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NEFROLOGIA Prof.

Diego Ennes |Infecção do Trato Urinário (ITU) 2

APRESENTAÇÃO:

PROF. DIEGO ENNES


Querido Estrategista, este livro digital abordará o tema
Infecção do Trato Urinário, a famosa ITU! Quem nunca se
deparou com um paciente ou mesmo amigo com queixa urinária
ou alteração em exame de urina e se perguntou o que fazer?
Esse assunto despenca em provas de Residência por todo
o Brasil (10% das questões de nefrologia são de ITU!) e veremos
os principais pontos abordados nas diferentes questões. Os
principais assuntos tratados ocorrem conforme o gráfico a seguir:

Estratégia
MED
@diego.ennes
NEFROLOGIA Prof. Diego Ennes |Infecção do Trato Urinário (ITU) 3

Nefrologia nas provas de Residência

4%
5%
4%
5%
Glomerulopa�as Li�ase renal
30%
7% Lesão renal aguda Tubulointers�cio

Doença renal crônica Distúrbios do potássio

Infecção urinária Disnatomias


10%
Distúrbios do potássio

20%
15%

Esse tema faz parte de uma intersecção entre Nefrologia e Infectologia, por isso nos juntamos para construir o material didático
mais completo para você. Espero que aproveite e aprenda esse assunto recorrente em provas – e na vida real – para responder a todas as
dúvidas com propriedade e confiança! Lembre-se de que, nas provas, esse tema também DESPENCA na parte de pediatria! Neste livro,
não contemplaremos as infecções urinárias na infância, pois o pessoal da pediatria preparou um material sensacional para você.
Bons estudos e vamos, juntos, em mais essa etapa!

/estrategiamed Estratégia MED

@estrategiamed t.me/estrategiamed
Estratégia
MED
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SUMÁRIO

1.0 DEFINIÇÃO 5
1 .1 SÍNDROMES CLÍNICAS 6

2.0 EPIDEMIOLOGIA 7
3.0 FISIOPATOLOGIA 8
3 .1 AGENTES ETIOLÓGICOS 9

4.0 DIAGNÓSTICO 12
4 .1 EXAME DE URINA 12

4 .2 SINTOMATOLOGIA 14

5.0 DIAGNÓSTICO E MANEJO 18


5 .1 CISTITE AGUDA 18

5 .2 CISTITE DE REPETIÇÃO 22

5 .3 PIELONEFRITE AGUDA 24

5 .4 ABSCESSO RENAL 29

5 .5 PIELONEFRITE ENFISEMATOSA 30

5 .6 BACTERIÚRIA ASSINTOMÁTICA 31

5 .7 INFECÇÃO FÚNGICA 34

5 .8 INFECÇÃO RELACIONADA A CATETER VESICAL 35

5 .9 CISTITE INTERSTICIAL 37

6.0 LISTA DE QUESTÕES 38


7.0 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 39
8.0 CONSIDERAÇÕES FINAIS 40

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CAPÍTULO

1.0 DEFINIÇÃO
Caro aluno, vimos na introdução que o tema de Infecção em provas. Falaremos de outros microrganismos separadamente
do Trato Urinário (ITU) é cobrado em todas as provas do Brasil e é ao final deste livro digital, combinado?
recorrente na prática clínica. Agora vamos provar isso para você ao Antes de passar para as formas de apresentação da ITU,
longo deste livro digital. gostaria apenas de refrescar sua memória e relembrar a anatomia
A ITU, também conhecida como infecção urinária, é definida do aparelho urinário. É importante termos isso em mente
pela presença de patógenos no trato urinário, normalmente estéril. para diferenciar os locais de acometimento e entendermos os
Parece uma definição bem simples e intuitiva, no entanto esse é mecanismos fisiopatológicos que levam à ocorrência de ITU.
apenas o mecanismo patogênico de uma série de síndromes clínicas Veja como é dividido o aparelho urinário no esquema a
que podem acometer o trato urinário. Vamos falar inicialmente de seguir:
ITUs causadas por bactérias – que são a maioria e as mais cobradas

Artéria e veia renais

Rins

Ureteres

 Trato urinário ALTO

 Trato urinário BAIXO


Bexiga

Uretra

Figura 1 – Divisão do trato urinário. Fonte: adaptado de Shutterstock.

Por meio dessa figura conseguimos diferenciar o trato urinário em duas partes:

- Baixo: compreende a bexiga e uretra.

- Alto: compreende os rins e ureteres.

Ter isso em mente vai ajudá-lo a diferenciar as principais síndromes clínicas, como veremos a seguir!

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1 .1 SÍNDROMES CLÍNICAS

Agora, vamos iniciar o estudo desse assunto pela apresentação das principais síndromes clínicas que representam as ITUs!

As ITUs podem ser divididas conforme a localização anatômica, a presença de complicações, a sintomatologia e a recorrência. Duas
definições importantes referem-se aos conhecidos termos de ITU complicada e não complicada. Vamos entender?

Cistite aguda infecção do trato urinário baixo – caracterizada pela infecção da bexiga

Pielonefrite aguda infecção do trato urinário alto – caracterizada por infecção do rim

presença de, no mínimo, 2 episódios de ITU em 6 meses ou 3 episódios em 12


ITU recorrente (ou de repetição)
meses

presença de urocultura positiva com contagem de bactérias ≥ 105 unidades


Bacteriúria assintomática
formadoras de colônia (UFC)/mL na ausência de sintomas urinários ou sistêmicos
Tabela 1 – Principais síndromes clínicas das ITUs.

- ITU não complicada: acomete indivíduos sem nenhum fator de risco, ou seja, é a infecção da mulher jovem,
hígida, na pré-menopausa, não gestante e sem anormalidade do trato urinário.

- ITU complicada: é todo o resto! Ou seja, é a infecção urinária que acomete indivíduos idosos, homens,
mulheres na pós-menopausa, gestantes, crianças ou aqueles com presença de anormalidades anatômicas ou
funcionais.

Para iniciar o assunto, veremos a definição de cada síndrome a seguir. Adiante, falaremos individualmente sobre cada uma delas, com
todas suas particularidades!

É fundamental que você se lembre dessas síndromes para compreender melhor seus diagnósticos e manejos, que veremos mais à
frente neste livro.

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CAPÍTULO

2.0 EPIDEMIOLOGIA
As ITUs representam a principal infecção ambulatorial da Os fatores de risco para ITU complicada são aqueles que
prática clínica, ou seja, são muito comuns e você vai se deparar com podem propiciar resistência bacteriana por formarem reservatórios
casos assim. de bactérias ou por prolongarem a estase urinária, que pode

O tipo mais frequente é a cistite aguda da mulher jovem e aumentar a proliferação bacteriana. Esses fatores incluem

sem comorbidades. As mulheres são mais propensas à infecção anormalidades anatômicas funcionais, causas obstrutivas, presença

urinária por razões anatômicas, por isso são mais susceptíveis. Isso de corpo estranho ou comorbidades que possam interferir no

é verdade desde a infância (exceto nos menores de um ano) até estado de imunossupressão dos pacientes.

a menopausa. À medida que a idade chega, as infecções urinárias A tabela abaixo exemplifica os principais fatores de risco:
tornam-se tão comuns em homens quanto em mulheres.

Fatores de risco para ITU

Condição de risco Patologia associada

Hiperplasia prostática
Litíase renal
Fatores obstrutivos Anormalidade anatômica: cistos, estenoses urológicas, divertículo, doença renal
policística
Malignidade do trato urinário

Refluxo vesicoureteral
Fatores anatômicos funcionais
Bexiga neurogênica

Cateter vesical de demora


Presença de corpo estranho Nefrostomia
Duplo J

Transplante renal ou de outro órgão sólido


Sexo masculino
Condições clínicas Gestantes
Diabetes mellitus
Manipulação cirúrgica recente do trato urinário
Tabela 2 – Fatores de risco para ITU.

