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Ecumenismo

Brasília-DF.
Elaboração

Paulo Lima

Produção

Equipe Técnica de Avaliação, Revisão Linguística e Editoração


Sumário

Apresentação.................................................................................................................................. 4

Organização do Caderno de Estudos e Pesquisa..................................................................... 5

Introdução.................................................................................................................................... 7

Unidade i
História................................................................................................................................................ 9

capítulo 1
Conceituação ..................................................................................................................... 9

capítulo 2
Concílios ecumênicos...................................................................................................... 12

capítulo 3
Movimento ecumênico moderno.................................................................................... 20

Capítulo 4
Resistência ao ecumenismo............................................................................................... 33

Unidade iI
Sincretismo e cultura...................................................................................................................... 41

capítulo 1
Um breve histórico ............................................................................................................ 41

capítulo 2
Sincretismo e suas ramificações...................................................................................... 56

capítulo 3
Diálogo inter-religioso e cultural.................................................................................. 61

Para (não) Finalizar...................................................................................................................... 69

Referências................................................................................................................................... 71

ANEXO............................................................................................................................................. 73
Apresentação

Caro aluno

A proposta editorial deste Caderno de Estudos e Pesquisa reúne elementos que se


entendem necessários para o desenvolvimento do estudo com segurança e qualidade.
Caracteriza-se pela atualidade, dinâmica e pertinência de seu conteúdo, bem como pela
interatividade e modernidade de sua estrutura formal, adequadas à metodologia da
Educação a Distância – EaD.

Pretende-se, com este material, levá-lo à reflexão e à compreensão da pluralidade


dos conhecimentos a serem oferecidos, possibilitando-lhe ampliar conceitos
específicos da área e atuar de forma competente e conscienciosa, como convém ao
profissional que busca a formação continuada para vencer os desafios que a evolução
científico-tecnológica impõe ao mundo contemporâneo.

Elaborou-se a presente publicação com a intenção de torná-la subsídio valioso, de modo


a facilitar sua caminhada na trajetória a ser percorrida tanto na vida pessoal quanto na
profissional. Utilize-a como instrumento para seu sucesso na carreira.

Conselho Editorial

4
organização do Caderno
de Estudos e Pesquisa

Para facilitar seu estudo, os conteúdos são organizados em unidades, subdivididas em


capítulos, de forma didática, objetiva e coerente. Eles serão abordados por meio de
textos básicos, com questões para reflexão, entre outros recursos editoriais que visam a
tornar sua leitura mais agradável. Ao final, serão indicadas, também, fontes de consulta,
para aprofundar os estudos com leituras e pesquisas complementares.

A seguir, uma breve descrição dos ícones utilizados na organização dos Cadernos de
Estudos e Pesquisa.

Provocação

Textos que buscam instigar o aluno a refletir sobre determinado assunto antes
mesmo de iniciar sua leitura ou após algum trecho pertinente para o autor
conteudista.

Para refletir

Questões inseridas no decorrer do estudo a fim de que o aluno faça uma pausa e reflita
sobre o conteúdo estudado ou temas que o ajudem em seu raciocínio. É importante
que ele verifique seus conhecimentos, suas experiências e seus sentimentos. As
reflexões são o ponto de partida para a construção de suas conclusões.

Sugestão de estudo complementar

Sugestões de leituras adicionais, filmes e sites para aprofundamento do estudo,


discussões em fóruns ou encontros presenciais quando for o caso.

Praticando

Sugestão de atividades, no decorrer das leituras, com o objetivo didático de fortalecer


o processo de aprendizagem do aluno.

5
Atenção

Chamadas para alertar detalhes/tópicos importantes que contribuam para a


síntese/conclusão do assunto abordado.

Saiba mais

Informações complementares para elucidar a construção das sínteses/conclusões


sobre o assunto abordado.

Sintetizando

Trecho que busca resumir informações relevantes do conteúdo, facilitando o


entendimento pelo aluno sobre trechos mais complexos.

Exercício de fixação

Atividades que buscam reforçar a assimilação e fixação dos períodos que o autor/
conteudista achar mais relevante em relação a aprendizagem de seu módulo (não
há registro de menção).

Avaliação Final

Questionário com 10 questões objetivas, baseadas nos objetivos do curso,


que visam verificar a aprendizagem do curso (há registro de menção). É a única
atividade do curso que vale nota, ou seja, é a atividade que o aluno fará para saber
se pode ou não receber a certificação.

Para (não) finalizar

Texto integrador, ao final do módulo, que motiva o aluno a continuar a aprendizagem


ou estimula ponderações complementares sobre o módulo estudado.

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Introdução

Desde que o homem se tornou religioso, no melhor sentido da palavra religião – vem do
latim religare, que, literalmente, significa se religar ao Divino –, o homem se contrapôs
a somente seu lado racional e mental dando com isto forma literal ao chamado Sensus
Divinitatis1 (proposto por João Calvino). Por isso, desde a existência humana na Terra
nós tentamos preencher com algo essa “sensação”, chamada “vazio” que há dentro de
si, quando seu eu espiritual está aquém do esperado ou tão somente quando não há
nada nele que se dê vazão.

Nessa caçada incessante, a espécie humana, dada pela ciência (por ora) como a única
racional (exceto golfinhos, elefantes e outros animais que estão ainda sendo estudados),
vem se dando ritos, estruturas religiosas das mais diversas, cultos a deuses de forma
direta ou indireta, simulacros, danças e rituais dos mais diversos tipos e formas; livros
dados como sagrados ou material de apoio à fé, seja ela em qualquer deus, templos
e locais de adoração consagrados a determinadas divindades. Enfim, o culto a seres
maiores é um fato histórico e exatamente por isso que o estudaremos, uma vez que
por meio do Ecumenismo, utilizando-se do sincretismo, a espécie humana vem se
dando a culturas mescladas cada vez mais distintas e veremos que não está distante das
primitivas.

Diante de várias religiões ao redor do mundo, procurou-se, a partir de um dado


momento, jungir todas elas, por meio de acordos primitivos, Concílios Antigos ou
Modernos, encabeçado pelo Vaticano II.

O movimento ecumênico obviamente é um marco histórico de nosso século e começa


pela fusão2 de religiões do sentido menos estrito da palavra, “semelhantes”, tal como
Cristianismo, Judaísmo e Catolicismo. Deste modo houve um interesse concreto de
demais religiões em juntar-se a tal sincretismo, utilizando-se como argumento maior a
paz e união do corpo de Cristo, dentro de uma Weltanschauung3 cristã.

Estudaremos neste material, portanto, como se deu dentro da história (não se limitando
somente a esta ciência) a concepção do homem frente a assuntos religiosos e políticos
de maior grau para a concretização do ecumenismo no mundo, bem como vem se dando
na atualidade com o sincretismo latente entre as religiões no mundo e principalmente
as latino-americanas e o diálogo inter-religioso envolvido. Não deixará de fazer parte
1 Literalmente tem o significado de “Sensação Divina”.
2 Terminologia que gera fortes debates.
3 Cosmovisão.

7
iminente o estudo das práticas e teorias ecumênicas nas diferentes áreas da cultura,
considerando tais ações o limiar entre a efetiva concretização de muitas religiões
ortodoxas que se ausentam até mesmo do debate sobre o assunto.

Não há meios, contudo, de falarmos sobre ecumenismo sem citar informações


relevantes da história da Igreja Cristã, tampouco os Concílios Ecumênicos formalmente
executados, uma vez que o ecumenismo mistura-se com tais assuntos, bem como seu
antagonismo, o rompimento da unidade das Igrejas do Ocidente e Oriente, o qual se
deu principalmente por movimentos reformadores do século XVI e outras divisões.

Existem grupos apoiadores e contrários, considerando o tema com forte abrangência


religiosa, nos quais, com efeito, o ecumenismo está inteiramente inserido.

Tanto o diálogo inter-religioso quanto posicionamentos resistentes ao movimento


ecumênico serão tratados. Sem embargos, estudaremos também como outras culturas
enxergam e seu grau de influência, decisão e envolvimento no movimento ecumênico
e o sincretismo religioso, traçando um possível futuro para o tema, dentro de fatores
previamente estabelecidos, haja vista a toda historicidade que teremos no que rege o
nosso assunto.

Um dos objetivos deste material, por fim, é o de instigar o pensamento e a posição


frente ao contexto em questão, dada a grande instabilidade do tema e seus respectivos
posicionamentos diversificados que vão do mais puro ódio ao sonho de sua realização
completa; sendo este material um guia para a reflexão, cabe ao aluno utilizá-lo como fonte
de consulta por tempo indeterminado e ao fim obter uma posição contundente frente a
um tema que é considerado por uns como um problema e, por outros, uma solução.

Objetivos
»» Analisar historicidade do movimento Ecumênico.

»» Despertar e instigar o pensamento e o posicionamento.

»» Compreender a discussão ecumênica hodierna no contexto


latino-americano.

»» Compreender a importânciado diálogo inter-religioso.

»» Relacionar a importância do sincretismo no ecumenismo.

»» Demonstrar as diferentes posições culturais frente ao assunto.

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História Unidade i

Nesta unidade veremos uma boa gama da historicidade que envolve o ecumenismo, seu
desenrolar através dos séculos, bem como a importância que movimentos ecumênicos
promovidos por grupos doutos ou leigos possuem para a história do ecumenismo.

capítulo 1
Conceituação

Conceito de ecumenismo
Segundo a boa Enciclopédia de Filosofia e Teologia de Champlin (1991, p. 262), o
vocábulo e conceituação de ecumenismo é:

Urna palavra cunhada modernamente, com base no termo grego


oikoumenika; “coisas relacionadas à terra habitada” (oikoumeni). Esse
vocábulo tem sido usado para designar tudo quanto pertence ao mundo
cristão (isto é, a Igreja, em seu aspecto ecumênico, como coextensiva do
globo habitado). Em 1937, essa palavra foi empregada na Universidade
de Princeton, nos Estados Unidos da América do Norte, para indicar
a Cadeira de Missões, que se tomou, então, Cadeira de Ecumenismo.
Daí, a palavra ecumenismo veio a significar a ciência da Igreja como
a comunidade cristã mundial, em sua natureza, funções, relações e
estratégia. Portanto, assim como a sociologia é a ciência da sociedade
em geral, assim também o ecumenismo é a ciência da comunidade
cristã mundial.

Parece um tanto quanto confuso pensar no significado da palavra ecumenismo como


terra habitada, no entanto veremos ao longo dos estudos que o intuito é justamente
este, não somente fazer com que a Terra seja habitada, pois o fazemos por puro instinto
de sobrevivência, haja vista a ordenança bíblica para crescermos e nos multiplicarmos

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UNIDADE I │ História

(Gn.1.28), mas o de torná-la habitada e não vazia de si mesma, provocando no homem


o sentimento de que ela está habitada, habitada de pessoas unas e que podem e devem
viver em plena e perfeita harmonia.

Neste sentido, os defensores do ecumenismo favorecem todo e qualquer caminho de


conciliação entre a comunidade cristã, seja ela ortodoxa ou não, haja vista diversos
Concílios Ecumênicos e Conselhos que buscam a unidade das igrejas (principalmente
cristãos, no entender de alguns), temas que serão melhores detalhados adiante.

Não nos engessaremos ingentemente nos tipos de ecumenismo, uma vez que ao longo
dos estudos eles dar-se-ão tacitamente de modo tautológico. Também veremos que se
fazem verdadeiras as palavras de Sêneca (4 a.C. – 65 d.C.), verba docente, exempla
trahunt4, em todo conteúdo didático, desde a era antiga até a época hodierna.

Não há um consenso oficial sobre os tipos de ecumenismo, no entanto, os principais e


com maior aceitação e discussão em debates são os seguintes.

»» Ecumenismo Espiritual (ou de oração): Está voltado para a


conversão do coração, por meio da oração, pela unidade do Corpo de
Cristo.

»» Ecumenismo Institucional: É impulsionado, promovido e realizado


pelas igrejas, dentro das quais existe o Conselho Ecumênico das Igrejas,
haja vista os Concílios Ecumênicos.

»» Ecumenismo da Caridade: É o amor comum entre as pessoas e as


comunidades, bem como o amor de Deus para com o homem.

»» Ecumenismo Teológico, Doutrinal ou Oficial: Formado pela


esfera intelectual eclesiástica voltada a assuntos teóricos da fé. São os
responsáveis por encabeçar o diálogo inter-religioso.

»» Ecumenismo Social ou Prático: Segundo esta visão ecumênica,


as relações dos cristãos preveem e exigem a conciliação entre eles, em
âmbito social, pastoral, cultural, social, de cooperação e de evangelização,
sempre focalizando e avultando a fulcral unidade da Igreja.

É certo que de alguma forma possa haver em muitos momentos ao longo de nossos
estudos aparentes contradições nos assuntos diversos que abordaremos, contudo
faz-se resultante somente de todo cenário de debates e posições ora a favor, ora contra
o movimento, isso em virtude das diferentes interpretações de temas políticos, sociais
e econômicos. Ficará claro, portanto, como tais áreas da vida influenciam diretamente

4 Palavras instruem, exemplos arrastam.

10
HiStóriA │ unidAdE i

em posições favoráveis ou contrárias frente ao assunto ecumênico, mas veremos,


principalmente, o palco econômico-político da história do mundo.

Ecumenismo tem como significado terra habitada, qual é, portanto, a real relação
entre uma “terra habitada” com a função do movimento de fato? Qual o sentido
da utilização do vocábulo para delimitar as ações contidas pelos integrantes
ecumênicos atualmente?

11
capítulo 2
Concílios ecumênicos

Concílios ecumênicos históricos


Os Concílios são chamados ecuménicos quando, sob a direção do
Papa ou dos seus representantes, reúnem bispos provenientes de toda
a ecúmena, ou seja, de todo o mundo habitado. Nos Concílios, a voz
do Papa e dos bispos de todo o mundo em comunhão com ele eleva-se
acima dos acontecimentos históricos e esta voz solene faz a história da
Igreja e, com ela, a história do mundo (MATTEI, 2012, p. 8).

Se entendermos que ecumenismo refere-se à busca pela fusão das religiões e que por ora
atém-se somente às igrejas cristãs, teremos nos Concílio a forma fatual de concretização
das ações por ele [o movimento ecumênico] almejadas. Segundo Champlin (1991, p.
830) a “palavra latina consilium significa ‘assembleia, ajuntamento’. O termo grego,
usado no Novo Testamento, é synedrion, que significa ‘estar sentado com’”.

Quer se aceite ou não, insofismavelmente os Concílios possuem influência direta em


nossas vidas, principalmente aos adeptos ao cristianismo, uma vez que em tais reuniões
decidia-se (e ainda decide-se) o futuro de uma crença e, por meio de centenas de
intelectuais envolvidos, discerne-se o certo do errado, o que deve ser adotado como
confiável e fidedigno e o que deve ser descartado para que, com isto, crie-se uma
doutrina não confusa e passível de crença por séculos a fio.

Segue-se, portanto, que os Concílios desempenham um papel de destaque em que a


autoridade ali envolvida é respeitada a ponto de jamais ser posta em dúvida por seus
adeptos.

Temos na Igreja Católica um pano de fundo fundamental na intermediação e ação


direta nos Concílios e os considerados ecumênicos, uma vez que a maior parte dos
participantes era de origem Católica Romana e aceitavam a intervenção e decisão final
somente do papa5. Toda sorte de integrantes da Igreja Católica faziam-se presentes, bem
como demais líderes religiosos; líderes importantes seculares e apenas observadores
também não eram postos de fora, dada a importância política do evento.

A fulcral dos Concílios para o mundo católico era tamanha que se tinha nos Concílios a
representação do autoritarismo infalível da Igreja no que tange a fé moral.
5 Dominus Dominantium, isto é, o Papa Máximo. Terminologia principalmente usada na atuação do Império Romano.

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HiStóriA │ unidAdE i

Esperava-se, contudo, a recepção, quando nestes julgamentos de assuntos diversos e


até mesmo os que não eram encontrados nas Escrituras, de uma maneira, como citado,
obrigatória, seja por um Concílio geral, ecumênico ou universal, por toda a Igreja de
Cristo. Para nos posicionar melhor, analisemos os Concílios Antigos reconhecidos pela
Igreja Católica Romana.

tabela 1: Concílios ecumênicos antigos

CONCÍLIO / ANO PRINCIPAIS ASSUNTOS TRATADOS


1. Niceia I (325 D.C.) Destacaram-se por definir a divindade de Jesus e do Espírito Santo. Credo de Niceia. Em
2. Constantinopla I (381 D.C.) Niceia também se proibiu a celebração do sabath no sábado.

3. Éfeso (431 D.C.) Dedicou-se a questões Cristológicas. Presidiu Cirilo, bispo de Alexandria. Condenaram-se
as opiniões de Nestório, bispo de Constantinopla, o qual negava a virgindade de Maria.
4. Calcedônia (451 D.C.) Condenou a criptologia de Eutíquio (378-454) pela doutrina monofisista e decretou-se
as duas naturezas de Cristo. Leão I (o Grande) teve fulcral papel, por meio de sua carta
dogmática, chamada Tomo a Flaviano.
5. Constantinopla II (553 D.C.) Decretou que a natureza de Cristo era dependente do Pai, mas falhou, e no Concílio III
6. Constantinopla III (680-681 D.C.) (680) declarou-se as duas vontades de Cristo, opondo-se aos monofisitas.

7. Niceia 11 (787 D.C.) Regulamentou a veneração de imagens e se posicionou contra os iconoclastas.


8. Constantinopla IV (869 D.C.) Este oitavo Concílio Ecumênico tratou do cisma fotiano, condenando o patriarca Fócio,
reconhecido como tal somente pelo Ocidente, e tem sido assunto de debates até hoje.
Também encerrou de maneira temporária o cisma oriental.
fonte: enciclopédia Champlin, mirador et al.

Os Concílios do primeiro ao sétimo seguiram-se mais para efeito de conhecimento aos


católicos, pois para eles somente os Concílios do oitavo ao vigésimo primeiro possuem
caráter ecumênico, uma vez que o Papa encontrava-se presente, deste modo, portanto,
antes do nono Concílio, no qual não havia presença papal, não era reconhecido como
Concílio ecumênico, uma vez que ali não se encontrava autoridade suficiente para
definição de nenhum assunto relacionado ao pensamento cristão.

Este não é um guia sobre Concílios, apenas nos serve para analisar a importância
que os Concílios possuem sobre o aspecto e efeito ecumênico mundial, houve,
contudo, alguns Concílios pré-Niceia não contundentes historicamente não
serão tratados em detalhes, uma vez que foge do escopo da delimitação do
nosso tema, já que envolvia basicamente a esfera católica, contudo, obviamente,
veremos seus efeitos nos Concílios, e isso nos basta. Portanto sugerimos a pesquisa
voluntária de cada Concílio para efeito de conhecimento, principalmente o de
Trento, Niceia e Constantinopla.

Não entraremos especificamente em assuntos detalhados e aprofundados de cada


Concílio, no entanto, falaremos um pouco mais à frente apenas dos que mais nos

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UNIDADE I │ História

interessam para fins didáticos. Conhecemos acima apenas os Concílios Antigos, ainda
nos cabe conhecer os demais considerados por muitos como de fato ecumênicos pelo
catolicismo, no entanto não reconhecidos pelo Oriente, sendo sua posição indeterminada
entre as igrejas protestantes. Dentre muitos assuntos, nos ateremos aos principais
contextos tratados à luz ecumênica. Os Concílios Medievais são:

Tabela 2: Concílios ecumênicos medievais

CONCÍLIO / ANO PRINCIPAIS ASSUNTOS TRATADOS


9. Latrão I (1123) Condenou-se o secularismo e encerrou-se a Questão das Investiduras.
10. Latrão II (1139) Invectivou os falsos papas. Estabeleceu a obrigatoriedade do celibato para o clero na Igreja ocidental.
Invectivou os hereges albigenses. Alexandre III determinou leis acerca da eleição papal e da
11. Latrão III (1179)
nomeação de bispos.
Afirmou a primazia singular da sé de Roma sobre toda a cristandade. Definiu também oficialmente o
12. Latrão IV (1215)1 dogma da transubstanciação. O pontífice Inocêncio III determinou que todo cristão, chegado ao uso
da razão, seria obrigado à confissão e à páscoa anuais; condenou-se os albigenses.
13. Lião I (1245) Atacou o monarca titular do Sacro Império Romano, imperador Frederico II, mas sem sucesso.
Tentou solucionar a ruptura com a igreja oriental. E, após a morte do imperador bizantino Miguel VIII,
14. Lião II (1274)
a união falhou.
A fim de dissolver a Ordem dos Cavaleiros Templários, oriunda das Cruzadas, alegava-se que
15. Viena (1311-1312)
estavam praticando magia.
Teve como objetivo resolver o problema do cisma papal. O imperador bizantino João VIII (1425-
16. Constança (1413-1418) 1448) ofereceu a união com o Ocidente em troca de apoio contra os turcos. Mas o papa o mudou
para Florença.
Promulgou a união com as diferentes igrejas ocidentais, incluindo a dos nestorianos e monofisitas,
como era forçada até se materializou, mas não obteve sucesso. O interesse real era o de ir contra o
17. Florença (1438-1445) Concílio de Basileia, que se enfraquecia e seus participantes voltavam-se a favor de Roma.
No oriente a união da igreja não foi sequer proclamada e Constantinopla caiu nas mãos dos turcos.
Tentou introduzir algumas pequenas reformas na igreja, mas foram alcançadas pelas Reformas
18. Latrão V (1512-1517)
Protestantes.

Fonte: Enciclopédia Champlin e Novo Dicionário de Teologia.

Mesmo nenhuma igreja reconhecendo os Concílios pós-Idade Média, em decorrência


da Reforma Protestante, a Igreja Católica convocou três, os quais se deram o nome de
“ecumênicos”.p. Trataremos da Reforma encabeçada por Martinho Lutero, tendo como
precursor Jerônimo, mais adiante. Por ora, finalizemos os Concílios:

Tabela 3: Concílios ecumênicos modernos

Reuniu-se em três estágios longos e distintos. Não conseguiu incluir nenhum protestante e por
isso alastrou-se grande hostilidade à Reforma. A profissão de fé incluída na bula Lniunctumnobis
19. Trento (1545-1563)
(1564) atestou a crença sacramental, na Eucaristia, na natureza sacrificial da missa, bem como na
legitimidade das indulgências e orações pelos mortos, na autoridade da Igreja e do próprio papa.
Completou-se a obra de Trento, e definiu-se a infalibilidade do papa nas questões de fé e moral.
20. Vaticano I (1869-1870)
Repúdio definitivo de todas as formas de galicanismo2.
Reação ao espírito da Contrarreforma. Aqui a Igreja Católica abriu-se mais para questões
21. Vaticano II (1962-1965)
protestantes, como o uso no culto do idioma local ao invés do latim.

Fonte: Enciclopédia Champlin e Novo Dicionário de Teologia.

14
História │ UNIDADE I

Era de se esperar que com tantos Concílios se promulgasse a adoção de todas as partes
cristãs uma união “estável”, algo que fizesse com que vivessem em paz e harmonia,
mas não foi assim que a carruagem andou, vimos que por vezes a tentativa ecumênica
do movimento não gerou frutos, gerando sentimentos de pura traição e rejeição, nos
quais líderes de ambas as partes chegaram a se arranhar a tal ponto que veicularam e
canalizaram este sentimento ao ódio mútuo.

Figura 1: Concílio de Niceia I

<http://www.lepanto.com.br/Imagens/SAtanasio2.jpg>

Niceia (325) e Constantinopla (381)


O catolicismo, pois, era o Credo de Niceia tal como interpretado no
Ocidente, uma Trindade numerosa, por outro lado, mas indiferenciada,
uma fé garantida pelos bispos de Roma e Alexandria. Teodósio exigia
a unidade da Igreja como fundamento de segurança do império, ainda
que dessa vez a partir do Credo de Niceia. (JOHNSON, 2003, p. 49).

Vemos, portanto, sempre o cunho político envolvido na era dos Concílios e falaremos
sobre política mais à frente. Atanásio, bispo de Alexandria (328-373), sempre fora uma
“pedra no sapato” do imperador, sob suspeita de infidelidade. Era um defensor assíduo
do Credo de Niceia, Credo no qual o Filho era coeterno e da mesma substância do Pai.
Foi acusado e condenado por vezes, e foi obrigado a fugir para o deserto. De qualquer
maneira, a continuação do Credo se deu por Dâmaso no lugar de Libério em 366 d.C.,

15
UNIDADE I │ História

e em 26 de outubro de 366, a violência tomou conta de Sicínio (atual Santa Maria


Maggiore) e com isso se deu um total 137 mortos.

