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Literatura, Educação e Identidade

Étnico-Racial

Brasília-DF.
Elaboração

Paulo Lima

Produção

Equipe Técnica de Avaliação, Revisão Linguística e Editoração


Sumário

APRESENTAÇÃO.................................................................................................................................. 4

ORGANIZAÇÃO DO CADERNO DE ESTUDOS E PESQUISA..................................................................... 5

INTRODUÇÃO.................................................................................................................................... 7

UNIDADE I
PANORAMA LITERÁRIO BRASILEIRO.......................................................................................................... 9

CAPÍTULO 1
NOÇÕES INICIAIS...................................................................................................................... 9

CAPÍTULO 2
ROMANTISMO E LITERATURA NO BRASIL................................................................................... 12

CAPÍTULO 3
O PAPEL DOS JESUÍTAS............................................................................................................ 18

CAPÍTULO 4
UMA BREVE HISTÓRIA DA LITERATURA BRASILEIRA...................................................................... 23

CAPÍTULO 5
DEMAIS FIGURAS DA LITERATURA EM DIFERENTES ESTILOS ........................................................ 32

UNIDADE II
QUESTÕES
ÉTNICO-RACIAIS................................................................................................................................... 37

CAPÍTULO 1
CIDADANIA (DIREITO) PARA TODOS.......................................................................................... 37

CAPÍTULO 2
MINORIAS E AS MUDANÇAS CULTURAIS................................................................................... 42

CAPÍTULO 3
O UNICEF, A CULTURA E A IDENTIDADE PARA A IGUALDADE ÉTNICO-RACIAL............................. 50

PARA (NÃO) FINALIZAR...................................................................................................................... 57

REFERÊNCIAS................................................................................................................................... 59

ANEXO I........................................................................................................................................... 60

ANEXO II.......................................................................................................................................... 62

ANEXO III......................................................................................................................................... 70

ANEXO IV......................................................................................................................................... 90
Apresentação

Caro aluno

A proposta editorial deste Caderno de Estudos e Pesquisa reúne elementos que se


entendem necessários para o desenvolvimento do estudo com segurança e qualidade.
Caracteriza-se pela atualidade, dinâmica e pertinência de seu conteúdo, bem como pela
interatividade e modernidade de sua estrutura formal, adequadas à metodologia da
Educação a Distância – EaD.

Pretende-se, com este material, levá-lo à reflexão e à compreensão da pluralidade


dos conhecimentos a serem oferecidos, possibilitando-lhe ampliar conceitos
específicos da área e atuar de forma competente e conscienciosa, como convém ao
profissional que busca a formação continuada para vencer os desafios que a evolução
científico-tecnológica impõe ao mundo contemporâneo.

Elaborou-se a presente publicação com a intenção de torná-la subsídio valioso, de modo


a facilitar sua caminhada na trajetória a ser percorrida tanto na vida pessoal quanto na
profissional. Utilize-a como instrumento para seu sucesso na carreira.

Conselho Editorial

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Organização do Caderno
de Estudos e Pesquisa

Para facilitar seu estudo, os conteúdos são organizados em unidades, subdivididas em


capítulos, de forma didática, objetiva e coerente. Eles serão abordados por meio de textos
básicos, com questões para reflexão, entre outros recursos editoriais que visam a tornar
sua leitura mais agradável. Ao final, serão indicadas, também, fontes de consulta, para
aprofundar os estudos com leituras e pesquisas complementares.

A seguir, uma breve descrição dos ícones utilizados na organização dos Cadernos de
Estudos e Pesquisa.

Provocação

Textos que buscam instigar o aluno a refletir sobre determinado assunto antes
mesmo de iniciar sua leitura ou após algum trecho pertinente para o autor
conteudista.

Para refletir

Questões inseridas no decorrer do estudo a fim de que o aluno faça uma pausa e reflita
sobre o conteúdo estudado ou temas que o ajudem em seu raciocínio. É importante
que ele verifique seus conhecimentos, suas experiências e seus sentimentos. As
reflexões são o ponto de partida para a construção de suas conclusões.

Sugestão de estudo complementar

Sugestões de leituras adicionais, filmes e sites para aprofundamento do estudo,


discussões em fóruns ou encontros presenciais quando for o caso.

Praticando

Sugestão de atividades, no decorrer das leituras, com o objetivo didático de fortalecer


o processo de aprendizagem do aluno.

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Atenção

Chamadas para alertar detalhes/tópicos importantes que contribuam para a


síntese/conclusão do assunto abordado.

Saiba mais

Informações complementares para elucidar a construção das sínteses/conclusões


sobre o assunto abordado.

Sintetizando

Trecho que busca resumir informações relevantes do conteúdo, facilitando o


entendimento pelo aluno sobre trechos mais complexos.

Para (não) finalizar

Texto integrador, ao final do módulo, que motiva o aluno a continuar a aprendizagem


ou estimula ponderações complementares sobre o módulo estudado.

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Introdução

Ao falarmos do desdobramento da cultura nacional brasileira e sua consequente


construção da identidade nacional, impossível nos é olvidar a Literatura Brasileira, já
que esta foi responsável, através de suas eras, por fornecer o sentimento comum da
época, bem como influenciar a implementação da cultura nacional em formação.

Como cidadãos brasileiros, temos sempre o direito de seguir o próprio senso cultural,
dado a conquista da democratização e laicização do Estado brasileiro. Desta forma,
fatores étnicos estão profundamente arraigados em nossa sociedade, dado que de onde
viemos, a cultura já estava consolidada, contudo, por diversos motivos que veremos,
perdeu-se a originalidade desta cultura primária em grande medida.

A ascendência indígena e africana do Brasil tem papel crucial neste contexto, e por
este motivo estudaremos alguns princípios e contextos étnico-raciais, para que assim
compreendamos de onde saímos, porque saímos e aonde chegamos.

Veremos as principais fontes de influências, assim como se pede atenção especial para
cada mente literária que deu vazão aos sentimentos e influência da época.

Objetivos
»» Discernir as diferentes eras literárias pós século XIX.

»» Estudar as principais influências da Literatura Brasileira.

»» Correlacionar a importância literária na construção da identidade


nacional.

»» Instigar o pensamento e posicionamento frente às questões étnico-raciais.

»» Compreender o desdobramento da construção da identidade cultural no


Brasil.

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PANORAMA
LITERÁRIO UNIDADE I
BRASILEIRO
Nesta unidade você terá contado com informações importantes para os Direitos
Humanos dos Brasileiros que é o acesso ao contexto literário da formação linguística e
cultural. Verá algumas eras de assuntos relacionados à Literatura Brasileira a partir do
século XIX.

CAPÍTULO 1
Noções iniciais

A Literatura Brasileira conta com uma gama gigantesca de tentáculos e vínculos


portugueses, não se limitando a nomes famosos, tampouco àqueles que estudamos no
grau primário, mas sua vastidão contempla pontos importantes e culminantes para
entendermos como chegamos até aqui por meio dos sentimentos literários que regiam
cada época que passou.

Seria loucura pensar que podemos esgotar um assunto tão vasto como este, portanto,
estudaremos brevemente dentro de um entendimento sempre focado nos direitos
humanos aos acessos a estas informações, bem como de entender como se desenrolou
o sentimento de liberdade de direito no contexto literário, o qual abrangia entornos
políticos, econômicos e religiosos.

É comum a influência religiosa na literatura e um pouco do contrário também é


verdadeiro, haja vista a ideologia jesuíta tão impregnada desde o começo do pensamento
e concepções poéticas e ensinos literários para índios e até peles brancas no Brasil.

Iniciaremos com a era bucólica, passaremos superficialmente (para o aluno dedicado,


jamais se contentará com o superficial, mas sim buscará informações profundas de cada
contexto) por algumas eras, nos ateremos em alguns aspectos de cada uma delas, bem
como, principalmente, veremos as figuras mais proeminentes nesse campo de estudo,
entendendo a contribuição de cada uma delas (as quais também, é óbvio, não serão
esgotadas aqui) no entendimento do desdobramento literário brasileiro.

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UNIDADE I │ PANORAMA LITERÁRIO BRASILEIRO

Neoclassicismo, Arcadismo ou Rococó


Embora o Arcadismo tenha tido sua influência, sobretudo no século XVIII, existem
reflexos de seus conceitos pós-século XIX. Desta forma, a importância de vermos
brevemente suas características principais.

O bucolismo, isto é, a elevação sobremaneira de uma vida despreocupada “projetada”


nos campos é a sua marca. Não é a toa que a maior parte dos adeptos ao bucolismo e
ao Rococó faziam parte da Conjuração Mineira, sendo eles poetas árcades, levando em
consideração que Minas Gerais é um Estado brasileiro que até hoje leva a fama pela sua
“tranquilidade de espírito”.

Tomás Antônio Gonzaga (1744-1810) de origem portuguesa, mas descendência


brasileira; era conhecido por ser um jurista bastante competente. Foi preso em
23/5/1789 no Rio de Janeiro, uma vez que estava envolvido na Inconfidência Mineira.
Gonzaga deixava claro em suas poesias que não era adepto à Conjuração, muito embora
Cláudio Manuel da Costa, seu amigo, fosse.

Por não se entender muito bem com Tiradentes, Gonzaga era visto como a mente mais
proeminente para dirigir a Inconfidência, no entanto, pela figura de Tiradentes, não
o foi. Suas obras demonstram sinais expressivos da transição para o Romantismo,
supervalorizando em praticamente todas elas o amor.

Contudo, veremos mais a frente, no quadro específico que trata de cada figura importante
na literatura, inclusive Alvarenga Peixoto, proeminente figura árcade.

Nos primeiro decênios do século XIX as fórmulas arcádicas servem


de meio, cada vez menos adequado, para transmitir os desejos de
autonomia que a inteligência brasileira já manifestava em diversos
pontos da Colônia. Seria curioso investigar o porquê de tanta má
poesia durante esse período rico de mudanças econômicas e políticas
na sociedade brasileira. A rigor, entre a Glaura de Silva Alvarenga e os
Primeiros Cantos (1846) de Gonçalves Dias não veio à luz nenhuma
obra que merecesse plenamente o título de poética. E mesmo que a data
final fosse recuada para 1836, ano da publicação dos Suspiros Poéticos
e Saudades de Gonçalves de Magalhães, marco da literatura romântica,
ainda assim teríamos três décadas e meia e certamente duas gerações
de curtíssimo fôlego lírico (BOSI, 1994, p.80).

O autor tenta buscar uma explicação plausível para este sentido se apegando ao fato de
vermos no hibridismo cultural e ideológico nesse período (em termos de século XIX),

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PANORAMA LITERÁRIO BRASILEIRO │ UNIDADE I

a carência que havia mormente capaz de organizar um estilo “forte e duradouro”. Todo
o processo então da Independência (de 1808 a 1831) fez-se por intermédio das classes
que dominavam o país, as quais herdaram da vida colonial mais recente uma série de
ambiguidades. Ele cita a:

»» ilustração-reação;

»» pombalismo-jesuitismo; deísmo-beatice; pensamento-retórica etc.

Liberalismo de centro
O liberalismo de centro é representado pelos publicistas da época Hipólito da Costa
Pereira e Evaristo da Veiga. Ambos criaram o molde brasileiro de prosa jornalística
de ideias, não superado durante o século XIX. Segundo Bosi (2004), a liberdade para
ambos é:

»» possibilidade de expressão;

»» de informação;

»» de crítica.

As principais características de um e outro é o que segue:

Quadro 1. Hipólito X Evaristo.

Era dotado de um talento mais viril que Evaristo; tendo passado boa parte da vida na Inglaterra, pôde absorver
uma cultura política muito mais complexa que a do redator apressado da Aurora Fluminense. Diferem também
pelas próprias circunstâncias de tempo em que atuaram. Hipólito foi analista lúcido que viu do alto do seu
Hipólito da Costa observatório londrino o Brasil de D. João VI; feita a Independência, calou-se o Correio Brasiliense dando por
cumprida a sua missão.
A prosa de Hipólito é a do ensaísmo ilustrado.

Evaristo da Veiga A prosa de Evaristo cinge-se à crônica política que tempera como pode as reações do imprevisto.

Muito embora ambas as visões fossem indispensáveis à formação de um público ledor em um país que mal nascera para a vida política; uma
e outra repisaram temas liberais de que tanto careciam as elites recém-saídas do arbítrio colonial. Todavia deixando um legado na primeira
geração romântica, não chegaram a influir na consciência literária que estava por nascer.

Fonte: Adaptado de Bosi (1994, p.85).

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CAPÍTULO 2
Romantismo e literatura no Brasil

Caracteres gerais do Romantismo


O amor e a pátria, a natureza e a religião, o povo e o passado, que afloram
tantas vezes na poesia romântica, são conteúdos brutos, espalhados
por toda a história das literaturas, e pouco ensinam ao intérprete do
texto, a não ser quando opostos em situação, tematizados e lidos como
estruturas estéticas (BOSI, 1994, p.91).

Segundo ainda Bosi (1994), o Romantismo expressa os sentimentos dos descontentes


com as novas estruturas:

»» A nobreza, que já caiu;

»» A pequena burguesia que ainda não subiu: de onde, as atitudes saudosistas


ou reivindicatórias que pontuam todo o movimento.

Desta maneira, muito embora existam diferenças de situação material, é possível dizer
que se formaram nos homens de letras configurações mentais paralelas às respostas
que a inteligência europeia dava a seus conflitos ideológicos. Importantes exemplos
originam-se dos melhores escritores. O romance colonial de Alencar e a poesia indianista
de Gonçalves Dias veem da aspiração de fundar um passado mítico a nobreza recente
do país.

Dentro das situações dos vários romantismos, Bosi (1994, pp.93-95) nos informa que:

O fulcro da visão romântica do mundo é o sujeito, que é o emissor da


mensagem [...]. A natureza romântica é expressiva. Ao contrário da
natureza árcade, decorativa. Ela significa e revela. Prefere-se a noite
ao dia, pois à luz crua do sol impõe-se ao indivíduo, mas é na treva
que latejam as forças inconscientes da alma: o sonho, a imaginação
[...]. A nação afigura-se ao patriota do século XIX como uma ideia-
força que tudo vivifica. Floresce a História, ressurreição do passado
e retorno às origens (MICHELET; GIOBERTI). Acendra-se o culto à
língua nativa e ao folclore (SCHLEGEL; GARRET; MANZONI) [...]. O
homem romântico reinventa o herói, que assume dimensões titânicas
(SHELLEY; WAGNER), sendo afinal reduzido a cantor da própria
solidão (FOSCOLO; VIGNY).

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PANORAMA LITERÁRIO BRASILEIRO │ UNIDADE I

No Brasil
Em nosso país, o romantismo aparece a partir de 1830, o qual foi diretamente
influenciado pela Independência do Brasil (1822). Temas ligados ao meio ambiente e
questões político-sociais, o romantismo é conhecido por sua própria linguagem.

Bosi (1994, pp. 97-98) afirma que a “relevância histórica reside no fato de Magalhães não
ter operado sozinho como imitador de Lamarti e Manzoni, mas de ter produzido junto
a um grupo, visando a uma reforma da Literatura Brasileira”. Para ele João Caetano
compôs a primeira tragédia escrita por um brasileiro e único de assunto nacional.

Quadro 2. Quatro fases da produção literária.

O marco inicial é a publicação de Suspiros Poéticos e Saudades (1836), de Gonçalves de Magalhães (1811-1882). A produção literária
passa por quatro fases.

Pertence o chamado “grupo fluminense”


1 Fase
a

De Gonçalves de Magalhães, Porto-Alegre, Torres Homem. A poesia lírica ainda está presa a certos aspectos do
(1836-1840)
Neoclassicismo, embora já rompendo para o Romantismo.

Indianismo
Assim designado o movimento de valorização do indígena, seus costumes, cosmologia, figuras, feitos, como a
expressão mais adequada ao procurado meio de dar caráter brasileiro à literatura. Foram seus maiores cultores e
2a Fase expressões as figuras máximas de José de Alencar (1829-1877) e Gonçalves Dias (1823-1864), o primeiro na
prosa de ficção e o segundo na poesia lírica e épica.
(1840-1850)
Alencar foi o centro da revolução romântica, incentivando pela doutrina e pelo exemplo a autonomia literária
nacional, graças à incorporação às letras da paisagem física, temas e motivos locais, fatos históricos, linguagem
brasileira. Pela sua extraordinária figura e pela obra notável que realizou, Alencar é o patriarca da Literatura
Brasileira.

“Mal do Século”, individualismo, subjetivismo, Ultrarromantismo


3a Fase
Com os líricos Álvares de Azevedo (1831-1852), Casimiro de Abreu (1839-1860), Junqueira Freire (1832-
(1850-1860)
1855), Fagundes Varela (1841-1875).

Avulta a figura de Castro Alves

4a Fase É admirável, pela grandeza do estro e caráter brasileiro, a plêiade de líricos do Romantismo. Além de Alencar, a
prosa de ficção teve cultores em Bernardo Guimarães (1825-1884), Joaquim Manuel de Macedo (1820-1882),
(1860-1880) Manuel Antônio de Almeida (1831-1861), Visconde de Taunay (1843-1899), e o teatro contou com Martins
Pena (1815-1848). Depois do Romantismo, com a autonomia assegurada, a literatura poderia caminhar por si,
com a natureza tropical incorporada, os costumes e linguagem locais valorizados, um público ledor garantido.

Fonte: Coutinho (2004, p.138).

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UNIDADE I │ PANORAMA LITERÁRIO BRASILEIRO

Compare na perspectiva de Bosi (1994) a distribuição do romance brasileiro moderno,


de 1930 para cá, em, pelo menos, quatro tendências, de acordo com o grau crescente de
tensão entre o “herói” e o seu mundo:

»» Romances de tensão mínima: há conflito, mas este se configura em termos


de oposição verbal, sentimental quando muito: as personagens não se
destacam visceralmente da estrutura e da paisagem que as condicionam.
Exemplos: as estórias populistas de Jorge Amado, os romances ou
crônicas da classe média de Érico Veríssimo e Marques Rebelo, e muito
do neorregionalismo documental mais recente.

»» Romances de tensão crítica: o herói opõe-se e resiste agonicamente às


pressões da natureza e do meio social, formule ou não em ideologias
explícitas o seu mal-estar permanente. Exemplos: obras maduras de José
Lins do Rego (Usina, Fogo Morto) e todo o Graciliano Ramos.

»» Romances de tensão interiorizada: o herói não se dispõe a enfrentar a


antinomia eu/mundo pela ação: evade-se, subjetivando o conflito. Exemplo:
os romances psicológicos em suas várias modalidades (memorialismo,
intimismo, autoanálise) de Otávio de Faria, Lúcio Cardoso, Cornélio Pena,
Cyro dos Anjos, Lígia Fagundes Telles, Osman Lins.

»» Romances de tensão transfigurada: o herói procura ultrapassar o conflito


que o constitui existencialmente pela transmutação mítica ou metafísica
da realidade. Exemplos: as experiências radicais de Guimarães Rosa e
Clarice Lispector.

Fonte: Adaptado de Bosi (1993, p.392)

De acordo com o mesmo autor, Gonçalves de Magalhães é lembrado, sobretudo, pela


baliza da publicação dos Suspiros Poéticos e Saudades, como exposto anteriormente.
A relevância histórica do autor não imitados de Lamarti e Manzoni é a de que visava à
reforma da Literatura Brasileira.

Dentro de um contexto modernista, temos que:

Na década de 1950, um movimento novo apresenta-se, denominado


Concretismo, o qual procurou introduzir na poesia lírica a ideia da
redução da expressão a signos pictóricos, visando à apresentação direta
do objetivo através de representações gráficas da linguagem, isolando a
palavra de suas conotações conteudísticas e valorizando-a visualmente.

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PANORAMA LITERÁRIO BRASILEIRO │ UNIDADE I

Citam-se aqui os nomes de Haroldo de Campos, Augusto de Campos,


Décio Pignatari, Ferreira Gullar, Mário Faustino. Ao atingir a década
de 1970, a Literatura Brasileira demonstra uma grande vitalidade,
expressa numa larga visão do mundo brasileiro, capacidade técnica
das suas figuras de destaque, um público compreensivo e ávido de
suas realizações, uma autonomia de criação, uma força de expressão e
apreensão da realidade, que a fazem uma das mais representativas da
América (COUTINHO, 2004, p.143).

Existem, portanto, três fases ou subperíodos, os quais correspondem a três gerações,


onde a primeira fase (1922-1930), de rebelião, destruição, revisão de valores; a segunda
fase (1930-1945), de reconstrução sobre moldes novos e a terceira fase (1945-1960), de
consolidação. Veja a seguir as principais e mais proeminentes figuras que apareceram
na era modernista.

Quadro 3. As três fases modernistas.

Caracterizou-se pelo predomínio da poesia, destacando-se os nome de Mário de Andrade (1893-1845), Manuel
Bandeira (1886-1968), Menotti del Picchia (1892-1988), Oswald de Andrade (1890-1954), Cassiano Ricardo
1a Fase (1895-1974), Guilherme de Almeida (1890-1969), Ribeiro Couto (1898-1963), Ronald de Carvalho (1893-1935);
(1922-1930) o grupo carioca da revista Festa, entre outros. Teve cunho nacionalista, com os grupos de Antropofagia, da Anta, do
Manifesto Regionalista do Recife, o grupo da revista Verde de Cataguases (Minas Gerais), o grupo da Arco e Flexa, da
Bahia.

Foi predominantemente de prosa ficção, com o movimento do nordeste, em que se destacaram José Américo de
Almeida (1887-1980), José Lins do Rego (1901-1957), Jorge Amado (1912-2001), Amando Fontes (1879-
2a Fase 1967), de características regionalistas e sociais, moldadas pelo ambiente social e econômico da região (ciclo da
(1930-1945) cana-de-açúcar, ciclo da seca e do cangaço, ciclo do cacau etc.). Ao lado desse grupo, desenvolveu-se outro no
centro-sul do país, mais preocupado com os problemas da alma humana e da convivência social, e a arma principal é
a introspecção e a análise psicológica. Seus inspiradores foram Machado de Assis e Raul Pompeia.

Inaugurada após a Segunda Guerra Mundial, pôs ênfase na busca de novas disciplinas para opor à tarefa libertária e
demolidora da primeira fase do movimento. Desta maneira, surgiu uma geração preocupada com o problema formal
e verbal, empreendendo uma pesquisa no domínio da linguagem, não somente na poesia como especialmente no
domínio da prosa de ficção.

Poesia Lírica

Surgem figuras como João Cabral de Melo Neto (1920-1999), Péricles Eugênio da Silva Ramos (1919-1992), José
3a Fase Paulo Moreira da Fonseca (1922-2004), Ledo Ivo (1924-2012), Geir Campos (1924-1999), Domingos Carvalho da
Silva (1915-2004), Bueno de Rivera (1911-1982), Darcy Damasceno (1922-1988 ) e outros.
(1945-1960)
Crítica Literária

Teve nessa fase um momento de grande importância com a polêmica em torno da renovação da crítica contra o
impressionismo e historicismo característicos da geração anterior. Destacaram-se nesse ponto Afrânio Coutinho
(1911-2000), Eduardo Portela (1932), Eugênio Gomes (1897-1972), Franklin de Oliveira (1916), Fausto Cunha
(1923), a que se juntaram depois Fábio Lucas (1931), Maria Luísa Ramos (1926), Rui Mourão (1929), Afonso Ávila
(1928), José Lino Grunewald (1931-2000), José Guilherme Merquior (1941-1991), Haroldo de Campos (1929-
2003), Augusto de Campos (1931) Décio Pignatari (1927-2012), Mário Chamie (1933-2011) e outros.

Fonte: Adaptado de Coutinho (2004, pp.141-142).

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UNIDADE I │ PANORAMA LITERÁRIO BRASILEIRO

Já em Bosi (1994, pp.100-101) temos mais informações concisas da historiografia


literária no Brasil retornando ao Romantismo:

O índio, fonte de nobreza nacional, seria, em princípio, o análogo do


bárbaro. O Romantismo refez sua semelhança à imagem da Idade Média,
conferindo-lhe caracteres “romanescos” de que se nutriu largamente a
fantasia de poetas, narradores e eruditos durante quase meio século [...].
Esse complexo ideoafetivo não abarca todo o Romantismo, mas uma
área bem determinada como classe e como tendência intelectual [...].
O nosso indianismo de Varnhagen a Alencar, pendeu para o extremo
conservador, como todo o contexto social e político do Brasil dos fins da
Regência à década de 1960. De qualquer forma, o cuidado da pesquisa
e da documentação é saldo positivo nesse período que nos deu, além
da obra de Varnhagen, as monografias de Joaquim Noberto de Souza
Silva (Rio, 1820-1891), dentre as quais são de leitura útil ainda hoje a
História da Conjuração Mineira (1873), norteada pelo mesmo espírito
nacionalista dos sequazes de Magalhães, e as introduções aos principais
poetas da plêiade mineira, que ele reeditou e anotou profusamente. Foi
Noberto um dos pilares em que se assentou a nossa historiografia literária
até a publicação das obras maduras de Sílvio Romero e José Veríssimo.

Basicamente a Literatura Brasileira compreende o “conjunto das obras literárias


produzidas no Brasil em língua portuguesa desde os tempos colônias” [...]
“Constituiu-se, destarte, desde cedo uma elite intelectual, que se dava ao cultivo
das letras. Assim, a Literatura Brasileira originou-se no início da colonização”
(COUTINHO, 2004).

Sobre como a sociedade brasileira se moldou na literatura romancista que provinha


de Portugal, aparecem as figuras proeminentes da literatura portuguesa de um lado,
apresentada pelos literários conhecidos e do outro, brasileira, pelos índios:

Gonçalves de Magalhães, Gonçalves Dias e José de Alencar, ao


introduziram e consolidarem o romantismo no Brasil, incorporaram à
discussão política do nacionalismo a tese da nacionalidade na literatura,
a que, fatalmente, se seguiu a da nacionalidade na língua. Enquanto
o grupo dos críticos, com visão mais ampla do horizonte abrangido,
cedo chegou ao conceito de nacionalidade linguística, o grupo dos
escritores ficou preso à problemática da língua como instrumento de
trabalho e, nessa visão, foi incapaz de estender sua apreciação à própria
estrutura da realidade linguística [...]. Ao introduzir o romantismo no
Brasil, Gonçalves de Magalhães tomou o tema do índio como aquele

16
PANORAMA LITERÁRIO BRASILEIRO │ UNIDADE I

que convinha essencialmente a essa introdução. O brasileiro era


resultado da interação com o índio e o problema deste foi sempre o
problema abrasador dos séculos anteriores. Ninguém poderia melhor
preencher o ideal romântico do herói nacional senão o índio [...]. A
língua que queria Gonçalves Dias para o Brasil era a língua portuguesa,
porém com um estilo brasileiro [...]. Para sermos mais precisos, temos
de dizer que Gonçalves Dias foi a segunda etapa do movimento que
levou à independência do instrumento linguístico dos modernistas.
Antecedido por Gonçalves de Magalhães e seguido por José de Alencar,
os três deram sua contribuição significativa ao processo de mudança,
pugnando pelo estilo brasileiro que se situava, com eles, no plano
semântico da expressão linguística e não ainda no plano da estrutura
(COUTINHO, 2004, pp.346-348).