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CAPÍTULO

3.0 FISIOPATOLOGIA
Caro aluno, vamos conversar um pouco sobre a fisiopatologia até o rim e provoca infecção urinária, é menos comum e, em geral,
da infecção urinária. está associada à infecção por Staphylococcus aureus e a quadros

A invasão do trato urinário por micro-organismos, em geral, mais graves com complicações, como abscessos renais.

ocorre quando patógenos da flora retal migram para a bexiga Os uropatógenos ganham o trato urinário por migração da
através da uretra. Se eles permanecerem apenas no espaço vesical, flora retal ou podem ser provenientes da vagina, reto ou pênis
temos a cistite aguda, que é a infecção do trato urinário baixo, ou do parceiro sexual. É por essa razão que as mulheres são mais
seja, restrita à bexiga! acometidas por esses micro-organismos: apresentam maior

Em alguns casos, esses uropatógenos (ou seja, micro- proximidade entre o ânus e a uretra, possuem a uretra mais curta

organismos com poder de infectar o trato urinário) podem migrar e ambiente periuretral mais úmido pela lubrificação vaginal. Todos

através dos ureteres até o rim e causar a pielonefrite, que é a infecção esses fatores em conjunto propiciam maior infectividade das

do trato urinário alto. Essa é a principal via de contaminação do bactérias no trato geniturinário feminino, por isso as ITUs são mais

trato urinário alto, ou seja, por via ascendente. A via hematogênica, comuns em mulheres jovens sexualmente ativas!

ou seja, quando uma bactéria que está na corrente sanguínea migra

Fatores que favorecem ITU em mulheres sexualmente ativas

• Maior proximidade uretra-ânus


• Uretra mais curta
• Ambiente periuretral mais úmido pela lubrificação vaginal
• Uso de espermicidas
• Relações sexuais frequentes
• Parceiro sexual novo
• Higiene íntima precária
• Mutações do gene CXCR1
Tabela 3 – Fatores para ITU em mulheres.

Alguns fatores comportamentais e genéticos também estão ligados à maior ocorrência de ITUs. O uso de espermicidas, relações
sexuais frequentes, parceiro sexual novo e higiene íntima precária são fatores que predispõem à maior ocorrência de ITU por propiciarem a
multiplicação de uropatógenos, seja por meio da redução da flora bacteriana vaginal natural e protetora (pelo uso de espermicidas) ou por
aumentar a migração de micro-organismos do reto para a uretra, em razão de relações sexuais frequentes ou contato com novos uropatógenos
advindos de novos parceiros sexuais. Entre os fatores genéticos, destaca-se a presença de mutações do gene CXCR1, que codifica o receptor
de interleucina-8 e confere menor imunidade e maior susceptibilidade às ITUs.

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3 .1 AGENTES ETIOLÓGICOS

Caro aluno, é muito importante saber quais são os principais uropatógenos responsáveis pela ocorrência de ITU.

Gostaria de frisar os três principais agentes:

1. Escherichia coli.

2. Escherichia coli.

3. Escherichia coli.

Acho que deu para entender qual é o principal patógeno, certo? 😉


Essa brincadeira é para você não errar e fixar esse conceito:

A E. coli é o principal agente etiológico de ITU em qualquer situação (comunitária e


hospitalar)!

Não importa se estamos falando acerca de cistite, pielonefrite, ITU na gestante ou qualquer outra situação: a E. coli (figura 2) é sempre
o principal micro-organismo responsável pela ITU. Isso ocorre porque essas bactérias possuem prolongamentos do seu citoesqueleto, que
são as fímbrias: processos que saem do corpo da bactéria e favorecem a sua adesão ao epitélio do trato urinário, tanto da bexiga como, de
maneira ascendente, até os rins!

ESCHERICHIA COLI

Figura 2 - Ilustração de Escherichia coli.

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O segundo lugar varia de acordo com a localização da infecção – alta ou baixa:

ITU ALTA ITU BAIXA


(pielonefrite) (cistite)

• Enterobactérias
• Staphylococcus coagulase-negativo
օ Proteus mirabilis
օ Saprophyticus
Agentes etiológicos օ Klebsiella spp.
• Enterococos
օ Enterobacter spp.
• Enterobactérias
• Pseudomonas aeruginosa
Tabela 4 – Agentes etiológicos nas ITUs.

É importante entender quais são os principais agentes causadores para sabermos como tratá-los! Veremos isso no momento adequado,
mas saber a epidemiologia sempre ajuda a instituir o tratamento empírico, ou seja, aquele que é instituído antes do resultado das culturas
de urina!

“Professor, já vi situações de sintomas urinários baixos e urocultura negativa. O que pensar?”

Muito bem, Estrategista, você precisa saber disso para sua prova! A presença de sintomas urinários, com ou sem leucocitúria
(classicamente chamamos de “piúria estéril”), leva-nos a pensar em organismos atípicos causadores de um quadro infeccioso do trato urinário:

CAUSAS DE PIÚRIA ESTÉRIL

- Uretrite por Chlamydia ou ureaplasma;

- Tuberculose urinária.

A sintomatologia de disúria, polaciúria, tenesmo e desconforto suprapúbico com leucocitúria discreta e urocultura estéril leva-nos à
hipótese de uretrite por Chlamydia. O tratamento indicado para esses casos é a doxiciclina por 14 dias.

As infecções por Mycobacterium tuberculosis serão contempladas no módulo de infectologia.

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CAI NA PROVA

(HOSPITAL ISRAELITA ALBERT EINSTEIN) Mulher de 30 anos de idade queixa-se de disúria, polaciúria, tenesmo vesical e desconforto
suprapúbico, constantes há 3 semanas. Realizou 3 exames de urina nesse período, que mostraram leucócitos variando entre 10.000 e 15.000
por mL. Todas as uroculturas foram negativas. Sabendo-se que não há infecção vaginal, indica-se:

A) Quinolona por 3 dias.

B) Nitrofurantoína por 3 a 6 meses.

C) Estrogenioterapia tópica por 3 meses.

D) Doxiciclina por 14 dias.

E) Acidificação urinária semanal.

COMENTÁRIOS

Caro aluno(a), aqui temos um exemplo de uma paciente com sintomas clássicos de infecção do trato urinário, porém com urocultura
negativa. O que vamos fazer?
Incorreta a alternativa A: não indicamos quinolona, uma vez que não há indícios de infecção por germe suscetível a tal antimicrobiano.
Incorreta a alternativa B: esse esquema é para antibioticoprofilaxia nas infecções urinárias de repetição (veremos no capítulo 5.2!).
Incorreta a alternativa C: aqui, há indicação para pacientes com atrofia vulvovaginal, durante o climatério, também sendo medida
preventiva para infecções urinárias de repetição em mulheres durante o período pós-menopausa.

a probabilidade diagnóstica é de uretrite por Chlamydia, logo o tratamento indicado é a doxiciclina por
Correta a alternativa D:
período de duas semanas.

Incorreta a alternativa E: acidificação urinária é terapêutica pouco habitual atualmente. Há resultados contraditórios em estudos,
mostrando alívio sintomático em pacientes com ITU.

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CAPÍTULO

4.0 DIAGNÓSTICO
Aluno(a), acabamos de ver a definição inicial de ITU. Mas como eu identifico a presença de patógenos no trato urinário?

A resposta é simples: por meio do exame de urina! Vamos entender um pouco mais sobre essa importante ferramenta diagnóstica,
certo?

4 .1 EXAME DE URINA

A urina é habitualmente estéril, ou seja, negativa para sintomas e procura por atendimento médico. Assim, podemos
a presença de micro-organismos. Assim, se demonstrarmos utilizar qualquer amostra de urina ao longo do dia, desde que tenha
crescimento de germes no exame de urina, temos o diagnóstico de um intervalo de, pelo menos, 2 horas em relação à micção anterior.
ITU, certo? Quando não é o próprio paciente que coleta sua urina, por
Errado! Nem todo crescimento de bactérias significa ITU! exemplo em pacientes graves em ambiente de terapia intensiva,
Precisamos ter a certeza de que houve uma coleta adequada para a amostra pode ser coletada através de sondagem vesical de
afastar contaminação e devemos observar um crescimento mínimo alívio ou de demora, ou seja, por meio da inserção de um cateter
de bactérias na urina. na bexiga do doente. Ambas devem ser realizadas sob técnica

A coleta correta do exame de urina consiste na higienização asséptica e a diferença entre elas é que o cateterismo vesical

local do trato geniturinário, seguida da orientação de coleta do jato de alívio (CVA) consiste na passagem única do cateter vesical e

médio de urina. O jato inicial deve ser desprezado para minimizar retirada na sequência. Já o cateterismo vesical de demora (CVD) é

contaminação. Essa é a técnica correta e asséptica que afasta a caracterizado pela passagem deste pela bexiga, com manutenção

contaminação da amostra de urina. Outro ponto ideal seria a coleta no ambiente vesical. Quando retiramos uma amostra de urina de

da primeira urina da manhã, pois ela conteria o maior número de um paciente com CVD, devemos repassar um novo, para evitar

patógenos, pelo tempo de estase da urina na bexiga. No entanto, contaminação por algum germe colonizador da sonda previamente

isso nem sempre é possível por questões logísticas do início dos instalada.

E como interpretamos o exame de urina?

O primeiro ponto que você precisa saber é que definimos ITU pelo crescimento de 105 unidades
formadoras de colônia por mililitro (UFC/mL) na urocultura!

E é sempre assim?

