dentro da classificação ontológica de Karl Loewenstein, é
aquela Constituição que está a serviço das classes dominantes, legitimando práticas
autoritárias de poder (trai seu escopo).
(C) INCORRETA. Simbólica (conceituação de Marcelo Neves) é aquela Constituição que
pretende não criar uma norma cogente, mas sim alcançar outros objetivos
(simbólicos).
(D) CORRETA. Conceito de Constituição dúctil, também conhecida como Constituição-
suave. Nas atuais sociedades, marcadas pela diversidade, a Constituição não pode ser
o ponto de partida, mas sim o de chegada; não deve ser um projeto predeterminado
de vida comunitária, cabendo-lhe apenas assegurar condições possíveis à vida comum
– tem de acompanhar a descentralização do Estado e refletir o pluralismo reinante.
(E) INCORRETA. Dirigente é a programática, isto é, estabelece um projeto para o
futuro. J. J. Gomes Canotilho assevera que a Constituição deve ser um plano que
direcionará a atuação do Estado, notadamente por meio das normas programáticas – a
Constituição passa a comandar a ação estatal e impor a realização de metas (não
substitui a política, mas se torna premissa material dela).

9. C 51
(A) INCORRETA. O constitucionalismo antigo possui raízes antes da Magna Carta de
1215, sendo citado por Pedro Lenza, em sua obra (Direito constitucional
esquematizado, 18ª ed., Saraiva, 2014, p.67), como exemplos o constitucionalismo
hebreu, estabelecendo-se no Estado teocrático limitações ao poder político ao
assegurar aos profetas a legitimidade para fiscalizar os atos governamentais que
extrapolassem os limites bíblicos (...), e das Cidades-Estados gregas como importante
exemplo de democracia constitucional.
(B) INCORRETA. Trata-se, em verdade, do Constitucionalismo contemporâneo do pós-
guerra.
(C) CORRETA.
(D) INCORRETA. Locke, Montesquieu e Rousseau são considerados principais
precursores do Constitucionalismo moderno, e não do contemporâneo.

10. C
(A) INCORRETA. O sentido de Constitucionalismo na Antiguidade era um sentido
eminentemente descritivo, não era um sentido normativo. Embora a pólis grega seja
de fato um embrião da democracia, com o julgamento de questões importantes pelo
povo, em praça pública (democracia direta), registre-se que nem todos eram
considerados cidadãos, sendo excluídos diversos estratos sociais da participação na
vida política. Outrossim, a aludida experiência se deu essencialmente em Atenas, e não
em Esparta. (Cláudio P. S. Neto e Daniel Sarmento - Direito constitucional - teoria,
história e métodos de trabalho).
(B) INCORRETA. De fato, a Constituição de 1946 estabeleceu a condicionante de
atendimento ao bem estar da sociedade em relação ao direito de propriedade, com
possibilidade de desapropriação por interesse social, contudo, a primeira Constituição
a registrar um compromisso social mais firme foi a de 1934, a qual rompeu com o
conceito essencialmente liberal que prevalecia nas Constituições anteriores e
introduziu elementos socioideológicos. Ex.: implementou a Justiça do Trabalho, a
Justiça Eleitoral, o voto secreto, o mandado de segurança, a ação popular, dentre
outros direitos individuais e sociais.
(C) CORRETA. A defesa das liberdades clássicas (direitos civis e políticos) e da igualdade
em sentido formal e a limitação do poder estatal compõem a tônica do
Constitucionalismo moderno. As Revoluções liberais da Europa, nesse contexto
histórico, buscavam a garantia da proteção do homem contra as arbitrariedades
estatais (abstenção estatal). Trata-se da construção de uma espécie de “círculo” em
volta do homem, composto pelas liberdades públicas e intransponível pelo Estado.
(D) INCORRETA. De fato, uma das características do Constitucionalismo hebreu reside
na circunstância de os profetas dotados de legitimidade popular no Estado Teocrático
fiscalizarem e punirem os atos dos governantes que ultrapassavam os limites bíblicos.
Ocorre que a assertiva o situa de forma cronologicamente equivocada, uma vez que
não se situa na época medieval, e sim na perspectiva do Constitucionalismo primitivo.
(E) INCORRETA. A Revolução Gloriosa promoveu a derrubada do absolutismo inglês,
que foi substituído pela monarquia parlamentar constitucional, sendo de fato uma
base importante para a afirmação do Constitucionalismo, porém não se previa um
modelo de estado federado.
52

11. D
(A) INCORRETA. A visão de Constituição como decisão política fundamental remete ao
autor Carl Schmmit. Na perspectiva jurídica (positivista) de Kelsen, a Constituição seria
a norma posicionada no topo do ordenamento jurídico e se apresentaria como
fundamento de validade de todas as outras normas ou outros atos normativos, daí
porque não se admite, na teoria de Kelsen, que se deixe de atender à Lei
Constitucional (na teoria Kelseana sequer é admitida a diferenciação entre
Constituição e Lei Constitucional).
(B) INCORRETA. Kelsen é quem trabalha o conceito jurídico de Constituição. Para
Canotilho, a Constituição deve ser vista em perspectiva dirigente, revelando um viés
social.
(C) INCORRETA. O conceito Sociológico de Constituição é fornecido por LASSALE. Para
HESSE, a Constituição por si só tem um sentido mais concreto, devido à sua força
normativa. Logo, na visão desse autor a Constituição não é só fato, norma e valor, e
sim resulta de uma síntese dialética desses 3 fatores, pois cada um deles interage com
os outros. Norma, fato e valor interagem, comunicam-se. Uma das funções da norma é
modificar a situação fática vigente em determinado contexto. O fato repercute sobre a
norma assim como a norma repercute sobre o fato. As normas visam a condicionar a
realidade social, mudar a situação fática.
(D) CORRETA. Na concepção de Haberle, a Constituição é o documento fundamental
de uma sociedade pluralista e aberta, obra de vários partícipes. A Constituição é uma
ordem fragmentária, passível de interpretação e descontínua. É o reflexo de um
processo interpretativo aberto e conduzido à luz da força normativa da publicidade.
(E) INCORRETA. A noção de Constitucionalismo dirigente remete à Canotilho. Para
Luhmann, a Constituição é documento regulador do sistema político, instrumento que
serve para reduzir a complexidade do sistema político, buscando uma reflexão de
funcionalidade do direito. Não basta analisar o vínculo de conformidade das leis com a
Constituição – juízos de constitucionalidade – sendo necessário que a Constituição
funcione como campo de contingência de autofixação do sistema político.

12. C
A banca considerou correta a seguinte assertiva: “Devem ser observados na
interpretação das normas constitucionais, por se tratarem de vetores adotados pela
Constituição”.
Entretanto, o STF adotou a tese da irrelevância jurídica do preâmbulo. Possuindo,
inclusive entendimento consolidado sobre a matéria:
O preâmbulo não se situa no âmbito do Direito, mas sim no domínio da política. Ele
apenas reflete a posição ideológica do constituinte. Desse modo, o preâmbulo não
possui relevância jurídica. Vale ressaltar, ainda, que o preâmbulo não constitui norma
central da Constituição, não sendo de reprodução obrigatória nas Constituições dos
Estados-membros. A invocação a Deus, presente no preâmbulo da CF/88, reflete um
53
sentimento religioso. Isso não faz, contudo, que o Brasil deixe de ser um Estado laico.
O Brasil é um Estado laico, ou seja, um Estado em que há liberdade de consciência e de
crença, onde ninguém é privado de direitos por motivo de crença religiosa ou
convicção filosófica. A invocação da proteção de Deus contida no preâmbulo da CF/88
não se trata de norma de reprodução obrigatória na Constituição estadual, não tendo
força normativa. Se a Constituição estadual não tiver esta expressão, não há qualquer
inconstitucionalidade nisso. STF. Plenário. ADI 2076, Rel. Min. Carlos Velloso, julgado
em 15/08/2002.
Dessa forma, a equipe do MEGE indicou que a questão era passível de anulação. De
toda forma, trouxe a questão para fins de estudo e análise da forma como o conteúdo
é cobrado.

13. E
(A) INCORRETA. A assertiva se equivoca ao dizer que existe separação entre o direito
e a moral. O Neoconstitucionalismo é uma nova forma de se interpretar o Direito, que
aproximado da Moral, passa a contemplar juízos de valor com a finalidade de
preservar, garantir e promover os direitos fundamentais, que por estarem prescritos
em regras ou princípios constitucionais faz com que o Direito Constitucional se aloque
no centro do sistema jurídico irradiando sua forma normativa.
(B) CORRETA. Constituições pluralistas ou compromissórias são aquelas que possuem
normas inspiradas em ideologias diversas. Geralmente resultam de um compromisso
entre os diversos grupos participantes do momento constituinte.
(C) INCORRETA. A assertiva se equivoca ao dizer que nas Constituições flexíveis o
conflito entre a norma constitucional anterior e a lei superveniente resolve-se não
pelo critério hierárquico. Flexíveis são aquelas Constituições que não possuem um
processo legislativo de alteração mais dificultoso do que o processo legislativo de
alteração das normas infraconstitucionais. A dificuldade em alterar a Constituição é a
mesma encontrada para alterar uma lei que não é constitucional.
(D) INCORRETA. O Brasil não adotou a teoria da dupla revisão, sendo inclusive
entendido como uma limitação implícita ao poder de reforma constitucional.
(E) INCORRETA. No sentido sociológico, a Constituição, segundo a conceituação de
Lassalle, seria a somatória dos fatores reais do poder dentro de uma sociedade.

54
CURSO MEGE

Site: www.mege.com.br
Celular / Whatsapp: (99) 982622200
Turma: PCSP (Delegado de Polícia)
Material: Direito Penal (Ponto 1)

RODADA 1
Direito Penal – Parte Geral
(Ponto 1)
1
Introdução ao Direito Penal
2
APRESENTAÇÃO
Prezado futuro Delegado de Polícia,

Neste momento de intensificação dos estudos com a iminência do lançamento


do concurso, trataremos dos principais pontos iniciais do edital anterior de São Paulo
em Direito Penal. Para quem acompanhou as últimas provas, foi visível a importância do
âmbito criminal nos certames de 2018 e 2022, com 28 questões do total de 100, sem
contar a parte de legislação extravagante, em que a sistemática penal é exigida.
Pensando neste panorama, não economizamos no material das rodadas, para cobrir o
máximo de temas e garantir o êxito ao final dos estudos.

Neste primeiro ponto, temos os aspectos introdutórios do Direito Penal que


são a base para formular qualquer raciocínio na matéria (daí a sua importância – foco
na discursiva e na oral). Apesar de não possuir tanta incidência, é crescente a cobrança
da parte histórica da matéria, além da parte principiológica, que é importantíssima.
Dessa forma, o presente material busca garantir que não ocorram erros em questões
que venham a surgir nas provas sobre o tema.

Muitos alunos acabam “saltando” essas partes históricas, pois, não acreditam
que são importantes. Todavia, além de poder ser decisivo através de pontuação extra,
o conhecimento de tais partes leva a uma melhor compreensão do Direito Penal como
um todo, evitando que vocês se valham excessivamente da memorização na hora de
responder questões.
3
Finalmente, foram selecionadas as principais questões para que vocês fixem
bastante o conteúdo, todas com comentários ao final. Façam todas,
independentemente de não ser de concurso para Delegado, pois a cobrança da parte
geral de direito penal é bastante semelhante para todos os cargos.

Desejo foco, motivação e excelentes estudos!

Artur Herbas.
SUMÁRIO
1. DOUTRINA (RESUMO) ................................................................................................ 5
1.1. CONCEITOS DE DIREITO PENAL ................................................................................ 5
1.2. MODELOS DE DIREITO PENAL .................................................................................. 9
1.3. VELOCIDADES DO DIREITO PENAL.......................................................................... 10
1.4. DIREITO PENAL DO INIMIGO .................................................................................. 11
1.5. EVOLUÇÃO HISTÓRICA DO DIREITO PENAL NO BRASIL .......................................... 12
1.6. BEM JURÍDICO........................................................................................................ 13
1.7. PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS DO DIREITO PENAL (EXPLÍCITOS E IMPLÍCITOS) .... 15
1.8. PERSONALIDADE OU RESPONSABILIDADE PESSOAL .............................................. 18
1.9. INTERVENÇÃO MÍNIMA ......................................................................................... 19
1.10. INDIVIDUALIZAÇÃO DA PENA ............................................................................... 24
1.11. CULPABILIDADE.................................................................................................... 25
1.12. HUMANIDADE ...................................................................................................... 26
1.13. PROPORCIONALIDADE ......................................................................................... 26
1.14. FONTES DO DIREITO PENAL ................................................................................. 28
4
1.15. RELAÇÃO DO DIREITO PENAL COM OUTROS RAMOS........................................... 30
1.16. INTERPRETAÇÃO DA LEI PENAL ............................................................................ 31
2. QUESTÕES ..................................................................................................................35
3. GABARITO COMENTADO ......................................................................................... 42
1. DOUTRINA (RESUMO)
1.1. CONCEITOS DE DIREITO PENAL

Direito Penal sob Conjunto de normas voltadas a disciplinar a proibição de


o aspecto formal determinados comportamentos humanos, dando-lhes os
ou estático contornos de crime ou de contravenção penal, fixando as
sanções aplicáveis em caso de descumprimento.

Direito Penal sob O direito Penal refere-se a comportamentos humanos


o aspecto considerados como altamente reprováveis ou danosos ao
material organismo social, afetando bens jurídicos indispensáveis à
conservação e progresso da sociedade.

Instrumento de controle social visando assegurar a necessária


disciplina para a harmônica convivência dos membros da
Direito Penal sob sociedade. A manutenção da paz social demanda a existência de
o aspecto normas destinadas a estabelecer diretrizes de conduta.
sociológico ou
dinâmico OBS: Na tarefa de controle social atuam vários outros ramos do
direito. No entanto, se determinada conduta atentar contra bens
jurídicos de especial importância, haverá a incidência do direito
penal pelo Estado.
5

1.1.1. ESCOLAS PENAIS


Conjunto de doutrinas que, em dado momento histórico-político, investigaram
os institutos do crime, do delinquente e da pena. É um tema que também é explorado
na disciplina de criminologia.

Tem como principal expoente Franz Von Liszt (século XIX), devendo-se
mencionar, também, as contribuições de Ernst Von Beling e Gustav Radbruch

1.1.1.1. ESCOLA CLÁSSICA OU IDEALISTA OU PRIMEIRA ESCOLA

No final do século XVIII, verifica-se uma tendência de reforma nas leis e na


administração da justiça, propiciada por um extraordinário movimento de ideias,
denominado de Iluminismo.

A escola Clássica surge na Itália, de onde se espalhou para todo o mundo,


principalmente para a Alemanha e França. Os clássicos, baseados na ciência dogmática,
adotavam o método dedutivo de trabalho no estudo do direito penal, pois a análise do
jurista deveria partir do direito positivo vigente, para, então, passar às questões jurídico-
penais.
Seu marco ocorre em 1764, em Milão, com a publicação da obra Dos delitos e
das penas, de Cesare Bonesana, o Marquês de Beccaria, considerado o fundador da
moderna ciência do direito penal. O livro deu origem ao período teórico ou teórico-
filosófico da chamada Escola Clássica de direito penal.

A obra constitui um libelo contra leis draconianas, excessivamente rigorosas e


de penas desproporcionais, tipos vagos e arbitrariedades da época, pregando a
humanização das penas, que não poderiam ter caráter meramente retributivo. O
fundamento para a punição do delinquente é o contrato social.

A imagem do homem como ser racional, igual e livre, a teoria do pacto social,
como fundamento da sociedade civil e do poder, assim como a concepção utilitária do
castigo, não desprovida de apoio ético, constituem os três sólidos pilares do
pensamento clássico.

Outro expoente da escola clássica foi o italiano Francesco Carrara (período


prático ou ético-jurídico da escola clássica). O autor fixou, como princípio fundamental,
do qual poderia ser deduzido toda a ciência criminal, a ideia do crime como ente
jurídico, e não ente de fato (definido como “uma infração, por ato humano externo,
positivo ou negativo e moralmente imputável, de uma lei do Estado promulgada para
proteger a segurança dos cidadãos”).

Heleno Cláudio Fragoso resume os princípios fundamentais, tidos como


postulados da escola clássica: a) O crime é um ente jurídico, é a violação do direito, como
exigência racional (e não como norma jurídica do direito positivo); b) Responsabilidade
6
penal fundada no livre arbítrio, sendo a liberdade de querer um axioma fundamental
para todo o sistema do direito punitivo; c) A pena é retribuição jurídica e
restabelecimento da ordem externa violada pelo delito; (Lições de direito penal: parte
geral, 16. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2004, p. 52-53).

1.1.1.2. ESCOLA POSITIVA

Surge no final do século XIX, com o avanço das ciências humanas e biológicas e
época de predomínio do pensamento positivista. Também há, nesta fase, crescente
preocupação com o fenômeno da criminalidade.

Os positivistas utilizam-se do método indutivo e de observação dos fatos


(método empírico) no estudo do direito penal. A escola Positiva encarava o crime como
fato social e humano, contemplando o delito em seu aspecto real. Além disso, o estudo
da ciência criminal foi voltado para a figura do ‘delinquente’.

A Escola Positiva passou por três fases:

1) A Fase Antropológica, com Cesare Lombroso:

O início desta fase ocorre com a publicação de O Homem Delinquente (1876),


de Cesare Lombroso. O autor introduziu a aplicação do método experimental no estudo
da criminalidade, desenvolvendo a teoria do criminoso nato (atavismo), cujas
características morfológicas constituiriam um tipo antropológico específico. Apesar do
fracasso da sua teoria, teve reverberações no Brasil, a exemplo de Nina Rodrigues.
Lombroso teve o mérito de fundar a Antropologia Criminal, que visa a encontrar, por
meio do estudo antropológico do criminoso, uma explicação causal de seu
comportamento.

2) A Fase Sociológica, com Enrico Ferri:

Enrico Ferri, por sua parte, representa a diretriz sociológica do positivismo. O


delito, para Ferri, não é produto exclusivo de nenhuma patologia individual (o que
contraria a tese antropológica de Lombroso), senão – como qualquer outro
acontecimento natural ou social – resultado da contribuição de diversos fatores:
individuais, físicos e sociais. Entende, pois, que a criminalidade é um fenômeno social
como outros, que se rege por sua própria dinâmica, de modo que o cientista poderia
antecipar o número exato de delitos e a classe deles, em uma determinada sociedade e
em um momento concreto, se contasse com todos os fatores individuais, físicos e sociais
antes citados e fosse capaz de quantificar a incidência de cada um deles. Porque, sob
tais premissas, não se comete nenhum delito a mais nem a menos (lei da “saturação
criminal”).

3) A Fase Jurídica, com Rafael Garófalo:

Garófalo, embora fiel às premissas metodológicas do positivismo (método


empírico, influência de Darwin, criminoso nato), distanciou-se tanto da Antropologia
lombrosiana, como do sociologismo de Ferri. O autor se destacou pelo seu conceito de
delito natural, sua teoria da criminalidade e pela fundamentação do castigo (ou teoria
7
da pena), pautada na defesa social. Defendeu a necessidade de uma nova forma de
intervenção penal – a medida de segurança.

Por fim, cumpre ressaltar que para essa escola, a periculosidade era a base da
responsabilidade penal: a pena (baseada, sobretudo, na periculosidade do agente –
“temibilidade” foi o termo cunhado por Garófalo), não tinha papel retributivo, mas
fundamentalmente preventivo, ou seja, era instrumento de defesa social, já que a
correção dos criminosos era impossível.

1.1.1.3. TERCEIRA ESCOLA OU ESCOLA ECLÉTICA

Posteriormente, surgiram movimentos ecléticos, que buscaram conciliar os


postulados das duas escolas penais anteriores. Assim, a chamada Terceira Escola (Terza
Scuola) defendia a manutenção da autonomia do direito penal, mas aliada à Filosofia do
Direito, ao mesmo tempo em que se deveriam promover investigações antropológicas
e sociológicas do crime.

A Terceira Escola prestigia o método lógico-abstrato e dedutivo, em


contraposição ao experimental, além de negar a existência do criminoso nato.
1.1.1.4. ESCOLA CORRECIONALISTA

A Escola Correcionalista, também conhecida como Correcionalismo Penal,


surgiu na Alemanha, em 1839, pautada nas contribuições de Karl David Augusto Röeder
e de sua obra “Comentatio na poena malum esse debeat”.

As duas principais colaborações da Escola Correcionalista podem ser descritas


como uma nova visão sob infrator e sob a pena, da seguinte maneira:

1 - O infrator é um ser incapaz, munido de debilidade e


perversidade; ao cometer delitos, pratica uma injustiça social.
2 - A pena é, assim, um meio para a realização do bem social,
baseada em uma política correcional e pedagógica, com a
finalidade terapêutica de corrigir a injusta e a perversa
vontade do criminoso. Dessa forma, a pena possui uma
função de prevenção especial (positiva) e tem como
consequência a regeneração do criminoso.
Por fim, cabe ressaltar que, segundo essa corrente, a sanção penal não pode ser fixa, ou
seja, deve ser aplicada por tempo indeterminado, enquanto perdurar o estado de perigo
do agente.

1.1.1.5. TECNICISMO JURÍDICO-PENAL

O tecnicismo nasceu pelas ideias de Arturo Rocco (Itália, 1910), e tem como
diretriz base o estudo do direito penal com fundamento em método dogmático ou
8
técnico-jurídico. Passou por dois momentos históricos:

a) Primeira Fase: Teve como colaboradores Arturo Rocco, Vicenzo Manzini,


Massari e Delitala e se caracterizou pela ideia de que a análise do direito penal deve ser
estritamente dedicada às leis e à exegese, de forma que deve ser afastado o seguimento
causal-explicativo inerente à antropologia, à sociologia e à filosofia. Assim, nega-se a
existência do direito natural, bem como da análise do livre arbítrio.

O estudioso do direito deve, então, abandonar a investigação filosófica e passar


a se dedicar aos estudos do direito positivo, com base em técnicas de exegese,
dogmática e crítica.

b) Segunda Fase: Teve como colaboradores Maggiore, Giuseppe Bettiol,


Petrocelli e Giulio Battaglini, e, apesar de continuar com uma vertente bem teórica,
diferentemente da primeira fase, passou a admitir a existência do direito natural,
acolhendo o livre-arbítrio a reestruturando a pena em sua perspectiva retributiva.

1.1.1.6. DEFESA SOCIAL

Marcada também por duas fases, surgiu no século XX. Foi defendida por Fillipo
Gramatica, Marc Ancel, Von Liszt, Van Hamel e Adolphe Prins.

1) Primeira Fase, desenvolvida por Fillipo Gramatica, que em 1945, fundou o


Centro Internacional de Estudos de Defesa Social
No primeiro momento, sustentava-se que o Direito Penal deveria somar
esforços na luta contra a criminalidade, mas vista como fenômeno social. Face o ideal
de defesa da sociedade, praticava-se a utilização de medidas de neutralização do
indivíduo por prazo indeterminado, o que protegia a sociedade, mas marginalizava e
segregava o agente.

2) Segunda Fase, desenvolvida por Marc Ancel

Com a maturação da sociedade após o período das duas grandes Guerras


Mundiais, a Defesa Social, já sob uma perspectiva de profilaxia criminal, passou a
objetivar o aprimoramento da sociedade, partindo do melhoramento do indivíduo. Isso
porque entendia-se que a delinquência era produto de uma disfuncionalidade da
organização social.

O dever de punir estatal passou a ser aplicado de forma preventiva, pautado


no respeito pela dignidade da pessoa humana (ex: prevenção de crimes, tratamento do
menor delinquente e reforma penitenciária).

Assim, pregava-se a utilização de medidas educativas, curativas e dosadas em


conformidade com as características pessoais do infrator.

1.2. MODELOS DE DIREITO PENAL

Direito penal mínimo Direito penal


9
Abolicionismo
(minimalismo penal ou máximo
(política criminal verde)
abolicionismo moderado) (eficientismo penal)

1.2.1. DIREITO PENAL MÍNIMO (MINIMALISMO PENAL OU ABOLICIONISMO


MODERADO)

Intimamente ligado à ideia de intervenção mínima, segundo a qual o Direito


Penal deve ser utilizado apenas em se tratando dos ataques mais graves aos bens
jurídicos mais relevantes e apenas quando outros instrumentos, jurídicos ou não, forem
insuficientes à sua tutela.

1.2.1. Garantismo

Nessa toada, surge o garantismo, cujo maior expoente é Luigi Ferrajoli. É um


modelo normativo de direito penal e processual penal, pautado na estrita legalidade,
que visa minimizar a violência e maximizar a liberdade. Prega a intervenção mínima do
Direito Penal. Dez axiomas garantistas trazidos por Ferrajoli:

1. Não há pena sem crime.

2. Não há crime sem lei.


3. Não há lei sem necessidade.

4. Não há necessidade sem ofensa a bem jurídico.

5. Não há ofensa a bem jurídico sem conduta.

6. Não há conduta sem culpabilidade.

7. Não há culpabilidade sem o devido processo legal.

8. Não há processo sem acusação.

9. Não há acusação sem provas.

10. Não há provas sem defesa.

1.2.2. ABOLICIONISMO PENAL (POLÍTICA CRIMINAL VERDE)

Os abolicionistas pretendem eliminar o Direito Penal, pois a sua existência


traria mais prejuízos que benefícios. O Direito Penal serviria apenas para legitimar
injustiças sociais, sendo caracterizado pelo seletivismo e pelo elitismo. A nova
sistemática, em que o Direito Penal está ausente, é a que se chama de política criminal
verde (cuidado para não achar que envolve ambiental). Alguns dos expoentes do
abolicionismo são Louk Hulsman, Thomas Mathiesen e Nils Christie.

1.2.3. DIREITO PENAL MÁXIMO (EFICIENTISMO PENAL)


10
Associado aos movimentos “Lei e ordem” e “Tolerância zero”, nos EUA. A ideia
é de que o Direito Penal não é eficaz por não ser severo o suficiente. Deve-se punir as
pequenas infrações, para evitar infrações maiores, bem como recrudescer as sanções
penais. Nenhum culpado deve sair impune, ainda que às custas do sacrifício de algum
inocente. Trata-se, portanto, de um modelo antigarantista, que visa o uso do Direito
Penal em busca da máxima efetividade do controle social.

1.3. VELOCIDADES DO DIREITO PENAL


Segundo o espanhol Jesús-Maria Silva Sánchez, três são as “velocidades” do
direito penal:

Direito Penal Modelo de Direito Penal clássico, que utiliza preferencialmente a


de primeira pena privativa de liberdade, mas se funda em direitos e garantias
velocidade individuais. Nesta velocidade, o Direito Penal se restringe ao seu
núcleo central (Direito Penal Nuclear).

Direito Penal Admite a flexibilização de certas garantias penais e processuais,


de segunda porém, aliadas à adoção das medidas alternativas à prisão (penas
velocidade restritivas de direito, pecuniárias etc.). Há uma expansão para uma
zona lateral ao Direito Penal Nuclear (Direito Penal Periférico).
A Lei n. 9.099/95 é reflexo do direito penal de segunda velocidade,
introduzindo institutos despenalizadores e um procedimento mais
simplificado, destinado aos crimes de menor potencial ofensivo.
Nela, há uma flexibilização de direito e garantias penais e processuais
em face da persecução de delitos cujos preceitos secundários não
implicam na privação da liberdade do acusado.