A hermenêutica6 de Melício sobre o Credo de Niceia, ainda em uma weltanschauung


católica, desenvolveu-se mediante uma compreensão da dualidade Pai e Filho como
“essência similar em todas as coisas”. Portanto, na época, uma visão forçada do que
tratava-se de “mesma substância”.

Já em Constantinopla as coisas mudaram sutilmente, no II Concílio Ecumênico o papa


não se encontrava presente, mas tão somente bispos orientais. Foi presidido também
por Melécio, bispo de Antioquia. Neste Concílio, o Espírito Santo fora reconhecido
como procedente “do Pai”, isto é, não Pai e Filho, mas somente do Pai. Roma e as igrejas
orientais não se encontravam neste ato totalmente de acordo, e isto ficou claro no ano
que se seguiu, o Concílio Dâmaso (382). Houve a excomunhão do bispo Flaviano (381-
449) e com ela objetivou-se a primeira definição da natureza das reinvindicações
pontifícias. Neste ato, Roma desejava estar acima de outras Igrejas.

Trento (1545-1563)
O Concílio de Trento fora convocado principalmente para dar respostas catolicistas
à Reforma. Reinaram nos 150 anos entre o retorno de Martinho V a Roma (1420)
dezenove papas e, após a turbulência do Grande Cisma7, a conclusão do Concílio se
deu apenas em 1563 (mais de duzentos bispos compareceram ao encerramento que se
deu em 4 de dezembro deste ano e com isto assinaram seus respectivos decretos com o
objetivo de manifestar seu assentimento), sob Pio IV, com isto, enfrentaram a grande
instabilidade à sua segurança e ao prestígio.

Teve-se em Paulo III a bem-sucedida convocação do Concílio, trabalhos que, após


diversas tentativas frustradas, iniciou-se em 1545. A confiança no imperador Carlos V
(que Paulo tentava promover a paz entre este e o rei Francisco I, mas sem sucesso) por
parte do papa Paulo III era pequena, mas foi capaz de cooperar com ele. O pontífice
sequer poderia ter imaginado que um Concílio que acreditava que duraria meses (após

6 Hermenêutica vem do grego e significa “declarar”, “anunciar”, “interpretar”, no entanto, nos bons dicionários de história,
vemos que sua origem deu-se pela pessoa de Hermes, filho de Cão (exatamente aquele da Bíblia, filho de Noé), o qual é o
mesmo Bel fundador da Babilônia, “o intérprete dos deuses”. Portanto, Cusí ou Cuxe, pai de Ninrode, e Hermes eram a mesma
pessoa! Veremos mais sobre essas figuras quando falarmos de “Sincretismo Religioso”.
7 Também conhecido como Cisma do Oriente, foi o que dividiu a Igreja Apostólica em Igreja Católico-Romana e Igreja Ortodoxa
no ano de 1054 em Constantinopla. Essa divisão foi reforçada por uma história antiga de distintas crenças doutrinárias que
incluíram as controvérsias sobre a definição da natureza dualista de Cristo, bem como sobre a devoção a ícones (do grego
eikom, “imagem”). O que de fato dividiu a Igreja foi no que tange à obediência ao papado romano. No ocidente a autoridade
eclesiástica suprema passou a caber ao papa, o bispo de Roma, legitimidade a qual remontava ao próprio Cristo por meio de
Pedro. Já no Oriente, a autoridade passava-se pelo episcopado (como já vimos!) composto por bispos. O ponto mais tenso, no
qual houve a excomunhão de vez da Igreja do Oriente, foi em 1054, quando houve uma discussão da recusa da comunidade
bizantina do sul da Itália em prestar homenagem ao pontífice Leão IX.

16
História │ UNIDADE I

a condenação de praticamente rotineiras das doutrinas luteranas, mas sem tocar nas
reformas da Igreja) duraria dezoito anos!

No primeiro período do Concílio (1545-1547), produziram-se importantes decretos


– haja vista o da justificação – em confronto com os pensamentos e ensinamentos
de Lutero acerca da justificação exclusivamente por meio da fé. Foi suspendido em
Trento partindo para Bolonha, porquanto se tornou impossível dar continuidade sem o
apoio do imperador e do próprio papa. Passou-se então por uma série de tentativas de
reativação e suspensão deste Concílio até enfim finalizar-se em 1563.

Concílio Vaticano II (1964)


Um belo salto histórico, contudo é somente aqui que as coisas realmente se encaixam
para nós. Como falamos, não estudaremos casuisticamente cada Concílio, mais acima
esboçamos as “pontas dos novelos”.

Tome nota. Compareceram em 21 de novembro de 1964 neste Concílio mais de 2.600


bispos de todo o mundo. É considerado Ecumênico, como já vimos, pois o papa é o
promotor do diálogo inter-religioso. Após noventa e dois anos, ocorre o primeiro
Concílio Ecumênico que abriu as portas para uma nova era na Igreja, com a introdução
de uma série de mudanças nas normas de culto.

Contudo, o Concílio Vaticano II distingue-se dos precedentes pelo facto


de colocar um novo problema aos historiadores. Os Concílios exercem,
sob o Papa e com o Papa, um solene magistério em matéria de fé e de
moral, apresentando-se como supremos juízes e legisladores no que diz
respeito ao direito da Igreja. Ora, o Concilio Vaticano II não emanou
leis, nem deliberou de modo definitivo sobre questões de fé ou de moral,
e, como seria de esperar, esta ausência de definições dogmáticas abriu a
discussão sobre a natureza dos documentos e a forma da sua aplicação
no chamado período “pós-conciliar”. (MATTEI, 2012, p. 7).

Aqui, a igreja Católica abre-se por completo ao diálogo inter-religioso (assunto que
veremos com maiores detalhes mais à frente), em Unitatis Redintegratio8, a igreja
Católica expressa o sentimento pelo qual até então não havia dado a unificação com
qualquer outra igreja:

Entretanto, os irmãos de nós separados, tanto os indivíduos como suas


comunidades e igrejas, não gozam daquela unidade que Jesus Cristo
quis prodigalizar a todos que regenerou e convivificou num só corpo
8 Decreto sobre o Ecumenismo.

17
UNIDADE I │ História

e em novidade de vida e que as Sagradas Escrituras e a venerável


Tradição da Igreja professam. Somente através da Igreja católica de
Cristo, auxílio geral de salvação, pode ser atingida toda a plenitude
dos meios de salvação. Cremos também que o Senhor confiou todos os
bens do Novo Testamento a um único Colégio apostólico, à cuja testa
está Pedro, a fim de constituir na terra um só corpo de Cristo, ao qual
é necessário que se incorporem plenamente todos os que, de alguma
forma, pertencem ao povo de Deus (UR 3e).

Neste decreto a Igreja Católica exorta a seus fiéis que se dediquem ao movimento
ecumênico, haja vista os finais dos tempos segundo eles. A devoção pela Bíblia é
amplamente elogiada (a qual os protestantes sempre se demonstraram mais atentos), e
reconhece-se ali a Igreja Ortodoxa como irmã cujos sacramentos são válidos, bem como
os membros das Reformas como “irmãos no Senhor”.

Aparece ali, com efeito, que nem todas as crenças são pertinentemente semelhantes,
havendo certa “hierarquia de verdades”.

O decreto aduz uma mudança significativa de atitude e alude que se deixe para trás
rivalidades e, todavia, com isto, busque escutar e jamais machucar ou menosprezar
qualquer outra parte em um diálogo inter-religioso.

Como visto acima, metodistas, luteranos e ortodoxos em geral, principalmente


anglicanos, dialogaram em conjunto e bilateralmente e em 1982 a 1ª Comissão
Internacional Anglicano-Católica apresentou um documento composto por diversas
críticas negativas provindas do Santo Ofício ou da Congregação para Doutrina da Fé
sob a jurisdição do então cardeal e agora papa-emérito Joseph Ratzinger.

Já na 2ª Comissão Internacional, no mesmo ano, organizou-se outra declaração


conjunta e o Conselho Mundial das Igrejas, por sua vez, reuniu-se no Peru (Lima) para
ajustar temas cruciais, como o batismo, a eucaristia e o ministério, o qual se assemelhou
bem com o relatório da comissão anglo-católica.

João XXIII era apenas cinco anos mais novo do que Pio XII antes
de falecer. Considerado muito simpático, generoso, este papa foi
mais conhecido pela convocação do Concílio Vaticano II, que se deu
em 25 de julho de 1959. Poderia, como todos os outros papas, não
realizar este Concílio, mas decidiu fazê-lo, pois enquanto em todos
os Concílios anteriores (ditos ecumênicos) visava-se discutir questões
doutrinárias, o objetivo do papa era o de reunir todos os bispos para
efetuar uma atualização na Igreja, o chamado aggiornamento9.

9 Adaptação da tradição da Igreja à evolução do mundo contemporâneo. Adaptação ao progresso.

18
HiStóriA │ unidAdE i

O pontífice declarou que o objetivo do Concílio era o de transpor para


a linguagem moderna os ensinamentos ancestrais do Cristianismo,
segundo o historiador britânico Johnson (2003, p. 298). Contudo,
deu-se uma renovação aparente da Igreja, estendendo-se até mesmo
para alterações litúrgicas, como vimos, adotou-se uma forma mais
simples de missa utilizando vernáculo10 ao invés de latim.

Vale a pena ler Unitatis Redintegratio na íntegra em <http://www.vatican.va/


archive/hist_councils/ii_vatican_council/documents/vat-ii_decree_19641121_
unitatis-redintegratio_po.html#top>. Dar maior ênfase no subtema Movimento
Ecumênico (ou vide Anexo I).

Como um dos propósitos deste material é o de suscitar o pensamento e posicionamento,


interessante nos é avaliar alguns números pós-Concílio (vide Estatísticas Pós-Vaticano
II, p. 31), uma vez que continuamente faremos a seguinte pergunta: “Ecumenismo,
triunfo de unidade ou separação?”, “qual o posicionamento que há do lado protestante,
evangélico, católico e sectário?”, “e as outras culturas, quais são suas perspectivas?”. À
medida que o tema for avançado em sequência, veremos as diferentes óticas, contudo,
atentemo-nos àquela que maior peso histórico possui dentro do tema, a ótica (em
números) Católico-Romana.

Por fim, não é demais reforçar que o Concílio Vaticano II foi o grande divisor de águas
do ecumênismo moderno. Veremos seus reflexos ao longo de nossos estudos, por ora
Souza (2005, p. 97) nos informa:

O Concílio Vaticano II deu-se conta da historicidade das formas de poder na Igreja e


elaborou uma compreensão teológica da autoridade mais colegial e menos monárquica,
em si mais adequada a incentivar novas estruturas de participação na vida eclesial,
especialmente na Lumen Gentium (Igreja), na Christus Dominus (bispos), na
Apostolicam Actuositatem (leigos) e na Gaudium et Spes (Igreja e mundo moderno).

O aluno proativo fará pesquisas para examinar os detalhes tratados em cada


Concílio Ecumênico para obter um melhor posicionamento sobre o que foi
tratado em cada um, bem como posicionar-se-á frente a eles e será surpreendido
ao descobrir, caso não conheça, a história de sua fé e dogmas hodiernos.

10 Origina-se de Vernaculum em latim e significa a língua nativa de um país ou região.

19
capítulo 3
Movimento ecumênico moderno

Surgimento do Conselho Mundial das


Igrejas (CMI)
O impulso inicial em favor do movimento Ecumênico em nossos dias fora dado pela
Conferência Missionária Mundial realizada em Edimburgo em 1910, a qual deu início a
um processo de convergência, dirigido pelo norte-americano John R. Mott e pelo inglês
J. H. Oldham, segundo Chadwicky e Evans (2007, p. 222).

No entanto, ao contrário do que muitos pensam e oposto aos movimentos anteriores, o


movimento ecumênico moderno nasceu fora da Igreja Católica, mais precisamente no
ambiente missionário protestante, ambiente no qual a multiplicidade das confissões
criava grandes problemas ao proselitismo.

A antiga preocupação dos diferentes dogmas cristãos em combater questões que


dividiam a doutrina, a organização eclesiástica e suas respectivas práticas deu lugar aos
três movimentos inerentes ao CMI.

Fé e Ordem
Teve como principal organizador o bispo da Igreja Episcopal11 americana Charles
H. Brent (1862-1929) e é um movimento que se dedica a lutar pela reconciliação
das denominações divididas. O encontro preliminar ocorreu em 1920 e em 1925 em
Estocolmo, mas a 1ª Conferência Mundial sobre Fé e Ordem fora realizada em 1927, em
Lausanne, seguida por Edimburgo e Oxford em 1937. Numerosos delegados da Ásia e
da África compareceram nestas reuniões.

Enquanto que em Edimburgo o foco era a sociedades missionárias, em Lausanne deu-se


formalmente como uma assembleia intereclesiástica, com 90 igrejas aproximadamente
presentes e devidamente representadas, exceto a Igreja Católica Romana, a Ortodoxa
Russa e diversas igrejas evangélicas.

O marco de fato fora em Edimburgo em 1937, a 2ª Conferência Fé e Ordem, onde


representantes de mais 120 igrejas reuniram-se. Esta conferência tinha como presidente
William Temple (1881-1944), arcebispo de Cantuária. Tanto em Lausanne como em
11 Dentro do uso moderno, o episcopado é uma forma de governo eclesiástico no qual o bispo é o chefe das três ordens: bispos,
padres e diáconos.

20
História │ UNIDADE I

Edimburgo discutiu-se principalmente o ministério e os sacramentos, bem como outros


temas centrais.

A Comissão Fé e Ordem tornou-se, portanto, uma das principais agências do CMI.

Vida e Obra
Em Estocolmo (1925) e Oxford (1937) foi feita uma proposta para criar uma central que
pudesse preparar um fórum para estudos ecumênicos e com isto evitasse a hipocrisia
e a rivalidade desnecessárias. Vida e Obra é um movimento que se preocupa com a
relação da fé cristã com as questões sociais, políticas e econômicas.

Nomeou-se então para este fórum, em 1937, o secretário teólogo holandês W. A.


Viser´t Hooft, concretizando, portanto, e formalmente iniciado em Amsterdã (1948),
o Conselho Mundial das Igrejas (CMI). Mas fora mesmo em Edimburgo (1937) que tal
assunto foi pertinentemente iniciado.

Concílio Missionário Internacional


Foi formado em 1921 e em 1961, mas, após esse ano, se integrou formalmente ao
Conselho Mundial das Igrejas.

Conselho Mundial das Igrejas e o pluralismo


religioso
Estabelecido em 1948 é um corpo eclesiástico não romano que possui como principais
membros os protestantes, bem como Igrejas Anglicanas e grupos ortodoxos orientais.
Tem como órgão principal a Assembleia-Geral, onde se assentam para diversas reuniões
(como em 1948 na Holanda, 1954 no E.U.A., em 1691 na Índia e 1968 na Suécia). Tal
grupo possui posições tanto radicais como liberais, utilizando-se até mesmo de violência.
Atua fortemente na África por conta da opressão aos negros, possui interferência
política e social ao redor do mundo.

Com sede em Genebra, deu origem a 147 igrejas em 44 países, a maioria das comunidades
ortodoxas e protestantes ao redor do mundo, cerca de 230, pertence ao Conselho.

Fé e Ordem ainda como agência do CMI enviou relatórios de reuniões realizadas em


Avaston, Illinois (1954), Nova Delhi (1961), Uppsala (1968), Nairobi (1975), Vancouver

21
UNIDADE I │ História

(1983) e assembleias posteriores. A quantidade de membros se multiplicou, passou de


147 igrejas em Amsterdã, para mais de 300 em Vancouver.

Uma cruz em um barco, este é o símbolo utilizado pelo


Conselho Mundial das Igrejas. Oikomene (Οικουμένη) sem o “u”
significa “o mundo”, o que deu origem ao OIKOUMENE, isto é,
o termo ecumenismo.

Se pesquisado com cuidado, esta terminologia também pode ser


lida como “universo”.

Uma consulta teológica à luz do tema salvação em Genebra na Suíça, patrocinada pelo
CMI, fora composta por 25 teólogos e trouxe as seguintes conclusões:

I. Através da história pessoas têm encontrado a Deus no contexto de várias


religiões e culturas diferentes.

II. Todas as tradições religiosas são ambíguas (inclusive o cristianismo), isto


é, uma combinação do que é bom e do que é ruim.

III. É necessário progredir além de uma teologia que confina a salvação a um


compromisso pessoal explícito com Jesus Cristo.

A luta do CMI não termina por aí, o Conselho preocupa-se também com a compreensão
teológica; a paz e o controle de armamentos; o racismo, haja vista a conferência de 1937
que se posicionou contra o antissemitismo do nazismo; a liberdade religiosa e a ajuda
aos refugiados e oprimidos das guerras.

A profissão de fé das Igrejas-membro consiste no aceite da divindade de Jesus e na


Santíssima Trindade. No entanto, as ideias do CMI baseiam-se nos argumentos
pluralistas, os quais tratam que mais de uma posição é correta e passível de compreensão,
adoção e fusão.

Vejamos em Champlin (1997, p. 303) a definição metafísica12 de pluralismo.

Quando é usado como expressão filosófica, o “pluralismo metafísico”


fala da ideia de que a existência compõe-se de muitas essências e
elementos, e que elas não podem ser reduzidas a uma única substância
ou realidade. O pluralismo insiste que há pelo menos três ou mais
substâncias verdadeiras e distintas ou tipos de realidade. O monismo
aceita somente uma verdadeira essência, embora possa haver uma

12 Para aqueles que não estão acostumados com este campo da Filosofia, a Metafísica estuda filosoficamente basicamente tudo
aquilo que não é científico e empírico.

22
HiStóriA │ unidAdE i

pluralidade de expressões desse único elemento. Com frequência, no


monismo, essas manifestações são consideradas ilusórias ou menos
reais. Por sua parte, o dualismo é a crença de que existem duas essências
básicas de realidade.

Plural, o próprio nome já traduz, um Credo com diferentes pluralidades. Vejamo-lo


inserido no CMI.

Tal pequeno cardápio filosófico faz-se necessário para melhor compreensão


do posicionamento Ecumênico. Em resumo, o pluralismo é a adoção de que
as diferentes visões cristãs são verdadeiras como um todo, embora dado por
sentidos diversificados, e a metafísica, por sua vez, estuda tais fenômenos.

Pluralismo religioso e o CMi


Ainda não tirando os olhos do CMI, o pluralismo é, portanto, a ideia de adotar mais de
uma substância como verdadeira, entendendo-se como substância a essência das coisas
que são reais, as quais subjazem às coisas e que dá apoio à realidade, popularmente
é aquilo que é mais real. Entende-se, todavia, no CMI, que as posições contrárias ao
ecumenismo permanecem “arrogantes” e consideram-se “donas da verdade absoluta”,
já que, para o CMI, não há uma só verdade, o monismo, tampouco uma posição
contundente das coisas, mas olhares de diferentes ângulos para o mesmo objeto.

Reconheceu-se também, no Concílio Vaticano II, o “pluralismo teológico”, como vemos


em UR4:

Resguardando a unidade nas coisas necessárias, todos na Igreja,


segundo o múnus dado a cada um, conservem a devida liberdade,
tanto nas várias formas de vida espiritual e de disciplina, quanto na
diversidade de ritos litúrgicos e até mesmo na elaboração teológica da
verdade revelada (Decreto Unitatis Redintegratio, 4).

Na elaboração teológica da verdade “revelada”, vimos que há margens a outras crenças


e doutrinas, pagãs ou não. Na encíclica Mortalium Animos13, João Paulo II (no ano de
1986) com o intuito de rezar pela paz, colocou sobre o sacrário em Assis a imagem de
Buda.

Deu-se então um nó na cabeça dos católicos, e não era para menos, a igreja católica
perdeu muito com isto (veja mais em Estatísticas Pós-Vaticano II), abalando, com o

13 Para ver mais: <http://www.vatican.va/holy_father/pius_xi/encyclicals/documents/hf_p-xi_enc_19280106_mortalium-


animos_po.html>.

23
unidAdE i │ HiStóriA

ato ecumênico e pluralista, toda a estrutura católica. Falaremos mais sobre o assunto
quando tratarmos de Sincretismo Religioso.

Na França, a força do movimento ecumênico era intensa; teve como obra primeira a do
sacerdote Couturier de Lyon, o qual reuniu grupos de diversos católicos e protestantes
na abadia trapista de Domples, após esta, nas dos dominicanos do centro Istina de
Paris. Este fato é importante para efeito de conhecimento do que tange o berço do
ecumenismo na Europa. O Secretariado para a Unidade foi criado em 1960 e teve a
direção do cardeal Bea; cinco observadores católicos foram enviados à assembleia do
CMI em Nova Delphi.

Por fim, de acordo com Ferguson (2007, pp. 707-708), ainda em Nova Delphi:

[...] a igreja Ortodoxa Russa e as primeiras pentecostais se uniram


ao Conselho e, desde então, também, observadores oficiais
católico-romanos tem uma participação cada vez mais plena nas
questões levantadas no CMI e não menos na Comissão de Fé e Ordem,
sob a atmosfera mais aberta promovida pelo Concilio Vaticano II (1962-
1965). As conferências internacionais de Fé e Ordem continuaram a se
reunir, notadamente em Lund (1952) e Montreal (1973). Uma reunião
em Lima em 1982 completou importante consenso sobre Batismo,
eucaristia e ministério (Genebra, 1982), como parte do programa
destinado a se chegar a uma apresentação concorde da fé apostólica nos
dias de hoje. Esse protocolo representaria a restauração de Fé e Ordem
a um lugar central nas atividades do CMI, apos certo desprestígio, no
período da assembleia de Uppsala, por sua preocupação maior com
questões econômicas, políticas e sociais.

Após este encontro, o CMI mudou sua declaração como organização de “uma comunhão
de igrejas que aceitam nosso Senhor Jesus Cristo como Deus e Salvador” para “uma
comunhão de igrejas que confessam o Senhor Jesus Cristo como Deus e Salvador, de
acordo com as Escrituras, e, portanto, procuram cumprir conjuntamente seu chamado
em comum para a glória do único Deus, Pai, Filho e Espírito Santo”.

Pesquise e saiba mais sobre o CMI diretamente em sua página <http://www.


oikoumene.org/en>. A worldwide fellowship of churches seeking unity, a common
witness and Christian service.

24
História │ UNIDADE I

CMI na América Latina


A 9ª Assembleia ocorreu em Porto Alegre, Brasil, nos dias 14 a 23 de fevereiro de
2006, e segundo o CMI foi um período de encontro, oração, celebração, deliberação e
envolvimento de milhares de cristãos de todo o mundo.

Como principais tarefas, reuniu-se a esfera mais alta de decisões no CMI, com mais
de 700 delegados vindos de mais de 340 igrejas-membro do CMI em 100 países.
Representantes de mais de 200 conselhos participaram do evento, agências e igrejas
não membros, também anfitriões brasileiros e latino-americanos e mais de 1.500
visitantes e observadores, fazendo jus ao tamanho do Conselho.

Suas reuniões se dão a cada sete anos, para oração e revisão de programas. Determina
prioridades com emissão de mensagens objetivas e pertinentes ao tema proposto, bem
como elege presidentes e Comitê Central.

As plenárias na Nona Conferência deram-se por Justiça econômica (foco em alternativas


viáveis), Identidade cristã e pluralismo (contexto do secularismo e pluralidade religiosa),
Unidade da Igreja (igrejas e o futuro do ecumenismo), América Latina (celebração com
as igrejas latino-americanas), Superando a violência (celebração da metade da década
e renovação), Deus, em tua graça, transforma o mundo (discernimentos no tema e na
mensagem da Assembleia). Muito embora, nas demais conferências, tais assuntos são
tidos como foco contínuo.

Demais movimentos ecumênicos


Nem só de CMI vive o homem, mas também de muitos outros movimentos
ecumênicos, muito embora os mais conhecidos sejam: Comissão Internacional Católica
Romano-Anglicana (ARCIC: The Final Report [CICRA: Relatório final], London, 1982;
ARCIC II: Salvationand the Church — on justification [CICRA II: Salvação e a Igreja
— sobre justificação], London, 1987). Outras conversações tem reunido anglicanos e
reformados (God’s Reignand Our Unity [O reino de Deus e nossa unidade], London/
Edinburgh, 1984) e batistas e reformados (Baptists and Reformedin Dialogue [Dialogo
entre batistas reformados], Genebra, 1984).