Não, temos uma particularidade: em urina coletada de cateter, utilizamos como critério diagnóstico o
crescimento de 102 UFC/mL!

Na prática, o que você precisa saber mesmo é o crescimento de 105 UFC/mL, que é o que despenca em provas!

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> 105 UFC


Coleta por micção para definir
SEM cateter infecção

Coleta > 102 UFC


para definir
COM cateter
infecção

E existem outras alterações do exame de urina que são e neoplasias do trato urinário.
sugestivas de ITU? - Esterase leucocitária: é uma enzima produzida pelos
Sim! As principais alterações urinárias são as seguintes: leucócitos degradados, que reflete a presença destes no exame

- Leucocitúria/piúria: presença de leucócitos no exame de de urina. Esse exame é realizado por meio de uma fita reagente,

urina, principalmente neutrófilos. Os neutrófilos são células de mesmo antes do processamento do exame de urina I e possui

defesa do organismo e sua presença infere também a presença associação com a presença de ITU.

de micro-organismos que precisam ser “combatidos”. Não é uma - Nitrito: a presença de nitrito também é identificada
exclusividade da ITU – a leucocitúria pode ocorrer em outras por intermédio de fita reagente e denota a presença de
síndromes clínicas como glomerulopatias, nefrite intersticial aguda bactérias uropatogênicas que são capazes de converter o nitrato
e rejeição ao transplante renal! normalmente presente na urina em nitrito por atividade enzimática

- Cilindros leucocitários: formados por células leucocitárias específica dessas bactérias, sobretudo em enterobactérias (bacilos

polimorfonucleares. Estão presentes em situações de infecção Gram-negativos). A presença de nitrito relaciona-se à presença de

urinária, nefrite intersticial aguda e, mais raramente, em bactérias em concentração superior a 105 UFC/mL.

glomerulopatias. - Gram: a coloração de Gram ajuda a diferenciar bactérias

- Hematúria: significa presença de hemácias na urina. Assim em dois grupos: Gram-positivas e Gram-negativas. A presença

como a leucocitúria, a hematúria não é exclusiva da ITU e pode desse elemento no exame de urina ajuda a inferir a presença de

ocorrer em situações diversas, como glomerulopatias, litíase renal bactérias e guiar o tratamento antibiótico.

Análise urinária Valor de referência

Leucocitúria Até 10.000/mm3 ou até 5/campo

Cilindros leucocitários Negativo

Hemácias Até 10.000/mm3 ou até 5/campo

Esterase leucocitária Negativo

Nitrito Negativo

Gram Negativo
Tabela 5 – Valores de referência no sumário de urina.

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Aqui, é importante ressaltar: esses outros elementos do exame de urina ajudam a corroborar
o diagnóstico de ITU, porém nenhum deles, seja positivo ou negativo, confirma ou afasta
completamente o diagnóstico!
São apenas ferramentas auxiliares e complementares!

4 .2 SINTOMATOLOGIA

Bom, agora entendemos como é o exame de urina no Os principais sintomas urinários são disúria, estrangúria,
paciente portador de ITU. Mas será que isso é suficiente para dor suprapúbica, polaciúria e urgência miccional. Em geral, esses
fecharmos o diagnóstico de ITU? sintomas estão presentes nos casos de cistite aguda (veremos

Infelizmente, não! os detalhes a seguir!). Outros sintomas sistêmicos podem estar


presentes, como febre, dor lombar, calafrios, náuseas e vômitos
Além das alterações urinárias vistas anteriormente, para
– esses sinais são mais relacionados à pielonefrite. Além disso,
corroborar o diagnóstico de ITU precisamos da presença de
pacientes idosos podem apresentar quadro de confusão mental e
sintomas urinários ou sistêmicos! A ocorrência de urocultura
quedas como sintomas de infecção sistêmica.
positiva SEM sintomas é a famosa bacteriúria assintomática, a qual
veremos em instantes.

Caro aluno, até aqui falamos de diversos sinais característicos da propedêutica urinária. Você se lembra
de todos eles das aulas de semiologia durante os primeiros anos da faculdade?

Vamos refrescar sua memória e relembrar os principais sinais:

- Disúria: dor ou ardor ao urinar, em geral referida na uretra.

- Polaciúria: aumento da frequência miccional.

- Estrangúria: micção lenta e dolorosa, que pode ser referida como jato urinário gota a gota.

- Urgência miccional: vontade súbita e incontrolável de urinar.

- Poliúria: aumento do volume urinário, em geral > 3.000 mL/24h.

- Oligúria: redução do volume urinário, em geral < 400 mL/24h.

- Anúria: ausência praticamente total de débito urinário, em geral < 50 mL/24h.

- Incontinência urinária: perda involuntária de urina.

- Hesitação miccional: dificuldade em iniciar o jato urinário.

- Pneumatúria: saída de ar durante a micção (lembrar de fístula urinária em doenças inflamatórias


intestinais, doença diverticular e tuberculose intestinal!).

- Enurese: micção involuntária e inconsciente, comum em crianças até 4 anos de idade. Não confundir
com incontinência, quando o indivíduo tem a consciência de que perdeu urina.

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Estrategista, vamos resolver algumas questões juntos para entender como o examinador cobra esses conceitos?

CAI NA PROVA

(SES – GO – 2020) O que é noctúria?

A) É a saída involuntária de urina em qualquer situação.

B) É o desejo de despertar para urinar.

C) É a dificuldade para iniciar o jato urinário.

D) É a dor ou o queimor ao urinar.

COMENTÁRIOS:

Caro aluno, essa questão aborda um conceito de propedêutica, que seria a definição de noctúria: é o ato de acordar à noite para urinar,
ou seja, a micção noturna. Perceba a importância também de saber a semiologia do aparelho urinário. Questão rápida e direta!

Vamos às alternativas:
Incorretas as alternativas A, C e D.

Correta a alternativa B.

Para finalizar, vamos apenas ressaltar os pontos importantes do diagnóstico de ITU:

- Urocultura > 105 UFC/mL + sintomas = ITU

- Sintomas urinários baixos = cistite.

- Sintomas sistêmicos = pielonefrite.

- Infecções repetidas (2 episódios em 6 meses ou 3 em 12 meses) = ITU de repetição.

- Presença de fator não habitual = ITU complicada.

- Urocultura > 105 UFC/mL na ausência de sintomas = bacteriúria assintomática.

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CAI NA PROVA

(UNICAMP – 2019) Em mulheres com infecção urinária, uma ferramenta valiosa no exame de urina é a avaliação da presença de nitrito.
Assinale a alternativa CORRETA:

A) Em seu metabolismo, as bactérias irão converter o nitrito em nitrato.

B) A desvantagem do método é que ele não identifica a presença de patógenos Gram-positivos.

C) Não há necessidade de se colher a primeira urina da manhã, bastando a paciente permanecer por 1 hora sem urinar antes da coleta.

D) Por ser um teste complexo e caro, poucos laboratórios disponibilizam para seus pacientes.

COMENTÁRIOS por Sérgio Beduschi Filho – infectologia (Infecções bacterianas/Infecção do trato urinário)

Incorreta a alternativa A, pois as bactérias convertem nitrato em nitrito.

já que a conversão de nitrato em nitrito ocorre no metabolismo de enterobactérias (bacilos Gram-


Correta a alternativa B,
negativos).

Incorreta a alternativa C, embora seja preferível a coleta da primeira urina da manhã, ela não é necessária para a realização do teste e
diagnóstico de infecção do trato urinário. Além disso, por tratar-se de um possível quadro de infecção, aguardar até o dia seguinte para
a coleta pode atrasar o início do tratamento. De qualquer maneira, devemos sempre procurar a alternativa “mais correta”, que, nessa
questão, é a alternativa B.
Incorreta a alternativa D, pois o teste que verifica a presença de nitrito é de execução simples e barata, além de ser amplamente disponível.

(UNAERP 2018) OJM, 26 anos, previamente com boa saúde, procura atendimento de urgência com queixa de disúria e polaciúria há 2 dias.
Nega febre ou outros sintomas. Usa pílula anticoncepcional como método contraceptivo. Ao exame físico, apresenta: bom estado geral,
Giordano negativo e, ao exame ginecológico, dor ao toque da parede vaginal anterior na topografia da bexiga. Restante dentro dos limites da
normalidade. Segundo as diretrizes médicas brasileiras mais recentes, é correto afirmar que

A) o tratamento com antibióticos, nesse caso, só poderia ser introduzido após urocultura confirmando infecção urinária.

B) um teste de fita reativa (dipstick) que mostre nitrito negativo praticamente afastaria o diagnóstico de cistite.

C) a ausência de leucocitúria significativa no exame de análise urinária, também conhecido como exame de urina tipo I, afastaria o diagnóstico
de cistite.

