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Choque cardiogênico

PEDRO HÉLIO PONTES DANTAS


DANIEL CURITIBA MARCELLOS
LÍVIA MARIA GARCIA MELRO

INTRODUÇÃO

O choque circulatório é caracterizado pela inabilidade do fluxo sanguíneo e da


oferta de oxigênio (DO2) em suprir as demandas metabólicas (VO2). Choque
cardiogênico é um tipo específico de choque circulatório resultante de uma falha
primária da bomba cardíaca. Em outras palavras: débito cardíaco inadequado com
altas pressões de enchimento gerando hipoperfusão tecidual.
De maneira geral, qualquer processo patológico que atinja o miocárdio, o
sistema de condução, as valvas cardíacas ou o pericárdio, seja isoladamente ou em
conjunto, pode levar a choque cardiogênico e instabilidade hemodinâmica,
conforme detalhado na Tabela 1.
Em aproximadamente 80% dos casos o choque cardiogênico tem como etiologia
o infarto agudo do miocárdio (IAM). Cinco a 10% dos pacientes hospitalizados por
IAM desenvolvem choque cardiogênico durante a internação, sendo mais comum
nos casos de IAM com supra do segmento ST (IAMCSST) de parede anterior e, em
seguida, de parede inferior – seja por disfunção primária do ventrículo esquerdo
(VE), do ventrículo direito (VD) ou secundário às complicações mecânicas do
IAM: insuficiência mitral aguda, ruptura do septo interventricular ou ruptura de
parede livre, sendo esta a mais grave das complicações.
Apesar dos esforços em pesquisa clínica e da aplicação cada vez mais frequente
e precoce dos dispositivos de assistência ventricular (que serão discutidos ao final
deste capítulo), a mortalidade no choque cardiogênico mantém-se elevada e
frustrantemente semelhante àquela observada há duas décadas – entre 30 e 50%.
Alguns estudos populacionais, porém, mostram uma discreta tendência à redução
dessa mortalidade ao longo dos últimos anos – benefício este que está atrelado à
adesão cada vez maior aos protocolos de cateterismo e revascularização precoces.
Pode-se afirmar, portanto, que a reversão da causa do choque (p. ex.,
angioplastia precoce no IAM, drenagem pericárdica no tamponamento cardíaco,
marca-passo provisório no bloqueio atrioventricular total [BAVT], e assim por
diante) está entre as medidas que mais influenciam na redução da morbimortalidade
do choque cardiogênico. Outro conceito de fundamental importância e que tem
ganhado cada vez mais visibilidade no meio acadêmico são os “times de choque”
(do inglês, shock team): são equipes multidisciplinares compostas por especialistas
(intensivistas, cardiologistas, cirurgiões cardíacos e hemodinamicistas). A atuação
do time de choque baseia-se em protocolos institucionais que permitam a rápida
identificação do choque, monitorização hemodinâmica adequada, minimização do
uso de vasopressores e inotrópicos e instalação precoce dos dispositivos de
assistência ventricular, e são capazes de melhorar substancialmente o prognóstico
desses pacientes.

TABELA 1 Causas de choque cardiogênico

Miocárdio
TABELA 1 Causas de choque cardiogênico

I) Infarto agudo do miocárdio


a. Disfunção ventricular esquerda
b. Arritmias ventriculares instáveis
c. Infarto de VD
d. Complicações mecânicas
I) Ruptura do músculo papilar com insuficiência mitral aguda
II) Ruptura do septo interventricular
III) Ruptura de parede livre
II) Insuficiência cardíaca descompensada
a. Insuficiência cardíaca crônica descompensada (etiologia definida)
b. Primeira descompensação de insuficiência cardíaca
I) Isquemia crônica
II) Miocardiopatia dilatada
III) Miocardite
IV) Miocardiopatia induzida por estresse (Takotsubo)
V) Miocardiopatia periparto
VI) Doenças endócrinas (hipo ou hipertireoidismo/feocromocitoma)
III) Choque pós-cardiotomia
a. Circulação extracorpórea prolongada
b. Cardioproteção insuficiente
IV) Obstrução dinâmica da via de saída do VE
V) Miocárdio atordoado pós-PCR
VI) Miocardiopatia da sepse
VII) Contusão miocárdica

Valvas

I) Valva nativa
a. Estenose
b. Insuficiência aguda
c. Obstrução valvar
II) Valva protética
a. Obstrução valvar
b. Restrição ou falência de folheto
c. Falha mecânica
d. Deiscência valvar

Sistema de condução elétrica

I) Arritmia atrial com rápida resposta ventricular


II) Taquiarritmias ventriculares
III) Bradiarritmias

Causas extracardíacas/obstrutivas
TABELA 1 Causas de choque cardiogênico

I) Tamponamento cardíaco
II) Pericardite constritiva
III) Tromboembolismo pulmonar

Fonte: adaptada de van Diepen et al, 2017. VD: ventrículo direito; VE: ventrículo esquerdo; PCR:
parada cardiorrespiratória.

Resumidamente, o choque cardiogênico é uma entidade clínica de prognóstico


reservado e tratamento complexo, que demanda experiência, trabalho em equipe e
estrutura hospitalar sofisticada. No presente capítulo abordaremos o que há de mais
recente em literatura a respeito do tema.

DEFINIÇÕES

As definições de choque cardiogênico variam na literatura (Tabela 2). De uma


maneira geral, baseiam-se na soma dos seguintes critérios:
Pressão arterial sistólica (PAS) < 90 mmHg por > 30 minutos OU suporte com
vasopressores para manter PAS > 90 mmHg.
Sinais clínicos de congestão pulmonar E/OU pressão de oclusão de artéria
pulmonar > 15 mmHg.
Sinais clínicos e/ou laboratoriais de hipoperfusão tecidual (extremidades frias,
tempo de enchimento capilar prolongado, rebaixamento do nível da
consciência, oligúria, lactato > 2 mmol/L).
2 2
Índice cardíaco < 1,8 L/min/m ou < 2,2 L/min/m em uso de DVA.

TABELA 2 Critérios de choque cardiogênico utilizados nos três principais ensaios clínicos sobre o
tema

SHOCK, 1999 IABP-SHOCK II, 2012 CULPRIT-SHOCK, 2017


TABELA 2 Critérios de choque cardiogênico utilizados nos três principais ensaios clínicos sobre o
tema

Critérios clínicos: Critérios clínicos: Critérios clínicos:


PAS < 90 mmHg por > 30 PAS < 90 mmHg por > 30 PAS < 90 mmHg por > 30
minutos OU suporte para minutos OU suporte para minutos OU suporte para
manter PAS > 90 mmHg manter PAS > 90 mmHg manter PAS > 90 mmHg
E E E
Hipoperfusão orgânica (débito Diagnóstico clínico de Diagnóstico clínico de
urinário < 30 mL/h ou congestão pulmonar congestão pulmonar
extremidades frias) E E
Critérios hemodinâmicos: Hipoperfusão orgânica Hipoperfusão orgânica
IC < 2,2 L/min/cm2 (alteração do nível de (alteração do nível de
E consciência, débito urinário < consciência, débito urinário < 30
POAP > 15 mmHg 30 mL/h, extremidades frias ou mL/h, extremidades frias ou
lactato > 2 mmol/L) lactato > 2 mmol/L)

IC: índice cardíaco; PAS: pressão arterial sistêmica; POAP: pressão de oclusão da artéria pulmonar.