Existe também, agora no Brasil, o Conselho Nacional das Igrejas Cristãs no Brasil
(CONIC), o q ual foi fundado em 1982 no Rio Grade do Sul. Fruto de um longo processo
de discussão e articulação das igrejas Católica Apostólica Romana, Evangélica de
Confissão Luterana no Brasil, Episcopal Anglicana do Brasil e Metodista.

25
UNIDADE I │ História

A Diaconia, também possui seu cunho ecumênico subjetivo, foi criada em 28 de julho
de 1967 na cidade do Rio de Janeiro. É uma organização social de serviço, sem fins
lucrativos e de inspiração cristã. Fruto da convocação da Confederação Evangélica
do Brasil é composta por 11 igrejas. No início da década de 1980, transferiu sua sede
para o Recife (PE), atuando em três estados do Nordeste, região que concentra o maior
número de pobres do País14.

Há também a CESE, que, em sua página, afirma que existe há mais de 40 anos. Ela
atua na promoção, defesa e garantia de direitos no Brasil e faz isso porque entende
que a desigualdade e a injustiça ainda persistem. Foi criada por Igrejas Cristãs com
a missão de fortalecer organizações da sociedade civil, principalmente as populares,
empenhadas nas lutas por transformações políticas, econômicas e sociais. Compõe-se
pelas seguintes igrejas.

»» Igreja Evangélica de Confissão Luterana no Brasil.

»» Igreja Presbiteriana Independente do Brasil.

»» Igreja Presbiteriana Unida do Brasil.

»» Igreja Episcopal Anglicana do Brasil.

»» Igreja Católica Apostólica Romana (CNBB).

»» Aliança de Batistas do Brasil.

A Confederação Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), por sua vez, assumiu
compromissos para com a liderança de diversas igrejas, com vistas a um diálogo fraterno.
Posicionou-se favorável à continuidade do movimento, contudo antagonizando-se das
afirmações exclusivistas da Dominus Iesus, a qual trata os fiéis das outras igrejas como
“irmãos no Senhor”. Entretanto, trata-se de um paradoxo, pois a CNBB faz parte da
Hierarquia Católica15; representa, por dever, o pensamento do papa e segue as suas
diretrizes.

Retornando a Edimburgo (1910), temos na Associação Cristã de Moços (ACM16)


uma possível introdução leiga ao nosso assunto, uma vez que o organizador do
Movimento de Estudantes John R. Mott (1865-1955) e criador da Federação Mundial
de Estudantes Cristãos foi secretário da ACM. Presidiu a Conferência Internacional de
Missão em Edimburgo, bem como o Conselho Internacional de Missões (1921). Mott
posteriormente ainda recebeu “basicamente” o Prêmio Nobel da Paz em 1946. Ele
14 Veja mais diretamente em sua página na internet: <http://www.diaconia.org.br>.
15 Não deixe de pesquisar mais sobre a Hierarquia Católica para melhor entendimento e posicionamento frente ao tema.
16 A ACM foi fundada em Londres no ano de 1844, mesmo ano da fundação da Igreja Adventista do Sétimo Dia, por George
William (1821-1905). Em 1894 fundou-se a Associação Cristã feminina.

26
História │ UNIDADE I

também é importante, pois, além de escrever diversas obras sempre se posicionando


em defesa do ecumenismo, presidiu ainda o CMI em 1954 antes de falecer.

O pontífice Bento XV (1914-1922) proibira católicos de participar de movimento dado


pela ACM, uma vez que muitos atribuem ao movimento leigo jovem o primeiro uso da
palavra ecumenismo em nossa era.

Após a morte de Buda (exatamente isto, tratamos que ecumenismo não se refere
somente ao cristianismo, pois, quando se dá ao diálogo, todos querem dialogar), monges
budistas realizaram também seu Concílio em Rajagriha, objetivando estabelecer a
doutrina budista. Em 366 a.C. e um segundo discutia-se cisões. O próprio judaísmo
também realizou o Concílio de Usha (158 d.C.), em Valladolid (1432), em Pittsburgh
(E.U.A., 1889).

Os evangélicos e o ecumenismo
Os evangélicos sempre foram uma “pedra no sapato” do Movimento Ecumênico e até
os dias atuais diversas igrejas evangélicas possuem posições diversificadas a respeito do
CMI, não adotando, contudo, uma postura una. Mesmo em 1910 já se viu a dificuldade
de uma eucaristia unificada entre as igrejas episcopalianas e não episcopalianas.

No entanto, das poucas igrejas evangélicas participantes, possui certo grau de influência,
dando maior vazão e foco a assuntos bíblicos tratados nas conferências. O ecumenismo
evangélico nasceu da cooperação do manifesto no Pacto Lausanne (1974) e tem sido
até hoje tema de debates como a questão da missão da igreja e da natureza da salvação.

Concílio Latino-Americano das Igrejas


Cristãs (CLAI)
O CLAI, segundo ele mesmo afirma, é uma organização de Igrejas e entidades ecumênicas
da América Latina e do Caribe e tem por finalidade a promoção da unidade entre todo
o povo cristão do continente, preservando, contudo, as identidades de cada tradição.

Em Oaxtepec no México, em setembro de 1978, reuniram-se dezenas de Igrejas


Evangélicas latino-americanas em uma assembleia, a qual teve como um dos objetivos
estabelecer os princípios básicos para a criação do oportuno Conselho. No entanto, o
CLAI foi “oficialmente” constituído pela Assembleia Geral de Igrejas, concretizada em
Huampani (Peru) em novembro de 1982.

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UNIDADE I │ História

Por fim, tem como objetivo, segundo ainda a visão do CLAI, “aprofundar a unidade
da Igreja de Jesus Cristo, reconhecendo a riqueza que representa a diversidade de
tradições, confissões e expressões da fé cristã; promover nesse sentido a reflexão, o
ensino, a proclamação e o serviço cristão”.

O Concílio Americano das Igrejas Cristãs foi formado para opor-se ao Concilio Mundial
de Igrejas, provendo uma alternativa para as igrejas de dependências conservadoras,
que assim podem contar com um “concilio universal”. Defende o fundamentalismo
teológico, porém, assim como o ceticismo, é a grande fraqueza do liberalismo, assim
também o espírito contencioso é a fraqueza do fundamentalismo. Daí o Concílio
Americano de Igrejas Cristãs tornou-se vitima de conflitos internos, com resultantes
defecções. Em seu ponto culminante, esse Concílio congregava cerca de um milhão de
pessoas, em certa variedade de denominações evangélicas. O ramo internacional deste
movimento foi o Concilio Internacional de Igrejas Cristãs.

Segundo ainda Champlin (1991, p. 834), a Associação Nacional de Evangélicos

Ocupa uma posição intermediária entre o CMI e o Concílio Americano


das Igrejas Cristãs. Também mostra tendência conservadores, mas sem
o radicalismo do Concílio Americano de Igrejas Cristãs. Foi formada em
1942, com o propósito de preservar a fé cristã de forma positiva, evitando
a beligerância que com frequência caracterizava o fundamentalismo. A
Associação Nacional de Evangélicos enfatiza tanto o lado social quanto
o lado evangelístico da ação cristã, tendo promovido organizações como
a Comissão para Alívio do Após-Guerra (1944), que enviou ajuda às
vitimas da guerra da Europa.

Embasamento bíblico
Bases bíblicas não faltam para que os movimentos Ecumênicos se apoiem, vale ressaltar
algumas tanto para efeito de conhecimento quanto para aprofundamento dogmático:

Portanto, dado que o Corpo Místico de Cristo, isto é, a Igreja, é um só


(I Cor. 12.12), compacto e conexo (Ef. 4.15), à semelhança do seu corpo
físico, seria inépcia e estultícia afirmar alguém que ele pode constar de
membros desunidos e separados: quem, pois não estiver unido com ele,
não é membro seu, nem está unido à cabeça, Cristo (Cfr. Ef. 5.30; 1.22).”A
Igreja do Deus vivo, coluna e fundamento da verdade” (I Tim 3,15)”que
todos sejam um como tu, Pai, estás em mim e eu em ti, para que eles
estejam em nós e o mundo creia que tu me enviaste” (Jo. 17.21). “[...]

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HiStóriA │ unidAdE i

Ide por todo o mundo e pregai o Evangelho a toda a criatura” – Marcos


16. 15; “Ide, portanto, fazei discípulos de todas as nações, batizando-os
em nome do Pai, e do Filho, e do Espírito Santo; ensinando-os a guardar
todas as coisas que vos tenho ensinado.” – Mateus 28.19, 20.14. Bem
como o capítulo 17 inteiro da Epístola de João.

Reflita sobre isso: unidade não significa uniformidade; pessoas diferentes podem ser,
dentro de limites previamente estabelecidos e bem delimitados, algo extremamente
enriquecedor haja vista todo o arcabouço legal e escopo do direito civil.

números referenciais

gráfico 1 – rompimento da igreja

fonte: baseado em Chadwick e evans (2007).

* Pré-Calcedonianas: compostos por armênios, Coptos, sírios e etíopes.

As não Calcedonianas também eram conhecidas como Antigas Igrejas Orientais,


conforme acima citado.

Para facilitar o entendimento e a sintetização, algumas vertentes religiosas


reúnem-se para abordar temas antigos na tentativa de olhar para o mesmo lugar do
mesmo ângulo. Atualmente estão envolvidos os seguintes grupos religiosos:

29
UNIDADE I │ História

Tabela 4: Grupos religiosos participantes do Movimento Ecumênico Atual

Petencostalistas
Católicos Discípulos de Cristo
Velhos Católicos Ortodoxos
Anglicanos Batistas
Metodistas Reformados
Luteranos

Tabela 5: Estatísticas Pós-Vaticano II (perspectiva Católica).

ESTATÍSTICAS PÓS-VATICANO II

Padres em Paróquias sem Christian


Ordenações: Seminaristas: Freiras:
exercício: padre: Brothers:
1965 - 549 (cerca
1965 - 58.000 1965 - 1.575 1965 - 49.000 1965 - 180.000 1965 - 2.434
de 1%)
2002 - 2.928
2002 - 45.000 2002 - 450 2002 - 4.700 2002 - 75.000 2002 - 959
(cerca de 15%)

Colégios
Redentoristas: Frades: Frades: Jesuítas: Franciscanos:
Católicos:
1965 - 1.148 1965 - 12.000 1965 - 1.566 1965 - 12.000 1965 - 5.277 1965 - 2.534
2002 - 349 2002 - 5.700 2002 - 786 2002 - 5.700 2002 - 3.172 2002 - 1.492

Estudantes Estudantes Batismos


Escolas Batismo de Casamentos
de Escolas de Colégios de Adultos
Paroquiais: Crianças: Católicos:
Paroquiais: Católicos: (conversões):
1965 - 4,5 milhões 1965 - 700.000 1965 - 10.504 1965 - 1,3 milhão 1965 - 126.000 1965 - 352.000
2002 - 1,9 milhão 2002 - 386.000 2002 - 6.623 2002 - 1 milhão 2002 - 80.000 2002 - 256.000

Presença Regular à Missa -


Anulamentos: Presença Regular à Missa - estudo da Fordham University:
estudo no 1:
1958 - 74% 74% dos Católicos (pesquisa
1965 - 338 1965 - 65% dos Católicos
Gallup)
2002 - 50.000 1994 - 26.6% (estudo da Notre Dame) 2000 - 25%

77% acreditam que Católicos não precisam assistir à Missa aos Domingos
65% acreditam que Católicos possam se divorciar e casar-se novamente
53% acreditam que Católicos possam fazer aborto
10% acreditam no ensinamento da Igreja com relação ao controle de natalidade (pesquisa da Notre Dame)
70% acreditam que a Eucaristia seja uma “lembrança simbólica” de Nosso Senhor (pesquisa da New York Times)

No entanto, vemos que muitos podem ter posto de lado sua fé na doutrina católica,
mas não em uma Weltanschauung Cristã, uma vez que o cristianismo cresceu em
praticamente todas as partes do mundo:

30
História │ UNIDADE I

Gráfico 2: Distribuição Regional de Cristãos (no mundo).

Fonte: <http://4.bp. blogspot.com/-7Ey6-1btb5w/TvJJdt6_nRI/AAAAAAAAJMk/vtsMT7wMXJ4/s1600/christianity-graphic-01.png>.

Figura 2: 10 países americanos com amplo número de Cristãos.

Fonte: <http://www.adparanagua.com.br/wp-content/uploads/2012/01/pesquisa-pew-forum.jpg>.

31
unidAdE i │ HiStóriA

figura 3: as religiões no mundo.

fonte: http://www.gazetadopovo.com.br/amazon/s3/info_mundo_religiao_19122012.jpg

O cristianismo, portanto é a maior religião do mundo, com mais de 2,1 bilhões de


seguidores e mais de 33 mil seitas. O islamismo, por sua vez, possui um total de 1,34
bilhão de muçulmanos, isto é, 20% da população mundial; é religião oficial de 25 países.
O hinduísmo é a terceira maior religião, com mais de 950 milhões de seguidores; na
Índia mais de 80% da população é hindu. Há mais de 13 milhões de judeus no mundo
e 5 milhões vivem em Israel. São 24 milhões de siques, praticantes do siquismo,
90% vivem na Índia. Os católicos romanos em 2007 estavam em mais de 1 bilhão de
seguidores (O´BRIEN, 2007).

Em resumo, o Movimento Ecumênico não tem avançado significativamente,


em linhas gerais, sem oposições e críticas, haja vista toda bancada evangélica,
anglicanas, ortodoxas e grupos ultraconservadores. O que muitos especialistas e
teólogos veem e debatem é que o ecumenismo vem fazendo muito mais fumaça
que fogo. Obviamente após o Concílio Vaticano II houve um forte progresso,
descortinando para todo o protestantismo, com vistas à respectiva Reforma, a
concepção e a chamada tarefa fundamental da Igreja Universal de Cristo. Há
certo reconhecimento católico do surgimento da divisão um dia ter ocorrido.
Por fim, os Concílios Ecumênicos são vistos pelos de fora como uma espécie
de Diplomacia Eclesiástica, na qual grandes líderes teológicos se reúnem para
decretar e estabelecer princípios de fé e moral.

32
Capítulo 4
Resistência ao ecumenismo

A resistência ao ecumenismo e suas raízes


Não é de hoje, conforme dito acima no subtema “Os evangélicos e o ecumenismo”, que
de fato estão à frente, juntamente com o protestantismo propriamente dito, o entrave
em se conciliar e unificar a igreja, fato que obviamente também possui embasamento
bíblico, uma vez que não necessariamente as doutrinas de outras religiões (credos e
Igrejas em si) são as mesmas, haja vista o culto de imagem, em que para uma é santo,
para a outra é abominável, está claro que o sincretismo religioso antigo e medieval
possui suas responsabilidades (trataremos mais sobre sincretismo adiante).

O problema é que o protestantismo e uma parte evangélica afirmam ver o elefante por
completo; o que muitas também afirmam, entretanto, pode ser comparado aos cinco
cegos apalpando partes do elefante:

Um apalpa a calda e diz: “É uma corda”, outro a tromba e diz: “é uma


cobra”, outro a perna e diz: “é uma árvore”, ainda outro as orelhas e
diz: “é uma ventarola”, e ainda outro cego apalpa as presas e diz: “é
uma lança”. Portanto, se olharem da perspectiva correta verão que é
simplesmente um elefante, e é isto que o Cristianismo afirma, ver o
elefante por completo, diferente disto, só pode ser falso, ou verdadeiro,
mas ambos serem verdadeiros é logicamente incoerente. (GEISLER;
TUREK, 2006, p. 49)

Sobre o ambiente do Concílio Vaticano II, Mattei (2009, p. 322) traz as seguintes
considerações:

Eis, segundo o documento apresentado pelo Cardeal Larraona, qual a


doutrina contida no esquema a propósito do primado do Pontífice e da
colegialidade dos Apóstolos: [...] criou uma atmosfera que torna difícil
a discussão serena, entrava e impede a verdadeira liberdade, fazendo
com que aqueles que não se mostram favoráveis sejam imediatamente
ridicularizados e considerados impopulares. Em semelhante ambiente,
as argumentações científicas já praticamente não conseguem exercitar
o seu legítimo influxo, não sendo sequer ouvidas.

33
UNIDADE I │ História

Grupos evangélicos influenciados pelo fundamentalismo e pietismo17 resistem em sua


maior parte ao ecumenismo; uma posição que dantes pertencia aos Católicos Romanos
é dada nos tempos modernos pelos protestantes em geral.

Todavia, não é possível sequer pensar em qualquer movimento protestante atual


sem antes falar de Martinho Lutero (é dele que falaremos no próximo tópico), e
principalmente do resultado de suas ações.

Adotou-se o método subjetivista fenomenológico como posicionamento da base da


Igreja quando tratou das questões doutrinárias no Concílio Vaticano II, tornando-se
impossível ao homem alcançar a visão objetiva em qualquer aspecto da vida.

Quando o papado assentiu e tornou-se cediça a posição sobre o subjetivismo humano


frente às questões religiosas de modo categórico, resultou-se que ninguém mais tinha
o direito de “julgar” ninguém, que tudo era uma visão relativa, como o caso do elefante
grande. O mundo então entrou em diálogo18.

A comunidade Católico-Romana Ortodoxa se opõe veementemente ao diálogo, tido


como “o diálogo com o diabo” por muitos, no entanto, ainda, a CNBB discursava através
de muitos bispos seu pensamento favorável.

Contudo, o Papa Pio XI, na encíclica Mortalium Animos19 (1928) lance-se contra após
o oficial lançamento do movimento ecumênico pelo Vaticano II.

Lutero

Martinho Lutero, nascido em Eisleben (Alemanha), em 10 de


novembro de 1483, era reconhecido pelo esforço no trabalho e nos
estudos por todos que com ele conviviam. Deixou a faculdade de
Direito para se dedicar à igreja, não se sabe ao certo o porquê, mas
em decorrência disto vemos na figura de Lutero um marco histórico
que não poderia deixar de ser citado.

17 Do latim Pius: “aquele que cumpre seus deveres”, este é um movimento que provém do Luteranismo e que possui como
cerne de sua crença as experiências individuais do cristão com Deus e, segundo Champlin (2001, p. 272), “o metodismo, os
menonitas, os dunkers (batistas alemães), os schwenkfelders e os morávios devem todos alguma coisa ao pietismo. A Igreja
Reformada Holandesa também teve lideres cujos discípulos salientaram esse conceito, o que também sucedeu ao luteranismo
norte-americano. A Igreja ReformadaAlemã da América do Norte exerceu uma influência pietista sobre o povo reformado
alemão naquele continente. Os Irmãos Unidos em Cristo e a Igreja Evangélica foram denominações que incorporaram (em sua
história inicial pelo menos) tendências pietistas. Talvez possamos dizer que a maioria das igrejas pentecostais da atualidade
retém tanto as virtudes quanto os vícios desse movimento”.
18 Veja mais sobre, dentro do tema Diálogo Inter-Religioso.
19 Veja mais na íntegra direto da página virtual do Vaticano: <http://www.vatican.va/holy_father/pius_xi/encyclicals/
documents/hf_p-xi_enc_19280106_mortalium-animos_po.html>.

34
HiStóriA │ unidAdE i

Enquanto se destacava na Igreja por meio de profundos estudos das cartas de Paulo,
algo aconteceu em sua mente, revoltou-se contra as indulgências obrigatórias da Igreja
Católica Romana, em seguida escreveu as famosas Noventa e Cinco Teses e pôs-se a
lutar em favor daqueles que se submetiam às práticas católicas. Ele por si mesmo ficou
assustado com tamanha repercussão de seu posicionamento; foi julgado em 1518 e fugiu
logo após, dando início a sua perseguição. Ficou recluso por dez anos em um castelo e
com isto traduziu o Novo Testamento para o alemão em 1522 e com ajuda posterior em
1532 a Bíblia inteira foi publicada (e incrivelmente após quase 500 anos é a versão mais
lida no idioma alemão!).

Indicamos que assista ao longa-metragem “Lutero”, do premiado diretor inglês


Eric Till. O filme reproduz de forma didática uma melhor compreensão do
surgimento da insatisfação protestante atual para com o nosso tema.

Contudo, retornando ao nosso assunto, da Reforma de Lutero deu-se início a dois grupos
principais, com efeito, os luteranos e os reformados. Tal fragmentação parece não ter
fim. Associados à Alemanha, historicamente, vem a Igreja Luterana; já a baseadas nos
ensinamentos de Zwínglio (1481-1522) e João Calvino (1509-1564) temos as igrejas
reformadas, as quais também se sucederam na Suíça.

reforma
A Reforma protestante mistura-se ao Concílio de Trento, como visto anteriormente, o
pontífice escolhido para dar continuidade ao legado de Pio IV, em 7 de janeiro de 1566,
foi Michele Ghislieri, dominicano milanês que assumiu o nome de Pio V.

Não sacrificaremos muito de nosso tempo estudando-a, pois temos bastante informação
sobre ela, mais importante agora é saber qual o efeito da Reforma para o ecumenismo.
No mais, sabemos que Lutero, com suas posições teológicas e respectivas mutatis
mutandis, assumiu as também políticas e nacionalistas. O intuito era fazer com que os
fiéis deixassem de ser romanos e passassem a ser habitantes de seu próprio país.

Sustentava-se a teologia de que não o papa, mas, sim, as Sagradas Escrituras eram
dignas de autoridade, bem como se suplantou o esgotamento do assunto indulgências.
Lutero mantinha sua doutrina sobre predestinação e, com isto, o imperador Calor V,
quando viu que estava favorecendo uma posição que não acreditava ser boa para o
Sacro Império Romano, abandonou a Reforma e apoiou a Contrarreforma.

35
UNIDADE I │ História

Contrarreforma
Como vimos, o Concílio de Trento promoveu o movimento católico antirreformador.
Portanto, após a Reforma, as práticas católicas viram o fim das vendas de indulgências
(não esqueça que indicamos o filme “Lutero” para melhorar seu conhecimento e sua
compreensão acerca do tema), bem como a criação de novas ordens, como, por exemplo,
a dos jesuítas (Companhia de Jesus). Contudo, padres intelectualmente rigorosos, sob
a orientação de Inácio de Loyola (1491-1556), do qual já falamos, quiseram impor nova
ênfase na assistência pastoral como também na obra missionária.

A contrarreforma não deixou de reafirmar a supremacia dos sacerdotes, tampouco dos


sacramentos e da autoridade do papado nas áreas que ainda dominava. Tal otimismo
no catolicismo refletiu-se em um grande nascimento da arte sacra.

Protestantismo
Nem sempre os protestantes foram contra o ecumenismo, vemos, contudo, que antes de
tempos contemporâneos, como dito, proveio grande parte do protestantismo coligações
continentais internacionais, reunindo-se periodicamente representantes de igrejas de
diversas partes, onde, em assembleias de estudo e recomendações, eram feitos, tais
como a Aliança Mundial das Igrejas Reformadas (1875), o Concílio Metodista Mundial
(1881), o Concílio Congregacional Internacional (1948). A partir destes movimentos é
que se começou a pensar e iniciar o surgimento do Conselho Mundial de Igrejas.

Não trataremos com profundos atributos históricos e em todos os detalhes pertinentes


da ação protestante, no entanto, veremos sequenciais lógicos atendo-nos ao nosso tema.

Obviamente, como já vimos, o efeito protestante de Lutero causou grande turbulência.


Temos no termo “protestantismo” o efeito coletivo da esfera “protestante”, deste modo, o
movimento reformador promovido por diversos grupos, baseados em teólogos e filósofos,
dantes postulados religiosos do tema, e também por alguns mártires do século XV e XVI.
Para melhor didática e compressão das alusões protestantes, veja a tabela a seguir:

Tabela 6: Traçado histórico.

TRAÇADO HISTÓRICO

GRUPOS TIPO INÍCIO

Os Albigenses Seita de Reformadores Séc. XI e XIII


Os Waldenses Seita de Dissidentes Religiosos 1170 D.C.