D) apenas com base nos dados clínicos acima, é possível firmar diagnóstico de infecção urinária não complicada com mais de 90% de certeza.

E) a bacterioscopia de urina por coloração de Gram seria ótima opção para firmar o diagnóstico de infecção urinária não complicada, pois
apresenta alta sensibilidade.

Prof. Diego Ennes | Curso Extensivo | Outubro 2021 16


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COMENTÁRIOS:

Caro aluno Estrategista, essa questão traz conceitos que você precisa dominar, tanto para a prova de Residência como para a prática
médica de qualquer generalista.

A cistite é muito mais frequente em mulheres do que em homens, o que se relaciona, principalmente, a fatores anatômicos, como o
menor comprimento da uretra e menor distância entre o orifício da uretra e o ânus.

Em mulheres que apresentam disúria, polaciúria, urgência ou dor suprapúbica, particularmente na ausência de prurido vaginal e
corrimento, devemos suspeitar de uma cistite (infecção do trato urinário baixo). O que define uma infecção do trato urinário como complicada
é a presença de um dos seguintes fatores: febre, sintomas sistêmicos (mal-estar importante, fadiga extrema, calafrios etc.), dor no flanco ou
sensibilidade no ângulo costovertebral.

porque, quando disúria e polaciúria se apresentam de forma combinada em uma mulher, há uma chance
Correta a alternativa D,
de 90% de estarmos diante de uma cistite. Nesse caso, fica estabelecido um diagnóstico clínico de infecção
do trato urinário não complicada, que não requer nenhum outro exame complementar.

Incorreta a alternativa A, porque, nesse caso, o diagnóstico de cistite não complicada é clínico e não requer exames.
Incorreta a alternativa B. A avaliação da presença de nitrito por meio do teste de fita não deve ser utilizada em mulheres jovens com
sintomas típicos, pois, mesmo negativo, não exclui infecção urinária. A utilização desse método baseia-se na capacidade de algumas
enterobactérias converterem o nitrato urinário em nitrito.
Incorreta a alternativa C, porque, embora a ausência de piúria tenha um bom valor preditivo negativo para infecção do trato urinário
(quando negativo, sugere fortemente que não é esse o diagnóstico), a afirmativa ficaria mais correta com a expressão “tornaria pouco
provável”, em vez de “afastaria”.
Incorreta a alternativa E, porque esse caso não requer exames adicionais para o diagnóstico e porque a bacterioscopia apresenta baixa
sensibilidade.

Prof. Diego Ennes | Curso Extensivo | Outubro 2021 17


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CAPÍTULO

5.0 DIAGNÓSTICO E MANEJO

5 .1 CISTITE AGUDA

A cistite, na maioria das vezes, possui diagnóstico clínico e atípicos e houver dúvida diagnóstica.
é muito frequente na mulher jovem, sobretudo após o início de “Mas, professor, quais são os sintomas típicos da cistite?”
atividade sexual, devido à potencial migração de patógenos da área Disúria, polaciúria e desconforto suprapúbico (figura 3). Cautela
retal para a uretral. A presença de sintomas típicos é suficiente para com sintomatologia inespecífica, como urina escurecida e odor
estabelecer a conduta mais apropriada: antibioticoterapia. Análise fétido, pois pode representar urina muito concentrada e sugerir
de sedimento urinário pode ser necessária se os sintomas forem desidratação – sobretudo em pacientes idosos.

Figura 3 - Sintomas de cistite aguda.

Estrategista, atenção no manejo do paciente com cistite e as opções você encontra na tabela 6. Se houver persistência de
aguda. Embora pareça muito simples, esse tema é frequente em sintomas após a terapêutica empírica, indicamos formalmente
provas e você precisa dominar. a coleta de urocultura para identificar e direcionar ao patógeno

Na cistite não complicada, o tratamento é feito de forma específico. Lembre-se, por exemplo, de que Proteus, Serratia e

empírica, sem obrigatoriedade de urocultura inicialmente Pseudomonas são intrinsecamente resistentes à nitrofurantoína,

(lembre-se de que, na presença de fatores que indiquem possível daí a importância da cultura se houver persistência de sintomas!

complicação, como vimos acima – fatores para ITU complicada –, Se a terapia inicial for eficaz e houver resolução dos sintomas, nada

devemos solicitar cultura urinária). O tempo de tratamento é curto específico deve ser feito.

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Cistite aguda Cistite aguda


não complicada GESTANTE

ATB empírico 3-5 dias Coletar cultura


ATB 3-7 dias

Persistência e/ou recorrência de


sintomas em 2 semanas? Urocultura de controle
1 a 2 semanas após

Sim

Coleta de Se cultura
urocultura negativa:

Antibiótico repetir
direcionado mensalmente

Fluxograma 1 – Tratamento da cistite aguda.

Ressalto aqui uma informação muito importante, aluno(a):

A CISTITE AGUDA NÃO COMPLICADA NÃO REQUER NENHUM EXAME COMPLEMENTAR PARA
TRATAMENTO INICIAL.

ANTIBIÓTICO DOSE DURAÇÃO

Nitrofurantoína 100 mg, 6/6 h 5 dias

Sulfametoxazol + trimetoprima 800 + 160 mg, 12/12 h 3 dias

Fosfomicina 3g Dose única

Amoxicilina + clavulanato 500 + 125 mg, 12/12 h 5-7 dias

Ciprofloxacino 250 mg 12/12h 3 dias


Tabela 6 – Opções antimicrobianas para cistite aguda.

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NITROFURANTOÍNA e FOSFOMICINA constituem as primeiras opções para tratamento da cistite aguda não complicada.

Agora vamos para uma peculiaridade capítulos, aguarde!).


importante, futuro Residente. A cistite Outra ressalva no tratamento da cistite em gestantes
aguda na paciente gestante, que é refere-se à segurança da antibioticoterapia escolhida (tabela 7).
importante, pois contempla um tema Em princípio, cefalexina, amoxicilina (com ou sem clavulanato)
frequente e de interface com a obstetrícia. e fosfomicina são opções seguras. A nitrofurantoína pode ser
Nesse caso, a coleta de urocultura é utilizada, porém preconiza-se evitar o uso no primeiro trimestre
obrigatória para guiar o tratamento e próximo a termo. O trimetoprim, por antagonizar o ácido fólico
inicial, bem como a urocultura de controle, (importante na formação do sistema nervoso central do feto),
para confirmar a eficácia terapêutica. Além disso, deve-se rastrear também deve ser evitado. Aminoglicosídeos são potencialmente
mensalmente a paciente com urocultura e tratar (mesmo se ototóxicos ao feto.
assintomática – bacteriúria assintomática virá nos próximos

PERMITIDO EVITAR

Cefalexina Quinolonas

Amoxicilina Sulfametoxazol + trimetoprim

Fosfomicina Aminoglicosídeos

Nitrofurantoína *

Ampicilina
Tabela 7 – Opções antimicrobianas durante a gestação.
*Ressalvas à nitrofurantoína: evitar no primeiro trimestre e no último mês, por risco de hiperbilirrubinemia.

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CAI NA PROVA

(SURCE - 2017) Mulher de 28 anos, sem comorbidades, comparece à consulta com queixas de disúria, polaciúria e urgência miccional iniciadas
há 1 dia. Nega febre, náuseas, lombalgia ou corrimento vaginal. Refere ter queixas semelhantes duas vezes por ano e nega uso de antibióticos
nos últimos 6 meses. Ao exame, hipersensibilidade à palpação de região hipogástrica, sem outros achados. A conduta recomendada diante
desse caso seria:

A) Prescrever fosfomicina trometamol 3 g, por via oral, em dose única, não sendo indicado, nesse caso, solicitar sumário de urina ou
urinocultura. Prescrever profilaxia pós-coito com ciprofloxacino.

B) Prescrever ciprofloxacino 500 mg a cada 12 horas, por via oral, por sete dias, não sendo indicado, nesse caso, solicitar sumário de urina
ou urinocultura. Investigar malformação de trato urinário.

C) Após coleta de sumário de urina e urinocultura, prescrever sulfametoxazol + trimetoprima 800/160 mg a cada 12 horas, por via oral, por
três dias.

D) Após coleta de sumário de urina e urinocultura, prescrever ciprofloxacino 500 mg a cada 12 horas, por via oral, por sete dias, seguido de
nitrofurantoína 100 mg/noite, por 6 meses.

COMENTÁRIOS:

Cautela com essa questão, Estrategista! Note que estamos diante de um caso de cistite aguda não complicada, mas o examinador
insere informações que podem confundi-lo, como a presença de sintomas semelhantes por duas vezes, no último ano. Não confunda com
cistite de repetição que, no caso, exigiria a presença de dois episódios em seis meses ou três em um ano (veremos isso de forma mais
detalhada no próximo tópico!).

temos uma paciente com cistite aguda não complicada, sem necessidade de exames complementares, e
Correta a alternativa A:
a fosfomicina é uma ótima opção terapêutica, em dose única.