Tais critérios, porém, apresentam alguns problemas que devem ser levados em
consideração. Em primeiro lugar, 5% dos pacientes que se apresentam em choque
cardiogênico têm a pressão arterial normal. Além disso, cerca de 1/3 dos casos
encaixam-se no fenótipo hemodinâmico que costumamos classificar como “perfil
L”, ou seja, pacientes em choque cardiogênico sem sinais de congestão pulmonar
ou hipervolemia. Por último, deve-se ter muito cuidado ao se estabelecer um valor
“normal” para o débito cardíaco: pacientes portadores de miocardiopatia crônica
podem apresentar-se estáveis e assintomáticos com um índice cardíaco < 2,2
L/min/m2, assim como um paciente com alta demanda metabólica (p. ex., choque
séptico) pode apresentar um índice cardíaco > 2,2 L/min/m2, sendo esse valor, ainda
assim, insuficiente para suprir suas necessidades de oxigenação tecidual; dessa
forma, atualmente é preferível referir-se ao débito cardíaco como “adequado” ou
“inadequado”, e não como “normal” ou “anormal”.
Os critérios citados servem, portanto, como um norte, devendo ser aplicados à
luz do senso crítico e raciocínio clínico.

FISIOPATOLOGIA

O clássico modelo fisiopatológico do choque cardiogênico encontra-se ilustrado


na Figura 1.
A hipoperfusão tecidual e coronariana ocorre primariamente em razão do baixo
débito cardíaco; outros fatores, porém, contribuem de maneira variável para a
perpetuação do choque: hipoxemia (resultado das altas pressões de enchimento
ventricular e consequente congestão pulmonar), disfunção endotelial, resposta
inflamatória sistêmica e vasoplegia. A interação entre cada um desses fatores
resulta em uma complexa sequência de eventos que levam à disfunção miocárdica
progressiva e à morte.

Figura 1 Modelo fisiopatológico em espiral do choque cardiogênico. Fonte: adaptada de van Diepen
et al., 2017. eNOS: enzima óxido nítrico sintase endotelial; iNOS: enzima óxido nítrico sintase
induzível; PDFVE: pressão diastólica final do ventrículo esquerdo; RVS: resistência vascular
sistêmica; SIRS: síndrome da resposta inflamatória sistêmica; TNF: fator de necrose tumoral.

Outro fator que contribui consideravelmente na perpetuação do choque é a


vasoconstrição periférica, primeiro e principal mecanismo compensatório
desencadeado pelo choque cardiogênico e que tem a função fisiológica de manter a
pressão arterial e a perfusão de órgãos vitais. As consequências da vasoconstrição
periférica são, todavia, deletérias – levam ao aumento da pós-carga e consequente
injúria cardíaca adicional, com redução ainda maior do débito cardíaco. A interação
entre a função cardíaca e o sistema arterial, conceito chamado de acoplamento
ventrículo-arterial, é de suma importância para a eficiência do sistema
cardiovascular, e a impedância da aorta e do sistema arterial como um todo afeta
diretamente a performance ventricular (Figura 2). É por esse motivo que, conforme
discutiremos adiante, deve-se evitar ao máximo o uso de vasopressores no choque
cardiogênico.
Entretanto, em muitos dos casos a vasoconstrição é contrabalanceada por
inflamação sistêmica e consequente vasoplegia, levando à perpetuação e piora do
choque. A disfunção endotelial e a produção inadequadamente elevada de óxido
nítrico desempenham papel importante nesse processo. Além disso, os níveis
séricos elevados de moléculas como peroxinitrito e citocinas pró-inflamatórias
(interleucinas e fator de necrose tumoral alfa) também promovem efeito
cardiotóxico e inotrópico negativo.
A disfunção do ventrículo direito (VD) também contribui para a instabilidade
hemodinâmica e perpetuação do choque, pela interdependência interventricular: o
VD é menos adaptado à elevação de pós-carga e mais tolerante à sobrecarga hídrica
do que o VE; consequentemente, o aumento das pressões de enchimento do VE leva
à hipertensão pulmonar secundária e à dilatação do VD, com desvio do septo
interventricular em direção ao VE, reduzindo o volume diastólico final dele,
levando à redução do volume sistólico e exacerbando a hipoperfusão sistêmica. É
por esse motivo que a terapia com diuréticos e o balanço hídrico negativo podem
não só reverter a congestão pulmonar, como também melhorar a hemodinâmica do
paciente.
Figura 2 A interação entre a elastância arterial e a elastância ventricular determina o acoplamento
ventrículo-arterial. O aumento da elastância arterial resulta em queda da elastância ventricular,
diminuição do volume sistólico e trabalho ventricular desperdiçado. VE: ventrículo esquerdo.

A instituição de um tratamento precoce e agressivo desempenha papel-chave


para que essa sequência letal de eventos seja revertida. Na fase inicial do choque, a
microcirculação e a macrocirculação apresentam-se como variáveis diretamente
proporcionais; ou seja, a melhora nos parâmetros macro-hemodinâmicos (como
débito cardíaco e pressão arterial) leva também à melhora da perfusão tecidual e à
reversão do choque. Rapidamente, porém, uma proporção significativa de pacientes
passa a apresentar o que chamamos de “incoerência hemodinâmica”, com
persistência da hipoperfusão tecidual a despeito da otimização macrocirculatória.
Isso acontece por heterogeneidade da microcirculação, redução da densidade capilar
e edema tecidual, o que pode levar a dano celular irreversível.
Na fase final do choque, caracterizada pela disfunção de múltiplos órgãos, fica
difícil separar os diferentes mecanismos responsáveis pela resposta inadequada à
terapia hemodinâmica, de forma que o tempo entre o início do choque e a
instituição do tratamento é o principal fator determinante para a reversibilidade das
disfunções orgânicas.

MONITORIZAÇÃO HEMODINÂMICA

O tema “monitorização hemodinâmica” já foi amplamente em capítulos


anteriores deste livro. Cabe aqui apenas acrescentar algumas particularidades da
monitorização hemodinâmica no choque cardiogênico:
Exame físico: a insuficiência circulatória possui três “janelas” clínicas:
cérebro, pele e rins. O exame clínico voltado para esses três órgãos é de
fundamental importância para a monitorização da perfusão orgânica, tanto
pela sua eficiência quanto pela simplicidade, e a melhora desses parâmetros
costuma ser o primeiro sinal de uma otimização hemodinâmica bem-sucedida.
Porém, é importante ressaltar que todos os parâmetros de exame clínico (nível
de consciência, débito urinário, tempo de enchimento capilar etc.) servem tão
somente para identificar má-perfusão tecidual, de forma que estarão
igualmente alterados em choques de quaisquer outras etiologias. Nenhum
deles possui boa acurácia na determinação do débito cardíaco, por sua alta
especificidade e baixa sensibilidade (Tabela 3). Sendo assim, são necessários
outros métodos complementares para tal, com destaque para o
ecocardiograma point-of-care, conforme discutido no capítulo específico. Em
casos selecionados (p. ex., quando não há janela ecocardiográfica adequada –
como nos pós-operatórios de cirurgia cardíaca – ou quando há hipertensão
pulmonar com disfunção de VD), o cateter de artéria pulmonar (Swan-Ganz) é
seguro e pode ser utilizado, desde que seus valores sejam interpretados por
médicos experientes.
TABELA 3 Acurácia dos sinais clínicos para estimar índice cardíaco < 2,2 L/min/cm2. Nota-se que
os valores preditivos são baixos, de forma que testes positivos ou negativos não podem,
respectivamente, confirmar ou excluir baixo débito cardíaco

Sinal clínico Sensibilidade Especificidade VPP (%) VPN (%)


(%) (%)

Débito urinário < 0,5 mL/kg/h nas 40 65 39 66


primeiras 6 horas

Tempo de enchimento capilar 25 85 48 67


prolongado (dedo indicador)

Rebaixamento do nível de 11 82 26 62
consciência (reagindo a estímulos
verbais)

Frequência respiratória > 22 irpm 77 34 39 73

Frequência cardíaca < 100 bpm 82 32 40 7

Pressão arterial sistólica < 90 mmHg 6 92 32

Fonte: adaptada de Hiemstra et al, 2019. VPN: valor preditivo negativo; VPP: valor preditivo positivo.