É uma mistura das características acima: usa a pena privativa de


Direito Penal liberdade (Direito Penal de 1ª velocidade), mas permite flexibilizar
de terceira
direitos e garantias (Direito Penal de 2ª velocidade) só que agora para
velocidade
os crimes de maior gravidade. Compatível com o denominado Direito
Penal do Inimigo.

Há quem fale, ainda, do Direito Penal de quarta velocidade (ou


neopunitivismo). De acordo com esse modelo, há restrição e supressão de garantias
penais e processuais penais de réus que foram chefes de Estado e, nesta condição,
foram responsáveis pela violação grave a tratados internacionais de direitos humanos.
Os graves crimes cometidos contra a humanidade por líderes de governo estão
enquadrados na quarta velocidade do Direito Penal. O neopunitivismo possui relação
com o Direito Penal Internacional.

Alguns doutrinadores já falam sobre quinta, sexta e até sétima velocidade de 11


Direito Penal, todavia, como aduz o criador da nomenclatura (Silva Sánchez), as demais
velocidades “criadas” se encaixam em uma de suas três velocidades.

1.4. DIREITO PENAL DO INIMIGO


O Direito Penal do Inimigo está situado na terceira velocidade do Direito Penal.
O Modelo concebido por Günther Jakobs, sustentando que determinados indivíduos,
como terroristas e membros do crime organizado, que se afastam de modo permanente
do Direito e não oferecem garantias cognitivas de que vão continuar fiéis à norma,
perdem o estado de cidadania e, por conseguinte, não podem usufruir dos mesmos
benefícios processuais concedidos às demais pessoas.

Para Masson, na concepção de Jakobs é possível observar “a convivência de


dois direitos em um mesmo ordenamento jurídico. Em primeiro lugar, um Direito Penal
do Cidadão, amplo e dotado de todas as garantias constitucionais, processuais e penais,
típico de um Estado Democrático de Direitos. Sem prejuízo, em parcela menor e restrita
a grupos determinados, com ele coexiste o Direito Penal do Inimigo, no qual o seu
sujeito deve ser enfrentado como fonte de perigo e, portanto, a sua eliminação da
sociedade é o fim último do Estado.” (MASSON, Cleber. Direto Penal Esquematizado –
Parte Geral. 2016, Editora Método. p. 114).

Principais características do direito penal, para esses inimigos são: antecipação


da punibilidade com a tipificação de atos preparatórios; condutas descritas em tipos de
mera conduta de perigo abstrato, flexibilizando o princípio da ofensividade; descrição
vaga dos crimes e das penas; preponderância do Direito Penal do autor em
contraposição ao Direito Penal do fato; surgimento das chamadas “leis de luta ou de
combate”; endurecimento da execução Penal.

Principais linhas de ataque (críticas) ao direito penal do inimigo:

- Quem é o inimigo e a quem caberia elegê-lo? Esse conceito


nunca foi bem estabelecido e pode dar margem a injustiças.
Na inquisição, os inimigos eram os hereges; para os nazistas,
os inimigos eram os judeus; etc.
- Quais os princípios a que se deve submeter esse ramo do
direito penal?
- O Direito Penal do Inimigo se contradiz em seus próprios
termos: se não há regras, não é Direito. O Direito Penal é
concebido justamente para impor limites ao arbítrio estatal.

Observação: Jakobs é adepto do funcionalismo sistêmico, segundo o qual a função


do Direito Penal não é a proteção de bens jurídicos, mas, sim, reafirmar a validade
da própria norma (voltaremos ao tema futuramente neste curso).

1.5. EVOLUÇÃO HISTÓRICA DO DIREITO PENAL NO BRASIL 12


1.5.1. PERÍODO COLONIAL

Assim como no restante do mundo, predominava a vingança privada no Brasil


pré-colonial, prevalecendo penas corporais, composições e o exílio.

Com a chegada dos portugueses, o ordenamento jurídico deles passou a vigorar


por aqui, inicialmente com as Ordenações Afonsinas (1446-1514), pautadas no Direito
Romano e no Direito Canônico, instituindo a chamada vingança pública. Eram
predominantes a existência de penas cruéis e a falta de princípios como a legalidade ou
ampla defesa. Os julgadores eram verdadeiros inquisidores.

De 1514 até 1603, vigoraram as Ordenações Manuelinas, também marcadas


por penas severas e pela vingança pública, aplicada pelos donatários das capitanias
hereditárias.

De 1603 até 1830, tivemos as Ordenações Filipinas, mantendo as


características mencionadas anteriormente, com juiz inquisidor, punição severa,
ausência de direitos e inexistência de personalidade da pena, já que parentes do
criminoso também acabavam punidos. Existiam as penas de açoite, amputação,
confisco, galés e degredo (muitos portugueses condenados eram “degredados” a viver
no Brasil como punição).
1.5.2. CÓDIGO CRIMINAL DO IMPÉRIO

Veio em 1830 após sanção de Dom Pedro I, e trouxe uma evolução do Direito
Penal, que passou a ser mais humanizado – torturas, açoites e outras penas cruéis foram
banidas. Ainda perduravam retrocessos como o tratamento degradante dos escravos,
tratados como animais/objetos.

Uma importante marca do Código Penal de 1830 é a previsão de que a pena


não poderia passar da pessoa do delinquente, trazendo o princípio da personalidade da
pena, que estudaremos adiante, ao direito brasileiro.

1.5.3. PERÍODO REPUBLICANO

Com o fim do Império, tivemos o Código Penal de 1890. Foi bastante criticado
pela doutrina por ignorar as tendências evolutivas de outros países, o que levou a uma
intensa regulamentação da matéria criminal em legislações extravagantes, até a edição
do atual Código Penal de 1940.

Imperioso destacar a existência do Código Penal de Nelson Hungria, de 1969,


que acabou revogado durante o período de vacatio legis.

Após inúmeras reformas, como a marcante de 1984, que modificou a parte


geral do CP, humanizando as penas e trazendo alternativas à prisão. A Lei 9.099/95
também consolidou esse movimento de redução do cárcere, através de institutos como
a transação penal e a suspensão condicional do processo. 13
1.6. BEM JURÍDICO
1.6.1. NOÇÕES

Para uma compreensão inicial, segundo lição de Roxin, bens jurídicos podem
ser definidos como circunstâncias reais dadas ou finalidades necessárias para uma vida
segura e livre, que garanta a todos os direitos humanos e civis de cada um na sociedade
ou para o funcionamento de um sistema estatal que se baseia nestes objetivos. Cabe ao
legislador, na sua propícia função, proteger os mais diferentes tipos de bens jurídicos,
cominando as respectivas sanções, de acordo com a sua importância para a sociedade.
Assim, haverá o ilícito administrativo, o civil, o penal, etc.

O bem jurídico-penal, por seu turno, compreende os bens existenciais


valorados positivamente pelo Direito e protegidos, dentro e nos limites de uma
determinada relação social conflitiva, por uma norma penal.

No entanto, a elevação de um bem jurídico aos status de bem jurídico-penal,


não pode se afastar da execução de uma atividade seletiva dos valores existenciais,
estritamente ligada ao caráter fragmentário e subsidiário do Direito Penal, pois
somente assim a atuação legiferante penal poderá ser considerada legítima e em
consonância com os valores do Estado Democrático de Direito.
O direito penal, assim, somente atua e protege os bens jurídicos mais
importantes para o corpo social (vida, liberdade, patrimônio, liberdade sexual,
administração pública, etc.).

Observação: Bem jurídico não se confunde com objeto material. Objeto material é
a pessoa ou coisa sobre a qual recai a conduta criminosa.

Exemplo (1): homicídio – o bem jurídico tutelado, ou seja, o que se busca


proteger com o tipo penal é a vida. O objeto material (ou seja, aquilo contra quem se
volta o agente) é a pessoa.

Exemplo (2): furto – o bem jurídico tutelado é o patrimônio. O objeto material


é a coisa subtraída.

1.6.2. FUNÇÕES DESEMPENHADAS PELO BEM JURÍDICO

Não existe crime sem bem jurídico. Este dá fundamento,


Função fundamentadora
substrato, ao crime.

O sistema é montado a partir de bens jurídicos. No


14
Função sistemática próprio CP, os crimes são classificados por bens jurídicos
(crimes contra a pessoa, patrimônio, etc.).

O tipo penal deve ser interpretado conforme o bem


Função interpretativa
jurídico a ele correspondente.

O bem jurídico atingido orienta a própria determinação


da competência. Ex.: se o crime é contra o trabalhador
Função processual individual, a competência, em princípio, é da Justiça
Estadual. Se há lesão à organização do trabalho, como um
todo, a competência passa a ser da Justiça Federal.
1.7. PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS DO DIREITO PENAL (EXPLÍCITOS E
IMPLÍCITOS)

CONSTITUCIONAIS EXPLÍCITOS CONSTITUCIONAIS IMPLÍCITOS

- Legalidade (art. 5º, XXXIX, CF): Intervenção mínima:


- Anterioridade (art. 5.º, XXXIX, CF). - Fragmentariedade.
- Retroatividade da lei penal benéfica - Subsidiariedade.
(art. 5.º, XL, CF). - Ofensividade ou lesividade.

- Personalidade ou responsabilidade - Insignificância ou bagatela.


pessoal (art. 5º, XLV, CF) - Adequação social.

- Individualização da pena (art. 5º, XLVI,


- Culpabilidade
primeira parte, CF)

- Humanidade (art. 5º, XLVII, CF) - Proporcionalidade

15
Observação: Consideramos a anterioridade e a retroatividade da lei benéfica
decorrências do princípio da legalidade. Da mesma forma, reputamos a
fragmentariedade, a subsidiariedade, a ofensividade ou lesividade, a insignificância
ou bagatela e a adequação social decorrências do princípio maior da intervenção
mínima. Há autores que relacionam todos eles como princípios autônomos, porém,
não há divergência quanto ao conteúdo

1.7.1. LEGALIDADE

Classicamente, diz-se que nullun crimen, nulla poena sina praevia lege,
conforme a consagrada fórmula de Feuerbach. Segundo Luiz Luisi, o princípio da
legalidade constitui “patrimônio comum da legislação penal dos povos civilizados”.

Não há consenso sobre a origem do postulado da legalidade. Para alguns o


princípio nasceu no Direito Romano. Para outros, em 1215, com a Charta Magna
Libertatum, editada por João Sem Terra. Para Francisco de Assis Toledo, origina-se no
Bill of Rights das colônias inglesas da América do Norte e na Déclaration des Droits de
L´Homme et du Citoyen, da Revolução Francesa.

A primeira positivação se deu no Código Penal francês de 1810. No Brasil, a


Constituição Imperial de 1824 e o Código Criminal do Império (1830) o previram.
O princípio da legalidade, que tem como fundamento o Estado de Direito, é a
base de todo o Direito Penal. Atualmente, no Brasil, está previsto na CF, art. 5º, inciso
XXXIX, e no CP, art. 1º.

CF, art. 5º, XXXIX - não há crime sem lei anterior que o defina, nem pena sem prévia
cominação legal.
CP, art. 1º - Não há crime sem lei anterior que o defina. Não há pena sem prévia
cominação legal.

Documentos internacionais que anunciam o princípio:

1) Convênio para proteção dos direitos humanos e liberdades


fundamentais (1950, art. 7º).
2) Convenção Americana de Direitos Humanos (1969).
3) Estatuto de Roma, que criou o Tribunal Penal Internacional (1977,
artigos 22 e 23).
1.7.1.1. Conceito do princípio da legalidade

Segundo Claus Roxin, o princípio da legalidade é um instrumento que protege


o cidadão do próprio Direito Penal.
16
Logo, trata-se de fator de contenção dos abusos do Estado, de um vetor basilar
do garantismo, ou seja, é real limitação do poder punitivo do Estado em face das
máximas garantias do cidadão. Assim, o fundamento político deste princípio é a
proteção do indivíduo face a atuação abusiva do Estado.

O princípio da legalidade se dá pela conjunção dos princípios da reserva legal


(não há crime sem lei) e da anterioridade.

Princípio da reserva legal  reserva absoluta de lei. Somente a lei, em sentido


estrito, pode descrever crimes e cominar penas. O princípio da reserva legal coincide
com o sentido estrito do princípio da legalidade.

A reserva legal é cumprida, em regra, pela edição de lei ordinária, e, em casos


excepcionais, por lei complementar. Assim, é impossível a criação de crimes e penas por
decreto, por exemplo.

Atenção! A medida provisória não poderá versar sobre direito penal e processual
penal, conforme a redação do art. 62, § 1º, b, da CF.

Há pequena divergência doutrinária sobre a possibilidade de a medida


provisória versar sobre direito penal não incriminador (STF já admitiu).
1.7.1.2. Vertentes do princípio da legalidade

a) Lege praevia (art. 5º, incisos XXXIX e XL da CF) - Não há crime sem lei
anterior que o defina, nem pena sem prévia cominação legal. A lei penal deve ser prévia
à prática da infração penal. Trata-se do princípio da anterioridade da lei penal, que tem
como consequência a proibição da retroatividade da lei penal mais severa, cuja
previsão encontra-se no art. 5º, inciso XL, da CF, ou seja: a lei penal não retroagirá, salvo
para beneficiar o réu. OBS: A retroatividade benéfica é garantia fundamental do cidadão.

b) Lege scripta (reserve legal) - Somente a lei penal escrita, em sentido formal,
poderá criar crimes e cominar penas. Consequência: proíbe-se a criação de crimes pela
via dos costumes. Não existe, no direito penal, o costume incriminador, embora o
costume sirva para a interpretar a lei penal (costume interpretativo).

QUESTÃO - Existe costume abolicionista no Direito Penal? Ou seja, um


costume que possa revogar uma infração penal?

A doutrina amplamente majoritária ensina que não existe costume


abolicionista. Somente uma lei tem condição de revogar outra lei, conforme exarado na
Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro. Esse entendimento também é
adotado pela jurisprudência dos Tribunais Superiores:

Súmula 502: Presentes a materialidade e a autoria, afigura-se 17


típica, em relação ao crime previsto no artigo 184, parágrafo
2º, do Código Penal, a conduta de expor à venda CDs e DVDs
piratas.

c) Lege Sctrita - A interpretação do tipo penal, além da verificação do juízo de


tipicidade deve ser estrita, assim, consequentemente, o direito penal veda o uso da
analogia incriminadora.

d) Lege certa (taxatividade) - A lei penal deve ser clara, certa, precisa,
proibindo-se o uso de conceitos vagos e imprecisos. Estamos diante do fundamento
jurídico da reserva legal, qual seja, o princípio da taxatividade, o qual exige, na
elaboração dos delitos, a facilidade na sua compreensão, não cabendo em seu conteúdo
expressões ambíguas ou indeterminadas. Obs: para César Bittencourt, o art. 288-A do
CP é exemplo de tipo penal que viola a taxatividade da lei penal.

1.7.1.3. Sentidos do Princípio Da Legalidade

a) Sentido amplo (CF, art. 5º, inciso II): Ninguém está obrigado a fazer ou a
deixar de fazer algo, salvo em virtude de lei.

b) Sentido estrito (art. 5º, inciso XXXIX): Específico para o direito penal -
“nullum crimen sine praevia legis”. Legalidade criminal – não há crime sem lei.
Legalidade penal – não há pena sem lei. Legalidade jurisdicional ou processual – não há
processo sem lei. Legalidade execucional – não há execução sem lei.

1.7.1.4. Fundamentos do princípio da legalidade

a) Político, exigência de vinculação dos Poderes Executivo e Judiciário às leis,


impedindo o poder punitivo arbitrário;

b) Democrático, respeito ao princípio da separação dos poderes;

c) Jurídico, a lei prévia e clara gera importante efeito intimidativo.

1.7.1.5. Princípio da anterioridade

Conforme estabelece a Constituição Federal, “não há crime sem lei anterior que
o defina”, nem pena “sem prévia cominação legal”.

Ou seja, a lei penal incriminadora não pode retroagir para punir fatos concretos
que até então não eram passíveis de repressão criminal. A lei penal deve ser prévia ao
fato delituoso.

1.7.1.6. Irretroatividade ou retroatividade da lei penal benéfica

Significa que a lei penal não pode retroagir, salvo para beneficiar o acusado.
Trataremos detalhadamente do tema em momento oportuno. 18
1.8. PERSONALIDADE OU RESPONSABILIDADE PESSOAL

CF, art. 5º, XLV - nenhuma pena passará da pessoa do condenado, podendo a
obrigação de reparar o dano e a decretação do perdimento de bens ser, nos termos
da lei, estendidas aos sucessores e contra eles executadas, até o limite do valor do
patrimônio transferido

Trata-se de princípio constitucional expresso (art. 5º, XLV), significando que a


pena não pode passar da pessoa do delinquente.

Não cabe, por exemplo, aplicar pena ao filho por crime cometido pelo pai.

Um reflexo desse princípio no processo penal é o denominado princípio da


intranscendência, segundo o qual a acusação deve ser dirigida contra o provável autor
da infração.
1.9. INTERVENÇÃO MÍNIMA
1.9.1. Conceito e subprincípios

Significa que o direito penal, sendo a forma mais agressiva de interferência


estatal na vida privada do indivíduo (aplicação de penas privativas de liberdade),
somente deve ser utilizado em face dos ataques mais graves aos bens jurídicos mais
relevantes, e desde que os outros instrumentos de controle estatal não sejam
suficientes para lidar com a situação.

A intervenção mínima (ou direito penal mínimo) surge com a Declaração


Universal dos Direitos do Homem, como forma de se garantir que a intervenção estatal
no plano individual ocorra, apenas, quando estritamente necessário.

No ordenamento brasileiro, trata-se de princípio constitucional implícito.

Do conceito é possível extrair os dois subprincípios da intervenção mínima:

Subsidiariedade: O Direito Penal é subsidiário, é a ultima


ratio. Assim, a criminalização de uma conduta somente será
legítima caso seja o único meio eficaz para a proteção do bem
jurídico. Somente deve ser utilizado se as outras formas de
controle social e demais ramos do direito revelarem-se
insuficientes na tutela do bem jurídico (ex.: sanções
administrativas ou cíveis).
19
Fragmentariedade: O Direito Penal não deve ser utilizado
para tutelar toda e qualquer situação, nem para tutelar todo
e qualquer bem jurídico. Somente uma pequena parcela da
imensa gama de atos ilícitos existentes interessa a esse ramo
do direito. Tal parcela compreende os atos que ofendem de
modo mais grave os bens jurídicos considerados essenciais
para o convívio em sociedade. Assim, o direito penal só
intervirá quando houver relevante lesão ou perigo de lesão
ao bem jurídico tutelado. É a fragmentariedade que
fundamenta o princípio da insignificância como causa de
atipicidade material da conduta.
Outros princípios decorrentes do princípio da intervenção mínima:

Insignificância ou bagatela.

Está assentado no brocardo “de minimis non curat praetor”. Em 1964, Roxin
introduziu no direito penal o princípio da insignificância ou da bagatela. Parte da
doutrina relaciona a insignificância como princípio autônomo.

O princípio é calcado na ideia de que certas condutas, embora tipificadas na lei,


representam uma lesão ínfima ao bem jurídico, tornando desnecessária e indevida a
aplicação de sanção penal. Há tipicidade formal, mas não tipicidade material. Assim, o
princípio da insignificância pode ser entendido como instrumento de interpretação
restritiva do tipo penal.

O STF (HC 138134/BA, 2ª T, j. 07.02.2017) formulou requisitos a serem


observados na análise de cada caso a fim de se reconhecer a insignificância:

- conduta minimamente ofensiva;


- ausência de periculosidade social da ação;
- inexpressividade da lesão jurídica causada;
- reduzido grau de reprovabilidade do comportamento.
Mnemônico: CAIR
O STF e o STJ, em regra, não têm admitido quando o acusado é reincidente,
portador de maus antecedentes ou criminoso habitual.

STF: [...] CRIME DE FURTO. PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA.


INAPLICABILIDADE. REITERAÇÃO DELITIVA. [...] 2. A
jurisprudência do STF consolidou o entendimento de que a
reiteração delitiva impossibilita a adoção do princípio da
insignificância. Paciente que ostenta em sua folha de
antecedentes várias ocorrências pelo mesmo crime de furto.
3. Agravo regimental não conhecido. (HC 123199, Rel. Min.
Roberto Barroso, 1ª T., j. 17/02/2017)
20
STJ: [...] FURTO. PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA.
REINCIDÊNCIA. INAPLICABILIDADE. Esta Corte entende pela
impossibilidade de aplicação do princípio da insignificância
quando o agente é reincidente. (AgRg no AREsp
1015210/MG, Rel. Min. Felix Fischer, 5ª T., j. 04/04/2017)

Na prática, observa-se que, na maioria dos julgados, o STF e o STJ negam a


aplicação da insignificância caso o réu seja reincidente ou já responda a outros
inquéritos ou ações penais. De igual modo, nega o benefício em situações de furto
qualificado, embora não se trate de regra absoluta (STF, Plenário, HC 123108/MG, HC
123533/SP e HC 123734/MG, Rel. Min. Barroso, j. 3/8/2015 - Info 793).

Assim, vamos aos precedentes em sentido contrário. É de se destacar que a


reincidência ou a habitualidade delitiva não impedem, por si sós, que o juiz da causa
reconheça a insignificância penal da conduta, à luz dos elementos do caso concreto.
Vejamos este julgado da 2ª Turma do STF, envolvendo furto famélico:
Agravo regimental em habeas corpus. Penal. Furto
qualificado (CP, art. 155, § 4º, inciso IV). Pretendido
reconhecimento do princípio da insignificância.
Possibilidade excepcional, à luz das circunstâncias do caso
concreto. Agravo provido. 1. À luz dos elementos dos autos,
o caso é de incidência excepcional do princípio da
insignificância, na linha de precedentes da Corte. 2. As
circunstâncias e o contexto que se apresentam permitem
concluir pela ausência de lesão significativa que justifique a
intervenção do direito penal, mormente se considerarmos a
inexpressividade dos bens subtraídos (avaliados em R$
116,50) e o fato de o ora agravante não ser, tecnicamente,
reincidente específico, já que a única ação penal à qual
responde não transitou em julgado. 3. Há de se ponderar,
ainda, a condição de hipossuficiência do agente, além do fato
de que a sua conduta foi praticada sem violência física ou
moral a quem quer que seja, sendo certo, ademais, que os
bens furtados foram restituídos à vítima, afastando-se,
portanto, o prejuízo efetivo. 4. Agravo regimental ao qual se
dá provimento. (HC 141440 AgR, Rel. Min. Dias Toffoli, 2ª T.,
j. 14/08/2018, Info 911).
21
A Primeira Turma do STF tem entendimento distinto e bastante peculiar, pois
apesar de não reconhecer a insignificância por conta da reincidência, usou as
circunstâncias menos graves do caso para determinar a substituição da pena restritiva
de liberdade por restritiva de direitos (manobra expressamente vedada pela literalidade
da redação legal):

HABEAS CORPUS. FURTO. PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA.


INAPLICABILIDADE. REITERÂNCIA DELITIVA. SUBSTITUIÇÃO
DA PENA CORPORAL POR RESTRITIVA DEDIREITOS.
CONCESSÃO DE OFÍCIO. 1. A orientação firmada pelo
Plenário do STF é no sentido de que a aferição da
insignificância da conduta como requisito negativo da
tipicidade, em crimes contra o patrimônio, envolve um
juízo amplo, que vai além da simples aferição do resultado
material da conduta, abrangendo também a reincidência
ou contumácia do agente, elementos que, embora não
determinantes, devem ser considerados (HC 123.533,
Relator Min. Roberto Barroso, DJe de 18/2/2016). 2.
Busca-se, desse modo, evitar que ações típicas de pequena
significação passem a ser consideradas penalmente lícitas
e imunes a qualquer espécie de repressão estatal,
perdendo-se de vista as relevantes consequências jurídicas
e sociais desse fato decorrentes. 3. A aplicação do princípio
da insignificância não depende apenas da magnitude do
resultado da conduta. Essa ideia se reforça pelo fato de já
haver previsão na legislação penal da possibilidade de
mensuração da gravidade da ação, o que, embora sem
excluir a tipicidade da conduta, pode desembocar em
significativo abrandamento da pena ou até mesmo na
mitigação da persecução penal. 4. Não se mostra possível
acatar a tese de atipicidade material da conduta, pois não
há como afastar o elevado nível de reprovabilidade
assentado pelas instâncias antecedentes, ainda mais
considerando os registros do Tribunal local dando conta
de que o réu possui diversos registros criminais,
ostentando, inclusive, uma condenação com trânsito em
julgado por delito de natureza patrimonial, o que
desautoriza a aplicação do princípio da insignificância, na
linha da jurisprudência desta Corte. 5. Quanto ao modo de
cumprimento da reprimenda penal, há quadro de
constrangimento ilegal a ser corrigido de ofício. A
imposição do regime inicial semiaberto, com arrimo na
22
reincidência, parece colidir com a proporcionalidade na
escolha do regime que melhor se coadune com as
circunstâncias da conduta de furto de bem pertencente
a estabelecimento comercial, avaliado em R$ 31,20 (trinta
e um reais e vinte centavos). Acrescente-se que as
circunstâncias judiciais são favoráveis, razão por que a
pena-base fora estabelecida no mínimo legal (cf.
HC123.533, Tribunal Pleno, Rel. Min. Roberto Barroso), de
modo que a conversão da reprimenda corporal por
restritivas de direito melhor se amolda à espécie. 6. Ordem
de Habeas Corpus concedida, de ofício, para converter a
pena corporal em sanções restritivas de direito, cabendo
ao Juízo de origem fixar as condições das penas
substitutivas. (HC 137217/MG, Rel. Min. Marco Aurélio,
red. p/ ac. Min. Alexandre de Moraes, j. 28/08/2018, Info
913).
Observação: Traremos decisões relevantes envolvendo o princípio da insignificância
quando examinarmos os tipos penais respectivos. No entanto, atenção para as
súmulas nº 599 e 589 do STJ.
Súmula 589: É inaplicável o princípio da insignificância nos crimes ou contravenções
penais praticados contra a mulher no âmbito das relações domésticas. STJ. 3ª Seção.
DJe 18/09/2017
Súmula 599: O princípio da insignificância é inaplicável aos crimes contra a
administração pública. STJ. 3ª Seção. Dje 27/11/2017

Finalmente, ainda há divergência sobre a possibilidade de o Delegado de Polícia


aplicar o princípio da insignificância em Auto de Prisão em Flagrante ou até em um
Inquérito Policial. Tal tema não deve ser abordado em prova objetiva, todavia, é possível
que apareça em prova subjetiva.

A defesa para aplicação se dá na celeridade, eficiência, além da carreira de


Delegado de Polícia ser carreira jurídica. Já imaginou deixar um cidadão que furtou
biscoitos preso por 24h só por que o Delegado não pode aplicar o princípio?

