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CONCEITOS BÁSICOS #13 – Superego

Vamos falar sobre esse que certamente é um dos conceitos mais importantes do campo
psicanalítico, não dá pra pensar a psicanalise hoje sem considerar o conceito de superego.

Se o conceito de superego é tão importante porque Freud só introduziu esse conceito em


1923? Caso você não saiba, Freud nem sempre trabalhou com o conceito de superego, esse
conceito só vai aparecer no livro “O ego e o Id” que está no volume 19. Temos algumas
elaborações de Freud que podem ser tomadas como embriões do desenvolvimento do
conceito de superego, mas o termo de fato só aparece aqui em 1923, no livro “o ego e o id”,
porque? Porque Freud demorou a propor esse conceito dentro com campo psicanalítico? A
razão? A razão é muito simples: Quando Freud inventa a psicanalise o que ele está
descobrindo? Ele está descobrindo que os sintomas das neuroses (N.H, N.O, fobias) no final
das contas são representações simbólicas de desejos sexuais reprimidos, e por trás da neurose
existe um processo de repressão de desejos sexuais. Se ele está descobrindo isso e isso pra
aquela época foi de fato uma novidade então o que Freud fez ao constatar essa descoberta?
Ele passou a investigar isso que era objeto de repressão nas neuroses, passou a investigar a
sexualidade, o reprimido, aquilo que era objeto de repressão nos seus pacientes neuróticos.

Então que Freud vai enveredar pra entender como funciona a sexualidade humana, vai
escrever em 1905 os três ensaios sobre a teoria da sexualidade, vai descobrir que no final das
contas a sexualidade humana é originalmente perversa, Freud vai envereder pra entender o
que a gente reprime, o que está sendo reprimido na neurose. Isso que Freud vai investigar
num primeiro momento de sua obra.

Essa investigação sobre aquilo que é objeto de repressão sobre os impulsos sexuais que são
reprimidos nas neuroses, esse primeiro momento vai até por volta de 1914 que é o momento
que Freud começa a se preocupar em estudar o outro lado dessa historia? Qual o outro lado?
A parte da personalidade que reprime. Ou seja, num primeiro momento ele estuda aquilo que
é reprimido, os impulsos sexuais que são reprimidos e que por conta disso dão origem às
neuroses, é aí que Freud vai estudar fases do desenvolvimento sexual (fase oral, anal etc), vai
descobrir o complexo de édipo e várias coisas que fazem parte do universo daquilo que é
objeto de repressão. Mas aí por volta de 1914 quando Freud começa a estudar o narcisismo e
escrever artigos de metapsicologia, Freud então começa a se interessar, ele julga que é o
momento da psicanalise se voltar para a parte da personalidade responsável pela repressão, a
parte da personalidade que faz o movimento de expulsão dos impulsos sexuais, dos desejos
sexuais da consciência, e essa parte num primeiro momento vai ser chamada por Freud
simplesmente de ego (eu), Freud vai entender que o agente da repressão é o eu, isso porque?
Porque os impulsos sexuais que são reprimidos, que são objetos de repressão, porque são
reprimidos? Porque não se encaixam no ego, ego entende que esses impulsos são
incompatíveis consigo e por isso que ele expulsa. Mas quando Freud começa a estudar o ego,
como se estrutura e como se desenvolve o ego ele começa a se dar conta de que essa
realidade egóica é mais complexa do que se imaginava, ela é tão complexa talvez quanto a
dimensão da sexualidade e dos impulsos que são reprimidos.

