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Jurisprudência/STJ - Decisões Monocráticas

Processo
AREsp 1913775

Relator(a)
Ministro HUMBERTO MARTINS

Data da Publicação
DJe 06/08/2021

Decisão
AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL Nº 1.913.775 - RJ (2021/0179270-0)
DECISÃO
C uida-se de agravo apresentado por REINALDO SANTOS OLIVEIRA contra a
decisão que não admitiu seu recurso especial.
O apelo nobre, fundamentado no artigo 105, inciso III, alínea "a", da
CF/88, visa reformar acórdão proferido pelo TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO
DO RIO DE JANEIRO, assim resumido:
APELAÇÃO CÍVEL. DIREITO CIVIL. REINTEGRAÇÃO DE POSSE. CESSÃO DE DIREITOS.
POSSE TRANSMITIDA POR MEIO DE COMODATO. POSTERIOR MANIFESTAÇÃO INEQUÍVOCA
PELO CEDENTE PELO TÉRMINO DO CONTRATO. POSSE QUE SE TORNOU INJUSTA. Ação
de reintegração de posse na qual a parte autora alega, em síntese, que
sofreu injustamente esbulho da posse de seu imóvel por conduta ilegal
praticada pelo Réu, que se recusa a sair do bem. Prolatada sentença de
procedência, insurge-se o Demandante da decisão. Recorrente que sustenta
que a Recorrida alegou tão-somente exceção de domínio. Irresignação que
não merece acolhimento. Parte autora que é cessionária de direitos do bem
em análise a partir de 1965, adquirindo então a posse legítima do
apartamento, podendo utiliza-lo diretamente ou não. In casu, verifica-se
que a Demandante concedeu ao seu filho permissão para uso do imóvel de
forma gratuita, transmitindo a ele - e a sua cônjuge (irmã do Réu) a
posse direta do bem. Autora que permaneceu na posse indireta do
apartamento. Posse direta que não anula a indireta, sendo que ambas são
legitimadas para o ajuizamento de eventual demanda possessória, inclusive
um em face do outro.
Existência de contrato de comodato. Autora que emprestou o imóvel para
que ente próximo exercesse a moradia no local com sua família.
No comodato a posse é transmitida a título provisório, de modo que o
comodatário adquire a posse precária, sendo obrigado a devolvê-la tão
logo o comodante reclame a coisa de volta. C om a notificação
extrajudicial ou a manifesta intenção declarada de reaver o bem,

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extingue-se o comodato, transformando-se em injusta a posse anteriormente
justa, em virtude da recusa de devolução do imóvel quando assim
solicitado. No caso dos autos é incontroversa a intenção de rescisão do
contrato de comodato bem como da reiterada negativa do Réu em devolver o
bem. Possessória que deve ser julgada procedente. Manutenção da sentença
que se impõe.
RECURSO DESPROVIDO.
Sustenta a parte recorrente, pela alínea "a" do permissivo
constitucional, violação dos arts. 1.196, 1.206 e 1.210, § 2°, todos do
Código Civil, e 927 do CPC, no que concerne à comprovação do exercício da
posse anterior do imóvel pela parte recorrida, trazendo os seguintes
argumentos:
Com as devidas vênias, o v. acórdão negou vigência ao disposto no artigo
927 do Código de Processo Civil, segundo o qual, no juízo possessório, o
postulante deve demonstrar sua posse anterior e a data e ocorrência do
esbulho, turbação ou ameaça, sendo que nenhum destes requisitos foi
comprovado pela parte autora.
C om efeito, visualiza-se que em nenhum momento a parte autora logrou
êxito em comprovar ter exercido posse sobre o imóvel, já que sempre
residiu com seu cônjuge em apartamento localizado à Avenida Nossa Senhora
de Copacabana, n° 748, Copacabana, Rio de Janeiro.
Mostra-se, portanto, evidente que a parte autora fundamenta sua pretensão
no jus possidendi, e não no jus possessionis, não sendo aquele objeto de
tutela em sede de ação possessória.
[...].
Assim, na condição de representante do Espólio, não faz jus sua
inventariante à tutela possessória, já que a inventariada em nenhum
momento demonstrou o exercício de posse sobre o imóvel objeto da lide.
Deste modo, caso queira, deve a inventariante, em nome próprio, requerer
proteção possessória, não fazendo jus a esta nos presentes autos.
Ademais, o v. acórdão não se pronunciou também quanto à informação
contida no RGI do imóvel objeto da discussão, acostado pela autora às
folhas 16/18, do qual se infere que esta e seu falecido esposo não
detinham a propriedade do bem, detendo apenas o título de cessão dos
direitos à compra do imóvel, que não é hábil à aquisição da propriedade.
Caso quisessem adquirir a propriedade, os cessionários deveriam localizar
os proprietários registrais a fim de lavrar escritura pública de compra e
venda e, apenas com o seu registro na matrícula do imóvel, tornar-se-iam
proprietários do bem. Na hipótese de não lograrem êxito em localizá-los,
apenas através de pronunciamento judicial poderiam ser declarados o