Incorreta a alternativa B: para cistite, há opções mais seguras que ciprofloxacino, além de tempos mais curtos de tratamento (exemplo 3
dias).
Incorretas as alternativas C e D: não há indicação de coleta de urina.

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5 .2 CISTITE DE REPETIÇÃO

Primeiro de tudo, você precisa saber definir o que é uma ITU de repetição.

DEFINIMOS COMO ITU DE REPETIÇÃO A PRESENÇA DE TRÊS OU MAIS INFECÇÕES EM UM ANO OU


DUAS OU MAIS, EM SEIS MESES.

CUIDADO! Se houver “recorrência” de sintomas antes de 2 confirmação com urocultura para termos certeza de que estamos
semanas, não considere como novo episódio infeccioso, mas sim, diante de uma infecção do trato urinário de fato (e de repetição) e
provável persistência do quadro. Nesse caso, a principal suspeita prosseguirmos com as condutas necessárias.
é resistência antimicrobiana do uropatógeno, e guiar o tratamento Todo paciente com cistite de repetição precisa de avaliação
por urocultura será essencial (como falamos no tópico acima). urológica ou exame de imagem obrigatoriamente, certo? Não, caro
Na maioria dos casos de cistite de repetição, se os sintomas futuro Residente! Vamos deixar isso bem claro. Nos casos de cistite
referidos forem típicos, não há necessidade de confirmação de repetição clássicos, sem evidências de complicação e sem sinais
laboratorial (e microbiológica) da infecção. Caso os episódios de alteração anatômica do trato urinário, não há necessidade. As
relatados gerem dúvidas quanto ao diagnóstico, sugere-se indicações de avaliação específica você encontra na tabela abaixo.

Indicações de avaliação por imagem ou de especialista (urologia)

Relapso de infecção (quando há novo quadro infeccioso dentro de duas semanas);

Isolamento de Proteus em culturas prévias (associado à nefrolitíase);

Histórico de litíase urinária;

Hematúria persistente.

Mulheres com queixas miccionais persistentes, como incontinência, micção incompleta e prolapso merecem investigação
uroginecológica.

Definido o quadro de cistite de repetição, as primeiras medidas a serem tomadas não são antimicrobianas. São elas:

- modificações comportamentais e de higiene adequada;

- evitar espermicidas/diafragmas;

- uso de cranberry via oral (muito discutido pela baixa evidência de melhora, porém seu baixo risco e reduzida incidência de efeitos
colaterais tornam a opção viável);

- terapia estrogênica vaginal em mulheres pós-menopausa.

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Uma dúvida frequente do aluno é quanto à profilaxia antibiótica. Podemos fazer? SIM! Depois de discutir com a paciente os riscos
e benefícios dessa conduta, a antibioticoprofilaxia (dose reduzida diária) por 3-6 meses é uma opção eficaz, podendo ser prolongada até
um ano. Uma ressalva que deve ser considerada é se os episódios de infecção têm associação com a atividade sexual. Se afirmativo, o uso
do antibiótico deve ser administrado antes ou logo após o coito, também com bons resultados. A escolha do antibiótico obedece à mesma
lógica do tratamento da cistite e, preferencialmente, deve ser guiado conforme cultura de infecção prévia. “Mas, professor, e se a paciente for
gestante e estiver apresentando infecções urinárias de repetição?” Devemos também proceder à antibioticoprofilaxia, respeitando as opções
antimicrobianas seguras do período gestacional, e estendê-la até a segunda semana do puerpério.

CAI NA PROVA

(UNICAMP - 2021) Mulher, 35a, apresenta dor para urinar, aumento da frequência, diminuição da quantidade e urgência miccional há dois
dias. Nega febre, calafrios, dor lombar e gravidez. Antecedente pessoal: dois episódios semelhantes nos últimos seis meses. Exame sumário
de urina: hemácias = 20/campo, leucócitos = 100/campo, proteína = ausente, nitrito = +++/4+, leucócito esterase = +++/4+; urocultura: E coli;
10⁵ UFC, sensível a todos os antibióticos testados. APÓS O TRATAMENTO DESSE EPISÓDIO, A CONDUTA PARA PREVENIR NOVAS INFECÇÕES
DO TRATO URINÁRIO É:

A) Prescrever profilaxia com nitrofurantoína por seis meses.

B) Prescrever profilaxia pós-coito com ciprofloxacino.

C) Investigar nefrolitíase.

D) Investigar malformação de trato urinário.

COMENTÁRIOS:

Estrategista, aqui temos um exemplo clássico de uma questão sobre conduta na cistite de repetição. Para acertar a questão, você
precisa saber a definição de ITU de repetição, o manejo adequado e, sobretudo, lembrar-se da antibioticoprofilaxia.

Em casos de ITU de repetição, a profilaxia antimicrobiana pode ser feita, considerando riscos e benefícios.
Correta a alternativa A!
Lembrar que deve ser iniciada após tratamento da infecção ativa.

Incorreta a alternativa B, pois profilaxia pós-coito deve ser indicada se houver ITU associada à relação sexual.
Incorreta a alternativa C, nefrolitíase deve ser pesquisada se houver sintomas sugestivos ou suspeita de pielonefrite obstrutiva.
Incorreta a alternativa D, malformação do trato urinário deve ser pesquisada na faixa etária pediátrica, uma vez que as complicações
ocorrem de maneira mais precoce e não na vida adulta.

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5 .3 PIELONEFRITE AGUDA

O diagnóstico de pielonefrite pode ser feito com base na presença dos seguintes sinais e sintomas:

- sintomas urinários baixos associados à febre ou sinais sistêmicos (calafrios, alteração do estado mental);

- desconforto lombar (no exame físico, lembre-se do clássico sinal de Giordano - figura 4, que é a punho-percussão lombar
dolorosa), com piúria e/ou bacteriúria.

Figura 4 - Sinal de Giordano.

Uma informação importante, Estrategista: não é obrigatória a presença de sintomas concomitantes ou prévios de cistite para afirmar
o diagnóstico de pielonefrite!

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Uma dúvida muito frequente no manejo da pielonefrite aguda é indicar internação ou tratamento ambulatorial. Vamos aprender:

INDICAÇÕES DE INTERNAÇÃO HOSPITALAR

- Pacientes com sepse/choque séptico precisam de internação hospitalar;

- Febre persistente;

- Impossibilidade de tolerar ingestão via oral;

- Gestantes (!!!).

Antes de estudarmos os fluxogramas de tratamento da pielonefrite, duas informações frequentes precisam ficar bem claras. A primeira
é em relação à urocultura. Diferentemente da cistite aguda, em que não é necessária avaliação laboratorial na condução inicial, na pielonefrite
DEVEMOS solicitar urocultura, independentemente da indicação de internação ou não do paciente. Lembre-se disso!

Outra dúvida frequente: é obrigatória a realização de exame de imagem? NÃO! O diagnóstico de pielonefrite não exige a realização de
exame de imagem, que muitas vezes pode vir normal, sobretudo em fases iniciais (até mesmo a tomografia!). Quando pedimos então?

INDICAÇÕES DE EXAME DE IMAGEM NA PIELONEFRITE

- gravidade clínica à admissão (sepse ou choque séptico);

- ausência de melhora clínica após 48-72 horas de antibioticoterapia direcionada;

- suspeita de obstrução urinária (redução de função renal e/ou oligúria).

Vamos dividir o manejo da pielonefrite no cenário ambulatorial e no paciente internado.

No paciente em condições de tratamento ambulatorial, a escolha da antibioticoterapia deverá ser feita inicialmente
a partir da possibilidade de haver infecção por germe multirresistente (fluxograma 2). Se há algum dos fatores presente,
devemos optar por uma dose inicial de ertapenem, seguido de prescrição via oral de quinolona (ciprofloxacino 500 mg, de
12 em 12 horas, ou levofloxacino 750 mg, uma vez ao dia).

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Se não há risco de resistência inicialmente, optamos pela prescrição via oral de quinolona ou antibiótico parenteral em dose única
(ceftriaxone ou ertapenem, por exemplo), seguido de quinolona via oral. “Mas, professor, e se houver contraindicação às quinolonas?”
Sulfametoxazol + trimetoprim; amoxicilina + clavulanato; cefadroxila e cefalexina são algumas opções viáveis, lembrando sempre de adequar
a antibioticoterapia conforme resultado de urocultura. Uma ressalva importante que fazemos com relação à nitrofurantoína: apesar de ser
ótima opção para o tratamento da cistite aguda, não utilizamos nitrofurantoína no tratamento de pielonefrite devido às baixas concentrações
do antibiótico no tecido renal.