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CAPÍTULO 3
O papel dos jesuítas

O jesuitismo, contrariamente ao que muitos imaginam, teve seu papel bastante


controverso, mas inegavelmente atuante em muitos aspectos da humanidade, já que
são considerados os “soldados do papa” até os dias de hoje. Não somente na literatura,
mas nas ciências e alquimia da época. Sua influência se propagou para o mundo por
meio do evangelismo dos adeptos à Companhia de Jesus (Os jesuítas).

Os jesuítas, chegados meio século depois de Cabral só usavam,


praticamente, na América, o termo língua. Aliás, é fato comprovado por
Davi Lopes que, no Oriente, a língua portuguesa teve destino diverso
daquele do Brasil. Como os povos encontrados tinham tecnologia igual
ou superior à dos portugueses, tinham interesse em plantar entre
os lusitanos seus turgimões, não somente razões comerciais mas,
principalmente por motivo de segurança [...]. Ao chegarem ao Brasil em
1549, os jesuítas só tinham nove anos em Portugal. No entanto, foram
suficientes para percorrerem todos os graus de poder, sempre favorecidos
por Dom João III, com dotações de colégios e privilégios entre os quais o
Colégio das Artes de Coimbra, em 1542. Este favorecimento continuou,
inclusive oficializado pela proteção do Concílio de Trento, no capítulo
XVI de sua seção XXV (1563). O que encontraram no Brasil, porém, foi
para eles inteiramente novo e inusitado, como se depreende das cartas
que o padre Nóbrega escreveu, desde 1549, ao rei e aos seus superiores.
Só o fato de escrever diretamente ao rei para queixar-se indica a elevada
preeminência dos jesuítas e, ao mesmo tempo, a surpresa diante do que
encontram no Brasil (COUTINHO, 2004, pp.267, 275).

Os jesuítas, e por eles mesmos denominados “Soldados do Papa” eram considerados


por muitos algo santo, enquanto outros viam-na como uma onda inimiga nunca dantes
vista na história da Igreja e no mundo. Tumultuou as certezas e hierarquias da Igreja
Católica, a fim de transformar a paisagem intelectual, cultural e devocional da Europa
e ainda interferir nas sucessivas controvérsias da Reforma, da construção de impérios,
do Iluminismo e da Revolução. O julgamento de sua história seria sempre conflituoso
(WRIGHT, 2006).

O historiador Jonathan Wright ainda nos traz riquíssimas informações sobre o


jesuitismo, uma vez que se aprofundou firmemente na história em busca de conhecer a
atuação da Companhia em todos os setores do mundo! De acordo com ele:

18
PANORAMA LITERÁRIO BRASILEIRO │ UNIDADE I

Como era de se esperar, administraram sacramentos homilias e


proporcionaram instrução para um grupo de homens tão variado como
Voltaire, Castro, Hitchcock e Joyce. Mas também criaram carneiros em
Quito, foram donos de haciendas no México, produtores de vinho na
Austrália e agricultores nos Estados Unidos anterior à Guerra Civil. A
companhia iria florescer no mundo das letras, nas artes, na música, na
ciência, teorizar a respeito da dança, das doenças, das leis da eletricidade
e da ótica. Iriam confrontar os desafios de Copérnico, Descartes e
Newton, e 35 crateras na superfície da lua viriam a ser batizadas com
o nome de cientistas da ordem. Missionários jesuítas iriam abastecer
a Europa com narrativas a respeito de culturas desconhecidas, relatos
sobre novos rios, novas estrelas, novos animais, plantas, drogas [...]
e uma variedade impressionante de mercadorias incríveis em meio
a isso tudo [...]. Protestantes da Reforma, filósofos do século XVIII e
liberais do século XIX se voltaram contra eles. Eles enfureceram John
Donne, Blaise Pascal, Thomas Jefferson e Napoleão, e se procuraram
proteger, definir e cultivar sua reputação – especialmente idolatrando
seus santos e mártires –, outros tentaram arrancá-la à força do controle
deles (WRIGHT, 2006, pp.17-18).

A Companhia se alastrou na medicina, farmacologia, ciências gerais como a física,


química e biologia, “seus conhecimentos de química permitiram que intrigasse plateias
chinesas com truques envolvendo nitrato de potássio e pós explosivos” (WRIGHT,
op.cit, p.94).

Voltaire e Rousseau, assim como Byron e Chateaubriand opinavam radicalmente sobre


o que ocorria na época, sendo de grande valia para a elite brasileira. Noções ideológicas
eram invertidas em tempo e fora de tempo dentro daquele contexto; padres tornando-se
maçons; religiosos que se professavam liberais, inclusive tradutor de Salmos fez-se
intérpretes da teoria do bom selvagem (BOSI, 1994).

O ecletismo, portanto, teve sua origem nos gêneros públicos e na poesia retórica a sua
melhor expressão; por poesia retórica o entendimento de Bosi (1994) é que trata do
“verso que se propõe abertamente ensinar, persuadir, moralizar; em suma, incutir um
complexo de ideias e sentimentos”. Ainda continua:

O iluminismo favorecia o gosto pedagógico, ministrando o útil,


enquanto cabia ao idílio árcade providenciar o agradável. Com o nosso
hibridismo ilustrado-religioso do começo do século XIX, é o poema
sacro, moralizante ou patriótico que vai substituir as tiradas em prol
das luzes do século anterior [...]. O patriótico e o moralizante aparecem

19
UNIDADE I │ PANORAMA LITERÁRIO BRASILEIRO

copiosos nas Poesias Avulsos de Américo Elísio (1825), pseudônimo de


José Bonifácio de Andrada e Silva, cujo relevo de estadista tem deixado
em segundo plano (e não sem justiça) as veleidades do poeta (BOSI,
1994, pp. 81-82).

Dentro de um contexto iluminista ainda enxergando através dos olhos jesuítas, eles:

Valorizavam um iluminismo da fé [...], mas eles faziam parte de


uma tradição que insultava o fideísmo e insistia no papel da razão
na vida espiritual: não usando a razão para criar crença, talvez, mas
encarando-a como uma ferramenta com a qual a crença poderia ser
explorada e expandida. Eram os inimigos dos jesuítas, os jansenitas, de
quem as sensibilidades religiosas suspeitavam mais da razão. O abismo
entre o que os jesuítas e o Iluminismo supostamente defendiam pode
ser exagerado com facilidade, o que nos leva de volta afinal àqueles
dois tipos de luz: a luz da razão e a luz da fé, a era do Iluminismo
representando uma e os jesuítas representando a outra: inimigos
implacáveis. Uma dicotomia perfeita, certamente, mas com uma
orientação meio equivocada (WRIGHT, 2006, pp.192-193).

Desde o começo, ano de Pe. Manuel da Nóbrega no Brasil, o negro aparece como escravo
dos jesuítas. De cara eles já enxergavam que os índios não cabiam no papel de escravos,
desta forma captaram cada vez mais a simpatia dos silvícolas, os quais necessitavam de
proteção contra as investidas escravizantes ou exterminadoras dos portugueses. Desta
maneira, o negro, o qual imediatamente chegava como escravo estava incerto em seu
futuro. Os jesuítas eram por sua vez, aliados do Rei na “catequização” do escravo negro,
ou seja, no ensinar a língua falada no Brasil por meio de orações e frases do dia a dia
(COUTINHO, 2004).

Concluímos, portanto, muito embora de modo extremamente superficial, uma vez


que a história dos jesuítas na história vai muito mais além. Marcada por avenças e
desavenças, por amor de uns e ódio de outros; envolvida em alta gama de boatos e
fatos, a Companhia foi acusada de dezenas de atitudes as quais por eles eram negadas
veementemente como envolvimento com pedofilia, bruxaria, no poder governamental,
falsas profecias, derramamento de sangue, supostos alvos jesuítas e outros assassinados
(tal como de Henrique IV, Elisabeth I, Carlos I e II, Wiliam McKinley, Abraham Lincoln
etc.) e enganações diversas.

20
PANORAMA LITERÁRIO BRASILEIRO │ UNIDADE I

Marquês de Pombal X Os jesuítas


Assim como os jesuítas tinham adeptos e não adeptos, favoráveis e
desfavoráveis às atitudes da Companhia, também possuíam amigos
e inimigos, inclusive os próprios Papas, onde uns apoiavam e outros
até mesmo perseguiam. Esta mistura de amor e ódio chegou ao nosso
contexto literário também. (Disponível em: <https://noseahistoria.
files.wordpress.com/2010/11/marqus1.jpg>.)

No início do século XX precisou-se sobremaneira de um herói que militasse contra o


jesuitismo, levantando um dos maiores opositores da ordem: Marquês de Pombal.

[...] gritando para a sua estátua na Avenida da Liberdade em Lisboa que


sua ajuda era mais uma vez necessária para derrotar o inimigo jesuíta.
Finalmente, havia a convicção de que todos os membros da Companhia,
qualquer que fosse a época ou lugar, compartilhavam uma culpa em
comum, uma série de crimes e contravenções, todos relacionados,
todos provenientes de um compromisso ininterrupto com a maldade e
crueldade. Um escritor no século XIX chegou até culpar a Companhia
por ter causado a Guerra Civil Americana. Estava certo de que as
centenas de milhares de vítimas deveriam ser acrescentadas às listas
que continham as vítimas do massacre da noite de São Bartolomeu em
1572 e o derramamento de sangue que se seguiu à revogação do Edito
de Nantes em 1685 (WRIGTH, 2006, p.159).

O Massacre da Noite de São Bartolomeu em que aproximadamente 70 mil cristãos


foram cruelmente assassinados. Para aprofundar-se no assunto, sugerimos o
filme A Rainha Margot de 1993, dirigido por Patrice Chéreau.

Antes de acabar o reinado de João V, publicou-se de maneira anônima o Verdadeiro


método de estudar, de Luís Antônio Verney (1746). O qual refletia claramente o
descontentamento que havia contra o domínio jesuíta do ensino, a obra foi a mola
propulsora de mudança da sociedade portuguesa, quase anestesiada pela ação cultural
dos jesuítas e pela falta de ação dos governantes (COUTINHO, 2004).

A investida de Verney em prol da língua portuguesa estava destinada a dois resultados


no reinado seguinte:

»» Oficialização do ensino da língua portuguesa em todo o reino, inclusive


no Brasil. Até então, não existia como mandamento legal nas escolas.

21
UNIDADE I │ PANORAMA LITERÁRIO BRASILEIRO

»» Início de culto aos clássicos da língua, escolhidos segundo o critério


enunciado por Verney.

Todavia, não é nosso objetivo aqui tratar em detalhes, mas sim entender sua importância
e influência na literatura e no mundo; uma vez também que os “jesuítas resistiram
com determinação e orgulho ao processo de sua exclusão da cena política e cultural”
(COUTINHO, 2004, p.320); desta maneira, finalizamos esse contexto nas palavras de
Wright (2006):

O legado das missões jesuítas não é simplesmente um legado de ruínas


[...] é enorme: a Europa aprendeu a respeito do mundo e o mundo
aprendeu a respeito da Europa; culturas se encontraram, muitas vezes
zombaram e deixaram marcas umas nas outras, mas algumas vezes
tentaram entender, o que nem sempre significou respeitar, a diferença,
os resíduos de séculos intermináveis e invisíveis há muito transcorridos.
(WRIGHT, 2006, p. 134)

O Papa atual no poder e a frente da Igreja Católica, não é adepto ao jesuíta, ou


favorável somente, mas ele é um Jesuíta. Francisco Xavier, juntamente com
Inácio de Loyola, foram os fundadores da Companhia no século XVI. Qualquer
semelhança por ele se denominar Papa Francisco I (o único Francisco da história),
não é mera coincidência.

22
CAPÍTULO 4
Uma breve história da literatura
brasileira

Vejamos a seguir um breve histórico da literatura no Brasil, dado que é direito


constitucional o conhecimento de tais contextos históricos importantes para a realidade
de hoje, a qual explica em grande medida de como chegamos até aqui.

Quadro 4. Resumo histórico.

ORIGEM

Originou-se a Literatura Brasileira da “situação” nova criada pelo descobrimento e colonização da nova terra. Nasceu após as grandes descobertas de
um novo mundo, um novo homem. Todo esse complexo cultural novo tinha de dar lugar a uma nova arte, a uma nova poesia, a uma nova literatura, a
uma nova dança, a um novo canto, a novas lendas e mitos populares. Para estudar a história literária brasileira, em vez de um critério político, deve-se
adotar uma filosofia estética compreendendo-a como um valor literário. Em consequência, o estudo da Literatura Brasileira é feito pelos grandes estilos
em que se expressou: Barroquismo, Arcadismo, Neoclassícismo, Romantismo, Realismo, Naturalismo, Parnasianismo, Simbolismo, Impressionismo,
Modernismo.

Os primeiros documentos escritos produzidos no Brasil não pertencem à literatura, mas à história e à sociologia. Desses
motivos saíram as “primeiras letras” escritas na colônia acerca de fatos, coisas e homens: a obra dos jesuítas, seja a parte
tipicamente literária, lírica ou dramática, seja o acervo de cartas e informes em torno das condições da colônia.
Barroco Na segunda metade XVIII, porém, o ciclo do ouro já daria um substrato material à arquitetura, à escultura e à vida musical,
de sorte que parece lícito falar de um “Barroco Brasileiro” e, até mesmo, mineiro. Alguns trabalhos do Aleijadinho, de Manuel
da Costa Ataíde, e composições sacras de Lobo de Mesquita. A poesia coetânea delas já não é, senão residualmente,
barroca, mas rococó, arcádica e neoclássica, havendo portanto uma discronia entre as formas expressivas.
Foi pela voz barroca dos jesuítas que a Literatura Brasileira teve início. Descontada a literatura de conhecimento da terra,
a primeira manifestação de sentido estético foi a literatura jesuítica, sobretudo produzida por Anchieta, o fundador da
Literatura Brasileira, em que se encontra o ponto alto da estética barroca em prosa.
Literatura jesuítica O Barroco, assim, contamina a produção cultural da época colonial, informando as origens da Literatura Brasileira, pois
além dos gêneros propriamente literários, poesia e drama, ela marca os panegíricos, a oratória, os escritos políticos,
históricos, jurídicos, militares. É, pois, do maior interesse o seu conhecimento pela luz que pode fornecer ao estudo da
formação Literária Brasileira.
A tendência classicista penetrou o século XVIII criando focos de Neoclassicismo nas literaturas ocidentais. Ao gosto
barroco grandioso e da ostentação, sem que haja completa libertação, pois o Barroco continua sob formas degeneradas
e decadentes, sucede uma procura das qualidades clássicas da medida, correção, conveniência, disciplina, simplicidade,
delicadeza, que vão dar no Rococó e Arcadismo.
O ideal neoclassista dominou até o final do século XVIII e início dos XIX. De todos os árcades, o único a ter pertencido
a uma corporação dessa natureza foi Basílio da Gama, filiado à Arcádia Romana. A reação clássica para o Arcadismo
Neoclassicismo
significava uma volta à simplicidade e pureza dos antigos, sobretudo segundo os modelos anacreôntico e pindárico, e
Arcadismo Rococó
realizando-se por meio do verso solto, em odes e elegias, numa identificação com a natureza, onde pensava-se residir todo
o bem e o belo. Daí a valorização da vida pastoril, simples, pura e pacífica.
O arcadismo confunde-se com o que hoje se chama o Rococó literário: culto sensual da beleza, afetação, refinamento,
frivolidade, elegância, linguagem melodiosa e graciosa, sentimentalismo, lascívia, gosto da natureza, intimismo, valorização
da vida pastoril e bucólica. Passa-se com ele da época cortês para o subjetivismo da era da classe média. Gonzaga, vate
de Marília, é o modelo brasileiro da literatura arcádica e rococó.

23
UNIDADE I │ PANORAMA LITERÁRIO BRASILEIRO

O espírito autonômico e nativista desde cedo veio conduzindo a Literatura Brasileira para a diferenciação cada vez maior,
distanciando-se da portuguesa, consolidando-se os ideais nativistas e a consciência comum, crescendo em importância a
figura do mestiço de sangue e alma, aprofundando-se a diferenciação linguística, num processo de adaptação ao ambiente
Nativismo físico, à nova situação histórica, ao homem novo que se foi criando e desenvolvendo.
De Bento Teixeira a Gregório de Matos, a Botelho de Oliveira, ao movimento academicista do século XVIII, ao Rococó
arcádico, o processo autonômico e de descolonização se foi configurando, para se consolidar com o Romantismo, no
século XIX. Tendo-se formado no século XVI, a Literatura Brasileira tornou-se autônoma com o Romantismo.
O nativismo transforma-se em nacionalismo. O processo de adaptação da literatura ao meio físico social, histórico, ao
novo homem que se formara no território americano, encontrou no Romantismo o ambiente mais propício. O foco de
Romantismo
influência cultural passou à França, em vez de Lisboa e Coimbra. O espírito brasileiro tornou-se autônomo. O Romantismo é
composto por quatro fases que você verá mais à frente neste material.
A partir de 1870, processa-se radical transformação literária, em reação contra o Romantismo. Sob a influência da reforma
filosófica produzida na Europa, com as novas doutrinas positivistas, materialistas, deterministas, evolucionistas, cientificistas,
Realismo-Naturalismo a geração que se iniciava na vida intelectual na década de 1870 deixou-se impregnar por esse espírito, tornando-se a
geração materialista. Assim foi empreendida uma verdadeira revolução da vida cultural do país. A objetividade passou a ser
a regra fundamental da criação artística.
Em poesia, o movimento que correspondeu ao Realismo-Naturalismo foi o Parnasianismo, à imagem de igual escola da
França. Suas figuras foram:
Parnasianismo a) Alberto de Oliveira (1857-1937); Raimundo Correia (1859-1911); Olavo Bilac (1865-1918); Vicente de Carvalho
(1866-1924).
b) O Parnasianismo teve numerosos cultores muito além de sua época criadora.
Mas, na década de 1890, produziu-se uma reação antiparnasiana, também de influência francesa, com o movimento
Simbolista. Consistiu numa revanche do espírito subjetivista, individualista, de interiorização, de espiritualidade, contra o
Simbolismo objetivismo, o realismo, a exteriorização, quando o símbolo como recurso poético.
Seus principais representantes foram Cruz e Souza (1861-1898), Alphonsus de Guimaraens (1870-1921), Emiliano
Perneta (1860-1921) e B. Lopes (1859-1916).
A tendência regionalista na Literatura Brasileira é de longa tradição, mergulhando suas raízes nos movimentos nativistas
e de busca do caráter brasileiro para a literatura que tiveram manifestações no indianismo, no sertanismo, no caboclismo,
e que vieram a desaguar no Regionalismo, sob suas diversas formas ou ciclos: o ciclo do cangaço e da seca, o da
mineração, o praieiro, o do gado, o nortista, o nordestino, o baiano, o central, o gaúcho e outros.
Regionalismo
Destacam-se Afonso Arinos (1868-1916), Simões Lopes Neto (1865-1947), Valdomiro Silveira (1873-1941), Coelho
Neto, Afrânio Peixoto (1876-1947), Xavier Marques (1861-1942), Lindolfo Rocha (1862-1911), Domingos Olímpio
(1860-1906), José do Patrocínio, Monteiro Lobato (1882-1948), Hugo de Carvalho Ramos (1895-1921), Gustavo
Barroso (1888-1959), Mário Sete (1886-1950), Lucílio Varejão (1892-1922) e alguns outros.
As duas primeiras décadas do século XX foram marcadas pela decadência dos estilos anteriores, ou a sua mistura.
Época de transição, o sincretismo a caracterizou, sincretismo, sobretudo manifesto na poesia lírica, em que as heranças
simbolistas e parnasianas se intercomunicaram por meio de epígonos ou indefinidos. São assim as figuras de Mário
Sincretismo e Transição
Pederneiras (1867-1915), Augusto dos Anjos (1884-1914), Raul de Leoni (1895-1926), José Albano (1882-1914),
e numerosos outros, todos caracterizados pelo uso de elementos formais ou conteudísticos do Parnasianismo e do
Simbolismo.
Em 1922, preparado pelos movimentos de vanguarda da Europa pós-guerra, e pela situação brasileira, desencadeou-se
a renovação literária e artística denominada Modernismo, a partir da Semana de Arte Moderna, realizada em fevereiro de
Modernismo 1922 em São Paulo. Se o Romantismo foi a autonomia literária, o Modernismo foi a maioridade. Seu principal objetivo
foi destruir as formas obsoletas, instaurando uma nova ordem literária. A princípio, usaram-se as armas do escândalo, da
piada, da destruição. Depois, passou-se à reconstrução.
O Modernismo arejou tudo, beneficiando também a crítica literária que, continuava a ser, em plena década de 1920, uma
fortaleza do academismo neoparnasiano.

Crítica Dentre os novos críticos encontram-se nomes como Tristão de Ataíde, Álvaro Lins, Afrânio Coutinho. Antônio Cândido de
Mello e Souza, além de Otto Maria Carpeaux que aparece hoje como divisor de águas entre modos de ler menores e,
não raro, provincianos, e uma consciência crítica poderosa da literatura como sistema enraizado na vida e na história da
sociedade.

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PANORAMA LITERÁRIO BRASILEIRO │ UNIDADE I

Cultivados no Brasil, ao longo dos quatro séculos e meio de produção literária, foram:
a) a poesia lírica, a epopeia, a ficção (romance e conto), o teatro, a crônica, as memórias e diários, as cartas. Os mais
importantes foram o lirismo, o romance, o conto e a crônica.
Gêneros literários
No que concerne aos gêneros em que se expressou a Literatura Brasileira por meio dos estilos apontados acima, é
necessário considerar a fase inicial, em que não se estabeleciam com nitidez os limites do literário em relação à religião, à
política e à história, nem mesmo se fazia uma distinção de fronteiras entre os gêneros.
A poesia lírica nasceu com os primeiros europeus que trabalharam na colonização e que encontraram nos indígenas suas
expressões elementares de poesia. Sempre houve, desde o início, acentuada inclinação pelo lirismo, herança medieval
das mais significativas. É um lirismo sentimental, de exaltação amorosa, de confissão pessoal e íntima, de melancolia,
subjetivismo, saudade, e de êxtase ante a natureza, é tão forte que impregna outros gêneros. Assim, é riquíssima a
Lirismo produção lírica brasileira.
O Pe. José de Anchieta foi o primeiro poeta, sendo desta maneira o fundador da Literatura Brasileira.
O Lirismo, a partir daí, desenvolveu-se de conformidade com os cânones estéticos dos diversos estilos da época.
A ficção começou na Literatura Brasileira praticamente com o Romantismo. Antes tinha havido um livro bastante significativo
da estética barroca em prosa, o Compêndio narrativo do peregrino da América (1728), de Nuno Marques Pereira.
Também é precursor a narrativa Aventuras de Diófanes (1752), de Teresa Margarida da Silva e Horta. Mas, na realidade,
com técnica narrativa moderna, só com o Romantismo é que a ficção se firmaria. Vários autores lhe deram início: Lucas
José de Alvarenga (1768-1831), Pereira da Silva (1819-1898), Justiniano José da Rocha (1812-1862), Francisco
Adolfo de Varnhagen (1816-1878), Joaquim Noberto de Souza e Silva (1820-1891), Teixeira de Souza (1812-1861).
Em meados do século, no apogeu do Romantismo, J.M. Macedo (1820-1862), José de Alencar (1829-1877), Bernardo
Guimarães (1825-1884), Franklin Távora (1842-1888), Visconde de Taunay (1843-1899), Manuel Antônio de Almeida
(1830-1861), ora na fórmula indianista, ora na sertanista, ora na regionalista, ora na urbana, deram forma definitiva ao
Ficção romance brasileiro. Deveu-se a Alencar a fixação definitiva do gênero, nos seus aspectos estrutural e temático.
A ficção brasileira atingiu um alto grau de força e representatividade em relação ao ambiente brasileiro, com Machado de
Assis a sua figura máxima.
O Realismo ficcional aprofunda a narração de costumes contemporâneos da primeira metade do século XIX e de todo o
século XVIII. Aguçam-se os dons de observação. A configuração do típico foi uma conquista do Realismo.
Em termos de construção, houve descarnamento do processo expressivo. O determinismo reflete-se na perspectiva
em que se movem os narradores ao trabalhar as suas personagens. Assim, do Romantismo ao Realismo, houve uma
passagem do vago ao típico, do idealizante ao factual.
Em termos de valor, deve-se distinguir um teatro Romântico menor, preocupado com a nacionalização da nova literatura.
Durante o Realismo, outros autores tiveram intensa atuação no teatro, como França Júnior (1838-1890), Artur Azevedo
(1855-1908), Machado de Assis (1839-1908), Roberto Gomes (1882-1922). No século XX, Cláudio de Souza (1876-
Teatro 1954), Viriato Correia (1884-1967), Oduvaldo Viana (1892-1972), Joraci Camargo (1898-1973).
Aliando técnicas do expressionismo e da psicanálise a preocupações sociais, o movimento teatral da década de 1860
mostra intensa efervescência, com as experiências vigorosas inclusive na cenarização e execução, a que um grupo de
excelentes atores dá grande relevo. É o teatro brasileiro consolidado.
Extremamente móvel e individual, a crônica é de grande popularidade e tem sido das mais ricas em contribuições originais.
Aparentado com o ensaio familiar dos ingleses, encontra o gênero enorme ressonância, ocupando colunas regulares de
jornais e revistas. Tem a forma de pequena exposição em prosa, leve, informal, impessoal, bisbilhoteira, em linguagem
Crônica coloquial, a propósito de fatos, cenas ou pessoas. Grandes nomes da Literatura Brasileira cultivam ou cultivaram a crônica.
São alguns deles: José de Alencar, Machado de Assis, Raul Pompéia, Araripe Júnior, Humberto de Campos, Henrique
Pongetti, Álvaro Moreira, Manuel Bandeira, Raquel de Queirós, Eneida, Carlos Drummond de Andrade, Rubem Braga,
Fernando Sabino.
No que concerne a outros gêneros, não tem sido igualmente importante a contribuição brasileira. Quanto ao épico, só
apareceram tentativas com Basílio de Gama, Santa Rita Durão e Gonçalves de Magalhães, ficando o espírito épico para
Outros Gêneros contaminar em certos momentos o lirismo, como em Castro Alves, ou a ficção, como no Macunaíma, de Mário de Andrade.
Quanto às memórias, diários, epistolografia, máximas, tem sido escassa a produção brasileira, excetuando-se nos últimos
tempos e memorialismo.