De outra banda, doutrina clássica entende que o Delegado só teria que verificar
a tipicidade formal, não podendo aplicar o princípio da insignificância.

O que é bagatela imprópria?


23
Na bagatela própria, o fato já nasce irrelevante para o direito penal, gerando
atipicidade material do fato (ex.: sujeito furta uma folha de papel).

Já na bagatela imprópria, falamos na tese da desnecessidade da pena. O fato


nasce relevante para o Direito Penal, sendo típico, ilícito e culpável (existe desvalor da
conduta e do resultado). Porém, no momento da sentença, o julgador entende que a
aplicação da pena é desnecessária (falta do interesse de punir). Não deve, em regra, ser
defendida em provas de Delegado (costuma ser uma tese defensiva trazida em provas
da Defensoria). Um exemplo seria o roubo praticado por um amigo no qual houve prisão
cautelar, reparação do dano, perdão pelo ofendido e circunstâncias judiciais favoráveis.

Lesividade ou ofensividade.

A lesividade, considerada por alguns como princípio autônomo, significa que


apenas condutas que causam efetiva lesão ou perigo de lesão a um bem jurídico podem
ser objeto de repressão penal.

Não há crime sem ofensa (nullum crimen sine iniuria). Se a conduta, no caso
concreto, não violar o bem jurídico, nem sequer ameaçá-lo, não existe crime.

É uma decorrência da intervenção mínima, mais especificamente do


subprincípio da fragmentariedade, delimitando a incidência do Direito Penal tanto em
âmbito administrativo como no âmbito jurisdicional.
A lesividade não se confunde com o princípio da alteridade (proibição da
punição por mal causado a si mesmo). O direito penal não pune a autolesão.

Adequação social.

Significa que uma conduta, sendo aceita e aprovada pela sociedade, não pode
ser considerada materialmente típica. Constitui uma decorrência da intervenção mínima
(mas, assim como a ofensividade e insignificância, há autores que classificam a
adequação social como princípio autônomo). Exemplo:

Casa de prostituição - CP, art. 229 - Ilicitude afastada pela


realidade social e evolução dos costumes - Conceito moral
ultrapassado e já sem sustentáculo na atualidade - Sua
consequente atipicidade. - Embora ainda figure no Código
Penal vigente, - este dos idos de 1940 -, a conduta a que se
refere o seu art. 229 (casa de prostituição) deixou de ser vista
à conta de delituosa. E deixou de sê-lo, porque se trata de um
conceito moral reconhecidamente ultrapassado e que já não
tem mais como sustentar-se nos dias atuais. A sociedade
hodierna culminou por ditar uma realidade que acabou por
afastar a ilicitude daquela conduta - a do art. 229 -, tornando-
a, em consequência, atípica, em nome da evolução dos
costumes (TJMG. Apelação Criminal 1.0024.04.375455-
24
5/001. 2ª Câmara Criminal. Rel. Des. Hyparco Immesi. j. em
26.06.2008)

Cabe lembrar que a redação do art. 229 do CP já foi modificada, prevalecendo


o delito unicamente quando há prática de exploração sexual. O STJ entende que a
adequação social não afasta a tipicidade da conduta de expor à venda CDs e DVDs
piratas, como diz a já referida Súmula 502 da aludida Corte.

1.10. INDIVIDUALIZAÇÃO DA PENA

CF, art. 5º, XLVI - a lei regulará a individualização da pena e adotará, entre outras,
as seguintes:
a) privação ou restrição da liberdade;
b) perda de bens;
c) multa;
d) prestação social alternativa;
e) suspensão ou interdição de direitos.
Este princípio constitucional expresso significa que a pena deve ser
individualizada para cada caso, evitando-se padronizações.

A individualização se dá em três planos:

Legislativo O legislador comina a pena mínima e a pena máxima


abstratamente cabíveis. Ex.: “Pena – reclusão, de 1 a 4 anos”.

O juiz do processo de conhecimento aplica a pena no caso


concreto, tomando por base a sanção mínima e a máxima
estabelecidas na lei.
Judiciário
Obs.: A individualização judicial compreende não só a fixação da
quantidade de pena, também a fixação de regime inicial,
possibilidade de substituição por restritiva de direitos ou
concessão de sursis etc.

No momento da execução da pena, o juiz fará as adaptações ao


caso concreto, já que o Estado deve zelar por cada condenado de
Executório ou forma individual, mediante tratamento penitenciário ou sistema
Administrativo alternativo no qual se afigure possível alcançar a finalidade da
pena - retribuição, prevenção e ressocialização. (ex.: progressão
25
de regime, regressão de regime, indulto, remição etc.)

Observação: Há relevantes decisões do STF sobre individualização da pena nos


crimes hediondos e tráfico de drogas, que trataremos oportunamente. O STJ (HC
463.434-MT, j. 25/11/2020, Info 684) já decidiu que, quando houver mais de uma
causa de aumento, uma delas pode ser empregada na terceira fase da dosimetria e
as demais podem ser aplicadas negativamente em outras fases da dosimetria (ex.
roubo majorado pelo concurso de agentes e pelo uso de arma – uma majora a pena
a outra é circunstância judicial negativa).

1.11. CULPABILIDADE
É princípio constitucional implícito e genérico, que possui três vertentes:

a) proibição de responsabilização penal sem dolo ou culpa;


b) vedação de aplicação da pena sem culpabilidade, isto é,
desprovida de imputabilidade, possibilidade de
conhecimento da ilicitude do ato e exigibilidade de outra
conduta;
c) a gravidade da pena deve ser proporcional à gravidade do
fato cometido.
Portanto, são incompatíveis com o princípio da culpabilidade: versari in re
illicita (imputação do ato criminoso ao agente só por ter agido de maneira voluntária,
ainda que sem dolo ou culpa); a fundamentação ou agravamento da pena pelo simples
resultado; a desconsideração da importância das modalidades de erro jurídico-penal.

1.12. HUMANIDADE

CF, art. 5º, XLVII - não haverá penas:

a) de morte, salvo em caso de guerra declarada, nos termos do art. 84, XIX;

b) de caráter perpétuo;

c) de trabalhos forçados;

d) de banimento;

e) cruéis;

XLIX - é assegurado aos presos o respeito à integridade física e moral.


26
Este princípio constitucional expresso determina o respeito à integridade física
e moral dos acusados e sentenciados, vedando quaisquer tipos de penas desumanas ou
cruéis. Vale citar:

STF: RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO POR MORTE DE


DETENTO. ARTIGOS 5º, XLIX, E 37, § 6º, DA CF - “É dever do
Estado e direito subjetivo do preso que a execução da pena
se dê de forma humanizada, garantindo-se os direitos
fundamentais do detento, e o de ter preservada a sua
incolumidade física e moral (artigo 5º, inciso XLIX, da CF”) (RE
841526/RS, Rep. Geral, Rel. Min. Luiz Fux, j. 30/3/2016).

1.13. PROPORCIONALIDADE
No âmbito do Direito Penal, significa que a severidade das penas deve ser
proporcional à gravidade dos delitos praticados.

A proporcionalidade deve ser observada tanto pelo legislador, ao cominar


abstratamente a pena de cada infração penal, quanto pelo julgador, que deve aplicar a
pena de modo a torná-la equilibrada em relação ao fato praticado. Como se percebe, o
princípio guarda relação com o da individualização da pena.
Com base na proporcionalidade, reconhecendo a inconstitucionalidade do
preceito secundário do art. 273, § 1º-B, V, do CP:

STJ: “É inconstitucional o preceito secundário do art. 273, §


1º-B, V, do CP, de reclusão, de 10 (dez) a 15 (quinze) anos, e
multa, devendo-se considerar, no cálculo da reprimenda, a
pena prevista no caput do art. 33 da Lei 11.343/2006 (Lei de
Drogas), com possibilidade de incidência da causa de
diminuição de pena do respectivo § 4º. De fato, é viável a
fiscalização judicial da constitucionalidade de preceito
legislativo que implique intervenção estatal por meio do
Direito Penal, examinando se o legislador considerou
suficientemente os fatos e prognoses e se utilizou de sua
margem de ação de forma adequada para a proteção
suficiente dos bens jurídicos fundamentais. (...) A ideia é a de
que a intervenção estatal por meio do Direito Penal, como
ultima ratio, deve ser sempre guiada pelo princípio da
proporcionalidade [...]” (STJ, AI no HC 239.363-PR, Rel. Min.
Sebastião Reis Júnior, j. 26/2/2015, DJe 10/4/2015).

Observação: O princípio da proporcionalidade é bastante estudado em Direito


27
Constitucional, apresentando um sentido mais amplo, aplicável a todos os ramos do
Direito. Nesse enfoque, conforme a base teórica de Robert Alexi, a
proporcionalidade é um postulado que apresenta 3 subprincípios: adequação,
necessidade e proporcionalidade em sentido estrito

Proibição da proteção deficiente (untermassverbot) e proibição do excesso


(übermassverbot)

Tradicionalmente, o princípio da proporcionalidade relaciona-se à proibição de


excesso do poder estatal, evitando a hipertrofia da punição.

Modernamente, também se extrai do princípio o sentido de proibição da


proteção deficiente: o Estado tem o dever de tutelar direitos fundamentais frente a
ataques de terceiros (imperativo de tutela). Na jurisprudência:
STF: HABEAS CORPUS. PORTE ILEGAL DE ARMA DE FOGO
DESMUNICIADA. (A)TIPICIDADE DA CONDUTA.
CONTROLE DE CONSTITUCIONALIDADE DAS LEIS PENAIS.
MANDATOS CONSTITUCIONAIS DE CRIMINALIZAÇÃO E
MODELO EXIGENTE DE CONTROLE DE
CONSTITUCIONALIDADE DAS LEIS EM MATÉRIA PENAL.
CRIMES DE PERIGO ABSTRATO EM FACE DO PRINCÍPIO DA
PROPORCIONALIDADE. LEGITIMIDADE DA
CRIMINALIZAÇÃO DO PORTE DE ARMA DESMUNICIADA.
ORDEM DENEGADA. 1. CONTROLE DE
CONSTITUCIONALIDADE DAS LEIS PENAIS. (...) Pode-se
dizer que os direitos fundamentais expressam não apenas
uma proibição do excesso (...), como também podem ser
traduzidos como proibições de proteção insuficiente ou
imperativos de tutela (...). Os mandatos constitucionais
de criminalização, portanto, impõem ao legislador, para o
seu devido cumprimento, o dever de observância do
princípio da proporcionalidade como proibição de
excesso e como proibição de proteção insuficiente (STF,
HC 104410, Rel. Min. Gilmar Mendes, 2ª T., Dje
27/03/2012 – destacou-se)

28
1.14. FONTES DO DIREITO PENAL
De onde emana o Direito Penal?

1.14.1. FONTES MATERIAIS (SUBSTANCIAIS OU DE PRODUÇÃO)

São as fontes responsáveis pela criação do Direito Penal. A competência para


legislar sobre direito penal é Privativa da União (art. 22, I, CF).

Exceção: os Estados, se autorizados por Lei Complementar editada pela União,


poderão legislar sobre questões específicas (art. 22, p.ú., CF).

1.14.2. FONTES FORMAIS (COGNITIVAS OU DE CONHECIMENTO)

De que maneira o Direito Penal exterioriza suas normas? As fontes formais são
as formas de exteriorização do Direito Penal.

1.14.2.1. Fonte imediata ou direta

É a LEI: Direito penal incriminador somente pode se exteriorizar por meio de lei
em sentido estrito, norma emanada do Congresso. Situações peculiares:
- Lei Complementar à Constituição – a maioria da doutrina
admite (Ex.: LC 105/2001, art. 10).
- Lei delegada – não cria lei penal (é delegação ao Presidente
da República, e o Presidente da República não edita lei penal).
- Medida provisória não pode criar crime. O art. 62 da CF veda.
- Medida provisória a favor do réu – admissível. A CF somente
proíbe contra o réu (STF, RE 254718).

1.14.2.2. Fonte mediata ou secundária

a) Costumes

São normas de comportamento que as pessoas adotam como se fossem


obrigatórias. Não podem criar crime nem penas. Excepcionalmente, podem influir no
direito penal. Ex.: princípio da adequação social; conceito de repouso noturno no crime
de furto, que varia de uma localidade para outra etc.

Mas atenção, alguns autores optam por classificar os costumes como Fontes
Informais do Direito Penal.

b) Princípios Gerais do Direito

São os valores, premissas e orientações fundamentais que inspiram a


elaboração, a interpretação e a preservação do ordenamento jurídico. Costumam ser
utilizados em decisões absolutórias. Ex: principio da insignificância.
29
c) Atos Administrativos

Os atos administrativos são considerados como fontes mediatas do Direito


Penal quando servem de complemento da norma penal em branco, a exemplo da
clássica Portaria 344, que delimita diversas substâncias como droga.

d) Outras fontes mediatas ou secundárias

Não obstante a divergência doutrinária, é válido ressaltar que alguns autores


entendem que também são fontes mediatas do Direito Penal: a doutrina, a
jurisprudência e os tratados internacionais de direitos humanos.

i) Doutrina: Por explicar ou interpretar as fontes imediatas, a doutrina pode ser


considerada fonte do Direito Penal.

ii) Jurisprudência: A jurisprudência é fonte reveladora do direito penal,


podendo, inclusive, ter caráter vinculante.

iii) Tratados e convenções internacionais de direitos humanos: Entende-se


que não podem criar crimes e penas para o direito interno, apenas no âmbito do direito
internacional. No entanto, tais tratados podem ser utilizados quando a questão versar
sobre direito penal não-incriminador.
1.14.3. Constituição Federal

Atuando como limite e fundamento do Direito Penal, a Constituição não


contém crimes e penas, mas traz princípios penais e processuais penais, rol de penas
permitidas e proibidas etc.

Fala-se atualmente também em mandatos constitucionais de criminalização


(expressos ou implícitos), determinando ao legislador a proteção suficiente/eficiente em
determinados temas. Tal se dá, por exemplo, com o crime de racismo (art. 5º, XLII),
crimes hediondos e equiparados (art. 5º, XLIII), ação de grupos armados contra a ordem
constitucional e o Estado Democrático (art. 5º, XLIV) e crimes ambientais (art. 225, 3º).

1.15. RELAÇÃO DO DIREITO PENAL COM OUTROS RAMOS


Iniciando pelo direito processual penal, é através dele que as leis penais são
concretizadas. Cleber Masson aponta que a finalidade precípua do Processo Penal é
“garantir a efetiva e justa incidência ao caso concreto das leis penais objetivas”. Tal ramo
incide no Direito Penal através do princípio constitucional do devido processo legal, aqui
já estudado.

Quanto ao direito constitucional, são principalmente os princípios da CF que


condicionam o Direito Penal, limitando a sua aplicação e trazendo fundamentos de
validade. Como exemplo, a inviolabilidade do domicílio (Art. 5º, XI) se sobrepõe ao
Código Penal, não podendo ser criadas novas formas de violação distintas daquelas
previstas na Carta Maior.
30
O Direito Penal também desenvolve o Constitucional, pois é através da
tipificação de delitos que se protegem os bens jurídicos insculpidos na CF, como a
propriedade privada, integridade corporal e a vida.

O direito civil traz relação com o âmbito criminal através de conceitos como
posse, propriedade e detenção, sendo válidos em crimes como a invasão de domicílio,
por exemplo. O Direito Civil também é essencial para entender crimes contra o
casamento ou falimentares.

No Direito Administrativo, temos a evidente familiaridade com o Direito Penal


com os Crimes Contra a Administração Pública, no CP, e com os Crimes em licitações em
contratos administrativos, que antes figuravam na revogada Lei nº 8.666/93, mas agora
estão no CP após a nova Lei de Licitações (14.133/2021). Podemos citar também os
Crimes Contra a Ordem Tributária da Lei nº 8.137/90.

Uma importante relação entre os ramos se dá em relação às normas penais em


branco heterogêneas, a exemplo dos crimes da Lei de Drogas (11.343/2006), cujo
conceito de “droga” advém de atos administrativos (Portaria da Anvisa).

Outra relação, também válida para o Direito Civil, é a possibilidade de um


mesmo fato gerar repercussões em diferentes ramos jurídicos. Um acidente de trânsito
cometido por um funcionário público, por exemplo, pode ensejar responsabilidade civil,
criminal e administrativa de uma só vez, sem que exista bis in idem.
É possível falar também em relação com o Direito Internacional, através do
Tribunal Penal Internacional, ao qual o Brasil de submete, além de questões como a
territorialidade da lei penal, estudada adiante, e institutos como a extradição.

1.16. INTERPRETAÇÃO DA LEI PENAL


1.16.1. ANALOGIA (ARGUMENTO ANALÓGICO OU APLICAÇÃO ANALÓGICA)

A analogia não é forma de interpretação da lei penal. Trata-se de processo de


integração da norma, cuja finalidade é suprir lacunas. Consiste em aplicar a um fato não
disciplinado por norma alguma norma disciplinadora de fato semelhante.

NORMA AUSÊNCIA DE NORMA

FATO FATO SEMELHANTE

31
É possível analogia em Direito Penal?

Analogia contra o réu (analogia in mallam partem)  vedada, já que tal hipótese
feriria o princípio da legalidade.

Analogia a favor do réu (analogia in bonam partem)  admissível, se a omissão


legislativa for involuntária. O silêncio eloquente não permite o uso da analogia, ainda
que favorável ao réu.

1.16.2. Interpretação extensiva

Processo de extração do significado da norma, ampliando o seu alcance para


possibilitar sua aplicação lógica.

Há controvérsia sobre a possibilidade de interpretação extensiva contra o réu.


Há duas correntes:

1) Possível, pois não é um processo de criação de normas,


sendo tão somente de interpretação. Ex.: Pune-se a bigamia
(casar duas vezes). Por interpretação extensiva, deve-se punir
a poligamia (casar múltiplas vezes) / O art. 172 pune a
emissão de duplicata em desacordo com a venda realizada.
Por interpretação extensiva, deve-se punir a emissão de
duplicata quando não existir a venda.
2) Não é possível, pois a lei penal incriminadora deve ser
interpretada restritivamente. Nesse sentido:

STJ: “O princípio da estreita legalidade impede a


interpretação extensiva para ampliar o objeto descrito na lei
penal. Na medida em que as multas não se inserem no
conceito de tributo é defeso considerar que sua cobrança,
ainda que eventualmente indevida – quer pelo meio
empregado quer pela sua não incidência - tenha o condão de
configurar o delito de excesso de exação, sob pena de
violação do princípio da legalidade, consagrado no art. 5º,
XXXIX, da Constituição Federal e art. 1º do CP” (STJ, HC
476.315, Rel. Min. Celso Limongi, 6ª T., j. 17/12/2009).

1.16.3. Interpretação analógica (intra legem)

Processo de extração do significado da norma, utilizando-se os elementos


fornecidos pela própria norma interpretada. É admissível, pois prevista na própria lei. O
legislador utiliza uma cláusula genérica seguida de uma fórmula casuística. Assim,
aquela (a cláusula genérica) deve ser compreendida em harmonia com os casos
equivalentes (a fórmula casuística). Exemplos: 32
CP, art. 121, § 2°: Se o homicídio é cometido:

I - mediante paga ou promessa de recompensa, ou por outro motivo torpe; (...)

III - com emprego de veneno, fogo, explosivo, asfixia, tortura ou outro meio
insidioso ou cruel, ou de que possa resultar perigo comum;

Vale a pena registrar a seguinte diferença:

- Interpretação Analógica: interpreta aplicando o próprio


conteúdo da norma.
- Analogia: integra a norma suprindo lacunas.
Também podemos destacar que as normas que estabelecem regras de
interpretação para outras normas é chamada pela doutrina de interpretação autêntica.
Exemplo clássico é o conceito de funcionário público do art. 327 do CP, usado para os
crimes contra a administração pública.

1.16.4. Norma penal em branco (norma cega ou aberta)

São normas penais cujo conteúdo do preceito primário não é determinado,


porém determinável, exigindo-se complementação por outra norma (integradora ou
complementar). O instituto divide-se em:
a) Norma penal em branco imprópria ou em sentido amplo ou homogênea;

b) Norma penal em branco própria, heterogênea ou em sentido estrito.

1.16.5. Norma penal em branco imprópria ou em sentido amplo ou homogênea

A fonte de produção do tipo penal em branco e do complemento é homogênea,


ou seja, ambos derivam do Congresso Nacional e se exteriorizam por meio de lei. A
norma penal em branco homogênea se subdivide em:

a) Homovitelina – O complemento dado pelo legislador está


no mesmo corpo normativo do tipo principal.
Ex.: os crimes funcionais e o conceito de funcionário público
estão no Código Penal (art. 327).
b) Heterovitelina – O complemento normativo dado pelo
legislador está em outro diploma legal, distinto daquele que
contém o tipo principal.
Ex.: art. 236 do CP – contrair casamento ocultando
impedimento (conceito de impedimento está no CC/2002).
1.16.6. Norma penal em branco própria, heterogênea ou em sentido estrito

A fonte de produção do complemento do tipo penal em branco (que deriva da


União e se exterioriza por meio de lei) é diversa da do tipo criminal. Na norma penal em
branco heterogênea o complemento encontra-se em atos infralegais, como por
exemplo, portarias e decretos do Poder Executivo.
33
Ex.: relação de drogas, no crime de tráfico, consta na portaria nº 344/1998,
editada pelo Ministério da Saúde.

A lei penal em branco HETEROGÊNEA é constitucional ou há violação ao


princípio constitucional da legalidade?

A discussão ocorre porque o complemento da NPB heterogênea encontra


previsão em ato infralegal.

É amplamente majoritário o entendimento de que não é inconstitucional. Para


que se atenda ao princípio da legalidade basta que o TIPO PENAL esteja previsto em lei
em sentido formal. A norma é indeterminada, mas determinável.

1.16.7. Norma penal em branco invertida ou ao revés ou às avessas/lei penal


incompleta/imperfeita ou crime remetido:

Há inversão quanto ao local no qual se exige a complementação normativa. O


tipo penal traz satisfatoriamente a descrição do preceito primário, no entanto, o
secundário (cominação da pena) é lacunoso ou incompleto. Ex.: genocídio (Lei 2.889/56,
art. 1º) que remete às penas do Código Penal e uso de documento falso (art. 304 CP),
no qual a pena corresponde ao crime de falsidade relacionado.
Nesse caso, o complemento (sanção aplicável) só pode ser fornecido por lei em
sentido estrito, sob pena de violação do princípio da reserva legal.

1.16.8. Norma penal em branco de fundo constitucional

Se dá quando o complemento do preceito primário é norma constitucional.

Ex: Art. 246 do CP (abandono intelectual) – “Deixar, sem justa causa, de prover
à instrução primária de filho em idade escolar”. O conceito de instrução primária pode
ser encontrado no art. 208, I da CF – “educação básica obrigatória e gratuita dos 4
(quatro) aos 17 (dezessete) anos de idade, assegurada inclusive sua oferta gratuita para
todos os que a ela não tiveram acesso na idade própria”.

1.16.9. Norma penal em branco ao quadrado

Verifica-se quando o próprio complemento da lei penal em branco necessita


também de complemento.

Ex: art. 38 da Lei 9.605/98: “Destruir ou danificar floresta considerada de


preservação permanente, mesmo que em formação, ou utilizá-la com infringência das
normas de proteção”. O conceito de “floresta de preservação permanente” é conferido
pelo art. 6º da Lei 12.651/12, mas além das hipóteses da lei, há uma ressalva:
“Consideram-se, ainda, de preservação permanente, quando declaradas de interesse
social por ato do Chefe do Poder Executivo, as áreas cobertas com florestas ou outras
formas de vegetação destinadas a uma ou mais das seguintes finalidades”. Assim, 34
podemos identificar que, em alguns casos, o complemento (conceito de floresta de
preservação permanente) também precisa de outro complemento (ato do Chefe do
Poder Executivo).

1.16.10. Tipo penal de DUPLA FACE EM BRANCO

Preceitos primário e secundário estão em branco. Ex.: artigo 304 do Código


Penal (uso de documento falso). Os “papéis falsificados” de que trata o tipo são
conceituados nos crimes de falsidade de documento público ou particular, assim como
a previsão das penas.
2. QUESTÕES

1. (DPC-SP/PCSP/2011) A ideia de que o Direito Penal, deve tutelar os valores


considerados imprescindíveis para a sociedade, e não todos os bens jurídicos, sintetiza
o princípio da
a) adequação social.
b) culpabilidade.
c) fragmentariedade.
d) ofensividade.
e) proporcionalidade.

2. (DPC-CE/CESPE/2011) Julgue o item que se seguem, relativos à aplicação da lei penal:


Aplica-se a novatio legis in mellius aos fatos anteriores, ainda que decididos por
sentença condenatória transitada em julgado, sem que haja violação à regra
constitucional da preservação da coisa julgada.
( ) Certo
( ) Errado

35
3. (DPC-SE/CESPE/2018) Julgue o item seguinte, relativo aos direitos e deveres
individuais e coletivos e às garantias constitucionais.
Em razão do princípio da legalidade penal, a tipificação de conduta como crime deve ser
feita por meio de lei em sentido material, não se exigindo, em regra, a lei em sentido
formal.
( ) Certo
( ) Errado

4. (PF – Perito Criminal/CESPE/2018) A fim de garantir o sustento de sua família, Pedro


adquiriu 500 CDs e DVDs piratas para posteriormente revendê-los. Certo dia, enquanto
expunha os produtos para venda em determinada praça pública de uma cidade
brasileira, Pedro foi surpreendido por policiais, que apreenderam a mercadoria e o
conduziram coercitivamente até a delegacia.
Com referência a essa situação hipotética, julgue o item subsequente.
O princípio da adequação social se aplica à conduta de Pedro, de modo que se revoga o
tipo penal incriminador em razão de se tratar de comportamento socialmente aceito.
( ) Certo
( ) Errado
5. (DPC-MA/CESPE/2018) No direito penal, a analogia
a) é uma forma de autointegração da norma penal para suprir as lacunas porventura
existentes.
b) é uma fonte formal imediata do direito penal.
c) utiliza, na modalidade jurídica, preceitos legais existentes para solucionar hipóteses
não previstas em lei.
d) corresponde a uma interpretação extensiva da norma penal.
e) é uma fonte formal mediata, tal como o costume e os princípios gerais do direito.

6. (TJSC/CESPE/2019) Constitui uma das características do direito penal do inimigo:


a) a legislação diferenciada.
b) a punição a partir de atos executórios.
c) a não utilização de medidas de segurança.
d) a observância das garantias processuais penais.
e) o abrandamento das penas na antecipação da tutela penal.