Na ausência de monitorização invasiva por cateter de artéria pulmonar, a


pressão venosa central (PVC) pode ser de grande utilidade, em especial nos
casos de disfunção ventricular direita, principalmente quando atrelados à
medida de débito cardíaco (por ecocardiografia ou monitores de termodiluição
transpulmonar). O conceito de que a PVC é resultado da interação entre a
função cardíaca global e a função de retorno venoso pode trazer informações
sobre os mecanismos das alterações hemodinâmicas e resposta às
intervenções. Muitas vezes a queda da PVC é alvo e consequência do
tratamento adequado de choque cardiogênico. Entretanto, se essa queda é
acompanhada por redução do débito cardíaco, provavelmente as medidas de
redução de hipervolemia tornaram-se exageradas e possivelmente deletérias.
Lactato, SvO2 e o gradiente venoarterial de pCO2 devem ser rotineiramente
dosados para auxiliar na monitorização hemodinâmica dos pacientes em
choque cardiogênico. Assim como acontece com o exame clínico, esses testes
laboratoriais podem identificar insuficiência circulatória, mas não são capazes
de revelar a etiologia do choque. Ademais, além de interpretá-los à luz dos
outros parâmetros de perfusão tecidual, devemos fazê-lo de maneira
sequencial – ou seja, estabelecendo nossa meta terapêutica na melhora dos
resultados ao longo do tempo, nunca objetivando atingir aqueles valores
habitualmente considerados como “normais”.
O conceito de DO2 é de central importância no manejo hemodinâmico do
choque cardiogênico. Como citado anteriormente, a hipoperfusão tecidual é
caracterizada pelo desbalanço entre DO2 e VO2, e o débito cardíaco é apenas
um componente da oferta de oxigênio aos tecidos. Alterações na SatO2 arterial
e nos níveis de hemoglobina podem contribuir para esse desbalanço, assim
como o aumento do consumo de oxigênio, nos casos de hipertermia, agitação,
dor e desconforto respiratório.

Em resumo, nenhum parâmetro macro ou micro-hemodinâmico deve ser


interpretado de forma isolada. Em vez de protocolos guiados por metas, devemos
utilizar uma avaliação multimodal do choque, para uma abordagem individualizada
no tratamento desses pacientes.

TRATAMENTO

Medidas gerais

A reversão do fator desencadeante é a primeira e mais importante medida a ser


adotada no tratamento do choque cardiogênico, como já citado na introdução deste
capítulo. Especialmente nos casos de miocardiopatia crônica descompensada,
devemos procurar ativamente por fatores possivelmente associados à
descompensação, como desidratação (diarreia, vômitos), má-adesão ao tratamento
medicamentoso ou à restrição hidrossalina, infecções etc.
Na coronariopatia aguda não é diferente: devemos “tratar” as coronárias o mais
rápido possível. O estudo SHOCK foi o primeiro grande ensaio clínico sobre o tema
e demonstrou redução de mortalidade nos casos de choque cardiogênico pós-IAM
submetidos precocemente (nas primeiras 12 horas) à coronariografia e à
revascularização miocárdica; além disso, análises subsequentes evidenciaram que
tal benefício se mantém ao longo dos primeiros 6 anos. É interessante salientar que
nesse estudo o desfecho de mortalidade foi semelhante entre os grupos nos
primeiros 30 dias, mostrando que a otimização hemodinâmica deve ser o primeiro
passo no atendimento dos pacientes com choque cardiogênico secundário ao
infarto.
O estudo CULPRIT-SHOCK, por sua vez, comparou duas estratégias diferentes
de revascularização: apenas da lesão culpada ou de todas as lesões graves (redução
luminal > 70%). Houve redução de desfecho combinado (morte ou terapia de
substituição renal) nos primeiros 30 dias quando se tratou inicialmente apenas a
artéria culpada, benefício provavelmente associado ao menor tempo de
procedimento e à menor exposição ao contraste iodado. Para se ter ideia da
importância da revascularização precoce, até a presente data esta foi a única medida
que isoladamente conseguiu demonstrar redução de mortalidade no choque
cardiogênico. Quanto à terapia trombolítica, esta é menos eficaz em um contexto de
instabilidade hemodinâmica, mas ainda assim indicada nos casos de IAMCSST
quando não há hemodinâmica disponível.
Ainda sobre choque cardiogênico pós-IAM, terapia antitrombótica com ácido
acetilsalicílico (AAS) e heparina é rotineiramente recomendada – o uso do segundo
antiagregante deve ser retardado até que a coronariografia de urgência seja
realizada, pois, a depender dos achados, a cirurgia de revascularização miocárdica
pode ser realizada em caráter de urgência. Em todos os pacientes submetidos à
angioplastia, porém, a dose de ataque do segundo antiagregante (clopidogrel,
prasugrel ou ticagrelor) deve ser fornecida. Inotrópicos negativos e vasodilatadores
orais devem ser suspensos, e, de uma maneira geral, orienta-se a reintrodução do
betabloqueador somente 24 horas após o desmame completo do inotrópico.
Além de tratar o fator desencadeador, devemos lembrar que o choque tem como
base fisiopatológica o desbalanço entre oferta e consumo de oxigênio, sendo três os
fatores que influenciam no DO2: débito cardíaco, concentração de hemoglobina e
saturação arterial de oxigênio. Dessa maneira, além do manejo hemodinâmico que
será discutido adiante, a otimização do DO2 inclui correção da hipoxemia (i. e.,
manter saturação de O2 > 90%, lembrando que a hiperóxia também deve ser
evitada) e da anemia.
Há poucos dados em literatura que auxiliem na decisão quanto à transfusão
sanguínea no choque cardiogênico. Mesmo na síndrome coronariana aguda, até o
momento apenas dois ensaios clínicos piloto procuraram esclarecer essa questão,
com resultados conflitantes. Uma subanálise do estudo TRACS (Transfusion
Requirements After Cardiac Surgery) mostrou que pacientes com mais de 60 anos
submetidos à cirurgia cardíaca e à estratégia liberal de transfusão evoluíram menos
frequentemente com choque cardiogênico. Por outro lado, há estudos retrospectivos
que mostram associação entre transfusão e aumento da mortalidade, especialmente
em pacientes com Hb > 8 g/dL. Por conta da ausência de evidências sólidas, parece
razoável transfundir concentrado de hemácias para os pacientes em choque
cardiogênico com Hb < 8,0 g/dL (especialmente nos casos de anemia aguda) e
evitar transfusão quando Hb > 10 g/dL. Níveis de Hb entre 8 e 10 g/dL representam
uma “área cinzenta” na qual a estratégia transfusional vai depender da
individualização dos casos e deve basear-se exclusivamente em critérios clínicos.
Por último, vale lembrar que a indução de hipotermia está proscrita, ou seja, não
deve ser realizada no choque cardiogênico (a não ser que o paciente possua outra
indicação, como neuroproteção após retorno da circulação espontânea). O estudo
SHOCK-COOL demonstrou que não há benefício hemodinâmico na hipotermia,
refutando antigas hipóteses baseadas em dados experimentais.

