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MATERIAL DE APOIO MÓDULO 1

RESUMO: EMERGÊNCIAS HIPERTENSIVAS

Aula ministrada em 2020 por Dr. Octávio Drummond Guina

Epidemiologia

Do ponto de vista epidemiológico a prevalência da Hipertensão Arterial Sistêmica (HAS) na população


adulta gira em torno de 35% no mundo. No Brasil, esse número está na casa dos 33%. Ainda nesses dados,
dentro da população com HAS, apenas 30% são pacientes que possuem um bom tratamento.

Já nos serviços de emergência, dentro dos atendimentos de Urgências observa-se que por volta de 25%
dos casos recebidos tem relação com alterações dos níveis pressóricos, urgências e emergências hipertensivas.
Considerando o número total de atendimentos em uma sala de emergência, esses casos representam 3% dos
atendimentos.

Definição

As diferenças entre urgências e emergências hipertensivas são sutis e definidas em diversos guidelines,
porem não possuem uma definição completamente arbitrária. O que é ofertado de concreto é a definição de que
níveis pressóricos elevados, com pressão diastólica (PAD) maiores que 120mmHg, associados a lesões de
órgãos-alvos são caracterizadas como emergências hipertensivas. Já os mesmos níveis pressóricos com
ausência de lesão de órgãos alvos são caracterizados como urgências hipertensivas.

Fisiopatologia

A fisiopatologia das emergências hipertensivas está extremamente associada a um déficit de


autorregulação. Quando esse déficit se apresenta frente a um aumento dos níveis pressóricos há a evolução
de três fatores: aumento da vasoconstrição, aumento da resistência vascular periférica e aumento da retenção
de volume.

Pode-se destacar o rim e cérebro como órgãos extremamente relacionados à síntese da autorregularão
pressórica corporal. Além disso o sistema renina-angiotensina-aldosterona também é outro ator de destaque
referente à autorregulação pressórica, mantendo-se em mente que a Angiotensina 2 é potente vasoconstritor e
a Aldosterona é um importante agente retentor de líquido.

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Manifestações Clínicas

No que tange as manifestações clínicas é entendido que essas costumam possuir intensa dependência
da causa básica do quadro, portanto não seria possível determinar alguma preponderante. Entretanto, é possível
listar as manifestações mais comumente encontradas.

Se o paciente apresentar acometimento neurológico alguns sintomas normalmente encontrados podem


ser déficit agudo focal, abaixamento do sensório, tontura, cefaleia, sincope e alterações visuais como turvação
e escotomas cintilantes. Já quando o quadro possui relação com a parte cardiovascular podem ser
frequentemente observadas manifestações como dispneia, dor torácica, náuseas e vômitos.

Fatores precipitantes

Existem diversos fatores que podem dar início à uma crise hipertensiva, alguns que merecem destaque
são:

Má adesão terapêutica: É uma causa muito comum e frequentemente observada em salas de


emergência. Geralmente o paciente já diagnosticado com HAS chega à emergência por não estar seguindo o
tratamento adequadamente, por possuir a hipertensão descontrolada, por possuir hipertensão refratária ou
resistente e até mesmo por possuir uma prescrição das medicações errada ou insuficiente.

Estresse: É outra causa também muito comum de ser encontrada na emergência. Os pacientes podem
relatar causas de estresse por diversos motivos, aborrecimentos que levam à uma elevação considerável da
pressão arterial.

Causas cardiovasculares: Essas possuem diversas ramificações, porém podemos ressaltar o destaque
para as isquemias.

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Hormônios tiroidianos: Dentro desta categoria, merece ênfase o hipertireoidismo, que pode se
apresentar como causa para uma síndrome de alto débito.

Uso de drogas e álcool

Gravidez (eclampsia)

Exames Complementares

Podem ser pedidos de acordo com os sintomas do paciente:

Consistem basicamente na tríade de exames laboratoriais, eletrocardiograma e exames de imagem.

Exames Laboratoriais:

A troponina é o principal marcador de injúria e isquemia miocárdica, então deve ser dosada
obrigatoriamente.

Ureia, creatinina, eletrólitos e gasometria também fazem parte da rotina e devem ser dosados.

O BNP (peptídeo natriurético cerebral) é um importante marcador liberado pelos ventrículos


quando há uma sobrecarga pressórica. Ele é encontrado na gênese da dispneia na sala de trauma e tem
alto valor preditivo negativo e por isso é usado para diagnóstico e prognóstico da insuficiência cardíaca.
Os valores encontrados abaixo de 100 quando dosado indicam que a causa não é cardíaca. Já quando
estão elevados e acima de 500, pode-se presumir origem cardíaca. A dificuldade encontrada no uso
desse marcador se dá pela faixa entre os valores de 100 e 500, na qual não há benefício para o
diagnóstico, nesses casos a clínica deve prevalecer para a conclusão do caso. Além disso, outras causas
também podem acarretar o aumento desse marcador como a hipertrofia ventricular esquerda, distúrbios
renais crônicos, valvulopatias e no tromboembolismo pulmonar. O substrato desse marcador é o NT-
proBNP que possui relação com diagnósticos de insuficiência cardíaca com fração de ejeção preservada.