7. (TJPA/FCC/2019) Considerável parcela de doutrinadores compreende a política


criminal como o conjunto de princípios e atividades que tem por fim reagir contra o 36
fenômeno delitivo, através do sistema penal, determinando os meios mais adequados
para o controle da criminalidade. A partir dessa afirmação, julgue os itens a seguir.
I - Os movimentos sociais conhecidos por Tolerância Zero, Nova Defesa Social e
Despenalização das Contravenções são considerados instrumentos de endurecimento
do Estado no combate ao crescimento da criminalidade.
II - Os defensores do movimento Lei e Ordem reconhecem que o agravamento das penas
é medida necessária para combater a violência, embora acreditem que não faça justiça
às vítimas.
III - O movimento Tolerância Zero parte da ideia de que o Estado não deve negligenciar
fatos criminosos, por mais insignificantes que sejam, já que esses fatos contêm em si
uma fonte de irradiação da criminalidade.
Assinale a opção correta.
a) Apenas o item I está certo.
b) Apenas o item II está certo.
c) Apenas o item III está certo.
d) Apenas os itens I e II estão certos.
e) Apenas os itens II e III estão certos.
8. (VUNESP – Delegado – PC/SP – 2022) Na evolução do direito processual penal,
percebe-se a influência de outros ramos do direito. O ____________deu uma atenção
ao aspecto subjetivo do crime, combateu a vingança privada, humanizou as penas,
reprimiu o uso de ordálias e introduziu as penas privativas de liberdade em substituição
às patrimoniais.
É correto afirmar que o ramo do direito que corretamente completa o enunciado é:
a) Direito Americano
b) Direito Romano
c) Direito Germânico
d) Direito Francês
e) Direito Canônico

9. (VUNESP – Delegado – PC/SP – 2022) Prescreve o art. 327 do CP: “considera-se


funcionário público, para os efeitos penais, quem, embora transitoriamente ou sem
remuneração, exerce cargo, emprego ou função pública.”
Tal norma traduz exemplo de interpretação
a) científica.
b) autêntica.
c) extensiva. 37
d) doutrinária.
e) analógica.

10. (DPC-AC/IBADE/2017) Analise as seguintes assertivas acerca da norma penal:


“O suicídio é um crime (assassínio) [...]. Aniquilar o sujeito da moralidade na própria
pessoa é erradicar a existência da moralidade mesma do mundo, o máximo possível,
ainda que a moralidade seja um fim em si mesma. Consequentemente, dispor de si
mesmo como um mero meio para algum fim discricionário é rebaixar a humanidade na
própria pessoa (homo noumenon), à qual o ser humano (homo phaenomenon) foi,
todavia, confiado para preservação” (KANT, Immanuel, a Metafísica dos Costumes).
A extinção da própria vida já foi objeto de sancionamento penal em diversos países.
Esclarece Galdino Siqueira (Tratado, tomo III, p. 68) que o direito romano punia com
confisco de bens o ato de suicidar-se para fugir a uma acusação ou à pena por outro
delito. A mesma pena foi aplicada em França. O confisco-segundo o autor-persistia na
Inglaterra no início do século XX, desde que o suicídio não fosse efeito de uma desordem
mental provada. Tendo por base o confisco de bens outrora pertencentes ao suicida -
que tem herdeiros - como forma de punição penal, é correto afirmar que
responsabilização de terceiros pela conduta de alguém viola o princípio penal,
denominado:
a) individualização judicial da pena.
b) taxatividade.
c) intranscendência.
d) ofensividade.
e) inderrogabilidade.

11. (VUNESP – Delegado – PC/SP – 2014) Tendo o Direito Penal a missão subsidiária de
proteger os bens jurídicos e, com isso, o livre desenvolvimento do indivíduo, e, ainda,
sendo a pena vinculada ao Direito Penal e à Execução Penal, após a reforma do Código
Penal Brasileiro, em 1984, é correto afirmar que a finalidade da pena é
a) repreensiva e abusiva.
b) punitiva e reparativa.
c) retributiva e preventiva (geral e especial).
d) ressocializadora e reparativa.
e) punitiva e distributiva.

12. (CESPE/TJBA/2019) De acordo com a doutrina predominante no Brasil


relativamente aos princípios aplicáveis ao direito penal, assinale a opção correta.
a) O princípio da subsidiariedade determina que o direito penal somente tutele uma
pequena fração dos bens jurídicos protegidos, operando nas hipóteses em que se
38
verificar lesão ou ameaça de lesão mais intensa aos bens de maior relevância.
b) O princípio da ofensividade, segundo o qual não há crime sem lesão efetiva ou
concreta ao bem jurídico tutelado, não permite que o ordenamento jurídico preveja
crimes de perigo abstrato.
c) O princípio da adequação social serve de parâmetro ao legislador, que deve buscar
afastar a tipificação criminal de condutas consideradas socialmente adequadas.
d) O princípio da taxatividade, ou do mandado de certeza, preconiza que a lei penal seja
concreta e determinada em seu conteúdo, sendo vedados os tipos penais abertos.
e) O princípio da bagatela imprópria implica a atipicidade material de condutas
causadoras de danos ou de perigos ínfimos.

13. (CESPE/TJPR/2019) Nas disposições penais da Lei Geral da Copa, foi estabelecido
que os tipos penais previstos nessa legislação tivessem vigência até o dia 31 de
dezembro de 2014. Considerando-se essas informações, é correto afirmar que a referida
legislação é um exemplo de lei penal:
a) excepcional.
b) temporária.
c) corretiva.
d) intermediária.
14. (FCC/TJBA/2019) Segundo entendimento sumulado do Superior Tribunal de Justiça,
INAPLICÁVEL o princípio da insignificância:
a) aos crimes ambientais e aos crimes patrimoniais sem violência ou grave ameaça à
pessoa, se reincidente o acusado.
b) aos crimes praticados contra a criança e o adolescente e aos crimes contra a ordem
tributária.
c) às contravenções penais praticadas contra a mulher no âmbito das relações
domésticas e aos crimes contra a Administração pública.
d) aos crimes de licitações e às infrações de menor potencial ofensivo, já que regidas por
lei especial.
e) aos crimes de violação de direito autoral e aos crimes previstos no estatuto do
desarmamento.

15. (VUNESP/TJRO/2019) A respeito dos princípios penais, é correto afirmar que:


a) são princípios norteadores da aplicação e execução da pena o da legalidade, o da
intranscendência da pena e o da intervenção mínima do direito penal.
b) o princípio da humanidade das penas veda que o réu permaneça algemado durante
audiência de instrução e julgamento, bem como que o condenado cumpra pena em
estabelecimento prisional em localidade distante da família.
c) são princípios constitucionais explícitos o da proporcionalidade, o da reserva legal e o
39
da insignificância.
d) o princípio da adequação social implica revogação da norma penal que estiver em
desacordo à ordem social estabelecida.
e) são princípios limitadores ao poder punitivo do Estado o da insignificância, o da
fragmentariedade e o da proporcionalidade.

16. (VUNESP/TJRJ/2019) O princípio da insignificância, que defende a não intervenção


do Direito Penal para coibir ações típicas que causem ínfima lesão ao bem jurídico
tutelado é afastado pela jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, por sua Súmula
nº 599, em relação aos crimes:
a) contra a criança e o adolescente.
b) praticados contra as mulheres ou em condição de violência de gênero.
c) de menor potencial ofensivo.
d) contra a Administração Pública.
e) contra o meio ambiente.
17. (2017 – FAPEMS - PC-MS - Delegado de Polícia) Com relação aos princípios aplicáveis
ao Direito Penal, em especial no que se refere ao princípio da adequação social, assinale
a alternativa correta:
a) o Direito Penal deve tutelar bens jurídicos mais relevantes para a vida em sociedade,
sem levar em consideração valores exclusivamente morais ou ideológicos.
b) só se deve recorrer ao Direito Penal se outros ramos do direito não forem suficientes.
c) deve-se analisar se houve uma mínima ofensividade ao bem jurídico tutelado, se
houve periculosidade social da ação e se há reprovabilidade relevante no
comportamento do agente.
d) não há crime se não há lesão ou perigo real de lesão a bem jurídico tutelado pelo
Direito Penal.
e) apesar de uma conduta subsumir ao modelo legal, não será considerada típica se for
historicamente aceita pela sociedade.

18. (FAPEMS - 2017 - PC-MS - Delegado de Polícia) No que diz respeito aos princípios
aplicáveis ao Direito Penal, analise os textos a seguir:
- A proteção de bens jurídicos não se realiza só mediante o Direito Penal, senão que
nessa missão cooperam todo o instrumental do ordenamento jurídico (ROXIN, Claus.
Der echo penai- parte geral. Madrid: Civitas, 1997.1.1, p. 65).
- A criminalização de uma conduta só se legitima se constituir meio necessário para a
proteção de ataques contra bens jurídicos importantes (BITENCOURT, Cezar Roberto.
40
Tratada de direito penal: parte geral. 20. ed. São Paulo: Saraiva, 2014, p. 54).
Nesse sentido, é correto afirmar que os textos se referem ao:
a) princípio da intervenção mínima, imputando ao Direito Penal somente fatos que
escapem aos meios extrapenais de controle social, em virtude da gravidade da agressão
e da importância do bem jurídico para a convivência social.
b) princípio da insignificância, que reserva ao Direito Penal a aplicação de pena somente
aos crimes que produzirem ataques graves a bem jurídicos protegidos por esse Direito,
sendo que agir de forma diferente causa afronta à tipicidade material.
c) princípio da adequação social em que as condutas previstas como ilícitas não
necessariamente revelam-se como relevantes para sofrerem a intervenção do Estado,
em particular quando se tornarem socialmente permitidas ou toleradas.
d) princípio da ofensividade, pois somente se justifica a intervenção do Estado para
reprimir a infração com aplicação de pena, quando houver dano ou perigo concreto de
dano a determinado interesse socialmente relevante e protegido pelo ordenamento
jurídico.
e) princípio da proporcionalidade, em que somente se reserva a intervenção do Estado,
quando for estritamente necessária a aplicação de pena em quantidade e qualidade
proporcionais à gravidade do dano produzido e a necessária prevenção futura.
19. (DPCES 2019 INSTITUTO ACESSO) O sistema penal é composto por órgãos de
naturezas jurídicas distintas com funções, dentre outras, de caráter investigativo,
repressivo, jurisdicional e prisional. É sabido que os números de letalidade no exercício
de tais funções, tanto de civis quanto de agentes do sistema penal têm aumentado nos
últimos anos. Por conta dessa informação, será preciso promover uma política pública
em âmbito penal que reverbere na diminuição de tal letalidade. (BATISTA, Nilo.
Introdução Crítica ao Direito Penal Brasileiro. 11. ed. Rio de Janeiro: Revan, 2007)
Identifique a alternativa correta que contenha os princípios que fundamentam o Direito
Penal, e que mostrem que sua observância se torna importante para o embasamento
da referida política pública.
a) Mínima letalidade/ letalidade controlada/ tutela civil e tutela penal/ livre iniciativa.
b) Mínimo proporcional/ reserva do possível/ humanidade/ lesividade.
c) Legalidade / proporcionalidade / penalidade / legítima defesa.
d) Intervenção mínima/ legalidade / lesividade / adequação social.
e) Devido processo legal/ contraditório e ampla defesa/ proximidade de jurisdição /
proporcionalidade.

20. (TJBA/CESPE/2019) A explicação do crime como fenômeno coletivo cuja origem


pode ser encontrada nas mais variadas causas sociais, como a pobreza, a educação, a
família e o ambiente moral, corresponde à perspectiva criminológica denominada: 41
a) sociologia criminal.
b) criminologia da escola positiva.
c) criminologia socialista.
d) tabelinha approach, ou etiquetamento.
e) ecologia criminal.
3. GABARITO COMENTADO
1. C

O princípio da fragmentariedade decorre do raciocínio de que o Direito Penal divide


(fragmenta) as relações sociais para selecionar os “fragmentos” de bens jurídicos cuja
defesa é importante o suficiente para o aparato penal do Estado.

2. CERTO

A novatio legis in mellius retroage até mesmo nos casos de coisa julgada, bastando a
análise do parágrafo único do art. 2º do CP: “A lei posterior, que de qualquer modo
favorecer o agente, aplica-se aos fatos anteriores, ainda que decididos por sentença
condenatória transitada em julgado”.

3. ERRADO

É necessário que as normas penais incriminadoras estejam previstas em lei em sentido


formal, em observância ao princípio da reserva legal, o que inclui o respeito ao devido
processo legislativo.

4. ERRADO

Prevalece que se trata de conduta típica prevista no CP. Súmula 502 do STJ: Presentes a
materialidade e a autoria, afigura-se típica, em relação ao crime previsto no art. 184, 2º, 42
do cp, a conduta de expor a venda cds e dvds piratas.

5. A

A fonte material da Lei penal é o próprio Estado. As fontes formais se dividem em


imediatas (lei) e mediatas (costumes, doutrina, jurispridência e princípios gerais de
direito). A analogia é meio de integração das normas penais, apenas quando benéfica
ao réu, pois veda-se a analogia in malam partem penal. A analogia legis consiste na
aplicação de norma jurídica já existente a um caso semelhante, enquanto a analogia iuris
se vale de princípios jurídicos para realizar a integração, por não existir dispositivo legal
semelhante no caso concreto.

6. A

De fato, a legislação diferenciada para aqueles considerados “inimigos” é uma das


características do Direito Penal do Inimigo de Gunther Jakobs (ex: lei de crimes
hediondos, lei de terrorismo, etc). O Direito Penal do inimigo também prevê a punição
a partir de atos preparatórios. É possível a utilização de medidas de segurança. As
garantias processuais penais tradicionais são flexibilizadas ou suprimidas e não há
abrandamento das penas.
7. C

(I) INCORRETA. A Nova Defesa Social é um movimento com traços de uma política
criminal humanista, na busca de um Direito Penal de caráter preventivo e protetor da
dignidade humana. Em sentido diametralmente oposto ao da Defesa Social, existem os
chamados Movimentos de Lei e Ordem, cuja ideologia estabelecida é a repressão,
pautada no regime punitivo-retributivo. A Despenalização das Contravenções, por seu
turno, não é considerada como instrumento de endurecimento do Estado no combate
ao crescimento da criminalidade.

(II) INCORRETA. Os defensores deste movimento acreditam que os criminosos somente


poderão ser controlados através de leis severas, que imponham a pena de morte e
longas penas privativas de liberdade. Estes seriam os únicos meios eficazes para
intimidar e neutralizar os criminosos e, além disso, capazes de fazer justiça às vítimas.

(III) CORRETA. Tal movimento parte da premissa de que os pequenos delitos devem ser
rechaçados, o que inibiria os mais graves (fulminar o mal em seu nascedouro), atuando
como prevenção geral; os espaços públicos e privados devem ser tutelados e
preservados.

8. E

O Direito Canônico era típico da Igreja Católica Apostólica Romana, pautado na


recuperação dos criminosos por meio do arrependimento, através de penas severas.
Combateu a “vingança privada” e o uso de ordálias (“provas” de inocência por meio de
43
tortura), o que humanizou as penas, e inovou ao consolidar a pena privativa de
liberdade.

9. B

A interpretação autêntica ocorre quando o próprio órgão responsável pela edição da


norma estabelece regras para interpretá-las. Tais normas interpretativas podem
retroagir, uma vez que apenas explicitam o sentido que a norma anterior deve ou
deveria ter expressado.

10. C

Correto é o princípio da intranscendência, que basicamente significa que a pena não


deve passar da pessoa do condenado. Dentre os princípios restantes, vimos que o da
individualização da pena evita a padronização da punição, ajustando a quantidade da
reprimenda às circunstâncias de cada caso e de cada agente. Deve ser respeitado na
esfera legislativa, judiciária e executória da pena. O da inderrogabilidade reza que
uma vez praticada um delito, a pena deverá ser aplicada (perdão judicial é exceção). A
ofensividade traduz o caráter de ultima ratio do Direito Penal e a taxatividade implica
na exigência de definição clara dos tipos penais, sem deixar dúvidas para a sua
aplicação.
11. C

Após a reforma de 84, as finalidades retributiva e preventiva estão previstas no art. 59


do CP. Com a Lei de Execução Penal, também passou a ser prevista a função
ressocializadora.

12. C

(A) INCORRETA: De acordo com o princípio da subsidiariedade, a atuação do Direito


Penal é cabível unicamente quando os outros ramos do Direito e os demais meios
estatais de controle social tiverem se revelado impotentes para o controle da ordem
pública. Em outras palavras, o Direito Penal funciona como um executor de reserva,
entrando em cena somente quando outros meios estatais de proteção mais brandos, e,
portanto, menos invasivos da liberdade individual não forem suficientes para a proteção
do bem jurídico tutelado.

(B) INCORRETA: De acordo com o princípio da ofensividade ou lesividade, não há


infração penal quando a conduta não tiver oferecido ao menos perigo de lesão ao bem
jurídico. Este princípio atende a manifesta exigência de delimitação do Direito Penal,
tanto em nível legislativo como no âmbito jurisdicional.

(C) CORRETA: De acordo com esse princípio, não pode ser considerado criminoso o
comportamento humano que, embora tipificado em lei, não afrontar o sentimento
social de Justiça.
44
(D) INCORRETA: “Lege certa”, taxatividade ou mandato de certeza O princípio da
legalidade jamais cumprirá seu papel se a lei, ainda que anterior à conduta, puder ser
editada de tal modo genérico ou vago, que não se possa delimitar, com segurança e
concretude, quais comportamentos a ela se subsumem. Por esse motivo, são
inconstitucionais os tipos penais vagos. Deve a lei penal ser concreta e determinada em
seu conteúdo, sob pena de gerar incertezas quanto à sua aplicação e,
consequentemente, provocar indesejável insegurança jurídica. (André Estefam e Victor
Eduardo Rios Gonçalves - Direito penal esquematizado: parte geral) No entanto, apesar
de vedados os crimes genéricos/vagos, a taxatividade não impede a formação de
normas penais em branco ou os chamados tipos penais abertos.

(E) INCORRETA: De acordo com esse princípio, sem previsão legal no Brasil, inexiste
legitimidade na imposição da pena nas hipóteses em que, nada obstante a infração
penal esteja indiscutivelmente caracterizada, a aplicação da reprimenda desponte como
desnecessária e inoportuna. Apresenta desvalor da conduta e desvalor do resultado. O
fato é típico e ilícito, o agente é dotado de culpabilidade e o Estado possui o direito de
punir (punibilidade). É de se observar que a bagatela imprópria tem como pressuposto
inafastável a não incidência do princípio da insignificância (própria). Com efeito, se o
fato não era merecedor da tutela penal, em decorrência da sua atipicidade, descabe
enveredar pela discussão acerca da necessidade ou não de pena.
13. B

A Lei Geral da Copa insere-se perfeitamente no conceito de lei temporária, que, segundo
a doutrina, possui cláusula de autorrevogação, com data específica e determinada para
o término da vigência da lei. Difere da lei excepcional, que prevê para o término de
vigência um evento futuro, porém, sem data definida, como o término de uma Guerra,
por exemplo.

14. C

A questão merece atenção, na medida em que a alternativa correta é aquela que possui
todos os exemplos compatíveis com a exigência do enunciado. Assim sendo, temos:

(A) INCORRETA. Segundo o STJ, é APLICÁVEL o princípio da insignificância aos crimes


ambientais (AgRg no AREsp 654.321/SC), aos crimes patrimoniais sem violência ou grave
ameaça à pessoa (AgRg no AREsp 19042/DF), se reincidente o acusado (REsp
1509985/RJ).

(B) INCORRETA. Segundo o STJ, é INAPLICÁVEL o princípio da insignificância aos crimes


praticados contra a criança e o adolescente e APLICÁVEL aos crimes contra a ordem
tributária (REsp 1.709.029/MG).

(C) CORRETA. Segundo o STJ, é INAPLICÁVEL o princípio da insignificância às


contravenções penais praticadas contra a mulher no âmbito das relações domésticas
(Súmula 589-STJ) e aos crimes contra a Administração pública (Súmula 599-STJ) 45
(D) INCORRETA. Segundo o STJ, é APLICÁVEL o princípio da insignificância aos crimes de
licitações (Súmula 599-STJ) e às infrações de menor potencial ofensivo, já que regidas
por lei especial (Não há relação entre a aplicação do princípio da insignificância e
regência das infrações por leis especiais).

(E) INCORRETA. Segundo o STJ, é INAPLICÁVEL o princípio da insignificância aos crimes


de violação de direito autoral (AgRg no REsp 1380149/RS ) e APLICÁVEL, aos crimes
previstos no estatuto do desarmamento (Há exceção, pois é inaplicável aos crimes de
posse e de porte de arma de fogo - HC 338153/RS).

15. E

(A) INCORRETA. Apenas o princípio da intranscendência está mais proximamente ligado


à aplicação e à execução da pena, na medida em que significa que a pena não pode
passar da pessoa do delinquente. O princípio da legalidade, por sua vez, é limitação do
poder punitivo do Estado em face das máximas garantias do cidadão. Por fim, o princípio
da intervenção mínima apresenta-se para garantir que a intervenção estatal no plano
individual ocorra, apenas, quando estritamente necessário.

(B) INCORRETA. Para o princípio da humanidade das penas, a pena deve respeitar os
direitos fundamentais do condenado enquanto ser humano. Não pode, assim, violar a
sua integridade física ou moral (CF, art. 5.º, XLIX). Da mesma forma, o Estado não pode
dispensar nenhum tipo de tratamento cruel, desumano ou degradante ao preso. Com
esse propósito, o art. 5.º, XLVII, da Constituição Federal proíbe as penas de morte, de
trabalhos forçados, de banimento e cruéis, bem como a prisão perpétua. Assim sendo,
há proximidade do mencionado princípio com a vedação do cumprimento de pena em
estabelecimento prisional em localidade distante da família. Por outro lado, a vedação
de que o réu permaneça algemado durante audiência de instrução e julgamento, está
mais estreitamente ligada ao princípio da presunção de inocência.

(C) INCORRETA. É explícito o princípio da legalidade da reserva legal (art. 5º, XXXIX, CF).
Entretanto, são implícitos o princípio da proporcionalidade e o da insignificância.

(D) INCORRETA. Para o princípio da adequação social, não pode ser considerado
criminoso o comportamento humano que, embora tipificado em lei, não afrontar o
sentimento social de Justiça. Todavia, a adequação social não implica revogação da
norma penal.

(E) CORRETA. Os princípios da fragmentariedade, da subsidiariedade e da insignificância


(que causa atipicidade material da conduta), decorrentes da intervenção mínima,
limitam o poder punitivo estatal afirmando ser legítima a intervenção penal apenas
quando a criminalização de um fato se constitui meio indispensável para a proteção de
determinado bem ou interesse, não podendo ser tutelado por outros ramos do
ordenamento jurídico.

16. D

De acordo com o enunciado de nº 599 da súmula do STJ: “O princípio da insignificância


46
é inaplicável aos crimes contra a Administração Pública”.

17. E

A assertiva traz a exata definição do princípio da adequação social.

18. A

Conforme vimos no nosso ponto, os textos se encaixam perfeitamente na noção de


intervenção mínima do Estado. Somente devemos “chamar” o Direito Penal quando os
demais meios “falharem”. Como vemos na própria assertiva: “Direito Penal somente
fatos que escapem aos meios extrapenais de controle social, em virtude da gravidade
da agressão e da importância do bem jurídico para a convivência social.”

19. D

Questão extremamente mal formulada ao meu ver, trazendo como gabarito a assertiva
“D”. Podemos voltar no ponto e ler os conceitos dos princípios que estão no gabarito e
mesmo assim não é tão claro que correspondem ao texto. O candidato, para acertar
essa questão, deve marcar por exclusão a alternativa “D”. De toda sorte, por lealdade
aos nossos alunos, trazemos no ponto também as questões “impugnáveis”.
20. A

(A) CORRETA. No final do século XIX, via-se um predomínio das ideias sociológicas no
campo da explicação causal do delito (Lacassagne, Tarde e Durkheim). Suas obras
encontraram grande aceitação, enxergando o crime como fenômeno coletivo, cujas
raízes poderiam ser encontradas nas mais variadas causas sociais, como a pobreza, a
educação, a família, o ambiente moral. Investigando­-se esses focos, poderia se prever,
com alguma segurança, o aumento da criminalidade e, então, combatendo­-se essas
causas, seria possível obter algum sucesso em sua redução. (André Estefam e Victor
Eduardo Rios Gonçalves - Direito penal esquematizado: parte geral)

(B) INCORRETA. Pontua uma profunda mudança de foco na Ciência do Direito Penal,
que deixa de se voltar para o sistema legal (Escola Clássica), deslocando­-se para o
delinquente e a pesquisa das causas do crime. Enquanto a Escola Clássica empregava o
método dedutivo, de lógica abstrata, a Escola Positiva se socorria do método indutivo e
experimental. A pena deveria cumprir um papel eminentemente preventivo, atuando
como instrumento de defesa social. A sanção, portanto, não se balizava somente pela
gravidade do ilícito, mas, sobretudo, pela periculosidade do agente. (André Estefam e
Victor Eduardo Rios Gonçalves - Direito penal esquematizado: parte geral)

(C) INCORRETA. A Criminologia socialista (Marx e Engels) considerava que as causas do


crime prendiam­-se à miséria, à cobiça e à ambição, que eram as bases do sistema
capitalista e, portanto, ao combatê­-lo, por meio do socialismo, se poria um fim às
tragédias sociais e ao crime. (André Estefam e Victor Eduardo Rios Gonçalves - Direito
penal esquematizado: parte geral)
47
(D) INCORRETA. Cuida-se de uma abordagem que não enxerga no comportamento
criminoso razões ontológicas ou intrínsecas para sua qualificação como tal, mas o encara
como o resultado de uma abordagem decorrente do sistema de controle social. As
instituições, portanto, é que rotulam ou “etiquetam” um agir como desviante. A
sociedade torna o agente criminoso, pois decide o que é aceito e o que é proibido.
Inexiste, nesta perspectiva, o delinquente, senão como personagem social que, por
critérios eleitos pelas forças dominantes, dita normativamente o agir conforme as regras
e o agir desviante. (André Estefam e Victor Eduardo Rios Gonçalves - Direito penal
esquematizado: parte geral)

(E) INCORRETA. A Ecologia Criminal, expressão também utilizada para se referir ao


pensamento da Escola de Chicago, é o próprio princípio ecológico que, aplicado aos
problemas humanos e sociais, postula a sua equacionação na perspectiva do equilíbrio
duma comunidade humana com o seu ambiente concreto. Respeitável setor da doutrina
considera a Escola de Chicago um dos focos de expansão mais poderosos e influentes
da Sociologia criminal. Dentro da perspectiva da Escola de Chicago, a compreensão do
crime sistematiza-se a partir da observação de que a gênese delitiva relacionava-se
diretamente com o conglomerado urbano que, muitas vezes, estruturava-se de modo
desordenado e radical, o que favorecia a decomposição da solidariedade das estruturas
sociais. Não por outra razão, seus teóricos desenvolviam uma “sociologia da grande
cidade”. (Eduardo Viana – Criminologia)
CURSO MEGE

Site para cadastro: www.mege.com.br


Celular / Whatsapp: (99) 982622200 (Tim)
Turma: PCSP – Pré-Edital
Material: Direito Processual Penal – Ponto 1

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Direito Processual Penal MERGEF
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(Ponto 01)
Princípios. Sistemas Processuais. Aplicação da Lei
Processual Penal. Inquérito Policial.
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MENSAGEM DO MEGE

ATENÇÃO

Vamos começar nossa matéria com dois dos assuntos mais importantes para a
carreira de delegado de polícia, que são sistemas processuais e inquérito. Frisamos
nesse primeiro momento também alguns temas que necessitam de atenção, como por
exemplo lei processual no tempo e no espaço, e indiciamento. Você precisa ler várias
vezes a lei seca do processo penal até a prova, com a resolução das questões jurídicas
relacionadas a cada um dos temas do edital para Delegado de São Paulo que se avizinha.