Pielonefrite aguda
Tratamento ambulatorial

Há risco para germe multirresistente?

Urocultura com germe MDR


institucionalizado

Uso recente de quinolona,


SMT+TMP, cefalosporina de
SIM: ertapenem dose um dia,
3ª ou 4ª geração
seguido de quinolona

NÃO: dose inicial de ceftriaxone,


ertapenem ou aminoglicosídeo,
seguido de quinolona
(ou quinolona direto)

Fluxograma 2 – Manejo da pielonefrite ambulatorial. (MDR = multidroga resistente; SMT+TMP = sulfametoxazol + trimetoprim).

No paciente hospitalizado, temos algumas particularidades (fluxograma 3) e o principal divisor no manejo inicial refere-se à presença
de gravidade clínica à admissão. Se há sepse (ou choque séptico), optamos por antibioticoterapia de amplo espectro com cobertura empírica
para enterobactéria produtora de betalactamase de espectro estendido (ESBL) e Staphylococcus oxa-resistente (MRSA) – esquema que pode
ser descalonado, a depender do resultado de cultura de urina. Além disso, devemos proceder a exame de imagem para descartar obstrução
urinária e eventual necessidade de avaliação ou intervenção urológica. Se não há sinais de sepse, adota-se uma conduta mais permissiva,
como vemos no fluxograma.

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Pielonefrite aguda
Tratamento hospitalar

PRESENÇA DE AUSÊNCIA DE
Sepse ou choque séptico Sepse ou choque séptico

Exame de imagem Exame de imagem se há


suspeita de obstrução urinária

Esquema ATB com cobertura


ESBL e MRSA Há risco para germe multirresistente?
Carbapenêmico + vancomicina Urocultura com MDR institucionalizado
Uso recente de quinolona, SMT+TMP,
cefalosporina de 3ª ou 4ª geração
Direcionar conforme urocultura
Trocar para via oral, se possível
SEM RISCO DE RESISTÊNCIA
Ceftriaxone ou quinolona
+ vancomicina se Gram+*

RISCO DE RESISTÊNCIA
Tazocin ou carbapenêmico
+
vancomicina se Gram+*

Fluxograma 3 – Manejo da pielonefrite em paciente internado. (ATB = antibioticoterapia; ESBL = enterobactéria produtora de betalactamase de espectro estendido;
MRSA = Staphylococcus aureus meticilina-resistente; *Gram+ em bacterioscopia ou na parcial de cultura).

A duração do tratamento antibiótico varia entre 5 e 14 dias, a depender da escolha. Esse ponto é algo que sempre gera dúvida e, por
vezes, é cobrado nas principais provas; portanto, fique atento (tabela 8). Uma observação importante deve ser feita com relação à presença
de hemocultura positiva em pacientes com pielonefrite, sem outros fatores complicadores. No geral, não há mudança de conduta em relação
à via de tratamento (pode ser utilizado antimicrobiano via oral) e à duração.

ATB DOSE DURAÇÃO

Ciprofloxacino 500 mg, 12/12h 5-7 dias

Levofloxacino 750 mg, 24/24h 5-7 dias

Amoxicilina + clavulanato 875 + 125 mg, 12/12h 10-14 dias

Ceftriaxone 1 a 2 g/dia (endovenoso) 10-14 dias

Meropenem 1 g, 8/8h (endovenoso) 10-14 dias

Sulfametoxazol + trimetoprim 800/160 mg, 12/12h 7-10 dias


Tabela 8 – Antibioticoterapia na pielonefrite.

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(SECRETARIA ESTADUAL DE SAÚDE – GO – 2021) A infecção em pacientes com pielonefrite aguda pode ser subdividida em (1) infecção não
complicada que não justifica hospitalização; (2) infecção não complicada em pacientes com trato urinário normal que estão enfermos o
suficiente para justificar hospitalização para terapia parenteral; e (3) infecção complicada associada com hospitalização, cateterismo, cirurgia
urológica ou anormalidades do trato urinário. É fundamental determinar se o paciente tem uma ITU não complicada ou complicada, pois
anormalidades significativas foram encontradas em 16% dos pacientes com pielonefrite aguda. Nesse sentido, em pacientes com pielonefrite:

A) não complicada presumida que serão tratados ambulatorialmente, a avaliação radiológica inicial geralmente pode ser adiada. No entanto,
se houver qualquer razão para suspeitar de um problema ou se o paciente não tiver acesso razoável a exames de imagem ou se não
houver mudança na condição, recomenda-se a ureteroscopia para descartar cálculos ou obstruções.

B) complicada conhecida ou suspeita, a TC fornece uma avaliação excelente do estado do trato urinário e da gravidade e extensão da
infecção. A ampicilina oral (500 mg quatro vezes ao dia) por sete dias é uma terapia de primeira linha apropriada em pacientes que não
necessitam de hospitalização, nos quais a prevalência de resistência uropatogênica ao antibiótico na comunidade não excede a 10%.

C) se uma dose parenteral única inicial de antibiótico for escolhida, um agente de ação prolongada, como 1 g de ceftriaxona ou uma dose
consolidada de 24 horas de um aminoglicosídeo, pode ser usado como alternativa a uma fluoroquinolona intravenosa. Fluoroquinolonas
orais uma vez ao dia, como ciprofloxacina 1.000 mg de liberação prolongada por sete dias ou azitromicina 500 mg por cinco dias, também
são alternativas razoáveis em pacientes não hospitalizados, nos quais os padrões de resistência na comunidade são baixos.

D) o sulfametozaxol + trimetoprima oral (160/800 mg [1 comprimido de dupla força] duas vezes ao dia por 14 dias) é um agente apropriado
se o organismo for conhecido por ser sensível; se a suscetibilidade for desconhecida, uma dose intravenosa inicial de um antibiótico
parenteral de ação prolongada, como 1 g de ceftriaxona ou uma dose consolidada de 24 horas de um aminoglicosídeo, é recomendada.

COMENTÁRIOS:

Estrategista, veja que questão difícil sobre o manejo da pielonefrite. Após estudar o fluxograma de tratamento, você certamente
acertará!
Incorreta a alternativa A: de fato, em pielonefrite não complicada não há necessidade de exames de imagem. Logo um procedimento
invasivo, como ureteroscopia, também não tem indicação, apenas se houver obstrução de via urinária por litíase, por exemplo.
Incorreta a alternativa B: a gravidade da pielonefrite não necessariamente se dará pela tomografia, mas sim, por parâmetros clínicos. O
exame de imagem auxilia a avaliar complicações e fatores obstrutivos.
Outra imprecisão da alternativa refere-se à antibioticoterapia empírica escolhida. A ampicilina tem cobertura focada em enterococo, com
pouca cobertura para Gram-negativos, flora que é muito envolvida nas infecções do trato urinário.
Incorreta a alternativa C: o esquema de dose inicial com ceftriaxona parenteral, seguido de quinolonas via oral, é uma boa opção. Porém,
macrolídeos (azitromicina) não compõem boa opção terapêutica para tratamento das infecções urinárias.

sulfametoxazol + trimetoprim apontam para uma preocupação crescente quanto aos índices de resistência.
Correta a alternativa D:
Portanto seu uso precedido por uma dose parenteral de ceftriaxona ou aminoglicosídeo torna-se boa
opção.

Prof. Diego Ennes | Curso Extensivo | Outubro 2021 28


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(HOSPITAL DA POLÍCIA MILITAR – MG – HPM – MG 2017 – LD) Sobre a Infecção do Trato Urinário (ITU), marque a alternativa INCORRETA.

A) A partir dos 50 anos de idade, a incidência de infecção do trato urinário é praticamente igual entre homens e mulheres.

B) O maior número de relações sexuais está relacionado a risco aumentado de infecção do trato urinário entre mulheres.

C) A presença de piúria franca, nitrito positivo e urocultura positiva estabelece o diagnóstico de ITU, mesmo em pacientes assintomáticos.

D) A nitrofurantoína é prescrita no tratamento de pielonefrite aguda.

COMENTÁRIOS (Infectologia – ITU – Clarissa Cerqueira)

Correta a alternativa A. A infecção urinária na idade adulta é mais frequente em mulheres. Com o passar dos anos, principalmente após
os 50 anos de idade, essa incidência tende a ficar igual entre homens e mulheres.
Correta a alternativa B. A relação sexual é fator de risco para infecção urinária. Quando a paciente tem episódios frequentes de infecção
após o coito, indicamos a profilaxia antimicrobiana que deve ser tomada após a relação sexual.