Obs.: Em pacientes obesos, devido a uma maior conversão periférica de adipócitos, o BNP pode aparecer
subestimado.

Catecolaminas são marcadores mais específicos que podem ser dosados por exemplo em crise
de feocromocitoma. (Na sala de emergência não são muito utilizadas pois os resultados demoram a
chegar).

Eletrocardiograma: Nesse exame há destaque para as alterações relacionadas a isquemia (supra ou


infra de ST, onda T isquêmica), taquiarritmias e as alterações hidroeletrolíticas (hipercalcemias e alterações
relacionadas ao cálcio).

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Exames de Imagem: Podem ser usadas de diversas maneiras para concluir o diagnóstico. São
destacados principalmente a radiografia de tórax, que pode prover diversas informações (Cardiomegalia?
Alteração estrutural do parênquima?); a Angiotomagrafia de aorta (Dissecação?), Ecocardiograma à beira do
leito (Avaliação da função dos ventrículos, Alteração valvar); Fundoscopia (Visualização direta se há presença
de papiledema) e tomografia de crânio (AVE isquêmico ou hemorrágico?)

Obs.: No Acidente Vascular Encefálico Isquêmico a imagem pode demorar até 48h para aparecer com clareza.

Emergências Hipertensivas: Principais Causas

Cerebrovasculares: AVE isquêmico ou hemorrágico, incluindo também hemorragia intraparenquimatosa


e subaracnóidea (o diagnóstico é clínico e por imagem de ressonância). Encefalopatia Hipertensiva, possui um
diagnóstico de exclusão.

Cardíacas: Síndrome Coronariana Aguda, sobretudo o infarto agudo do miocárdio (seja ele com ou sem
supra); Dissecção aórtica; Insuficiência Cardíaca Aguda (falência do ventrículo esquerdo); e complicações pós
infarto agudo do miocárdio, sobretudo o paciente que sofreu intervenção frente a um pós operatório de uma
cirurgia de revascularização miocárdica.

Renais: Glomerulonefrites agudas e crises renais (vasculites) possuem o maior destaque. Pode-se citar
também a Anemia Hemolítica Microangiopática e as complicações pós transplante nas quais o paciente pode
passar por rejeição ao órgão transplantado ou se encontrar no processo de regulação em relação a parte renal,
experimentando níveis pressóricos mais elevados.

Circulação excessiva de catecolaminas: É comumente encontrada na crise do feocromocitoma, um


tumor produtor de catecolaminas situado normalmente na glândula adrenal. Pacientes com esse tumor
normalmente apresentam uma tríade clássica: cefaleia, palpitações e sudorese, associadas a aumento dos
níveis pressóricos. O feocromocitoma é uma causa de hipertensão secundaria, essas causas são normalmente
pesquisadas em pacientes que desenvolvem hipertensão antes dos 30 anos ou depois dos 50 e que estejam
utilizando 3 ou mais classes de medicamentos em doses máximas, sendo pelo menos uma delas um diurético.

Também pode ser causada por interação com inibidores da MAO (enzima monoamina oxidase - responsável por
degradar monoaminas como a noradrenalina, tiramina, dopamina e serotonina, aumentando assim a
concentração no corpo e no cérebro dessas substâncias, são utilizados como antidepressivos), podendo ser por
meio de drogas ou até mesmo alimentos.

Outra causa pode ser a utilização de drogas simpático miméticas com destaque para a cocaína, que pode levar
os pacientes a terem aumentos pressóricos de modo agudo.

Efeito Rebote: é a causa mais encontrada da circulação excessiva de catecolaminas, é ocasionada pela
interrupção abrupta do uso de anti-hipertensivos, o paciente então pode experimentar um aumento dessas
substâncias em circulação e chegar ao quadro de uma emergência hipertensiva.

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Gravidez: Nesse conjunto merece destaque a eclampsia, que está relacionada com a crise convulsiva
associada ou não ao aumento abrupto dos níveis pressóricos. A crise convulsiva na eclampsia possui alguns
pontos a serem observados, primeiramente é necessário descartar outras causas como a utilização de drogas,
isquemias, hemorragias entre outros. Após essas causas serem excluídas é importante ressaltar que na maior
parte das vezes a crise convulsiva é do tipo tônico-clônico generalizada, as crises focais, multifocais e até
mesmo o coma são raríssimos. É significativo também destacar que 15-20% das pacientes com eclampsia
podem evoluir para a ocorrência de um AVE, por isso o tratamento deve ser rápido e eficaz por meio de por
exemplo interrupção da gestação e controle de pressões sistólicas acima de 160mmHg e diastólicas acima de
110mmHg (10% das gestantes possuem recorrência da crise convulsiva e portanto nesses casos o sulfato de
magnésio é a primeira droga de escolha).