Fonte: Adaptado de Coutinho (2004, pp.131-147) e Bosi (1994, pp.18, 127,147).

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UNIDADE I │ PANORAMA LITERÁRIO BRASILEIRO

Recapitulação metodológica
É desta maneira que chega-se uma conclusão, a qual Coutinho (2004) afirma ter feito
pela primeira vez na história dos estudos sobre a realidade linguística brasileira, e que
de forma rigorosa fora feito um levantamento dos fatores históricos e socioculturais
que estiveram presentes no processo de formação da língua nacional brasileira. Por
isso, indicamos a leitura (para o aluno que tiver interesse de se aprofundar neste campo
de assunto, o livro de Afrânio Coutinho intitulado A Literatura no Brasil – Introdução
Geral). Vejamos, portanto, suas considerações:

Quadro 5. Recapitulação metodológica, síntese histórica da questão e conclusão.

1 – A aproximação pelos europeus de povos desconhecidos se fazia, em fins do século XV, segundo táticas sociais e psicológicas assimiladas
praticamente dos turgimões orientais.
2 – No Brasil, a primeira interação linguística se fez com o primeiro português aqui deixado solitariamente, chamado esse português de língua em
semelhança funcional com o turgimão, já que estabelecia pontes culturais com o nativo.
3 – Os jesuítas disseminaram em todo o território brasileiro a prática das pontes culturais, acrescentando, porém, a elas, deliberadamente, o hábito
linguístico de falar arremedando o português tal como era realizado pelo nativo, método do grande evangelizador São Francisco Xavier, segundo a
opinião corrente da época.
4 – Tanto essa prática quando esse hábito, em contraste com a ausência de qualquer política educacional da parte dos portugueses durante dois
séculos e meio, levaram à formação de uma realidade linguística brasileira inteiramente independente daquela que correspondia a processos
linguísticos em desenvolvimento no solo português.
5 – Levada a coroa lusitana a assumir oficialmente, em pleno século XVIII, a língua portuguesa como língua nacional, em repúdio à língua instintiva,
de uso até então, defrontou-se com a existência concreta de uma realidade linguística brasileira diversa na América, classificando-a automaticamente
como dialeto dentro, na época, do sentido dessa palavra, dependente do de língua nacional.
6 – Por razões de Estado, foram os jesuítas expulsos do Brasil, deixando um vácuo no ensino público e na política indigenista, logo ocupado
autoritariamente pelo governo em face do peso econômico do Brasil e de seu potencial de libertação.
7 – Implantada a língua nacional portuguesa em contradição com a realidade da língua oral brasileira, única existente, criou-se uma tensão linguística
não claramente conscientizada pelos brasileiros, a qual aflorou, pela primeira vez, no primeiro ano de funcionamento da Câmara dos Deputados.
8 – A solução implantada pelos portugueses de um regime monárquico no país conduzido de acordo com a índole portuguesa, correspondeu uma
política de achatamento e desprestígio da realidade linguística brasileira.
9 – A reação à política linguística da monarquia foi primeiro promovida por escritores românticos que precisavam de temas nacionais.
10 – A questão da língua do Brasil, posta inicialmente como questão dependente da literatura nacional, desprendeu-se desta e passou a existir
autonomamente à medida que se precipitavam os ideais republicanos.
11 – Proclamada a República, a língua continuou dependente, agora à distância, do dirigismo cultural lusitano por força do ambiente de liberdade
espontânea que se criou após a queda da monarquia, gerando uma contradição que forçava uma solução.
12 – O movimento modernista encaminhou esta solução, consagrando a língua brasileira como instrumento expressional por excelência repudiando a
persistente norma lusitana de língua escrita e de língua literária.
13 – Contra o movimento modernista na língua reagiu um grupo de intelectuais, solidário com a política linguística salazarista, o qual usou, para a
consecução de seus propósitos, o problema ortográfico que sensibilizava a Academia Brasileira e a política universitária de ensino do vernáculo, tudo
sob o apoio ostensivo do regime ditatorial brasileiro.
14 – Nas duas oportunidades de reconhecimento público da língua brasileira na Assembleia Constituinte (1934 e 1946), foram seus defensores
neutralizados por manobras inspiradas pelos lusófilos da linha filológico-gramatical.
15 – Consolidada a língua literária do Modernismo, os adversários da língua brasileira foram, por sua vez, neutralizados pela introdução no país da
descrição linguística estruturalista, com o consequente banimento da gramática clássica e promoção generalizada da língua oral, reforçada pelos meios
de comunicação modernos em revistas, jornais e telenovelas.

26
PANORAMA LITERÁRIO BRASILEIRO │ UNIDADE I

16 – A partir da promoção da pronúncia-padrão, no Brasil, por meio de congressos, encontros e projetos previamente direcionados, os lusófilos
passaram a propagar a necessidade do estabelecimento de uma norma culta, ponto de apoio para nova unificação ortográfica e gramatical, bem
como para a retomada da política linguística salazarista. Neste estado se encontra, pois, agora, a questão da língua do Brasil: tentativa, pelo lusófilos,
de recobrar o terreno perdido para os linguistas depois de terem tirado de cena os defensores da língua brasileira. Estes, porém, estão prontos para
voltar com sua proposta de produção do ato político de denominar a língua nacional como língua brasileira.

Fonte: Adaptado de Coutinho (2004, pp.371-373).

As figuras mais proeminentes da literatura


brasileira
Temos alguns nomes que jamais sairão de nossas mentes, uns menos conhecidos,
outros tão aclamados que já ouvimos que deram inspirações para peças de teatro, filmes
famosos (com fama internacional), livros altamente indicados nas escolas, e é assim em
sua maior parte que nos lembramos das maiores e melhores obras as quais o aluno em
uma boa formação fundamental teve acesso.

A literatura em geral, bem como as ciências sociais, desde o século XIX representaram
um importante sentido na formação da identidade cultural brasileira. Quando pensamos
em Gonçalves Dias e José de Alencar, logo nos remetemos ao romantismo, importante
base da literatura e identidade brasileira.

Quadro 6. As principais mentes e suas características da Literatura Brasileira.

ARCÁDIA E ILUSTRAÇÃO
Cláudio estreou como cultista e, sem dúvida, ecos do Barroco eram os versos que se produziam na Coimbra. Datam desse
Cláudio Manuel período coimbrão o Munúsculo Métrico, romance heroico, o Epicédio em Memória de Frei Gaspar da Encarnação, o Labirinto de
da Costa Amor, o Culto Métrico e os Números Haermônicos, todos escritos entre 1751 e 1753.
(1729-1789) Cláudio tentou com menor êxito a poesia narrativa e compôs a Fábula do Ribeirão do Carmo e o poemeto épico Vila Rica.
Ambos são curiosos documentos da oscilação que sofria o escritor entre o prestígio da Arcádia e as suas montanhas mineiras.
A mesma ambivalência e o mesmo esforço para resolvê-la no trato com a palavra encontra-se em José Basílio da Gama. O seu
Uraguai (1769), poemeto épico, tenta conciliar a louvação de Pombal e o heroísmo do indígena; e o jeito foi fazer recair sobre o
jesuíta a pecha de vilão, inimigo de um, enganador do outro.
Basílio da Gama O Uraguai lê-se ainda hoje com agrado, pois Basílio era poeta de veia fácil que aprendeu na Arcádia menos artifício dos temas
(1741-1795) que o desempenho da linguagem e do metro.
A natureza é colhida por imagens densas e rápidas; não são já mero arcadismo, mas caminho para o paisagismo romântico. Esse
móvel pano de fundo, que às vezes vale por si próprio deslocando-se para o primeiro plano da tessitura narrativa, é a novidade
de Basílio no trato da epopeia.
Também Caramuru de Fr. José de Santa Rita Durão o índio é matéria prima para exemplificar certos padrões ideológicos. Mas
será uma corrente oposta à de Basílio, voltada para o passado jesuítico colonial.

Santa Rita Durão Se, pela cópia de alusões à flora brasileira e aos costumes indígenas, o Caramuru parece dotado de índole mais nativista do
que o Uruguai, no cerne das intenções e na estrutura, a epopeia de Durão está mais distante do homem americano do que o
(1722 - 1784) poemeto de Basílio.

No conjunto, porém, a sua extrema fidelidade aos módulos clássicos e às hierarquias mentais da Contrarreforma insere-o de
pleno direito na linguagem conservadora que em Portugal resistiu à maré iluminista.

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UNIDADE I │ PANORAMA LITERÁRIO BRASILEIRO

Gonzaga é conaturalmente árcade. Para os românticos, que levariam o processo ao limite, a natureza era o lugar sagrado da
paixão, o cenário divino dos seus próprios sonhos de liberdade e de glória. Mas para o árcade ela ainda é pano de fundo. Nas
liras compostas no cárcere, o desejo de temperar as próprias dores com novas galanterias e torneios mitológicos é prova de um
caráter incapaz de extremos.
Escreveu Cartas Chilenas no intuito de satirizar seu desafeto político.
Gonzaga, Silva
Alvarenga, Nas obras de Alvarenga Peixoto encontram-se traços esparsos, mas fortes, de nativismo. Em geral, combina a loa do
Alvarenga progressismo com a aceitação do governo forte: é o déspota ilustrando o seu ideal, tirano a quem se rende a Colônia na pessoa
Peixoto do nativo. Quanto ao juízo estético sobre a lírica de Alvarenga Peixoto, está pendente de poucas composições, sendo algumas de
autoria discutível.
Silva Alvarenga dá-nos a imagem cabal do militante ilustrado. Mas a atenção do leitor amante da poesia logo se voltará para a
coerência formal de sua obra, Glaura, composta de rondós e madrigais. Último dos neoclássicos de relevo, já foi considerado,
no entanto “o elo que prende os clássicos aos românticos”. É verdade também que jogar com as linhas e as cores da paisagem
para exprimir os próprios afetos é ser pré-romântico em sentido lato.
ROMANTISMO
Mestiço de origem humílima a quem se deve a autoria do primeiro romance brasileiro, O Filho do Pescador (1843). Marca a
Teixeira e Sousa ficção subliterária de Teixeira Souza o aspecto mecânico que nela assume a intriga.
(1812-1861) O culto da peripécia em todos os seus romances produz sempre a justaposição, único modo de levar adiante o romance:
acidentes, reconhecimentos, avanços e retornos, até que o processo sature o autor e o leitor e dê por encerrado o passatempo.
Foi o primeiro poeta autêntico a emergir no Romantismo. Manteve-se com a literatura do grupo de Magalhães mais de um
contato, a sua personalidade de artista soube transformar os temas comuns em obras poéticas duradouras que o situam muito
acima dos predecessores.
Gonçalves Dias Um dos caracteres da poesia americana de Gonçalves Dias, e que as distancia da frouxidão das experiências anteriores, é a
(1823-1864) entrada súbita de vigor de selvagem desejado.
O exemplo de Gonçalves Dias artífice do verso sobrevive aos românticos e toca os parnasianos. Ele é clássico do romantismo. A
sua lírica singulariza-se no conjunto da poesia romântica brasileira como a mais literária, isto é, a que melhor exprimiu o caráter
mediador entre os polos da expressão e da construção.
Foi o escritor mais bem dotado de usa geração. Em vários níveis se apreendem as suas tendências para a evasão e para
o sonho. A camada dos sonhos compõe ritmos frouxos, melodias lânguidas e fáceis que se prestam antes à sugestão de
Álvares de atmosferas que o recorte nítido de ambientes.
Azevedo As comparações e as metáforas traduzem no concreto das imagens naturais os mesmos sentimentos básicos: a flor desfolhada
(1831-1852) lembra a juventude sem viço; o sussurro da brisa semelha o suspiro do amante; e “as ondas são anjos que dormem no mar”.
Nessa literatura a fusão de libido e instinto de morte caminhava na esteira de um Romantismo em progresso enquanto trazia à luz
da contemplação poética os domínios obscuros do inconsciente.
É precisamente esse convívio tenso entre eros e thanatos que sela a personalidade do religioso e do artista malogrado.
Junqueira Freire
(1832-1855) Cria um estilo viril que nada deve aos clássicos em rigor e precisão: essa era a art romantique rica de sons e de imagens, de
movimento e de tensão, que Baudelaire cultuava como fonte de seu próprio estilo. Dela nada existia em Junqueira Freire.
As fontes populares estavam presentes no “poeta lagartixa” e “poeta de salão”. Por isso mesmo representativo do gosto
romântico médio do Brasil Império.
Laurindo Rabelo A trova, os redondilhos, as rimas emparelhadas são os seus meios de expressão congenitais, e, na mesma linha de simplicidade,
(1826-1864) são as flores que lhe oferecem material copioso para enumerações e metáforas.
Sua obra pode ser uma das balizas para um estudo que a nossa cultura reclama: o das relações entre a linguagem do povo, da
classe média e dos grupos de prestígio nos meios urbanos.
Operou uma descida de tom em relação à poesia dos anteriores. O que singulariza o poeta é o modo de compor, que remonta,
em última análise, ao seu modo de conhecer a realidade na linguagem e pela linguagem.
Casimiro de
Abreu Reduzia a natureza e o próximo a um ângulo menor: o do seu temperamento sensual e menineiro que o aproxima bastante dos
literatos fluminenses coevos.
(1837-1860)
Em tudo Casimiro é menor. Os seus versos agradaram, e creio que ainda possam agradar aos que pedem pouco à literatura: um
ritmo cantante, uma expressão fácil, uma palavra brejeira.

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PANORAMA LITERÁRIO BRASILEIRO │ UNIDADE I

O epígono por excelência foi, sem dúvida, Fagundes Varela. O único nome de relevo na poesia da década de 1860.
Fagundes Varela Mais que os seus modelos, sensível à lira patriótica de filiação liberal: índice de uma tendência que inverteu, a partir de 1860,
(1841-1875) aquele signo áulico manifesto no coro dos contentes.
Varela foi, mais que os seus modelos, sensível à lira patriótica de filiação liberal.
Preferia que o chamassem de Sousândrade. Um espírito originalíssimo para seu tempo. Romântico da segunda geração notava-
Joaquim de se nele um maior cuidado na escolha do léxico e no meneio sintático.
Souza Andrade
Mas o pedantismo ainda acerbo das Harpas não significava, nesse talento dinâmico, apenas um resquício purista: era prenúncio
(1833 - 1902) do escritor atento às técnicas de dicção, e que seria capaz de manejar com a mesma ductibilidade as fontes e os compostos do
jargão yankee.
FICÇÃO
A cronologia manda começar pelo Romance de Joaquim Manuel de Macedo. Autor de A Moreninha diluí-las em mais dezessete
romances. Em todos eles o gosto do puro romanesco é importado, mas são nossos os ambientes, as cenas, os costumes, os
Joaquim Manuel tipos, em suma, o documento.
de Macedo Percebe-se nele uma carência de realidade moral não compensada pela cópia de traços pitorescos e pelas digressões
(1820-1882) sentimentais.
Subromancista pela pobreza da fantasia, subromântico pela míngua do sentimento. Faltava a Macedo o senso vivo do ridículo em
que as convenções enredam o homem comum.
No outros polos, Memórias de um Sargento de Milícias estão isentas de qualquer traço idealizante e procuram despregar-se
da matéria romanceada graças ao método objetivo de composição, próximo do que seria uma crônica histórica cujo autor se
Manuel Antônio divertisse em resenhar as andanças e os pecadilhos do uomo qualunque.
de Almeida Em Manuel, o compromisso é mais alto e legítimo, porque se faz entre o relato de um momento histórico e uma visão
(1831-1861) desenganada da existência, fonte de humor difuso no seu único romance.
O seu valor reside principalmente em ter captado, pelo fluxo narrativo, uma das marcas da vida na pobreza, que é perpétua
sujeição à necessidade, sentida de modo fatalista como o destino de cada um.
Merece o lugar de centre pela natureza e expressão de sua obra. Em Sonhos d’Ouro, traçou um quadro retrospectivo da sua
ficção, onde se mostrara consciente de ter abraçado todas as etapas da vida brasileira.
Essas linhas indicam que pretendia cobrir com sua obra narrativa passado e presente, cidade e campo, litoral e sertão, e compor
uma espécie de suma romanesca do Brasil. No entanto, seus vinte e um romances possuem traços visceralmente românticos.
Manuel Antônio O Romantismo de Alencar é, no fundo, ressentido e regressivo, o que lhe dá sentido na história da nossa cultura e ajuda a
de Alencar explicar muitas das suas opções estéticas.
(1830-1861) O Brasil ideal, para ele, seria urna espécie de cenário selvagem, onde expulsos os portugueses, reinariam capitães altivos,
senhores de baraço e cutelo rodeados de sertanejos e peões, livres sim, mas fiéis até a morte.
O escritor que idealizara heróis míticos no coração da floresta é o mesmo que sabe recortar as figuras gentis de donzelas e
mancebos nos salões da Corte e nos passeios da Tijuca. Ao descrever a natureza e os ambientes internos, é tão preciso como
qualquer prosador do fim do século.

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UNIDADE I │ PANORAMA LITERÁRIO BRASILEIRO

São regionalistas. As várias formas de sertanismo que têm sulcado as nossas letras desde meados do século passado, nasceram
do contato com de uma cultura citadina e letrada com a matéria bruta do Brasil rural, provinciano e arcaico.
As obras mais lidas de Bernardo, O seminarista e A Escrava Isaura, devem a sua popularidade menos a um progresso na fabulação
ou no traçado das personagens do que à garra dos problemas explícitos: o celibato no primeiro e a escravidão no segundo.
O Seminarista está na linha do romance passional. Já A Escrava Isaura, foi chamado A Cabana do pai Tomás nacional.
Visconde de Taunay tinha condições de dar ao regionalismo romântico a sua versão mais sóbria. Foi capaz de enquadrar a
Sertanistas. história de Inocência em um cenário e em um conjunto de costumes sertanejos onde tudo é verossímil. Sabia explorar na
Bernardo medida justa o cômico dos tipos. No âmbito de nosso regionalismo, romântico ou realista, nada há que supere Inocência em
Guimarães, simplicidade e bom gosto.
Taunay, Távora Com a obra O gaúcho, Franklin Távora quis introduzir, já no apagar das luzes da ficção romântica, um critério mais rigoroso de
verossimilhança.
Não cumpriu com O Cabeleira sua promessa de uma literatura nordestina. Literariamente, é uma sofrível mistura de crônica do
cangaço e expedientes melodramáticos.
Os manifestos e os prólogos de Távora podem ser lidos como sinal avançado dos riscos que o provincianismo traz para a literatura;
ou, num plano histórico, como sintoma dos fundos desequilibrados que já no século XIX sofria o Brasil como nação desintegrada,
incapaz de resolver os contrastes regionais e à deriva de uma política de preferências econômicas fatalmente injusta.

TEATRO
Assinou os primeiros textos teatrais, numa linguagem coloquial que, no gênero, não foi superada por nenhum outro comediógrafo
do século passado. O tom passa do cômico ao bufo, e a representação pode virar farsa a qualquer tempo.
Luís Carlos
Seu modo de sentir o social já era bem menos conservador que do primeiro grupo romântico. O eixo de sua comédia é o
Martins Pena
crescendo da urbanização, que desintegra o velho artesanato da Corte.
(1815-1848)
São diálogos que valem como excelente testemunho da língua coloquial brasileira tal como se apresentava em meados do
século XIX.
Sua melhor obra teatral, Leonor de Mendonça, tinha linha europeia do drama histórico. Compôs o drama com os olhos postos
Gonçalves Dias na restauração do teatro português. A consciência do novo, do não mais clássico, também se revela pela justificação da prosa
(1823-1864) em lugar do verso, bem como pela apologia de um modelo shakesperiano de tragédia onde prosa e verso se revezariam
segundo o tom e o ritmo dos afetos que movem os personagens.
Caberia a Alencar insistir na dose de “brasilidade” que esse drama de costumes deveria conter. Para tanto, compôs Verso e
José de Alencar Reverso. O Demônio Familiar, comédia em que os vaivéns da intriga são obra de um escravo.
(1829-1877)
Em Mãe, Alencar entroniza no centro do drama a figura de uma escrava.

Agrário de
Os dois jovens dramaturgos, meio esquecidos pela crítica moderna, trabalharam o tema da escravidão de modo mais direto e
Meneses, Paulo
cortante que Alencar.
Eiró
REALISMO
O ponto mais alto e equilibrado da nossa ficção. O seu equilíbrio era o dos homens que, sensíveis à mesquinhez humana e à
Joaquim Maria sorte precária do indivíduo, aceitam por fim uma e outra como herança inalienável, e fazem de sua reflexão cotidiana.
Machado de Menos do que pessimismo sistemático, melhor seria ver como suma da filosofia machadiana um sentido agudo ao relativo: nada
Assis valendo como absoluto, nada merece o empenho do ódio ou do amor.
(1839-1880) A sua ficção constitui, pelo equilíbrio formal que atingiu um dos caminhos permanentes da prosa brasileira na direção da
profundidade e da universalidade.
Autor de um livro só: O Ateneu, possuía dom de memorialista finura de observação moral. Em sua obra, a captação dos
Raul Pompéia ambientes e das pessoas não dispensa o expressionismo da imagem. As aproximações são, em geral, violentas e, no caso das
pessoas, depressivas.
(1863-1895)
Não fora o seu talento excepcional de artista, Raul Pompéia teria naufragado no puro romance de tese.

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PANORAMA LITERÁRIO BRASILEIRO │ UNIDADE I

Em Aluísio, a influência de Zola e de Eça é facilmente sentida.


Em face de certa vaguidade romântica no trato das personagens, foi salutar o deslocamento do eixo tara o homem comum,
desfigurado, mais do que se acreditava, pelos revezes da herança biológica, da familiar, da profissão.
Aluísio Azevedo
O Mulato, que passa pelo primeiro romance naturalista brasileiro, dá uma boa visão do meio maranhense o tempo.
(1875-1913)
O mérito do autor estaria em saber aplicar a outros ambientes o dom de observação de que fizera prova. Somente em O Cortiço
atinou de fato a forma que se ajustava a seu talento: existe o quadro: dele derivam as figuras.
O Cortiço foi um passo adiante na história da nossa prosa.
A fortuna crítica de Coelho Neto conheceu os extremos do desprezo a da louvação. Sobressai como a grande presença literária
entre o crepúsculo do Naturalismo e a Semana de 22.
Henrique
Maximiniano As qualidades mestras de Coelho Neto ajustavam-se curiosidade, memória e sensualidade verbal.
Coelho Neto
De relevância, escreve, em 1897, Inverno em Flor, cuja obra possui viva coloração naturalista.
(1864-1934)
Em suma, sua linguagem é correta e precisa até ao pedantismo, à obscuridade, ao preciosismo. O que validamente se lhe
contesta é aquela qualidade rara de atingir sem escórias um nível de profundidade.

Júlio Afrânio
Peixoto Não deixou uma obra de ficção tão volumosa, dadas as suas múltiplas curiosidades de divulgador e erudito. Escreveu romances
de costumes rurais. Seu realismo sertanejo e, portanto, de extração romântica. No entanto, aquele seu mundanismo diplomático
(1876-1947) que lhe desvirilizara os primeiros romances o impediu aqui de ascender à epicidade bronca que o argumento propiciava.

Xavier Marques Francisco Xavier Ferreira Marques – idílico marinista, povoou sua novela Jana e Joel com os gênios e as sereias da Ilha Itaparica.
(1861-1942) O regionalismo de Xavier Marques está permeado de tons românticos.

Afonso Arinos Afonso Arinos de Melo Franco é o primeiro regionalista de real importância a considerar nesse período. Histórias e quadros
(1868-1916) sertanejos constituem o grosso de seu livro Pelo Sertão.

Compartilha com Afoso Arinos o mérito de ter iniciado em nossas letras uma prosa regional ao mesmo tempo patética e veraz.
Valdomiro
Silveira Arinos temperava a transcrição da linguagem mineira com um sensível comprazimento de prosa clássica; já em Valdomiro
predomina o gosto da fala regional em si mesma: sintaxe, modismos, léxico, fonética, quase tudo se acha colado à vivência dos
(1873-1941) homens e das coisas do interior.

Simões Lopes
Neto João Simões é o patriarca das letras gaúchas.
(1865-1916)
Alcides Maya Alcides Castilho Maya tomava uma direção aparentemente igual à Simões Lopes, mas em substância diversa, pois para ele o
(1878-1944) gaúcho representa o regionalismo artificioso dentro de um estilo entre parnasiano e decante.

Hugo de A vida dos tropeiros goianos encontrou seu narrador no malogrado Hugo de Carvalho Ramos, jovem suicida que morreu aos 26
Carvalho Ramos anos. Seus contos, reunidos em Tropas e Boiadas, revelam plena aderência aos mais variados aspectos da natureza e da vida
(1895-1921) social goiana que reponta vigorosa em toda parte, não obstante certa estilização preciosa.

José Bento Monteiro Lobato exerceu na cultura nacional um papel que transcende de muito a sua inclusão entre os contistas
regionalistas. Moralista e doutrinador aguerrido, de acentuadas tendências para uma concepção racionalista e pragmática
Monteiro Lobato do homem, Lobato assumiu posição ambivalente dentro do Pré-Modernismo. O Pré-Modernismo no Brasil é algo bastante
complexo e contraditório, que só pode ser feito com extrema cautela.
(1882-1948)
A indicação dos limites da arte lobatiana parece colidir com a relevância da figura humana que vive na História Brasileira em que
já assumiu um papel simbólico.

Fonte: Adaptado de Bosi (2004, pp. 61-217) e Coutinho (1997, p.236).