A piúria com nitrito positivo e urocultura com crescimento bacteriano não estabelecem o diagnóstico de
Incorreta a alternativa C.
infecção urinária se o paciente estiver assintomático. O que define uma infecção urinária é a presença de
sinais e sintomas.

Correta a alternativa D. A nitrofurantoína não deve ser usada para pielonefrite, pois não consegue atingir concentrações elevadas nos rins.

5 .4 ABSCESSO RENAL

Abscesso renal e perinefrético podem ocorrer como


complicação de pielonefrite ou por disseminação hematogênica
(S. Aureus é a principal causa, nesse caso). A apresentação clínica
constitui-se de febre e dor lombar que, muitas vezes, ocorrem
naquele paciente com resposta lentificada ou mesmo ausência de
melhora durante tratamento de pielonefrite.

O melhor exame para diagnóstico é a tomografia


computadorizada com contraste iodado (figura 5). O achado
confirmatório é a presença de uma cavidade fechada com realce
após injeção do contraste (sinal do anel). Quando localizado
externamente ao rim, confinado à fáscia de Gerota, é denominado
abscesso perinefrético.
Figura 5 – Abscesso renal. Fonte: acervo pessoal Dr. Joshua Viana.

Prof. Diego Ennes | Curso Extensivo | Outubro 2021 29


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Por não haver conexão com o sistema coletor, muitas vezes a urocultura pode ser negativa. Nesse caso, a terapia empírica deverá
cobrir enterobactérias ou ser direcionada conforme resultado da cultura de secreção na drenagem cirúrgica. Quando há concomitância de
estafilococcemia, direciona-se o tratamento para esse germe.

E quando indicamos drenagem?

- Drenagem imediata se abscesso renal a partir de 5 cm;

- Drenagem imediata se abscesso perinefrético a partir de 3 cm.

Em abscessos com dimensões menores que as supracitadas, o tratamento clínico é continuado e avaliada intervenção conforme
evolução clínica da antibioticoterapia (a qual deverá ser mantida por duas a três semanas, com ou sem drenagem).

5 .5 PIELONEFRITE ENFISEMATOSA

PIELONEFRITE ENFISEMATOSA

A pielonefrite enfisematosa é uma grave infecção causada


por germes capazes de produzir gás, sendo E. coli (70% dos casos)
e K. pneumoniae (quase 30%) os principais agentes responsáveis.
Pseudomonas aeruginosa e P. mirabilis também podem ser
causadores, porém em mínima proporção. Até 90% dos casos
ocorrem em pacientes com diabetes.

O diagnóstico é confirmado por imagem (tomografia


computadorizada, embora a própria radiografia de abdome possa
encontrar sinais de gás em topografia renal – figura 6).
Tratamento cirúrgico, seja drenagem percutânea
ou até mesmo nefrectomia (em casos graves), associado à
antibioticoterapia endovenosa é a melhor escolha na pielonefrite
enfisematosa.

A mortalidade causada por essa condição é alta. Sem


tratamento cirúrgico, há estudos que mostram 60 a 80% de
mortalidade.

Figura 6 – Radiografia simples de pielonefrite enfisematosa.

Prof. Diego Ennes | Curso Extensivo | Outubro 2021 30


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5 .6 BACTERIÚRIA ASSINTOMÁTICA

Atenção aqui, Estrategista! Agora você estudará um dos tópicos que mais são cobrados em provas
quando o assunto é infecções do trato urinário: BACTERIÚRIA ASSINTOMÁTICA.

Associamos a essa entidade aquele paciente que não apresenta sintomas (compatíveis com
infecção do trato urinário) e com urocultura positiva com crescimento de pelo menos 105 UFC/mL
(lembre-se desse valor, pois algumas questões colocam positividade de urocultura abaixo desse limite,
logo não podemos afirmar que seja bacteriúria assintomática!). Em mulheres, é necessária confirmação
do exame, com segunda amostra, dentro de até duas semanas. Em homens ou em amostras obtidas por
cateterismo vesical, apenas uma amostra é suficiente (figura 7).

2 amostras com
Bacteriúria
Mulheres intervalo de
assintomática até 15 dias

Bacteriúria Amostra única


Homens
assintomática é suficiente

Bacteriúria Amostra
Amostra única
colhida
assintomática é suficiente
por cateter

Figura 7 – Diagnóstico de bacteriúria assintomática.

Cuidado com a presença de piúria no exame de urina. A simples presença de leucocitúria não é confirmativa de bacteriúria. Fique
atento a isso, futuro Residente!

O que mais costumamos ver nas provas de Residência é o examinador cobrar do candidato as indicações para tratar um paciente com
bacteriúria assintomática. Vamos frisar as principais indicações.

INDICAÇÕES DE TRATAMENTO NA BACTERIÚRIA ASSINTOMÁTICA

- Gestantes (PRINCIPAL INDICAÇÃO, OBRIGATÓRIO SABER!).

- Pré-operatório de cirurgia urológica (com risco de sangramento de mucosa do trato urinário).

Prof. Diego Ennes | Curso Extensivo | Outubro 2021 31


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Você precisa dominar o assunto opções terapêuticas guiadas pelo antibiograma, respeitando
bacteriúria assintomática na gestação, a segurança dos antimicrobianos na gestação e por tempo de
Estrategista! Leia com calma aqui. tratamento igual à cistite. Finalizado o tratamento, uma urocultura

Devemos solicitar urocultura na de controle deve ser realizada, após uma semana do término.

gestante a partir de 12 a 16 semanas de Caso haja persistência do mesmo germe na urocultura, repetimos

gestação. A bacteriúria na gestação ocorre o tratamento com curso maior de duração. E lembre-se: não há

com mais facilidade, além de suscetibilizar indicação de antibioticoprofilaxia na bacteriúria assintomática,

a pielonefrite, parto prematuro, baixo apenas se caracterizar infecção urinária de repetição.

peso ao nascimento e mortalidade perinatal. Feito o diagnóstico Algumas fontes preconizam tratamento de bacteriúria
de bacteriúria assintomática (lembre-se do critério: positividade assintomática em transplante renal recente (menos de um mês),
de cultura com pelo menos 105 UFC/mL), devemos tratar com porém isso não é consenso absoluto.

IMPORTANTE:

Pacientes diabéticos, idosos, com cateter vesical, pré-operatório não urológico NÃO
devem ser submetidos a rastreio de bacteriúria assintomática, tampouco receber tratamento!

CAI NA PROVA

(SANTA CASA DE MISERICÓRDIA DE BELO HORIZONTE – MG – 2018) Por definição, na bacteriúria assintomática não há sintomas locais ou
sistêmicos de infecção urinária, porém essa situação merece tratamento:

A) em pacientes diabéticos, pois esses são imunossuprimidos.

B) quando a urocultura for positiva para estafilococos, bactéria não usual no trato urinário.

C) quando a urocultura mostrar uma bactéria multirresistente, pela maior virulência dela.

D) quando o paciente for submetido à cirurgia urológica, ainda que seja imunocompetente.

COMENTÁRIOS:

Olhe um exemplo clássico (de muitos, porque esse tema despenca em prova!). Aqui o examinador deseja testar seu conhecimento
acerca de indicação de tratamento em bacteriúria assintomática.
Incorreta a alternativa A: pacientes diabéticos com bacteriúria assintomática não têm indicação de receber antibioticoterapia.
Incorreta a alternativa B: não indicamos tratamento de bacteriúria assintomática com base nos resultados microbiológicos.
Incorreto a alternativa C: novamente, não indicamos tratamento baseado em variedade de germes encontrados na cultura.

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pré-operatório de cirurgia urológica com risco de sangramento de mucosa deve receber antibioticoterapia
Correta a alternativa D:
se houver presença de bacteriúria.

(SUS-SP 2019) Gestante de 30 semanas, assintomática, traz o seguinte exame de urina.

EXAME (valor de referência)

Cor: amarela

pH: 5,0 (5,0 a 8,0)

Densidade: 1,022 (de 1,010 a 1,030)

Proteínas: inferior A 0,10 g/L (Negativa)

Glicose: inferior a 0,3 g/L (negativa)

Células Epiteliais: raras

Leucócitos: 32.000 (inferior a 30.000/mL)

Eritrócitos: 1.000 (inferior a 12.000/mL)

Cilindros: ausentes

Urocultura: positiva para Escherichia coli acima de 100.000 UFC/mL

O médico deve:

A) tratar com cefalosporina.

B) coletar nova urocultura com rigorosa assepsia vaginal.

C) recomendar aumento da ingestão de líquidos e repetir a urocultura.

D) prescrever cranberry ou acidificar a urina.

E) repetir a urocultura após tratamento de provável leucorreia.