Manejo volêmico

Ao contrário do choque séptico, em que a expansão volêmica com cristaloides


ainda é recomendada rotineiramente nas primeiras horas de tratamento pelo último
guideline da Surviving Sepsis Campaign (SSC), a maioria dos pacientes com
choque cardiogênico não se beneficia de tal conduta. Isso porque, via de regra, eles
já se encontram hipervolêmicos, com altas pressões de enchimento ventricular e
congestão pulmonar. Deve-se considerar administração de cristaloides apenas
quando as três condições abaixo são encontradas:
1. Sinais clínicos de hipoperfusão orgânica.
2. Ausência de congestão pulmonar (p. ex., ausência de linhas B e derrame
pleural na ultrassonografia de tórax).
3. Sinais clínicos e história compatíveis com hipovolemia verdadeira (p. ex.,
diarreia, vômitos, idosos com dificuldade de acesso à água etc.).

Nesses casos, podemos tentar uma prova volêmica com 250 mL de cristaloide,
idealmente checando se há aumento do débito cardíaco após infusão (com
ecocardiograma ou monitorização invasiva de débito cardíaco). Se não houver
melhora clínica ou o paciente apresentar sinais de congestão pulmonar após essa
prova inicial, devemos parar imediatamente.
Na maioria dos casos, porém, há sinais clínicos ou de imagem sugestivos de
hipervolemia e congestão pulmonar. Esses pacientes se beneficiam de terapia com
diuréticos e balanço hídrico negativo, mesmo na vigência de instabilidade
hemodinâmica. Caso o paciente não responda adequadamente à furosemida,
devemos associar diuréticos de outras classes, como hidroclorotiazida e
espironolactona, pois eles possuem ações sinérgicas por bloquearem canais de sódio
em diferentes porções do néfron.

Manejo hemodinâmico

O manejo hemodinâmico dos pacientes em choque cardiogênico baseia-se na


titulação de fármacos vasodilatadores, inotrópicos e vasopressores. Apesar do uso
frequente das catecolaminas, que são administradas em aproximadamente 90% dos
casos, as evidências sobre o tema são bastante limitadas, com poucos ensaios
clínicos randomizados comparando as diversas classes entre si.
O controle de FC no choque cardiogênico é muito pouco estudado na literatura.
Seu racional teórico se baseia em diminuição do consumo de oxigênio miocárdico e
no aumento do tempo diastólico, melhorando a perfusão coronariana, e deve ser
considerado em caso de taquiarritmias extremas, preferencialmente com agentes
que não possuem ação inotrópica negativa, como amiodarona e digitálicos. Nos
casos de taquicardia sinusal, estudos experimentais mostram que a ivabradina
possui um perfil de segurança razoável, controlando a frequência cardíaca sem
resultar em queda do débito cardíaco, podendo ser considerada em casos
selecionados, inclusive em pacientes em uso de inotrópico.
Em 10 a 15% dos casos, porém, não há resposta adequada ao tratamento
medicamentoso, e os pacientes evoluem com choque refratário e piora progressiva
das disfunções orgânicas (INTERMACS 1 e 2 – ver Tabela 4), devendo-se avaliar
rapidamente a indicação de dispositivos de assistência circulatória percutânea,
conforme será detalhado adiante.

TABELA 4 Classificação INTERMACS (Interagency Registry for Mechanically Assisted Circulatory


Support). “Tempo para intervenção” refere-se ao tempo para instalação de um dispositivo de
assistência ventricular

INTERMACS Quadro clínico Hemodinâmica Tempo para


intervenção

7 NYHA III Sem instabilidade Sem indicação

6 Limitação aos Limitação moderada a atividades. Urgência varíavel


esforços Sem sinais de congestão

5 Intolerante aos Limitação severa a atividades. Urgência variável


pequenos Confortável em repouso com sinais de
esforços congestão
TABELA 4 Classificação INTERMACS (Interagency Registry for Mechanically Assisted Circulatory
Support). “Tempo para intervenção” refere-se ao tempo para instalação de um dispositivo de
assistência ventricular

4 Sintomas ao Desmame de inotrópicos possível. Há Eletivo (semanas


repouso retenção hídrica a meses)

3 Estável com Estabilidade com inotrópicos, porém Eletivo (dias a


inotrópicos com falência de desmame semanas)

2 Declínio Deterioração da nutrição, função renal Dias


progressivo e hepática, piora da retenção hídrica a
apesar de despeito de inotrópicos
inotrópicos

1 Choque Hipotensão persistente apesar de Horas


cardiogênico inotrópicos e BIA. Disfunção orgânica
grave

BIA: balão intra-aórtico.

Vasopressores
Os vasopressores devem ser titulados com o objetivo inicial de manter a pressão
arterial média (PAM) > 65 mmHg – valor extrapolado do estudo SEPSISPAM, que
randomizou 776 pacientes em choque séptico e comparou duas metas pressóricas
(65-70 vs. 80-85 mmHg), sem diferença no desfecho primário (mortalidade em 28
dias) entre os grupos. Do ponto de vista fisiopatológico, porém, sabemos que o
choque cardiogênico diverge substancialmente do choque séptico, de forma que
essa meta pressórica inicial deve ser posteriormente individualizada.
O conceito de “Cardiac Power Output”, produto do débito cardíaco e da
pressão arterial média, pode ser utilizado de forma sequencial e é a variável
hemodinâmica que mais se correlaciona com mortalidade no choque cardiogênico
(Figura 3). Como discutido anteriormente neste capítulo, o acoplamento ventrículo-
arterial deve ser considerado no manejo de vasopressores. Sendo assim, metas de
PAM mais baixas podem ser toleradas contanto que não haja sinais de hipoperfusão
tecidual. Como os vasopressores aumentam o consumo de oxigênio pelo miocárdio
e a vasoconstrição periférica, podem comprometer ainda mais a microcirculação e o
débito cardíaco, logo seu uso deve ser restrito à menor dose pelo menor tempo
possível.
Em outras palavras, o tratamento com vasopressores prioriza a pressão em vez
do fluxo, essencialmente tratando uma consequência da disfunção cardíaca
(hipotensão) sem considerar a sequência de eventos fisiopatológicos envolvidos.
Dessa forma, os vasopressores podem ser utilizados em uma situação de
emergência, sempre associados a um inotrópico, devendo-se logo em seguida
iniciar tentativa de desmame baseada em uma estratégia individualizada, com
checagens constantes de débito cardíaco e perfusão orgânica. É muito comum que
os pacientes melhorem com doses mais baixas de vasopressor, mesmo com PAM <
65 mmHg, justamente pela redução da pós-carga e consequente aumento do débito
cardíaco e do DO2.
Noradrenalina é o vasopressor de escolha no choque cardiogênico. O estudo
SOAP II, publicado em 2010, randomizou 1.679 pacientes e comparou
noradrenalina à dopamina no choque (independentemente da etiologia). Além de
mais arritmia com o uso da dopamina, no subgrupo de pacientes com diagnóstico de
choque cardiogênico (n = 280), dopamina foi também associada à maior
mortalidade em 28 dias. Noradrenalina foi também comparada à adrenalina no
choque cardiogênico em um ensaio clínico piloto publicado em 2018. O estudo em
questão foi encerrado precocemente, pois a adrenalina levou à maior incidência de
choque refratário e a uma tendência à maior mortalidade quando comparada à
noradrenalina. Dopamina e epinefrina, portanto, não devem ser utilizadas como
vasopressores no choque cardiogênico.
Vasopressina entra como vasopressor de segunda escolha e é igualmente eficaz
na elevação da pressão arterial, podendo ser associada à noradrenalina nos casos de
choque refratário (INTERMACS 1). Seu uso se torna interessante principalmente
nos casos em que o paciente se encontra muito taquicárdico, por não ter ação direta
em receptores adrenérgicos. Como a vasopressina tem menor ação no aumento da
resistência vascular pulmonar, pode ser o vasopressor de eleição nos casos de
hipertensão pulmonar e disfunção de VD.
Figura 3 Conceito de Cardiac power output (CPO): trabalho sistólico (TS) × frequência cardíaca
(FC). O TS é definido pelo produto entre volume sistólico e pressão arterial (PA). Com a mesma PA,
o CPO é menor quando o coração tem menor força inotrópica e gera um menor volume sistólico. DC:
débito cardíaco; EDPVR: end diastolic pressure volume relationship; PAM: pressão arterial média;
VE: ventrículo esquerdo.