36
História │ UNIDADE I

João Wycliffe Pré-Reformador Séc. XVI


João Huss Pré-Reformador 1369-1415
Os Anabatistas Pré-Reformadores Séc. XVI
A Reforma Protestante Protestantismo Ano 1517
A Igreja Anglicana Movimento Pré-Evangélico Séc. XVI
Metodismo Protestantismo Séc. XVIII e XIX
Movimento Missionário Protestantismo Evangélico Séc. XIX
Fragmentação Protestante e Evangélica Liberalismo e Protestantismo Séc. XX
Movimento Carismático Fragmentação Protestante Séc. XX
Movimento Ecumênico Moderno Unificação ou Fragmentação? 4
Séc.XX

Fonte: Baseado em Champlin (2007, p. 476).

Tais grupos deveriam ser estudados independentes, uma vez que cada um traz
importantes acontecimentos históricos que impedem a fusão total das igrejas (estude-os
se possível). Segue uma resistência de ideias previamente estabelecidas por fundadores
de pensamentos ideológicos cristãos e grupos que se detém a um ou outro ensinamento
de dissidentes medievais. Até o próprio Lutero se posicionou contra qualquer tipo de
atividade posterior à Reforma Protestante que envolvesse seu nome ou o intitulasse
“mestre” de um fim específico, tampouco sonhou com uma igreja Luterana.

A diferença fundamental entre o protestantismo e o catolicismo, na qual toda sorte de


problemas se deu, era basicamente que a Igreja não só acreditava na santidade do papa
como também exigia a reverência; em oposição, a ala protestante, além de não concordar
com isto, via (vê) somente nas Sagradas Escrituras a autoridade sobre qualquer
hierarquia eclesiástica. Dos reformadores, os mais radicais (exceto obviamente Lutero)
eram Ulrich Zwingli (1484-1531) e João Calvino (1509-1564), os quais se opunham a
diversos aspectos da liturgia romana e ao celibato dos padres.

Lutero era temperamental, esfuziante e imprevisível. Iniciou a Reforma


sem ter ideia, ou teologia concebida [...] Só panfletos, escritos como
revides a fatos presentes: a venda de indulgências; a excomunhão; a
revolta dos camponeses e por aí vai. Chega-se a pensar que o destino da
história encarnou-se naquele homem, naquele momento precioso, em
que o curso dos fatos humanos, sociais e políticos tinham que mudar o
seu rumo (SOUZA, 2012, p. 230).

Temos ainda três fatores fulcrais para ressaltar, o primeiro deles é a expansão colonial
dos povos protestantes; em segundo, o enriquecimento deles em função direta ou
indireta desta expansão e, ainda, em terceiro, a conquista da relevância da proposta
teológica que ganharam nos últimos séculos, principalmente a partir de João Wesley
(Inglaterra) no século XVIII.

37
UNIDADE I │ História

É certo que maior parte da comunidade protestante é contrária, no entanto há alguns


fatores que o trazem para os precursores do movimento ecumênico moderno, a fim de
estabelecer a unidade da igreja de Cristo. Muitos crêem que o debate inter-religioso não
deva conduzir a uma aceitação relativa, mas ao um testemunho sincero.

A Revolução Industrial, século XIX, seguida pela Revolução Comercial, principalmente


na Europa, provocou no mundo, como é cediça, uma série de alterações. Na Europa
Ocidental houve diversos apoios políticos e econômicos para Companhias estatais, com
privilégios notórios, deste modo a comunidade protestante incidiu a possuir muitos
bens, facilitando seu enriquecimento e crescimento propagativo.

Com o Renascimento Comercial o qual provocou inúmeras e importantes transformações


na Europa Ocidental, a sociedade se desestabilizou, retornando às práticas pervertidas
e primitivas. Por produzir notáveis obras teológicas, os protestantes eram vistos como
bons conhecedores das Sagradas Escrituras, e passaram com isso a produzir e repensar
novos caminhos para a sociedade, um deles era o evangelismo nos termos bíblicos.
Deu-se início à teologia romântica, porém racional à nação e conferiu os possíveis20
primeiros passos ecumênicos de nossa Era.

Igreja Católico-Romana
A Igreja Católico-Romana não é de toda a favor do movimento ecumênico. Existem
grupos contrários ortodoxos e fundamentalistas que se opõem veementemente ao
movimento.

Para posicionar-se e analisar o outro lado da moeda, vale a pena ler a confrontação da
própria Igreja, porém dita Católico-Romana de raízes primitivas, na Carta Encíclica
em Mortalium Animos sobre o ecumenismo pelo papa Pio XI, que teve como tópicos
principais:

Tabela 7: Principais pontos abordados em Mortalium Animos de Pio XI.

01 Ânsia Universal de Paz e Fraternidade.

02 A Fraternidade na Religião. Congressos Ecumênicos.

03 Os Católicos não podem aprová-lo.

04 Outro erro. A união de todos os Cristãos. Argumentos falazes.

05 Debaixo desses argumentos se oculta um erro gravíssimo.

06 A verdadeira norma nesta matéria.

07 Só uma religião pode ser verdadeira: A revelada por Deus.

20 Veja mais sobre o início no Concílio em Edimburgo, 1910.

38
HiStóriA │ unidAdE i

08 A única religião revelada é a Igreja Católica.

09 Um erro capital do movimento ecumênico na pretendida união das Igrejas cristãs.

10 A Igreja Católica não pode participar de semelhantes reuniões.

11 A verdade revelada não admite transações.

12 A Igreja Católica: depositária infalível da verdade.

13 Sem fé, não há verdadeira caridade.

14 União Irracional.

15 Princípio até o indiferentismo e o modernismo.

16 A única maneira de unir todos os cristãos.

17 A obediência ao Romano Pontífice.

18 Apelo às seitas dissidentes.

19 Conclusão e Bênção Apostólica.


fonte: adaptado de <http://www.vatican.va/holy_father/pius_xi/encyclicals/documents/hf_p-xi_enc_19280106_mortalium-
animos_po.html>

Como vimos, tal contrariedade é provavelmente encabeçada por Pio XI, o qual
apologeticamente traz aos fiéis diferente Weltanschauung sobre o movimento.

Ainda sim precisamos nos aprofundar um pouco mais para diagnosticarmos as raízes
das ações antiecumênicas, para isto, e com intuito didático, vejamos as informações
abaixo:

Quadro 1: fragmentação da igreja ocidental

39
UNIDADE I │ História

Para que nosso subtema não se torne prolixo, busque diferentes pontos de vista de
cada fragmentação acima. Sabemos bem que cada uma delas contribui para um ponto
da história, por isto a importância de pesquisá-los em separado. Para que também não
fique pesado, consulte aqueles que você não possui conhecimento ou domínio.

Concretização ecumênica, uma ilusão?


Por fim, vemos que grupos separatistas envolvem todo segmento religioso, não se
limitando somente ao catolicismo, contudo sobremodo tivemos que estudá-los, já
que aferem, com efeito, diretamente ao ecumenismo antigo e moderno. O modo de
preencher a “terra habitada” do interior e exterior humano, material ou abstrato, tem
na figura ecumênica seu modo concreto de agir.

Insofismavelmente vemos no Vaticano II o marco histórico ecumênico moderno, assim


como Niceia fora o ecumenismo antigo. Resta-nos agora, mormente, direcionarmos
dentro de um tema delicado para fins sociais, porém teologicamente menos complexo
para ortodoxos e menos ainda para modernistas, os quais já possuem opinião formada,
aquele contra, este a favor.

Cabe agora reavaliar, sem embargos, a real função e posicionar-se a favor ou contra,
uma vez que a indiferença somente gera indiferença.

40
Sincretismo e Unidade iI
cultura

Nesta unidade estudaremos o sincretismo envolvido na vida e na cultura dos povos no


desenrolar de séculos. Veremos que o sincretismo não se dá somente em nosso tempo,
mas sobremaneira é oriundo da história primitiva da humanidade, envolto em todas as
culturas da história da humanidade.

capítulo 1
Um breve histórico

Sincretismo religioso
Visto que não há meio de se falar de ecumenismo sem falar de sincretismo, este assunto
será abordado em uma escala de importância de maior grau, dado a fatores que
influenciaram e influenciam modelos ecumênicos e seus respectivos pensamentos em
virtude de cenários dantes adotados e que hodiernamente tem-se como fundamento
padrão e pano de fundo histórico, cenário onde muitos creem sem ao menos nem
se quer saber o porquê da crença. Segundo Boff (2005, p. 219) “a condescendência
(katabasis) era, na teologia antiga, exatamente o momento em que se operava o
grandioso sincretismo cristão que herdamos, nos séculos IV e V, uma categoria teológica
fundamental”. Com efeito, veremos que não ocorre somente nestes séculos, mas desde
a antiguidade babilônica egípcia e da mitologia grega.

Sincretismo relativista
Uma vez que, se todas as religiões fossem válidas, o valor de cada uma seria relativo.
Não haveria uma religião verdadeira. Não haveria religião que pudesse se apresentar
como possuidora exclusiva da verdade. Se nenhuma religião fosse verdadeira, isto é,
dada como o padrão norteador, tudo seria subjetivo, desencadeando-se nas diversas

41
UNIDADE II │ Sincretismo e cultura

ramificações cristãs, as quais se veem hodiernamente. Como diria Júlio César, alea
jacta est21.

Cristo e Buda, a Santíssima Trindade e Allah, a Eucaristia e um galo preto morto


num terreiro para Xangô seriam de semelhante importância, tudo se torna
relativo22. O pluralismo fez-se presente. Hereges e feiticeiros, que anteriormente
não podiam sequer entrar na Igreja, o fizeram. As igrejas, os conventos
e os seminários ficaram vazios (como vimos no quadro: Estatísticas Pós-Vaticano II).
Os Colégios católicos se fecharam e centenas de padres e bispos abandonaram a fé.

Tal relativismo religioso propaga a salvação em todas as religiões, independentemente


de crença, tipo e forma de crença, se ela for para o bem, então tudo está certo: ela está
correta.

Em Nostra Aetate sobre a Igreja e as religiões não cristãs, trata-se de crenças como
hinduísmo e budismo, islã e religião judaica. Paulo VI ainda fala sobre a fraternidade
universal e a reprovação de toda a discriminação racial ou religiosa e ainda que “não
podemos, porém, invocar Deus como Pai comum de todos, se nos recusarmos a tratar
como irmãos alguns homens, criados à Sua imagem” (Nostra Aetate, 5)23.

Sincretismo histórico
Dada a ação dos imperadores quanto a sua autoimposição papal, eles atribuíam ao
cristianismo apenas uma maneira de “agradar” o povo, devem ter refletido no ditado
popular “se não pode vencê-los, junte-se a eles”. O Império percebeu isto, deste modo
incorporou o cristianismo aos aspectos políticos, sociais e econômicos (veja mais sobre
no próximo tópico), deste modo centenas de crenças pagãs foram absorvidas pelo
cristianismo do agora Império Católico-Romano, incluindo imagens, festividades e
datas comemorativas, culturas entre outras coisas.

O poder sagrado da Igreja-instituição foi posto de lado, falsificaram-se decretos, como


Testamentum Constantini, para justificar pretensões pagãs, o que confirmou que, seja
cristão ou pagão, sagrado ou profano, não fazia diferença; segue-se que se queria o
individuo/situação seria para ampliar e crescer, independentemente das consequências
para a fé ou em conformidade ou não com as Sagradas Escrituras, não havia problema.
Não importava neste momento o aspecto ou o efeito para Deus, mas tão somente a
fórmula mágica da fusão Estado-Igreja.
21 “A sorte está lançada”.
22 Veja mais sobre a posição católica em: <http://www.montfort.org.br/old/index.php?secao=veritas&subsecao=religiao&artig
o=relativismo_ecumenismo&lang=bra>.
23 Veja na íntegra: http://www.vatican.va/archive/hist_councils/ii_vatican_council/documents/vat-ii_decl_19651028_
nostra-aetate_po.html

42
Sincretismo e cultura │ UNIDADE II

Na era de Pérgamo, na Bíblia, o sincretismo se deu no máximo nível, e isso ocorreu


por volta de 313 d.C. a 606 d.C. Em 380 d.C. o Cristianismo é oficializado no império
romano. Isso se deu através da ruina do Mundo Romano por meio de fatores de ordem
política, econômica e social, tais como:
I. o início do sistema agrário;
II. pestes;
III. as revoltas nos exércitos;
IV. a invasão dos povos Bárbaros.

Esse último nos interessa mais, por se tratar de nosso tema principal, uma vez que, com
a invasão dos Bárbaros e suas diversas ramificações, impetraram-se essências de cada
povo absorvido pelo Império Romano. Dado literalmente ao cunho de força de combate
dos Bárbaros, para efeito didático fazia como um grandalhão do colégio pedindo um
lanche para uma criança bem menor do que ele, a pequena respondia e era como “ah,
você acredita nesse deus, no final das contas é a mesma coisa porque queremos fazer o
bem, vem pra cá, a gente pega um pouco das coisas que você acredita; deuses que vocês
adoram e semelhantes datas para fazer uma só festa; somamos com as nossas e vamos
adorar, afinal, são todos os mesmos!”.

Pode parecer estranho, mas no cotidiano dava-se em torno disso mesmo. Para efeito
de conhecimento mais aprofundado, bem como possível material de consulta, segue
abaixo tabela das ramificações Bárbaras infiltradas e devidamente absorvidas com
critérios dos mais diversos níveis pela cultura Imperial Católico-Romana:

Quadro 2: Povos que deram origem ao sincretismo.

TIPO CARACTERÍSTICAS E PONTOS PRINCIPAIS


1 - GERMÂNICOS
Origem indo-europeia. Habitavam a Europa Ocidental. Povos que viviam atrasados em comparação à Roma. Eram seminômades – não sabiam
aproveitar o solo. Gastavam a maior parte do seu tempo bebendo ou dormindo.
1.1 - Visigodos Visigodos foram os primeiros a chegar ao império romano.
1.2 - Ostrogodos (na Itália) e os anglo-saxões Godos eram povos germânicos que saquearam Roma em 410 d.C. Neste mesmo ano Aécio
na Grã-Bretanha venceu Atila.
1.3 - Francos Habitavam na França (antiga Gália). Formaram reino no norte da África.
1.4 - Vândalos Tribo oriental que criou um estado no norte da África ocupando a cidade de Cartago.
1.5 - Lombardos “Barba longa”, oriundo da Escandinávia.

2 - ASIÁTICOS
2.1 - Turcos -
2.2 – Avaros -

43
UNIDADE II │ Sincretismo e cultura

2.3 - Hunos (povos do extremo Oriente. Comiam carne crua e eram extremamente primitivos. Eles amasiavam a carne sentando nela
Pressionavam os Godos – eram tártaro-mongóis quando cavalgavam. Vestiam panos e peles de ratos do campo.
– e faziam parte do grupo que fazia ameaças)
Eles empurraram pra dentro do império romano os germânicos.
Ninguém guerreava mais que os Hunos e pressionavam os germânicos.
Viviam para assaltar, roubar, batalhava-se apenas por recompensa.
Dominaram o extremo asiático e foram barrados pela muralha da China.

Migram de território em território na Europa oriental e disputavam com germânicos e Eslavos e


estes fogem para dentro do Império Romano.
O imperador Bizantino do Império Romano Oriental concordou pagar tributo em ouro aos Hunos
para não ser destruídos.
Na Europa ocidental enfrentaram os germânicos e romanos juntos, e ainda sim conseguiram
chegar à península Itália.
Atila era o rei dos Hunos.
Quando ele morre desaparece também o seu império.
Liderados por Atila conseguiram invadir a Itália.
Porém passageiro (império) no cenário mundial.

3 - IRANIANOS
3.1 – Citas -
3.2 – Sármatas -
3.3 – Alanos -

4 - ESLAVOS
4.1 – Ocidentais -
4.2 - Orientais (Russos e Ucranianos) -
4.3 – Meridionais (Búlgaros, Sérvios, Croatas e -
Eslovenos)

5 - MISSIONÁRIOS
5.1 - Na Armênia – Gregório – 257-331, o Persas mataram o pai de Gregório e toda sua família quando ele tinha um ano de idade.
Iluminador evangelizava o povo em 300 d.C.
Tirídates foram poupados e foram enviados para Roma digno de nobreza, já Gregório é enviado a
Capadócia e teve sua formação fundamentada no cristianismo.
Gregório era conselheiro particular do herdeiro do trono (Tríades).
Tirídates, quando se tornou rei, convidou Gregório para adorar outros deuses, mas este se
recusou e foi jogado na masmorra e por lá ficou durante 15 anos!
Após os 15 anos, no século III, o rei ficou doente, a esposa de Tirídates teve um sonho que
somente Gregório poderia salvar o rei, e assim foi feito.
O rei se converteu, o reino se converteu por tabela a Armênia toda se converte e oficialmente em
301 d.C. passou a ser quase inteira cristã com aproximadamente 2,5 milhões convertidos.
Os armênios sustentam a fé até hoje.
5.2 - Na Etiópia (Frumêncio) Primeiro bispo missionário na Etiópia.
A rainha resolveu adotar Frumêncio como filho e recebe educação cristã.
Recebendo autorização do bispo em Alexandria são enviados como sacerdotes cristãos para criar
a primeira comunidade cristã na África negra e com isto se se expandiu pela África o cristianismo.

44
Sincretismo e cultura │ UNIDADE II

5.3 - Na Grã-Bretanha (obra feita por vários Naqueles dias as crenças se baseavam em variadas teologias.
missionários. Muitos Godos já vieram como
cristãos)
Baseavam-se mais nas formas arianas de cristianismo.
5.4 - Na França (Martinho) Foi tocado por Deus e abandonou o exército e foi Santo padroeiro da França.
Ele liderou monges guerreiros para destruir nos bosques incendiando imagens feitas a ídolos,
com o intuito de exterminar os deuses pagãos.
5.5 - Na Irlanda (Patrício) Considerado hoje o padroeiro da Irlanda.
Levado por piratas com seis anos, cuidou de gados.
Vendido como escravo, trabalhou duro.
Fugiu da Irlanda para Grã-Bretanha e se dedicou à vida religiosa em mosteiros.
Deus chamou-o para voltar para Irlanda como pregador e com isto teve muito sucesso com a
nação que o escravizou.
Paládio era responsável pela missão na Irlanda, mas quando morreu Patrício assumiu.
Em três décadas ele converteu praticamente a Irlanda inteira!
Não contava com apoio político, não houve repressão contra os próprios cristãos, mas somente
pregava à moda antiga.
Converteu o rei e a nação toda se converteu.
Fez daquela ilha o reino principal do cristianismo na Europa.
5.6 - Escócia (Columba) Abriu mosteiros na Escócia toda.
Não doutrinava, com isto trazia antigas práticas e religiões.
Na Escócia só foram substituídas as práticas pagãs aos líderes quando eles passaram a cultuar
santos.
Portanto, na Escócia, infiltrou-se o paganismo.
Viviam dogmas e crenças pagãs através do sincretismo. Heresias eram dadas em demasia!
5.7 - Os Apologistas Fidei defensor em latim. Defendiam a fé cristã com inteligência. Tinham como inimigos os pagãos.
5.8 – Gnosticismos Encontravam-se principalmente na Turquia e acreditavam que somente pelo conhecimento o
homem era salvo e não pela morte de Cristo.

Fonte: Baseado em Chadwicky (2007) et al.

Nascimento da igreja primitiva em uma


Weltanschauung protestante
Há uma mescla entre as tradições pagãs entre todos esses povos com o cristianismo.

Cristãos no início eram considerados judeus convertidos. Em 36 d.C. os cristãos foram


espalhados para fora de Jerusalém, nesta data Julius e Andrônico (apóstolos) levavam
o evangelho, no entanto o imperador Cláudio (10 a.C. – 54 d.C.) expulsou todos os
judeus de Roma.

Com esses judeus líderes expulsos, a espinha dorsal da igreja foi praticamente quebrada
e então o rebanho ficou só. Tirou-se a Bíblia do povo cristão, com isto, sem alguém para

45
UNIDADE II │ Sincretismo e cultura

instruir, uma vez que os poucos missionários que haviam tinham sido expulsos e sem
nenhuma base bíblica, aquela pequena comunidade cristã começou a se desviar, com
efeito, essa pequena igreja em Roma começou a se tornar completamente apóstata e/
ou sincretista.

Esse período durou cerca de treze anos. Após 50 d.C. esses apóstolos voltaram a Roma.
Com isto, a primeira igreja em Roma foi a primeira igreja que se deixou levar por
outras culturas. Diante disto, esses mesmos apóstolos tiveram que fundar uma nova
igreja, pois os líderes ali levantados, isto é, na primeira igreja, passaram suas doutrinas,
considerada pelo povo cristão, heréticas.

A primeira igreja de Roma, portanto, foi a Igreja Católico-Romana, como a própria


Igreja afirma ser. No entanto, os apóstolos montaram a segunda igreja, pois não tinham
mais controle sobre a idolatria. A segunda e a terceira igreja foram perseguidas pelo
governo, o contrário do que faziam com a primeira Igreja, a qual era favorecida pelo
Império.

O bispo de Roma introduziu diversas festas e ideias pagãs no culto. Induziu aos
governantes a perseguição aos cristãos (aproximadamente sete mil em Tessalônica
foram perseguidos), pois os pegaram em uma festa adorando a Jesus e não a Astarte24.

Mesmo tendo avançado cronologicamente, precisamos requerer mais um pouco


da história antiga para melhor entendimento do sincretismo religioso dos tempos
modernos.

Para não focar somente na Weltanschauung do cristianismo que vai de encontro


ao catolicismo, Flavio Josefo, importante historiador secular romano, bem como o
Talmude babilônico, dá o significado de Babel (exatamente aquela da Bíblia) como
confusão. Cidade a qual fora formada por Cusí (ou Cuxe), filho de Cão ou Cam, filho
de Noé. Mas somente em Ninrode, filho de Cusí, propagou-se a doutrina de adoração a
outros deuses. Ninrode teve como intuito principal:

1. Edificar uma nova nação.

2. Propagar uma nova religião.

3. Exaltar o próprio nome.

24 Segundo Champlin (2002, p. 354) - No grego é Astarte, de onde se origina o termo em português. Em inglês é Ashtoreth, que
deve ser distorção da forma grega, segundo a analogia de Bosheth, vergonha. Era a deusa suprema Cananeia, contraparte de
Baal, e conhecida entre os babilônios como Istar, e no sul da Arábia como Athtar (uma forma masculina). Virgem perene, ela
era também a mãe frutífera e criadora da vida. Os filisteusparecem haver ressaltado o caráter belicoso de Astarte (ver I Sm
31:10). As numerosas Astarotes representam várias formas sob as quais ela era adorada em diferentes lugares (Jz. 10:6; I Reis
11:33; 23:13). O nome delafoi dado à capital de Ogue, rei de Basã (Deu. 1:4).

46
SinCrEtiSMo E CulturA │ unidAdE ii

O Egito recebeu dos Caldeus (babilônicos) a matemática e a ciência, a Grécia, por sua
vez, importa logo depois esse conhecimento do Egito. Entre o ensino das ciências eram
ensinados o ocultismo e os contatos com esses deuses.

Portanto agora temos:

Houve certo tempo que todos os povos da terra criam em um só Deus. Um Deus
supremo, eterno, invisível, caráter amoroso, bom e justo e ainda criou todas as coisas
pela palavra de sua boa (isso deixa qualquer cristão no mínimo intrigado). Havia uma
crença universal neste Deus corroborada pelos historiadores Pompeu Trogo (historiador
galo-romanizado) e Diosoro Sículo (historiador grego), ambos do século I a.C.

Os descendentes de Cão desviaram-se do monoteísmo, e por isso tipifica aqueles que se


opõem aos descendentes de Sem. Asshurera, a mesma pessoa de Ninrode, que também
era conhecido como Ninos, contudo, o mesmo fundador da Babilônia, fundou Nínive.
Cidade dos próprios descendentes de Ninrode, e por este motivo, para o bom conhecedor
das Sagradas Escrituras, é que Jonas, o profeta, negou-se prima facie se dirigir para lá.

Por que tudo isto é importante? Porque por meio de Ninrode e das culturas
Babilônicas é que toda mitologia grega fora baseada, bem como o Egípcio, o qual teve
grande influência em sincretismo Imperial. Falamos de Hermes, que era a mesma
pessoa de Cusí, no qual toda a Hermenêutica fora fundada, pois como dito, Hermes era
considerado Mercúrio, na cultura Grega, o “intérprete dos deuses”. Cusí, portanto, fora
o precursor de todo o sistema antigo.