Bons estudos!

Equipe Mege.

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3
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ORMAT
SUMÁRIO

1. DOUTRINA (RESUMO) ................................................................................................ 5


1.1. PRINCÍPIOS ............................................................................................................... 5
1.2. SISTEMAS PROCESSUAIS......................................................................................... 14
1.3. APLICAÇÃO DA LEI PROCESSUAL PENAL.................................................................. 16
1.4. INQUÉRITO POLICIAL .............................................................................................. 19
2. JURISPRUDÊNCIA ...................................................................................................... 37
3. QUESTÕES................................................................................................................. 38
4. GABARITO COMENTADO .......................................................................................... 45

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ORMAT
1. DOUTRINA (RESUMO)
1.1. PRINCÍPIOS
1.1.1. CONCEITO E FUNÇÕES

Os princípios são mandamentos nucleares de um sistema. São postulados que


se irradiam por todo o sistema de normas.

Os princípios têm duas funções principais: normativa e interpretativa. Com


efeito, os princípios são normas jurídicas, possuindo força coercitiva, podendo ser
invocados para a solução de casos concretos. Além disso, na hipótese de dúvida na
interpretação de certa norma, esta pode ser esclarecida por meio do conteúdo do
princípio.

1.1.2. PRINCÍPIOS PROCESSUAIS PENAIS E CONSTITUCIONAIS

A. Princípio da busca da verdade real

Também chamado de princípio da verdade material ou da verdade substancial,


significa que, no processo penal, devem ser realizadas as diligências necessárias e
adotadas todas as providências cabíveis para tentar descobrir como os fatos realmente
se passaram, de forma que o jus puniendi seja exercido com efetividade em relação
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àquele que praticou ou concorreu para a infração penal. 5
MERGEF
Não obstante, é necessário ter em vista que a procura da verdade real não pode
implicar violação de direitos e garantias estabelecidos na legislação. Assim, temos como ORMAT
exemplos de exceções à verdade real:

- A inadmissibilidade das provas obtidas por meios ilícitos (art.


5º, LVI, da CF);

- Descabimento da revisão criminal contra a sentença


absolutória transitada em julgado, mesmo diante do surgimento
de novas provas contra o réu;

- Vedação ao testemunho das pessoas que tiverem


conhecimento do fato em razão de sua profissão, função, ofício
ou ministério, salvo se, desobrigadas, quiserem depor (art. 207
do CPP).

B. Princípio ne procedat judex ex officio

Também chamado de princípio da ação ou princípio da demanda ou princípio


da iniciativa das partes, concretiza a regra da inércia da jurisdição e produz
consequências práticas importantes em relação ao desencadeamento da ação penal, ao
desenvolvimento válido do processo e à fase recursal.
O princípio em exame justifica a Súmula 160 do STF quando esta proíbe os
tribunais de reconhecerem, contra o réu, nulidades não arguidas no recurso da
acusação.

C. Princípio do devido processo legal (art. 5º, LIV, CF)

Art. 5º. Caput.

(...)

LIV - ninguém será privado da liberdade ou de seus bens sem o


devido processo legal;

O exame deste princípio, originário da cláusula do due process of law do Direito


anglo-americano, permite nele identificar alguns elementos essenciais à sua
configuração como expressiva garantia da ordem constitucional, destacando-se, dentre
eles, por sua inquestionável importância, as seguintes prerrogativas:

- O direito ao processo (garantia de acesso ao Poder Judiciário);

- O direito à citação e ao conhecimento prévio do teor da


acusação;

- O direito a um julgamento público e célere, sem dilações PAGE \*


indevidas; 6
MERGEF
- O direito ao contraditório e à plenitude de defesa (direito à ORMAT
autodefesa e à defesa técnica);

- O direito de não ser processado e julgado com base em leis ex


post facto;

- O direito à igualdade entre as partes;

- O direito de não ser processado com fundamento em provas


revestidas de ilicitude;

- O direito ao benefício da gratuidade;

- O direito à observância do princípio do juiz natural;

- O direito ao silêncio (privilégio contra a autoincriminação);

- O direito à prova; e

- O direito de presença e de participação ativa nos atos de


interrogatório judicial dos demais litisconsortes penais passivos,
quando existentes.
D. Princípio da vedação das provas ilícitas (art. 5º, LVI, CF)

Art. 5º. Caput.


(...)
LVI - são inadmissíveis, no processo, as provas obtidas por meios
ilícitos;

Provas ilícitas são aquelas obtidas por meios que afrontam direta ou
indiretamente garantias constitucionais e legais.

OBSERVAÇÃO: A doutrina processual penal faz uma distinção conceitual entre a


prova ilícita e a prova ilegítima, sendo aquela a obtida com violação ao direito
substantivo (material), e esta a obtida com violação ao direito adjetivo
(processual).

A vedação constitucional da prova ilícita não é absoluta no processo penal, já


que é possível ser afastada em favor do acusado, quando tiver por fim a prova da
inocência com fundamento no princípio da proporcionalidade.

E. Princípio da presunção de inocência (art. 5º, LVII, CF)


PAGE \*
Art. 5º. Caput. 7
MERGEF
(...)
LVII - ninguém será considerado culpado até o trânsito em ORMAT
julgado de sentença penal condenatória;

Também chamado de princípio do estado de inocência ou da situação jurídica


de inocência ou da não culpabilidade, este princípio deve ser considerado em três
momentos distintos: na instrução processual, como presunção legal relativa de não
culpabilidade, invertendo-se o ônus da prova; na avaliação da prova, impondo-se a
valoração das provas em favor do acusado quando houver dúvidas sobre a existência de
responsabilidade pelo fato imputado; e, no curso do processo penal, como parâmetro
de tratamento ao acusado, em especial no que concerne à análise quanto à necessidade
ou não de sua segregação provisória.

Sobre o princípio da presunção de inocência, não podemos deixar de tecer


breves considerações sobre a posição do STF acerca da execução provisória da pena,
tema que, ao longo do tempo, sofreu constantes mutações pela corte máxima.

Até 2009, o STF entendia ser possível a execução provisória da pena desde a
prolação da sentença condenatória em primeiro grau. Depois, em 05/02/09 (HC 84.078),
o STF passou a entender que a execução provisória da pena era inconstitucional,
devendo ser aguardado o trânsito em julgado em razão do princípio da presunção de
inocência. Esse entendimento prevaleceu até 2016, quando no HC 126.292 o STF decidiu
que era possível a execução provisória da pena, desde que proferido acórdão
condenatória em 2º grau (em sede de recurso ou em ações penais originárias).
Revisando seu entendimento sobre o tema, o STF decidiu na ADC 43/DF, ADC
44/DF e ADC 54/DF, em 07/11/19, por maioria (6x5), que a execução provisória da pena
ofende o princípio da presunção de inocência.

Este é o entendimento atual e que deve ser utilizado para a sua prova.

No que se refere ao tribunal do júri, a Lei nº 13.964/19 (Lei Anticrime) trouxe


uma importante e polêmica previsão: no caso de condenação igual ou superior a 15
(quinze) anos de reclusão, o juiz determinará, na sentença, a execução provisória das
penas, com expedição do mandado de prisão.

Art. 492. Em seguida, o presidente proferirá sentença que:


I – no caso de condenação:
e) mandará o acusado recolher-se ou recomendá-lo-á à prisão
em que se encontra, se presentes os requisitos da prisão
preventiva, ou, no caso de condenação a uma pena igual ou
superior a 15 (quinze) anos de reclusão, determinará a execução
provisória das penas, com expedição do mandado de prisão, se
for o caso, sem prejuízo do conhecimento de recursos que
vierem a ser interpostos;
§ 4º A apelação interposta contra decisão condenatória do
Tribunal do Júri a uma pena igual ou superior a 15 (quinze) anos
de reclusão não terá efeito suspensivo. PAGE \*
§ 5º Excepcionalmente, poderá o tribunal atribuir efeito 8
MERGEF
suspensivo à apelação de que trata o § 4º deste artigo, quando
verificado cumulativamente que o recurso: ORMAT
I - não tem propósito meramente protelatório; e
II - levanta questão substancial e que pode resultar em
absolvição, anulação da sentença, novo julgamento ou redução
da pena para patamar inferior a 15 (quinze) anos de reclusão.
§ 6º O pedido de concessão de efeito suspensivo poderá ser feito
incidentemente na apelação ou por meio de petição em
separado dirigida diretamente ao relator, instruída com cópias
da sentença condenatória, das razões da apelação e de prova da
tempestividade, das contrarrazões e das demais peças
necessárias à compreensão da controvérsia.” (NR)

Além do mais, o art. 492, § 4º, afirma que a referida apelação não terá efeito
suspensivo, salvo nos casos excepcionados pelo § 5.

Em outras palavras, se o réu for condenado no Tribunal do Júri a uma pena igual
ou superior a 15 anos de reclusão, ele terá que iniciar o cumprimento da pena privativa
de liberdade, mesmo que ele tenha interposto apelação contra essa sentença, ou seja,
mesmo antes do trânsito em julgado da condenação.

Vale lembrar que o STF, até então, tinha entendimento divergente sobre o
tema entre as suas turmas. De um lado, a 1ª Turma do STF entendia que “a prisão de
réu condenado por decisão do Tribunal do Júri, ainda que sujeita a recurso, não viola o
princípio constitucional da presunção de inocência ou não-culpabilidade.” (STF. 1ª
Turma. HC 118.770, Relator p/ Acórdão Min. Roberto Barroso, julgado em 07/03/2017).
Essa decisão, no entanto, foi publicada antes do julgamento das ADC 43/DF, ADC 44/DF
e ADC 54/DF, em 7/11/2019, por meio das quais o STF, por 6x5, decidiu que é
inconstitucional a execução provisória da pena. A 2ª Turma do STF, por sua vez, entendia
que não era possível a execução provisória da pena mesmo em caso de condenações
pelo Tribunal do Júri.

OBSERVAÇÃO: Em razão das divergências jurisprudenciais, entendemos que a


novidade não deve ser cobrada em prova de 1a fase, sob risco de anulação. De toda
forma, como não rejeitamos a hipótese de cobrança, ainda assim, caso ocorra, o
aluno deverá se atentar ao enunciado da questão: se o questionamento for sobre
o posicionamento do STF, deve se seguir a posição mais recente dessa Corte, qual
seja, pela impossibilidade de execução provisória independentemente do
julgamento de apelação; se for conforme o regramento previsto no Código de
Processo Penal, a resposta correta será pela possibilidade do cumprimento
antecipado da pena no âmbito do Tribunal do Júri (Art.492 do CPP).

Com o advento do pacote anticrime, devemos esperar a posição das cortes


superiores. O tema será apreciado no Recurso Extraordinário 1235340, cujo relator é o
ministro Luís Roberto Barroso.
PAGE \*
Quanto à possibilidade de execução provisória das Penas Restritivas de 9
MERGEF
Direitos, existia uma divergência jurisprudencial. O STJ e a 2ª Turma do STF entendiam
pela impossibilidade, pois a LEP possui regra específica que não foi analisada pela corte ORMAT
suprema, a qual apenas autorizou a execução provisória da pena privativa de liberdade.
Noutro giro, a 1ª Turma do STF entendia pela possibilidade, pelas mesmas razões as
quais é possível a execução provisória da pena privativa de liberdade. Ocorre que, com
o julgamento das ADC 43/DF, ADC 44/DF e ADC 54/DF, em 7/11/2019, em que o STF,
por 6x5, decidiu que é inconstitucional a execução provisória da pena, esse mesmo
entendimento também deve ser aplicado para as penas restritivas de direitos.

F. Princípio da obrigatoriedade de motivação das decisões judiciais

A exigência de motivação das decisões judiciais, inscrita no art. 93, IX, da CF e


no art. 381 do CPP, é atributo constitucional-processual que possibilita às partes a
impugnação das decisões tomadas no âmbito do Poder Judiciário, conferindo, ainda, à
sociedade a garantia de que essas deliberações não resultam de posturas arbitrárias,
mas, sim, de um julgamento imparcial, realizado de acordo com a lei.

No tribunal do júri há mitigação da obrigatoriedade de motivação, pois o


Conselho de Sentença, formado por juízes leigos, não pode motivar nem fundamentar
o seu entendimento, até porque vigoram o princípio da incomunicabilidade dos jurados
e o princípio da íntima convicção.

Na esteira desse tema, a Lei nº 13.964/19 (Lei Anticrime) trouxe a


imperiosidade de que decisões que decretem a prisão preventiva ou outras medidas
cautelares diversas da prisão deverão ser justificadas e fundamentadas. É o que diz, por
exemplo, o art. 282, § 3º:

“Ressalvados os casos de urgência ou de perigo de ineficácia da


medida, o juiz, ao receber o pedido de medida cautelar,
determinará a intimação da parte contrária, para se manifestar
no prazo de 5 (cinco) dias, acompanhada de cópia do
requerimento e das peças necessárias, permanecendo os autos
em juízo, e os casos de urgência ou de perigo deverão ser
justificados e fundamentados em decisão que contenha
elementos do caso concreto que justifiquem essa medida
excepcional.”

Essa linha é reforçada pelo legislador no art. 312, § 2º, do CPP, quando diz:

“A decisão que decretar a prisão preventiva deve ser motivada


e fundamentada em receio de perigo e existência concreta de
fatos novos ou contemporâneos que justifiquem a aplicação da
medida adotada.”

Para não deixar dúvidas para o intérprete, o legislador chegou ao ponto de


dizer, inclusive, o que não representa uma motivação idônea. Confira:
PAGE \*
Art. 315. A decisão que decretar, substituir ou denegar a prisão
10
MERGEF
preventiva será sempre motivada e fundamentada.
§ 1º Na motivação da decretação da prisão preventiva ou de ORMAT
qualquer outra cautelar, o juiz deverá indicar concretamente a
existência de fatos novos ou contemporâneos que justifiquem a
aplicação da medida adotada.
§ 2º Não se considera fundamentada qualquer decisão judicial,
seja ela interlocutória, sentença ou acórdão, que:
I - limitar-se à indicação, à reprodução ou à paráfrase de ato
normativo, sem explicar sua relação com a causa ou a questão
decidida;
II - empregar conceitos jurídicos indeterminados, sem explicar o
motivo concreto de sua incidência no caso;
III - invocar motivos que se prestariam a justificar qualquer outra
decisão;
IV - não enfrentar todos os argumentos deduzidos no processo
capazes de, em tese, infirmar a conclusão adotada pelo julgador;
V - limitar-se a invocar precedente ou enunciado de súmula, sem
identificar seus fundamentos determinantes nem demonstrar
que o caso sob julgamento se ajusta àqueles fundamentos;
VI - deixar de seguir enunciado de súmula, jurisprudência ou
precedente invocado pela parte, sem demonstrar a existência de
distinção no caso em julgamento ou a superação do
entendimento.
G. Princípio da publicidade

O princípio da publicidade, previsto expressamente no art. 93, IX, primeira


parte, da CF, e no art. 792, caput, do CPP, representa o dever que assiste ao Estado de
atribuir transparência a seus atos, reforçando, com isso, as garantias da independência,
imparcialidade e responsabilidade do juiz. Além disso, consagra-se como uma garantia
para o acusado, que, em público, estará menos suscetível a eventuais pressões,
violências ou arbitrariedades.

H. Princípio da imparcialidade do juiz

Significa que o magistrado, situando-se no vértice da relação processual


triangulada entre ele, a acusação e a defesa, deve possuir capacidade objetiva e
subjetiva para solucionar a demanda, vale dizer, julgar de forma absolutamente
equidistante das partes, vinculando-se apenas às regras legais e ao resultado da análise
das provas do processo.

Para evitar a contaminação da parcialidade do juiz que atua na fase da


investigação, a Lei nº 13.964 (Lei Anticrime) trouxe a figura do juiz das garantias, que,
em suma, é o juiz que atua da fase das investigações até o recebimento da
denúncia/queixa, quando então dá lugar ao juiz da instrução e julgamento. A ideia é que
este último magistrado não se contamine com o conhecimento e a tomada de medidas
durante a fase investigativa. Esse assunto será explorado com minúcias no material
PAGE \*
sobre os sujeitos processuais. 11
MERGEF
No entanto, vale lembrar que o STF, por meio de medida cautelar proferida
monocraticamente pelo Min. Luiz Fux, no bojo da ADI 6.300 6.305 6.299 6.298, decidiu ORMAT
suspender, até o julgamento do mérito da ação penal, todos os dispositivos da novel
legislação que versam sobre o juiz das garantias. O fundamento principal é que o STF
precisa discutir a constitucionalidade desses dispositivos antes que se implemente a sua
efetivação.

I. Princípio da igualdade processual (art. 5º, caput, CF)

Também chamado de princípio da paridade de armas (par conditio), significa


que as partes, em juízo, devem contar com as mesmas oportunidades e ser tratadas de
forma igualitária.

Os tratamentos normativos diferenciados são compatíveis com a Constituição


Federal quando verificada a existência de uma finalidade razoavelmente proporcional
ao fim visado.

J. Princípio do contraditório (art. 5º, LV, CF)

Trata-se do direito assegurado às partes de serem cientificadas de todos os atos


e fatos havidos no curso do processo, podendo manifestar-se e produzir as provas
necessárias antes de ser proferida a decisão jurisdicional.
OBSERVAÇÃO: Este princípio é mitigado em determinados casos, como ocorre no
chamado contraditório diferido ou postergado, que consiste em relegar a
momento posterior a ciência e a impugnação do investigado ou do acusado quanto
a determinados pronunciamentos judiciais. Em tais casos, a urgência da medida ou
a sua natureza exige um provimento imediato e inaudita altera parte, sob pena de
prejuízo ao processo ou, no mínimo, de ineficácia da determinação judicial.

Um contraditório com qualidade prevê a observância do seguinte trinômio:

- a intimação da parte sobre o ato processual praticado;

- a possibilidade de manifestação a seu respeito;

- e que tenha a possibilidade de influência na decisão do juiz.

Destaca-se, por fim, que a Constituição Federal garante o contraditório aos


litigantes e aos acusados em processo judicial ou administrativo; todavia, o inquérito
policial, como será visto adiante, não é verdadeiro processo, mas procedimento
administrativo, de forma que não há que se falar na garantia do contraditório perante a
fase policial de investigações. Além do mais, não há, no inquérito, litigante ou acusado,
mas mero investigado (até porque o delegado de polícia não acusa, mas investiga
apenas, colhendo provas sobre o fato criminoso, sem interesse acusatório ou PAGE \*
absolutório). 12
MERGEF
K. Princípio da ampla defesa (art. 5º, LV, CF) ORMAT
A ampla defesa traduz o dever que assiste ao Estado de facultar ao acusado
toda a defesa possível quanto à imputação que lhe foi realizada.

A concepção moderna da garantia da ampla defesa reclama, para a sua


verificação, seja qual for o objeto do processo, a conjugação de três realidades
procedimentais, genericamente consideradas, a saber: a) o direito à informação (nemo
inauditus damnari potest); b) a bilateralidade da audiência (contraditoriedade); c) o
direito à prova legalmente obtida ou produzida (comprovação da inculpabilidade).

A ampla defesa pode ser exercida de duas formas:

1. Autodefesa: realizada facultativamente pelo próprio agente,


sendo permitido calar-se ou trazer qualquer elemento de
convicção, ainda que não jurídico, o que pode ser bastante útil
perante os jurados no tribunal do júri, que decidem de acordo
com a íntima convicção;

2. Defesa técnica: realizada obrigatoriamente por advogado


habilitado (art. 261 do CPP), não podendo o réu se
autorrepresentar no processo penal, a não ser que seja
advogado (art. 263 do CPP). Além do mais, a correta defesa do
réu é de interesse da sociedade, sendo ela irrenunciável.
A falta de defesa técnica, no processo penal, nos termos da Súmula 523 do STF,
constitui nulidade absoluta, mas, se for deficiente apenas, só anulará o processo caso
exista prova do prejuízo do réu.

Ainda em se tratando de autodefesa, a doutrina entende que o réu possui o


direito de ser ouvido (audiência) e o direito de presença. O primeiro se expressa
principalmente por meio do interrogatório judicial. Já o segundo se reflete na
possibilidade de acompanhar todos os atos do processo. É, pois, uma faculdade.

L. Princípio do duplo grau de jurisdição

Este princípio assegura a possibilidade de revisão das decisões judiciais, por


meio do sistema recursal, em que as decisões do juízo a quo podem ser reapreciadas
pelos tribunais. É uma decorrência da própria estrutura do Judiciário, vazada na Carta
Magna, que, em vários dispositivos, atribui competência recursal aos diversos tribunais
do país.

M. Princípio do juiz natural (art. 5º, XXXVII e LIII, CF)

O princípio do juiz natural consagra o direito de ser processado pelo magistrado


competente (art. 5º, inc. LIII, da CF) e a vedação constitucional à criação de juízos ou
tribunais de exceção (art. 5º, inc. XXXVII, da CF). Em outras palavras, tal princípio impede
a criação casuística de tribunais pós-fato, para apreciar um determinado caso.
PAGE \*
N. Princípio do promotor natural e imparcial 13
MERGEF
Este princípio veda a designação arbitrária, pela Chefia da Instituição, de ORMAT
promotor para patrocinar caso específico. Vale dizer, o promotor natural há de ser,
sempre, aquele previamente estatuído em lei. Como ensina Hugo Nigro Mazzilli, o
princípio do promotor natural é decorrência do princípio da independência funcional.
Consiste na existência de um órgão do Ministério Público investido nas suas atribuições
por critérios legais prévios.

OBSERVAÇÃO: A abrangência de aplicação desse princípio é limitada ao processo


criminal, excluído, portanto, o inquérito policial. Deste modo, eventuais diligências
realizadas na fase das investigações policiais a partir de determinação (requisição)
de promotor distinto daquele que seja quem deva atuar não desnaturam o
princípio.

O. Princípio do in dubio pro reo (art. 5º, LVII, CF)

Também chamado de princípio da prevalência do interesse do réu ou “favor


rei” ou “favor libertatis” ou “favor inocente”, este princípio privilegia a garantia da
liberdade em detrimento da pretensão punitiva do Estado.

A dúvida deve militar em favor do acusado. Em verdade, na ponderação entre


o direito de punir do Estado e o status libertatis do imputado, este último deve
prevalecer.
OBSERVAÇÃO: Este princípio é mitigado quando se trata de decisão do Conselho
de Sentença por ocasião dos julgamentos pelo júri. É que, em casos tais, os jurados
decidem por sua íntima convicção.

É de se ressaltar que, na pronúncia, não se exige a certeza da autoria do crime, mas


apenas a existência de indícios suficientes e prova da materialidade, imperando,
nessa fase final da formação da culpa, o brocardo “in dubio pro societate” (e não o
princípio “in dubio pro reo”). (STJ, AgRg. no AREsp. 405.488/SC)

P. Princípio ne bis in idem

Consiste na proibição de que o réu seja julgado novamente por fato que já foi
apreciado pelo Poder Judiciário.

1.2. SISTEMAS PROCESSUAIS


Existem três espécies de sistemas processuais penais: inquisitivo, acusatório e
misto.

1.2.1. SISTEMA INQUISITIVO

Nesse sistema, cabe a um só órgão acusar e julgar. O juiz dá início à ação penal PAGE \*
e, ao final, ele mesmo profere a sentença. 14
MERGEF
O acusado é mero objeto do processo, não sendo considerado sujeito de
ORMAT
direitos.

Antes do advento da CF/88, era admitido em nossa legislação em relação à


apuração de todas as contravenções penais e dos crimes de homicídio e de lesões
corporais culposos. Era o chamado processo judicialiforme, que foi banido de nossa
legislação pelo art. 129, I, da CF, que conferiu ao MP a iniciativa exclusiva da ação
pública.

1.2.2. SISTEMA ACUSATÓRIO

No sistema acusatório, existe separação entre os órgãos incumbidos de realizar


a acusação e o julgamento, o que garante a imparcialidade do julgador e, por
conseguinte, assegura a plenitude de defesa e o tratamento igualitário das partes.

1.2.3. SISTEMA MISTO OU ACUSATÓRIO FORMAL

Este sistema é caracterizado pela existência do Juizado de Instrução, fase


investigatória e persecutória preliminar conduzida por um juiz, que não se confunde
com o inquérito policial, seguida de uma fase acusatória em que são assegurados todos
os direitos do acusado e a independência entre acusação, defesa e juiz.
1.2.4. SISTEMA ADOTADO NO BRASIL.

No Brasil, é adotado o sistema acusatório, pois há clara separação entre a


função acusatória — do Ministério Público nos crimes de ação pública — e a julgadora.
Contudo, não se trata do sistema acusatório puro, uma vez que, apesar de a regra ser a
de que as partes devam produzir suas provas, admitem-se exceções em que o próprio
juiz pode determinar, de ofício, sua produção de forma suplementar.

Esse sistema foi reforçado pela Lei nº 13.964/19 (Lei Anticrime), que proibiu
expressamente o juiz de decretar prisão preventiva e outras medidas cautelares de
ofício. Confira:

Art. 282. § 2º As medidas cautelares serão decretadas pelo juiz a


requerimento das partes ou, quando no curso da investigação
criminal, por representação da autoridade policial ou mediante
requerimento do Ministério Público.

Esse dispositivo difere da redação anterior, que dizia:

§ 2o As medidas cautelares serão decretadas pelo juiz, de ofício


ou a requerimento das partes ou, quando no curso da
investigação criminal, por representação da autoridade policial
ou mediante requerimento do Ministério Público. (Incluído pela
PAGE \*
Lei nº 12.403, de 2011).
15
MERGEF
ANTES DA LEI ANTICRIME APÓS A LEI ANTICRIME ORMAT

No curso do processo o juiz poderia, de O juiz não pode, nem na fase de


ofício ou a requerimento das partes, investigações nem no curso do processo,
decretar medidas cautelares. Já na fase decretar medidas cautelares de ofício.
da investigação criminal o juiz só poderia
decretar medidas cautelares mediante
representação do Delegado de Polícia ou
requerimento do MP.

Esse mesmo entendimento, que foi previsto para as medidas cautelares em


geral, foi repetido pelo legislador da Lei Anticrime no caso da prisão preventiva Confira:

Art. 311. Em qualquer fase da investigação policial ou do


processo penal, caberá a prisão preventiva decretada pelo juiz,
a requerimento do Ministério Público, do querelante ou do
assistente, ou por representação da autoridade policial.

A redação anterior do dispositivo dizia:

Art. 311. Em qualquer fase da investigação policial ou do


processo penal, caberá a prisão preventiva decretada pelo juiz,
de ofício, se no curso da ação penal, ou a requerimento do
Ministério Público, do querelante ou do assistente, ou por
representação da autoridade policial. (Redação dada pela Lei nº
12.403, de 2011).