Inotrópicos
Os agentes inotrópicos têm um papel central no tratamento do choque
cardiogênico. Infelizmente eles aumentam o consumo miocárdico de ATP, fazendo
com que a melhora hemodinâmica inicial se dê às custas do aumento da demanda
de oxigênio, quando a bomba cardíaca já está em falência e a oferta de O2 é
limitada. É por esse motivo que os inotrópicos devem ser titulados por meio de
mensurações constantes de débito cardíaco e perfusão orgânica. É importante
salientar, porém, que valores suprafisiológicos de débito cardíaco não se associam a
melhores desfechos e devem ser evitados. Devemos, assim, estabelecer como meta
terapêutica uma avaliação temporal e multimodal dos diversos marcadores de
perfusão tecidual, como tempo de enchimento capilar, nível de consciência, débito
urinário, avaliações seriadas de função renal e hepática, lactato, SvO2, gap V-A de
pCO2 etc. (para mais detalhes, ver capítulos específicos). Sugere-se iniciar o
desmame dos inotrópicos assim que houver melhora clínica do paciente.
A dobutamina é o inotrópico de escolha e deve ser iniciada simultaneamente à
noradrenalina ou isoladamente para aumentar a contratilidade miocárdica. Trata-se
de uma catecolamina sintética com forte afinidade pelos receptores B1 e B2 em uma
relação 3:1 (ou seja, atua mais como inotrópico do que como vasodilatador
periférico). A ação vasodilatadora da dobutamina, na verdade, ocorre
particularmente em doses baixas (< 5 mcg/kg/min) – doses altas, acima de 15
mcg/kg/min, aumentam a contratilidade miocárdica sem afetar a resistência
vascular periférica. Além disso, apesar de inicialmente reduzir o tônus vascular, a
PAM costuma elevar-se com o uso da dobutamina, pois o aumento do débito
cardíaco sobrepõe-se à redução da resistência vascular sistêmica. Em doses
equivalentes à do nitroprussiato de sódio e à do milrinone, a dobutamina aumenta a
contratilidade miocárdica sem causar hipotensão, sendo, dessa forma, seguro tentar
iniciá-la mesmo antes ou até na ausência da noradrenalina. A dobutamina,
entretanto, possui algumas limitações, como desenvolvimento de tolerância ao
longo dos dias (por down-regulation dos receptores B1) e efeito limitado nos
pacientes em uso crônico de betabloqueadores.
Milrinone é um inibidor de fosfodiesterase tipo 3 que, além de inotrópico, tem
potente efeito vasodilatador. Por esse motivo seu uso é bastante limitado no choque
cardiogênico, uma vez que os pacientes geralmente apresentam-se hipotensos e
necessitam de suporte com vasopressor. Entretanto, estudo recente randomizando
192 pacientes comparando uso de dobutamina e milrinone em choque cardiogênico
(estudo DOREMI) não demonstrou diferença nos desfechos clínicos, inclusive no
subgrupo de pacientes em uso de vasopressor.
O levosimendan é um sensibilizador dos canais de cálcio e traz uma série de
vantagens teóricas à dobutamina e ao milrinone: 1) menor efeito pró-arrítmico; 2)
não aumenta demanda energética do miocárdio; 3) não induz tolerância. Sua
atividade se deve a um metabólito ativo com meia-vida de 81 horas, fazendo com
que, após infusão do levosimendan por 24 horas, seus efeitos durem por 7 a 9 dias.
Apesar dos benefícios teóricos, o levosimendan possui custo bastante elevado e
carece de evidências científicas que justifiquem o seu uso rotineiro. O estudo
SURVIVE (o maior já realizado) randomizou 1.327 pacientes com insuficiência
cardíaca descompensada e necessidade de inotrópicos, comparando o levosimendan
à dobutamina, não encontrando diferença de mortalidade em 180 dias. Além disso,
o levosimendan associou-se à maior incidência de fibrilação atrial, hipocalemia e
cefaleia. O estudo CHEETAH, por sua vez, comparou levosimendan a placebo no
perioperatório de cirurgia cardíaca com necessidade de suporte hemodinâmico
(FEVE < 25%, uso de inotrópicos ou balão intra-aórtico), sendo interrompido
precocemente por futilidade (sem diferença no desfecho primário – mortalidade em
30 dias – ou nos desfechos secundários – tempo de ventilação mecânica, tempo de
internação em UTI ou tempo de internação hospitalar).
A Tabela 5 traz informações sumárias quanto ao mecanismo de ação, indicações
e complicações dos três principais inotrópicos.

Vasodilatadores
O tratamento do choque cardiogênico envolve um tênue balanço que visa atingir
a melhor perfusão tecidual possível ao menor custo energético para o miocárdio.
Como vimos anteriormente, inotrópicos e vasopressores são frequentemente
necessários para garantir a perfusão orgânica do paciente. Isso se dá, todavia, às
custas de maior gasto energético e dano adicional ao miocárdio.
É por esse motivo que os vasodilatadores devem ser iniciados assim que
possível. Eles trazem um duplo benefício: reduzem o tônus venoso (reduzindo,
assim, a pré-carga e as pressões de enchimento ventricular) e o tônus arterial
(reduzindo pós-carga e aumentando débito sistólico às custas de um menor gasto
energético para o miocárdio).
®
O nitroprussiato de sódio (Niprid ) é um vasodilatador arterial e venoso,
®
enquanto a nitroglicerina (Tridil ) é um vasodilatador predominantemente do
território venoso. É por esse motivo que devemos dar prioridade ao nitroprussiato
de sódio nos casos de choque cardiogênico. A redução da pós-carga leva ao
aumento do volume sistólico e é particularmente importante nos casos de
complicação mecânica do IAM (insuficiência mitral aguda ou rotura do septo
interventricular).
Orienta-se iniciar os vasodilatadores assim que se complete o desmame da
noradrenalina e caso o paciente mantenha espontaneamente uma PAS > 90 mmHg.
De uma maneira geral, a partir da individualização do tratamento (e baseando-se em
parâmetros clínicos e laboratoriais de perfusão orgânica), toleramos uma PAM < 65
mmHg. Isso acontece porque o aumento do débito cardíaco e o menor gasto
energético geram um aumento do DO2 e uma redução do VO2, respectivamente, o
que leva à melhor perfusão orgânica mesmo com níveis pressóricos mais baixos.