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proprietários.
De qualquer forma, ainda que a autora tivesse tomado qualquer dessas
providências, ainda assim, seria proprietária de apenas 50% do imóvel,
pois os outros 50% foram legados ao genitor da sobrinha do ora
Recorrente, que, por sua vez, tentou ceder seus direitos hereditários
para sua genitora, sendo, contudo, a cessão considerada ineficaz pelo
juízo orfanológico, posto que contrária ao desejo do testador. (fls.
1001/1004).
É, no essencial, o relatório. Decido.
Na espécie, o Tribunal de origem se manifestou nos seguintes termos:
No caso dos autos, sustenta a parte autora ser devida a procedência da
demanda na medida em que é a legítima proprietária e possuidora do imóvel
situado na Rua Senador Vergueiro, 98, cobertura 03. Em sua defesa, alega
o Réu que a parte autora jamais exerceu a posse, não sendo possível
reintegrar a Demandante de algo que nunca teve.
C ompulsando os documentos acostados, denota-se que a parte autora é
cessionária de direitos do bem em análise a partir de 1965 (index 00007.
fls. 11).
Note-se que no momento em que se tornou cessionária, a parte autora
adquiriu a posse legítima do apartamento, podendo utiliza-lo diretamente
ou não.
In casu, verifica-se que a Demandante concedeu ao seu filho permissão
para uso do imóvel de forma gratuita, transmitindo a ele (e a sua cônjuge
- irmã do Réu) a posse direta do bem. Ao proceder dessa forma, permaneceu
a Autora na posse indireta do apartamento.
Nesse contexto, há que se esclarecer que a posse direta não anula a
indireta, sendo que ambas são legitimadas para o ajuizamento de eventual
demanda possessória, inclusive um em face do outro.
Enquanto a posse direta é a de quem recebe o bem para usar, detendo
materialmente a coisa; a posse indireta é a de quem cede o uso do bem.
No caso dos autos, há verdadeira presença de comodato do bem, na medida
em que a Autora emprestou o imóvel para que ente próximo exercesse a
moradia no local com sua família. C om o seu falecimento, o comodato
continuou com sua cônjuge, irmã do Réu, sendo a posse sempre decorrente
de comodato e não legado com alega o Demandado.
No comodato a posse é transmitida a título provisório, de modo que o
comodatário adquire a posse precária, sendo obrigado a devolvê-la tão
logo o comodante reclame a coisa de volta. C om a notificação
extrajudicial ou a manifesta intenção declarada de reaver o bem,
extingue-se o comodato, transformando-se em injusta a posse anteriormente

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justa, em virtude da recusa de devolução do imóvel quando assim
solicitado.
Porquanto não se tenha certeza acerca da natureza da posse no início pelo
Réu - que argumenta que permaneceu no bem após sua irmã partir para a
Espanha, com sua anuência, fato é que há muito tempo a posse do Demandado
se tornou injusta e clandestina, na medida em que a parte autora vem
tentando reaver a posse direta de seu bem, sem, contudo lograr êxito.
É incontroverso o esbulho, na medida em que o próprio Réu afirma que até
a presente data se recusa a desocupar bem que não é seu. Viável e
adequada, portanto, a presente reintegração de posse.
Não é razoável entender que o Réu possua qualquer proteção ou direito de
permanecer o local, sendo imperiosa a sua saída imediata (fls. 925/926).
Assim, incide o óbice da Súmula n. 7 do STJ ("A pretensão de simples
reexame de prova não enseja recurso especial"), uma vez que o acolhimento
da pretensão recursal demandaria o reexame do acervo fático-probatório
juntado aos autos.
Nesse sentido:
AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM REC URSO ESPEC IAL. REINTEGRAÇÃO DE POSSE.
REQUISITOS DO ART. 927 DO C PC . C OMPROVAÇÃO DA POSSE ANTERIOR E DO
ESBULHO. SÚMULA 7/STJ. INDENIZAÇÃO/RETENÇÃO POR BENFEITORIAS REALIZADAS
APÓS A DATA DA PERÍC IA. QUESTÃO NÃO DEC IDIDA PELA C ORTE DE ORIGEM.
AUSÊNC IA DE PREQUESTIONAMENTO. SÚMULA 211/STJ. AGRAVO NÃO PROVIDO.
1. A procedência do pedido de reintegração de posse pressupõe a prova do
preenchimento dos requisitos do art. 927 do Código de Processo Civil.
2. O Tribunal de origem, mediante análise do contexto fático-probatório
dos autos, entendeu estarem presentes nos autos os elementos que
comprovam a posse anterior da agravada e o esbulho alegado.
3. A modificação de tal entendimento lançado no v. acórdão recorrido, nos
moldes em que ora postulado, demandaria o revolvimento do suporte fático-
probatório dos autos, o que encontra óbice na Súmula 7 do Superior
Tribunal de Justiça.
[...] 6. Agravo regimental não provido. (AgRg no AREsp 273.408/MG,
relator Ministro Raul Araújo, Quarta Turma, DJe 30/6/2015.)
C onfiram-se ainda os seguintes precedentes: AgInt no AREsp 1.679.153/SP,
relator Ministro Marco Aurélio Bellizze, Terceira Turma, DJe de 1/9/2020;
AgInt no REsp 1.846.908/RJ, relator Ministro Antonio C arlos Ferreira,
Quarta Turma, DJe de 31/8/2020; AgInt no AREsp 1.581.363/RN, relator
Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma, DJe de 21/8/2020; e AgInt nos
EDcl no REsp 1.848.786/SP, relator Ministro Benedito Gonçalves, Primeira
Turma, DJe de 3/8/2020; AgInt no AREsp n. 1.311.173/MS, relator Ministro

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Gurgel de Faria, Primeira Turma, DJe de 16/10/2020.
Ante o exposto, com base no art. 21-E, V, do Regimento Interno do
Superior Tribunal de Justiça, conheço do agravo para não conhecer do
recurso especial.
Publique-se. Intimem-se.
Brasília, 05 de agosto de 2021.
MINISTRO HUMBERTO MARTINS Presidente

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