Porém, a Lei nº 13.964/19 trouxe a previsão de que é possível que o juiz, de


ofício, revogue a prisão preventiva se, no correr da investigação ou do processo, verificar
a falta de motivo para que ela subsista, bem como novamente decretá-la, se
sobrevierem razões que a justifiquem (art. 316, caput).

Esse tema será tratado com mais minúcias no material sobre prisões!

1.3. APLICAÇÃO DA LEI PROCESSUAL PENAL


1.3.1. APLICAÇÃO DA LEI PROCESSUAL PENAL NO ESPAÇO

Art. 1º. O processo penal reger-se-á, em todo o Território


Brasileiro, por este Código, ressalvados:
I – os tratados, as convenções e regras de direito internacional;
II – as prerrogativas constitucionais do Presidente da República,
dos ministros de Estado, nos crimes conexos com os do
Presidente da República, e dos ministros do STF, nos crimes de
PAGE \*
responsabilidade (Constituição, arts. 86, 89, § 2º, e 100);
III – os processos da competência da Justiça Militar;
16
MERGEF
IV – os processos da competência do tribunal especial
ORMAT
(Constituição, art. 122, nº 17);
V – os processos por crimes da imprensa.

O processo penal, em todo o território nacional, rege-se pelo Código de


Processo Penal. Tal regra encontra-se em seu art. 1º, caput, que adotou, quanto ao
alcance de suas normas, o princípio da territorialidade, segundo o qual seus dispositivos
aplicam-se a todas as ações penais que tramitem pelo território brasileiro.

OBSERVAÇÃO: O CPP adota o princípio da territorialidade absoluta (locus regit


actum), no sentido de que, no Brasil, não se admite a aplicação de direito
processual estrangeiro, apesar de admitir a aplicação de regras de direito
internacional. Adota, também, o princípio da territorialidade estrita, no sentido de
que a lei processual brasileira, ao contrário do que ocorre com a lei penal, não tem
extraterritorialidade. Contudo, isto não quer dizer que ela não será aplicada a
crimes cometidos fora do território nacional, pois, se este crime for aqui julgado,
a lei processual brasileira será aplicada.
1.3.1.1. Exceções à incidência do CPP

O art. 1º do CPP elenca hipóteses em que este não terá aplicação, ainda que o
fato tenha ocorrido no território nacional. Vejamos:

A - Os tratados, as convenções e regras de direito internacional (art. 1º, I, CPP);

Os tratados, as convenções e as regras de direito internacional, firmados pelo


Brasil, mediante aprovação por decreto legislativo e promulgação por decreto
presidencial, afastam a jurisdição brasileira, ainda que o fato tenha ocorrido no território
nacional, de modo que o infrator será julgado em seu país de origem.

É o que ocorre, por exemplo, com agentes diplomáticos aqui acreditados, como
embaixadores, secretários de embaixadas, bem como seus familiares, além dos
funcionários de organizações internacionais, tal qual a ONU. A Convenção de Viena,
aprovada pelo Decreto Legislativo nº 103/64, prevê imunidade diplomática a esses
agentes, de forma que não estão sujeitos à lei processual penal brasileira, pois terão a
aplicação da lei material do seu respectivo país, e, por via de consequência, o processo
lá tramitará.

B - As prerrogativas constitucionais do Presidente da República, dos ministros de


Estado, nos crimes conexos com os do Presidente da República, e dos ministros do STF,
nos crimes de responsabilidade (art. 1º, II, CPP);
PAGE \*
Esse dispositivo refere-se aos crimes de natureza político-administrativa, e não 17
MERGEF
aos delitos comuns. O julgamento dessas infrações não é feito pelo Poder Judiciário, e
sim pelo Legislativo. ORMAT

C - Os processos da competência da Justiça Militar (art. 1º, III, CPP);

Os processos de competência da Justiça Militar, isto é, os crimes militares,


seguem os ditames do Código de Processo Penal Militar (Decreto-lei n. 1.002/69), e não
da legislação processual comum.

OBSERVAÇÃO: Não se deve olvidar que a Justiça Eleitoral, também especializada,


tem competência para apreciação dos crimes eleitorais e conexos, possuindo
codificação própria (Lei nº 4.737/65 – Código Eleitoral), mas o CPP é aplicado
subsidiariamente.

D - Os processos da competência do tribunal especial (art. 1º, IV, CPP);

O tribunal especial a que faz menção o inc. IV do art. 1º é o antigo Tribunal de


Segurança Nacional, que não existe mais. Hoje, os crimes contra a segurança nacional
estão previstos na Lei nº 7.170/83, sendo afetos à Justiça Federal (art. 109, IV, CF).
E - Os processos por crimes da imprensa (art. 1º, V, CPP).

O Supremo Tribunal Federal, ao julgar a Arguição de Descumprimento de


Preceito Fundamental (ADPF 130-7/DF), declarou que a referida lei não foi recepcionada
pela Constituição Federal de 1988, de modo que, atualmente, os antigos crimes da Lei
de Imprensa (Lei n. 5.250/67) deverão ser enquadrados, quando possível, na legislação
comum, e a apuração dar-se-á nos termos do Código de Processo Penal.

1.3.1.2. Exceções decorrentes de leis especiais

Algumas leis especiais excepcionam a aplicação do CPP em relação à apuração


a determinados crimes, como, por exemplo, os relacionados a drogas, cujo rito é
integralmente regulado pela Lei nº 11.343/2006; os crimes falimentares, cujo rito
encontra-se na Lei nº 11.101/2005; as infrações de menor potencial ofensivo, tratadas
em sua totalidade na Lei .099/95.

1.3.1.3. Tribunal penal internacional

O art. 5º, § 4º, da CF, prevê que “o Brasil se submete à jurisdição de Tribunal
Penal Internacional a cuja criação tenha manifestado adesão”. Assim, ainda que um
delito seja cometido no território brasileiro, havendo denúncia ao TPI, o agente poderá
ser entregue à jurisdição estrangeira.
PAGE \*
1.3.2. APLICAÇÃO DA LEI PROCESSUAL PENAL NO TEMPO.
18
MERGEF
Regra geral – Princípio do efeito imediato ou princípio da aplicação imediata ou
sistema do isolamento dos atos processuais. ORMAT

Art. 2º. A lei processual penal aplicar-se-á desde logo, sem


prejuízo da validade dos atos realizados sob a vigência da lei
anterior.

O art. 2º do CPP adotou o princípio da imediata aplicação da lei processual


penal, também chamado de princípio tempus regit actum. De acordo com esse princípio,
os novos dispositivos processuais podem ser aplicados a crimes praticados antes de sua
entrada em vigor. O que se leva em conta, portanto, é a data da realização do ato
(tempus regit actum), e não a da infração penal.

OBSERVAÇÃO: A lei processual aplicar-se-á desde logo, mesmo que seja


prejudicial ao réu. E não se pode dizer que há violação ao art. 5º, XL, da CF, pois a
vedação incorporada neste dispositivo constitucional não se refere às normas
puramente processuais penais, mas, sim, às normas de natureza penal.

1.3.2.1. Exceção

O art. 3º da Lei de Introdução ao CPP dispõe que “o prazo já iniciado, inclusive


o estabelecido para a interposição de recurso, será regulado pela lei anterior, se esta
não prescrever prazo menor do que o fixado no CPP”. Assim, se um determinado prazo
já estiver em andamento, incluindo prazo recursal, valerá o prazo da lei anterior se o
prazo da nova lei for menor do que aquele outro. Trata-se, portanto, de uma hipótese
de ultratividade da lei processual penal.

1.3.2.2. Normas processuais heterotópicas e normas processuais mistas ou híbridas

Normas processuais são aquelas que regulamentam aspectos relacionados ao


procedimento ou à forma dos atos processuais, possuindo aplicação imediata. Já as
normas materiais são aquelas que objetivam assegurar direitos ou garantias, possuindo
efeitos retroativos nos aspectos que visam a beneficiar o réu, mas jamais retroagem
para prejudicá-lo.

A. Normas heterotópicas

Existem determinadas regras que, apesar de inseridas em diplomas processuais


penais, possuem conteúdo material, retroagindo para beneficiar o réu. Outras, ao revés,
incorporadas a leis materiais, apresentam um conteúdo processual, regendo-se pelo
critério tempus regit actum. Surge, nesses casos, o fenômeno da heterotopia.

B. Normas mistas ou híbridas

Norma híbrida é aquela que possui preceitos de direito material e de direito


PAGE \*
processual. Como não pode haver cisão, deve prevalecer o aspecto material. Assim, se
a parte penal for benéfica, a nova lei será aplicada às infrações ocorridas antes da sua 19
MERGEF
vigência. O aspecto penal retroage, e o processual terá aplicação imediata, preservando-
se, contudo, os atos praticados quando da vigência da norma anterior. Já, se a parte ORMAT
penal for maléfica, a norma híbrida não terá nenhuma incidência aos crimes ocorridos
antes de sua vigência e o processo iniciado, todo ele, será regido pelos preceitos
processuais previstos na lei antiga.

1.4. INQUÉRITO POLICIAL


1.4.1. CONCEITO

O inquérito policial consiste em um conjunto de diligências realizadas pela


polícia investigativa, objetivando a identificação das fontes de prova e a colheita de
elementos de informação quanto à autoria e à materialidade da infração penal, a fim de
possibilitar que o titular da ação penal, Ministério Público (nos crimes de ação penal
pública) ou ofendido (nos crimes de ação penal privada), possa ingressar em juízo.

1.4.2. NATUREZA JURÍDICA

O inquérito policial é um procedimento administrativo.

OBSERVAÇÃO: Como o inquérito policial é mera peça informativa, eventuais vícios


dele constantes não têm o condão de contaminar o processo penal a que der
origem.
1.4.3. FINALIDADE

O inquérito policial tem dupla finalidade:

- Preservadora: a existência prévia de um inquérito policial inibe


a instauração de um processo penal infundado, temerário,
resguardando a liberdade do inocente e evitando custos
desnecessários para o Estado;

- Preparatória: fornece elementos de informação quanto à


autoria e à materialidade do delito, para que o titular da ação
penal ingresse em juízo, além de servir para acautelar meios de
prova que poderiam desaparecer com o decurso do tempo.

OBSERVAÇÃO: O inquérito policial exerce papel fundamental em relação à


decretação de medidas cautelares pessoais, patrimoniais ou probatórias no curso
da investigação policial e, também, é útil para fundamentar eventual absolvição
sumária (CPP, art. 397).

1.4.4. VALOR PROBATÓRIO


PAGE \*
Art. 155. O juiz formará sua convicção pela livre apreciação da 20
MERGEF
prova produzida em contraditório judicial, não podendo
fundamentar sua decisão exclusivamente nos elementos ORMAT
informativos colhidos na investigação, ressalvadas as provas
cautelares, não repetíveis e antecipadas.

“Elementos de informação” não é sinônimo de “prova”. Elementos de


informação são aqueles colhidos na fase investigatória, sem a necessária participação
dialética das partes (art. 155 do CPP). Por outro lado, provas são os elementos de
convicção produzidos, em regra, no curso do processo judicial e, por conseguinte, com
a necessária participação dialética das partes, sob o manto do contraditório (ainda que
diferido) e da ampla defesa.

Tendo em conta que os elementos de informação não são colhidos sob a égide
do contraditório e da ampla defesa, deduz-se que o inquérito policial tem valor
probatório relativo, e, de forma isolada, não podem os elementos de informação servir
de fundamento para um decreto condenatório, mas podem, de forma subsidiária, influir
na formação do livre convencimento do juiz para a decisão da causa quando
complementam outros indícios e provas que passam pelo crivo do contraditório em
juízo.
1.4.5. CARACTERÍSTICAS

A. Procedimento escrito

De acordo com o art. 9º do CPP, todas as peças do inquérito policial serão, num
só processado, reduzidas a escrito ou datilografadas e, neste caso, rubricadas pela
autoridade.

OBSERVAÇÃO: Apesar de o CPP não fazer menção à gravação audiovisual de


diligências realizadas no curso do inquérito policial, sempre que possível, o registro
dos depoimentos do investigado, do indiciado, do ofendido e das testemunhas
será feito pelos meios ou recursos de gravação magnética, estenotipia, digital ou
técnica similar, inclusive audiovisual, destinada a obter maior fidelidade das
informações (art. 405, §1º, do CPP).

B. Procedimento dispensável

O inquérito policial é peça meramente informativa. Portanto, se o titular da


ação penal (Ministério Público ou ofendido) dispuser desse substrato mínimo necessário
para o oferecimento da peça acusatória, o inquérito policial será perfeitamente
dispensável.
PAGE \*
C. Procedimento sigiloso 21
MERGEF
Se o inquérito policial tem por objetivo investigar infrações penais, coletando ORMAT
elementos de informação quanto à autoria e à materialidade dos delitos, de nada valeria
o trabalho da polícia investigativa se não fosse resguardado o sigilo necessário durante
o curso de sua realização. Portanto, por natureza, o inquérito policial está sob a égide
do sigilo externo, nos termos do art. 20 do CPP, que dispõe que a autoridade assegurará
no inquérito o sigilo necessário à elucidação do fato ou exigido pelo interesse da
sociedade.

ATENÇÃO! A despeito do art. 20 do CPP e mesmo em se tratando de inquérito


sigiloso, tem prevalecido o entendimento de que o advogado deve ter acesso aos
autos do procedimento investigatório, caso a diligência realizada pela autoridade
policial já tenha sido documentada. Porém, em se tratando de diligências que
ainda não foram realizadas ou que estão em andamento, não há que falar em
prévia comunicação ao advogado, nem ao investigado, na medida em que o sigilo
é inerente à própria eficácia da medida investigatória. É o que se denomina de
sigilo interno (Súmula Vinculante nº 14).
ATENÇÃO! Súmula Vinculante 14 do STF - “é direito do defensor, no interesse do
representado, ter acesso amplo aos elementos de prova que, já documentados em
procedimento investigatório realizado por órgão com competência de polícia
judiciária, digam respeito ao exercício do direito de defesa”.

ATENÇÃO! NÃO CONFUNDIR COM INQUÉRITO CIVIL. Nele a publicidade é regra.

D. Procedimento inquisitorial

O inciso XXI do art. 7º do Estatuto da OAB, incluído pela Lei 13.245/2016, prevê
que o advogado tem direito de assistir a seus clientes investigados durante a apuração
de infrações, sob pena de nulidade absoluta do respectivo interrogatório ou
depoimento e, subsequentemente, de todos os elementos investigatórios e probatórios
dele decorrentes ou derivados, direta ou indiretamente, podendo, inclusive, no curso
da respectiva apuração apresentar razões e quesitos.

Diante da nova redação conferida à Lei 8.906/94, indaga-se se ainda é possível


afirmar que o inquérito policial é um procedimento inquisitorial.

Prevalece que sim. Com efeito, ante a impossibilidade de aplicação de uma PAGE \*
sanção como resultado imediato das investigações criminais, como ocorre, por exemplo, 22
MERGEF
em um processo administrativo disciplinar, não se pode exigir a observância do
contraditório e da ampla defesa nesse momento inicial da persecução penal. Ora, se não ORMAT
há necessidade de um defensor no curso de um processo administrativo disciplinar, do
qual pode resultar a aplicação de sanções relativamente severas (v.g., suspensão,
exoneração, perda de função, etc.), é de se estranhar a obrigatoriedade de defensor
durante a realização de um interrogatório policial, do qual jamais será possível a
aplicação imediata de uma sanção.

Além disso, as atividades investigatórias estão concentradas nas mãos de uma


única autoridade (Delegado de Polícia, no caso do inquérito policial; Ministério Público,
em se tratando de um procedimento investigatório criminal), que deve conduzir a
apuração de maneira discricionária, colhendo elementos quanto à autoria e à
materialidade do fato delituoso. Logo, não há oportunidade para o exercício do
contraditório ou da ampla defesa.

E. Procedimento discricionário

A fase preliminar de investigações é conduzida de maneira discricionária (e não


arbitrária) pela autoridade policial, que deve determinar o rumo das diligências de
acordo com as peculiaridades do caso concreto.
F. Procedimento oficial

Incumbe ao Delegado de Polícia (civil ou federal) a presidência do inquérito


policial. Vê-se, pois, que o inquérito policial fica a cargo de órgão oficial do Estado, nos
termos do art. 144, § 1º, I, c/c art. 144, § 4º, da CF.

Nesse sentido, é o que dispõe a Lei 12.830/2013:

Art. 2º As funções de polícia judiciária e a apuração de infrações


penais exercidas pelo delegado de polícia são de natureza
jurídica, essenciais e exclusivas de Estado.

§1º Ao delegado de polícia, na qualidade de autoridade policial,


cabe a condução da investigação criminal por meio de inquérito
policial ou outro procedimento previsto em lei, que tem como
objetivo a apuração das circunstâncias, da materialidade e da
autoria das infrações penais.

ATENÇÃO! Em nenhuma hipótese, a presidência do IP poderá ser realizada pelo


juiz. Mas, atenção: embora não se trate de inquérito policial, o STF, visando apurar
notícias fraudulentas (fake news) e ameaças contra seus ministros, instaurou, para
tramitação na Corte sob relatoria do Min. Alexandre de Moraes, o Inq. 4781. Por
PAGE \*
conseguinte, o partido Rede Sustentabilidade, sustentando não competir ao
Judiciário conduzir investigações criminais, ajuizou a ADPF 572. Deliberando a
23
MERGEF
respeito, entendeu o Plenário da Corte (em 18.06.2020) no sentido da
constitucionalidade do inquérito, que foi instaurado a partir de previsão do seu ORMAT
Regimento Interno, salientando, outrossim, que o STF tem a função extraordinária
e atípica de apurar qualquer lesão real ou potencial à sua independência. Para
alguns doutrinadores, tal decisão viola o sistema acusatório, já que a referida
instauração concentra no próprio STF funções de investigar e julgar.

ATENÇÃO NÃO CONFUNDIR COM INQUÉRITO CIVIL que é um procedimento


administrativo investigatório a cargo do Ministério Público, cujo objeto consiste
essencialmente na coleta de elementos de convicção que lhe sirvam de base à
propositura de uma ação civil pública para a defesa de interesses transindividuais
ou para a defesa do patrimônio público e social.

G. Procedimento oficioso

Ao tomar conhecimento de notícia de crime de ação penal pública


incondicionada, a autoridade policial é obrigada a instaurar o inquérito policial de ofício,
independentemente de provocação da vítima e/ou qualquer outra pessoa.
No caso de crimes de ação penal pública condicionada à representação e de
ação penal de iniciativa privada, a instauração do inquérito policial está condicionada à
manifestação da vítima ou de seu representante legal. Porém, uma vez demonstrado o
interesse do ofendido na persecução penal, a autoridade policial é obrigada a agir de
ofício, determinando as diligências necessárias à apuração do delito.

H. Procedimento indisponível

De acordo com o art. 17 do CPP, a autoridade policial não poderá mandar


arquivar autos de inquérito policial.

Se, diante de uma circunstância fática, o delegado percebe que não houve
crime, não deve iniciar o inquérito policial, mas, uma vez iniciado, deve levá-lo até o
final, não podendo arquivá-lo. E, no relatório, não poderá fazer considerações acerca da
existência de excludentes de ilicitude ou de culpabilidade, cabendo-lhe simplesmente
relatar as diligências investigatórias realizadas e apontar a tipificação do fato apurado.

I. Procedimento temporário

Apesar de o art. 10, § 3º, do CPP, permitir que a autoridade policial possa
requerer ao juiz a devolução dos autos para ulteriores diligências, quando o fato for de
difícil elucidação e o indiciado estiver solto, o princípio constitucional da duração
razoável do processo (art. 5º, LXXVIII, CF) impede que o inquérito policial tenha seu
PAGE \*
prazo de conclusão prorrogado indefinitivamente.
24
MERGEF
1.4.6. FORMAS DE INSTAURAÇÃO
ORMAT
1.4.6.1. Crimes de ação penal pública incondicionada

Nos crimes de ação penal pública incondicionada, o inquérito policial pode ser
instaurado das seguintes formas:

- De ofício (CPP, art. 5º, I).

Por força do princípio da obrigatoriedade, caso a autoridade policial tome


conhecimento do fato delituoso a partir de suas atividades rotineiras, deve instaurar o
inquérito policial independentemente da provocação de qualquer pessoa. A peça
inaugural será uma portaria.

- Requisição da autoridade judiciária ou do Ministério Público


(CPP, art. 5º, II).

Quanto à possibilidade de a autoridade judiciária requisitar a instauração de


inquérito policial, vários doutrinadores sustentam que não se coaduna com a adoção do
sistema acusatório pela CF, sob pena de evidente prejuízo a sua imparcialidade. O
correto seria encaminhar as informações acerca da prática de ilícito penal ao MP.
ATENÇÃO! O Pacote Anticrime (Lei 13.964/2019) inseriu no CPP o art. 3º-A, o qual
proíbe qualquer iniciativa do Juiz na fase investigativa. Este dispositivo teve sua
eficácia suspensa por meio de medida cautelar deferida no STF pelo Ministro Luiz
Fux (em 22.01.2020) no âmbito das Ações Diretas de Inconstitucionalidade 6.298,
6.299, 6.300 e 6.305, ainda não julgadas definitivamente. Enquanto perdurar esta
suspensão, não fica o juiz impedido de requisitar a instauração de inquérito.
Cogitando-se, porém, a possibilidade de que seja revogada a medida cautelar e,
portanto, restabelecida sua eficácia, é certo que os termos peremptórios do art.
3º-A inviabilizarão a requisição judicial do inquérito policial, permanecendo, então,
apenas a legitimidade do Ministério Público para essa requisição.

Quanto à requisição feita pelo Ministério Público, a autoridade policial está


obrigada a instaurar o inquérito policial por força do princípio da obrigatoriedade, que
impõe às autoridades o dever de agir diante da notícia da prática de infração penal.

OBSERVAÇÃO: Em se tratando de requisição ministerial manifestamente ilegal


(v.g., para investigar crime prescrito ou conduta atípica), deve a autoridade policial
abster-se de instaurar o inquérito policial, comunicando sua decisão,
justificadamente, ao órgão do Ministério Público responsável pela requisição,
assim como às autoridades correcionais. PAGE \*
25
MERGEF
- Requerimento do ofendido ou de seu representante legal (art.
5º, II, CPP). ORMAT

Prevalece o entendimento no sentido de que ao delegado incumbe verificar a


procedência das informações a ele trazidas, evitando-se, assim, a instauração de
investigações temerárias e abusivas. Assim, convencendo-se que a notitia criminis é
totalmente descabida, sem respaldo jurídico ou material, como, por exemplo, quando
entender que o fato é manifestamente atípico ou que a punibilidade esteja extinta, deve
a autoridade policial indeferir o requerimento do ofendido para instauração de
inquérito policial.

- Notícia oferecida por qualquer do povo (art. 5º, § 3º, CPP).

Trata-se de mera faculdade do cidadão, não tendo ele o dever de noticiar a


prática de infração penal.

OBSERVAÇÃO: As autoridades públicas, notadamente aquelas envolvidas na


persecução penal, por força do princípio da obrigatoriedade, têm o dever de
noticiar fatos possivelmente criminosos, sob pena de responderem
administrativamente e de incorrerem no delito de prevaricação, caso comprovado
que a inércia se deu para satisfazer interesse ou sentimento pessoal (CP, art. 319).
- Auto de prisão em flagrante delito.

A despeito de não constar expressamente do art. 5º do CPP, o auto de prisão


em flagrante é, sim, uma das formas de instauração do inquérito policial, funcionando
o próprio auto como a peça inaugural da investigação.

1.4.6.2. Crimes de ação penal pública condicionada e de ação penal de iniciativa


privada

Nos crimes de ação penal pública condicionada, a deflagração da persecutio


criminis está subordinada à representação do ofendido ou à requisição do Ministro da
Justiça (CPP, art. 5º, § 4º).

Em se tratando de crime de ação penal de iniciativa privada, o Estado fica


condicionado ao requerimento do ofendido ou de seu representante legal (CPP, art. 5º,
§ 5º). No caso de morte ou ausência do ofendido, o requerimento poderá ser formulado
por seu cônjuge, ascendente, descendente ou irmão (CPP, art. 31).

OBSERVAÇÃO: Em relação aos crimes de ação penal pública condicionada e de


ação penal de iniciativa privada, a instauração do inquérito policial também poderá
se dar em virtude de auto de prisão em flagrante, cuja lavratura estará
condicionada ao requerimento da vítima ou de seu representante legal.
PAGE \*
ATENÇÃO! O requerimento é condição de procedibilidade do próprio inquérito 26
MERGEF
policial, sem o qual a investigação sequer poderá ter início.
ORMAT

OBSERVAÇÃO: “A representação, condição de procedibilidade exigida nos crimes


de ação penal pública condicionada, prescinde de rigores formais, bastando a
inequívoca manifestação de vontade da vítima ou de seu representante legal no
sentido de que se promova a responsabilidade penal do agente, como
evidenciado, in casu, com a notitia criminis levada à autoridade policial,
materializada no boletim de ocorrência” (HC 130.000/SP, DJ 08.09.2009).

1.4.6.3. NOTITIA CRIMINIS

Notitia criminis é o conhecimento, espontâneo ou provocado, por parte da


autoridade policial, acerca de um fato delituoso. Subdivide-se em:

a) Notitia criminis de cognição imediata (ou espontânea).

Ocorre quando a autoridade policial toma conhecimento do fato delituoso por


meio de suas atividades rotineiras. É o que acontece, por exemplo, quando o delegado
de polícia toma conhecimento da prática de um crime por meio da imprensa.
b) Notitia criminis de cognição mediata (ou provocada).

Ocorre quando a autoridade policial toma conhecimento da infração penal por


meio de um expediente escrito. É o que acontece, por exemplo, nas hipóteses de
requisição do Ministério Público, representação do ofendido etc.

c) Notitia criminis de cognição coercitiva.

Ocorre quando a autoridade policial toma conhecimento do fato delituoso por


meio da apresentação do indivíduo preso em flagrante.

1.4.6.4. DELATIO CRIMINIS

A delatio criminis é uma espécie de notitia criminis, consubstanciada na


comunicação de uma infração penal feita por qualquer pessoa do povo à autoridade
policial, e não pela vítima ou seu representante legal.

1.4.6.5. NOTITIA CRIMINIS INQUALIFICADA

Também conhecida como “delação apócrifa”, “notícia anônima” ou “denúncia


anônima”, a notitia criminis inqualificada não autoriza, por si só, a propositura de ação
penal ou mesmo, na fase de investigação preliminar, o emprego de métodos invasivos
de investigação, como interceptação telefônica ou busca e apreensão. Entretanto, elas
podem constituir fonte de informação e de provas que não podem ser simplesmente PAGE \*
descartadas pelos órgãos do Poder Judiciário. 27
MERGEF
ORMAT
ATENÇÃO! Em caso de denúncia anônima, a autoridade policial deve: a) realizar
investigações preliminares para confirmar a credibilidade da “denúncia”; b) sendo
confirmado que possui aparência mínima de procedência, instaura-se IP; c)
instaurado o IP, a autoridade policial deverá buscar outros meios de prova (que
não seja a interceptação telefônica, pois esta é a ultima ratio). Se houver indícios
concretos contra os investigados, mas a interceptação se revelar imprescindível
para provar o crime, poderá ser requerida a quebra do sigilo telefônico ao
magistrado (STF, HC 106.152, em 29/03/2016).