Dispositivos de assistência ventricular percutâneos (DAVp)

Os pacientes em choque cardiogênico refratários a estabilização clínica, que


evoluem com choque progressivo, sinais de hipoperfusão tecidual e disfunções
orgânicas, a despeito do uso de inotrópicos e vasopressores, deverão ser avaliados
por um “Shock Team” para o implante de um dispositivo de assistência ventricular
percutâneo. O papel do “Shock Team” na indicação de dispositivos deve se pautar
no timing da indicação (precedendo a DMOS instalada), escolha do melhor
dispositivo, estratégias de canulação e elegibilidade, levando em consideração a
apropriabilidade da indicação (pacientes com razoável expectativa de vida, chance
de reversão do quadro e elegíveis a transplante cardíaco caso não haja recuperação
da função ventricular).

TABELA 5 Um resumo sobre os três principais inotrópicos disponíveis no mercado. A quantidade


de setas representa a magnitude do efeito hemodinâmico

Inotrópico Mecanismo de Dose Efeitos Complicações Comentários


ação hemodinâmicos

Dobutamina Catecolamina 2,5-20 ↑ DC Taquicardia Inotrópico de


sintética com mcg/kg/min ↓ RVS Taquiarritmias primeira
ação em ↓ POAP Tolerância escolha no
receptores B1 Miocardite por choque
(principal), B2 hipersensibilidade cardiogênico.
e alfa- Por aumentar
adrenérgicos consumo de
oxigênio pelo
miocárdio, seu
uso deve ser
limitado à
menor dose
pelo menor
tempo possível
TABELA 5 Um resumo sobre os três principais inotrópicos disponíveis no mercado. A quantidade
de setas representa a magnitude do efeito hemodinâmico

Milrinone Inibidor de 0,25-0,75 ↑↑ DC Taquicardia Uso limitado no


fosfodiesterase mcg/kg/min ↓↓ RVS Taquiarritmias choque
tipo III ↓↓ POAP Hipotensão cardiogênico
devido à
hipotensão.
Deve ser o
inotrópico de
escolha nos
pacientes
intoxicados por
betabloqueador
e na
hipertensão
pulmonar com
disfunção de
VD

Levosimendan Aumenta 0,05-0,6 ↑ DC Taquiarritmias Seu uso é


sensibilidade mcg/kg/min ↓↓ RVS Hipotensão limitado aos
dos por 24 ↓↓ POAP Hipocalemia pacientes
miofilamentos horas Cefaleia dependentes
ao cálcio de inotrópico
(INTERMACS
3) em proposta
de cuidados
paliativos
exclusivos (sua
longa meia-
vida
proporciona
aos pacientes
a possibilidade
de alta
hospitalar)

DC: débito cardíaco; POAP: pressão de oclusão da artéria pulmonar; RVS: resistência vascular
sistêmica; VD: ventrículo direito.

A preferência por DAVp no paciente INTERMACS 1 se dá pelo fato de serem


de menor custo, fácil acesso e inserção rápida, podendo ser realizados à beira do
leito, na sala de hemodinâmica ou em centro cirúrgico.
Conforme discutido anteriormente neste capítulo, pacientes que se encontram
em INTERMACS 1 podem ser elegíveis a implante de DAV percutâneo de curta
permanência, servindo como um suporte hemodinâmico temporário como ponte:
1. Ponte para recuperação: frequentemente a causa do choque cardiogênico é
temporária ou tratável, com possibilidade de desmame da assistência
ventricular após recuperação da função cardíaca após o insulto agudo (p. ex.,
IAM, Takotsubo, miocardite, miocardiopatia da sepse).
2. Ponte para decisão: considerando a alta morbimortalidade de pacientes em
choque cardiogênico, diferentes cenários podem ocorrer – disfunção
neurológica permanente, disfunção de múltiplos órgãos –, não sendo possível
definir, no momento da implantação do dispositivo, a estratégia final de
tratamento, sendo ela mais bem decidida após a estabilidade clínica.
3. Ponte para transplante: pacientes que melhoram das disfunções orgânicas, mas
não recuperam a função ventricular e não conseguem ser desmamados do
suporte, devem ser listados para transplante cardíaco se elegíveis. O DAVp
poderá permanecer até o momento do transplante ou poderá ser transicionado
para um dispositivo de inserção central (cirúrgica) ou um dispositivo de longa
permanência (LVAD – left ventricular assist device), funcionando assim como
“ponte para ponte”.

Os potenciais benefícios de dispositivos mecânicos incluem:


Manter perfusão para órgãos vitais, prevenindo a disfunção de múltiplos
órgãos.
Reduzir as pressões cardíacas intracavitárias, diminuindo a congestão
pulmonar (com exceção da ECMO – discutido adiante).
Reduzir o volume e o estresse do ventrículo esquerdo e o consumo de
oxigênio do miocárdio, favorecendo a recuperação da função ventricular.
Aumento da perfusão coronariana.

Os tipos de DAVp disponíveis no mercado são descritos a seguir.

Balão intra-aórtico (BIA)


Sua passagem é realizada por meio de punção arterial femoral, sendo locada sua
extremidade de 1 a 2 cm abaixo da emergência da artéria subclávia esquerda
(Figura 4). Seus efeitos hemodinâmicos principais são:
Aumento da perfusão coronariana: durante a diástole ventricular, ocorre a
insuflação do balão intra-aórtico, levando ao aumento da pressão diastólica
aórtica em até 30 mmHg e melhorando a perfusão coronariana.
Diminuição da pós-carga ventricular esquerda: durante a sístole ventricular,
ocorre a desinsuflação do balão intra-aórtico, criando um “efeito de sucção”,
por diminuir a pressão sistólica aórtica em até 20%, diminuindo a pós-carga,
com aumento do volume sistólico ejetado pelo ventrículo e reduzindo o
consumo miocárdico de oxigênio.

O aumento do DC gerado pelo BIA é em geral modesto, girando em torno de


0,5 L/min. Os efeitos hemodinâmicos do BIA, para serem ótimos, dependem de
diversos fatores, como posição do balão na aorta, diâmetro do balão em relação ao
diâmetro da aorta, tempo de inflação e deflação do balão, e frequência cardíaca,
pressão arterial e resistência vascular periférica do paciente.
Amplamente utilizado no choque cardiogênico secundário a infarto pelo seu
racional fisiológico, seu uso diminuiu substancialmente após o estudo IABP-Shock
Trial 2. Esse ensaio clínico randomizou 600 pacientes com choque cardiogênico
secundário a IAM para uso do BIA vs. tratamento clínico convencional, e não
mostrou diferença de mortalidade entre os grupos ou diferenças em outros
desfechos secundários (dose de drogas vasoativas, lactato sérico, função renal ou
tempo de internação), sendo seu uso de rotina rebaixado à recomendação IIIA pelos
guidelines.
Figura 4 Balão intra-aórtico.