Janus (Júpiter de Babel), deus romano, fora a figura que deu origem ao mês de Janeiro.
Em seguida surge, na pessoa de Bafomé ou Baphomet, o ser andrógeno25. Zero-aschta,
a deusa, era considerada a semente da mulher prometida, como se a profecia estivesse
se cumprindo. O culto a ela, portanto, passa a fazer parte do culto em Roma.

Babilônia cai pelo Império Medo-Persa e Átalos corre para Pérgamo levando junto seus
sacerdotes e impérios sagrados. Pérgamo então se estabelece um lugar de trabalho de
confusão. Todo esse conhecimento de ocultismo, portanto, em Átalo, é passado para
Roma, logo, uma miscelânea de culturas.

Não queremos subjugar credos, tampouco culturas, mas sim mostrar e demonstrar
as raízes sincretistas medievais e modernas, as quais têm sua origem no início das

25 Homem e mulher ao mesmo tempo.

47
UNIDADE II │ Sincretismo e cultura

principais civilizações conhecidas, cabe ao aluno avaliar o efeito positivo ou negativo


que tal sincretismo teve e tem para o cunho religioso.

Do Egito a Roma
Uso e conteúdo das catacumbas eram comuns no Egito, no entanto, na época do
Imperador Nero, as catacumbas passam a fazer parte do museu do Vaticano, em Roma.
Na galeria dos monumentos das catacumbas também se encontram sarcófagos e outros
instrumentos, imagens, ornamentos e objetos de culturas pagãs.

A coleção mais valiosa do museu cristão é a Galeria Lapidaria (lápides contam como
a primeira igreja lidava com a questão da morte). Caio Júlio e o imperador Petrônio
Máximo jazem nesses túmulos.

A idolatria iniciou-se de fato na igreja cristã no século II d.C. A influência pagã iniciou-se
quando um mártir era morto, pois como no cristianismo se crê na vida eterna, é certo
que este mártir estaria em um lugar melhor após a morte, portanto era motivo de alegria
e não de tristeza. Após um ano morto, a data de aniversário de sua morte era celebrada
de forma natural, chegando a se tornar até mesmo festa. Partes dos corpos dos santos
serviam como relíquias, portanto imagens, esculturas e estátuas eram feitas a eles. Era
a maneira de se lembrar daquelas pessoas consideradas santas.

Essa idolatria nasce da necessidade do ser humano em ter um objeto para adorar e
erguer um altar para um deus desconhecido, portanto é a partir da veneração destes
mártires que surgem as imagens de idolatria na igreja cristã.

Cada vez mais a doutrina pagã se infiltrou na igreja cristã. Comentava-se onde jaziam os
apóstolos: “Paulo e Pedro aqui podem interceder por Vitor”. Os próprios pais da igreja
no segundo século já pregavam distorcidamente os ensinos de Jesus. Introduziram-se
de modo muito sutil, subliminar e assim transformam a igreja.

“Ah, vovô (morto), intercede por mim a Jesus para Ele atender minha oração” e assim
começou. Comentários desse tipo deram início à nova cultura que adotava bases de
outros dogmas, misturando-se e transformando-se no sincretismo medieval conhecido.

Há tanto um panteão grego quanto romano. O mesmo deus da mitologia grega


representava outro na cultura romana; deuses diferentes e de nomes diferentes, porém
com mesmas características e finalidades.

48
Sincretismo e cultura │ UNIDADE II

Acreditava-se que a veneração de corpos, no toque do corpo do mártir, era algo santo.
Em 1545 (Trento), citava-se “Santos corpos dos santos mártires devem ser venerados”.
Quem não adorasse as relíquias (restos mortais de seres humanos) era morto.

São milhares de cadáveres e catacumbas de mortos (restos mortais de homens), bem


como utensílios de roupas, que supostamente seriam santos e que levavam multidões
para sua veneração e adoração. Os cultos religiosos (dado pela própria enciclopédia
católica) diz que vieram de práticas anteriores. Davam-se imensas filas de relíquias
vinham para Roma, consolidando-se um verdadeiro comércio de relíquias. Na própria
catedral de Wittenberg, onde Lutero pregou suas 95 teses havia 19.000 santas relíquias.
Essas relíquias eram catalogadas, etiquetadas e vendidas por bispos e papas.

“Roma era como um cemitério malcheiroso e hienas procuravam cadáveres [...] Todos
os túmulos remexidos” (Gregorovius, historiador não cristão). Vários milagres foram
atribuídos a essas relíquias, o povo era movido a “novidades” – sempre com novas
relíquias.

Em 308 d.C. encontrou-se a cruz da crucificação de Jesus. Nessa altura a edificação e


a manutenção da catedral eram os próprios donativos da organização. Dependendo da
qualidade e quantidades das relíquias eram mostradas como objeto de adoração. Inicia-
se a venda de indulgências. Historiadores seculares consideravam que: “a quantidade
de madeiras das lascas da cruz de Cristo era tão absurda que dava pra se construir um
barco de vinte e dois pés de altura”.

Na mesma capela encontrava-se mais de dezessete pés do jumento que ajudou Jesus.
Mais de oito crânios diferentes encontrados de João Batista, onze pernas de André e
nove braços de Estevão. Um verdadeiro comércio de relíquias.

Na Alemanha, expunham-se os supostos corpos dos três reis magos. Em 1204 d.C.
a questão do culto às relíquias tomou uma proporção assustadora. O que era um
carinho pelos mártires tornou-se uma igreja com mais de sete mil crânios, setecentos
verdadeiros pregos que crucificaram Jesus foram catalogados. Somente em Portugal
existia mais de cinco igrejas e ali se comercializava os pedaços da cruz e até mesmo pó
dos restos de Adão.

Uma ampola de sangue de João Paulo II e um pedaço de pele de João XIII foram
colocados ao lado do túmulo26.

26 Veja mais em < http://g1.globo.com/mundo/noticia/2014/04/papas-joao-paulo-ii-e-joao-xxiii-se-tornam-santos-neste-


domingo.html>.

49
unidAdE ii │ SinCrEtiSMo E CulturA

Pesquise mais sobre a origem do Natal, da Páscoa e de datas comemorativas


nas diferentes áreas da cultura antes de entrarmos nos próximos temas.
Eles não esgotaram este assunto, deste modo é válido para maior e melhor
posicionamento frente ao contexto a busca destas informações27.

o sincretismo antigo e as perseguições


Em Diocleciano deu-se a última grande perseguição. Tertuliano, escritor cristão do
segundo século dizia que “O sangue dos mártires é a semente da igreja”.

Policarpo, líder em Esmirna, quando chegou a Roma viu pessoas prostradas para imagens
dos apóstolos e considerou que os primeiros cristãos estavam sendo sobrepujados.

A história de Paulo se tornou imagens para conto de histórias, diante disso pessoas
começaram a fazer escultura para marcar sua história, logo então acreditou-se que essa
imagem podia interceder pela pessoa e com isto se deu o culto àquela imagem.

Eostre ou Ostera é a Deusa da fertilidade adorada na mitologia nórdica e germânica. Na


primavera, lebres, coelhinhos e ovos coloridos eram associados a ela como símbolo da
fertilidade. De seus cultos pagãos originou-se a Páscoa (Easter, em inglês e Ostern em
alemão). Logo no primeiro século já se estava fazendo a fusão entre o cristianismo e
paganismo. Antigos povos nórdicos comemoravam o festival de Eostre em 30 de março.

Na Wicca, a deusa da aurora, também é aclamada nesses dias. Existem oito sazonais na
bruxaria e uma delas é relacionada a esta deusa.

Policarpo de Esmirna em sua viagem a Roma não conseguiu intervir aquele paganismo e
dizia que Efraim estava entregue aos ídolos. Policarpo era um bispo que posteriormente
se tornou mártir. Desde Trajano (98 d.C. a 117 d.C.) nenhum cristão podia ser preso
sem culpa comprovada, nesta época o mártir cristão foi Inácio (Igreja de Antioquia
– formado por João), como vimos acima. Ao mesmo tempo em que prendia Inácio os
próprios cristãos o visitavam na cadeia. Quando Trajano chega a Antioquia, prende
Inácio (Inácio já era pastor de Antioquia) para dar de exemplo aos outros cristãos para
não serem cristãos. Inácio foi dado a uma morte dolorosa para ser comido por leões e
escoltado até Roma; foi torturado para que blasfemasse contra Jesus. Por ter a própria
fé abalada, fortalecia a fé da igreja. Foi morto em 110 d.C.

27 Apenas para instigar: o Natal é comemorado no mesmo dia em que se comemorava o aniversário de Mitra (o deus-sol).
Veremos mais sobre ele à frente.

50
Sincretismo e cultura │ UNIDADE II

Trajano foi sucedido por Adriano (perseguição igual a Trajano), posteriormente por
Antônio Pio e após essa mudança a igreja praticamente viveu em paz. Em Marco Aurélio
(161 d.C.), contudo, acentuou-se a perseguição.

Marco era culto, “justo” e sábio – não perseguiu os cristãos por crerem em Cristo, mas
pelo fato de não se curvarem à cultura dele. Justino (mártir), foi delatado diante do
juiz (180 d.C. - 192 d.C.) e, em Sétimo Severo (193 d.C. – 211 d.C.), deu-se a quinta
perseguição e neste império adotou-se de fato a política sincretista.

Neste período a igreja é alvo de decreto político. Martirizaram-se pastores e líderes


para os novos convertidos tivessem medo de se firmar na fé. Entre 211 d.C. e 235 d.C. foi
relativamente tranquilo, a Igreja sempre passava por esses altos e baixos, então, após
235 d.C., a sexta perseguição começou.

Para efeito de conhecimento histórico, é necessário conhecer de uma maneira resumida


tais fatos, pois através deles se concretizou na vida dos próprios mártires darem-se ao
paganismo. A pressão era simples e, muitas vezes, literalmente excruciante.

Entre 249 d.C. a 251 d.C. houve uma “breve” perseguição, isto é, a sétima delas. Por
todo o império é visto tais momentos se sucedendo. A oitava ocorreu por volta dos
anos 253 d.C. e 260 d.C., uma perseguição menos intensa, contudo, após dez anos de
“tranquilidade”. Porém, entre 270 d.C. e 275 d.C., inicia-se a nona perseguição da Igreja,
em que muitos apostataram da fé em Cristo. Após isso houve descanso.

Em Cartago havia um bispo Cipriano que aceitava o retorno de muitos cristãos, mas
com severas regras. A igreja foi enfraquecendo, pois aceitava hereges, apóstatas, fracos
na fé e a partir de então a igreja desanda de vez. Surgiram também outras doutrinas
de menor importância, entre elas o donatismo (grande opositor Augustinho). Em 284
d.C. – 305 d.C., já na décima perseguição, houve, para os cristãos, o cumprimento das
profecias.

Em Roma, Diocleciano e Galério como vice, Maximiniano e Constâncio Cloro como


vice, os quatro eram considerados imperadores, mas Diocleciano o maior. O rival mais
poderoso era Constantino, favorável aos cristãos, mesmo não se assumindo cristão.
Constantino teve de visão com uma cruz escrito “Por esse sinal vencerá”.

Em 275 a.C. os romanos começaram a conquistar até mesmo cidades da Grécia. Desta
forma uma nação passou a invadir a outra, com isto Roma se protege e conquista outros
territórios. Depois que Roma consegue dominar a península Itálica, os romanos partiram
para conquista de outros territórios e uma das mais importantes batalhas se deu em
Cartago, porquanto se Roma conquistasse essa cidade garantiria a supremacia romana.

51
UNIDADE II │ Sincretismo e cultura

No Mar mediterrâneo (significa literalmente “mar é nostro”), o Império Romano


conquista a Macedônia, Germania, Tracia, Síria, Palestina (63 a.C.) e então inicia-se
domínio de Roma sobre Jerusalém. Roma queria que Jerusalém se tornasse patrimônio
mundial. Otaviano encontrou-se como única pessoa a governar individualmente Roma,
mas depois que Augusto28 (o primeiro imperador) morre, decretou-se sua divinização.

Os imperadores em sua grande maioria foram considerados deuses depois de suas


mortes. Embora Roma possui-se muitas colônias, era só uma República.

A maioria dos imperadores romanos eram psicopatas (matavam sua própria família,
esposa e viviam em orgia, bem como toda sorte de problemas). O sucessor de Augusto,
Tibério (14-37 d.C.), iniciou uma época de terror e homicídios, em que ele mesmo morre
assassinado.

Calígola (Gaio, 37-41 d.C.) foi assassinado e conhecido por prostituir suas próprias
esposas. Já em Cláudio, conquistou-se a atual Inglaterra (41-54 d.C.). Expulsaram
então os judeus de Roma e logo mais em Constantino, como vimos, determinou que o
Cristianismo fosse religião oficial do império romano.

Em Constantino encerram-se as perseguições. Mesmo nos tempos apostólicos os erros


aconteceram. O amor daquela igreja se apaga e os cristãos se apostataram. Muitos
não eram cristãos e entraram desapercebidamente e perfunctoriamente na igreja
(assim como satanistas), e foi exatamente essa infiltração que tornou a igreja em um
sincretismo religioso sem precedentes, nem mesmo nos tempos atuais.

Por fim, para efeito de conhecimento, das primeiras perseguições de Cristo até em 1900
não se compara aos mortos depois de 1900. A mais intensa deu-se no nosso século.
Estima-se que vinte e seis milhões de pessoas morreram no século XX. Mais de 250
milhões de cristãos estão sofrendo perseguições até os dias de hoje.

Mitraísmo e a perseguição
É extremamente válido ressaltar e reiterar toda a pressão que envolvia os cristãos na
antiguidade por parte do império para a adoração subliminar ao deus Mitra, o deus-sol.
No mitraísmo bolos com pequenos pedaços de frutas (nosso Panetone hodierno) eram
oferecidos ao deus em seu aniversário, em 25 de dezembro, portanto o menos intelectual
verá claramente que adotou-se a mesma metodologia a Jesus, muito embora o bom
conhecedor bíblico saiba que Cristo não nasceu em dezembro, mas em uma data de fins
de setembro e início de outubro na festa dos Tabernáculos (ou festa das Cabanas).

28 O mês de Agosto é em homenagem a Augusto e Julho a Júlio César, para efeito de conhecimento.

52
Sincretismo e cultura │ UNIDADE II

Em Trajano, como vimos, os cristãos “somente” eram mortos caso eles mesmos não
negassem a fé e cultuassem ao deus que o império obrigava, contudo o problema é
que o cristianismo sempre afirmará ser detentor da verdade absoluta e morrerão por
isto, e assim os mais fortes na fé prevalecerão; foi exatamente que ocorreu: dezenas de
centenas padeciam nas mãos do império. Para dar maior força argumentativa, vejamos
abaixo fragmentos do epistolário de Plínio, o Jovem, que era um historiador secular,
pedindo conselho ao imperador sobre como agir com os cristãos naquele tempo:

Estou acostumado, oh meu senhor, a submeter ao teu julgamento


todos os problemas sobre os quais tenho dúvidas: quem, de fato, pode
melhor que tu guiar minha incerteza e esclarecer minha ignorância?
[...] Com os que me foram denunciados como cristãos segui este
procedimento: perguntei-lhes a eles mesmos se eram cristãos. Se
confessavam, repetia uma segunda e uma terceira vez a pergunta,
ameaçando-os de morte: ordenei justiçar aos que perseveravam [...]
Por outro lado eles afirmavam que toda sua culpa ou erro consistia no
fato de se reunirem antes da alvorada um dia estabelecido, de cantar
entre eles alternadamente um hino a Cristo como se fosse um deus, de
se comprometer sob juramento não cometer nenhum delito, como não
cometer roubos, pilhagens, adultérios, a não faltar a palavra dada, a não
se negar, se lhes pedirem, de devolver um depósito [...] Não encontrei
nada, a não ser uma superstição irracional e desmesurada. Portanto,
suspendendo a instrução, apresso-me a perguntar-te o teu parecer [...].

Por um lado baseado em seus “princípios” governamentais, por outro não deixar se
alastrar um “vírus” (concepção dos imperadores daquela época) cristão pelo resto do
povo, Trajano responde:

Meu querido Segundo, na instrução de outros processos contra os que


haviam sido denunciados como cristãos te comportastes como devias:
não se pode fixar uma norma geral, que tenha um caráter rígido, por
assim dizê-lo. Não se deve persegui-los: se não denunciados e se mostram
culpados, deve ser castigados, mas de maneira que quem tenha negado
ser cristão e o tenha demonstrado com fatos, isto é, venerando nossos
deuses, obtenha o perdão graças a seu arrependimento, embora seja
lícito suspeitar dele pelo passado. Em nenhum procedimento judicial,
contudo, devem ser tomadas em considerações as denúncias anônimas.
Representam um péssimo exemplo e não são dignas de nosso tempo.
(Plínio, o Jovem, Epistolário, X, 96,97).

53
unidAdE ii │ SinCrEtiSMo E CulturA

figura 4: mitra, o deus-sol.

fonte: <http://arquehistoria.com/wp-content/uploads/2011/12/mitra.jpg>.

Não temos por objetivo trazer detalhes sobre a perseguição dos cristãos, contudo, faz-se
profundamente necessário entendermos as raízes sincretistas de nosso tempo, os quais
se têm nos primeiros séculos após Cristo as mais consideráveis aplicações.

Não deixe de construir um traçado histórico do tema para facilitar seu processo
de aprendizagem. Para o aluno proativo, as buscas de informações extras nunca
são demais. Por isso, faça um levantamento histórico mais apurado da origem
pagã de Mitra29 e a forma de culto que mitreus faziam a esse deus; uma antiga
divindade de origem indo-europeia, que já se fazia presente na religião indiana
no período védico e reverenciado também em boa parte do território iraniano.
Porém, na cultura romana ele era conhecido como: Apolo, Hélio ou Hermes.
Para instigar seu processo de vontade para a busca informativa, saiba que a
origem da suástica, sim, exatamente o que simbolizou o nazismo e toda sua
enfadonha herança, tem sua origem na Índia, muito antes de Hitler a usar. O que
hodiernamente se vem tentando por parte dos fervorosos indianos na justiça
é comprovar sua origem antes do “roubo” da imagem, para que com isto eles
possam a continuar utilizando em seus rituais de adoração a divindades locais.
Em sua pesquisa que poderá passar da Pré-história (criação dos deuses),
Proto-história, Medievo Helênico, período alto, médio e baixo-arcaico, período
clássico, macedônico, helenístico, enfim, perceba que sempre haverá a figura
da mãe, pai e filho em praticamente todas as culturas, credos e crenças, sejam
elas pagãs ou cristãs, originando-se em termos bíblicos em Ninrode, Semirames
e Tamús, em que o último era a mesma pessoa do pai, uma vez que Ninrode

29 Olhe novamente para imagem de Mitra e abra sua carteira, qualquer semelhança com a figura impressa em nosso papel-moeda
(real) é mera coincidência (?) e, porque não, com a pouco famosa Estátua da Liberdade (presente francês para os americanos).
Não deixe de comparar as imagens.

54
Sincretismo e cultura │ UNIDADE II

relacionava-se com a própria mãe. O aluno bem atento perceberá também


a representação em simulacros (sempre) do sol e da lua, o sol (o pai) sempre
assumindo seu papel circular, seja ele uma circunferência apenas, ou com
preenchimento, já a lua (a mãe) com maior verossimilhança de apresentar-se em
forma de lua minguante ou crescente. Dentre outros detalhes que se perceberão
somente com uma avaliação minuciosa, a qual nós não temos espaço para tratar,
e serão vistas muitas outras semelhanças.

55
capítulo 2
Sincretismo e suas ramificações

O sincretismo e os jogos olímpicos


Prima facie a pergunta seria qual a relevância dos jogos olímpicos com o sincretismo?
Vamos analisar.

Primeiramente a tocha era oferecida como sacrifício a Zeus. A tocha ficava no Altar
do sacrifício. Desde as ruínas do templo de Era até Berlim essa chama foi carregada.
Teorias nazistas estão envolvidas, pois o culto ao corpo passou a ser insofismavelmente
imprescindível. Essa chama é ateada na tocha olímpica até hoje em Olímpia, no templo
de Héstia. Era uma tentativa de recriar a cerimônia de antigamente.

Atrizes colocavam uma tocha em um espelho parabólico representando exatamente


como fazia-se na Grécia antiga. A chama sai de Olímpia e só termina quando seu destino
final é alcançado. O próprio cristianismo começou a assumir teorias de cultos pagãos.

Em Júlio César começou o título aos imperadores, nesta época misturou-se política
e Igreja (veremos mais à frente sobre o tema) e então Roma30 incorporou de vez o
paganismo. Deuses e deusas da cultura grega eram diretamente adorados (qualquer
leigo sabe que Apolo e Hércules são fulcrais a cultura grega e seus jogos antigos). Diante
disto, o culto ao corpo, somado a adoração pagã, fez do império romano e, portanto, da
Igreja naquela época uma grande cultura sincretista.

O sincretismo moderno
Boff (2005, p. 194), demonstra-se a favor do sincretismo, no entanto, como um bom
teólogo e filósofo com formação alemã, traz a posição contrária:

Para o antigo secretário do Conselho Ecumênico das Igrejas, Visser´t


Hooft, o sincretismo constitui a grande tentação deste século, pois a
alma humana não é naturaliter christiana, mas naturaliter syncretista;
ele chega a afirmar que o sincretismo é muito mais perigoso do que
o ateísmo integral. G. Thils, conhecido professor de Lovaina, fez eco
ao alarme de Visser´t Hooft com um livro cujo título já indicava a
alternativa: Sincretismo ou catolicismo? Com menos rigidez, assume
30 O início do império romano datou-se em 16 de janeiro de 24 A.C.

56
Sincretismo e cultura │ UNIDADE II

fundamentalmente as críticas do antigo secretário do Conselho


Ecumênico das Igrejas. O próprio Vaticano II adverte “contra toda
espécie de sincretismo e de falso particularismo” (Ad Gentes 22/942).

É nítido que igrejas como Assembleia de Deus, Adventistas do Sétimo Dia, Deus é Amor,
Congregação Cristã no Brasil, Igreja do Evangelho Quadrangular, Igreja Pentecostal, O
Brasil para Cristo, Casa da Benção e religiosos que se posicionam como pentecostais
em sua maioria, protestantes, Católico-Romanos ortodoxos, e dezenas de outras igrejas
que possuem sua crença na Bíblia e creem que Deus as deu uma visão e que devem
seguir dificilmente se aglutinaram ao movimento sincretista hodierno, deste modo, as
chances de se juntarem ao sincretismo total, como uma “Igreja Universal” para todos,
são praticamente zero.

O sincretismo, como um todo, possui diversos motivos para se iniciar, seja ela por mais
proximidade política, onde se trabalha a filosofia do Poderoso Chefão: “mantenha
seus amigos pertos e seus inimigos mais perto ainda”. (1) Seja por mera acomodação
ou estratégia de sobrevivência; (2) seja pela miscelânea cultural, o que implica tudo o
que vimos em sincretismo antigo, então se tem que inevitável é a mistura de aspectos
pagãos ou religiosos de outras denominações; (3) por concordismo pela simples
não força de opinião, “o que vier é lucro”; (4) seja também por tradução, de alguma
maneira aquela seita e/ou religião tenta de algum modo fazer com que sua crença
chegue a outros povos, tribos e nações; ou, por fim, (5) por simples concordância
intelectual de fundir-se a outras dentro de um mesmo interesse filosófico com tentativa
de encontro das convergências e abandono das divergências. Seja qual for o motivo
de inicialização, estão todos em uma linha tênue que percorrem para um mesmo fim:
a união entre povos.

O sincretismo e a liberdade religiosa na


América Latina
Após o Concílio Vaticano II a visão liberalista, não dita de maneira direta, aparece
na Declaração Dignitatis Humanae31 de uma forma que representa seus princípios e
respectivas dimensões de modo utópicas: “Deve-se reconhecer ao homem a liberdade
em sumo grau e não há de restringi-la, a não ser quando e quanto for necessário”
(7c/1.556). Já em Gaudiumet Spes32 admoesta-se aos cidadãos “que evitem atribuir
demasiadamente poder à autoridade pública” (75b/453).

31 Sempre vale a pena conferir: <http://www.vatican.va/archive/hist_councils/ii_vatican_council/documents/vat-ii_


decl_19651207_dignitatis-humanae_po.html>.
32 Veja mais: <http://www.vatican.va/archive/hist_councils/ii_vatican_council/documents/vat-ii_const_19651207_gaudium-
et-spes_po.html>.