Cirúrgicas: Nesse tópico, três situações merecem maior destaque, o paciente que é submetido
a uma cirurgia de emergência, porém a PA encontra-se muito elevada, o que o torna um caso de HAS;
em segundo, há também a hipertensão no pós-operatório, principalmente, por causa do processo
inflamatório; e por fim, a PA pode aumentar pela liberação de substâncias vasoconstrictoras na
presença de lesão endotelial, causada pelas suturas vasculares e, assim, desencadear hemorragia
pós-operatória.

Emergências Hipertensivas: Tratamento

É importante ressaltar que o tratamento deve estar adequado à causa base da Emergência
Hipertensiva! No entanto, isso não impede estabelecer medidas gerais que a maioria dos pacientes
demandará:

• Suplementação de O2 ( no paciente com sat. <92%)


• Monitorização Cardíaca
• Acesso Venoso
• Cabeceira Elevada
• Monitorização da Diurese
• Monitorar o peso
• Exames Laboratoriais
• Tratar a causa base

1. Na Emergência:

Tempo é precioso, dessa forma, não se pode atrasar o tratamento e deve-se encaminhar para o
CTI. Em sequência, faz-se a administração de drogas vasodilatadoras como:

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a. Nitroglicerina (Nitrol): possui menor custo, atua na pré-carga; A vasodilatação na isquemia
é mais seletiva, atua nas artérias coronárias; Por exemplo, no edema agudo de pulmão essa
droga deve ser priorizada, uma vez que a causa geralmente está relacioanda com IAM,
dessa forma, o paciente poderá ter melhor desfecho.

Contraindicações:

A vasodilatação ocorre pelo aumento de GMPc intracelular. Além disso, seu início é de ação
rápida (5 minutos após a administração) e a dose inicial indicada é de 0,5 mcg/Kg/min
(máximo: 400 mcg/min). Os efeitos colaterais, portanto, podem incluir taquicardia reflexa,
hipotensão, cefaleia e metemoglebinemia (alta conversão de hemoglbina para metemoglobina;
o quadro clícnico pode ser clássico com saturação alta + cianose sem resposta a O2); Vale
ressaltar que a nitroglicerina deve ser a preferência, principalemte, para médicos com menos
experiência.

b. Nitroprussiato de Sódio (Nipride): é uma droga fotossensível, possui maior complexidade


no manuseio quando comparada a Nitroglicerina; é um vasodilatador misto o qual atua no
músculo liso alterando tanto a pré quanto a pós carga. A dose indicada varia entre 0,5 a 10
mcg/Kg/min. Os efeitos colaterais, nesse caso, compreendem meteoglobinemia (raro),
cefaleia, flushing, taquicardia reflexa, intoxicação por cianeto (geralemente o pct está
recebendo a medicação por 2-3 dias, tem rebaixamento do nível de consciencia, fica
hipodenso, pode apresentar convulsões e aumento de lactato periférico; diagnóstico:
dosagem de cianeto e antídoto: B12)

c. Esmolol: Beta1 seletivo, usado para reduzir abruptammente a frequancia cardíaca (ex:
dissecção aórtica); Possui Meia-vida curta de 9 min. A dose recomendada se inicia com 0,5
mg/Kg/min e seus efeitos colaterais são bradicardia e hipotensão.

Dica para decorar a seletividade:


1 coração = Beta1: Bisoprolol, metaprolol, atenolol, nebivolol, esmolol
2 pulmões = Beta2
Não seletivos (B1 e B2): Propranolol, Nadolol, Pindolol
Duplo efeito (B1 e alfa): Carvedilol

Abordagem:

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I. Reduzir a PA de 10-20% na primeira hora (em “média” < 180x120 mmHg)
II. Reduzir de 5-15% nas próximas 23h (em “média” <160x110 mmHg)
Excessão:
• AVE Isquêmico: reduzir abruptamente a PA num AVE isquemico sem indicação pode
aumentar a área de penumbra, o que aumenta a isquemia. Nesse caso só deve realizar
quando a PA >ou= 185x110 mmHg ou PA >ou= 220x120 mmHg para pcts candidatos
a trombólise;
• AVE Hemorrágico: se PAS entre 220 – 150 mmHg reduz para 140; se >220, reduz para
160 – 140 mmHg.
• Dissecção de Aorta: PAS deve ser rapidamente reduzida para 120x100 mmHg,
preferencialmete nos primeiros 20 minutos

2. Urgências Hipertensivas

Apresenta sintomas?

SIM NÃO

Droga VO 30/30 min Ambulatório 1-7 dias

• Clonidina (efeito sedativo)


• Captopril
• Prazosin
• Nifedipina (maior imprevisibilidade a cada níveis pressóricos)

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