31
CAPÍTULO 5
Demais figuras da literatura em
diferentes estilos

Ao passarmos por Modernismo e Regionalismo, automaticamente falamos de


Identidade Cultural e Identidade Nacional, assuntos que se correlacionam tornam-se
basicamente um só.

Em síntese, quando descobrimos a identidade cultural de cada autor, discernimos a


identidade cultural de nosso país.

Estilos literários que facilmente podem ser encontrados em Macunaíma de


Mário de Andrade. Obra a qual o autor tenta resolver o problema angustiante
no que tange à identidade coletiva. Literatura mais do que indicada para leitura.

Quadro 7. As principais mentes e suas características da Literatura Brasileira.

O REALISMO
POESIA
Antônio Mariano Alberto de Oliveira encetou o seu longo roteiro poético parecendo um romântico retardatário. E embora, a
Alberto de Oliveira partir do segundo livro, Meridionais (1884), já se afirmasse o “culto da forma” com que ele próprio definiria a natureza do
(1859-1937) Parnaso, a nota intimista da estreia repontaria esparsamente até os últimos poemas, provando que não fora possível, nem
ao primeiro dos mestres parnasianos, a impassibilidade que a escola preconizava.
Raimundo da Mota Azevedo Correia esbateu os tons demasiados claros do Parnasianismo e deu exemplo de uma poesia
Raimundo Correia de sombras e luares que inflectia amiúde em meditações desenganadas.
(1859-1911) Estreou com uma coleção de versos em que Machado de Assis sentiu “o cheiro romântico da decadência”, os Primeiros
Sonhos, versos de adolescente que o autor não incluiria na edição definitiva das Poesias.
Olavo Brás Martins dos Guimarães Bilac, o mais antológico dos poetas, potencia-se a tendência parnasiana de cifrar no
Olavo Bilac brilho da frase isolada e na chave de ouro de um soneto a mensagem toda da poesia.
(1865-1918) Hoje parece consenso da melhor crítica reconhecer em Bilac não um grande poeta, mas um poeta eloquente, capaz de
dizer com fluência as coisas mais díspares, que o tocam de leve, mas o bastante para se fazerem, em suas mãos, literatura.
TEATRO
Capistrano de João Capistrano de Abreu esboçou uma teoria da literatura nacional em termos puramente taineanos: do clima, do solo e
Abreu da mestiçagem adviriam os traços negativos do homem brasileiro, a indolência, a labilidade nervosa, a exaltação súbita, mas
(1853-1927) efêmera, presentes, segundo ele, nos vários momentos da nossa poesia.

Sílvio Vasconcelos das Silveira Ramos Romero tinha gosto da pesquisa e da mais variada leitura, mas ao contrário do
cearense, o crítico sergipano amava apaixonadamente as ideias gerais e não fazia história do documento isolado senão
para ilustrar as grandes leis étnicas e sociais que aprendera junto a seus mestres determinados. Ele é a consciência ativa e
vigilante da Escola do Recife.
As linhas de força do pensamento romeriano no que toca às letras brasileiras podem resumir-se nas seguintes premissas:
Sílvio Romero
a) A literatura – como as demais artes e o folclore – exprime diretamente fatores naturais e sociais: o clima, o solo, as raças
(1851-1914) e seu processo de mestiçagem (determinismo biossociológico).
b) A sequência dos fatos na História ilustra a interação dos fatores mencionados; mas ela não é cega, tem um sentido: o
progresso da humanidade (evolucionismo).
c) A melhor crítica literária será, portanto, genética e não formalista. Os critérios de juízo darão valor ao poder que a obra
deve possuir de espelhar o meio, e não a seus caracteres de estilo (crítica externa X crítica retórica).

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PANORAMA LITERÁRIO BRASILEIRO │ UNIDADE I

Tristão de Alencar Araripe Jr., apesar de ter recebido a mesma formação teórica de Sílvio Romero, revelou-se desde
Araripe Jr. os seus primeiros ensaios um leitor mais sensível aos aspectos propriamente artísticos da literatura. Devemos-lhe boas
(1848-1911) monografias sobre Alencar, Raul Pompéia, Gregório de Matos e uma longa série de resenhas e artigos, compilados
postumamente, em que acompanhou de perto as estreias dos romancistas do fim do século e dos poetas simbolistas.
Com José Veríssimo Dias de Matos a ênfase nos fatores externos cede a um tipo de apreciação eclética que, à falta de
melhor termo, poderia ser definida humanística. A arte é signo das eternas emoções do homem. Expressão articulada visa a
José Veríssimo provocar o prazer do belo.
(1857-1916) Reintegrando a literatura na esfera das belas-artes, Veríssimo opera nos Estudos e na história da Literatura Brasileira uma
seleção de autores bem mais rigorosa que a de Sílvio Romero. Ao crítico paraense interessava, de um lado o lavor da
forma, de outro a projeção de constantes psicológicas como a imaginação, a sensibilidade e a fantasia.
SIMBOLISMO
Medeiros de
Albuquerque (1867-
1934) e Wenceslau Tais figuras costumam ser lembradas como os precursores do Simbolismo. Ambos conheceram, de fato, as novas literárias
de Queirós francesas desde o decênio de 1880.

(1865-1921)
Cruz e Souza Nada se compara a originalidade e força à irrupção dos Broquéis com que Cruz e Souza renova a expressão poética
em língua portuguesa. Os Simples, de Guerra Junqueiro, e o Só, de Antônio Nobre, ambos de 1892, no fundo, obras
(1861-1898) neorromânticas, signos do saudosismo que iria vincar a poesia em Portugal antes dos anos modernistas.
Alphonsus de
Guimaraens A poesia no autor de Kyriale nos aparece iluminada por uma luz igual e suave, constante no seu nível, quase sem supressas
na sua temática. Alphonsus de Guimaraes foi poeta de um só tema: a natureza, a arte, a crença religiosa.
(1870-1921)
Foi um poeta de um livro só, Eu, cuja fortuna, extraordinária para uma obra poética, atestam as trinta edições vinda à luz.
Esta popularidade deve-se ao caráter original, paradoxal, até mesmo chocante, da sua linguagem, tecida de vocábulos
Augusto dos Anjos esdrúxulos e animada de uma virulência pessimista sem igual em nossas letras.
(1884-1914) Trata-se de um poeta poderoso, que deve ser mensurado por um critério estético extremamente aberto que possa
reconhecer, além do “mau gosto” do vocabulário rebuscado e científico, a dimensão cósmica e a angústia moral da sua
poesia.
PRÉ-MODERNISMO
O engenheiro Euclides Rodrigues Pimenta da Cunha deteve o olhar na matéria e nos determinismos raciais que o século
dezenove lhe ensinara aceitar sem reservas. Desse esforço aturado de colher o sal, emergiu outra face da nação: face
Euclides da Cunha trágica que contemplamos em Os Sertões.
(1866-1909) A personalidade de Euclides inclinava-se naturalmente para os conflitos violentos, para os aflitos extremos. É moderna nele
a ânsia de ir além dos esquemas e desvendar o mistério da terra e do homem brasileiro com as armas todas da ciência e
da sensibilidade.
João Ribeiro Um crítico independente João Batista Ribeiro de Andrade Fernandes representa em sua longa parábola, que vai de poeta
parnasiano a crítico literário, de filólogo a historiador, o tipo exemplar do humanista moderno, a quem não falta nunca o grão
(1860-1934) de sal de heresia.
Lima Barreto Afonso Henrique de Lima Barreto aparece o romance social. Sua biografia explica o húmus ideológico da sua obra: a
origem humilde, a cor, a vida penosa de jornalista pobre e de pobre amanuense, aliadas à vida consciência da própria
(1881-1922) situação social, motivaram aquele seu socialismo maximalista, tão emotivo nas raízes quanto penetrante nas análises.
Graça Aranha Tanto José Pereira da Graça Aranha quanto Lima Barreto são os dois vultos mais importantes da ficção pré-modernista e
(1868-1931) provieram de camadas sociais opostas, palmilharam existências diferentes e chegaram a diferentes opções estéticas.

Manuel Carneiro de Souza Bandeira Filho chamou-se um dia “poeta menor”. Fez por certo uma injustiça a si próprio,
Manuel Bandeira mas deu, com essa notação crítica, mostras de reconhecer as origens psicológicas da sua arte; aquela atitude intimista
dos crepusculares do começo do século que ajudaram a dissolver toda a eloquência pós-romântica, pela prática de um
(1886-1968) lirismo confidencial, auto irônico, talvez incapaz de empenhar-se num projeto histórico, mas, por isso mesmo, distante das
tentações pseudo-ideológicos, alheio a descaídas retóricas.
Cassiano Ricardo Cassiano Ricardo Leite pagou, como os demais modernistas históricos antes de aderir ao movimento, tributo à medida
(1895-1974) velha: neossimbolista é Dentro da Noite, neoparnasiana A Frauta de Pã.

Menotti del Picchia Paulo Menotti Del Picchia tenaz divulgador das novas tendências estéticas, construiu obra singular no contexto modernista,
no sentido de uma descida de tom que lhe permitiu aproximar-se do leitor médio e roçar pela cultura de massa que hoje
(1892-1988) ocupa mais de um ideológico perplexo.

33
UNIDADE I │ PANORAMA LITERÁRIO BRASILEIRO

Raul Bopp Na trilha de Verde-amarelíssimo de Menotti, Cassiano e Plínio Salgado, mas bem cedo convertido aos chamados
Antropofagia de Oswald e Tarsila, está Raul Bopp, cuja rapsódia amazônica, Cobra Norato, é o necessário complemento do
(1898-1984) Manifesto Antropófago.
Costuma-se distinguir um primeiro momento de interesse pela nova ficção e pela literatura, em geral (ex.: o romance
Plínio Salgado O Estrangeiro, de prosa solta e impressionista), da carreira ideológica e política que se lhe seguiu. Mas a verdade está
(1901-1975) no todo: o indianismo mítico dos escritos iniciais e a xenofobia do Manifesto da Anta não estavam infensos aos ideais
reacionários que selariam o homem público na década de 1930.
Guilherme de Pertenceu só episodicamente ao movimento de 22. Não havendo partido do espírito que o animava, também não
Almeida encontrou nele pontos definitivos de referência estética.

(1890-1969) Sua cultura, seu virtuosismo, suas aspirações morais vinham do passado e lá permaneceram.
Antônio Castilho de Alcântara Machado D´Oliveira, o prosador do Modernismo paulista, soube ver e exprimir as alterações
que trouxera à realidade urbana um novo personagem: o imigrante. O enxerto que o estrangeiro, sobretudo o italiano,
Alcântara Machado significava para o tronco luso-tupi da antiga São Paulo produziria mudanças de costumes, de reações psicológicas e,
naturalmente, uma fala nova a espelhar os novos conteúdos.
(1901-1935)
É nos contos de Brás, Bexiga e Barra Funda que se vão encontrar exemplos de uma ágil literatura citadina, realista (aqui e
ali impressionista), que já não se via desde os romances e as sátiras cariocas de Lima Barreto.
Sérgio Milliet Milliet estreou como poeta de formação e língua. Integrado no grupo da Semana, continuou a escrever versos sobre temas
cotidianos, um lirismo de tons menores, mas fortemente afetado pela ironia do puro intelectual dividido entre as solicitações
(1898-1966) da paisagem paulista e as nostalgias de uma Europa saturada de cultura.
e
Já Paulo Prado deve-se, em parte, a própria realização da Semana, que ele apoiou não só material como espiritualmente.
Paulo Prado Aproveitando de modo muito pessoal as fontes dos jesuítas e dos viajantes estrangeiros, ensombra de cores tristes a
interpretação do nosso povo. No subtítulo do Retrato do Brasil (1928), lê-se: ensaio sobre a tristeza brasileira.
(1869-1943)
TENDÊNCIAS CONTEMPORÂNEAS
A FICÇÃO
José Américo de O romance de estreia A Bagaceira, passou a marco da literatura social nordestina. Creio que isso se deva não tanto aos
Almeida seus méritos intrínsecos quanto por ter definido uma direção formal (realista) a um veio temático: a vida nos engenhos, a
(1887-1980) seca, o retirante, o jagunço.

Raquel de Queirós Na esteira do regionalismo, ela compôs dois romances de ambientação cearense, O Quinze e João Miguel. Em ambos
(1910-2003) revela notar uma prosa enxuta e viva que seria depois tão estimável na cronista Raquel de Queirós.

José Lins do Rego José Lins do Rego Cavalcanti soube fundir numa linguagem de forte e poética oralidade as recordações da infância e da
adolescência com o registro intenso da vida nordestina colhida por dentro, através dos processos mentais de homens e
(1901-1957) mulheres que representavam a gama étnica e social da região.
Jorge Amado de Faria, fecundo contador de histórias regionais, definiu-se certa vez “apenas um baiano romântico e
Jorge Amado sensual”. Definição justa, pois presume o caráter de um romancista voltado para as marginais, os pescadores e os
marinheiros de sua terra que lhe interessam enquanto exemplos de atitudes “vitais”: romântica e sensuais.
(1912-2001) Cronista de tensão mínima soube esboçar largos painéis coloridos e facilmente comunicáveis que lhe franqueariam um
grande e nunca desmentido êxito junto ao público.
Só há um romancista brasileiro que partilha com Jorge Amado o êxito maciço junto ao público, ele mesmo, Érico Veríssimo.
Érico Veríssimo E, apesar disso, ou por isso mesmo, a sua obra tem conhecido amiúde reservas da crítica mais sofisticada.
Nos livros mais recentes, O Prisioneiro e O Senhor Embaixador, Veríssimo afasta-se da temática sulina e volta-se para um
(1905-1975) tipo novo de romance, político-internacional, mantendo, porém intacto aquele seu cálido liberalismo socializante, que é a
suma ideológica da relação que sempre estabeleceu com o próximo.
José Geraldo Manuel Germano Correia Vieira Machado da Costa também de extração urbana é a obra ficcional de José
José Geraldo Vieira Geraldo Vieira, mas num sentido oposto ao de Marques Rebelo.
(1897-1977) No romancista de A Quadragésima Porta sentimos o homem fascinado pela atmosfera da cidade grande enquanto lugar
geométrico das angústias e das experiência intelectuais mais refinadas da civilização contemporânea.
Lúcio Cardoso
Revela pendor para a criação de atmosferas de pesadelo.
(1913-1968)
Cornélio Pena Mais tarde de seus escritos, Cornélio de Oliveira Pena optaria pelo caminho da evocação miúda e determinada. A Menina
(1896-1958) Morta é um romance de atmosfera mas, ao mesmo tempo, um conjunto absolutamente coeso e verossímil.

34
PANORAMA LITERÁRIO BRASILEIRO │ UNIDADE I

A ucraniana se manteria fiel às suas primeiras conquistas formais. O uso intensivo de metáfora insólita, a entrega ao fluxo da
Clarice Lispector consciência, a ruptura com o enredo factual têm sido constantes do seu estilo de narrar que, na sua manifesta heterodoxia.
(1926-1977) Os analistas à caça de estruturas não deixarão tão cedo em paz os textos complexos e abstratos de Clarice que parecem
às vezes escritos adrede para provocar esse gênero de deleitação crítica.
João Guimarães O regionalismo, que deu algumas das formas menos tensas de escritura (a crônica, o conto folclórico, a reportagem), estava
Rosa destinado a sofrer, nas mãos de um artista-demiurgo, a metamorfose que o traria de novo ao centro da ficção brasileira. A
alquimia, operada por João Guimarães Rosa, tem sido o grande tema da nossa crítica desde o aparecimento dessa obra
(1908-1967) espantosa que é Grande Sertão: Veredas.
A POESIA
O primeiro grande poeta que se afirmou depois das estreias modernistas. A prática do distanciamento abriu ao poeta
mineiro as portas de uma expressão que remete ora a um arsenal concretíssimo de coisas, ora à atividade lúdica da razão,
Carlos Drummond solta, entregue a si mesma, armando e desarmando dúvidas.
de Andrade Os polos coisa-razão, que fazem de Carlos Drummond um poeta reclamado pela vanguarda tecnista, não se acham nele
(1902-1987) divididos por força de um programa. Há um tecido conjuntivo a uni-los e a sustê-los, o sentimento do mundo do poeta,
também negativo na medida em que se ensombra com os tons cinzentos da acídia, do desprezo e do tédio, que tudo
resulta na irrisão da existência.
Com Drummond de Andrade tem em comum o também mineiro Murilo Mendes a recusa às formas batidas e o senso
vivíssimo da modernidade como libertação. Mas o seu pensamento trilha veredas opostas às do enxuto minerador de
Murilo Mendes Claro Enigma. É pensamento que não rói o real, mas multiplica-o, exalta-o e, com materiais tomados à fantasia, opera uma
potenciação das imagens cotidianas.
(1901-1975) Murilo é poeta de aderência ao ser, poeta cósmico e social que aceita a fruição dos valores primordiais. Tendo mantido
firme a sua ânsia libertária, ânsia que partilhou com o Modernismo anterior a 1930, jamais cai em formas antiquadas de
apologética.
Jorge de Lima Este poeta, que, a certa altura da sua história espiritual, partilhou com Murilo Mendes o projeto de “restaurar a poesia em
Cristo”, conheceu uma acidentada evolução literária. Começou como sonetista neoparnasiano e chegou até o “príncipe dos
(1895-1953) poetas de Alagoas”.
Augusto Frederico Schmidt também foi poeta de inspiração bíblica, mas, diversamente de Jorge Lima, não assistia nele o dom do verso nítido
Schmidt ou o encanto da imagem plástica. Era difusa a sua fala, romântica a melodia, derramado o estilo. Lidos isoladamente, alguns
dos seus poemas sabem mesmo a retórica anacrônica; mas o conjunto é uno e deixa a impressão de que seus temas
(1906-1965) centrais (morte, solidão, angústia, fuga) não poderiam ser tratados fora aquela dicção intensiva que o poeta lhes deu.
Marcus Vinícius de Melo Moraes em seus primeiros livros que foram também escritos sob o signo da religiosidade
Vinícius de Moraes neossimbolista que marcou o roteiro de Schmidt; mas a urgência biográfica logo descolocou o eixo dos temas desse poeta
lírico por excelência para a intimidade dos afetos e para a vivência erótica.
(1913-1980)
Vinícius será talvez, depois de Bandeira, o mais intenso poeta erótico da poesia brasileira moderna.
Com ela a vertente intimista, comum aos poetas, afina-se ao extremo e toca os limites da música abstrata. Mas, enquanto
Cecília Meireles Murilo, Jorge de Lima, Schmidt e Vinícius são líricos do ser e da presença (religiosa, erótica ou social), o poeta da Solombra
(1901-1964) parte de certo distanciamento do real imediato e norteia os processos imagéticos para a sombra, o indefinido, quando não
para o sentimento da ausência e do mata.

Fonte: Adaptado de Bosi (2004, pp. 163-460) e Coutinho (1997, p.236).

Vimos, portanto, as principais mentes por trás da Literatura Brasileira, bem como
os estilos que dela fazem parte. Como foi afirmado, não temos a intenção de nos
aprofundarmos demasiadamente no assunto, mas sim adquirir conhecimentos
suficientes do panorama geral literário para que com isso facilite o entendimento
dos direitos conquistados no Brasil provindo de uma área (a literatura) que não pode
ser descartada parcialmente, tampouco por completo, do cenário social, político e
econômico do país.

É certo que todas as épocas literárias tiveram fundamental importância para a formação
da identidade nacional, no entanto, ressaltamos, como já exposto em certa medida
anteriormente, o modernismo e o regionalismo.

35
UNIDADE I │ PANORAMA LITERÁRIO BRASILEIRO

Todas as bases e moldes da identidade que em larga escala se formou e tem se formado
está inteiramente ligada à composição religiosa e suas respectivas tradições, mitos
e tradições orais da língua portuguesa, bem como ditos e crendices populares, e
obviamente em caráter secular as festas em geral, tradições folclóricas, artes e esportes
etc.

Por sermos um país denominado continental, certamente haveria de ocorrer diferenças


consideráveis de uma região à outra, grupos representando expressões em determinadas
completamente diferentes de outras.

Da mesma maneira, é a avalanche cultural americana no Brasil e no mundo, a qual tem


desempenhado tamanha influência que povos atuais tem se prostrado ao que vem de
fora, abafando aquilo que um dia foi identidade nacional e tornando-se em identidade
global.

Você também acredita ou vê fatos observáveis da perda de identidade própria


para a do exterior? Isto se dá desde 1500? Não deixe de posicionar-se, como de
costume, sobre o assunto em questão.

36
QUESTÕES UNIDADE II
ÉTNICO-RACIAIS

Nesta unidade, diferente do apanhado geral literário que fizemos na última unidade,
veremos dentro uma visão de minorias étnicas, voltando-nos a principalmente a
indígena e afro-descendência brasileira. Procure não negligenciar as propostas de
pesquisas e estudos complementares, uma vez que, por meio deles você terá um grau
maior de profundidade no assunto.

CAPÍTULO 1
Cidadania (direito) para todos

A forte quantidade de movimento por parte das minorias em prol de seus direitos
vem tomando conta dos noticiários das mais diversas formas e fins. Muitos assuntos
fortemente controversos, haja vista às cotas para negros nas universidades. Por um
lado uns expressam sua opinião favorável devido à falta de oportunidades de muitos
encontram no mercado de trabalho e no mundo acadêmico simplesmente pelo fato de
serem afrodescendentes.

Por outro lado, alguns da própria minoria tratam essa questão como escandalosamente
preconceituosa, já que intelectualmente não há sentido de tratar os que não possuem pele
clara com maior favorecimento, sendo que terão que estudar de maneiras semelhantes e
vestibulares nos seus mais diversos fins não solicita foto ou algum tipo de identidade física.

Os favoráveis às cotas negras alegam que na verdade a falta de oportunidade e


desenvolvimento acadêmico iniciou-se no ensino fundamental, dado que em geral
possuem condições precárias de estudos. Assunto contestado pelos desfavoráveis às
cotas e assim vai.

De acordo com Ferreiras e Mattos (2007):

As várias discussões, voltadas para a questão das cotas para os


afrodescendentes nas universidades, articulam-se em torno de aspectos

37
UNIDADE II │ QUESTÕES ÉTNICO-RACIAIS

jurídicos, políticos, de relações raciais, do problema da exclusão social


do brasileiro e da falta de qualidade das escolas públicas, dentre outros.
Entretanto, os argumentos que permeiam as discussões somente
tangenciam os possíveis efeitos da política de cotas na construção
da subjetividade do afrodescendente e da sua inserção como sujeito
histórico de transformação da realidade social que o constituiu.

Para maiores informações sobre o sistema de cotas, dentro de um contexto


psicossocial, indicamos a leitura completa do artigo técnico O afro-brasileiro
e o debate sobre o sistema de cotas: um enfoque psicossocial disponível em:
<http://www.scielo.br/scielo.php?pid=S1414-98932007000100005&script=sci_
arttext>.

Confira também a matéria publicada pela Folha de S. Paulo em 3/5/2014


intitulada Editorial: social, não étnico sobre outro prisma do assunto relacionado.
Disponível em: <http://www1.folha.uol.com.br/opiniao/2014/05/1448949-edit
orial-social-nao-etnico.shtml>.

Lembre-se: seu desempenho em um curso EAD depende muito de seu esforço


e interesse pessoal. Assim também aconselhamos a não se limitar ao contexto
somente aqui empregado, já que a visão, por mais profissional que seja de quem
fornece as informações, em qualquer medida, é limitada. Desta forma, não deixe
de pesquisa conteúdos extratextos (para mais dicas de estudos, consulte nosso
para (não) finalizar). E obviamente, não se esqueça de contar com seu “faro” de
pesquisas.

Geralmente são assuntos polêmicos que geram no mínimo reflexão. Provocam dezenas
de debates em todos os campos do conhecimento, inclusive o da religião quando se
trata da causa gay e algumas concepções do feminismo, dado que a Bíblia proíbe
ambas as práticas (não as pessoas em si, mas as práticas por elas não combatidas
assim como qualquer outro instinto. Quanto ao feminismo, não há mal em sua maior
parte, mas a insubmissão ao homem fere um princípio religioso cristão, obviamente
demasiadamente distorcido até por quem nele acredita).

Assuntos que achávamos já não ter mais que se preocupar como fundamentalismo,
racismos, patriotismo excessivo que geram ataque e não apenas defesa, nacionalismos
em geral, regionalismos, chauvinismos e muitos outros têm se transformado em
assuntos mais que atuais.

38
QUESTÕES ÉTNICO-RACIAIS │ UNIDADE II

Desde agora, portanto, começa fazer sentido o porquê de estudarmos literatura


(logicamente para àqueles que não entenderão a importância literatura dentro de um
contexto de direito). Veja diretamente nas palavras de Pinsk e Pinsk (2005):

O Romantismo, legitimando o testemunho do vivido e a expressão


do sentimento, permitiu que muitas representantes do sexo feminino
se animassem a falar. E o socialismo lhes abriu suas tribunas, lhes
proporcionou espaço político para que sua fala se traduzisse em ações
(contribuindo, portanto, para que pudessem exercer a cidadania)
[...]. As mulheres tinham sido mantidas fora dos níveis superiores de
escolarização, de modo que toda mulher que supostamente são sabia
falar com fluência devia permanecer calada [...]. Quem desencadeou o
movimento foi Mary Wollstonecraft (1759-1797), a mulher de William
Godwin, que acompanhou de perto a Revolução Francesa e, em seu livro
Reivindicação dos Direitos da Mulher, lamentou que os revolucionários
não tivessem ido mais fundo no combate à opressão e não tivessem
eliminado os privilégios masculinos. (PINSK; PINSK, 2005)

Os direitos étnico-sociais e étnico-raciais começavam a tomar uma forma mais sólida a


partir do século XX, não que seja digna de modelo, mas perto do que se via em épocas
passadas, melhorou de forma contundente.

Basicamente, de acordo com Pinsk e Pinsk (2005), nós dividimos as sociedades


capitalistas em duas classes sociais:

»» Classe proprietária ou capitalista: composta por pessoas com posses


econômicas suficientes para assegurar a satisfação de suas necessidades e
das de seus dependentes, sem que tenham necessidade de exercer alguma
atividade remunerada.

»» Classe social trabalhadora: composta pelos demais, que por não terem
tais posses subsistem com os ganhos do exército de atividade remunerada.
Só os membros da classe trabalhadora são sujeitos dos direitos sociais.
Esses direitos só se aplicam àqueles cuja situação torna necessário o seu
uso.