57
UNIDADE II │ Sincretismo e cultura

Gaarder et al. (2000, p. 282-283), nos informa:

A separação entre Igreja e Estado, ato político que institucionalizou a


neutralidade do Estado em matéria de religião, foi obra da República
Velha proclamada em 1889, depois chamada República Velha. Os
republicanos houveram por bem inscrever desde logo na Constituição
de 1891 – definitivamente, pelo menos até agora – a moderna liberdade
de culto. Vale dizer: o respeito a todas as formas de expressão religiosa,
o respeito escrupuloso às convicções mais íntimas de um ser humano, a
liberdade de consciência.

Hoje em dia nossa Carta Magna não deixou de lado o posicionamento laico do Estado33.
No entanto, não é assim que muitos governos atuam ao redor do mundo, como bem
sabemos, haja vista os países do Oriente Médio, Africanos e alguns Asiáticos, em maior
rigor.

Vemos, sobretudo, a tentativa no sincretismo puro, uma forma de reorganizar o mundo


de forma a “libertá-lo” da guerra e das prisões culturais que envolvem diversos países.

O quadro pluralista latino-americano envolve diversas congregações e comunidades


religiosas cristãs em torno de um mesmo fim, Cristo – Agnus Dei, qui tollis peccata
mundi34 – no entanto, por caminhos diferentes. É um processo dinâmico e complexo
de conversão e tentativa de reconversão, competição entre si, contudo nosso continente
passa por um dos maiores processos laicos da história da humanidade, permitindo à
sociedade a livre escolha das crenças religiosas.

A unidade da Igreja latina fora construída sobre três eixos: semelhante fé (vinculum
symbolicum), semelhantes sacramentos (vinculum liturgicum) e semelhante governo
hierárquico (vinculum sociale). Portanto a concepção hierárquica de unus grex sub
uno pastore e unum corpus [populus] sub uno capite35 foi enfatizada. A Igreja Oriental
Ortodoxa36 permaneceu em centralizar-se no sacramento como princípio gerador e
unidade entre o corpo, e obviamente não deixando de lado una euchatistia, unus grex37.

Para a Igreja latina moderna, não se resguardando somente a forma de pensar católica,
mas em uma weltanschauung genérica cristã, a fé dá liberdade e se, contudo, a legislação
permite exercê-la, farão de maneira iniludível, fulcral à sobrevivência e propagação do
cristianismo.

33 Vide Constituição Federal de 1988 em seu art. 5º, VI, sobre a Liberdade Religiosa.
34 Cordeiro de Deus, que tiras os pecados do mundo.
35 Um povo só sob um pastor só e um corpo sob um capitão só.
36 Ou Igreja Católica Ortodoxa, herdeira de padrões cristãos do Império Bizantino.
37 Uma só eucaristia, um só povo.

58
Sincretismo e cultura │ UNIDADE II

Aspectos sociais, políticos e econômicos


É certo que o homem sempre foi um ser político, preocupado com seu status e extrato
bancário. Não descarta estar sempre no poder de algo ou alguma coisa, tampouco deixa
de lado seus compromissos e preocupações pessoais; muitas vezes tais razões não são
necessariamente pelo interesse financeiro, mas a marca de seu nome na história de
um povo/nação. Aspectos cognitivos estão envolvidos, e não entraremos em tamanhos
detalhes, no entanto faz-se necessário conhecer somente um pouco mais do que o trivial
que muitos conhecem, a fim de adotar uma postura um tanto quanto mais informativa
e alicerçada em rocha sólida.

O século XVI é a fase dos conflitos religiosos. Há, porém, muito jogo
político na Reforma e na Contrarreforma, o que despertou interesse
teórico. O interesse, no entanto, foi apenas interesseiro e não teórico.
Os católicos tinham a posição política que os favorecia e a justificaram
teoricamente. Os protestantes também tinham as suas e tentaram
defendê-las teoricamente. (SOUZA, 2012, p. 347).

A Reforma e a Renascença marcaram a Era Moderna. As duas sinalizaram fases de


ruptura38 e, com isto, romperam aquilo que envolvia as ideias dominantes, as medievais,
com efeito, colocaram outras. Essas novas concepções políticas, sociais e econômicas
tiveram seus efeitos imediatos.

Houve a concepção do novo homem às margens do protestantismo e a contrarreforma


como um todo, neste ambiente ele não é mais temente a Deus e “fechado para o mundo”
com as consideradas ideias imutáveis, inamovíveis, mas sim fincado em rocha de caráter
duvidoso com suas dinâmicas liberalistas (assunto do qual falaremos um pouco mais à
frente).

Outrossim, em Lumen Gentium39, Puebla critica formalmente quanto a neutralidade da


Igreja referente os aspectos sociais, políticos e econômicos:

“[...] a Igreja critica aqueles que tendem a reduzir o espaço da fé à


vida pessoal ou familiar, excluindo a ordem profissional, econômica,
social e política, como se o pecado, o amor, a oração e o perdão não
tivessem importância aí” (no 515). “Há instrumentalização da Igreja
que pode provir dos próprios cristãos, sacerdotes e religiosos, quando
anunciam um Evangelho sem conexões econômicas, sociais, culturais e

38 Lembrando-se sempre que não há meios de se falar em união (ecumenismo) sem falar em divisão, seu efeito contrário, dado a
complexidade das ações humanas. Fora Diocleciano, em 284 d.C. quem dividiu o império entre Oriental e Ocidental.
39 Vale a pena ler na íntegra: <http://www.vatican.va/archive/hist_councils/ii_vatican_council/documents/vat-ii_
const_19641121_lumen-gentium_po.html>. Constituição Dogmática Lumen Gentium sobre a Igreja.

59
UNIDADE II │ Sincretismo e cultura

políticas. Na prática esta mutilação equivale a certo conluio – embora


inconsciente – com a ordem estabelecida” (no 558).

Até o século XI, o poder da Igreja está sob a tutela do Império. Contudo, sabemos que
se iniciou em Constantino quando convocou o Concílio Ecumênico de Niceia (325),
chamando-se a si mesmo de papa e encontrando sua caracterização jurídica por meio
da incompreensão leiga. A Igreja tinha se transformado no berço dos imperadores,
os quais dispunham dos cargos eclesiásticos e os tratavam de maneira secular. Deste
modo, diversos atributos pagãos e de outras culturas foram adentrando aos poucos no
cristianismo, transformando-o num grande sincretismo.

Tal Weltanschauung católica é criticada pelo protestantismo, pois ambos consideram-


se com raízes primitivas, zona de debate contemporâneo, e, ainda, sob a ideia católico-
romana, vemos sua história sempre, e isto é unânime historicamente, pois é um fato
que a religião misturou-se em aspectos profundos com o Império e toda sorte de política
medieval.

60
capítulo 3
Diálogo inter-religioso e cultural

Diálogo inter-religioso
É certo que o diálogo inter-religioso está inserido no tema sincretismo, pois dentro
do sincretismo religioso há margens para abordagens cada vez mais expressivas de
diálogos ecumênicos entre religiões cristãs ou não.

Como estudamos, o início deu-se por meio do Cristianismo absorvendo culturas pagãs
e outras por intenção sincera ou por medo (mais por terror, diga-se de passagem).
Mas também vimos que de maneira subliminar muitos cristãos adoram hoje deuses
semelhantes aos da mitologia grega e cultura egípcia, mesmo sem intenção.

O sincretismo mediante o diálogo inter-religioso (expressão previamente estabelecida


pelo Concílio Vaticano II) é tido por muitos como a única forma de se chegar à paz no
mundo, por intermédio de parcerias envolto a acordos e desejos comuns, regrado a
muita conversa, propostas, debates sem confrontação direta, mas sim para os favoráveis,
fac, quod facien dum est (fazendo o que deve ser feito).

Há, portanto, oriundo do pensamento sobre a miscelânea religiosa, o sincretismo puro,


aquele que não vê problema algum em fundir-se qualquer tipo de religião umas com
as outras, e o sincretismo adaptado, aquele que exige algum tipo de conversão após o
diálogo. Muitas vezes o sincretismo adaptado parte de origem cristã para não cristãos,
uma vez que afirma ser detentora da verdade e que a salvação vem somente por meio
de Cristo, o Salvator mundi40.

Assim insere Boff (2005, p. 211) sobre o que chamamos aqui de sincretismo adaptado:

Em razão disto, entende-se que, na atividade missionária, num


primeiro momento, a fé cristã se re-afirma em sua identidade, contra
distinguindo-se de outras expressões religiosas. Problema o Evangelho,
condia à conversão. Uma vez operada a conversão, inicia-se o processo
de sincretismo. Neste segundo momento, a identidade cristã, no dizer
do Vaticano II, “toma emprestado costumes e tradições, do saber e da
doutrina, das artes e sistemas dos povos tudo o que pode contribuir
para glorificar o Criador, para ilustrar a graça do Salvador e para
ordenar convenientemente a vida cristã (Ad Gentes 22/941). Origina-se
40 Salvador do mundo.

61
UNIDADE II │ Sincretismo e cultura

assim um verdadeiro sincretismo, tendo como núcleo substancial a


identidade cristã.

Vemos interesse hodiernamente da busca do diálogo por diferentes povos, tribos e


nações, os quais buscam, reitera-se, acordos universais para tornar o mundo melhor, e
por que não, segundo alguns, uma Igreja Universal.

Na obra de Boff (2005, p. 48), embora ele demonstre ser a favor do diálogo sincretista,
trata-se de ensaios de eclesiologia militante, temos a seguinte observação sobre a
tendência teológica tendo como reflexão Mysterium salutis41:

Se nas duas tendências anteriores42 a Igreja, seja como Hierarquia, seja


como Povo de Deus, ocupava o centro da teologia, agora é o mistério da
salvação o polo enucleador de toda sistematização. Mysterium salutis
é um conceito-chave na Tradição antiga e na teologia do Vaticano II.
Deus se oferece a si mesmo como salvação, que vai do Abel justo usque
ad ultimum electum, recobrindo toda a história dos homens.

A teologia de que as Sagradas Escrituras emergem como sacramento, de que a


salvação é dada para todas as tribos e nações, está inteiramente ligada ao fenômeno
religioso universal, pois Deus salva e a parte do homem é buscar esta salvação. Em tal
argumentação, os testemunhos de outras religiões também fazem parte iminente. O
diálogo ecumênico não se restringe às Igrejas Cristãs, como estamos tentando ver ao
longo do curso, uma vez que a fusão pode se dar por qualquer outra religião que tenha
a paz e o amor como intuito final.

A Igreja Católica põe um tanto quanto de lado a proposta inicial de conversão dos não
adeptos ao Cristianismo e Catolicismo. Haja vista a Encíclica Ecclesiam Suam43do papa
Paulo VI, em que ele apresenta seu controverso enunciado e digno de debates entre
Católico-Romano Ortodoxo: “despretensiosa conversação epistolar”. Diz ainda:

“Parece-nos, porém, que a relação da Igreja com o mundo, sem excluir


outras formas legítimas, se representa melhor pelo diálogo, embora não
necessariamente com palavras que tenham para os dois interlocutores
o mesmo sentido” (Paulo VI, Ecclesiam Suam, no 45) [...] Descobre-se
no diálogo como são diversas as vias que levam à luz da fé, mas como
apesar disso é possível fazê-las convergir para o mesmo fim. Ainda que
sejam divergentes, podem tornar-se complementares, levando o nosso
raciocínio para fora das sendas comuns e obrigando-o a aprofundar
41 Mistério da Salvação.
42 Em uma ele trata da tendência teológica como explicitação depositum fidei, onde estão contidas verdades necessárias para a
salvação cristã. Já na segunda, teologia como iniciação à experiência cristã.
43 Veja mais na íntegra direto do site do Vaticano: <http://www.vatican.va/holy_father/paul_vi/encyclicals/documents/hf_p-
vi_enc_06081964_ecclesiam_po.html>.

62
Sincretismo e cultura │ UNIDADE II

as investigações e a renovar os modos de expressão. A dialética deste


exercício de pensamento e de paciência far-nos-á descobrir elementos
de verdade mesmo nas opiniões alheias” (Paulo VI, Ecclesiam Suam,
no 48).

Vemos claramente a despretensão dogmática de conversão por meio do diálogo


inter-religioso moderno por parte do papa e, consequentemente, de toda a Igreja
Católica. Ainda faz-se válido ressaltar que nosso material baseia-se sobremaneira em
encíclicas, decretos e documentos católicos, porquanto o mesmo oferece a maior gama
histórica, importância política, relevância social e econômica e maior abrangência
mundial. Muitas religiões seguem direta ou indiretamente ensinamentos católicos,
posicionamentos e pensamentos papais.

O que o ocorre no Vaticano passa a ser de interesse mundial e, de acordo e em função


de escolhas e pensamentos romanos, prima facie muitos são afetados diretamente.
Deste modo, o diálogo inter-religioso ainda não perdeu seu cerne, o qual tem os olhos
voltados para instituições católico-romanas, ortodoxas e agora para as evangélicas.

Tem-se no diálogo inter-religioso, sobretudo, a concepção humanista de mundo. Um


mundo de igualdade social e deste modo, um mundo de paz, de tolerância e respeito
para com o próximo, de ressocialização da minoria, discriminados, pobres e oprimidos,
da luta contra a devastação ambiental, violência e violação dos direitos humanos, entre
outros aspectos importantes, como o de que o proselitismo não faz bem, mas somente
vê a fé de outrem como um caminho que o levará a Deus e de maneira alguma lúdica e
ceteres paribus quando se tem os olhos voltados para o bem e para a paz.

Deste modo, e principalmente por este fator, é que muitos ortodoxos e fundamentalistas
não aderem ao diálogo, uma vez que se baseiam na adoção bíblica de que não se pode
misturar joio e trigo, com isto, portanto, há uma resistência sobremaneira ao diálogo,
impedindo que este se propague pelo mundo. A Organização das Nações Unidas (ONU)
vem tentando alterar o quadro em parceria com o Vaticano, no entanto, o sucesso do
diálogo está ficando cada vez mais distante.

Para que nosso subtema não se torne prolixo, uma vez que tacitamente sabemos que o
diálogo inter-religioso não mais se afere como no passado, somente com igrejas cristãs
envolvidas, mas a busca de uma Igreja Universal faz-se como objetivo uno. Os atos
prosélitos ortodoxos são vistos sob a ótica em favor do movimento ecumênico como
uma posição estranha e digna de rejeição, considerando o fato que por meio do diálogo
pode-se alcançar todo e qualquer sonho nacional de paz e amor mundial.

63
UNIDADE II │ Sincretismo e cultura

A cultura da revolução
Bem sabemos que naqueles tempos (entre os séculos XII e XIV) a fé estava baseada na
Bíblia, quando possível, contudo nos finais do século X e sobretudo século XI, Anselmo
e Abelardo discutiam filosoficamente sobre o tema religião, portanto fazendo-se cediço
aos cristãos que não necessariamente a fé cega levava a Deus, mas pelo intelecto podia-se
chegar ao mesmo Deus, porém de uma maneira sã. Agostinho foi prova disto, haja
vista sua obra Summa contra Gentiles, considerada a maior obra apologética da Idade
Média.

A metafísica passa ser mais importante que a ciência para a filosofia, isto até Galileu.
Portanto as perguntas eram de cunho teológico, porém lógico, as quais fizeram com que
diversos cristãos desviados retornassem a fé.

Os cristãos passam a dialogar mais entre si; para muitos, o diálogo inter-religioso
envolve somente a comunidade cristã, contudo budistas, judeus e islâmicos estão
dialogando muito antes do Vaticano II, como sabemos, por pessoas da comunidade,
mas sem comprovação, por isso somente após 1964 é que se deu oficialmente o diálogo
entre as diferentes culturas.

Convergências e divergências sincretistas das


diferentes culturas e credos de modo (não)
conclusivos
Podemos aqui fazer “vista grossa” quanto ao debate que envolve todas as culturas que
possuem o bem como interesse e refletir somente sobre o cristianismo e suas ramificações
religiosas, contudo adstringiríamos o assunto. Também não conseguiremos, de modo
algum, tratar casuisticamente cada religião do mundo em suas respectivas concepções
sobre a aceitação do diálogo, tampouco conciliá-las em um total, contudo, mormente
apresentar relações importantes ao nosso tema, a fim de torná-lo o mais didático e
menos exaustivo possível, com o intuito de não esgotá-lo, uma vez que o objetivo é fazer
com que o aluno venha a se posicionar frente aos temas propostos de maneira categórica,
com informação, para propalar, porque não, sua concepção sobre ecumenismo e
assuntos pertinentes.

Como vimos, existem as crenças monoteístas, politeístas, monolátricas, panteístas,


animista. Vimos também que existiu a monarquia, aristocracia e sociedade em geral,
as quais estruturavam nações gregas, germânicas, romanas e indianas. A Rainha dos
Céus dos tempos antigos está presente em praticamente todas as religiões por meio

64
Sincretismo e cultura │ UNIDADE II

de simulacros, haja vista os cultos propagados a divindades do gênero feminino que


possuem as mesmas características dos cultos, como exemplo a “antiga” deusa Diana.

Consideramos também a suma importância das diferenças e semelhanças das religiões


orientais e ocidentais, mas não em detalhes, como afirmamos, por falta de espaço, no
entanto, vale ressaltar as principais diferenças e em quais pontos se convergem:

Tabela 8: Concepções Ocidental e Oriental

CONCEPÇÕES OCIDENTAL ORIENTAL


Ideia do começo e fim e Deus como Visão cíclica, a vida e a história do mundo resumem-
Histórica
criador se a infinitos ciclos.
Deus é o criador de todas as coisas. Ele é A divindade encontra-se em todas as coisas (visão
Conceituação
imanente e transcendente no mundo. politeísta) e de forma impessoal (panteísta)
A pessoa de Deus é completamente O homem iluminado e conhecedor pode se tornar
Noção Humanista
diferente da figura humana divino em algum ciclo.
A liberdade da alma é a salvação. Aqui se projeta
Deus julga o ser humano. A existência do
Eternidade a ideia de que sacrifícios místicos e conhecimento
céu e inferno é uma verdade.
libertarão a alma dos ciclos eternos.
O homem deve obedecer a Deus,
Ética esvaziando-se de si mesmo e se Fuga do mundo e passividade.
abstendo do mal e sua aparência.
Entoar cânticos e louvores; basear-se na
Adoração Meditar e sacrificar o que se é e o que se tem.
Bíblia, orar e pregar o evangelho.

Fonte: Baseado em Coogan (2007) e Gaarder (2000).

Dessa forma vemos nas diferentes religiões o seguinte diálogo quanto à existência de
Deus em todas as coisas, em uma Weltanschauung cristã ortodoxa fundamentalista:
“se Deus está presente no mundo e fora dele, dentro de mim e fora de mim; seu deus
também, podendo ser ele uma árvore, elefante ou o que quer que seja é verdadeiro; ora,
portanto vamos e adoramos apenas um só deus, uma só igreja”.

De modo sectário aqui foram expostas as convergências e divergências entre os


pensamentos; o que é bom para um, passa a ser até mesmo tétrico e herético para outro.
A interpretação de Jo, 17 para igrejas do oriente pode ser completamente antagônica
à cosmovisão ocidental. A ubiquidade de Deus para os credos panteísticos torna-se
capaz de se apresentar de forma válida na fauna e na flora. Vemos nos budismo bases
dogmáticas neste sentido:
1. Não fazer mal a nenhuma criatura viva.
2. Não tomar aquilo que não lhe foi dado (não roubar).
3. Não se comportar de modo irresponsável nos prazeres sensuais.
4. Não falar falsidades.
5. Não se entorpecer com álcool ou drogas.

65
UNIDADE II │ Sincretismo e cultura

Para o bom conhecedor dos dez mandamentos bíblicos, verá que há diversas
similaridades de acordo e em função da interpretação hermenêutica de ambos.

Desde a antiguidade os chineses tratam dos “três caminhos”, a saber: taoísmo,


confucionismo e budismo. O budismo é oriundo da Índia, propagando-se na China
e no Japão, influenciando categoricamente a religião do país, o xintoísmo. Quando o
comunista Tsé-Tung, em 1949, reprimiu a liberdade religiosa, destruindo templos e
confiscando toda sorte de comunidades religiosas, vemos a forte relação atemporal das
autoridades oficiais para com qualquer atividade de cunho religioso.

Nestas reviravoltas (chamemos de “crises religiosas”) a pressão, como vimos, é por vezes
extrema e incomensuravelmente dolorosa e é exatamente desta forma, (aproveitemos
a visão filosófica de Thomas Kuhn no que tange a filosofia científica para adequarmos
e melhor esclarecer nosso assunto, embora qualquer filósofo científico teria asco só
de pensar dessa forma) que as revoluções religiosas dão-se de forma muitas vezes
catastróficas, considerando por diversas razões a rejeição ao deus que adoravam, o
qual não foi “capaz” de solucionar um problema paradigmático de tal magnitude que
recrudescia dia após dia, passando a adorar qualquer outro deus “vencedor” de qualquer
outra religião promissora.

A figura de Abraão para os judeus (Is, 51.2) pode ser – novamente temos o caráter
subjetivo envolvido – a mesma do cristianismo (Jo, 8-29-40), o qual por sua vez
também converge ou diverge com o Abraão dos muçulmanos (Corão, sura 2, 129), o
qual alicerça-se nas obrigações de credo, oração, caridade, jejum e peregrinação à Meca,
não sendo totalmente convergente com as concepções judaicas e cristãs.

Ainda permanecendo no diálogo inter-religioso sincretista, veja a seguinte tabela:

Tabela 9: Relações sincretistas

Nomes Orixá Sincretismo


Exu Mensageiro - S.m. Diabo
Ogum Orixá da metalurgia, deus da guerra. S.m. Santo Antônio
Oxóssi Orixá da caça, deus da fauna. S.m. São Sebastião
Ossaim Orixá da vegetação, deus das folhas. Sm. Santo Onofre
Oxumarê Orixá do arco-íris. S.andrógeno. São Bartolomeu
Obaluaê Orixá das pestes, das pragas e das doenças. S.m. São Lázaro
Xangô Orixá do trovão, deus da justiça. S.m. São Jerônimo
Iansã Orixá do relâmpago, dona dos espíritos mortos. S.f. Santa Bárbara
Orixá das águas doces e salgadas, deus do amor e da Senhora Conceição e Senhora
Obá
fertilidade. S.f. Aparecida

66
Sincretismo e cultura │ UNIDADE II

Nomes Orixá Sincretismo


Logum Edé Orixá dos rios dentro das florestas. S.m e S.f. São Miguel Arcanjo
Orixá das grandes águas, dos mares e oceanos, a grande mãe,
Iemanjá Senhora da Conceição
deusa da maternidade. S.f.
Nanã Orixá da lama do fundo das águas. S.f. Santa Ana
Oxaguiã Orixá da criação da cultura material, da sobrevivência. S.m. Menino Jesus.
Oxalufã ou Obatalá Jesus Crucificado, Cristo Redentor,
Orixá da criação da humanidade. Ser andrógeno.
(oxalá Velho) e Senhor do Bonfim.
Fonte: Baseado em Coogan (2007) e Gaarder (2000).

Sendo os orixás divindades moralistas, que exigem e recompensam quem é bom e


castigam quem é mal, tornam-se semelhantes aos deuses mitológicos do panteão grego,
egípcio; também o espiritismo acredita que quem faz o bem de qualquer forma é bom
e quem faz o mal deve evoluir para se tornar um ser divino. Bem sabemos que esse
pensamento representa em termos o posicionamento oriental (vide tabela Concepções
Ocidental e Oriental). O cristianismo, o judaísmo e o islamismo, sendo monoteístas,
creem na verdade de seus escritos sagrados como verdade absoluta, no entanto afirmam
possuir essa verdade.

Temos na cultura, portanto, toda sorte de convergências e divergências religiosas


e dogmáticas. O evolucionismo e ateísmo, mesmo não sendo consideradas religiões,
concebem a ideia semelhante que mesmo não havendo um deus, “tudo que corre para o
bom andamento da vida, é bom, e o que diverge em favor da vida é mal, e ponto”.