Uma primeira constatação que Freud faz quando vai estudar o ego é a capacidade que o ego
tem de se dividir, esse é um ponto interessante e é dai que ele vai tirar o conceito de
superego, presta atenção nesse raciocínio: Você quando está pensando sobre você mesmo,
quando está avaliando um comportamento que você teve, o que está acontecendo com você
do ponto de vista metapsicologico? Você está se dividindo. O Lucas que cometeu aquele ato e
fez aquele comportamento está sendo avaliado pelo Lucas que tem esse papel julgador, esse
papel avaliador. Então quando reflito sobre minhas ações, eu reflito sobre como estou
ministrando essa aula, o que eu fiz, o que eu pensei estou me dividindo pelo menos em duas
partes: uma parte que é observada e avaliada e outra parte que avalia, julga e que observa.
Freud vai notar que essa divisão do ego que aparece nas pessoas saudáveis, neuróticas, uma
coisa natural vai se manifestar na psicose paranoica de uma maneira muito extravagante. O
que acontece na psicose paranoica? O sujeito tem a firme convicção de que ele está sendo
observado por outro, que tem alguém monitorando seus passos, alguém observando tudo o
que ele faz e não só observando mas avaliando e julgando. Freud vai olhar pra essa realidade
da psicose paranoica e vai dizer: O psicótico paranoico ao invés de se avaliar, se julgar como as
pessoas saudáveis e neuróticas fazem, ele projeta essa instancia, essa parte do ego que avalia
e julga, projeta isso pro lado de fora, então ele começa acreditar que está sendo julgado,
sendo avaliado, monitorado, observado por outra pessoa e não por si mesmo. Freud então
partindo daquele seu princípio de compreensão da psicologia humana que parte da doença
pra normalidade, Freud vai entender que isso que vemos de maneira tão radical na psicose,
essa presença de uma instancia que julga o sujeito, observa, avalia, que monitora está
presente em todas as pessoas essa divisão e nós precisamos dar um nome pra essa parte do
ego que avalia, que monitora, que observa e que julga aí então que Freud proporá o conceito
de superego. Essa tradução talvez não seja tão boa porque quando falamos de superego como
estamos muito a ideia de “super herói” usar a partícula “super” como tendo significado de algo
melhor, ou se algo superior, de algo mais potente fica parecendo que quando falamos de
superego estamos falando de um ego superior e não se trata disso. “Super” deve ser
entendido no seu sentido original de “acima de” o superego é a parte do ego que se coloca
acima do ego, porque? Se vou monitorar, avaliar uma pessoa eu tenho que me colocar em
uma posição acima da pessoa para olha-la de cima, não posso estar no mesmo patamar.

Ex: Na hora que você por exemplo fez alguma coisa, uma prova e saiu com a consciência
pesada pensando “eu acho que fui mal, sou péssimo aluno, não dei conta de fazer isso” na
hora que você faz esse movimento, o que está acontecendo com você matapsicologicamente é
o julgamento do superego sobre o ego que nesse momento está no papel de observado,
julgado e avaliado.

Como o superego se forma? Freud vai entender que a formação do superego, essa
diferenciação que acontece no ego pra dar origem a uma parte que vai julga-lo, avalia-lo vai
entender que essa formação acontece na relação com os nossos cuidadores primários. Freud
vai entender que no final das contas essa instancia julgadora, avaliadora, observadora nada
mais é do que o resultado de uma identificação da criança com os pais. O que é a
identificação? É um mecanismo de defesa que consiste em trazer para dentro de si o objeto
que está do lado de fora e trazer para dentro de si significa trazer pra dentro do seu ego,
introjetar essa objeto. Costumo dizer que podemos entender a identificação como uma
imitação inconsciente, nós podemos imitar uma pessoa conscientemente mas pode também
fazer isso inconscientemente, é um mecanismo da identificação, pego aqueles objetos que
estão do lado de fora e trago esse objetos pra dentro de mim por meio de uma introjeção,
identificação então passo a tomar aquilo que é importante para outro como sendo importante
pra mim mesmo. É exatamente isso que a criança faz.

Em primeiro lugar ela faz isso porque a criança está em uma condição de vulnerabilidade em
relação aos pais, o ego da criança é muito frágil, extremamente frágil então aquilo que os pais
colocarem sobre ela tenderá ser parte dela no futuro. Como ela não tem ainda um ego
suficientemente forte pra criticar, questionar aquilo que os pais colocam então a tendência da
criança vai ser internalizar aquilo que os pais colocam pra ela, sobretudo porque a criança ama
e admira seus pais. Por conta dessa admiração, anseio de se tornar como os pais a criança trás
os pais para dentro de si e consequentemente ela vai se tornando semelhante a eles. Mas aí
entra um detalhe importante que Freud menciona sobre o superego.

Ele diz num determinado momento que na verdade na formação do superego o que está em
jogo não é uma identificação exatamente com os pais mas com o superego dos pais. Freud vai
dizer que o superego e basicamente formado por resíduos verbais, ou seja, por aquilo que ela
escuta dos pais, pelas palavras que os pais dizem pra ela e aquilo que os pais dizem pra criança
“isso pode” “isso não pode” “você tem que ser assim” eles dizem baseados nos seus próprios
ideais, os pais passam seus ideais para as crianças por meio de sua fala, e a criança também
incorpora ideais por meio daquilo que os pais falam, lê e vai ouvindo ao longo da vida. Então
na formação do superego entra mais em jogo aquilo que os pais falam do que como o modo
que os pais se comportam. Isso não significa que o modo como os pais se comportam seja
irrelevante, que os pais não funcionam como exemplos pra criança, funcionam sim, isso vai ter
um papel na formação do ego da criança mas na formação do superego o papel mais
preponderante não é como os pais se comportam mas aquilo que os pais dizem, aquilo que
depois os professores dizem, as pessoas a quem a criança/adolescente/adulto dá autoridade,
são esses resíduos verbais que vão constituir no final das contas o superego. O Freud chega até
a se perguntar se no final das contas o superego não é constituído de frases, proibições que a
criança ouviu e vai ouvindo ao longo da vida?