ATENÇÃO! A denúncia anônima, sem amparo em outros elementos que


justifiquem a suspeita, não configura a justa causa necessária para legitimar a
busca pessoal e veicular efetuada pela polícia. STJ. HC 734263 01/09/2022

OBSERVAÇÃO! O STF entende que os documentos apócrifos somente poderão dar


azo à persecução penal quando forem produzidos pelo acusado, ou, ainda, quando
constituírem eles próprios o corpo do delito (Inf. 629 – jun/11).
1.4.7. INDICIAMENTO
1.4.7.1. Conceito

Indiciar é atribuir a autoria (ou participação) de uma infração penal a uma


pessoa. De acordo com o art. 2º, § 6º, da Lei 12.830/13, o indiciamento, privativo do
delegado de polícia, dar-se-á por ato fundamentado, mediante análise técnico-jurídica
do fato, que deverá indicar a autoria, materialidade e suas circunstâncias.

OBSERVAÇÃO: Por força da simplicidade que norteia a própria investigação das


infrações de menor potencial ofensivo, tendo em vista a possibilidade de
incidência das medidas despenalizadoras previstas na Lei 9.099/95 e tendo em
conta que a imposição de pena restritiva de direitos ou multa nas hipóteses de
transação penal não constará de certidão de antecedentes criminais (Lei 9.099/95,
art. 76, § 6º), entende-se que é inviável o indiciamento em sede de termo
circunstanciado.

1.4.7.2. Momento

A condição de indiciado poderá ser atribuída já no auto de prisão em flagrante


ou até o relatório final do delegado de polícia. Logo, uma vez recebida a peça acusatória,
PAGE \*
não será mais possível o indiciamento, já que se trata de ato próprio da fase
investigatória.
28
MERGEF
ORMAT
OBSERVAÇÃO: O indiciamento, após o recebimento da denúncia, configura
constrangimento ilegal, pois esse ato é próprio da fase inquisitorial (STJ, RHC
60.445, em 26/04/2016).

1.4.7.3. Pressupostos

Para que haja indiciamento é indispensável a presença de elementos


informativos suficientes que apontem a autoria e a materialidade do delito.

OBSERVAÇÃO: O indiciamento funciona como um poder-dever da autoridade


policial, já que, presentes elementos informativos apontando na direção do
investigado, não resta à autoridade policial outra opção senão seu indiciamento.

1.4.7.4. Desindiciamento

O indiciamento configura constrangimento quando a autoridade policial, sem


elementos mínimos de materialidade delitiva, lavra o termo respectivo e nega ao
investigado o direito de ser ouvido e de apresentar documentos. Nesta hipótese, a
jurisprudência tem admitido a possibilidade de impetração de habeas corpus, a fim de
sanar o constrangimento ilegal daí decorrente, buscando-se o desindiciamento.
1.4.7.5. Atribuição

O indiciamento é o ato privativo do Delegado de Polícia. Portanto, se a


atribuição para efetuar o indiciamento é privativa da autoridade policial (Lei 12.830/13,
art. 2º, § 6º), não se afigura possível que o juiz, o Ministério Público ou uma Comissão
Parlamentar de Inquérito requisitem ao delegado de polícia o indiciamento de
determinada pessoa.

1.4.8. CONCLUSÃO DO INQUÉRITO POLICIAL

1.4.8.1. Prazo para conclusão

De acordo com o art. 10, caput, do CPP, o inquérito deverá terminar no prazo
de 10 (dez) dias, se o indiciado tiver sido preso em flagrante ou estiver preso
preventivamente, contado o prazo, nesta hipótese, a partir do dia em que se executar a
ordem de prisão, ou no prazo de 30 (trinta) dias, quando estiver solto, mediante fiança
ou sem ela.

OBSERVAÇÃO: Para Avena, Tourinho Filho, Renato Brasileiro e parcela expressiva


da jurisprudência, da expressão “a partir do dia”, conclui-se que os prazos previstos
no art. 10 do CPP são processuais, independentemente de o indiciado estar preso
ou solto. Assim, devem ser contados na forma do art. 798, § 1º, excluindo-se o dia
PAGE \*
do começo e incluindo-se o dia do final. Além disso, não se iniciam e não se
finalizam em dias não úteis. Por outro lado, Nucci, Nestor e Mirabete defendem 29
MERGEF
que, se o indiciado está preso, o prazo de 10 dias é material, devendo ser contado
na forma do art. 10 do CP, incluindo-se o dia do começo e excluindo-se o dia do ORMAT
final, independentemente de tais datas recaírem ou não em dia útil. Já, se o
indiciado está solto, o prazo de 30 dias é processual, devendo ser contado na
forma do art. 798, § 1º, do CPP.

Segundo o art. 10, § 3º, do CPP, quando o fato for de difícil elucidação e o
indiciado estiver solto, a autoridade poderá requerer ao juiz a devolução dos autos, para
ulteriores diligências, que serão realizadas no prazo marcado pelo juiz.

No tocante ao indiciado preso, a maioria da doutrina entende que, se há


elementos para a segregação cautelar do agente (prova da materialidade e indícios de
autoria), também há elementos para o oferecimento da peça acusatória, sendo inviável,
por conseguinte, a devolução dos autos do inquérito policial à autoridade policial para
realização de diligências complementares.
Existem outros prazos definidos em leis especiais para a conclusão do Inquérito
Policial. Para facilitar, confira a tabelinha:

PRESO SOLTO

JUSTIÇA ESTADUAL
10 30+30
(art. 10 do CPP)

JUSTIÇA FEDERAL
15 + 15 30 + 30
(art. 66 da Lei nº 5.010/66)

LEI DE DROGAS
30 + 30 90 + 90
(art. 51 da Lei nº 11.343/06)

ECONOMIA POPULAR
10 10
(art. 10 da Lei nº 1.521/51)

INQUÉRITO MILITAR
20 40 + 20
(art. 20 CPPM)
PAGE \*
1.4.8.2. Relatório 30
MERGEF
O relatório é uma peça elaborada pela autoridade policial, de conteúdo ORMAT
eminentemente descritivo, em que deve ser feito um esboço das principais diligências
levadas a efeito na fase investigatória, justificando-se até mesmo a razão pela qual
algumas não tenham sido realizadas.

Deve a autoridade policial abster-se de fazer qualquer juízo de valor no


relatório, já que a opinio delicti deve ser formada pelo titular da ação penal.

OBSERVAÇÃO: A Lei de Drogas prevê expressamente que a autoridade policial


relatará sumariamente as circunstâncias do fato, justificando as razões que a
levaram à classificação do delito, indicando a quantidade e a natureza da
substância ou do produto apreendido, o local e as condições em que se
desenvolveu a ação criminosa, as circunstâncias da prisão, a conduta, a qualificação
e os antecedentes do agente (Lei 11.343/06, art. 52, I). Mesmo nesse caso de
drogas, é de bom alvitre esclarecer que o Ministério Público não fica vinculado à
classificação provisória formulada pela autoridade policial, pois é ele o titular da
ação penal.
1.4.8.3. Destinatário dos autos do inquérito policial

Pela leitura do art. 10, § 1º, do CPP, percebe-se que, uma vez concluída a
investigação policial, os autos do inquérito policial devem ser encaminhados
primeiramente ao Poder Judiciário e, somente depois, ao Ministério Público.

Contudo, a doutrina moderna sustenta que o § 1º do art. 10 do CPP não foi


recepcionado pela CF/88, pois a necessidade de remessa inicial dos autos ao Poder
Judiciário viola o sistema acusatório.

Este, porém, não é o entendimento do STF, que, afirmando a recepção do § 1º


do art. 10 do CPP pela CF/88, decidiu ser inconstitucional lei estadual que preveja a
tramitação direta do IP entre a Polícia e o MP (ADI 2.886, 03/04/2014).

Por outro lado, em decisão mais recente, o STJ decidiu que, enquanto a
Resolução nº 63/2009 do CJF não for declarada inconstitucional, é legal a portaria
editada por Juiz Federal que estabelece a tramitação direta de IP entre a PF e o MPF.
Por força dessa Resolução, atualmente, no âmbito da JF, se o DPF pede a dilação do
prazo para as investigações ou apresenta o relatório final, o IP não precisa ir para o Juiz
Federal e depois ser remetido ao MPF. O caminho é direto entre a PF e o MPF, sendo o
próprio membro do Parquet quem autoriza a dilação do prazo (5ª T, RMS 46.165, em
19/11/2015).
PAGE \*
OBSERVAÇÃO: A Resolução nº 063/2009-CJF também foi impugnada no STF por 31
MERGEF
meio da ADI nº 4.305, mas não há previsão de julgamento.
ORMAT

1.4.8.4. Providências a serem adotadas após a remessa dos autos

Uma vez recebidos os autos do inquérito policial, são duas as possibilidades:

a) Em se tratando de crime de ação penal de iniciativa privada.

Dispõe o art. 19 do CPP que, nos crimes em que não couber ação pública, os
autos do inquérito serão remetidos ao juízo competente, no qual aguardarão a iniciativa
do ofendido ou de seu representante legal, ou serão entregues ao requerente, se o
pedir, mediante traslado. Na prática, todavia, os autos acabam sendo remetidos ao
Ministério Público, para que analise se há elementos de informação quanto a eventual
crime de ação penal pública.

b) Em se tratando de crime de ação penal pública.

Os autos do inquérito policial são remetidos ao Ministério Público, ao qual se


abrem cinco possibilidades:
- Oferecimento da denúncia;

- Arquivamento dos autos do inquérito policial;

- Requisição de diligências;

OBSERVAÇÃO: O Delegado de Polícia não é obrigado a atender requisições


manifestamente ilegais. Aliás, ao tratar do poder de requisição ministerial, a
própria CF faz referência à indicação dos fundamentos jurídicos de sua
manifestação. Nesse caso, fazendo-o de maneira fundamentada, incumbe ao
Delegado se recusar a cumprir requisições manifestamente ilegais, comunicando
a ocorrência ao respectivo Procurador-Geral de Justiça para as providências
funcionais pertinentes.

- Declinação de competência;

- Conflito de competência.

1.4.9. ARQUIVAMENTO DO INQUÉRITO POLICIAL

Pela redação original do art. 28 do CPP, entendia-se que o arquivamento do


inquérito policial era um ato complexo, pois envolvia prévio requerimento formulado
PAGE \*
pelo órgão do Ministério Público e posterior decisão da autoridade judiciária
competente. Veja:
32
MERGEF
Art. 28. Se o órgão do Ministério Público, ao invés de apresentar ORMAT
a denúncia, requerer o arquivamento do inquérito policial ou de
quaisquer peças de informação, o juiz, no caso de considerar
improcedentes as razões invocadas, fará remessa do inquérito
ou peças de informação ao procurador-geral, e este oferecerá a
denúncia, designará outro órgão do Ministério Público para
oferecê-la, ou insistirá no pedido de arquivamento, ao qual só
então estará o juiz obrigado a atender.

Ocorre que a Lei nº 13.964/19 (Lei Anticrime) mudou referida sistemática,


disciplinando, desta feita, que o arquivamento do inquérito policial prescindia de
apreciação judicial. Com efeito, a novel legislação retirou do juiz o papel de controlador
do arquivamento do inquérito policial, alterando o art. 28 do CPP para ordenar que o
membro do Ministério Público, ao ordenar o arquivamento do inquérito policial ou de
quaisquer peças informativas da mesma natureza, encaminhe o procedimento para a
instância de revisão ministerial para fins de homologação.

Assim, arquivamento do inquérito policial passou, com a nova lei, a ser


analisado única e exclusivamente no âmbito do Ministério Público, devendo ato
normativo interno da instituição estabelecer qual é o órgão ministerial que analisará os
arquivamentos ordenados pelos membros.
Além disso, a lei trouxe a obrigação de o órgão ministerial dar ciência à vítima,
ao investigado e à autoridade policial sobre a decisão de arquivamento. Confira o
dispositivo legal:

Art. 28. Ordenado o arquivamento do inquérito policial ou de


quaisquer elementos informativos da mesma natureza, o órgão
do Ministério Público comunicará à vítima, ao investigado e à
autoridade policial e encaminhará os autos para a instância de
revisão ministerial para fins de homologação, na forma da lei.

ATENÇÃO! No entanto, vale destacar que a Lei nº 13.964/19 (Lei Anticrime) foi
publicada no dia 24/12/2019, com uma vacatio legis de 30 (trinta) dias de duração.
Na véspera de sua entrada em vigor, no dia 22/02/20, o Min. Luiz Fux, no bojo da
ADI 6.300 6.305 6.299 e 6.298, decidiu suspender até o julgamento do mérito da
ação penal, além de outros dispositivos da novel legislação, o novo art. 28 do CPP
que versam sobre o arquivamento do inquérito policial. O fundamento principal
é que o STF precisa discutir a constitucionalidade desses dispositivos antes que se
implemente a sua efetivação. Assim, para fins de provas de concursos, vale a
redação anterior do art. 28 sem a alteração promovida pela Lei Anticrime. Vamos
ficar atentos aos próximos passos do STF.

PAGE \*
1.4.9.1. Fundamentos do arquivamento 33
MERGEF
O CPP não dispõe sobre as causas que dão ensejo ao arquivamento do inquérito
ORMAT
policial. Assim, a doutrina afirma que o arquivamento do IP deve ser requerido nas
mesmas hipóteses de rejeição da inicial acusatória, previstas no art. 395 (inépcia da
inicial, ausência de pressupostos ou condições da ação e ausência de justa causa) e com
base nas causas que autorizam a absolvição sumária, previstas no art. 397 (excludentes
de culpabilidade ou de ilicitude, atipicidade e causas extintivas da punibilidade).

Em tese, aspectos relativos à culpabilidade do agente e à ilicitude da conduta


são irrelevantes no momento do oferecimento da denúncia. No entanto, parte da
doutrina, por motivo de economia processual e para não submeter um “inocente” ao
constrangimento de responder a um processo penal, defende a possibilidade de
arquivamento do IP quando houver absoluta certeza quanto à existência de uma causa
de exclusão da culpabilidade ou de uma causa de exclusão da ilicitude. Vale destacar
que, em se tratando de inimputabilidade por doença mental ao tempo do fato, a
denúncia deve ser ajuizada para fins de aplicação de medida de segurança. E, em se
tratando de inimputabilidade decorrente da menoridade penal, não há que se falar em
ação penal, mas, sim, em ação socioeducativa.

1.4.9.2. Coisa julgada na decisão de arquivamento

Hipóteses em que haverá coisa julgada formal:

a) Ausência de pressupostos processuais ou condições para o


exercício da ação penal;
b) Ausência de justa causa para o exercício da ação penal.

Hipóteses em que haverá coisa julgada formal e material:

a) Atipicidade da conduta delituosa;

b) Existência manifesta de causa excludente da ilicitude;

ATENÇÃO! O STF entende que o inquérito policial arquivado por excludente de


ilicitude pode ser reaberto. Assim, para a Suprema Corte, esse arquivamento não
faz coisa julgada material.
O STJ, por sua vez, entende que o arquivamento do inquérito policial baseado em
excludente de ilicitude produz coisa julgada material e, portanto, não pode ser
reaberto.

c) Existência manifesta de causa excludente da culpabilidade;

d) Existência de causa extintiva da punibilidade.

OBSERVAÇÃO: Se a extinção da punibilidade é declarada com base em certidão de


PAGE \*
óbito falsa, a decisão não está protegida pelo manto da coisa julgada material. Para
os Tribunais, não há que falar em revisão criminal pro societate, sendo
34
MERGEF
perfeitamente possível o oferecimento de denúncia, porquanto a decisão
ORMAT
declaratória que, com base em certidão de óbito falsa, julga extinta a punibilidade
pode ser revogada, já que não gera coisa julgada em sentido estrito.

1.4.9.3. Arquivamento implícito

Se o MP deixa de se manifestar expressamente sobre todo o conteúdo do IP,


omitindo da denúncia crimes e/ou criminosos que foram foco da investigação, haveria
o que se chama de “arquivamento implícito”. Contudo, tal modalidade de arquivamento
não é admitida pelo STF por ausência de previsão legal (1ª T, HC 104.356, 19/10/2010).

1.4.9.4. Arquivamento indireto

Se o membro do MP deixar de oferecer a denúncia por entender que o crime


não é de sua atribuição, ele deve requerer a remessa dos autos ao órgão competente. A
isso se dá o nome de “arquivamento indireto”.

OBSERVAÇÃO: Se o juízo originário discordar do Promotor e se julgar competente,


deverá invocar, por analogia, o disposto no art. 28 do CPP (redação atual, não
alterada pela Lei Anticrime), remetendo os autos ao PGJ.
1.4.9.5. Arquivamento originário

Se a ação penal for da competência originária do Procurador Geral, e este


requer o arquivamento do IP, fala-se em arquivamento originário. Nesta hipótese, é
inviável a aplicação do art. 28 CPP (redação atual, não alterada pela Lei Anticrime), mas
é possível um recurso administrativo ao Colégio de Procuradores (art. 12, XI, da Lei
8.625/93 - LONMP).

1.4.9.6. Arquivamento provisório

Ocorre na hipótese de ausência de uma condição de procedibilidade, como no


caso de representação da vítima nos crimes de ação penal pública condicionada a essa
representação. Se a vítima se retrata antes do oferecimento da denúncia (art. 25 do
CPP), caberá o arquivamento, que perdurará até que ela se arrependa e volte a
representar. Se for ultrapassado o prazo para tanto e a vítima não representar, o
arquivamento se torna definitivo.

1.4.9.7. Arquivamento em crimes de ação penal de iniciativa privada

Sabendo-se quem é o autor do crime, o pedido de arquivamento deve ser


acolhido como forma de renúncia tácita, o que causa a extinção da punibilidade.

Por outro lado, sendo desconhecida a autoria, não há que se falar em renúncia
PAGE \*
tácita, hipótese em que há de se admitir o pedido de arquivamento do inquérito policial
feito pelo ofendido. 35
MERGEF
1.4.9.8. Surgimento de novas provas ORMAT

Estabelece o art. 18 do CPP que, “depois de ordenado o arquivamento do


inquérito pela autoridade judiciária, por falta de base para a denúncia, a autoridade
policial poderá proceder a novas pesquisas, se de outras provas tiver notícia”.

A nova prova capaz de permitir o desarquivamento do inquérito deve satisfazer


três requisitos:

a) Tratar-se de prova substancialmente nova, isto é, apta para


alterar o convencimento anteriormente formado sobre a
desnecessidade da persecução penal;

b) Tratar-se de prova formalmente nova, assim compreendida


aquela até então desconhecida por qualquer das autoridades; e

c) Tratar-se de prova capaz de refletir no contexto probatório a


partir do qual realizada a postulação de arquivamento do
inquérito.

ATENÇÃO! Súmula 524 do STF arquivado o inquérito policial, por despacho do juiz,
a requerimento do promotor de justiça, não pode a ação penal ser iniciada, sem
novas provas.
OBSERVAÇÃO: Com o advento do Pacote Anticrime, caso a medida cautelar seja
revogada (ADIs 6.298, 6.299, 6.300 e 6.305), resta prejudicada a expressão “pela
autoridade judiciária” constante no art. 18 do CPP. Sem embargo, há de persistir
em vigor o texto remanescente. Logo, uma vez arquivado o inquérito policial ou
outros elementos informativos da mesma natureza, a retomada das investigações
pela autoridade policial e o próprio ajuizamento da ação penal contra os mesmos
investigados e em relação aos mesmos fatos condicionam-se a que surjam
elementos que produzam modificação no panorama probatório dentro do qual foi
realizado o arquivamento do inquérito.

PAGE \*
36
MERGEF
ORMAT
2. JURISPRUDÊNCIA

O compartilhamento de informações coletadas em inquérito com a Controladoria-Geral


da União encontra respaldo no art. 3º, VIII, da Lei nº 12.850/2013 (Lei de Organização
Criminosa). Além disso, essa medida tem fundamento em Tratados promulgados pelo
Brasil e introduzidos no ordenamento pátrio com status de lei ordinária, como é o caso
da Convenção de Palermo, da Convenção de Mérida e da Convenção de Caracas. Os
supostos delitos praticados pelos agentes públicos investigados envolvem, em tese,
vultosos valores transacionados por meio de operações bancárias e aquisição e venda
de bens móveis e imóveis, condutas praticadas com o possível escopo de ocultar a
origem pública dos recursos, fato que, por si só, revela a imprescindibilidade do
compartilhamento de informações com a CGU, órgão com expertise em apurar
eventuais infrações que tenham lesado o erário. STJ. Corte Especial. AgRg na Pet
15270/DF, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 15/2/2023 (Info 764).

O prazo para a conclusão do inquérito policial, em caso de investigado solto é impróprio.


Assim, em regra, o prazo pode ser prorrogado a depender da complexidade das
investigações. No entanto, é possível que se realize, por meio de habeas corpus, o
controle acerca da razoabilidade da duração da investigação, sendo cabível, até mesmo,
o trancamento do inquérito policial, caso demonstrada a excessiva demora para a sua
PAGE \*
conclusão. STJ. 6ª Turma. HC 653299-SC, Rel. Min. Laurita Vaz, Rel. Acd. Min. Sebastião
Reis Júnior, julgado em 16/08/2022 (Info 747).
37
MERGEF
ORMAT
Ação controlada do art. 8º, § 1º da Lei nº 12.850/2013 exige apenas comunicação prévia
(e não autorização judicial) A ação controlada prevista no § 1º do art. 8º da Lei nº
12.850/2013 independe de autorização, bastando sua comunicação prévia à autoridade
judicial. STJ. 6ª Turma. HC 512290-RJ, Rel. Min. Rogerio Schietti Cruz, julgado em
18/08/2020 (Info 677).

É legal o auxílio da agência de inteligência ao Ministério Público Estadual durante


procedimento criminal instaurado para apurar graves crimes em contexto de
organização criminosa. STJ. 6ª Turma. HC 512290-RJ, Rel. Min. Rogerio Schietti Cruz,
julgado em 18/08/2020 (Info 677).

Não há infiltração policial quando agente lotado em agência de inteligência, sob


identidade falsa, apenas representa o ofendido nas negociações da extorsão, sem se
introduzir ou se infiltrar na organização criminosa com o propósito de identificar e
angariar a confiança de seus membros ou obter provas sobre a estrutura e o
funcionamento do bando. STJ. 6ª Turma. HC 512290-RJ, Rel. Min. Rogerio Schietti Cruz,
julgado em 18/08/2020 (Info 677).
3. QUESTÕES
1. A respeito dos princípios processuais penais, é correto afirmar:

a) a ausência de previsão de atividade instrutória do juiz em nosso ordenamento


processual penal brasileiro decorre do princípio da imparcialidade do julgador.

b) o direito ao silêncio, que está previsto na Constituição da República, em conformidade


com a interpretação sedimentada, só se aplica ao acusado preso.

c) o princípio da motivação das decisões e das sentenças penais se aplica a todas as


decisões proferidas em sede de direito processual penal, inclusive no procedimento do
Tribunal de Júri.

d) o princípio do contraditório restará violado se entre a acusação e a sentença inexistir


correlação.

e) o princípio da verdade real constitui princípio supremo no processo penal, tendo valor
absoluto, inclusive para conhecimento e para valoração das provas ilícitas.

2. Sobre os princípios do processo penal, assinale a alternativa correta.


PAGE \*
a) A lei processual penal mais nova aplica-se retroativamente, determinando a 38
MERGEF
necessidade de repetição de todos os atos instrutórios já realizados sob a vigência da
legislação revogada. ORMAT

b) As provas obtidas ilicitamente, segundo a atual jurisprudência dominante no


Supremo Tribunal Federal, poderão ser valoradas em prejuízo do acusado quando da
prolação da sentença, haja vista a supremacia do interesse público em face dos direitos
e garantias fundamentais.

c) O princípio do duplo grau de jurisdição estabelece a obrigatoriedade de que todas as


decisões de mérito sejam submetidas à apreciação de corte de hierarquia
imediatamente superior, devendo o juiz, de ofício, remeter os autos do processo à
segunda instância ainda que as partes não interponham qualquer recurso contra a
decisão proferida.

d) O princípio da obrigatoriedade da ação penal pública incondicionada estabelece que


ao Ministério Público é vedado qualquer juízo discricionário quanto à pertinência ou
conveniência da iniciativa penal, sendo, todavia, o instituto da delação premiada uma
hipótese de exceção ao referido princípio no ordenamento jurídico brasileiro.

e) A interposição de um recurso incabível em lugar daquele legalmente previsto para


impugnar determinada decisão, ainda que protocolizado tempestivamente, segundo a
atual jurisprudência dominante do Superior Tribunal de Justiça, tem como consequência
prática o não conhecimento da irresignação da parte em decorrência do princípio da
unirrecorribilidade.
3. Relativamente aos sistemas e princípios fundamentais do processo penal, assinale
a opção correta.

a) A proibição de revisão pro societate foi expressamente integrada ao ordenamento


jurídico brasileiro pela CF, sendo fruto da necessidade de segurança jurídica a vedação
que impede que alguém possa ser julgado mais de uma vez por fato do qual já tenha
sido absolvido por decisão passada em julgado, exceto se por juiz absolutamente
incompetente.

b) O direito ao silêncio ou garantia contra a autoincriminação derrubou um dos pilares


do processo penal tradicional: o dogma da verdade real, permitindo que o acusado
permaneça em silêncio durante a investigação ou em juízo, bem como impedindo de
forma absoluta que ele seja compelido a produzir ou contribuir com a formação da prova
ou identificação pessoal contrária ao seu interesse, revogando as previsões legais nesse
sentido.

c) A elaboração tradicional do princípio do contraditório garantia a paridade de armas


como forma de igualdade processual. A doutrina moderna propõe a reforma do
instituto, priorizando a participação do acusado no processo como meio de permitir a
contribuição das partes para a formação do convencimento do juiz, sendo requisito de
eficácia do processo.

d) O princípio do juiz natural tem origem no direito anglo-saxão, construído inicialmente


PAGE \*
com base na ideia da vedação do tribunal de exceção. Posteriormente, por obra do
direito norte-americano, acrescentou-se a exigência da regra de competência
39
MERGEF
previamente estabelecida ao fato, fruto, provavelmente, do federalismo adotado por
ORMAT
aquele país. O direito brasileiro adota tal princípio nessas duas vertentes fundamentais.

e) A defesa técnica é o corolário do princípio da ampla defesa, exigindo a participação


de um advogado em todos os atos da persecução penal. Segundo o STF, atende
integralmente a esse princípio o pedido de condenação ao mínimo legal, ainda que seja
a única manifestação jurídica da defesa, patrocinada por DP ou dativo.