Conclusão
Basicamente temos em todas as diferenciações do sagrado e do profano. O problema
é que o cristianismo afirma ter a verdade absoluta, então, incorre-se em um problema
lógico, o qual, no final, se o cristianismo estiver correto, todo o restante será condenado,
no entanto, se todos os povos, fora os cristãos ortodoxos não católicos, estiverem
corretos, segue-se que todos se salvam e serão todos um só povo com um só deus.

Não tentamos aqui esgotar ou estudar exaustivamente cada assunto, porquanto


acreditamos ter exposto os tópicos principais necessários para a busca de informações
mais precisas e detalhas de cada tema e/ou subtema, e por certo sem sorrelfa.

Mostramos que o pródromo ecumênico e sincretista não se deu em nossa era, tampouco
na época medieval, mas, sim, na origem das civilizações antigas, e que o simulacro dos
deuses passou de religião em religião por diversos modos e motivações, sejam elas de
forma lúdica e racional; seja por ignorância e amadorismo; seja por pressão acachapante
das autoridades para com os fiéis ou pressões exercidas por guerras entre povos nos quais

67
UNIDADE II │ Sincretismo e cultura

o “deus do mais forte” permanecia como o deus vitorioso e digno de adoração; seja, até
mesmo, por fim, que num diálogo inter-religioso deu-se o entendimento conclusivo de
que o deus de um possuía características semelhantes ao deus de outro, portanto adorar
o deus de um ou de outro não fazia diferença, resguardando-se, contudo, o propósito
original (como o deus da fauna, da flora, oceano e entre outros).

O sincretismo, segundo alguns, não implicava em misturas ou identificações, mas em


semelhanças e equivalências, como num jogo de analogias, e não como fusão. Cabe ao
aluno identificar e se possível posicionar-se frente a um tema complexo em demasia,
haja vista toda sorte de filiações e resistências ao movimento ecumênico, tanto moderno
quanto na história do mundo.

68
Para (não) Finalizar

Continue sua pesquisa!


Leituras recomendadas:

» Para compreender o ecumenismo, de Juan Bosch Navarro.

» Introdução à teologia ecumênica, de Jos Vercruysse.

Ambos da Editora Loyola.

Encontra-se facilmente acessível na página virtual do Vaticano (www.vatican.com), a


maior parte dos decretos utilizados no tema. Embora tenhamos no Anexo I a UR, leia
na íntegra também a declaração Dignitatis Humanae, sobre a liberdade religiosa.

O site <www.montfort.org.br> (Associação Cultural) também possui excelentes


conteúdos didáticos, contudo é válido ressaltar que possuem uma visão ortodoxa
Católico-Romana, com fortes critérios apologéticos Católico-Romanos.

Livros são como ouro, jamais serão desvalorizados em sua prateleira, compre-os sempre,
cedo ou tarde, independentemente se a leitura estiver em dia ou não você o utilizará.

As imagens falarão por si em nosso tema, não deixe de continuar sua pesquisa. Não nos
cabe aqui enchermos o material de imagens para que fique denso, não fora o intuito em
momento algum, portanto, por falta de espaço e coerência lógica para melhor cadência
e bom andamento de nosso aprendizado, não foram colocadas em demasia, então parta
para a jornada da busca ininterrupta e sadia do conhecimento.

Não deixe de ler os pontos que mais o instigaram em nosso Anexo I.

Como diria Ovídio (43 a.C. -18 d.C.), Finis coronat Opus44!

Links Úteis:

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44 O fim coroa a obra!

69
UNIDADE II │ Sincretismo e cultura

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70
Referências

As estatísticas pós-Vaticano II provam! Disponível em: <http://www.montfort.


org.br/as-estatisticas-pos-vaticano-ii-provam/>. Acesso em: 21 de agosto de 2014.

BENTES, J. M.; CHAMPLIN, R. N. Enciclopédia de Bíblia, Teologia e Filosofia,


v. 1. São Paulo: Candeia, 1991.

_______, v. 2. São Paulo: Candeia, 1991.

_______, v. 3. São Paulo: Candeia, 1991.

_______, v. 4. São Paulo: Candeia, 1995.

_______, v. 5. São Paulo: Candeia, 1997.

_______, v. 6. São Paulo: Candeia, 1997.

BÍBLIA. Português. Bíblia sagrada. Tradução de João Ferreira de Almeida. Rio de


Janeiro: CPAD, 1998.

BOFF, Leonardo. Igreja: carisma e poder. Rio de Janeiro: Record, 2005.

CHADWICKY, Henry e EVANS, G.R. Igreja cristã. Barcelona: Folio S.A., 2007.

COOGAN, D. M., Religiões. História, tradições e fundamentos das principais crenças


religiosas. São Paulo: Publifolha, 2007.

Decreto Unitatis Redintegratio, sobre o ecumenismo. Disponível em <http://


www.vatican.va/archive/hist_councils/ii_vatican_council/documents/vat-ii_
decree_19641121_unitatis-redintegratio_po.html#top>. Acesso em 19 de Novembro
de 2014.

DURANDO, Furio. A Grécia Antiga. Barcelona: Folio S.A., 2005.

Encyclopaedia Britannica: Chicago: Encyclopaedia Britannica, 1987. 6 v.

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GAARDER, Jostein; HELLERN Victor; NOTAKER Henry. O livro das religiões. São
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71
Referências

GEISLER, Norman; TUREK, Frank. Não tenho fé suficiente para ser ateu. São
Paulo: Vida, 2006.

JOHNSON, Paul. O livro de ouro dos papas. Rio de Janeiro: Ediouro, 2003.

MATTEI, Roberto de. O Concílio Vaticano II. Uma história nunca escrita. Ed. Petrus,
2012.

O´BRIEN, Joanne. O atlas das religiões: o mapeamento completo de todas as


crenças. São Paulo: Publifolha, 2008.

SOUZA, Roberto Pinto de. As ideias que formaram a civilização ocidental. São
Paulo: DVS Editora, 2012.

72
ANEXO

DECRETO

UNITATIS REDINTEGRATIO
SOBRE O ECUMENISMO

PROÉMIO

Natureza do movimento ecuménico

1. Promover a restauração da unidade entre todos os cristãos é um dos principais


propósitos do sagrado Concílio Ecuménico Vaticano II. Pois Cristo Senhor fundou uma
só e única Igreja. Todavia, são numerosas as Comunhões cristãs que se apresentam aos
homens como a verdadeira herança de Jesus Cristo. Todos, na verdade, se professam
discípulos do Senhor, mas têm pareceres diversos e caminham por rumos diferentes,
como se o próprio Cristo estivesse dividido(1). Esta divisão, porém, contradiz
abertamente a vontade de Cristo, e é escândalo para o mundo, como também prejudica
a santíssima causa da pregação do Evangelho a toda a criatura.

O Senhor dos séculos, porém, prossegue sábia e pacientemente o plano de sua graça
a favor de nós pecadores. Começou ultimamente a infundir de modo mais abundante
nos cristãos separados entre si a compunção de coração e o desejo de união. Por toda a
parte, muitos homens sentiram o impulso desta graça. Também surgiu entre os nossos
irmãos separados, por moção da graça do Espirito Santo, um movimento cada vez mais
intenso em ordem à restauração da unidade de todos os cristãos. Este movimento de
unidade é chamado ecuménico. Participam dele os que invocam Deus Trino e confessam
a Cristo como Senhor e Salvador, não só individualmente mas também reunidos em
assembleias. Cada qual afirma que o grupo onde ouviu o Evangelho é Igreja sua e de
Deus. Quase todos, se bem que de modo diverso, aspiram a uma Igreja de Deus una e
visível, que seja verdadeiramente universal e enviada ao mundo inteiro, a fim de que o
mundo se converta ao Evangelho e assim seja salvo, para glória de Deus.

Este sagrado Concílio considera todas essas coisas com muita alegria. Tendo já
declarado a doutrina sobre a Igreja, movido pelo desejo de restaurar a unidade de todos
os cristãos, quer propor a todos os católicos os meios, os caminhos e as formas com que
eles possam corresponder a esta vocação e graça divina.

73
anexo

CAPÍTULO I

PRINCÍPIOS CATÓLICOS DO ECUMENISMO

Unidade da Igreja

2. Nisto se manifestou a caridade de Deus para connosco, em que o Filho unigénito de


Deus foi enviado ao mundo pelo Pai a fim de que, feito homem, desse nova vida pela
Redenção a todo o género humano e o unificasse(2). Antes de se imolar no altar da cruz
como hóstia imaculada, rogou ao Pai pelos que crêem, dizendo: “Para que todos sejam
um, como tu, Pai, em mim e eu em ti; para que sejam um em nós, a fim de que o mundo
creia que tu me enviaste” (Jo. 17,21). Na Sua Igreja instituiu o admirável sacramento
da Eucaristia, pelo qual é tanto significada como realizada a unidade da Igreja A Seus
discípulos deu o novo mandamento do mútuo amor (3) e prometeu o Espírito Paráclito
(4), que, como Senhor e fonte de vida, com eles permanecesse para sempre.

Suspenso na cruz e glorificado, o Senhor Jesus derramou o Espírito prometido. Por Ele
chamou e congregou na unidade da fé, esperança e caridade o Povo da nova Aliança, que
é a Igreja, como atesta o Apóstolo: “Só há um corpo e um espírito, como também fostes
chamados numa só esperança da vossa vocação.Só há um Senhor, uma fé, um Baptismo”
(Ef. 4, 45). Com efeito, “todos quantos fostes baptizados em Cristo, vos revestistes de
Cristo.Pois todos sois um em Cristo Jesus” (Gál. 3, 27-28). O Espírito Santo habita nos
crentes, enche e rege toda a Igreja, realiza aquela maravilhosa comunhão dos fiéis e
une a todos tão intimamente em Cristo, que é princípio da unidade da Igreja. Ele faz
a distribuição das graças e dos ofícios (5), enriquecendo a Igreja de Jesus Cristo com
múltiplos dons, “a fim de aperfeiçoar os santos para a obra do ministério, na edificação
do corpo de Cristo” (Ef. 4,12).

Para estabelecer esta Sua Igreja santa em todo mundo até à consumação dos séculos,
Cristo outorgou ao colégio dos doze o ofício de ensinar, governar e santificar (6). Dentre
eles, escolheu Pedro, sobre quem, após a profissão de fé, decidiu edificar a Sua Igreja.
A ele prometeu as chaves do reino dos céus (7) e, depois da profissão do seu amor,
confiou-lhe a tarefa de confirmar todas as ovelhas na fé (8) e de apascentá-las em
perfeita unidade (9), permanecendo eternamente o próprio Cristo Jesus como pedra
angular fundamental (10) e pastor de nossas almas(11).

Jesus Cristo quer que o Seu Povo cresça mediante a fiel pregação do Evangelho,
administração dos sacramentos e governo amoroso dos Apóstolos e dos seus sucessores
os Bispos, com a sua cabeça, o sucessor de Pedro, sob a acção do Espírito Santo; e
vai aperfeiçoando a sua comunhão na unidade: na confissão duma só fé, na comum
celebração do culto divino e na fraterna concórdia da família de Deus.

74
anexo

Assim a Igreja, a única grei de Deus, como um sinal levantado entre as nações (12),
oferecendo o Evangelho da paz a todo o género humano(13), peregrina em esperança,
rumo à meta da pátria celeste(14).

Este é o sagrado mistério da unidade da Igreja, em Cristo e por Cristo, realizando o


Espírito Santo a variedade dos ministérios. Deste mistério o supremo modelo e princípio
é a unidade dum só Deus, o Pai e o Filho no Espírito Santo, na Trindade de pessoas.

Ruptura da unidade da Igreja: laços de união entre todos os cristãos

3. Nesta una e única Igreja de Deus já desde os primórdios surgiram algumas cisões
(15), que o Apóstolo censura asperamente como condenáveis (16). Nos séculos
posteriores, porém, originaram-se dissensões mais amplas. Comunidades não pequenas
separaram-se da plena comunhão da Igreja católica, algumas vezes não sem culpa dos
homens dum e doutro lado. Aqueles, porém, que agora nascem em tais comunidades
e são instruídos na fé de Cristo, não podem ser acusados do pecado da separação, e a
Igreja católica os abraça com fraterna reverência e amor. Pois que crêem em Cristo e
foram devidamente baptizados, estão numa certa comunhão, embora não perfeita, com
a Igreja católica. De facto, as discrepâncias que de vários modos existem entre eles e
a Igreja católica - quer em questões doutrinais e às vezes também disciplinares, quer
acerca da estrutura da Igreja - criam não poucos obstáculos, por vezes muito graves, à
plena comunhão eclesiástica. O movimento ecuménico visa a superar estes obstáculos.
No entanto, justificados no Baptismo pela fé, são incorporados a Cristo (17), e, por isso,
com direito se honram com o nome de cristãos e justamente são reconhecidos pelos
filhos da Igreja católica como irmãos no Senhor (18).

Ademais, dentre os elementos ou bens com que, tomados em conjunto, a própria Igreja
é edificada e vivificada, alguns e até muitos e muito importantes podem existir fora do
âmbito da Igreja católica: a palavra de Deus escrita, a vida da graça, a fé, a esperança
e a caridade e outros dons interiores do Espírito Santo e elementos visíveis. Tudo isso,
que de Cristo provém e a Cristo conduz, pertence por direito à única Igreja de Cristo.

Também não poucas acções sagradas da religião cristã são celebradas entre os
nossos irmãos separados. Por vários modos, conforme a condição de cada Igreja ou
Comunidade, estas acções podem realmente produzir a vida da graça. Devem mesmo
ser tidas como aptas para abrir a porta à comunhão da salvação.

Por isso, as Igrejas (19) e Comunidades separadas, embora creiamos que tenham
defeitos, de forma alguma estão despojadas de sentido e de significação no mistério da
salvação. Pois o Espírito de Cristo não recusa servir-se delas como de meios de salvação
cuja virtude deriva da própria plenitude de graça e verdade confiada à Igreja católica.

75
anexo

Contudo, os irmãos separados, quer os indivíduos quer as suas Comunidades e Igrejas,


não gozam daquela unidade que Jesus quis prodigalizar a todos os que regenerou e
convivificou num só corpo e numa vida nova e que a Sagrada Escritura e a venerável
Tradição da Igreja professam. Porque só pela Igreja católica de Cristo, que é o meio geral
de salvação, pode ser atingida toda a plenitude dos meios salutares. Cremos também
que o Senhor confiou todos os bens da nova Aliança ao único colégio apostólico, a cuja
testa está Pedro, com o fim de constituir na terra um só corpo de Cristo. É necessário
que a ele se incorporem plenamente todos os que de

alguma forma pertencem ao Povo de Deus. Este Povo, durante a peregrinação terrena,
ainda que sujeito ao pecado nos seus membros, cresce incessantemente em Cristo.
É conduzido suavemente por Deus, segundo os Seus misteriosos desígnios, até que
chegue, alegre, à total plenitude da glória eterna na celeste Jerusalém.

O movimento ecuménico

4. Hoje, em muitas partes do mundo, mediante o sopro da graça do Espírito Santo,


empreendem-se, pela oração, pela palavra e pela acção, muitas tentativas de aproximação
daquela plenitude de unidade que Jesus Cristo quis. Este sagrado Concilio, portanto,
exorta todos os fiéis a que, reconhecendo os sinais dos tempos, solicitamente participem
do trabalho ecuménico.

Por “movimento ecuménico” entendem-se as actividades e iniciativas, que são


suscitadas e ordenadas, segundo as várias necessidades da Igreja e oportunidades dos
tempos, no sentido de favorecer a unidade dos cristãos. Tais são: primeiro, todos os
esforços para eliminar palavras, juízos e acções que, segundo a equidade e a verdade,
não correspondem à condição dos irmãos separados e, por isso, tornam mais difíceis
as relações com eles; depois, o “diálogo” estabelecido entre peritos competentes, em
reuniões de cristãos das diversas Igrejas em Comunidades, organizadas em espírito
religioso, em que cada qual explica mais profundamente a doutrina da sua Comunhão
e apresenta com clareza as suas características. Com este diálogo, todos adquirem um
conhecimento mais verdadeiro e um apreço mais justo da doutrina e da vida de cada
Comunhão. Então estas Comunhões conseguem também uma mais ampla colaboração
em certas obrigações que a consciência cristã exige em vista do bem comum. E onde
for possível, reúnem-se em oração unânime. Enfim, todos examinam a sua fidelidade à
vontade de Cristo acerca da Igreja e, na medida da necessidade, levam vigorosamente
por diante o trabalho de renovação e de Reforma.

Desde que os fiéis da Igreja católica prudente e pacientemente trabalhem sob a


vigilância dos pastores, tudo isto contribuirá para promover a equidade e a verdade,
a concórdia e a colaboração, o espírito fraterno e a união. Assim, palmilhando este

76
anexo

caminho, superando pouco a pouco os obstáculos que impedem a perfeita comunhão


eclesiástica, todos os cristãos se congreguem numa única celebração da Eucaristia e
na unidade de uma única Igreja. Esta unidade, desde o início Cristo a concedeu à Sua
Igreja. Nós cremos que esta unidade subsiste indefectivelmente na Igreja católica e
esperamos que cresça de dia para dia. até à consumação dos séculos.

Mas é evidente que o trabalho de preparação e reconciliação dos indivíduos que


desejam a plena comunhão católica é por sua natureza distinto da empresa ecuménica:
Entretanto, não existe nenhuma oposição entre as duas, pois ambas procedem da
admirável Providencia divina.

É, sem dúvida, necessário que os fiéis católicos na empresa ecuménica se preocupem


com os irmãos separados, rezando por eles, comunicando com eles sobre assuntos da
Igreja, dando os primeiros passos em direcção a eles. Sobretudo, porém, examinam
com espírito sincero e atento aquelas coisas que na própria família católica devem ser
renovadas e realizadas para que a sua vida dê um testemunho mais fiel e luminoso da
doutrina e dos ensinamentos recebidos de Cristo, através dos Apóstolos.

Embora a Igreja católica seja enriquecida de toda a verdade revelada por Deus e de
todos os instrumentos da graça, os seus membros, contudo, não vivem com todo aquele
fervor que seria conveniente. E assim, aos irmãos separados e ao mundo inteiro o
rosto da Igreja brilha menos e o seu crescimento é retardado. Por esse motivo, todos os
católicos devem tender à perfeição cristã (20) e, cada um segundo a própria condição,
devam procurar que a Igreja, levando em seu corpo a humildade e mortificação de Jesus
(21), de dia para dia se purifique e se renove, até que, Cristo a apresente a Si gloriosa,
sem mancha e sem ruga (22).

Guardando a unidade nas coisas necessárias, todos na Igreja, segundo o múnus dado
a cada um, conservem a devida liberdade tanto nas várias formas de vida espiritual
e de disciplina, como na diversidade de ritos litúrgicos e até mesmo na elaboração
teológica da verdade revelada. Mas em tudo cultivem a caridade. Por este modo de agir,
manifestarão sempre melhor a autêntica catolicidade e apostolicidade da Igreja.

Por outro lado, é mister que os católicos reconheçam com alegria e estimem os bens
verdadeiramente cristãos, oriundos de um património comum, que se encontram nos
irmãos de nós separados. É digno e salutar reconhecer as riquezas de Cristo e as obras
de virtude na vida de outros que dão testemunho de Cristo, às vezes até à efusão do
sangue. Deus é, com efeito, sempre admirável e digno de admiração em Suas obras.

Nem se passe por alto o facto de que tudo o que a graça do Espírito Santo realiza
nos irmãos separados pode também contribuir para a nossa edificação. Tudo o que é

77
anexo

verdadeiramente cristão jamais se opõe aos bens genuínos da fé, antes sempre pode
fazer com que mais perfeitamente se compreenda o próprio mistério de Cristo e da
Igreja.

Todavia, as divisões dos cristãos impedem a Igreja de realizar a plenitude de catolicidade


que lhe é própria naqueles filhos que, embora incorporados pelo Baptismo, estão
separados da sua plena comunhão. E até para a própria Igreja se torna mais difícil
exprimir na realidade da vida e sob todos os aspectos a sua plena catolicidade.

Este sagrado Concílio verifica com alegria que a participação dos fiéis na acção
ecuménica aumenta cada vez mais. Recomenda-a aos Bispos de todo o mundo, para
que a promovam com interesse e prudentemente a dirijam.

CAPÍTULO II

PRÁTICA DO ECUMENISMO

Trabalho de toda a Igreja

5. A solicitude na restauração da união vale para toda a Igreja, tanto para os fiéis como
para os pastores. Afecta a cada um em particular, de acordo com sua capacidade, quer na
vida cristã quotidiana, quer nas investigações teológicas e histéricas. Essa preocupação
já manifesta de certo modo a união fraterna existente entre todos os cristãos, e conduz
à unidade plena e perfeita, segundo a benevolência de Deus.

A renovação da Igreja: sua importância e necessidade

6. Toda a renovação da Igreja (23) consiste essencialmente numa maior fidelidade à


própria vocação. Esta é, sem dúvida, a razão do movimento para a unidade. A Igreja
peregrina é chamada por Cristo a essa reforma perene. Como instituição humana e
terrena, a Igreja necessita perpetuamente desta reforma. Assim, se em vista das
circunstancias das coisas e dos tempos houve deficiências, quer na moral, quer na
disciplina eclesiástica, quer também no modo de enunciar a doutrina - modo que deve
cuidadosamente distinguir-se do próprio depósito da fé - tudo seja recta e devidamente
restaurado no momento oportuno.

Esta renovação tem, por isso, grande importância ecuménica. Ela já é efectuada em
várias esferas da Igreja. Tais são os movimentos bíblico e litúrgico, a pregação da
palavra de Deus e a catequese, o apostolado dos leigos, as novas formas de vida religiosa,
a espiritualidade do matrimónio, a doutrina e actividade da Igreja no campo social.
Tudo isto deve ser tido como penhor e auspicio que felizmente prognosticam os futuros
progressos do ecumenismo.

78
anexo

A conversão do coração

7. Não há verdadeiro ecumenismo sem conversão interior. É que os anseios de unidade


nascem e amadurecem a partir da renovação da mente (24), da abnegação de si mesmo
e da libérrima efusão da caridade. Por isso, devemos implorar do Espírito divino a graça
da sincera abnegação, humildade e mansidão em servir, e da fraterna generosidade
para com os outros. “Portanto - diz o Apóstolo das gentes - eu, prisioneiro no Senhor,
vos rogo que vivais de modo digno da vocação a que fostes chamados, com toda a
humildade e mansidão, com paciência, suportando-vos uns aos outros em caridade, e
esforçando-vos solicitamente por conservar a unidade do Espírito no vínculo da paz”
(Ef. 4, 1-3). Esta exortação visa sobretudo aqueles que foram elevados à sagrada Ordem
na intenção de que seja continuada a missão de Cristo, que entre nós “não esteve para
ser servido, mas para servir” (Mt. 20,28).

Também das culpas contra a unidade, vale o testemunho de S. João: “Se dissermos que
não temos pecado, fazemo-lo mentiroso e a sua palavra não está em nós” (1Jo. 1,10).
Por isso, pedimos humildemente perdão a Deus e aos irmãos separados, assim como
também nós perdoamos àqueles que nos ofenderam.

Lembrem-se todos os cristãos de que tanto melhor promoverão e até realizarão a união
dos cristãos quanto mais se esforçarem por levar uma vida mais pura, de acordo com o
Evangelho. Porque, quanto mais unidos estiverem em comunhão estreita com o Pai, o
Verbo e o Espírito, tanto mais íntima e facilmente conseguirão aumentar a fraternidade
mútua.

A oração pela unidade

8. Esta conversão do coração e esta santidade de vida, juntamente com as orações


particulares e públicas pela unidade dos cristãos, devem ser tidas como a alma de todo
o movimento ecuménico, e com razão podem ser chamadas ecumenismo espiritual.

É coisa habitual entre os católicos reunirem-se frequentemente para aquela oração pela
unidade da Igreja que o próprio Salvador pediu ardentemente ao Pai, na vigília de sua
morte: “Que todos sejam um” (Jo. 17,21).

Em algumas circunstâncias peculiares, como por ocasião das orações prescritas “pro
unitate” em reuniões ecuménicas, é lícito e até desejável que os católicos se associem
aos irmãos separados na oração. Tais preces comuns são certamente um meio muito
eficaz para impetrar a unidade. São uma genuína manifestação dos vínculos pelos quais
ainda estão unidos os católicos com os irmãos separados: “Onde dois ou três estão
congregados em meu nome, ali estou eu no meio deles” (Mt. 18,20).