Apesar de estudos neutros, o BIA mantém seu papel no choque cardiogênico


refratário, em paciente que mantém piora clínica apesar de suporte inotrópico,
principalmente em centros que não dispõem de outros dispositivos de assistência
ventricular. Além de amplamente acessível, baixo custo comparado a outras
modalidades de assistência e única punção vascular, é o dispositivo que grande
parte dos profissionais de saúde de centros cardiológicos sabe implantar e manejar.
Por sua capacidade de reduzir pós-carga de ventrículo esquerdo, guidelines
internacionais mantêm o BIA como escolha para pacientes selecionados,
principalmente para complicações mecânicas de IAM, como insuficiência mitral
grave, aumentando o volume sistólico e reduzindo a fração de regurgitação mitral.
Também tem indicação em casos de defeito de septo interventricular, na
estabilização do paciente até a correção cirúrgica.
Ainda são amplamente utilizados em pacientes em fila de transplante cardíaco
que se encontram em INTERMACS 2, cenário em que o ganho de débito cardíaco
modesto pode ser suficiente para estabilização clínica do paciente.
A principal contraindicação do BIA é a insuficiência aórtica maior do que
discreta. O aumento do grau de regurgitação aórtica na diástole pela insuflação do
balão pode levar ao aumento do estresse na parede do VE, piora da congestão
pulmonar, e eleva o risco de pseudoaneurisma de VE e ruptura em um cenário
clínico de pós-IAM. A presença de aneurisma ou dissecção de aorta também são
contraindicações absolutas, pelo risco de estender a dissecção ou ocasionar a rotura
do aneurisma.
A maior parte das complicações do BIA são vasculares, como isquemia do
membro e trauma vascular, com sangramento de retroperitôneo. Deve-se examinar
o membro com balão rotineiramente para avaliação de pulsos e sinais de má
perfusão, e se presentes, realizar a retirada do BIA o quanto antes.

TandemHeart®
É um dispositivo de inserção percutânea que bombeia sangue do átrio esquerdo
através de uma cânula implantada por via transeptal, para o sistema arterial
ileofemoral através de uma cânula arterial (Figura 5). Sendo assim, o dispositivo
deve ser implantado em sala de hemodinâmica.
Durante o suporte mecânico, tanto o VE como a bomba contribuem com o
débito cardíaco simultaneamente, trabalhando em paralelo. A retirada do sangue do
átrio esquerdo reduz a pré-carga do VE, trabalho do VE, pressões de enchimento e
consumo de oxigênio pelo miocárdio. O débito cardíaco ofertado pelo dispositivo
será dependente do calibre das cânulas. Uma cânula 19F permite fluxos de até 5
L/min, já cânulas de 15F vão ofertar fluxos no máximo de 3,5 L/min. A esses
valores é adicionado o débito cardíaco dado pelo próprio VE, embora esse esteja
reduzido por conta das mudanças de carga – redução de pré-carga e aumento da
pós-carga.
®
As vantagens do TandemHeart são melhores parâmetros hemodinâmicos
®
quando comparado com o BIA e o Impella 2,5, embora nos ensaios clínicos
randomizados não tenham mostrado benefício de sobrevida em 30 dias. Também
pode ser utilizado em pacientes com trombo intraventricular. Estenose aórtica não é
uma contraindicação à sua inserção.
Figura 5 TandemHeart®.

Como se trata de um suporte somente ao VE, é necessário ter boa função de VD


para seu funcionamento. Doença arterial periférica pode dificultar a inserção da
cânula arterial, ou induzir a isquemia periférica. Presença de trombo em AD ou AE
é contraindicação à canulação transeptal. É necessária a anticoagulação sistêmica
com heparina para evitar trombose de bomba e circuito. A necessidade de
cardiologista intervencionista com experiência na punção transeptal é uma barreira
importante ao uso amplo desse dispositivo. Deve-se estar atento a complicações
exclusivas da punção transeptal, como o tamponamento cardíaco, e ao
deslocamento da cânula de AE para AD, resultando em shunt direito-esquerdo
maciço e hipoxemia grave.

Impella®
O Impella® é um dispositivo de fluxo axial não pulsátil desenhado para propelir
sangue do ventrículo esquerdo para a aorta ascendente (Figura 6). É desenvolvido
para ser inserido via artéria femoral e posicionado no nível da valva aórtica. Está
disponível em três versões:
Impella® 2,5: débito de 2,5 L/min, necessário um cateter de 12F.
®
Impella CP: débito de 3 a 4 L/min, necessário um cateter de 14F.
Impella® 5,0: débito de 5 L/min, necessário um cateter de 21F (inserido por
acesso cirúrgico à artéria femoral).
®
Bombeando o sangue diretamente do VE, o Impella reduz as pressões de
enchimento do VE, reduz o consumo de oxigênio pelo miocárdio e aumenta a
®
pressão arterial sistêmica. O Impella 2,5 é capaz de ofertar um maior suporte
hemodinâmico que o BIA, porém menor que o TandemHeart® ou a ECMO. Em
®
termos de suporte circulatório, o Impella CP e o 5,0 são semelhantes ao
TandemHeart®. Assim como o TandemHeart®, esses dispositivos somente oferecem
suporte ao VE; portanto, em casos de disfunção biventricular ou instabilidade
elétrica, ele não deve ser utilizado. Já existe no mercado a versão de suporte direito
®
(Impella RP ), sendo utilizado principalmente no IAM de VD ou em associação
com o Impella CP® para suporte biventricular. Os principais pontos negativos são a
durabilidade de cerca de 7 dias, em razão da vida útil da bomba rotor, altas taxas de
hemólise e custo ainda bastante elevado.
Figura 6 Impella®.

®
Similarmente ao TandemHeart , como não há suporte ao VD, em situações de
disfunção biventricular ou arritmias ventriculares instáveis irá ocorrer rápida
deterioração do quadro hemodinâmico do paciente. É contraindicado em pacientes
com valva aórtica mecânica ou trombo em VE. Estenose aórtica é uma
contraindicação relativa, com alguns relatos de uso na literatura. É necessária a
anticoagulação sistêmica com heparina. Em teoria, em paciente com defeito de
septo interventricular pode piorar o shunt direito-esquerdo, levando a hipoxemia
grave. As principais complicações são as vasculares, como isquemia de membro,
pseudoaneurisma e fístula arteriovenosa, comuns a todos os procedimentos
transfemorais. A hemólise intravascular é comum, reportada em 5 a 10% dos casos
nas primeiras 24 horas, e pode responder ao reposicionamento do dispositivo. Em
situações de hemólise grave e IRA, está indicada a retirada do dispositivo.
A grande vantagem desse dispositivo perante a ECMO é a sua capacidade de
reduzir significativamente as pressões do VE, diminuindo o consumo de oxigênio
miocárdico. Essa característica, associada à facilidade de inserção percutânea, fez
seu uso ser bastante difundido nos EUA nos cenários de choque cardiogênico pós-
infarto. Tem sido também bastante utilizado em associação com a ECMO VA, para
drenagem e descompressão do VE.
®
Dois grandes estudos retrospectivos em 2020 compararam o uso do Impella
com BIA no choque cardiogênico pós-infarto e mostraram uma associação do uso
do dispositivo com maior mortalidade, mesmo pareados por gravidade. As
principais complicações associadas ao desfecho são AVC e IRA. Após esses
estudos, o uso do dispositivo deve ser investigado em ensaios clínicos
randomizados antes da recomendação para seu uso de rotina.