4. Em 09 de abril de 2009, em uma festa de aniversário, A, maior, relatou ter sido


estuprada por B, irmão da aniversariante. Foi oferecida queixa-crime aos 08 de
outubro de 2009, a qual foi recebida em 03 de novembro do mesmo ano, tendo o Juiz
determinado, de ofício, a realização de exame de sangue de B, para comparar com os
vestígios de sêmen encontrados na vítima. O acusado recusou-se a fazer o exame,
suscitando seu direito ao silêncio. Ao final, B acabou condenado, sob o fundamento
de que, ao se recusar a fornecer material genético, houve inversão do ônus da prova,
não tendo provado sua inocência.

A respeito do caso, assinale a alternativa correta.

a) O processo não é nulo, pois, ainda que ao tempo da propositura da inicial, a ação
penal fosse condicionada à representação, ao tempo do crime, a ação era de iniciativa
privada, não se aplicando a Lei nº 12.015/2009, de 07 de agosto de 2009, nesta parte.
b) O juiz, em sede penal, não pode ordenar a realização de provas, pois não há mais
espaço para poderes instrutórios, reminiscência do sistema inquisitorial.

c) O processo é nulo, pois a ação penal é de iniciativa privada, e o recebimento da queixa


deu-se após o prazo decadencial, de seis meses.

d) O processo é nulo, por ilegitimidade de parte, pois o crime de estupro, com as


alterações advindas da Lei nº 12.015/2009, de 07 de agosto de 2009, passou a ser
processável mediante ação penal pública, condicionada à representação da vítima.

e) Acertada a condenação proferida, haja vista que a recusa em oferecer material


genético acarreta inversão do ônus da prova.

5. Em relação às garantias constitucionais do processo penal, é correto afirmar que:

a) a defesa da intimidade não é motivo para restrição da publicidade dos atos


processuais.

b) é reconhecida a instituição do júri, com a organização que lhe der a lei, assegurada a
competência para o julgamento, exclusivamente, dos crimes dolosos contra a vida.

c) a garantia do juiz natural é contemplada, mas não só, na previsão de que ninguém PAGE \*
será processado nem sentenciado senão pela autoridade competente. 40
MERGEF
d) a garantia da duração razoável e os meios que garantam a celeridade da tramitação ORMAT
aplicam-se exclusivamente ao processo judicial.

e) o civilmente identificado não será submetido, em nenhuma hipótese, a identificação


criminal.

6. A lei processual penal:

a) não admite aplicação analógica, salvo para beneficiar o réu.

b) não admite aplicação analógica, mas admite interpretação extensiva.

c) somente pode ser aplicada a processos iniciados sob sua vigência.

d) admite o suplemento dos princípios gerais de direito.

e) admite interpretação extensiva, mas não o suplemento dos princípios gerais de


direito.
7. Com relação ao Princípio Constitucional da Publicidade, com correspondência no
Código de Processo Penal, é correto afirmar que:

a) a publicidade ampla e a publicidade restrita não constituem regras de maior ou menor


valor no processo penal, cabendo ao poder discricionário do juiz a preservação da
intimidade dos sujeitos processuais.

b) a publicidade restrita tem regramento pela legislação infraconstitucional e não foi


recepcionada pela Constituição Federal, que normatiza a publicidade ampla dos atos
processuais como garantia absoluta do indivíduo.

c) de acordo com o artigo 93, inciso IX, da Constituição Federal, com nova redação dada
pela EC 45/2004, os atos processuais serão públicos, sob pena de nulidade, cabendo ao
juiz limitar a presença, nas audiências, de partes e advogados.

d) a publicidade restrita é regra geral dos atos processuais, ao passo que a publicidade
ampla é exceção e ocorre nas situações expressas em lei, dependendo de decisão
judicial no caso concreto.

e) a publicidade ampla é regra geral dos atos processuais, ao passo que a publicidade
restrita é exceção e ocorre nas situações expressas em lei, dependendo de decisão
judicial no caso concreto.
PAGE \*
41
MERGEF
8. A lei processual penal brasileira:
ORMAT
a) admite interpretação extensiva e aplicação analógica, bem como o suplemento dos
princípios gerais de direito.

b) aplica-se desde logo, em prejuízo da validade dos atos realizados sob a vigência da lei
anterior.

c) retroage no tempo para obrigar a refeitura dos atos processuais, caso seja mais
benéfica ao réu.

d) não admite definição de prazo de vacatio legis.

e) será aplicada nos atos processuais praticados em outro território que não o brasileiro,
em casos de extraterritorialidade da lei penal.

9. Antônio está sendo processado pela prática do delito de furto qualificado. É correto
dizer que, caso haja mudança nas normas que regulamentam o procedimento comum
ordinário:

a) a nova lei se aplica ao processo no estágio em que se encontra, se concluída a fase de


instrução.
b) a nova lei apenas se aplica se benéfica ao acusado.

c) os atos praticados sob a vigência da lei anterior são válidos.

d) a nova lei se aplica ao processo no estágio em que se encontra, apenas se ainda não
recebida a denúncia contra Antônio.

e) os atos praticados sob a vigência da lei anterior precisam ser ratificados, caso
contrário não serão considerados válidos.

10. Acerca dos princípios penais constitucionais e dos direitos fundamentais do


cidadão à luz da CF, julgue os itens a seguir.

I - São princípios processuais penais expressos na CF a presunção de não culpabilidade,


o devido processo legal e o direito do suspeito ou indiciado ao silêncio.

II - O direito processual penal compreende o conjunto de normas jurídicas destinadas a


regular o modo, os meios e os órgãos do Estado encarregados do exercício do jus
puniendi.

III - A CF determina que o Brasil se submeta à jurisdição do Tribunal Penal Internacional,


porém veda absolutamente a entrega de brasileiro naturalizado a jurisdição estrangeira. PAGE \*
42
MERGEF
IV - De acordo com o princípio da irretroatividade da lei processual penal, a regra nova
não pode retroagir, mesmo quando eventualmente beneficiar o réu. ORMAT
Estão certos apenas os itens:

a) I e II.

b) I e IV.

c) II e III.

d) I, III e IV.

e) II, III e IV.

11. São princípios constitucionais processuais penais explícitos e implícitos,


respectivamente:

a) dignidade da pessoa humana e juiz natural; e insignificância e identidade física do juiz.

b) intranscendência das penas e motivação das decisões; e intervenção mínima (ou


ultima ratio) e duplo grau de jurisdição.

c) contraditório e impulso oficial; e adequação social e favor rei (ou in dubio pro reo).
d) não culpabilidade (ou presunção de inocência) e duração razoável do processo; e não
autoacusação (ou nemo tenetur se detegere) e paridade de armas.

12. Em apuração de falta disciplinar atribuída a recluso no interior do estabelecimento


penal, instaurada sindicância para esse fim, em observância aos termos do Regimento
Interno Padrão dos Estabelecimentos Penais, é correto afirmar que:

a) garantida a defesa ao sentenciado, em observância à norma que regulamenta a


matéria, válido é o procedimento.

b) a presença do advogado na oitiva do sindicado, quando o sentenciado tem defensor


constituído, é obrigatória.

c) é nulo o procedimento se o sentenciado não teve a assistência de defensor durante a


sua oitiva.

d) o procedimento disciplinar tem caráter inquisitivo e, por isso, não é exigida a atuação
do defensor.

13. No tocante às garantias constitucionais aplicáveis ao processo penal: PAGE \*


43
MERGEF
a) todos os julgamentos dos órgãos do Poder Judiciário serão públicos, e fundamentadas
todas as decisões, sob pena de nulidade, podendo a lei limitar a presença, em ORMAT
determinados atos, às próprias partes e a seus advogados, mas não somente a estes.

b) o civilmente identificado jamais pode ser submetido a identificação criminal, sob pena
de caracterização de constrangimento ilegal.

c) o preso tem direito à identificação do responsável por sua prisão, mas nem sempre
por seu interrogatório policial.

d) a razoável duração do processo e os meios que garantam a celeridade de sua


tramitação são garantias exclusivamente aplicáveis à ação penal.

e) a garantia do juiz natural é contemplada, mas não só, na previsão de proibição de


juízo ou tribunal de exceção.

14. Considerando a legislação processual penal, a abranger as garantias consagradas


nos diplomas internacionais incorporados pelo Brasil, assinale a afirmativa
INCORRETA.

a) O acusado possui o direito a um processo sem dilações indevidas.

b) O acusado possui o direito ao tempo adequado à preparação de sua defesa.


c) O acusado possui o direito aos meios adequados à preparação de sua defesa.

d) O acusado possui o direito de ser comunicado, de modo genérico, da acusação


formulada, sem necessidade de que essa comunicação seja pormenorizada.

e) O acusado, por meio de sua defesa, tem o direito de inquirir as testemunhas de


acusação e de obter o comparecimento e a inquirição das testemunhas de defesa nas
mesmas condições das testemunhas de acusação.

PAGE \*
44
MERGEF
ORMAT
4. GABARITO COMENTADO
1. D.

(A) INCORRETA. Há hipóteses de atividade instrutória do juiz no atual ordenamento. Por


exemplo, o art. 156 do CPP prevê que é facultado ao juiz de ofício ordenar, mesmo antes
de iniciada a ação penal, a produção antecipada de provas consideradas urgentes e
relevantes, observando a necessidade, adequação e proporcionalidade da medida.

(B) INCORRETA. O investigado ou acusado tem direito ao silêncio em todas as fases da


persecução penal, independentemente de estar preso ou solto.

(C) INCORRETA. No procedimento do Tribunal do Júri se aplica o sistema da convicção


íntima.

(D) CORRETA. Gustavo Henrique Righi Ivahy Badaró afirma que “toda violação da regra
de correlação entre acusação e sentença implica em um desrespeito ao princípio do
contraditório. O desrespeito ao contraditório poderá trazer a violação do direito de
defesa, quando prejudique as posições processuais do acusado, ou estará ferindo a
inércia da jurisdição, com a correlativa exclusividade da ação penal conferida ao
Ministério Público, quando o juiz age de ofício. Em suma, sempre haverá violação do
contraditório, sejam suas implicações com a defesa ou com a acusação”.
PAGE \*
(E) INCORRETA. O princípio da verdade real não é supremo e absoluto, inclusive porque,
em regra, não se admite a valoração das provas ilícitas.
45
MERGEF
ORMAT

2. D.

(A) INCORRETA. De acordo com o art. 2º do CPP.

(B) INCORRETA. Em regra, aplica-se o princípio da vedação à utilização de provas ilícitas.


Excepcionalmente, a prova ilícita é admitida para beneficiar o acusado.

(C) INCORRETA. A alternativa descreve o recurso necessário, que não se confunde com
o princípio do duplo grau de jurisdição.

(D) CORRETA. De acordo com o art. 4º, § 4º, da Lei nº 12.850/2013.

(E) INCORRETA.De acordo com o STJ, aplica-se o princípio da fungibilidade quando


preenchidos os seguintes requisitos: a) dúvida objetiva quanto ao recurso a ser
interposto; b) inexistência de erro grosseiro; e c) que o recurso interposto erroneamente
tenha sido apresentado no prazo daquele que seria o correto (AREsp 616.226, em
21/05/2015).
3. D.

(A) INCORRETA. A incompetência absoluta do juiz não é exceção ao princípio do ne bis


in idem.

(B) INCORRETA. O direito ao silêncio não impede de forma absoluta que o acusado
colabore com a formação da prova. Por exemplo, o art. 4º, § 14, da Lei nº 12.850/2013,
dispõe que nos depoimentos que prestar, o colaborador renunciará, na presença de seu
defensor, ao direito ao silêncio e estará sujeito ao compromisso legal de dizer a verdade.

(C) INCORRETA. A elaboração tradicional do princípio do contraditório não garantia a


paridade de armas como forma de igualdade processual.

(D) CORRETA. ALTERNATIVA E: INCORRETA.

O inquérito policial é inquisitorial, de forma que nesta fase da persecução penal não é
obrigatória a participação de advogado.

4. A.

(A) CORRETA. A Lei nº 12.015/2009 é uma norma híbrida cuja parte material é
prejudicial ao réu, de forma que não deve retroagir. No caso, deve ser aplicado o PAGE \*
regramento anterior, em que a ação penal é privada. 46
MERGEF
(B) INCORRETA. Há previsão de casos em que o juiz pode determinar a produção de ORMAT
provas, inclusive de ofício. Ex.: art. 156 do CPP.

(C) INCORRETA. O que interrompe o prazo decadencial é o oferecimento da queixa-


crime. Portanto, no caso, não houve decadência.

(D) INCORRETA. Não há ilegitimidade de parte, pois a ação penal é privada, não se
aplicando a Lei nº 12.015/2009 ao caso.

(E) INCORRETA. No processo penal, a culpa não se presume. Cabe àquele que faz a
alegação o ônus de prová-la. Além disso, o acusado está acobertado pelo princípio nemo
tenetur se detegere.

5. C.

(A) INCORRETA. De acordo com o art. 5º, LX, da CF, a lei só poderá restringir a
publicidade dos atos processuais quando a defesa da intimidade ou o interesse social o
exigirem.

(B) INCORRETA. Compete ao Tribunal do Júri o julgamento dos crimes dolosos contra a
vida e os que lhes são conexos (art. 5º, XXXVIII, ‘d’, da CF c/c art. 78, I, do CPP).
(C) CORRETA. Além de consagrar a garantia de que ninguém será processado nem
sentenciado senão pela autoridade competente (art. 5º, LIII, da CF), o princípio do juiz
natural veda a criação de juízos ou tribunais de exceção (art. 5º, XXXVII, da CF).

(D) INCORRETA. De acordo com o art. 5º, LXXVIII, da CF, a todos, no âmbito judicial e
administrativo, são assegurados a razoável duração do processo e os meios que
garantam a celeridade de sua tramitação.

(E) INCORRETA. De acordo com o art. 5º, LXXVIII, da CF, o civilmente identificado não
será submetido à identificação criminal, salvo nas hipóteses previstas em lei.

6. D.

(A), (B) e (E) INCORRETAS. De acordo com o art. 3º do CPP, a lei processual penal admite
interpretação extensiva e aplicação analógica, bem como o suplemento dos princípios
gerais de direito.

(C) INCORRETA. De acordo com o art. 2º do CPP, a lei processual penal aplicar-se-á desde
logo, sem prejuízo da validade dos atos realizados sob a vigência da lei anterior.

(D) CORRETA. De acordo com o art. 3º do CPP.


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7. E. ORMAT
(A) INCORRETA. A publicidade, seja ela ampla ou restrita, tem fundamental importância
para o processo penal, tanto que constitui princípio constitucional (art. 93, IX, CF).

(B) INCORRETA. De acordo com o art. 93, IX, da CF, a lei pode prever casos de
publicidade restrita.

(C) INCORRETA. De acordo com o art. 93, IX, da CF, cabe à lei, e não ao juiz, limitar a
presença, em determinados atos, às próprias partes e a seus advogados, ou somente a
estes, em casos nos quais a preservação do direito à intimidade do interessado no sigilo
não prejudique o interesse público à informação.

(D) INCORRETA.

(E) CORRETA. De acordo com o art. 93, IX, da CF, a regra é a publicidade ampla, sendo
exceção a publicidade restrita.

8. A.

(A) CORRETA. De acordo com o art. 3º do CPP.

(B) e (C) INCORRETAS. De acordo com o art. 2º do CPP, não há prejuízo da validade dos
atos realizados sob a vigência da lei anterior.

(D) INCORRETA. A previsão de aplicação imediata não impossibilita que novas leis
processuais passem por vacatio legis.

(E) INCORRETA. Adota-se o princípio da territorialidade estrita, no sentido de que a lei


processual brasileira, ao contrário do que ocorre com a lei penal, não tem
extraterritorialidade.

9. C.

(A) INCORRETA.

(B) INCORRETA.

(C) CORRETA.

De acordo com o art. 2º do CPP, a lei processual penal aplicar-se-á desde logo, sem
prejuízo da validade dos atos realizados sob a vigência da lei anterior.

(D) INCORRETA.
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(E) INCORRETA. 48
MERGEF
ORMAT
10. A.

(I) CORRETO. O item está correto, pois os três princípios elencados possuem berço
constitucional:

Art. 5º. Caput.

(...)

LVII - ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal
condenatória;

LIV – ninguém será privado da liberdade ou de seus bens sem o devido processo legal;

LXIII - o preso será informado de seus direitos, entre os quais o de permanecer calado,
sendo-lhe assegurada a assistência da família e de advogado;

(II) CORRETO.

O item está correto, pois se trata de um conceito doutrinário aceito na comunidade


jurídica, não havendo nada a reparar.

(III) INCORRETO.
A assertiva começa correta quanto à submissão do Brasil ao Tribunal Penal
Internacional, mas termina incorreta quanto à impossibilidade absoluta de extradição
do brasileiro naturalizado. Confira:

Art. 5º. Caput.

(...)

LI - nenhum brasileiro será extraditado, salvo o naturalizado, em caso de crime comum,


praticado antes da naturalização, ou de comprovado envolvimento em tráfico ilícito de
entorpecentes e drogas afins, na forma da lei;

§ 4º O Brasil se submete à jurisdição de Tribunal Penal Internacional a cuja criação tenha


manifestado adesão. (Incluído pela Emenda Constitucional nº 45, de 2004)

(IV) INCORRETO.

O item confunde o candidato com o princípio da irretroatividade da lei penal. No caso


da lei processual, nos termos do art. 2º do CPP, não há que se falar em irretroatividade.
Perceba que esse dispositivo foi cobrado duas vezes na prova!

Art. 2o A lei processual penal aplicar-se-á desde logo, sem prejuízo da validade dos atos
realizados sob a vigência da lei anterior.
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11. D. ORMAT
(A) INCORRETA. O princípio da identidade física do juiz está expresso no CPP:

Art. 399. Recebida a denúncia ou queixa, o juiz designará dia e hora para a audiência,
ordenando a intimação do acusado, de seu defensor, do Ministério Público e, se for o
caso, do querelante e do assistente. (Redação dada pela Lei nº 11.719, de 2008).

§ 2o O juiz que presidiu a instrução deverá proferir a sentença. (Incluído pela Lei nº
11.719, de 2008).

(B) INCORRETA. O princípio da intervenção mínima (ou ultima ratio) é de Direito Penal,
e não de Direito Processual Penal.

(C) INCORRETA. O princípio do impulso oficial não está expresso no CPP, mas sim no CPC
(art. 2º). Em que pese possa haver discussão se esta previsão supre o enunciado,
entende-se que o princípio do in dubio pro reo está expresso no seguinte dispositivo:

Art. 5º, LVII, da CF - ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de
sentença penal condenatória;

(D) CORRETA. Os princípios da presunção de inocência e duração razoável do processo


têm expresso assento constitucional, conforme se confere a seguir:
Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-
se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida,
à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: (...)

LVII - ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal
condenatória;

LXXVIII - a todos, no âmbito judicial e administrativo, são assegurados a razoável duração


do processo e os meios que garantam a celeridade de sua tramitação.

Segundo a doutrina, o princípio da não autoacusação é implícito na CF quando esta


afirma que é direito do preso permanecer calado. É o mesmo caso do princípio da
paridade de armas, que também é implícito na CF e decorre do contraditório e da ampla
defesa. Confira:

Art. 5º. LXIII - o preso será informado de seus direitos, entre os quais o de permanecer
calado, sendo-lhe assegurada a assistência da família e de advogado;

Art. 5º. LV - aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em


geral são assegurados o contraditório e ampla defesa, com os meios e recursos a ela
inerentes;

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12. A. 50
MERGEF
Entendemos que a referida questão deveria ter sido anulada, mas não foi. Seguem os ORMAT
comentários.

(A) CORRETA. A assertiva está extremamente mal formulada e incompreensível. A


norma que regulamenta a matéria de falta disciplina a matéria é a LEP (Lei nº 7.210/84).
Um dos pressupostos de validade deste procedimento é, realmente, a garantia de
defesa ao sentenciado. Mas não é a única hipótese que garante a sua higidez, uma vez
que, por exemplo, ainda que assistido por defesa técnica, se o procedimento for
conduzido com desvio de finalidade ele também poder ser invalidado. Além disso, esta
assertiva traz afirmação similar à letra “C”, o que leva a duas respostas corretas.

(B) INCORRETA. Outra assertiva com péssima redação, e que não deixa claro o qual
conhecimento se está querendo abordar do candidato. Se o sindicado tem defensor
constituído, ele não é o seu advogado? Não existe uma compreensão mínima para se
analisar a assertiva.

(C) INCORRETA. Incorreta, segundo o gabarito preliminar, mas, ao nosso ver, está
correta, devendo a questão ser anulada. Vejamos:

Súmula 533-STJ: Para o reconhecimento da prática de falta disciplinar no âmbito da


execução penal, é imprescindível a instauração de procedimento administrativo pelo
diretor do estabelecimento prisional, assegurado o direito de defesa, a ser realizado por
advogado constituído ou defensor público nomeado.
Vale lembrar que o entendimento da referida súmula foi relativizado pelo STF tão
apenas quanto à necessidade de instauração de PAD quando substituída por uma
audiência judicial, mas a Suprema Corte em nada alterou o entendimento quanto à
obrigatoriedade do respeito à ampla defesa.

(...) 2. A oitiva do condenado pelo Juízo da Execução Penal, em audiência de justificação


realizada na presença do defensor e do Ministério Público, afasta a necessidade de
prévio Procedimento Administrativo Disciplinar (PAD), assim como supre eventual
ausência ou insuficiência de defesa técnica no PAD instaurado para apurar a prática de
falta grave durante o cumprimento da pena (RE 972.598/RS, Relator Min. ROBERTO
BARROSO Tema 941, Plenário, Sessão Virtual de 24/4/2020 a 30/4/2020).

3. Diante dessa nova orientação traçada pelo Supremo Tribunal Federal, esta Corte tem
entendido que a Súmula n. 533 do STJ, que reputa obrigatória a prévia realização de
procedimento administrativo disciplinar para o reconhecimento de falta praticada pelo
condenado durante a execução penal, deve ser relativizada, sobretudo em casos nos
quais o reeducando pratica falta grave durante o cumprimento de pena extra muros,
ocasiões em que a realização de audiência de justificação em juízo, com a presença da
defesa técnica e do Parquet, é suficiente para a homologação da falta, não havendo que
se falar em prejuízo para o executado, visto que atendidas as exigências do contraditório
e da ampla defesa, assim como os princípios da celeridade e da instrumentalidade das
formas. Isso porque a sindicância realizada por meio do PAD somente se revelaria útil e
justificável para averiguar fatos vinculados à casa prisional, praticados no interior da PAGE \*
cadeia ou sujeitos ao conhecimento e à supervisão administrativa da autoridade 51
MERGEF
penitenciária.
ORMAT
Precedentes: HC 581.854/PR, Rel. Ministro NEFI CORDEIRO, DJe de 19/6/2020; HC
585.769/MG, Rel. Ministro JORGE MUSSI, DJe de 30/06/2020; HC 582.486/PR, Rel.
Ministro ROGÉRIO SCHIETTI, DJe de 28/05/2020; HC 577.233/PR, Rel. Ministro
REYNALDO SOARES DA FONSECA, Quinta Turma do STJ, unânime, julgado em
18/08/2020, DJe de 24/08/2020.

4. A relativização do verbete sumular n. 533/STJ não desprestigia o disposto nos arts.


47, 48 e 59 da LEP, pois, como se sabe, o executado que cumpre pena em regime aberto,
semiaberto harmonizado (com tornozeleira eletrônica ou em prisão domiciliar sem
tornozeleira) ou em livramento condicional deixa de se reportar à direção do presídio e
passa a se reportar diretamente ao Juízo de Execução Criminal, responsável pelo
estabelecimento e fiscalização das condições a serem observadas durante o
cumprimento da pena extra muros, não havendo como se afirmar que nessa etapa da
execução penal o executado remanesce sob o poder disciplinar da autoridade
administrativa penitenciária. (...)

STJ. 5ª Turma. AgRg no HC 579.647/PR, Rel. Min. Reynaldo Soares da Fonseca, julgado
em 08/09/2020.

(D) INCORRETA. Ver ITEM “C”.


13. E.

(A) INCORRETA. Art. 93, IX, da CF/88, dispõe que todos os julgamentos dos órgãos do
Poder Judiciário serão públicos, e fundamentadas todas as decisões, sob pena de
nulidade, podendo a lei limitar a presença, em determinados atos, às próprias partes e
a seus advogados, ou somente a estes, em casos nos quais a preservação do direito à
intimidade do interessado no sigilo não prejudique o interesse público à informação

(B) INCORRETA. Art. 5º, LVIII, da CF/88 - o civilmente identificado não será submetido à
identificação criminal, salvo nas hipóteses previstas em lei.

(C) INCORRETA. Art. 5º, LXIV, da CF/88 - o preso tem direito à identificação dos
responsáveis por sua prisão ou por seu interrogatório policial;

(D) INCORRETA. Art. 5º, LXXVIII, da CF/88 - a todos, no âmbito judicial e administrativo,
são assegurados a razoável duração do processo e os meios que garantam a celeridade
de sua tramitação.

(E) CORRETA. Art. 5º, LIII, da CF/88 - ninguém será processado nem sentenciado senão
pela autoridade competente; XXXVII - não haverá juízo ou tribunal de exceção;

14. D PAGE \*
52
MERGEF
(A) CORRETA.
ORMAT
PACTO INTERNACIONAL DOS DIREITOS CIVIS E POLÍTICOS

Artigo 14

3. Toda pessoa acusada de um delito terá direito, em plena igualdade, às seguintes


garantias mínimas:

(...)

c) a ser julgada sem dilações indevidas;

(B) CORRETA.

DECRETO No 678, DE 6 DE NOVEMBRO DE 1992 - Convenção Americana sobre Direitos


Humanos (Pacto de São José da Costa Rica)

ARTIGO 8

Garantias Judiciais

2. Toda pessoa acusada de delito tem direito a que se presuma sua inocência enquanto
não se comprove legalmente sua culpa. Durante o processo, toda pessoa tem direito,
em plena igualdade, às seguintes garantias mínimas:
c) concessão ao acusado do tempo e dos meios adequados para a preparação de sua
defesa;

(C) CORRETA.

Ver ITEM “B”.

(D) INCORRETA.

DECRETO Nº 678, DE 6 DE NOVEMBRO DE 1992 - Convenção Americana sobre Direitos


Humanos (Pacto de São José da Costa Rica)

ARTIGO 8

Garantias Judiciais

2. Toda pessoa acusada de delito tem direito a que se presuma sua inocência enquanto
não se comprove legalmente sua culpa. Durante o processo, toda pessoa tem direito,
em plena igualdade, às seguintes garantias mínimas:

b) comunicação prévia e pormenorizada ao acusado da acusação formulada;

(E) INCORRETA.
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DECRETO Nº 678, DE 6 DE NOVEMBRO DE 1992 - Convenção Americana sobre Direitos
Humanos (Pacto de São José da Costa Rica)
53
MERGEF

ARTIGO 8 ORMAT

Garantias Judiciais

2. Toda pessoa acusada de delito tem direito a que se presuma sua inocência enquanto
não se comprove legalmente sua culpa. Durante o processo, toda pessoa tem direito,
em plena igualdade, às seguintes garantias mínimas:

f) direito da defesa de inquirir as testemunhas presente no tribunal e de obter o


comparecimento, como testemunhas ou peritos, de outras pessoas que possam lançar
luz sobre os fatos.

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