Dentro do capitalismo, o que menos ocorre é a própria ociosidade, contrariamente o


que acontece quando os críticos ao socialismo se posicionam: “porque eu que trabalhei
a vida toda para possuir dois carros, devo compartilhar um com alguém que sequer
sabe o que é uma faculdade, muito menos o que significa trabalhar 12 horas/dia?”.

39
UNIDADE II │ QUESTÕES ÉTNICO-RACIAIS

Nos primórdios do capitalismo:

A falta de trabalho se generaliza na Europa ocidental a partir do século


XVI, em parte por causa da instabilidade nos novos mercados que a
colonização das Américas, África e porções crescentes da Ásia e da Oceania
expandia. Os resultados cambiantes das numerosas guerras religiosas
e dinásticas alteravam com frequência a configuração dos monopólios
coloniais, o acesso a certos mercados, o abastecimento de mão de obra
e de metal precioso de metrópoles e colônias. As massas deslocadas de
suas ocupações rumavam às cidades (PINSK, 2005, p.193).

Indicamos a leitura da obra considerada o livro do século de Max Weber: A ética


protestante e o espírito do capitalismo. De forma assustadoramente objetiva
(em torno de 80 páginas), Weber aborda uma até então, incógnita não decifrada
por nenhum sociólogo e/ou estudante do assunto anterior a ele.

Veja o texto a seguir encontrado na página virtual da UNESCO sobre suas ações
da valorização à manutenção da cultura africana no Brasil:

A UNESCO e o programa étnico-racial


Promover o reconhecimento da importância da interseção da história africana
com a brasileira para transformar as relações entre os diversos grupos raciais que
convivem no país.

Esta é a essência do Programa Brasil-África: Histórias Cruzadas, instituído pela


UNESCO no Brasil, a partir da aprovação da Lei 10.639, em 2003, que preconiza o
ensino dessas questões nas salas de aulas brasileiras.

Desde então, o processo de implementação da Lei da Educação das Relações


Étnico-Raciais nos sistemas de ensino brasileiro vem enfrentando desafios, entre
eles a necessidade de desenvolvimento de uma nova cultura escolar e de uma
nova prática pedagógica que reconheça as diferenças étnico-raciais resultantes
da formação da sociedade brasileira. Para contribuir com esse processo, o
programa Brasil-África: Histórias Cruzadas da UNESCO atua em três eixos
estratégicos, complementares e fundamentais:

»» Acompanhamento da implementação da Lei.

»» Produção e disseminação de informações sobre a história da África e


dos afro-brasileiros.

40
QUESTÕES ÉTNICO-RACIAIS │ UNIDADE II

»» Assessoramento no desenvolvimento de políticas públicas.

O objetivo dessa atuação é identificar pontos críticos, avanços e desafios na


implementação da Lei, bem como para cooperar para a formulação de estratégias
para a concretização de políticas públicas nesse sentido, além de sistematizar,
produzir e disseminar conhecimentos sobre a história e cultura da África e dos
afro-brasileiros, subsidiando as mudanças propostas pela legislação.

Para a UNESCO, apoiar a implementação da Lei da Educação das Relações


Étnico-Raciais é uma maneira de valorizar a identidade, a memória e a cultura
africana no Brasil – o país que conta com a maior população originária da
diáspora africana.

A partir do momento em que as origens africanas na formação da sociedade


brasileira forem conhecidas e reconhecidas e as trocas entre ambas disseminadas,
se abrirão importantes canais para o respeito às diferenças e para a luta contra
as distintas formas de discriminação, bem como para o resgate da autoestima e
a construção da identidade da população. Somados, esses canais contribuirão
para o desenvolvimento do país.

Assim, o trabalho com esses tópicos nas escolas e nos sistemas de ensino
proposto pela legislação nacional, em última instância, leva os alunos e a
sociedade a valorizar o direito à cidadania de cada um dos povos.

Tudo isso encontra uma forte convergência com o trabalho da UNESCO, que
atua em todo o mundo declarando que conhecer melhor outras civilizações e
culturas permite tanto compreender a segregação e os conflitos raciais como
afirmar direitos humanos.

Disponível em: <http://www.unesco.org/new/pt/brasilia/education/inclusive-education/brazil-


africa-project/about-brazil-africa-crossed-histories/>. Acesso em: 23 out. 2015.

41
CAPÍTULO 2
Minorias e as mudanças culturais

Retornando às minorias, no que tange a questão entre a maioria e a(s) minoria(s)


está complicando a coexistência há algum tempo. Contudo, quando se originou e
enfim apareceu a ideia da cidadania na Europa Ocidental no séc. XVIII, a questão das
identidades coletivas heterogêneas passou a ficar no começo distante dos olhos políticos
e dos pensadores proeminente da época. Por um lado, tal idealização do conceito
de cidadão evoluiu em sociedades que eram (excepcionalmente, do ponto de vista
comparativo) relativamente homogêneas tanto raciais quanto religiosa e etnicamente;
por outro, e mais importante, a heterogeneidade não foi vivida como problema a
agendar (PINSK; PINSK, 2005).

Os autores ainda continuam:

As guerras religiosas tinham terminado há muito, revoltas regionais


haviam sido reprimidas, o Iluminismo enfatizava e valorizava o que
seres humanos tinham em comum, e o despertar das nações estava ainda
no futuro. O cidadão então “inventado” tinha um discurso abrangente
contra os monarcas absolutistas, as aristocracias com seus privilégios
inúteis, os sacerdotes obscurantistas; mas tinha pouco a dizer sobre
como lidar com diferenças de cor da pele, língua, fé. Tudo isso iria
mudar no século XIX, sob o impacto das revoluções política, industrial
e demográfica, que uniram massas humanas numa busca incessante e
turbulenta frente à modernidade. A confrontação entre as diferenças
surgidas tornou urgente achar soluções para possibilitar a convivência.
O conceito de “cidadão”, expandido para incluir a democracia, foi então
utilizado como método para permitir e legitimar a coexistência de
tantos homens diferentes. Só que isso, dentro do ideário da cidadania,
podia ser feito unicamente por meio da negação de diferenças grupais:
a aplicação de princípios genéricos solucionaria, acreditou-se, as
desigualdades particulares. O ideal se chocou com a dura realidade
social de discriminação, preconceitos, perseguição, alienação (PINSK;
PINSK, 2005, pp.343-344).

Caso não se lembre de assuntos mais específicos e de grande notoriedade como


O Iluminismo, Revolução Francesa e demais assuntos que tratamos(remos)
aqui, não abordando-os em detalhes, mas previamente exigidos, pesquise-os!

42
QUESTÕES ÉTNICO-RACIAIS │ UNIDADE II

Muitos deles de tão falados se tornam tão “triviais” a nossos ouvidos que de fato
olvidamos a importância de conhecê-los (ou no melhor termo, relembrá-los)
com uma simples pesquisa na Web.

Não há dúvida, portanto, que o século XIX foi marcado por uma série de conquistas,
avanços e retrocessos no que se refere ao direito humano de viver em sociedade sem ser
discriminado apenas por fazer parte de alguma minoria, seja ela qual for.

A marca se dá em grande medida por particularidade clericais, do Terceiro Estado


(sobre a Revolução na França), demais assuntos religiosos, burgueses, senhores
feudais e escravos. Não vamos, porém nos aprofundar nos séculos passados, mas de
fato, segundo Pinsk e Pinsk (2005) a evolução dos direitos sociais em geral em favor
da cidadania iniciou-se na sociedade europeia, branca e cristã, sem divisões internas
insuperáveis além das contradições de classe, e com poucas minorias raciais, nacionais
ou religiosas.

Na época da Revolução Francesa, manifestou-se uma reação contra


todas as representações depreciativas dos povos distantes. As ideias
liberais vieram perturbar a crença na necessidade do sofrimento
na terra. O homem queria lutar pela justiça e pela felicidade neste
mundo. Essa luta, que no começo foi apenas uma luta espiritual,
incluiu a humanidade toda no círculo de suas considerações; e, não
esperando salvação diretamente no próprio país e do próprio povo,
o homem alargou, então, a vista para mais longe, vendo aí o que lhe
parecia desejável. Isto o levava à supervalorização do desconhecido, à
idealização dos povos longínquos. Dois grandes homens dessa época,
Voltaire e Jean-Jacques Rousseau, se entusiasmaram, cada um a seu
modo, por essas ideias [...]. A época da ciência natural, o século XIX,
pôs termo a essa divinização (BALDUS, 1979, p.4).

Contudo, para entendermos melhor os estudos étnicos, melhor nos é analisarmos um


pouco de seus principais conceitos.

Etnologia
O que significa então etnologia, bem como a diferença entre etnologia e etnografia, sua
separação da antropologia é vista a seguir de acordo com Baldus (op. cit., p.1):

Literalmente: a ciência do povo ou dos povos, isto é, a ciência que


estuda diversas modalidades totais de um povo e suas relações com as
modalidades de outros povos. A palavra povo, aqui, unidade cultural.

43
UNIDADE II │ QUESTÕES ÉTNICO-RACIAIS

Assim, a etnologia estuda a unidade cultural no que diz respeito à sua


singularidade local e temporal e às suas relações com outras unidades
culturais. A etnologia limita-se ao estudo das chamadas culturas
primitivas, por ser ainda uma ciência em formação. “Cultura”, no
sentido que lhe dão os etnólogos, é a expressão harmônica total do
sentir, pensar, querer, poder, agir e reagir de uma unidade social,
expressão que nasce de uma combinação de fatores hereditários, físicos
e psíquicos com fatores coletivos morais, e que, unida ao equipamento
civilizador (instrumentos armas etc.), dá à unidade social a capacidade
e a independência necessárias à luta material e espiritual pela vida. Um
dos problemas principais da etnologia é estudar a mudança contínua
desta expressão e as causas dessa mudança. Não faz muito tempo que
a etnologia se separou da antropologia: ambas eram consideradas até
há pouco como ciências irmãs [...]. A antropologia, como o nome já
o indica, ocupa-se do homem (anthropos), a saber, do homem como
indivíduo e como espécie [...]. A diferença entre etnologia e etnografia
se evidencia pelos próprios nomes. A etnografia descreve o povo e tem
seu objeto, por assim dizer, na configuração exterior da cultura [...],
enquanto que a etnologia procura compreender o povo na sua essência
e conhecê-los nas particularidades funcionais da sua cultura [...]. A
etnografia tem por condição a estabilidade no momento da observação;
a etnologia examina a dinâmica. Destes diferentes modos de ver resulta
o fato de o etnógrafo encontrar o seu material de preferência na cultura
material, e o etnólogo achar o seu na cultura espiritual.

Para conhecermos a identidade como processo em construção na sociedade brasileira.


Identidades culturais e suas relações com o desenvolvimento psicológico e com as
aprendizagens institucionais de grupos étnico-raciais, bem como a formulação da
identidade e processo de socialização e a consequente identidade afrodescendente em
nosso país, precisamos ter em mente conceitos de etnologia, uma vez também que ela
as estuda.

É notório que a atual geração de etnólogos brasileiros concentra cada vez


mais o seu interesse em temas de organização e estrutura sociais. Uma
das razões está na formação predominantemente sociológica de muitos
desses pesquisadores [...]. A investigação de uma parte destes tem sido
objeto, nos últimos anos, de contribuições de alto valor, também de
antropólogos estrangeiros interessados no estudo dos índios do Brasil
(SCHADEN, 1976, pp.12-13).

44
QUESTÕES ÉTNICO-RACIAIS │ UNIDADE II

Impossível, nos é, portanto, falarmos e primórdios étnico-raciais sem falarmos dos


índios, a origem real dos brasileiros, os quais tiveram por cultura engolir goela abaixo o
que vinha de outros povos, principalmente, claro, dos portugueses.

Os Índios e as causas das mudanças culturais


Se a classe média reclamava das ações políticas e econômicas do governo/império,
quanto mais os índios! Juntamente com o africano escravizado, o índio foi igualmente
cauterizado, muito embora não considerados pelos portugueses com semelhante força
de trabalho como os afrodescendentes.

É importante conhecer alguns fatores que levaram a mudança cultural da época,


servindo de base para o desdobramento durante os séculos e como chegamos hoje onde
estamos.

Schaden (op. cit., p.15) nos informa que:

O processo aculturativo dos grupos tribais foi sendo compreendido


cada vez mais em termos de pluralidade de fatores ativos na conjunção
interétnica, ou seja, considerando não apenas unilateralmente as culturas
e sociedades índias e as mudanças por elas sofridas, mas também – e
sobretudo – a variedade de situações socioculturais e econômicas do
homem branco ou mestiço em contato com o silvícola. Talvez não haja
exagero na assertiva de que, graças a essa maneira de encarar as relações
entre o mundo dos brancos e as tribos indígenas, os estudos feitos no
Brasil, sobre aculturação e assimilação, parecem ser bem mais ricos em
perspectivas para a ação prática do que os que se fizeram na maioria
dos outros países – e isto sem menosprezo daquilo que de original
contribuíram para a interpretação teórica desses processos.

Entre as diversas causas de cultura em nosso país, podemos distinguir as que vêm
de “dentro”, ou seja, da própria unidade cultural, e aqueles que vêm de “fora”, ou
seja, são razidas de outra unidade a unidade cultural no caso em questão. Tais causas
apresentam-se sob na forma de necessidades ou de indivíduos condutores (BALDUS,
1979).

A influência europeia teve sua fundamental importância sob o aspecto da cultura


que vem de fora. É nítido que diversos tipos de instrumentos, doenças e epidemias,
cosmovisões e crenças que chegaram ao Brasil impactaram diretamente o cotidiano
daqueles que aqui habitavam.

45
UNIDADE II │ QUESTÕES ÉTNICO-RACIAIS

Para nos aprofundarmos apenas um pouco, veja o que Baldus (1979, pp.178-179), o
qual esteve pessoalmente presente em muitos aspectos de suas pesquisas e entrevistas,
nos traz sobre a receptividade de algumas tribos frente às culturas de origem estranha
(inclusive religiosas):

A predileção e os dotes pessoais têm papel decisivo em ambos pessoais1


têm papel decisivo em ambos os casos. O chefe principal dos Tapirapé
favorece quase tudo que vem dos brancos, e enquanto tiver o poder,
a tribo estará, até certo ponto, disposta à assimilação. Ele foi, por
exemplo, a causa de que, há pouco, os Tapirapé cultivassem a cana-de-
açúcar e cantassem melodias cristãs. O segundo chefe é exatamente o
contrário, e seu rival encarniçado. Odeia os estrangeiros, é conservador,
não planta cana-de-açúcar e só canta as suas canções [...]. Os Bororo
em Sangradouro e Meruri são dirigidos pelos missionários salesianos,
que, em contraste com os representantes da Comissão de Proteção
aos Índios, procuram influir não somente na cultura material, mas
na espiritual. Como, em geral não têm bastante compreensão da vida
espiritual dos índios, vem a dar-se nesta a coexistência do novo ao lado
do antigo, o que motiva declarações dos padres no sentido de que seus
alunos levam vida ambígua, sendo, às vezes, “cristãos civilizados”, e, às
vezes, “Bororo perfeitos” [...]. Muitos religiosos e leigos ocuparam-se
com os Karajá. Mas até a segunda metade do século passado, foram
passageiros os contatos. (BALDUS 1979, pp.178-179)

O espaço de tempo da mudança de cultura, para ele é diferente casuisticamente. Baldus


dá o exemplo de quando uma tribo recebe, de uma vez, instrumentos de ferro em grande
quantidade a fim de poder substituir todos os seus machados de pedra, a mudança
de cultura, neste caso, se realiza apenas uma vez, ele de cara percebe que é um bom
negócio, conferindo-lhe vantagens que antes não tinha. Já se a tribo recebe quantidade
menor, a mudança de cultura se dará paulatinamente.

E continua:

Quando, em geral, o tempo gasto numa mudança na cultura material


é mais curto que o gasto em mudança na cultura espiritual, a causa é a
seguinte: as necessidades influem mais fortemente na cultura material,
manifestando-se mais imediatamente a vantagem e a desvantagem [...].
Sendo, porém, oferecidos ao índio nova forma social, novo canto ou nova
crença religiosa, não compreende a razão pela qual tenha de abandonar
o tradicional ou misturá-lo com o novo. É verdade que, em geral, tal
1 Necessidades ou de indivíduos condutores.

46
QUESTÕES ÉTNICO-RACIAIS │ UNIDADE II

mudança rápida e radical só se refere a determinados elementos da


cultura material. E, por outro lado, há casos em que a cultura espiritual
se altera, ficando a material essencialmente a mesma.

O autor Herbert Baldus trata bastante das experiências pessoais que teve
com as tribos Kaingan, Bororo, Karajá, Tapirapé... Enfim, o aluno que desejar se
aprofundar, indicamos a leitura de sua obra Ensaios de Etnologia Brasileira.

Cohn (2001) afirma que na notoriedade da visível “explosão étnica” que se vivencia
atualmente no Brasil, populações e indivíduos que negavam sua identidade e origem
indígena, se encontram em outro cenário, onde a figura de ser descendente de índio
não é mais motivo de vergonha, principalmente após a Constituição Federal de 1988.
Cenário extremamente diferente do passado. Hoje, segundo as concepções da autora,
é que se constrói uma nova identidade cultural, muito embora a identidade étnica
esteja juridicamente definida a partir do conceito de autoidentificação e adscrição,
apropriando-se do estereótipo que nossa sociedade criou para os índios através da
expectativa da população brasileira de que os índios “pareçam índios”.

Contudo, voltemos ao modo de como as coisas tomaram o rumo que tomaram.

Os jesuítas, catequese e aculturação


Como de costume, os jesuítas não poderiam ficar de fora. O método de catequese dos
aborígenes do Brasil no período colonial, de acordo com o que nos informa Schaden
(1976, p.365), “foi particularmente exercido pelos jesuítas, como parte do plano geral de
colonização organizado pela coroa lusitana para povoamento e exploração da América
portuguesa, foi objeto de análises por diversos historiadores e cientistas sociais”.

Segundo Gilberto Freyre, citado por Schaden, em a Casa-Grande e Senzala, ele examina
a catequese como processo aculturativo, registrando:

»» as premissas morais em que se basearam os missionários inacianos para


orientar o seu método, ou seja, a interpretação de certos costumes e
instituições indígenas como erros e pecados que deveriam ser eliminados
e punidos por sua incompatibilidade com a teologia e a ética cristãs;

»» o cuidado com a preparação de agentes interculturais – padres e irmãos


que fossem “línguas”, menos indígenas doutrinados, chefes tribais
convertidos;

»» as técnicas de internalização das novas crenças, valores e mores.

47
UNIDADE II │ QUESTÕES ÉTNICO-RACIAIS

Jonathan Wright (2010) nos alerta, com uma fonte bibliográfica riquíssima (obra já
tratada no início deste material) que os jesuítas poderiam ser quem quer que precisassem
ser. As armas de conquista e conversa se davam de forma diversa. Utilizam da própria
ciência e química para forjar milagres, enganavam pessoas cultas, quanto mais os índios
quando no Brasil.

Havia também àqueles que estavam dispostos a ajudar de fato, embora muitos deles,
de acordo com Baldus (1979) tinham asco dos índios, mas os tratava bem em prol de
sua causa.

No Brasil, a ideia certa de que os índios tinham alma e eram seres


humanos não precisou de declaração papal2. Até a chegada de Tomé de
Souza à Bahia, em 1549, o relacionamento interétnico não contava com
os olhos atentos nem de dominicanos ardentes nem de franciscanos
conciliadores, como na América espanhola [...]. Já a prática do ritual
do canibalismo tupinambá foi sempre uma mácula cultural difícil de
ser aceita e concebida como uma atividade humana, e, apesar de ser
vivenciada e até insuflada por alguns europeus, pois ajudava a dividir
lealdades indígenas, constituiu uma das principais justificativas de
dúvida quanto à humanidade dos índios. Na melhor das hipóteses,
quando os jesuítas começaram a refletir sobre o assunto e tentaram
esclarecê-lo para seus superiores e seus rebanhos portugueses, os
tupinambás deveriam estar tomados pelo próprio belzebu, a quem
deram o nome de jurupari, cujos sacerdotes e porta-vozes eram os
paj-guaçu e caraíbas, homens bizarros que andavam miserável e
misteriosamente de aldeia em aldeia conclamando-os todos a largarem
tudo e buscarem a Terra sem Males, que ficaria em algum lugar a oeste
[...]. Para os jesuítas, os caraíbas eram seus adversários centrais que
se chocavam contra sua doutrinação cristã. Era preciso destruí-los
(PINSK; PINSK, 2005, pp. 423-424).

Em meio a tantas turbulências em busca de dinheiro e poder, é certo que portugueses e


franceses não se colocavam na posição de amigos dos índios, dos africanos ou qualquer
minoria cultural. Quando o Brasil passou a ser uma colônia para produção de açúcar
para exportação, a obtenção da mão de obra indígena, seja nos molde de escravidão, seja
na semiservidão, tornou-se uma preocupação tornou-se de forte preocupação perene,
onde, por sua natureza de necessidade econômica básica, fundamentou os princípios

2 Veja Sublimus Dei promulgada em 1537 pelo Papa Paulo III. Disponível em inglês em: <http://www.papalencyclicals.net/
Paul03/p3subli.htm>.
Para mais informações em português veja em: <http://darwinedeus.blogfolha.uol.com.br/2013/08/27/a-igreja-declarou-que-
indios-e-negros-nao-tinham-alma/>.

48
QUESTÕES ÉTNICO-RACIAIS │ UNIDADE II

iniciando-se a partir do momento que a Coroa portuguesa iria estabelecer sua estratégia
de política de relacionamento interétnico (PINSK; PINSK, 2005).

Marquês de Pombal, sendo inimigo assíduo dos jesuítas, objetivou expulsá-los através
da elaboração do “Diretório dos Índios”, também conhecido como “Diretório de
Pombal”, elaborou e promulgou em 1757 um conjunto de 95 artigos normativos com
força de lei, na esperança de fazer com que os índios alcançassem modos civilizados
como os portugueses.

Opondo-se à política dos jesuítas (e por extensão às demais ordens


missionárias), que controlava as aldeias indígenas em seu relacionamento
social e econômico com a sociedade luso-brasileira em formação, o
Diretório pretendia, em primeiro lugar, revogar a legitimidade legal e
moral que as ordens religiosas há duzentos anos haviam obtido, da Coroa
portuguesa tanto quanto da sociedade colonial, de manterem o encargo
de proteção e mediação das relações interétnicas com boa parte dos
índios que estavam sendo assimilados ao sistema colonial. Em seguida,
pretendia abrir as aldeias à entrada indiscriminada de brancos e negros
livres para mais rapidamente transformar esses índios em vassalos
do Reino, o que quer dizer, no caso, o equivalente a cidadania. Assim,
ironicamente, o primeiro sentido de cidadania com que os índios foram
agraciados por Portugal teve como meio a anulação da autonomia relativa
das aldeias onde viviam (PINKS; PINSK, op. Cit., 428).

É certo então que a figura do índio no Brasil bem como o espaço que ele ocupa na
sociedade brasileira tem sido concebido também de modo mutante, como afirma
Cohn (2001). A autora pontua que em um primeiro instante, pensa-se o índio como
parte da formação da sociedade brasileira, e com isto tratando-o, como importante, no
passado, para a constituição, da qual ela chama de singularidade nacional. Cita ainda
que o foco está deste modo, no índio como nosso antepassado, nas heranças que deles
recebemos, seja genética, seja cultural, e também pela importância que eles tiveram
para a adaptação do colonizador europeu ao novo meio.

Confira em: < http://www.scielo.br/pdf/his/v25n1/a03v25n1.pdf> As


missões jesuíticas entre os guaranis no contexto da Ilustração de Beatriz Helena
Domingues. Também em: < http://ojs.c3sl.ufpr.br/ojs/index.php/educar/article/
viewFile/12806/8694> O ensino jesuítico no período colonial brasileiro: algumas
discussões e <http://historiaehistoria.com.br/materia.cfm?tb=artigos&id=253>
As concepções jesuíticas acerca do indígena e de sua conversão à fé cristã –
breves considerações a partir da obra e Diálogo sobre a conversão do gentio de
Valmir Medina Riga.

49
CAPÍTULO 3
O UNICEF, a cultura e a identidade para
a igualdade étnico-racial

De acordo com o Fundo das Nações Unidas para a Infância – UNICEF (<www.unicef.
com.br>) todas as crianças e adolescentes têm o direito de conhecer a parte da história
e a cultura dos povos indígenas e africanos, e pouco tempo atrás a grade escolar dava
sempre maior importâncias às histórias e cultura europeias. Deste modo, criou-se a
Lei no 10.639/2003 que alterou a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional –
LBD, declarando com isso obrigatório o ensino da história e da cultura afro-brasileira e
africana em todos os sistemas e modalidades de ensino.

Em 2008, a LDB ocorreu outra mudança: a Lei no 11.645 obrigou o ensino da história e
da cultura indígena em todas as escolas do país. Esse é um dos temas do UNICEF para
os municípios inscritos no Selo UNICEF Município Aprovado. A ideia com isto foi a
de fortalecer a política de educação para a igualdade étnico-racial e também promover
ações que estimulem crianças e adolescentes a reconhecer, valorizar e preservar as
culturas afro-brasileiras, africana e indígena.

Para dar apoio a essas ações, o UNICEF lançou o Guia de Orientação Cultura e
Identidade: Comunicação para a Igualdade Étnico-Racial.

É declarado no Guia que:

Cada criança e cada adolescente, independentemente da raça, etnia


ou cor da pele, devem ser estimulados a reconhecer e valorizar as
identidades culturais. Ao entender que há tradição e história presentes
em aldeias, comunidades ribeirinhas, quilombos, bairros populares,
terreiros, assentamentos e outros espaços, eles podem se orgulhar
de a cultura de sua localidade integrar a diversidade que caracteriza
o Brasil [...].observa-se grande variação na expressão dessas culturas.
Haja vista a diversidade das populações indígenas. Existem no Brasil
4.774 aldeias, com um total de 218 etnias e 180 línguas, que estão
localizadas em 448 municípios, de 24 Estados brasileiros. Ouvindo as
histórias das pessoas mais velhas, é possível conhecer mais as tradições
e identificar um patrimônio que pode ser recriado nos mais diversos
contextos e situações. Assim, independentemente da forma como são
denominados ou se autodenominam em cada região do País – índios,

50
QUESTÕES ÉTNICO-RACIAIS │ UNIDADE II

negros, caboclos, ribeirinhos, habitantes da floresta, quilombolas –,


as influências afro-brasileira e indígena podem estar presentes nas
formas de ser e de viver, embora as informações sobre essas culturas
nem sempre sejam mencionadas no conteúdo escolar, nos meios de
comunicação e no dia a dia dos municípios.