79
anexo

Todavia, não é lícito considerar a communicatio in sacris como um meio a


ser aplicado indiscriminadamente na restauração da unidade dos cristãos.
Esta communicatio depende principalmente de dois princípios: da necessidade de
testemunhar a unidade da Igreja e da participação nos meios da graça. O testemunho
da unidade frequentemente a proíbe. A busca da graça algumas vezes a recomenda.
Sobre o modo concreto de agir, decida prudentemente a autoridade episcopal local,
considerando todas as circunstancias dos tempos, lugares e pessoas, a não ser que outra
coisa seja determinada pela Conferência episcopal, segundo os seus próprios estatutos,
ou pela Santa Sé.

O conhecimento dos irmãos separados

9. É preciso conhecer a mente dos irmãos separados. Para isso, necessariamente se requer
um estudo, a ser feito segundo a verdade e com animo benévolo. Católicos devidamente
preparados devem adquirir um melhor conhecimento da doutrina e história, da vida
espiritual e litúrgica, da psicologia religiosa e da cultura própria dos irmãos. Muito
ajudam para isso as reuniões de ambas as partes para tratar principalmente de questões
teológicas, onde cada parte dever agir de igual para igual, contanto que aqueles que, sob
a vigilância dos superiores, nelas tomam parte, sejam verdadeiramente peritos. De tal
diálogo também se ver mais claramente qual é a situação real da Igreja católica. Por
esse caminho se conhecer outrossim melhor a mente dos irmãos separados e a nossa fé
lhes ser mais aptamente exposta.

A formação ecuménica

10. A sagrada teologia e as outras disciplinas, principalmente as históricas, devem ser


ensinadas também sob o ponto de vista ecuménico, de modo que respondam mais
exactamente à verdade das coisas.

Importa muito que os futuros pastores e sacerdotes estudem a teologia bem elaborada
deste modo e não polemicamente, sobretudo nas questões que incidem sobre as relações
entre os irmãos separados e a Igreja católica.

É da formação dos sacerdotes que depende em grande parte a necessária instrução e


formação espiritual dos fiéis e dos religiosos.

Devem ainda os católicos que se entregam a obras missionárias nas mesmas terras que
outros cristãos, especialmente hoje em dia, conhecer os problemas e os frutos que, para
o seu apostolado, se originam do ecumenismo.

80
anexo

A exposição clara e fiel da fé

11. O modo e o método de formular a doutrina católica de forma alguma devem


transformar-se em obstáculo por diálogo com os irmãos. É absolutamente necessário
que toda a doutrina seja exposta com clareza. Nada tão alheio ao ecumenismo como
aquele falso irenismo pelo qual a pureza da doutrina católica sobre detrimento e é
obscurecido o seu sentido genuíno e certo.

Ao mesmo tempo, a fé católica deve ser explicada mais profunda e correctamente, de


tal modo e com tais termos que possa ser de facto compreendida também pelos irmãos
separados.

Ademais, no diálogo ecuménico, os teólogos católicos, sempre fiéis à doutrina da Igreja,


quando investigarem juntamente com os irmãos separados os divinos mistérios, devem
proceder com amor pela verdade, com caridade e humildade. Na comparação das
doutrinas, lembrem-se que existe uma ordem ou “hierarquia” das verdades da doutrina
católica, já que o nexo delas com o fundamento da fé cristã é diferente. Assim se abre
o caminho pelo qual, mediante esta fraterna emulação, todos se sintam incitados a um
conhecimento mais profundo e a uma exposição mais clara das insondáveis riquezas de
Cristo (25).

A colaboração com os irmãos separados

12. Todos os cristãos professem diante do mundo inteiro a fé em Deus uno e trino, no
Filho de Deus encarnado, nosso Redentor e Salvador. Por um esforço comum e em estima
mútua dêem testemunho da nossa esperança, que não confunde. Visto que nos nossos
tempos largamente se estabelece a cooperação no campo social, todos os homens são
chamados a uma obra comum, mas com maior razão os que crêem em Deus, sobretudo
todos os cristãos assinalados com o nome de Cristo. A cooperação de todos os cristãos
exprime vivamente aquelas relações pelas quais já estão unidos entre si e apresenta o
rosto de Cristo Servo numa luz mais radiante. Esta cooperação, que já se realiza em não
poucas nações, deve ser aperfeiçoada sempre mais, principalmente nas regiões onde
se verifica a evolução social ou técnica. Vai ela contribuir para apreciar devidamente a
dignidade da pessoa humana, promover o bem da paz, aplicar ainda mais o Evangelho
na vida social, incentivar o espírito cristão nas ciências e nas artes e aplicar toda a
espécie de remédios aos males da nossa época, tais como a fome e as calamidades, o
analfabetismo e a pobreza, a falta de habitações e a inadequada distribuição dos bens.
Por essa cooperação, todos os que crêem em Cristo podem mais facilmente aprender
como devem entender-se melhor e estimar-se mais uns aos outros, e assim se abre o
caminho que leva à unidade dos cristãos.

81
anexo

CAPÍTULO IlII

IGREJAS E COMUNIDADES ECLESIAIS


SEPARADAS DA SÉ APOSTÓLICA ROMANA

Duas categorias de cismas

13. Temos diante dos olhos as duas principais categorias de cisões que ferem a túnica
inconsútil de Cristo.

As primeiras divisões sobrevieram no Oriente, já por contestação das fórmulas


dogmáticas dos Concílios de Éfeso e Calcedónia, já em tempo posterior, pela ruptura da
comunhão eclesiástica entre os Patriarcados orientais e a Sé Romana.

As outras, após mais de quatro séculos, originaram-se no Ocidente, provocadas pelos


acontecimentos comumente conhecidos com o nome de Reforma. Desde então, muitas
Comunhões, nacionais ou confessionais, se separaram da Sé Romana. Entre aquelas
nas quais continuam parcialmente as tradições e as estruturas católicas, ocupa um
lugar especial a Comunhão anglicana.

Estas diversas divisões, todavia, diferem muito entre si, não apenas em razão da origem,
lugar e tempo, mas principalmente pela natureza e gravidade das questões relativas à
fé e à estrutura eclesiástica.

Por isso, sem querer minimizar as diferenças entre os vários grupos cristãos e sem
desconhecer os laços que, não obstante a divisão, entre eles existem, este sagrado
Concílio determina propor as seguintes considerações para levar a cabo uma prudente
acção ecuménica.

I. CONSIDERAÇÃO PECULIAR SOBRE AS IGREJAS ORIENTAIS

Carácter e história própria dos orientais

14. Durante não poucos séculos, as Igrejas do Oriente e do Ocidente seguiram por
caminhos próprios, unidas, contudo, pela fraterna comunhão da fé e da vida sacramental.
Quando entre elas surgiam dissensões acerca da fé ou da disciplina, era a Sé de Roma
quem, de comum acordo, as resolvia. Entre outras coisas de grande importância, é grato
ao sagrado Concílio trazer à memória de todos o facto de que no Oriente florescem
muitas Igrejas particulares ou locais, entre as quais sobressaem as Igrejas patriarcais;
não poucas delas se gloriam de ter origem nos próprios Apóstolos. Por isso entre os
orientais prevaleceu e prevalece a solicitude e o cuidado de conservar na comunhão de
fé e caridade aquelas relações fraternas que devem vigorar entre as Igrejas locais como
entre irmãs.

82
anexo

Semelhantemente, não se deve esquecer que as Igrejas do Oriente têm desde a origem
um tesouro, do qual a Igreja do Ocidente herdou muitas coisas em liturgia, tradição
espiritual e ordenação jurídica. Nem se deve subestimar o facto de que os dogmas
fundamentais da fé cristã sobre a Trindade e o Verbo de Deus encarnado da Virgem
Maria, foram definidos em Concílios Ecuménicos celebrados no Oriente. Para preservar
esta fé, muito sofreram e ainda sofrem aquelas Igrejas.

Mas a herança deixada pelos Apóstolos foi aceite de formas e modos diversos e desde
os primórdios da Igreja cá e lá foi explicada de maneira diferente, também por causa
da diversidade de génio e condições de vida. Tudo isso, além das causas externas, e
também por falta de mútua compreensão e caridade, deu ocasião às separações.

Em vista disto, o sagrado Concilio exorta a todos, mormente aos que pretendem
dedicar-se à restauração da plena comunhão desejada entre as Igrejas orientais e a
Igreja católica, a que tenham na devida consideração esta peculiar condição da origem e
do crescimento das Igrejas do Oriente e da índole das relações que vigoravam entre elas
e a Sé Romana antes da separação. Procurem apreciar rectamente todos estes factores.
Acuradamente observadas, estas coisas contribuirão muito para o desejado diálogo.

A tradição litúrgica espiritual dos orientais

15. Também é conhecido de todos com quanto amor os cristãos-orientais realizam as


cerimónias litúrgicas, principalmente a celebração eucarística, fonte da vida da Igreja
e penhor da glória futura, pela qual os fiéis unidos ao Bispo, tendo acesso a Deus Pai
mediante o Filho, o Verbo encarnado, morto e glorificado, na efusão do Espírito Santo,
conseguem a comunhão com a Santíssima Trindade, feitos “participantes da natureza
divina” (2 Ped. 1,4). Por isso, pela celebração da Eucaristia do Senhor, em cada uma
dessas Igrejas, a Igreja de Deus é edificada e cresce (26), e pela concelebração se
manifesta a comunhão entre elas.

Neste culto litúrgico, os orientais proclamam com belíssimos hinos a grandeza de


Maria sempre Virgem, a quem o Concílio Ecuménico de Éfeso solenemente proclamou
Santíssima Mãe de Deus, para que se reconhecesse verdadeira e propriamente a Cristo
como Filho de Deus e Filho do Homem segundo as Escrituras. Cantam hinos também a
muitos santos, entre os quais os Padres da Igreja universal.

Como essas Igrejas, embora separadas, têm verdadeiros sacramentos, e principalmente,


em virtude da sucessão apostólica, o sacerdócio e a Eucaristia, ainda se unem muito
intimamente connosco. Por isso, alguma communicatio in sacris não só é possível
mas até aconselhável, em circunstâncias oportunas e com aprovação da autoridade
eclesiástica.

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anexo

Também no Oriente se encontram as riquezas daquelas tradições espirituais, que o


monaquismo sobretudo expressou. Pois desde os gloriosos tempos dos santos Padres
floresceu no Oriente aquela elevada espiritualidade monástica, que de lá se difundiu
para o Ocidente e da qual a vida religiosa dos latinos se originou como de sua fonte, e
em seguida, sem cessar, recebeu novo vigor. Recomenda-se, por isso, vivamente que
os católicos se abeirem com mais frequência destas riquezas espirituais dos Padres do
Oriente que elevam o homem todo à contemplação das coisas divinas.

Conhecer, venerar, conservar e fomentar o riquíssimo património litúrgico e espiritual


dos orientais é da máxima importância para guardar fielmente a plenitude da tradição
cristã e realizar a reconciliação dos cristãos orientais e ocidentais.

Disciplina própria dos orientais

16. Além do mais, desde os primeiros tempos as Igrejas do Oriente seguiam disciplinas
próprias, sancionadas pelos santos Padres e Concílios, mesmo Ecuménicos. Longe de
obstar à unidade da Igreja, uma certa diversidade de costumes e usos, como acima
se lembrou, aumenta-lhe a beleza e ajuda-a não pouco a cumprir a sua missão. Por
isso, o sagrado Concilio, para tirar todas as dúvidas, declara que as Igrejas do Oriente,
conscientes da necessária unidade de toda a Igreja, têm a faculdade de se governarem
segundo as próprias disciplinas, mais conformes à índole de seus fiéis e mais aptas
para atender ao bem das almas. A observância perfeita deste tradicional princípio, nem
sempre respeitada, é condição prévia indispensável para a restauração da união.

Carácter da teologia dos orientais

17. O que acima foi dito acerca da legítima diversidade, apraz declarar também com
relação à diversidade na enunciação teológica das doutrinas. Com efeito, no estudo
da verdade revelada, o Oriente e o Ocidente usaram métodos e modos diferentes para
conhecer e exprimir os mistérios divinos. Não admira, por isso, que alguns aspectos
do mistério revelado sejam por vezes apreendidos mais convenientemente e postos
em melhor luz por um que por outro. Nestes casos, deve dizer-se que aquelas várias
fórmulas teológicas, em vez de se oporem, não poucas vezes se completam mutuamente.
Com relação às tradições teológicas autênticas dos orientais, devemos reconhecer que
elas estão profundamente radicadas na Sagrada Escritura, são fomentadas e expressas
pela vida litúrgica, são nutridas pela viva tradição apostólica e pelos escritos dos Padres
orientais e dos autores espirituais, e promovem a recta ordenação da vida e até a
contemplação perfeita da verdade cristã.

Dando graças a Deus porque muitos filhos orientais da Igreja católica, que guardam este
património e desejam vivê-lo mais pura e plenamente, já vivem em plena comunhão

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com os irmãos que cultivam a tradição ocidental, este sagrado Concilio declara que
todo esse património espiritual e litúrgico, disciplinar e teológico, nas suas diversas
tradições, faz parte da plena catolicidade e apostolicidade da Igreja.

A busca da unidade

18. Tendo ponderado tudo isso, este sagrado Concílio renova o que foi declarado pelos
sagrados Concílios anteriores e também pelos Pontífices Romanos: para restaurar ou
conservar a comunhão e a unidade, é preciso “não impor nenhum outro encargo além do
necessário” (Act. 15, 28). Veementemente deseja também, que nas várias instituições e
formas de vida da Igreja, se envidem todos os esforços para uma gradual concretização
desta unidade, principalmente pela oração e pelo diálogo fraternal em torno da doutrina
e das necessidades mais urgentes do ministério pastoral de hoje. Do mesmo modo
recomenda aos pastores e fiéis da Igreja católica as boas relações com aqueles que já
não vivem no Oriente, mas longe da pátria, para que cresça a colaboração fraterna com
eles no espírito da caridade, excluído todo o espírito de contenda e rivalidade. E se
este trabalho for promovido com todo o entusiasmo, o sagrado Concílio espera que,
demolido o muro que separa a Igreja ocidental da oriental, haja finalmente uma única
morada, firmada na pedra angular, Jesus Cristo, que fará de ambas uma só coisa (27).

II. IGREJAS E COMUNIDADES ECLESIAIS SEPARADAS NO OCIDENTE

Condição própria destas comunidades

19. As Igrejas e Comunidades eclesiais, que se separaram da Sé Apostólica Romana


naquela grave perturbação iniciada no Ocidente já pelos fins da Idade média, ou em
tempos posteriores, continuam, contudo, ligadas à Igreja católica pelos laços de uma

peculiar afinidade devida à longa convivência do povo cristão na comunhão eclesiástica


durante os séculos passados. Visto que estas Igrejas e Comunidades eclesiais, por causa
da diversidade de origem, doutrina e vida espiritual não só diferem de nós mas também
diferem consideravelmente entre si, descrevê-las de modo adequado é um trabalho
muito difícil, que não entendemos fazer aqui.

Embora o movimento ecuménico e o desejo de paz com a Igreja católica ainda não
sejam vigorosos em toda a parte, temos a esperança de que crescerão pouco a pouco em
todos o sentido ecuménico e a estima mútua.

É preciso, contudo, reconhecer que entre estas Igrejas e Comunidades e a Igreja católica
há discrepâncias consideráveis, não só de índole histórica, sociológica, psicológica,
cultural, mas sobretudo de interpretação da verdade revelada. Para que mais facilmente,
não obstante estas diferenças, se possa estabelecer o diálogo ecuménico, queremos

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expor seguidamente alguns pontos que podem e devem ser o fundamento e o incentivo
deste diálogo.

A confissão de Cristo

20. Consideramos primeiramente aqueles cristãos que, para glória de Deus único, Pai e
Filho e Espírito Santo, abertamente confessam Jesus Cristo como Deus e Senhor e único
mediador entre Deus e os homens. Sabemos existirem não pequenas discrepâncias em
relação à doutrina da Igreja católica, mesmo sobre Cristo, Verbo de Deus encarnado, e
sobre a obra da redenção e por conseguinte sobre o mistério e o ministério da Igreja, bem
como sobre a função de Maria na obra da salvação. Alegramo-nos, contudo, vendo que
os irmãos separados tendem para Cristo como fonte e centro da comunhão eclesiástica.
Levados pelo desejo de união com Cristo, são mais e mais compelidos a buscarem a
unidade bem como a darem em toda a parte e diante de todos o testemunho da sua fé.

Estudo da Sagrada Escritura

21. O amor e a veneração e quase o culto da Sagrada Escritura levam os nossos irmãos
a um constante e cuidadoso estudo do texto sagrado: pois o Evangelho é “força de Deus
para salvação de todo aquele que crê, primeiro do judeu, mas também do grego” (Rom.
1,16).

Invocando o Espírito Santo, na própria Sagrada Escritura, procuram a Deus que lhes
fala em Cristo anunciado pelos profetas, Verbo de Deus por nós encarnado. Nela
contemplam a vida de Cristo e aquilo que o divino Mestre ensinou e realizou para a
salvação dos homens, sobretudo os mistérios da Sua morte e ressurreição.

Mas, embora os cristãos de nós separados afirmem a autoridade divina da Sagrada


Escritura, pensam diferentemente de nós - cada um de modo diverso - sobre a relação
entre a Escritura e a Igreja. Na Igreja, segundo a fé católica, o magistério autêntico tem
lugar peculiar na exposição e pregação da palavra de Deus escrita.

No entanto, no próprio diálogo a Sagrada Escritura é um exímio instrumento na


poderosa mão de Deus para a consecução daquela unidade que o Salvador oferece a
todos os homens.

A vida sacramental: o Baptismo, a ceia do Senhor

22. Pelo sacramento do Baptismo, sempre que for devidamente conferido segundo
a instituição do Senhor e recebido com a devida disposição de alma, o homem é
verdadeiramente incorporado em Cristo crucificado e glorificado, e regenerado para
participar na vida divina, segundo esta palavra do Apóstolo: “Com Ele fostes sepultados

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no Baptismo e n’Ele fostes conressuscitados pela fé no poder de Deus, que O ressuscitou


dos mortos” (Col. 2,12) (28).

O Baptismo, pois, constitui o vínculo sacramental da unidade que liga todos os que
foram regenerados por ele. O Baptismo, porém, de per si é o inicio e o exórdio, pois
tende à consecução da plenitude de vida em Cristo. Por isso, o Baptismo ordena-se à
completa profissão da fé, à íntegra incorporação na obra da salvação, tal como o próprio
Cristo o quis, e finalmente à total inserção na comunhão eucarística.

Embora falte às Comunidades eclesiais de nós separadas a unidade plena connosco


proveniente do Baptismo, e embora creiamos que elas não tenham conservado a
genuína e íntegra substancia do mistério eucarístico, sobretudo por causa da falta
do sacramento da Ordem, contudo, quando na santa Ceia comemoram a morte e a
ressurreição do Senhor, elas confessam ser significada a vida na comunhão de Cristo e
esperam o Seu glorioso advento. É, por isso, necessário que se tome como objecto do
diálogo a doutrina sobre a Ceia do Senhor, sobre os outros sacramentos, sobre o culto e
sobre os ministérios da Igreja.

A vida com Cristo: liturgia e moral

23. A vida cristã destes irmãos alimenta-se da fé em Cristo e é fortalecida pela graça
do Baptismo e pela audição da palavra de Deus. Manifesta-se na oração privada, na
meditação bíblica, na vida familiar cristã, no culto da comunidade congregada para
o louvor de Deus. Aliás, o culto deles contém por vezes notáveis elementos da antiga
Liturgia comum.

A sua fé em Cristo produz frutos de louvor e acção de graças pelos benefícios recebidos
de Deus. Há também, entre eles, um vivo sentido da justiça e uma sincera caridade
para com o próximo. Esta fé operosa produziu não poucas instituições para aliviar a
miséria espiritual e corporal, promover a educação da juventude, tornar mais humanas
as condições sociais da vida e estabelecer por toda a parte a paz.

E se em assuntos morais muitos dentre os cristãos nem sempre entendem o Evangelho


do mesmo modo que os católicos, nem admitem as mesmas soluções para questões
mais difíceis da sociedade hodierna, querem, no entanto, como nós, aderir à palavra de
Cristo como fonte da virtude cristã e obedecer ao preceito do Apostolo: “Tudo quanto
fizerdes por palavra ou por obra, fazei tudo em nome do Senhor Jesus Cristo, dando
graças a Deus Pai por Ele” (Col. 3,17). Daqui é que pode começar o diálogo ecuménico
sobre a aplicação moral do Evangelho.

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Exortação ao ecumenismo prudente e católico

24. Assim, após termos exposto brevemente as condições segundo as quais se pode
exercer a acção ecuménica e os princípios pelos quais ela deve ser orientada, olhamos
com confiança para o futuro. Este sagrado Concílio exorta os fiéis a absterem-se de
qualquer zelo superficial ou imprudente que possa prejudicar o

verdadeiro progresso da unidade. Com efeito, a sua acção ecuménica não pode ser
senão plena e sinceramente católica, isto é, fiel à verdade que recebemos dos Apóstolos
e dos Padres, e conforme à fé que a Igreja católica sempre professou, e ao mesmo tempo
tendente àquela plenitude mercê da qual o Senhor quer que cresça o Seu corpo no
decurso dos tempos.

Este sagrado Concílio deseja insistentemente que as iniciativas dos filhos da Igreja
católica juntamente com as dos irmãos separados se desenvolvam; que não se ponham
obstáculos aos caminhos da Providência; e que não se prejudiquem os futuros impulsos
do Espírito Santo. Além disso, declara estar consciente de que o santo propósito de
reconciliar todos os cristãos na unidade de uma só e única Igreja de Cristo excede as
forças e a capacidade humana. Por isso, coloca inteiramente a sua esperança na oração
de Cristo pela Igreja, no amor do Pai para connosco e na virtude do Espírito Santo. “E a
esperança não será confundida, pois o amor de Deus se derramou em nossos corações
pelo Espírito Santo que nos foi dado” (Rom. 5,5).

Vaticano, 21 de Novembro de 1964.

PAPA PAULO VI

Notas

1. Cfr. 1 Cor., 1, 13.

2. Cfr. 1 Jo. 4,9; Col. 1, 18-20; Jo. 11,52.

3. Cfr. Jo. 13,34.

4. Cfr. Jo. 16,7.

5. Cfr. 1 Cor. 12, 4-11.

6. Cfr. Mt. 28, 18-20; Jo. 20, 21-23.

7. Cfr. Mt. 16,19; Mt. 18,18.

8. Cfr. Lc. 22,32.

9. Cfr. Jo. 21, 15-17.

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anexo

10. Cfr. Ef. 2,20.

11. Cfr. 1 Ped. 2,25; I Conc. Vatic., Const. Pastor aeternus: Coll. Lac. 7, 482 a.

12. Cfr. Is. 11, 10-12.

13. Cfr. Ef. 2, 17-18; Mc. 16,15.

14. Cfr. 1 Ped. 1, 3-9.

15. Cfr. 1 Cor. 11, 18-19; Gal. 1, 6-9; 1 Jo. 2, 18-19.

16. Cfr. 1 Cor. 1, 11 ss.; 11,22.

17. Cfr. Conc. Florentino, ses. VIII, Decr. ExultateDeo; Mansi 31, 1055 A.

18. Cfr. S. Agostinho, In Ps. 32, Enarr. II, 29: PL 36, 299.

19. Cfr. IV Conc. Lateranense (1215), const. IV: Mansi 22, 990; II Conc.
Lugdunense, Profissão de fé de Miguel Paleólogo: Mansi 24, 71 E; Conc. Florentino,
Ses. VI, definiçãoLaetenturCoeli: Mansi 31, 1026 E.

20. Cfr. Tg. 1,4; Rom. 12, 1-2.

21. Cfr. 2 Cor. 4,10; Fil. 2, 5-8.

22. Cfr. Ef. 5,27.

23. Cfr. IV Conc. Lateranense, ses. XII, Const. Constituti: Mansi 32, 988 B-C.

24. Cfr. Ef. 4,23.

25. Cfr. Ef. 3, 8.

26. Cfr. S. João Crisóstomo, In Jo. hom. XLVI: PG 59, 260-262.

27. Cfr. Conc. Florentino, ses. VI, Definição Laetenturcoeli: Mansi 31, 1026 E.

28. Cfr. Rom. 6, 4.

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