COMENTÁRIOS:

Trouxe essa questão, futuro Residente, para você perceber a importância desse tema e reforçar o quanto é cobrado nas provas de
Residência pelo país.

Aqui, temos uma gestante assintomática, com bacteriúria significativa. Conduta? TRATAR! Gestantes e pré-operatório de cirurgia
urológica são indicações absolutas de tratamento de bacteriúria assintomática!

Além disso, devemos nos lembrar das opções seguras na gestação e cefalosporina é uma ótima escolha.

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Logo, correta a alternativa A.

5 .7 INFECÇÃO FÚNGICA

Fungúria é algo relativamente comum em pacientes hospitalizados, com fatores de risco (quadro abaixo), raramente representando
infecção invasiva grave. As espécies de Candida são as mais encontradas.

FATORES DE RISCO PARA CANDIDÚRIA:

• Antibioticoterapia prévia.

• Dispositivos urológicos.

• Diabetes.

• Neoplasias.

Candidúria assintomática geralmente não requer tratamento. Candidúria sintomática deve ser tratada. A escolha, na
Indica-se, contudo, tratar pacientes neutropênicos ou que serão maioria das vezes, recai sobre o fluconazol, com duração de 14 dias
submetidos à manipulação do trato urinário. Cuidado, caro aluno! (tanto para cistite como pielonefrite). Para Candida spp. resistentes
Muitas vezes, o examinador, em um enunciado de caso clínico, insere a fluconazol, anfotericina desoxicolato é a escolha, por 7 dias (não
um paciente em perioperatório de outra condição (ortopédica, por se usam as formulações lipídicas de anfotericina na suspeita de
exemplo). Não tratamos, nesse caso! Uma observação importante pielonefrite por Candida devido à má penetração desse antifúngico
é que, na persistência de candidúria em pacientes com diabetes, no parênquima renal).
optamos por exame de imagem, a fim de descartar “bola fúngica”
ou presença de abscesso.

Exceção:
Candidúria neutropênicosou
NÃO tratar
assintomática manipulação do
trato urinário

Se falha,
Tratar com
Candidúria fluconazol
anfotericina
sintomática por 14 dias
desoxicolato
por 7 dias

Figura 8 – Tratamento da candidúria.

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5 .8 INFECÇÃO RELACIONADA A CATETER VESICAL

As ITUs são responsáveis por assintomática, há um risco de 10 a 25% de o paciente desenvolver


aproximadamente 40% das infecções uma ITU.
hospitalares. Cuidado novamente com bacteriúria no paciente com
A presença de CVD é o principal cateter vesical, futuro Residente. Aqui também, definimos a
fator de risco para ITU hospitalar (figura presença de infecção quando também há sintomatologia típica ou
9) e ocorre uma taxa de colonização desse sinais de infecção sistêmica, em que o foco urinário é o suposto
dispositivo de 3 a 10% por dia (ATENÇÃO!). responsável.

A colonização ocorre por via extraluminal (mecanismo Para a coleta de urocultura, idealmente deve-se trocar o CVD
mais importante), com a entrada da bactéria pelo biofilme que se e coletar a amostra no novo dispositivo. Caso isso não seja viável,
forma no cateter na uretra, ou intraluminal, pela estase urinária a amostra de urina deve ser coletada do conduto e não da bolsa
secundária à drenagem inadequada ou contaminação da bolsa coletora. Confirmada a infecção, deve-se trocar o cateter, caso isso
coletora. Ocorrendo colonização e, por conseguinte, bacteriúria já não tenha sido feito.

Figura 9 - Cateter vesical de demora.

Nos pacientes impossibilitados de micção espontânea e que precisam de cateterismo vesical, em vez de manter o dispositivo de longa
permanência, o cateterismo intermitente é uma opção com menor risco de causar infecção. Essa técnica consiste no cateterismo de forma
intermitente, isto é, realizado a cada 4 horas pelo próprio paciente ou familiar. Em outras palavras, o paciente insere o cateter (figura abaixo)
pela uretra, esvazia a bexiga e retira o dispositivo na sequência, descartando-o. Assim, a sonda não fica de forma permanente dentro do
paciente, o que impede eventual proliferação bacteriana e consequente infecção.

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Figura 10 - Cateter vesical para técnica intermitente.

CAI NA PROVA

(USP-SP 2021) Homem de 31 anos, vítima de ferimento por arma de fogo há 3 anos com destruição de L5, evoluindo com bexiga neurogênica
e dificuldade para promover o esvaziamento vesical. Faz uso de sonda vesical de demora (SVD) com sistema aberto (sem extensão e bolsa
coletora acoplados) e ocluído, que é aberto a cada 6 horas para promover o esvaziamento vesical. No último ano, apresentou 5 episódios de
infecção urinária febril, tendo sido dois deles tratados em ambiente hospitalar para antibioticoterapia endovenosa. Há 6 meses, começou a
apresentar perda urinária adjacente à SVD antes de promover o esvaziamento vesical, necessitando utilizar forro ou fralda. A ultrassonografia
do aparelho urinário evidenciou rins sem dilatação e bexiga de boa capacidade com paredes finas, creatinina de 0,8 mg/dL, proteína C-reativa
de 2,5 mg/L e cultura de urina positiva para E. coli. Preocupado com as infecções e perdas urinárias, o paciente deseja orientação. Qual a
melhor conduta?

A) Retirar a sonda vesical de demora e iniciar cateterismo intermitente limpo.

B) Trocar a sonda vesical de demora e reduzir o intervalo para promover o esvaziamento vesical para 4 horas (ao invés de 6 horas).

C) Trocar a sonda vesical de demora e instalar o sistema fechado, utilizando bolsa coletora com extensão de sonda.

D) Retirar a sonda vesical e passar a promover o esvaziamento vesical por manobra de Credé a cada 4 horas.

COMENTÁRIOS:

Separei essa questão para você ver como é importante saber esse conceito de cateterismo vesical, Estrategista!

Como vimos acima, se o paciente tem necessidade de manter cateter vesical, a técnica intermitente (a cada 4 horas) é a mais indicada.

Logo, correta a alternativa A.

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5 .9 CISTITE INTERSTICIAL

É uma situação clínica pouco habitual de ser cobrada em provas de Residência, Estrategista! Mas, eventualmente, pode aparecer.
Então, vamos entender.

A cistite intersticial é uma síndrome dolorosa crônica


relacionada a sintomas vesicais (pressão, dor e desconforto),
associada a outros sintomas urinários baixos, com duração acima
de 6 semanas e sem associação com agentes infecciosos ou outras
causas uroginecológicas. A sintomatologia também contempla
desconforto conforme há esvaziamento vesical.

O diagnóstico é clínico, considerando as características acima


e, principalmente, descartadas as demais causas. A cistoscopia,
quando realizada para avaliar outras possíveis etiologias, pode
achar lesões características da cistite intersticial: lesões de Hunner
(depósitos de fibrinas na mucosa vesical - figura 11). No entanto,
esse achado é incomum (cerca de 10% dos pacientes), porém muito
característico.

O tratamento envolve analgesia comum, antidepressivos


tricíclicos, fisioterapia e, em casos mais graves, anestésicos Figura 11 - Lesão de Hunner - Fonte: Chenam, A.; Khourdaji, I. et. al. Tratamento
eletrocirúrgico de úlceras de Hunner na população de cistite intersticial de um
intravesicais. centro de referência.

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MED

CAPÍTULO

7.0 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS


1. Johnson, R.J. et al. Comprehensive Clinical Nephrology, 5th ed. Elsevier: 2015.
2. Nicolle, L.E. et al. Clinical Practice Guideline for the Management of Asymptomatic Bacteriuria: 2019 Update by the Infectious Diseases
Society of America. Clin Infect Dis. 2019 May 2;68(10):e83-e110.
3. Brenner, B.M., editor. Brenner & Rector’s The Kidney. 10th ed. Philadelphia: Elsevier, 2016.
4. Anger, J. et al. Recurrent Uncomplicated Urinary Tract Infections in Women: AUA/CUA/SUFU Guideline. J Urol. 2019 Aug;202(2):282-
289.
5. Tópicos UpToDate:
Acute complicated urinary tract infection (including pyelonephritis) in adults.

Acute simple cystitis in women.

Catheter-associated urinary tract infection in adults.

Sampling and evaluation of voided urine in the diagnosis of urinary tract infection in adults.

Urinary tract infections and asymptomatic bacteriuria in pregnancy.

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CAPÍTULO

8.0 CONSIDERAÇÕES FINAIS


Muito bem, Coruja!

Mais um importante tópico de nefrologia concluído com sucesso. E mais um passo dado em frente, rumo à aprovação!

Agora, não deixe de fazer as questões selecionadas para consolidar ainda mais o conhecimento, ok?

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