Certamente que em muitos pontos estamos bem aquém do ideal, mas muito mais
avançados do que com relação ao passado. Onde, por conta própria, muitos índios (a
maior parte deles) possuem opções de escolha em muitos sentidos. O guia traz consigo
também os importantes aspectos da busca pela igualdade étnico-racial.

Quadro 8. Aspectos principais da comunicação para igualdade étnico-racial.

As culturas de origem africana e indígena possuem uma diversidade enorme. De maneira geral, identificam-se características bastante semelhantes entre
elas, pois são povos que:
a) organizam-se por meio da participação coletiva e valorizam a presença de crianças, jovens, adultos e idosos em todos os processos sociais;
b) preservam a vida natural e social, isto é, juntam-se em torno de objetivos comuns;
c) consideram o território patrimônio de gerações e gerações;
d) definem seus territórios não somente pela extensão e recursos naturais neles existentes, mas também pelo trabalho, símbolos, vivências,
cemitérios, habitações, plantações, roças comunitárias, caminhos, rios, riachos, praias, mar, lagos, montanhas, florestas, córregos, mitos,
histórias e muito mais;
e) foram atingidos por diversas formas de violência física e cultural, ameaças de dissolução e, por isso, entendem como fundamental a
transmissão entre as gerações de suas histórias e culturas, nem sempre respeitadas no contexto em que vivem atualmente;
f) elaboram visões de mundo, a partir de suas vivências e sentimentos, valorizam as experiências de pessoas de mais idade e das envolvidas
nas religiões – sejam de matriz africana ou indígena;
g) tratam tudo isso (vivências, sentimentos, experiências dos mais velhos e dos líderes religiosos) como legado, herança, bens de família – uma
memória que se perpetua oralmente.

Fonte: Cultura e Identidade: Comunicação para igualdade étnico-racial. Disponível em: <http://www.unicef.org/brazil/pt/
br_cultura_guia_sab.pdf>. Acesso em: 23 out. 2015.

O UNICEF e as expressões culturais dos povos


indígenas e afro-brasileiros
Dentro das expressões culturais que por direito os indígenas e afro-brasileiros tem de
externalizar entre si e onde estiverem, obviamente em respeito mútuo, o UNIFEF traz
consigo os tipos de expressões culturais desempenhadas (e que podem ser) por eles,
dado que o direito fora conquistado, com grande ajuda da Constituição Federal de
1988. Cabe-nos com isto avaliá-las:

51
UNIDADE II │ QUESTÕES ÉTNICO-RACIAIS

Quadro 9. Tipos de manifestações culturais.

Atos públicos, festas e celebrações, como Sairé, Quarup, Boi de Parintins, Círio de Nazaré, festejos do Divino Espírito Santo,
apresentações teatrais, de dança, recitais poéticos, exposições de artes plásticas, bumba-meu-boi, tambores, reinados do
Eventos
congo, maculelê, ternos e folias de reis, tambor de crioula, cantos de trabalho, ritos de passagem, cantorias, quadrilhas
juninas, sambas, que tenham a cultura negra e/ou indígena evidenciada.
Marcos do nascimento, da passagem da infância/adolescência para a vida adulta, do casamento, da morte etc. São
Rituais
exemplos: Moça Nova, Tucandeira e rituais sagrados, como ocorrem nas religiões de matriz africana.
Processos de trabalho e produtos obtidos, próprios do município ou da região, e que são característicos do viver, celebrar,
conviver, cuja origem e história se baseiam nas civilizações indígenas e/ou africanas. Essas expressões culturais podem
Ofícios e modos de
ser encontradas nas artes e no artesanato, na fabricação de instrumentos e de outros objetos de uso religioso, na culinária,
fazer na medicina tradicional. Alguns exemplos: cerâmica, cestaria, cocares, pinturas corporais, ferramentas de orixás, carranca,
panos-da-costa, penteados, trançados, tear, navegações, comidas (tapioca, acarajé etc.), entre outros.
Espaços construídos ou naturais, como as aldeias, as reservas indígenas, territórios quilombolas, terreiros, mercados, feiras,
Lugares e construções rios, cachoeiras, praias, beira-rio, beiradão, mangues, igarapés, igapós, lagos, paranás, várzeas, furos, montanhas, florestas.
Eles testemunham passagens importantes da história local e traduzem a experiência indígena e afro-brasileira no município.
Contados, geralmente, pelas pessoas mais velhas. Elas conhecem a história e a cultura e têm prazer de repassá-las aos
mais jovens, que, ao conhecê-las, começam a se orgulhar de seu pertencimento étnico-racial. A memória cultural de uma
localidade é o maior bem que ela possui. E a tradição oral faz esse bem circular, ganhar mundo, organizando a vida, as
Mitos, contos, histórias ideias, mantendo a riqueza cultural de um povo. Isso tudo compõe a cultura de cada localidade, mostrando o jeito como
as pessoas se relacionam, se vinculam ao passado e à tradição, dando continuidade à existência. Nas culturas indígenas e
afro-brasileiras, as histórias são a forma principal de transmissão e preservação do conhecimento e da cultura em si. Dessa
forma é que têm resistido, com o passar do tempo, à massificação, que tende a ditar um padrão cultural uniformizante.
Pessoas com um trabalho e uma vivência reconhecidos por grande parte da população. Geralmente, são líderes
comunitários, artistas, pessoas com conhecimentos relevantes da região e com bastante experiência de vida. Gente que se
Lideranças e
incumbe de representar e cuidar de seu povo e repassar os modos de celebração e de cura aprendidos de seus ancestrais,
personalidades como caciques, tuxauas, líderes quilombolas, benzedeiras, mães e pais de santo, pajés, guerreiros, cantadores, mestres de
manifestações culturais.
Expressões e vocábulos Expressões linguísticas de origem indígena e africana que permanecem no falar cotidiano do povo, sua linguagem específica
locais e regionais e seus mais diversos significados. Muitos nomes de rios, povoados, comidas e objetos carregam essa herança.
Narrativas que contam um pouco da vida do município e/ou de uma comunidade específica, resgatando suas origens, como
Histórias dos locais e
surgiu, se existe há muito tempo, quem foram seus pioneiros, se já foi maior, se pertenceu a outro município, etc. Valem as
dos territórios explanações sobre como o município se encontra atualmente, a história de seus bairros, comunidades e distritos.
Entidades locais representativas da população indígena e afro-brasileira do município, como associações e grupos culturais
ou comunitários (ordens religiosas, grupos de capoeira e de danças populares), terreiros, organizações não governamentais,
Instituições movimentos de luta pela terra – a exemplo de seringueiros, Movimento Cabano ou Cabanagem (1835-1840) etc. Esse
aspecto permite perceber o grau de organização popular no município, quem são suas lideranças e o reconhecimento dos
trabalhos realizados pelas organizações.

Fonte: Cultura e Identidade: Comunicação para igualdade étnico-racial. Disponível em: <http://www.unicef.org/brazil/pt/
br_cultura_guia_sab.pdf>. Acesso em: 23 out. 2015.

Como visto que nas manifestações culturais pelos índios e afrodescendentes


expressadas, fortifica-se a identidade étnico-racial de todos os povos e culturas por
eles desempenhadas. Também é correto afirmar que a autoestima e autoconfiança
das minorias não somente os índios e afrodescendentes, com tais manifestações, se
fortalecem, já que demonstram força ao fazê-la. Pinsk e Pinsk (2005, pp.460-461) nos
dá uma janela histórica, bem como nos coloca uma “pulga atrás da orelha” no que se
refere à realidade dos fatos atuais:

No Brasil, especialmente no século XIX, protesto social dos escravos sob


a forma de aquilombamento ampliava seus significados. Coexistiram
assim forma diversas de quilombos: aqueles que procuravam constituir

52
QUESTÕES ÉTNICO-RACIAIS │ UNIDADE II

comunidades independentes com atividades camponesas integradas


à economia local; o aquilombamento caracterizado pelo protesto
reivindicatório dos escravos para com seus senhores e os pequenos grupos
de quilombolas que se dedicavam a razias e assaltos às fazendas próximas
[...]. Ainda durante a escravidão e avançando o século XX, muitos
quilombolas eram quase reconhecidos como pequenos camponeses, pois
iam frequentemente e com a maior liberdade aos povoados circunvizinhos
comerciar seus produtos [...]. Quanto aos aquilombamentos que se
caracterizam como formas de protestos reivindicatórios, eram, na maior
parte, constituídos por escravos pertencentes a uma mesma localidade
e/ou fazendas, sendo, na maioria das vezes, cativos de propriedade de
um mesmo fazendeiro [...]. Com tais protestos, que podiam durar alguns
meses ou até anos, esse escravos aquilombados procuram reivindicar
variados espaços autonômicos. Não raras vezes aceitavam volta à situação
de cativos, com a condição de verem suas exigências atendidas. (PINSK;
PINSK, 2005, pp.460-461)

Dentro de uma comparação entre as perspectivas indígenas e africanas sobre a mudança


parcial/total de cultura, não nos cabendo estudar uma e esquecer a outra, Baldus (1979,
pp.181-182) nos informa:

Enquanto, em geral, os negros na África Central tendem para um novo


equilíbrio dentro da própria cultura, se uma mudança é efetuada graças
ao contato com os europeus, os índios no Brasil, a este respeito, reagem
com menos volubilidade. A falta de flexibilidade, que ordinariamente
mostram em relação às influências da nossa civilização, lembra
diretamente a hipótese agora de novo alimentada pelo estudo do
cultivo índio das plantas úteis, segundo a qual os índios brasileiros são
sobreviventes de povos de alta cultura. Assimilação recíproca do novo
à sua cultura, é rara, acontecendo em casos especiais, quanto muito só
na cultura espiritual de certos tribos, por exemplo na mitologia [...]. Se
perguntarmos agora por que ordinariamente o contato com os brancos
causou própria, vemos, como causa mais importante, além do fato de
o índio possuir menos capacidade de assimilação que o negro africano,
a intrusão do europeu como indivíduo condutor nas comunidades
culturais índias. Esta intrusão cultural é favorecida pelo efeito destrutivo
que, encarado biologicamente, o homem branco exerce sobre o índio.
(BALDUS, 1979, pp.181-182)

53
UNIDADE II │ QUESTÕES ÉTNICO-RACIAIS

Leve em consideração o emprego da concepção “intrusão social” e pense até


que ponto é positivo e até quanto é negativo tal intrusão. Você realmente
acredita que o melhor seria o patamar zero de influência externa nas culturas?
E o contrário, também é verdadeiro? Não deixe de se posicionar e usar como
ponto de apoio o Anexo I.

O autor ainda nos informa, conforme falamos da figura do índio em meio ao contexto
escravista e adaptações territoriais que:

Os índios, em geral, não se deixaram escravizar como os negros: ou


opuseram resistência, sendo então exterminados, ou sucumbiram às
condições alteradas da vida. Não têm a fertilidade do negro, e o pequeno
número de seus filhos diminui ainda mais ao contato com os europeus.
O europeu não é capaz de aclimar-se na África Central, podendo, como
indivíduo, exercer lá apenas um papel efêmero. Na América do Sul,
porém, criou para si uma nova pátria, povoando-a cada vez mais, com
seus descendentes. Enquanto aqui o número dos seus cresce e o dos
índios, pelas razões mencionadas, diminui, absorve o europeu os índios
também pelo sangue. Na África Central, misturas de sangue importantes
entre ele e os negros nunca se realizaram (BALDUS, op. Cit., p.183).

Contudo, como nosso intuito aqui é o de fazer com que haja pensamento e posicionamento
frente à cediça abordagem da formação da identidade cultural brasileira, bem como
os principais aspectos que contribuíram para seu desenvolvimento, vale-nos caber de
diferentes óticas e visões sobre a discrepância da realidade que aprendemos X a factual:

Com efeito, até recentemente o destino dos índios vinha sendo traçado
por antropólogos e historiadores, sem falar sobre o pensamento desejoso
da elite dominante, como inexoravelmente condenado ao desfecho de
“fim de raça”. Por esse modo, estaria se confirmando todo um conjunto
de concepções e sentimentos, teorias, hipóteses, e elucubrações em
torno da ideia de que os índios iriam se acabar. Isso constitui o que
chamamos de “paradigma da aculturação”, o qual se pode dizer que
designa o processo histórico de destruição das populações autóctones e
domínio do Novo Mundo, analisado e interpretado como se isso fosse
um evento natural, próprio do confronto entre civilização e barbárie.
A sobrevivência dos povos indígenas atuais, no Brasil, nas Américas e
no resto do mundo não europeu significa que o paradigma tinha fortes
tinturas ideológicas. Estamos assim diante da necessidade de repensar

54
QUESTÕES ÉTNICO-RACIAIS │ UNIDADE II

todo esse processo histórico para que seja compreendido à realidade


atual da sobrevivência étnica (PINSK; PINSK, 2005, p. 435).

Continue dando vazão aos conhecimentos aqui contemplados com a leitura


de nosso Anexo III - Convenção sobre a Proteção e Promoção da Diversidade
das Expressões Culturais. Anexamos propositalmente em nosso material para
facilitar seu manuseio, marcações e anotações de textos que lhe ressaltem os
olhos e julgue mais importante. Não deixe de acompanhá-lo e como de costume,
posicionar-se a respeito.

Antes do Para (não) Finalizar, leia atentamente o seguinte texto, pense e


posicione-se a respeito.

Por Jaime Pinsk e Carla Bassanezi Pinsk

A experiência de luta e organização dos trabalhadores no Brasil não está


marcada tão somente pela formalização jurídica decretada pela Abolição. Com
o fim da escravidão – como um sistema social amparado por leis –, o processo
de lutas, e também as desigualdades, considerando os trabalhadores, suas
etnias e relações de gênero, não desaparecem, a caracterização e a reprodução
das desigualdades ganham outras dimensões. O escravo vira negro. Como?
Não mais havendo a distinção jurídica entre os trabalhadores, a marca étnica
– e histórica – da população negra é reinventada como fato social. A sociedade
brasileira, mais do que permanecer desigual em termos econômicos, sociais
e fundamentalmente raciais a partir de 1888 (portanto, temos que considerar
as experiências desde a colonização), reproduz e aumenta tais desigualdades,
marcando homens e mulheres etnicamente. A questão não foi somente a falta
de políticas públicas com relação aos ex-escravos e seus descendentes no
pós-abolição. Houve mesmo políticas públicas no período republicano
reforçando a intolerância contra a população negra: concentração fundiária nas
áreas rurais, marginalização e repressão nas áreas urbanas.

Podemos reconstituir a história dos quilombos no Brasil, articulando – para


além do protesto escravo – as lutas pelo acesso, direito e manutenção à posse e
uso da terra e a gestação de culturas originais no mundo rural. Nas complexas
experiências históricas que envolveram os quilombos, recuperam-se inúmeras
comunidades negras rurais, destacando a base da memória geracional e
comunitária, inclusive o processo de formação/ transformação e até destruição
delas. Muitas dessas comunidades rurais negras nasceram de processos
de doações de lotes de terras aos escravos (apesar de não terem o título das
mesmas), outras de movimentos migratórios do pós-abolição, no qual grupos

55
UNIDADE II │ QUESTÕES ÉTNICO-RACIAIS

negros (geralmente organizados por parentesco) procuravam terras devolutas


nas franjas das fronteiras econômicas e de ocupação. Também a articulação de
mocambos (e depois das comunidades que eles remanesceram) com vários
outros setores econômicos produziram povoados e vilas – antigas feiras ou locais
de trocas mercantis. Também é importante acompanhar a trajetória de ocupação
fundiária em algumas regiões realizada por negros (não necessariamente
libertos do 13 de maio), posteriormente expulsos por movimentos econômicos
e especulativos rurais. Muitos desses proprietários “negros” podiam não ser
necessariamente camponeses e suas atividades rurais estavam totalmente
integradas ao mercado.

No contexto da importância que a questão agrária tem assumido no Brasil é


fundamental articulá-la com outras questões e movimentos sociais. Trata-se
de uma questão nacional, como poucas que atualmente têm mobilizado o país
e seus vários setores sociais, políticos e econômicos. Torna-se uma questão
nacional, tem sido um desafio para a questão agrária no Brasil a questão étnica,
especialmente as experiências do cativeiro – com os quilombos/ mocambos e
formas de protesto de ocupação de terra – e aquelas“terras de pretos”. Destacamos
finalmente a recuperação da história dos quilombos como importante capítulo
das lutas em torno do acesso a terra – face importante da luta pela cidadania –
no Brasil, sua dimensão étnica e as reconstruções culturais relativas.

56
Para (não) Finalizar

Não pare no meio do caminho


Ingenuidade é acreditar que um assunto encontra-se esgotado sempre ao final de algum
livro, material ou estudo. Este é um meio de pesquisa para que seus estudos continuem
e prossigam sempre avançando.

Ao longo de nosso material vimos contextos importantes para desenvolvimento da


identidade cultural brasileira, dentre eles, o que mais se destaque e toma forma de
interlocutor é a própria literatura. Vimos seus principais fundadores, bem como suas
concepções e pequenas escalas de texto, facilitando o processo de aprendizagem,
manuseio e praticidade.

Para o aluno dedicado, principalmente àqueles que viram neste material seu formato
de prosseguimento de carreira; sugerimos a pesquisa e leitura/aprofundamento do que
se segue:

Estudar de maneira aprofundada os conteúdos:

»» Era Barroca.

»» Era Neoclássica.

»» Romantismo e Regionalismo.

»» Realismo.

»» Era de Transição.

»» Era Modernista.

Educação e Profissionalização para a Igualdade Racial e de Gênero – CEAFRO

<www.ceafro.ufba.br>

Conselho Indigenista Missionário – CIMI

<www.cimi.org.br>

57
PARA (NÃO) FINALIZAR

Fundação Nacional do Índio

<www.funai.gov.br>

Instituto Socioambiental – ISA

<www.isa.org.br>

Mazza Edições

<www.mazzaedicoes.com.br>

Pallas Editora

<www.pallaseditora.com.br>

Portal da Igualdade – Secretaria de Políticas de Promoção da Igualdade Racial

<www.portaldaigualdade.gov.br>

Projeto A Cor da Cultura

<www.acordacultura.org.br>

Projeto de Documentação Fotográfica Povos Guarani

<www.djweb.com.br/historia>

Importantes informações trazidas pela UNESCO através do IPHAN

<http://www.unesco.org/culture/ich/doc/src/00096-PT.pdf>

Para debate, indicamos a leitura do artigo O afro-brasileiro e o debate sobre o


sistema de cotas: um enfoque psicossocial de Ricardo Franklin Ferreiras e Ricardo
Mendes Mattoss. Disponível em: <http://goo.gl/ijk5u3>.

58
Referências

BALDUS, Herbert. Ensaio de etnologia brasileira. 2. ed. São Paulo: INL, 1979.

BOSI, Alfredo. História concisa da literatura brasileira. 37. ed. São Paulo:
Cultrix, 2004.

COHN, Clarice. 2001. Culturas em transformação: os índios e a civilização.


Disponível em: <http://dx.doi.org/10.1590/S0102-88392001000200006>. Acesso
em: 22 mar. 2015.

COUTINHO, Afrânio dos S. A literatura no Brasil. 7. ed. São Paulo: Global, 2004.

__________. 4. ed. São Paulo: Global, 1997.

FERREIRAS, R.F.; MATTOS, R.M. 2007. O afro-brasileiro e o debate sobre


o sistema de cotas: um enfoque psicossocial. Disponível em: <http://dx.doi.
org/10.1590/S1414-98932007000100005 >. Acesso em: 22 mar. 2015.

FREYRE, Gilberto. Casa grande e senzala. 4. ed. Rio de Janeiro, 1943, pp.217,280.

QUEVEDO, Júlio. A escravidão no Brasil: trabalho e resistência. São Paulo: FDT,


1996.

PINSK, Jaime; PINSK, Carla B. História da cidadania. São Paulo: Contexto, 2005.

SCHADEN, Egon. Leituras de etnologia brasileira. São Paulo: Cia Editora


Nacional, 1976.

SECADI. Plano nacional de implementação das diretrizes curriculares


nacionais para educação das relações étnico-raciais e para o ensino de
história e cultura afro-brasileira e africana. Brasília: MEC, SECADI, 2013.

UNESCO. Programa Brasil-África: histórias cruzadas. Disponível em: < http://


www.unesco.org/new/pt/brasilia/education/inclusive-education/brazil-africa-
project/about-brazil-africa-crossed-histories/#c1098725>. Acesso em: 24 mar. 2015.

UNICEF. 2011. Cultura e identidade: comunicação para a identidade étnico-racial.


Disponível em: <http://www.unicef.org/brazil/pt/br_cultura_guia_pam.pdf>. Acesso
em: 24 mar. 2015.

WRIGHT, Jonathan. Os jesuítas: missões, mitos e histórias. Rio de Janeiro: Relume


Dumará, 2006.

59
ANEXO I

Presidência da República
Casa Civil
Subchefia para Assuntos Jurídicos

LEI No 10.639, DE 9 DE JANEIRO DE 2003.

Altera a Lei no 9.394, de 20 de dezembro


de 1996, que estabelece as diretrizes e
bases da educação nacional, para incluir
Mensagem de veto no currículo oficial da Rede de Ensino
a obrigatoriedade da temática “História
e Cultura Afro-Brasileira”, e dá outras
providências.

O PRESIDENTE DA REPÚBLICA Faço saber que o Congresso Nacional decreta e


eu sanciono a seguinte Lei:

Art. 1o A Lei no 9.394, de 20 de dezembro de 1996, passa a vigorar acrescida dos seguintes
arts. 26-A, 79-A e 79-B:

“Art. 26-A. Nos estabelecimentos de ensino fundamental e médio, oficiais e particulares,


torna-se obrigatório o ensino sobre História e Cultura Afro-Brasileira.

§ 1o O conteúdo programático a que se refere o caput deste artigo incluirá o estudo da


História da África e dos Africanos, a luta dos negros no Brasil, a cultura negra brasileira
e o negro na formação da sociedade nacional, resgatando a contribuição do povo negro
nas áreas social, econômica e política pertinentes à História do Brasil.

§ 2o Os conteúdos referentes à História e Cultura Afro-Brasileira serão ministrados no


âmbito de todo o currículo escolar, em especial nas áreas de Educação Artística e de
Literatura e História Brasileiras.

§ 3o (VETADO)”

“Art. 79-A. (VETADO)”

“Art. 79-B. O calendário escolar incluirá o dia 20 de novembro como ‘Dia Nacional da
Consciência Negra’.”

60
ANEXOS

Art. 2o Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação.

Brasília, 9 de janeiro de 2003; 182o da Independência e 115o da República.

LUIZ INÁCIO LULA DA SILVA


Cristovam Ricardo Cavalcanti Buarque

Este texto não substitui o publicado no D.O.U. de 10.1.2003

61
ANEXO II

Declaração universal sobre a diversidade


cultural

A Conferência Geral,
Reafirmando seu compromisso com a plena realização dos direitos humanos e das
liberdades fundamentais proclamadas na Declaração Universal dos Direitos Humanos
e em outros instrumentos universalmente reconhecidos, como os dois Pactos
Internacionais de 1966 relativos respectivamente, aos direitos civis e políticos e aos
direitos econômicos, sociais e culturais,

Recordando que o Preâmbulo da Constituição da UNESCO afirma “(...) que a ampla


difusão da cultura e da educação da humanidade para a justiça, a liberdade e a paz são
indispensáveis para a dignidade do homem e constituem um dever sagrado que todas
as nações devem cumprir com um espírito de responsabilidade e de ajuda mútua”,

Recordando também seu Artigo primeiro, que designa à UNESCO, entre outros
objetivos, o de recomendar “os acordos internacionais que se façam necessários para
facilitar a livre circulação das idéias por meio da palavra e da imagem”,

Referindo-se às disposições relativas à diversidade cultural e ao exercício dos direitos


culturais que figuram nos instrumentos internacionais promulgados pela UNESCO[1],

Reafirmando que a cultura deve ser considerada como o conjunto dos traços distintivos
espirituais e materiais, intelectuais e afetivos que caracterizam uma sociedade ou um
grupo social e que abrange, além das artes e das letras, os modos de vida, as maneiras
de viver juntos, os sistemas de valores, as tradições e as crenças[2],

Constatando que a cultura se encontra no centro dos debates contemporâneos sobre a


identidade, a coesão social e o desenvolvimento de uma economia fundada no saber,

Afirmando que o respeito à diversidade das culturas, à tolerância, ao diálogo e à


cooperação, em um clima de confiança e de entendimento mútuos, estão entre as
melhores garantias da paz e da segurança internacionais,

62
ANEXOS

Aspirando a uma maior solidariedade fundada no reconhecimento da diversidade


cultural, na consciência da unidade do gênero humano e no desenvolvimento dos
intercâmbios culturais,

Considerando que o processo de globalização, facilitado pela rápida evolução das novas
tecnologias da informação e da comunicação, apesar de constituir um desafio para
a diversidade cultural, cria condições de um diálogo renovado entre as culturas e as
civilizações,

Consciente do mandato específico confiado à UNESCO, no seio do sistema das Nações


Unidas, de assegurar a preservação e a promoção da fecunda diversidade das culturas,

Proclama os seguintes princípios e adota a presente Declaração:

Identidade, diversidade e pluralismo

Artigo 1o - A diversidade cultural, patrimônio comum da


humanidade

A cultura adquire formas diversas através do tempo e do espaço. Essa diversidade se


manifesta na originalidade e na pluralidade de identidades que caracterizam os grupos
e as sociedades que compõem a humanidade. Fonte de intercâmbios, de inovação e de
criatividade, a diversidade cultural é, para o gênero humano, tão necessária como a
diversidade biológica para a natureza. Nesse sentido, constitui o patrimônio comum da
humanidade e deve ser reconhecida e consolidada em beneficio das gerações presentes
e futuras.

Artigo 2o - Da diversidade cultural ao pluralismo cultural

Em nossas sociedades cada vez mais diversificadas, torna-se indispensável garantir


uma interação harmoniosa entre pessoas e grupos com identidades culturais a um só
tempo plurais, variadas e dinâmicas, assim como sua vontade de conviver. As políticas
que favoreçam a inclusão e a participação de todos os cidadãos garantem a coesão
social, a vitalidade da sociedade civil e a paz. Definido desta maneira, o pluralismo
cultural constitui a resposta política à realidade da diversidade cultural. Inseparável de
um contexto democrático, o pluralismo cultural é propício aos intercâmbios culturais e
ao desenvolvimento das capacidades criadoras que alimentam a vida pública.