ECMO – oxigenação por membrana extracorpórea


A ECMO realiza o suporte extracorpóreo em pacientes em que a função
cardiopulmonar não supre as necessidades fisiológicas. Pode ser venovenosa (V-V)
para somente suporte pulmonar, ou venoarterial (V-A), para oxigenação e suporte
circulatório (Figura 7). Em casos de falência biventricular, instabilidade elétrica ou
hipoxemia grave concomitante, a ECMO V-A é o dispositivo de escolha. Pode ser
canulada à beira do leito, sem necessidade de fluoroscopia, por via periférica, ou
pode-se canular via toracotomia em centro cirúrgico.
Apresenta princípios semelhantes à circulação extracorpórea utilizada em
cirurgia cardíaca. A ECMO V-A é realizada por um circuito composto por uma
bomba centrífuga, não pulsátil e uma membrana de oxigenação para a troca gasosa.
Uma cânula venosa drena o sangue do AD (inserção tanto pelas jugulares ou
femorais), passa pela membrana para troca gasosa e devolve na aorta descendente
via cânula na artéria femoral. É necessária a anticoagulação plena com heparina.
ECMO V-V mantém a troca gasosa sem nenhum suporte circulatório. A ECMO
V-A é capaz de realizar o suporte de até 6 a 7 L/min, dependendo do calibre das
cânulas. Entretanto, por devolver o sangue retrogradamente na aorta, leva ao
aumento da pós-carga do VE, aumentando o consumo de oxigênio pelo miocárdio
por conta do aumento das pressões de enchimento ventricular. Sendo assim, a
ECMO V-A por si só é incapaz de reduzir o estresse na parede ventricular, podendo
retardar ou impedir a recuperação da função ventricular. Dessa forma, pode se
tornar necessária a associação com outro dispositivo que atue para a descompressão
®
do VE, como o BIA ou Impella . Como o suporte é biventricular mesmo em
estados de total falha de função cardíaca, como arritmias malignas ou PCR, a
ECMO V-A é capaz de manter o fluxo sanguíneo necessário para a oxigenação dos
demais órgãos. Por ser um dispositivo de fácil inserção, capaz de oferecer um
suporte respiratório e hemodinâmico robusto, é o dispositivo mais amplamente
utilizado no choque cardiogênico refratário. Como ponto negativo, é necessária uma
equipe multidisciplinar especialista no suporte em ECMO, a fim de melhorar o
manejo de todas as variáveis do sistema – rotações, fluxo, temperatura, oxigenação,
anticoagulação e cuidado com as cânulas.

Figura 7 ECMO V-A.


Figura 8 Fonte: adaptada de Holger Thiele et al. Management of cardiogenic shock. European
Heart Journal. 2015;36:1223-30. BIA: balão intra-aórtico; IAM: infarto agudo do miocárdio.

Não existem ensaios clínicos randomizados de ECMO V-A no contexto de


choque cardiogênico.
A insuficiência aórtica pode piorar significativamente com o suporte em
ECMO, aumentando ainda mais o estresse na parede ventricular, principalmente
sem uma estratégia de descompressão de ventrículo esquerdo. Em pacientes com
doença vascular periférica, o risco de falha em canulação ou isquemia pode tornar
necessária a canulação central via toracotomia. Complicações de ECMO mais
comuns são relacionadas a sangramento, eventos tromboembólicos e hemólise.
®
Similarmente ao TandemHeart , pode ser necessária a inserção de cânula
anterógrada em artéria femoral superficial para manter a perfusão do membro
canulado.
A Tabela 6 compara os principais dispositivos de assistência circulatória
utilizados em pacientes com choque cardiogênico.

TABELA 6 Dispositivos de assistência ventricular percutâneos


TABELA 6 Dispositivos de assistência ventricular percutâneos

BIA ECMO TandemHeart® Impella® 2.5

Impella® CP
Impella® 5.0

Mecanismo Pneumático Centrífugo Centrífugo Axial

Via de acesso Percutânea Percutânea Percutânea Percutânea


Percutânea
Dissecção

Cânula 7-9F 18-21F inflow 21F inflow 12F


15-17F outflow 15-17F outflow 14F
21F

Inserção Aorta Inflow – átrio Inflow: átrio Inserção


descendente via direito via jugular esquerdo via veia retrógrada no VE
artéria femoral ou femoral femoral e punção via artéria femoral
Outflow – aorta de septo
descendente via interatrial
artéria femoral Outflow: artéria
femoral

Suporte 0,5 L/min > 4,5 L/min 4 L/min 2,5 L/m


hemodinâmico 3,7-4 L/min
5 L/min

BIA: balão intra-aórtico; ECMO: oxigenação por membrana extracorpórea; VE: ventrículo esquerdo.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

O choque cardiogênico é uma síndrome clínica complexa e de alta


mortalidade, sendo, na maioria dos casos, uma consequência direta do IAM.
Precocidade e agressividade na condução desses pacientes são peças
fundamentais para o sucesso terapêutico (Figura 8).
Sempre que possível, os pacientes devem ser encaminhados a um centro de
referência e conduzidos pela equipe de choque local (Shock Team) com o
objetivo de avaliar indicação e instalação precoce dos dispositivos de
assistência ventricular (p. ex., balão intra-aórtico e ECMO VA).
Uma das medidas mais importantes no choque cardiogênico pós-IAM é a
angioplastia precoce da artéria culpada. Os pacientes devem ser encaminhados
à sala de hemodinâmica assim que estabilizados do ponto de vista
hemodinâmico, quando o transporte for seguro.
A monitorização hemodinâmica deve basear-se em diversos parâmetros
clínicos, laboratoriais e de imagem, conceito conhecido como “monitorização
multimodal”. Devemos estabelecer como meta terapêutica a restauração da
perfusão tecidual, nunca objetivando exclusivamente valores “normais” de
débito cardíaco, pressão arterial etc.
O ecocardiograma e a ultrassonografia pulmonar à beira do leito (point-of-
care) têm papel central na condução desses pacientes. São métodos não
invasivos, seguros e acurados que nos dão informações de suma importância,
como: débito cardíaco, função de VD, pressões de enchimento ventricular,
função diastólica de VE, grau de congestão pulmonar, presença de derrame
pleural e pericárdico, dentre outros. Reservamos o cateter de artéria pulmonar
(Swan-Ganz) para os casos em que não há janela disponível para realização
do ecocardiograma, na hipertensão pulmonar com disfunção de VD e no
choque refratário que não responde à terapia hemodinâmica inicial.
O manejo hemodinâmico do choque cardiogênico deve ser individualizado,
minimizando-se o uso dos vasopressores e inotrópicos à menor dose, pelo
menor tempo possível, visando à melhora da perfusão tecidual.
Vasodilatadores intravenosos devem ser iniciados assim que possível.
Pacientes em choque cardiogênico refratário, em piora clínica a despeito de
otimização hemodinâmica, deverão ser avaliados por um Shock Team para
elegibilidade de implante de dispositivo de assistência ventricular mecânica.
Em razão do menor custo, fácil inserção percutânea à beira do leito e suporte
cardiopulmonar robusto e biventricular, a ECMO V-A é o dispositivo mais
utilizado nos casos de choque cardiogênico refratário. Estratégias de
descompressão do VE deverão ser discutidas no início do suporte, para menor
incidência de complicações como edema agudo de pulmão e melhora da
recuperação ventricular.

LEITURA COMPLEMENTAR

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use in the United States among patients undergoing percutaneous coronary intervention with mechanical
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Carson JL, Brooks MM, Abbott JD et al. Liberal versus restrictive transfusion thresholds for patients with
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