Em primeiro lugar podemos entender que o superego vai ser formado em função de um
identificação primária da criança com os pais, os pais são seres admirados, os pais são seres
amados e isso por si só já é suficiente pra criança internalizar aquilo que vem dos pais mas
Freud vai dizer outra coisa: Ele vai dizer que o superego é herdeiro do complexo de édipo. Isso
significa portanto: vamos pensar na metáfora da “herança”: se meu pai é dono de uma
empresa e eu herdo essa empresa do meu pai e então essa empresa vai sobreviver agora sob
meu comando. Então a herança permite uma sobrevivência daquilo que foi deixado como
herança, então se Freud está dizendo que o superego é herdeiro complexo de édipo isso
significa que o superego é então um representante do complexo de édipo na cabeça da
criança. A criança passa pela situação edipiana, ela domina ou não a situação edipiana, e se
forma dentro dela o superego que além de ser fruto de uma identificação primária com os
pais, vai ser também o representante do complexo de édipo. Mas como assim? Vamos pensar
como Freud caracteriza o complexo de édipo:

Para Freud o que está em jogo no complexo de édipo são desejos incestuosos e desejos
parrecidas e matricidas (matar). O que está em jogo são desejos da criança de gozar
sexualmente com seus pais como também desejo de afastar, tirar de campo os seus pais. São
esses desejos que são desejos antissociais e não podem ser sustentados na civilização e
socialmente, não há como conceber uma sociedade em que o incesto é permitido, em que o
assassinato dos pais é permitido, então são esses desejos antissociais que estão em jogo no
complexo de édipo, e dominar o complexo de édipo do ponto de vista de Freud significa abrir
mão desses desejos, abrir mão do desejo de gozar sexualmente os pais e de afastar os pais
como rivais. Dominar o complexo de édipo significa abandonar esses desejos.

Dai a criança abandonando esses desejos ela não vai renunciar a troco de nada, Freud sempre
diz que se a gente renuncia a uma determinada satisfação a gente só faz isso em função de
uma troca.
Então a criança vai abandonar essa satisfação sexual e os seus desejos hostis e agressivos em
relação aos pais em troca de trazer os pais para dentro de si. É isso, a criança vai abandonar
esse investimento nos pais como um investimento objetal, vai aceitar renunciar aos pais como
objetos, como objetos sexuais e como objetos para satisfação dos seus impulsos agressivos, vai
renunciar os pais como objetos em troca de trazer os pais para dentro de si, então essa
processo de domínio de complexo de édipo e vai reforçar as identificações primárias que a
criança já fez com os pais, então se ela já havia trazido um pouco dos pais para dentro de si por
admira-los e ama-los agora ela vai trazer ainda mais os pais para dentro de si, ela vai trazer
ainda mais em função do abandona do complexo de édipo. Por isso Freud diz que o superego é
herdeiro do complexo de édipo, pois no final das contas na formação do superego entra em
jogo uma troca, aceito abandonar meus pais como objetos mas em troca quero esses pais
dentro de mim e assim então a criança passa a conviver com essa instancia que é uma parte de
seu ego, Freud vai entender que o ego no final das contas é constituído basicamente por
identificações, então você olha pra você mesmo e se percebe como uma pessoa especifico,
diferente das outras, singular mas se eu nada mais é uma mistura de uma série de
identificações que fez ao logo da vida com tios, irmãos, pai, mãe e essas identificações com pai
e mãe que são as primeiras e mais importantes ganham um lugar a parte dentro da
personalidade de tal maneira que em função desse lugar a parte elas ganham statuos de
domínio, statuos superior e por isso vão constituir o superego.

Então o que vai acontecer: a criança que em um primeiro momento era controlada, vigiada,
observada por seus pais (ela ainda não tinha autocontrole e autoregulação, quem exercia esse
papel de controle e dizer pra criança que isso pode e isso não pode, você precisa ser assim e
assado são os pais), agora com a formação do superego (internalização das falas dos pais,
internalização das proibições) ao internalizar isso a criança já não precisa desse controle
externo. Claro que isso não significa que a criança está independete dos pais, mas agora ela
trouxe os pais pra dentro de si, então ela vai passar a monitorar o próprio comportamento, a
regular o próprio comportamento, a se observar e esse processo vai continuar ao longo da
vida. O superego que é formado a partir dos pais vai receber acréscimos de professores, de
outras pessoas que vão exercer junto a criança esse papel de autoridade, a criança vai
introjetando essas falas das outras pessoas também no seu superego.

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