63
ANEXOS

Artigo 3o - A diversidade cultural, fator de desenvolvimento

A diversidade cultural amplia as possibilidades de escolha que se oferecem a todos; é


uma das fontes do desenvolvimento, entendido não somente em termos de crescimento
econômico, mas também como meio de acesso a uma existência intelectual, afetiva,
moral e espiritual satisfatória.

Diversidade cultural e direitos humanos

Artigo 4o - Os direitos humanos, garantias da diversidade


cultural

A defesa da diversidade cultural é um imperativo ético, inseparável do respeito à


dignidade humana. Ela implica o compromisso de respeitar os direitos humanos e
as liberdades fundamentais, em particular os direitos das pessoas que pertencem a
minorias e os dos povos autóctones. Ninguém pode invocar a diversidade cultural para
violar os direitos humanos garantidos pelo direito internacional, nem para limitar seu
alcance.

Artigo 5o - Os direitos culturais, marco propício da


diversidade cultural

Os direitos culturais são parte integrante dos direitos humanos, que são universais,
indissociáveis e interdependentes. O desenvolvimento de uma diversidade criativa exige
a plena realização dos direitos culturais, tal como os define o Artigo 27 da Declaração
Universal de Direitos Humanos e os artigos 13 e 15 do Pacto Internacional de Direitos
Econômicos, Sociais e Culturais. Toda pessoa deve, assim, poder expressar-se, criar
e difundir suas obras na língua que deseje e, em partícular, na sua língua materna;
toda pessoa tem direito a uma educação e uma formação de qualidade que respeite
plenamente sua identidade cultural; toda pessoa deve poder participar na vida cultural
que escolha e exercer suas próprias práticas culturais, dentro dos limites que impõe o
respeito aos direitos humanos e às liberdades fundamentais.

Artigo 6o - Rumo a uma diversidade cultural accessível a


todos

Enquanto se garanta a livre circulação das idéias mediante a palavra e a imagem, deve-se
cuidar para que todas as culturas possam se expressar e se fazer conhecidas. A liberdade
de expressão, o pluralismo dos meios de comunicação, o multilingüismo, a igualdade
de acesso às expressões artísticas, ao conhecimento científico e tecnológico - inclusive

64
ANEXOS

em formato digital - e a possibilidade, para todas as culturas, de estar presentes nos


meios de expressão e de difusão, são garantias da diversidade cultural.

Diversidade cultural e criatividade

Artigo 7o - O patrimônio cultural, fonte da criatividade

Toda criação tem suas origens nas tradições culturais, porém se desenvolve plenamente
em contato com outras. Essa é a razão pela qual o patrimônio, em todas suas formas,
deve ser preservado, valorizado e transmitido às gerações futuras como testemunho
da experiência e das aspirações humanas, a fim de nutrir a criatividade em toda sua
diversidade e estabelecer um verdadeiro diálogo entre as culturas.

Artigo 8o - Os bens e serviços culturais, mercadorias


distintas das demais

Frente às mudanças econômicas e tecnológicas atuais, que abrem vastas perspectivas


para a criação e a inovação, deve-se prestar uma particular atenção à diversidade da
oferta criativa, ao justo reconhecimento dos direitos dos autores e artistas, assim como
ao caráter específico dos bens e serviços culturais que, na medida em que são portadores
de identidade, de valores e sentido, não devem ser considerados como mercadorias ou
bens de consumo como os demais.

Artigo 9o - As políticas culturais, catalisadoras da


criatividade

As políticas culturais, enquanto assegurem a livre circulação das ideias e das obras,
devem criar condições propícias para a produção e a difusão de bens e serviços
culturais diversificados, por meio de indústrias culturais que disponham de meios
para desenvolver-se nos planos local e mundial. Cada Estado deve, respeitando suas
obrigações internacionais, definir sua política cultural e aplicá-la, utilizando-se dos
meios de ação que julgue mais adequados, seja na forma de apoios concretos ou de
marcos reguladores apropriados.

65
ANEXOS

Diversidade cultural e solidariedade internacional

Artigo 10 - Reforçar as capacidades de criação e de


difusão em escala mundial

Ante os desequilíbrios atualmente produzidos no fluxo e no intercâmbio de bens culturais


em escala mundial, é necessário reforçar a cooperação e a solidariedade internacionais
destinadas a permitir que todos os países, em particular os países em desenvolvimento
e os países em transição, estabeleçam indústrias culturais viáveis e competitivas nos
planos nacional e internacional.

Artigo 11 - Estabelecer parcerias entre o setor público, o


setor privado e a sociedade civil

As forças do mercado, por si sós, não podem garantir a preservação e promoção da


diversidade cultural, condição de um desenvolvimento humano sustentável. Desse
ponto de vista, convém fortalecer a função primordial das políticas públicas, em parceria
com o setor privado e a sociedade civil.

Artigo 12 - A função da UNESCO

A UNESCO, por virtude de seu mandato e de suas funções, tem a responsabilidade de:

a. promover a incorporação dos princípios enunciados na presente


Declaração nas estratégias de desenvolvimento elaboradas no seio das
diversas entidades intergovernamentais;

b. servir de instância de referência e de articulação entre os estados, os


organismos internacionais governamentais e não governamentais, a
sociedade civil e o setor privado para a elaboração conjunta de conceitos,
objetivos e políticas em favor da diversidade cultural;

c. dar seguimento a suas atividades normativas, de sensibilização e de


desenvolvimento de capacidades nos âmbitos relacionados com a
presente Declaração dentro de suas esferas de competência;

d. facilitar a aplicação do Plano de Ação, cujas linhas gerais se encontram


apensas à presente Declaração.

66
ANEXOS

Linhas gerais de um plano de ação para a


aplicação da declaração universal da unesco
sobre a diversidade cultural

Os Estados-Membros se comprometem a tomar as medidas apropriadas para difundir


amplamente a Declaração Universal da UNESCO sobre a Diversidade Cultural e
fomentar sua aplicação efetiva, cooperando, em particular, com vistas à realização dos
seguintes objetivos:

1. Aprofundar o debate internacional sobre os problemas relativos à


diversidade cultural, especialmente os que se referem a seus vínculos
com o desenvolvimento e a sua influência na formulação de políticas, em
escala tanto nacional como internacional; Aprofundar, em particular,
a reflexão sobre a conveniência de elaborar um instrumento jurídico
internacional sobre a diversidade cultural.

2. Avançar na definição dos princípios, normas e práticas nos planos


nacional e internacional, assim como dos meios de sensibilização e das
formas de cooperação mais propícios à salvaguarda e à promoção da
diversidade cultural.

3. Favorecer o intercâmbio de conhecimentos e de práticas recomendáveis


em matéria de pluralismo cultural, com vistas a facilitar, em sociedades
diversificadas, a inclusão e a participação de pessoas e grupos advindos
de horizontes culturais variados.

4. Avançar na compreensão e no esclarecimento do conteúdo dos direitos


culturais, considerados como parte integrante dos direitos humanos.

5. Salvaguardar o patrimônio linguístico da humanidade e apoiar a


expressão, a criação e a difusão no maior número possível de línguas.

6. Fomentar a diversidade linguística - respeitando a língua materna - em


todos os níveis da educação, onde quer que seja possível, e estimular a
aprendizagem do plurilinguismo desde a mais jovem idade.

7. Promover, por meio da educação, uma tomada de consciência do valor


positivo da diversidade cultural e aperfeiçoar, com esse fim, tanto a
formulação dos programas escolares como a formação dos docentes.

8. Incorporar ao processo educativo, tanto o quanto necessário, métodos


pedagógicos tradicionais, com o fim de preservar e otimizar os métodos
culturalmente adequados para a comunicação e a transmissão do saber.
67
ANEXOS

9. Fomentar a “alfabetização digital” e aumentar o domínio das novas


tecnologias da informação e da comunicação, que devem ser consideradas,
ao mesmo tempo, disciplinas de ensino e instrumentos pedagógicos
capazes de fortalecer a eficácia dos serviços educativos.

10. Promover a diversidade linguística no ciberespaço e fomentar o acesso


gratuito e universal, por meio das redes mundiais, a todas as informações
pertencentes ao domínio público.

11. Lutar contra o hiato digital - em estreita cooperação com os organismos


competentes do sistema das Nações Unidas - favorecendo o acesso dos
países em desenvolvimento às novas tecnologias, ajudando-os a dominar
as tecnologias da informação e facilitando a circulação eletrônica dos
produtos culturais endógenos e o acesso de tais países aos recursos
digitais de ordem educativa, cultural e científica, disponíveis em escala
mundial.

12. Estimular a produção, a salvaguarda e a difusão de conteúdos


diversificados nos meios de comunicação e nas redes mundiais de
informação e, para tanto, promover o papel dos serviços públicos de
radiodifusão e de televisão na elaboração de produções audiovisuais
de qualidade, favorecendo, particularmente, o estabelecimento de
mecanismos de cooperação que facilitem a difusão das mesmas.

13. Elaborar políticas e estratégias de preservação e valorização do patrimônio


cultural e natural, em particular do patrimônio oral e imaterial e combater
o tráfico ilícito de bens e serviços culturais.

14. Respeitar e proteger os sistemas de conhecimento tradicionais,


especialmente os das populações autóctones; reconhecer a contribuição
dos conhecimentos tradicionais para a proteção ambiental e a gestão dos
recursos naturais e favorecer as sinergias entre a ciência moderna e os
conhecimentos locais.

15. Apoiar a mobilidade de criadores, artistas, pesquisadores, cientistas


e intelectuais e o desenvolvimento de programas e associações
internacionais de pesquisa, procurando, ao mesmo tempo, preservar
e aumentar a capacidade criativa dos países em desenvolvimento e em
transição.

68
ANEXOS

16. Garantir a proteção dos direitos de autor e dos direitos conexos, de modo
a fomentar o desenvolvimento da criatividade contemporânea e uma
remuneração justa do trabalho criativo, defendendo, ao mesmo tempo,
o direito público de acesso à cultura, conforme o Artigo 27 da Declaração
Universal de Direitos Humanos.

17. Ajudar a criação ou a consolidação de indústrias culturais nos países


em desenvolvimento e nos países em transição e, com este propósito,
cooperar para desenvolvimento das infra-estruturas e das capacidades
necessárias, apoiar a criação de mercados locais viáveis e facilitar o
acesso dos bens culturais desses países ao mercado mundial e às redes de
distribuição internacionais.

18. Elaborar políticas culturais que promovam os princípios inscritos na


presente Declaração, inclusive mediante mecanismos de apoio à execução
e/ou de marcos reguladores apropriados, respeitando as obrigações
internacionais de cada Estado.

19. Envolver os diferentes setores da sociedade civil na definição das políticas


públicas de salvaguarda e promoção da diversidade cultural.

20. Reconhecer e fomentar a contribuição que o setor privado pode aportar


à valorização da diversidade cultural e facilitar, com esse propósito, a
criação de espaços de diálogo entre o setor público e o privado.

Os Estados-Membros recomendam ao Diretor Geral que, ao executar os programas da


UNESCO, leve em consideração os objetivos enunciados no presente Plano de Ação e
que o comunique aos organismos do sistema das Nações Unidas e demais organizações
intergovernamentais e não governamentais interessadas, de modo a reforçar a sinergia
das medidas que sejam adotadas em favor da diversidade cultural.

Fonte: Disponível em: <http://unesdoc.unesco.org/images/0012/001271/127160por.


pdf>.

69
ANEXO III

Convenção sobre a proteção e promoção da


diversidade das expressões culturais
Texto oficial ratificado pelo Brasil por meio do Decreto Legislativo no 485/2006.

A Conferência Geral da Organização das Nações Unidas para Educação, a Ciência e a


Cultura, em sua 33ª reunião, celebrada em Paris, de 3 a 21 de outubro de 2005,

Afirmando que a diversidade cultural é uma característica essencial da humanidade,

Ciente de que a diversidade cultural constitui patrimônio comum da humanidade, a ser


valorizado e cultivado em benefício de todos,

Sabendo que a diversidade cultural cria um mundo rico e variado que aumenta a gama
de possibilidades e nutre as capacidades e valores humanos, constituindo, assim, um
dos principais motores do desenvolvimento sustentável das comunidades, povos e
nações,

Recordando que a diversidade cultural, ao florescer em um ambiente de democracia,


tolerância, justiça social e mútuo respeito entre povos e culturas, é indispensável para
a paz e a segurança no plano local, nacional e internacional,

Celebrando a importância da diversidade cultural para a plena realização dos direitos


humanos e das liberdades fundamentais proclamados na Declaração Universal dos
Direitos do Homem e outros instrumentos universalmente reconhecidos,

Destacando a necessidade de incorporar a cultura como elemento estratégico das


políticas de desenvolvimento nacionais e internacionais, bem como da cooperação
internacional para o desenvolvimento, e tendo igualmente em conta a Declaração do
Milênio das Nações Unidas (2000), com sua ênfase na erradicação da pobreza,

Considerando que a cultura assume formas diversas através do tempo e do espaço, e que
esta diversidade se manifesta na originalidade e na pluralidade das identidades, assim
como nas expressões culturais dos povos e das sociedades que formam a humanidade,

Reconhecendo a importância dos conhecimentos tradicionais como fonte de riqueza


material e imaterial, e, em particular, dos sistemas de conhecimento das populações

70
ANEXOS

indígenas, e sua contribuição positiva para o desenvolvimento sustentável, assim como


a necessidade de assegurar sua adequada proteção e promoção,

Reconhecendo a necessidade de adotar medidas para proteger a diversidade das


expressões culturais incluindo seus conteúdos, especialmente nas situações em que
expressões culturais possam estar ameaçadas de extinção ou de grave deterioração,

Enfatizando a importância da cultura para a coesão social em geral, e, em particular, o


seu potencial para a melhoria da condição da mulher e de seu papel na sociedade,

Ciente de que a diversidade cultural se fortalece mediante a livre circulação de ideias e


se nutre das trocas constantes e da interação entre culturas,

Reafirmando que a liberdade de pensamento, expressão e informação, bem como a


diversidade da mídia, possibilitam o florescimento das expressões culturais nas
sociedades,

Reconhecendo que a diversidade das expressões culturais, incluindo as expressões


culturais tradicionais, é um fator importante, que possibilita aos indivíduos e aos povos
expressarem e compartilharem com outros as suas ideias e valores,

Recordando que a diversidade linguística constitui elemento fundamental da diversidade


cultural, e reafirmando o papel fundamental que a educação desempenha na proteção
e promoção das expressões culturais,

Tendo em conta a importância da vitalidade das culturas para todos, incluindo as


pessoas que pertencem a minorias e povos indígenas, tal como se manifesta em sua
liberdade de criar, difundir e distribuir as suas expressões culturais tradicionais, bem
como de ter acesso a elas, de modo a favorecer o seu próprio desenvolvimento,

Sublinhando o papel essencial da interação e da criatividade culturais, que nutrem e


renovam as expressões culturais, e fortalecem o papel desempenhado por aqueles que
participam no desenvolvimento da cultura para o progresso da sociedade como um
todo,

Reconhecendo a importância dos direitos da propriedade intelectual para a manutenção


das pessoas que participam da criatividade cultural,

Convencida de que as atividades, bens e serviços culturais possuem dupla natureza,


tanto econômica quanto cultural, uma vez que são portadores de identidades, valores
e significados, não devendo, portanto, ser tratados como se tivessem valor meramente
comercial,

71
ANEXOS

Constatando que os processos de globalização, facilitado pela rápida evolução das


tecnologias de comunicação e informação, apesar de proporcionarem condições inéditas
para que se intensifique a interação entre culturas, constituem também um desafio para
a diversidade cultural, especialmente no que diz respeito aos riscos de desequilíbrios
entre países ricos e pobres,

Ciente do mandato específico confiado à UNESCO para assegurar o respeito à


diversidade das culturas e recomendar os acordos internacionais que julgue necessários
para promover a livre circulação de idéias por meio da palavra e da imagem,

Referindo-se às disposições dos instrumentos internacionais adotados pela UNESCO


relativos à diversidade cultural e ao exercício dos direitos culturais, em particular a
Declaração Universal sobre a Diversidade Cultural, de 2001,

Adota, em 20 de outubro de 2005 , a presente Convenção.

I. Objetivos e princípios diretores

Artigo 1o – OBJETIVOS

Os objetivos da presente Convenção são:

a. proteger e promover a diversidade das expressões culturais;

b. criar condições para que as culturas floresçam e interajam livremente em


benefício mútuo;

c. encorajar o diálogo entre culturas a fim de assegurar intercâmbios culturais


mais amplos e equilibrados no mundo em favor do respeito intercultural e
de uma cultura da paz;

d. fomentar a interculturalidade de forma a desenvolver a interação cultural,


no espírito de construir pontes entre os povos;

e. promover o respeito pela diversidade das expressões culturais e a


conscientização de seu valor nos planos local, nacional e internacional;

f. reafirmar a importância do vínculo entre cultura e desenvolvimento para


todos os países, especialmente para países em desenvolvimento, e encorajar
as ações empreendidas no plano nacional e internacional para que se
reconheça o autêntico valor desse vínculo;

72
ANEXOS

g. reconhecer natureza específica das atividades, bens e serviços culturais


enquanto portadores de identidades, valores e significados;

h. reafirmar o direito soberano dos Estados de conservar, adotar e implementar


as políticas e medidas que considerem apropriadas para a proteção e
promoção da diversidade das expressões culturais em seu território;

i. fortalecer a cooperação e a solidariedade internacionais em um espírito de


parceria visando, especialmente, o aprimoramento das capacidades dos
países em desenvolvimento de protegerem e de promoverem a diversidade
das expressões culturais.

Artigo 2o – PRINCÍPIOS DIRETORES

1. Princípio do respeito aos direitos humanos e às liberdades fundamentais

A diversidade cultural somente poderá ser protegida e promovida se estiverem


garantidos os direitos humanos e as liberdades fundamentais, tais como a liberdade
de expressão, informação e comunicação, bem como a possibilidade dos indivíduos de
escolherem expressões culturais.

Ninguém poderá invocar as disposições da presente Convenção para atentar contra os


direitos do homem e as liberdades fundamentais consagrados na Declaração Universal
dos Direitos Humanos e garantidos pelo direito internacional, ou para limitar o âmbito
de sua aplicação.

2. Princípio da soberania

De acordo com a Carta das Nações Unidas e com os princípios do direito internacional,
os Estados têm o direito soberano de adotar medidas e políticas para a proteção e
promoção da diversidade das expressões culturais em seus respectivos territórios.

3. Princípio da igual dignidade e do respeito por todas as culturas

A proteção e a promoção da diversidade das expressões culturais pressupõem o


reconhecimento da igual dignidade e o respeito por todas as culturas, incluindo as das
pessoas pertencentes a minorias e as dos povos indígenas.

4. Princípio da solidariedade e cooperação internacionais

A cooperação e a solidariedade internacionais devem permitir a todos os países, em


particular os países em desenvolvimento, criarem e fortalecerem os meios necessários

73
ANEXOS

a sua expressão cultural – incluindo as indústrias culturais, sejam elas nascentes ou


estabelecidas – nos planos local, nacional e internacional.

5. Princípio da complementaridade dos aspectos econômicos e culturais do


desenvolvimento

Sendo a cultura um dos motores fundamentais do desenvolvimento, os aspectos


culturais deste são tão importantes quanto os seus aspectos econômicos, e os indivíduos
e povos têm o direito fundamental de dele participarem e se beneficiarem.

6. Princípio do desenvolvimento sustentável

A diversidade cultural constitui grande riqueza para os indivíduos e as sociedades. A


proteção, promoção e manutenção da diversidade cultural é condição essencial para o
desenvolvimento sustentável em benefício das gerações atuais e futuras.

7. Princípio do acesso eqüitativo

O acesso eqüitativo a uma rica e diversificada gama de expressões culturais provenientes


de todo o mundo e o acesso das culturas aos meios de expressão e de difusão constituem
importantes elementos para a valorização da diversidade cultural e o incentivo ao
entendimento mútuo.

8. Princípio da abertura e do equilíbrio

Ao adotarem medidas para favorecer a diversidade das expressões culturais, os Estados


buscarão promover, de modo apropriado, a abertura a outras culturas do mundo e
garantir que tais medidas estejam em conformidade com os objetivos perseguidos pela
presente Convenção.

II. Campo de aplicação

Artigo 3o – CAMPO DE APLICAÇÃO

A presente Convenção aplica-se a políticas e medidas adotadas pelas

Partes relativas à proteção e promoção da diversidade das expressões culturais.

III. Definições

Artigo 4o – DEFINIÇÕES

Para os fins da presente Convenção, fica entendido que:

74
ANEXOS

1. Diversidade Cultural

“Diversidade cultural” refere-se à multiplicidade de formas pelas quais as culturas


dos grupos e sociedades encontram sua expressão. Tais expressões são transmitidas
entre e dentro dos grupos e sociedades. A diversidade cultural se manifesta não apenas
nas variadas formas pelas quais se expressa, se enriquece e se transmite o patrimônio
cultural da humanidade mediante a variedade das expressões culturais, mas também
através dos diversos modos de criação, produção, difusão, distribuição e fruição das
expressões culturais, quaisquer que sejam os meios e tecnologias empregados.

2. Conteúdo Cultural

“Conteúdo cultural” refere-se ao caráter simbólico, dimensão artística e valores culturais


que têm por origem ou expressam identidades culturais.

3. Expressões culturais

“Expressões culturais” são aquelas expressões que resultam da criatividade de


indivíduos, grupos e sociedades e que possuem conteúdo cultural.

4. Atividades, bens e serviços culturais

“Atividades, bens e serviços culturais” refere-se às atividades, bens e serviços que,


considerados sob o ponto de vista da sua qualidade, uso ou finalidade específica,
incorporam ou transmitem expressões culturais, independentemente do valor comercial
que possam ter. As atividades culturais podem ser um fim em si mesmas, ou contribuir
para a produção de bens e serviços culturais.

5. Indústrias culturais

“Indústrias culturais” refere-se às indústrias que produzem e distribuem bens e serviços


culturais, tais como definidos no parágrafo 4 acima.

6. Políticas e medidas culturais

“Políticas e medidas culturais” refere-se às políticas e medidas relacionadas à cultura,


seja no plano local, regional, nacional ou internacional, que tenham como foco a cultura
como tal, ou cuja finalidade seja exercer efeito direto sobre as expressões culturais de
indivíduos, grupos ou sociedades, incluindo a criação, produção, difusão e distribuição
de atividades, bens e serviços culturais, e o acesso aos mesmos.

75
ANEXOS

7. Proteção

“Proteção” significa a adoção de medidas que visem à preservação, salvaguarda e


valorização da diversidade das expressões culturais.

“Proteger” significa adotar tais medidas.

8. Interculturalidade

“Interculturalidade” refere-se à existência e interação eqüitativa de diversas culturas,


assim como à possibilidade de geração de expressões culturais compartilhadas por
meio do diálogo e respeito mútuo.

IV. Direitos e obrigações das partes

Artigo 5o - REGRA GERAL EM MATÉRIA DE DIREITOS E OBRIGAÇÕES

1. As Partes, em conformidade com a Carta das Nações Unidas, os princípios do


direito internacional e os instrumentos universalmente reconhecidos em matéria de
direitos humanos, reafirmam seu direito soberano de formular e implementar as suas
políticas culturais e de adotar medidas para a proteção e a promoção da diversidade das
expressões culturais, bem como para o fortalecimento da cooperação internacional, a
fim de alcançar os objetivos da presente Convenção.

2. Quando uma Parte implementar políticas e adotar medidas para proteger e promover
a diversidade das expressões culturais em seu território, tais políticas e medidas deverão
ser compatíveis com as disposições da presente Convenção.

Artigo 6o – DIREITOS DAS PARTES NO ÂMBITO NACIONAL

1. No marco de suas políticas e medidas culturais, tais como definidas no artigo 4.6,
e levando em consideração as circunstâncias e necessidades que lhe são particulares,
cada Parte poderá adotar medidas destinadas a proteger e promover a diversidade das
expressões culturais em seu território.

2. Tais medidas poderão incluir:

a. medidas regulatórias que visem à proteção e promoção da diversidade


das expressões cultuais;

b. medidas que, de maneira apropriada, criem oportunidades às atividades,


bens e serviços culturais nacionais – entre o conjunto das atividades,
bens e serviços culturais disponíveis no seu território –, para a sua

76
ANEXOS

criação, produção, difusão, distribuição e fruição, incluindo disposições


relacionadas à língua utilizada nessas atividades, bens e serviços;

c. medidas destinadas a fornecer às indústrias culturais nacionais


independentes e às atividades no setor informal acesso efetivo aos
meios de produção, difusão e distribuição das atividades, bens e serviços
culturais;

d. medidas voltadas para a concessão de apoio financeiro público;

e. medidas com o propósito de encorajar organizações de fins não


lucrativos, e também instituições públicas e privadas, artistas e outros
profissionais de cultura, a desenvolver e promover o livre intercâmbio e
circulação de idéias e expressões culturais, bem como de atividades, bens
e serviços culturais, e a estimular tanto a criatividade quanto o espírito
empreendedor em suas atividades;

f. medidas com vistas a estabelecer e apoiar, de forma adequada, as


instituições pertinentes de serviço público;

g. medidas para encorajar e apoiar os artistas e todos aqueles envolvidos


na criação de expressões culturais;

h. medidas objetivando promover a diversidade da mídia, inclusive


mediante serviços públicos de radiodifusão.

Artigo 7o – MEDIDAS PARA A PROMOÇÃO DAS EXPRESSÕES CULTURAIS

1. As partes procurarão criar em seu território um ambiente que encoraje indivíduos e


grupos sociais a:

a. criar, produzir, difundir, distribuir suas próprias expressões culturais,


e a elas ter acesso, conferindo a devida atenção às circunstâncias e
necessidades especiais da mulher, assim como dos diversos grupos
sociais, incluindo as pessoas pertencentes às minorias e povos indígenas;

b. ter acesso às diversas expressões culturais provenientes do seu território


e dos demais países do mundo;

2. As Partes buscarão também reconhecer a importante contribuição dos artistas,


de todos aqueles envolvidos no processo criativo, das comunidades culturais e
das organizações que os apóiam em seu trabalho, bem como o papel central que
desempenham ao nutrir a diversidade das expressões culturais.

77
ANEXOS

Artigo 8o – MEDIDAS PARA A PROTEÇÃO DAS EXPRESSÕES CULTURAIS

1. Sem prejuízo das disposições dos artigos 5 e 6, uma Parte poderá diagnosticar a
existência de situações especiais em que expressões culturais em seu território estejam
em risco de extinção, sob séria ameaça ou necessitando de urgente salvaguarda.

2. As Partes poderão adotar todas as medidas apropriadas para proteger e preservar as


expressões culturais nas situações referidas no parágrafo 1, em conformidade com as
disposições da presente Convenção.

3. As partes informarão ao Comitê Intergovernamental mencionado no Artigo 23


todas as medidas tomadas para fazer face às exigências da situação, podendo o Comitê
formular recomendações apropriadas.

Artigo 9o – INTERCÂMBIO DE INFORMAÇÕES E TRANSPARÊNCIA

As Partes:

a. fornecerão, a cada quatro anos, em seus relatórios à UNESCO, informação


apropriada sobre as medidas adotadas para proteger e promover a diversidade
das expressões culturais em seu território e no plano internacional;

b. designarão um ponto focal, responsável pelo compartilhamento de


informações relativas à presente Convenção;

c. compartilharão e trocarão informações relativas à proteção e promoção da


diversidade das expressões culturais.

Artigo 10 – EDUCAÇÃO E CONSCIENTIZAÇÃO PÚBLICA

As Partes deverão:

a. propiciar e desenvolver a compreensão da importância da proteção e


promoção da diversidade das expressões culturais, por intermédio, entre
outros, de programas de educação e maior sensibilização do público;

b. cooperar com outras Partes e organizações regionais e internacionais para


alcançar o objetivo do presente artigo;

c. esforçar-se por incentivar a criatividade e fortalecer as capacidades


de produção, mediante o estabelecimento de programas de educação,
treinamento e intercâmbio na área das indústrias culturais. Tais medidas
deverão ser aplicadas de modo a não terem impacto negativo sobre as
formas tradicionais de produção.

78
ANEXOS

Artigo 11 – PARTICIPAÇÃO DA SOCIEDADE CIVIL

As Partes reconhecem o papel fundamental da sociedade civil na proteção e promoção


da diversidade das expressões culturais. As Partes deverão encorajar a participação ativa
da sociedade civil em seus esforços para alcançar os objetivos da presente Convenção.

Artigo 12 – PROMOÇÃO DA COOPERAÇÃO INTERNACIONAL

As Partes procurarão fortalecer sua cooperação bilateral, regional e internacional, a


fim de criar condições propícias à promoção da diversidade das expressões culturais,
levando especialmente em conta as situações mencionadas nos Artigos 8 e 17, em
particular com vistas a:

a. facilitar o diálogo entre as Partes sobre política cultural;

b. reforçar as capacidades estratégicas e de gestão do setor público nas


instituições públicas culturais, mediante intercâmbios culturais profissionais
e internacionais, bem como compartilhamento das melhores práticas;

c. reforçar as parcerias com a sociedade civil, organizações não-governamentais


e setor privado, e entre essas entidades, para favorecer e promover a
diversidade das expressões culturais;

d. promover a utilização das novas tecnologias e encorajar parcerias para


incrementar o compartilhamento de informações, aumentar a compreensão
cultural e fomentar a diversidade das expressões culturais;

e. encorajar a celebração de acordos de co-produção e de codistribuição.

Artigo 13 – INTEGRAÇÃO DA CULTURA NO DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL

As Partes envidarão esforços para integrar a cultura nas suas políticas de desenvolvimento,
em todos os níveis, a fim de criar condições propícias ao desenvolvimento sustentável
e, nesse marco, fomentar os aspectos ligados à proteção e promoção da diversidade das
expressões culturais.

Artigo 14 – COOPERAÇÃO PARA O DESENVOLVIMENTO

As Partes procurarão apoiar a cooperação para o desenvolvimento sustentável e a


redução da pobreza, especialmente em relação às necessidades específicas dos países
em desenvolvimento, com vistas a favorecer a emergência de um setor cultural dinâmico
pelos seguintes meios, entre outros:

a. o fortalecimento das indústrias culturais em países em desenvolvimento:

79
ANEXOS

›› criando e fortalecendo as capacidades de produção e distribuição


culturais nos países em desenvolvimento;

›› facilitando um maior acesso de suas atividades, bens e serviços culturais


ao mercado global e aos circuitos internacionais de distribuição;

›› permitindo a emergência de mercados regionais e locais viáveis;

›› adotando, sempre que possível, medidas apropriadas nos países


desenvolvidos com vistas a facilitar o acesso ao seu território das
atividades, bens e serviços culturais dos países em desenvolvimento;

›› apoiando o trabalho criativo e facilitando, na medida do possível, a


mobilidade dos artistas dos países em desenvolvimento;

›› encorajando uma apropriada colaboração entre países desenvolvidos e


em desenvolvimento, em particular nas áreas da música e do cinema.

b. o fortalecimento das capacidades por meio do intercâmbio de


informações, experiências e conhecimentos especializados, assim como
pela formação de recursos humanos nos países em desenvolvimento, nos
setores púbico e privado, no que concerne notadamente as capacidades
estratégicas e gerenciais, a formulação e implementação de políticas, a
promoção e distribuição das expressões culturais, o desenvolvimento
das médias, pequenas e micro empresas, e a utilização das tecnologias e
desenvolvimento e transferência de competências;

c. a transferência de tecnologias e conhecimentos mediante a introdução


de medidas apropriadas de incentivo, especialmente no campo das
indústrias e empresas culturais;

d. o apoio financeiro mediante:

›› o estabelecimento de um Fundo Internacional para a Diversidade


Cultural conforme disposto no artigo 18;

›› a concessão de assistência oficial ao desenvolvimento, segundo


proceda, incluindo a assistência técnica, a fim de estimular e incentivar
a criatividade;

›› outras formas de assistência financeira, tais como empréstimos


com baixas taxas de juros, subvenções e outros mecanismos de
financiamento.

80
ANEXOS

Artigo 15 – MODALIDADES DE COLABORAÇÃO

As Partes incentivarão o desenvolvimento de parcerias entre o setor público, o setor


privado e organizações de fins não-lucrativos, e também no interior dos mesmos,
a fim de cooperar com os países em desenvolvimento no fortalecimento de suas
capacidades de proteger e promover a diversidade das expressões culturais. Essas
parcerias inovadoras enfatizarão, de acordo com as necessidades concretas dos países
em desenvolvimento, a melhoria da infra-estrutura, dos recursos humanos e políticos,
assim como o intercâmbio de atividades, bens e serviços culturais.

Artigo 16 – TRATAMENTO PREFERENCIAL PARA PAÍSES EM DESENVOLVIMENTO

Os países desenvolvidos facilitarão intercâmbios culturais com os países em


desenvolvimento garantindo, por meio dos instrumentos institucionais e jurídicos
apropriados, um tratamento preferencial aos seus artistas e outros profissionais e
praticantes da cultura, assim como aos seus bens e serviços culturais.

Artigo 17 – COOPERAÇÃO INTERNACIONAL EM SITUAÇÕES DE GRAVE AMEAÇA


ÀS EXPRESSÕES CULTURAIS

As Partes cooperarão para mutuamente se prestarem assistência, conferindo especial


atenção aos países em desenvolvimento, nas situações referidas no Artigo 8.

Artigo 18 – FUNDO INTERNACIONAL PARA A DIVERSIDADE CULTURAL

1. Fica instituído um Fundo Internacional para a Diversidade Cultural, doravante


denominado o “Fundo”.

2. O Fundo estará constituído por fundos fiduciários, em conformidade com o


Regulamento Financeiro da UNESCO.

3. Os recursos do Fundo serão constituídos por:

a. contribuições voluntárias das Partes;

b. recursos financeiros que a Conferência-Geral da UNESCO assigne para


tal fim;

c. contribuições, doações ou legados feitos por outros Estados, organismos


e programas do sistema das Nações Unidas, organizações regionais ou
internacionais; entidades públicas ou privadas e pessoas físicas;

d. juros sobre os recursos do Fundo;

81
ANEXOS

e. o produto das coletas e receitas de eventos organizados em benefício do


Fundo;

f. quaisquer outros recursos autorizados pelo regulamento do Fundo.

4. A utilização dos recursos do Fundo será decidida pelo Comitê Intergovernamental,


com base nas orientações da Conferência das Partes mencionada no Artigo 22.

5. O Comitê Intergovernamental poderá aceitar contribuições, ou outras formas


de assistência com finalidade geral ou específica que estejam vinculadas a projetos
concretos, desde que os mesmos contem com a sua aprovação.

6. As contribuições ao Fundo não poderão estar vinculadas a qualquer condição


política, econômica ou de outro tipo que seja incompatível com os objetivos da presente
Convenção.

7. As Partes farão esforços para prestar contribuições voluntárias, em bases regulares,


para a implementação da presente Convenção.

Artigo 19 - INTERCÂMBIO, ANÁLISE E DIFUSÃO DE INFORMAÇÕES

1. As Partes comprometem-se a trocar informações e compartilhar conhecimentos


especializados relativos à coleta de dados e estatísticas sobre a diversidade das expressões
culturais, bem como sobre as melhores práticas para a sua proteção e promoção.

2. A UNESCO facilitará, graças aos mecanismos existentes no seu Secretariado, a


coleta, análise e difusão de todas as informações, estatísticas e melhores práticas sobre
a matéria.

3. Adicionalmente, a UNESCO estabelecerá e atualizará um banco de dados sobre os


diversos setores e organismos governamentais, privadas e de fins não lucrativos, que
estejam envolvidos no domínio das expressões culturais.

4. A fim de facilitar a coleta de dados, a UNESCO dará atenção especial à capacitação e


ao fortalecimento das competências das Partes que requisitarem assistência na matéria.

5. A coleta de informações definida no presente artigo complementará as informações


a que fazem referência as disposições do artigo 9.

V. Relações com outros instrumentos

Artigo 20 – RELAÇÕES COM OUTROS INSTRUMENTOS:APOIO MÚTUO,


COMPLEMENTARIDADE E NÃO-SUBORDINAÇÃO

82
ANEXOS

1. As Partes reconhecem que deverão cumprir de boa-fé suas obrigações perante


a presente Convenção e todos os demais tratados dos quais sejam parte. Da mesma
forma, sem subordinar esta Convenção a qualquer outro tratado:

a. fomentarão o apoio mútuo entre esta Convenção e os outros tratados dos


quais são parte; e

b. ao interpretarem e aplicarem os outros tratados dos quais são parte ou ao


assumirem novas obrigações internacionais, as Partes levarão em conta
as disposições relevantes da presente Convenção.

2. Nada na presente Convenção será interpretado como modificando os direitos e


obrigações das Partes decorrentes de outros tratados dos quais sejam parte.

Artigo 21 – CONSULTA E COORDENAÇÃO INTERNACIONAL

As Partes comprometem-se a promover os objetivos e princípios da presente Convenção


em outros foros internacionais. Para esse fim, as Partes deverão consultar-se, quando
conveniente, tendo em mente os mencionados objetivos e princípios.

VI. Órgãos da Convenção

Artigo 22 – CONFERÊNCIA DAS PARTES

1. Fica estabelecida uma Conferência das Partes. A Conferência das Partes é o órgão
plenário e supremo da presente Convenção.

2. A Conferência das Partes se reune em sessão ordinária a cada dois anos, sempre que
possível no âmbito da Conferência-Geral da UNESCO. A Conferência das Partes poderá
reunir-se em sessão extraordinária, se assim o decidir, ou se solicitação for dirigida ao
Comitê Intergovernamental por ao menos um terço das Partes.

3. A Conferência das Partes adotará o seu próprio Regimento interno.

4. As funções da Conferência das Partes são, entre outras:

a. eleger os Membros do Comitê Intergovernamental;

b. receber e examinar relatórios das Partes da presente Convenção


transmitidos pelo Comitê Intergovernamental;

c. aprovar as diretrizes operacionais preparadas, a seu pedido, pelo Comitê


Intergovernamental;

83
ANEXOS

d. adotar quaisquer outras medidas que considere necessárias para


promover os objetivos da presente Convenção.

Artigo 23 – COMITÊ INTERGOVERNAMENTAL

1. Fica instituído junto à UNESCO um Comitê Intergovernamental para a Proteção e


Promoção da Diversidade das Expressões Culturais, doravante referido como “Comitê
Intergovernamental”. Ele é composto por representantes de 18 Estados-Partes da
Convenção, eleitos pela Conferência das Partes para um mandato de quatro anos, a
partir da entrada em vigor da presente Convenção, conforme o artigo 29.

2. O Comitê Intergovernamental se reune em sessões anuais.

3. O Comitê Intergovernamental funciona sob a autoridade e em conformidade com as


diretrizes da Conferência das Partes, à qual presta contas.

4. Os número de membros do Comitê Intergovernamental será elevado para 24 quando


o número de membros da presente Convenção chegar a 50.

5. A eleição dos membros do Comitê Intergovernamental é baseada nos princípios da


representação geográfica eqüitativa e da rotatividade.

6. Sem prejuízo de outras responsabilidades a ele conferidas pela presente Convenção,


o Comitê Intergovernamental tem as seguintes funções:

a. promover os objetivos da presente Convenção, incentivar e monitorar a


sua implementação;

b. preparar e submeter à aprovação da Conferência das Partes, mediante


solicitação, as diretrizes operacionais relativas à implementação e
aplicação das disposições da presente Convenção;

c. transmitir à Conferência das Partes os relatórios das Partes da Convenção


acompanhados de observações e um resumo de seus conteúdos;

d. fazer recomendações apropriadas para situações trazidas à sua atenção


pelas Partes da Convenção, de acordo com as disposições pertinentes da
Convenção, em particular o Artigo 8;

e. estabelecer os procedimentos e outros mecanismos de consulta que visem


à promoção dos objetivos e princípios da presente Convenção em outros
foros internacionais;

f. realizar qualquer outra tarefa que lhe possa solicitar a Conferência das
Partes.

84
ANEXOS

7. O Comitê Intergovernamental, em conformidade com o seu Regimento interno,


poderá, a qualquer momento, convidar organismos públicos ou privados ou pessoas
físicas a participarem das suas reuniões para consultá-los sobre questões específicas.

8. O Comitê Intergovernamental elaborará o seu próprio Regimento interno e o


submeterá à aprovação da Conferências das Partes.

Artigo 24 – SECRETARIADO DA UNESCO

1. Os órgãos da presente Convenção serão assistidos pelo Secretariado da UNESCO.

2. O Secretariado preparará a documentação da Conferência das Partes e do Comitê


Intergovernamental,assim como o projeto de agenda de suas reuniões, prestando
auxílio na implementação de suas decisões e informando sobre a aplicação das mesmas.

VII. Disposições finais

Artigo 25 - SOLUÇÃO DE CONTROVÉRSIAS

1. Em caso de controvérsia acerca da interpretação ou aplicação da presente Convenção,


as Partes buscarão resolvê-la mediante negociação.

2. Se as Partes envolvidas não chegarem a acordo por negociação, poderão recorrer


conjuntamente aos bons ofícios ou à mediação de uma terceira parte.

3. Se os bons ofícios ou a mediação não forem adotados, ou se não for possível superar
a controvérsia pela negociação, bons ofícios ou mediação, uma Parte poderá recorrer
à conciliação, em conformidade com o procedimento constante do Anexo à presente
Convenção. As Partes considerarão de boa-fé a proposta de solução da controvérsia
apresentada pela Comissão de Conciliação.

4. Cada Parte poderá, no momento da ratificação, aceitação, aprovação ou adesão,


declarar que não reconhece o procedimento de conciliação acima disposto. Toda
Parte que tenha feito tal declaração poderá, a qualquer momento, retirá-la mediante
notificação ao Diretor-Geral da UNESCO.

Artigo 26 - RATIFICAÇÃO, ACEITAÇÃO, APROVAÇÃO OU ADESÃO POR


ESTADOS-MEMBROS

1. A presente Convenção estará sujeita à ratificação, aceitação, aprovação ou adesão


dos Estados-Membros da UNESCO, em conformidade com os seus respectivos
procedimentos constitucionais.

85
ANEXOS

2. Os instrumentos de ratificação, aceitação, aprovação ou adesão serão depositados


junto ao Diretor-Geral da UNESCO.

Artigo 27 – ADESÃO

1. A presente Convenção estará aberta à adesão de qualquer Estado não membro da


UNESCO, desde que pertença à Organização das Nações Unidas ou a algum dos seus
organismos especializados e que tenha sido convidado pela Conferência-Geral da
Organização a aderir à Convenção.

2. A presente Convenção estará também aberta à adesão de territórios que gozem de


plena autonomia interna reconhecida como tal pelas Nações Unidas, mas que não
tenham alcançado a total independência em conformidade com a Resolução no 1514 (XV)
da Assembleia Geral, e que tenham competência nas matérias de que trata a presente
Convenção, incluindo a competência para concluir tratados relativos a essas matérias.

3. As seguintes disposições aplicam-se a organizações regionais de integração


econômica:

a. a presente Convenção ficará também aberta à adesão de toda organização


regional de integração econômica, que estará, exceto conforme estipulado
abaixo, plenamente vinculada às disposições da Convenção, da mesma
maneira que os Estados Parte.

b. se um ou mais Estados-Membros dessas organizações forem


igualmente Partes da presente Convenção, a organização e o Estado ou
Estados-Membros decidirão sobre suas respectivas responsabilidades
no que tange ao cumprimento das obrigações decorrentes da presente
Convenção. Tal divisão de responsabilidades terá efeito após o término do
procedimento de notificação descrito no inciso (c) abaixo. A organização
e seus Estados-Membros não poderão exercer, concomitantemente, os
direitos que emanam da presente Convenção. Além disso, nas matérias
de sua competência, as organizações regionais de integração econômica
poderão exercer o direito de voto com um número de votos igual ao
número de seus Estados-Membros que sejam Partes da Convenção. Tais
organizações não poderão exercer o direito a voto se qualquer dos seus
membros o fizer, e viceversa.

c. a organização regional de integração econômica e seu Estado ou


Estados-Membros que tenham acordado a divisão de responsabilidades
prevista no inciso (b) acima, o informarão às Partes do seguinte modo:

86
ANEXOS

›› em seu instrumento de adesão, tal organização declarará, de forma


precisa, a divisão de suas responsabilidades com respeito às matérias
regidas pela Convenção;

›› em caso de posterior modificação das respectivas responsabilidades,


a organização regional de integração econômica informará ao
depositário de toda proposta de modificação dessas responsabilidades;
o depositário deverá, por sua vez, informar as Partes de tal modificação.

d. os Estados-Membros de uma organização regional de integração


econômica que se tenham tornado Partes da presente Convenção são
supostos manter a competência sobre todas as matérias que não tenham
sido, mediante expressa declaração ou informação ao depositário, objeto
de transferência de competência à organização.

e. entende-se por “organização regional de integração econômica” toda


organização constituída por Estados soberanos, membros das Nações
Unidas ou de um de seus organismos especializados, à qual tais Estados
tenham transferido suas competências em matérias regidas pela presente
Convenção, e que haja sido devidamente autorizada, de acordo com seus
procedimentos internos, a tornar-se Parte da Convenção.

4. O instrumento de adesão será depositado junto ao Diretor-Geral da UNESCO.

Artigo 28 - PONTO FOCAL

Ao aderir à presente Convenção, cada Parte designará o “ponto focal” referido no


artigo 9.

Artigo 29 - ENTRADA EM VIGOR

1. A presente Convenção entrará em vigor três meses após a data de depósito do


trigésimo instrumento de ratificação, aceitação, aprovação ou adesão, mas unicamente
em relação aos Estados ou organizações regionais de integração econômica que tenham
depositado os seus respectivos instrumentos de ratificação, aceitação, aprovação ou
adesão naquela data ou anteriormente. Para as demais Partes, a Convenção entrará em
vigor três meses após a data do depósito de seu instrumento de ratificação, aceitação,
aprovação ou adesão.

2. Para os fins do presente artigo, nenhum instrumento depositado por organização


regional de integração econômica será contado como adicional àqueles depositados
pelos Estados-Membros da referida organização.

87
ANEXOS

Artigo 30 - SISTEMAS CONSTITUCIONAIS NÃO UNITÁRIOS OU FEDERATIVOS

Reconhecendo que os acordos internacionais vinculam de mesmo modo as Partes,


independentemente de seus sistemas constitucionais, as disposições a seguir
aplicam-se às Partes com regime constitucional federativo ou não unitário:

a. no que se refere às disposições da presente Convenção cuja aplicação


seja da competência do poder legislativo federal ou central, as obrigações
do governo federal ou central serão as mesmas das Partes que não são
Estados federativos;

b. no que se refere às disposições desta Convenção cuja aplicação seja da


competência de cada uma das unidades constituintes, sejam elas Estados,
condados, províncias ou cantões que, em virtude do sistema constitucional
da federação, não tenham a obrigação de adotar medidas legislativas, o
governo federal comunicará, quando necessário, essas disposições às
autoridades competentes das unidades constituintes, sejam elas Estados,
condados, províncias ou cantões, com a recomendação de que sejam
aplicadas.

Artigo 31 - DENÚNCIA

1. Cada uma das Partes poderá denunciar a presente Convenção.

2. A denúncia será notificada em instrumento escrito despositado junto ao


Diretor-Geral da UNESCO.

3. A denúncia terá efeito doze meses após a recepção do respectivo instrumento. A


denúncia não modificará em nada as obrigações financeiras que a Parte denunciante
assumiu até a data de efetivação da retirada.

Artigo 32 - FUNÇÕES DE DEPOSITÁRIO

O Diretor-Geral da UNESCO, na condição de depositário da presente Convenção,


informará aos Estados-Membros da Organização, aos Estados não membros e às
organizações regionais de integração econômica a que se refere o Artigo 27, assim como
às Nações Unidas, sobre o depósito de todos os instrumentos de ratificação, aceitação,
aprovação ou adesão mencionados nos artigos 26 e 27, bem como sobre as denúncias
previstas no Artigo 31.

88
ANEXOS

Artigo 33 – EMENDAS
1. Toda Parte poderá, por comunicação escrita dirigida ao Diretor-Geral, propor emendas
à presente Convenção. O Diretor-Geral transmitirá essa comunicação às demais Partes.
Se, no prazo de seis meses a partir da data da transmissão da comunicação, pelo
menos metade dos Estados responder favoravelmente a essa demanda, o Diretor-Geral
apresentará a proposta à próxima sessão da Conferência das Partes para discussão e
eventual adoção.
2. As emendas serão adotadas por uma maioria de dois terços das Partes presentes e
votantes.
3. Uma vez adotadas, as emendas à presente Convenção serão submetidas às Partes
para ratificação, aceitação, aprovação ou adesão.
4. Para as Partes que as tenham ratificado, aceitado, aprovado ou a elas aderido,
as emendas à presente Convenção entrarão em vigor três meses após o depósito
dos instrumentos referidos no parágrafo 3 deste Artigo por dois terços das Partes.
Subseqüentemente, para cada Parte que a ratifique, aceite, aprove ou a ela adira, a
emenda entrará em vigor três meses após a data do depósito por essa Parte do respectivo
instrumento de ratificação, aceitação, aprovação ou adesão.
5. O procedimento estabelecido nos parágrafos 3 e 4 não se aplicarão às emendas
ao artigo 23 relativas ao número de membros do Comitê Intergovernamental. Tais
emendas entrarão em vigor no momento em que forem adotadas.
6. Um Estado, ou uma organização regional de integração econômica definda no artigo
27, que se torne Parte da presente Convenção após a entrada em vigor de emendas
conforme o parágrafo 4 do presente Artigo, e que não manifeste uma intenção diferente,
será considerado:

a. parte da presente Convenção assim emendada; e

b. parte da presente Convenção não-emendada relativamente a toda

Parte que não esteja vinculada a essa emenda.

Artigo 34 – TEXTOS AUTÊNTICOS

A presente Convenção está redigida em árabe, chinês, espanhol, francês, inglês e russo,
sendo os seis textos igualmente autênticos.

Artigo 35 – REGISTRO

Em conformidade com o disposto no artigo 102 da Carta das Nações Unidas, a


presente Convenção será registrada no Secretariado das Nações Unidas por petição do
Diretor-Geral da UNESCO.

89
Anexo IV
Procedimento de conciliação

Artigo 1o – COMISSÃO DE CONCILIAÇÃO

Por solicitação de uma das Partes da controvérsia, uma Comissão de Conciliação será
criada. Salvo se as Partes decidirem de outra maneira, a Comissão será composta de
5 membros, sendo que cada uma das Partes envolvidas indicará dois membros e o
Presidente será escolhido de comum acordo pelos 4 membros assim designados.

Artigo 2o – MEMBROS DA COMISSÃO

Em caso de controvérsia entre mais de duas Partes, as Partes que tenham o mesmo
interesse designarão seus membros da Comissão em comum acordo. Se ao menos duas
Partes tiverem interesses independentes ou houver desacordo sobre a questão de saber
se têm os mesmos interesses, elas indicarão seus membros separadamente.

Artigo 3o – NOMEAÇÕES

Se nenhuma indicação tiver sido feita pelas Partes dentro do prazo de dois meses a
partir da data de pedido de criação da Comissão de Conciliação, o Diretor-Geral da
UNESCO fará as indicações dentro de um novo prazo de dois meses, caso solicitado
pela Parte que apresentou o pedido.

Artigo 4o – PRESIDENTE DA COMISSÃO

Se o Presidente da Comissão não tiver sido escolhido no prazo de dois meses após a
designação do último membro da Comissão, o Diretor-Geral da UNESCO designará o
Presidente dentro de um novo prazo de dois meses, caso solicitado por uma das Partes.

Artigo 5o – DECISÕES

A Comissão de Conciliação tomará as suas decisões pela maioria de seus membros. A


menos que as Partes na controvérsia decidam de outra maneira, a Comissão estabelecerá
o seu próprio procedimento. Ela proporá uma solução para a controvérsia, que as Partes
examinarão de boa-fé.

90
ANEXOS

Artigo 6o – DISCORDÂNCIA

Em caso de desacordo sobre a competência da Comissão de Conciliação, a mesma


decidirá se é ou não competente.

Fonte: Disponível em:


<http://unesdoc.unesco.org/images/0015/001502/150224POR.pdf>

91

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