Você está na página 1de 7

Nº 1.0000.23.

231435-1/001
AGRAVO DE INSTRUMENTO-CV 21ª CÂMARA CÍVEL ESPECIALIZADA
Nº 1.0000.23.231435-1/001 BELO HORIZONTE
AGRAVANTE(S) BANCO DO BRASIL S/A
AGRAVADO(A)(S) ART VIAGENS E TURISMO LTDA EPP
AGRAVADO(A)(S) NOVUM INVESTIMENTOS
PARTICIPACOES S/A
AGRAVADO(A)(S) 123 VIAGENS E TURISMO LTDA.
INTERESSADO(A)S PAOLI BALBINO & BARROS
SOCIEDADE DE ADVOGADOS
ATRIBUIÇÃO DA PARTE EM BRANCO
ADMINISTRADOR JUDICIAL
INTERESSADO(A)S BRIZOLA E JAPUR ATRIBUIÇÃO DA
PARTE EM BRANCO
ADMINISTRADOR JUDICIAL

DECISÃO

Vistos.
Trata-se de agravo de instrumento interposto pelo Banco do
Brasil S/A em face da decisão proferida pelo Juízo da 1ª Vara
Empresarial da Comarca de Belo Horizonte/MG, que deferiu o
processamento da recuperação judicial das empresas 123 Viagens e
Turismo Ltda., Art Viagens e Turismo Ltda. e Novum Investimentos
Participações S/A.
Primeiramente, o agravante destaca que as recuperandas não
instruíram a petição inicial com a totalidade dos documentos exigidos
no art. 51 da LRF para viabilizar o processamento da RJ, bem como
não apresentaram a lista de credores juntamente com a inicial.
Em relação aos documentos efetivamente apresentados, alega
que não foram observadas às prescrições legais aplicáveis, que
asseguram aos credores, stakeholders, Ministério Público e demais
interessados na RJ o conhecimento necessário e suficiente das
informações gerenciais, econômicas e financeiras da empresa,

Fl. 1/7
Nº 1.0000.23.231435-1/001
indispensáveis ao adequado exercício dos direitos que lhes competem
para defesa dos seus direitos e interesses no feito.
Subsidiariamente, defende a imprescindibilidade da realização
de constatação prévia, em razão da gravidade das circunstâncias do
caso concreto, da necessidade de análise da possibilidade de
preservação da empresa e o uso fraudulento ou abuso de direito.
Ainda como pedido subsidiário, e cumulativamente ao pleito de
realização de constatação prévia, informa que existem ilegalidades
inerentes à nomeação dos AJ’s, vez que se trata de recuperação
judicial com repercussão midiática, a análise de habilitações e
divergências de centenas de milhares de credores, a confecção de
tamanho quadro geral de credores, o levantamento do real ativo e
passivo das empresas devedoras, dentre as demais atribuições
elencadas na lei, que demandam a designação de administrador
judicial com maior estrutura, experiência e expertise.
Destaca que a padronização para fixação da remuneração dos
AJ’s adotada pelo Juízo singular não detém qualquer lastro legal e
contraria as orientações divulgadas pelo CNJ na Recomendação CNJ
nº 141/2023. Acrescenta que o percentual arbitrado incidente sobre o
passivo declarado resultará em quantia extremamente vultosa,
excessiva e incompatível com a prática judicial e o mercado.
Requer a concessão do efeito suspensivo ao presente agravo
de instrumento, para, imediatamente, sustar os efeitos da decisão
recorrida, com suspensão dos efeitos do deferimento do
processamento da RJ, determinação da constatação prévia,
destituição dos administradores judiciais, com concomitante nomeação
de novos auxiliares do Juízo, arbitrada remuneração nos moldes da
Recomendação CNJ nº 141/2023.

Fl. 2/7
Nº 1.0000.23.231435-1/001
Ao final, pede o provimento ao presente recurso para revogar a
decisão recorrida e declarar a insuficiência e imprestabilidade dos
documentos juntados pelas Recuperandas, e, por isso, indeferir a
petição inicial, com fundamento no art. 485, I e VI, do CPC;
Subsidiariamente, requer seja reformada a decisão para (i)
determinar a realização de constatação prévia, (ii) destituir os AJ’s
nomeados na decisão agravada, nomeando em seu lugar quaisquer
das maiores empresas atuantes no mesmo ramo de mercado,
detentoras de maior experiência e estrutura; e (iii) reduzir os
honorários fixados para remuneração dos AJ’s a patamares
compatíveis com os majoritariamente praticados no mercado e demais
casos de processos de recuperação judicial da espécie.
As recuperandas peticionaram (evento 3602), requerendo o
indeferimento do pedido de concessão dos efeitos suspensivo e ativo.
É o relatório.
A despeito das judiciosas considerações em sentido contrário,
em um exame de cognição sumária realizado no agravo de instrumento
n° 1.0000.23.225196-7/000, conclui pela necessidade de realização de
constatação prévia no presente caso, confira-se:

Em que pese sua judiciosa fundamentação, e


considerando este momento processual de cognição
sumária, julgo necessária a determinação de
constatação prévia.
De pronto, ressalto que a determinação a quo para
que os auxiliares do juízo apresentem um laudo de
averiguação aprofundado da situação das empresas
não encontra amparo na lei.
Ademais, a existência de dúvida quanto à viabilidade
do pedido recuperacional, que inclusive foi
devidamente apontada em primeiro grau, recomenda
justamente a realização da citada constatação,
consoante disposto no art. 51-A da Lei n° 11.101/05:

Fl. 3/7
Nº 1.0000.23.231435-1/001

Art. 51-A. Após a distribuição do pedido de recuperação


judicial, poderá o juiz, quando reputar necessário, nomear
profissional de sua confiança, com capacidade técnica e
idoneidade, para promover a constatação exclusivamente
das reais condições de funcionamento da requerente e da
regularidade e da completude da documentação
apresentada com a petição inicial.

Diante desse quadro, faz-se necessária a nomeação


de perito técnico de confiança deste Juízo, para a
constatação exclusivamente das reais condições de
funcionamento da agravada, da regularidade e da
completude da documentação apresentada com a
petição inicial, ou seja, se a empresa agravada atende
aos requisitos para o pedido de recuperação judicial,
se seria o caso de recuperação judicial ou de falência.

A descomunal extensão do caso - a inicial noticia uma média de


cinco milhões de clientes por ano e movimentação financeira de mais
de cinco bilhões de reais em 2022, tendo por outro lado mais de
700.000 (setecentos mil) credores, que depositaram nas empresas
agravadas seus sonhos de viagem -, bem como o fato de as pretensas
recuperandas serem empresas de tecnologia, exigem, conforme bem
apontado pelo juízo a quo:

...um acompanhamento diferenciado, atento e


diligente de experts da informática para preservação
de dados e informações que são valiosos nas
transações que utilizam Inteligência Artificial,
algoritmos e indução de comportamentos baseados
em dados inseridos no sistema. O rastreamento
dessas informações e os modelos de publicidade e os
volumes de movimentações
financeiras precisam ser analisados em conjunto com
a contabilidade tradicional. O valor deste ativo não
pode ser mensurado pelos métodos tradicionais. A
fluidez dos algoritmos na internet, com mineração e
garimpo para encontrar rapidamente a transação
desejada impõe celeridade e intervenções
diferenciadas de bloqueios de bens físicos.

Fl. 4/7
Nº 1.0000.23.231435-1/001
Apesar das recuperandas afirmarem sua viabilidade e
possibilidade de recuperação, sua oferta de produtos,
em padrões muito distintos dos valores praticados no
mercado, merecem análise dos riscos altos
envolvidos. Necessária uma análise mais acurada das
suas transações. Além disso, o produto oferecido no
mercado difere da compra e venda de bens. Na
sociedade de consumo, viagens, férias, passeios,
hospedagens turísticas insere-se no plano dos sonhos
e da realização de desejos. A frustração dessa
expectativa é indelével.

Diante desse quadro, conforme destacado anteriormente,


impõe-se a realização de constatação prévia para que sejam apuradas
as reais condições de funcionamento da agravada, da regularidade e
da completude da documentação apresentada.
Neste particular, acrescento que os questionamentos
apresentados pelo agravante quanto a regularidade da documentação
apresentada, em especial aqueles referentes ao artigo 51, incisos II e
III, serão devidamente explorados na citada perícia, que atestará a
necessária confiança para o possível processamento da recuperação
judicial.
A meu ver, afigura-se essencial a análise por profissionais
técnicos acerca das reais condições de funcionamento das empresas e
da regularidade e da completude da documentação apresentadas com
a peça vestibular, para posterior deferimento ou não do processamento
da recuperação judicial.
Para que não haja dúvidas, aponto que está suspensa a
recuperação judicial, assim como a designação dos administradores
judiciais até que sobrevenha o resultado da constatação previa
anteriormente determinada.

Fl. 5/7
Nº 1.0000.23.231435-1/001
Nada obstante, considerando que o ativo declarado de uma das
empresas gira em torno de R$27.000.000,00 (vinte e sete milhões de
reais), enquanto o passivo declarado é de aproximadamente
R$1.600.000.000,00 (um bilhão e seiscentos milhões de reais),
afigura-se necessária a manutenção do período de blindagem (stay
period), sejam das ações ordinárias ou execução dos eventuais
credores da recuperação judicial, nos exatos termos da decisão
singular:

Ressalvadas as ações previstas pelo artigo 6º, §§ 1º,


2º e 7º e pelo artigo 49, §§ 3º e 4º, da Lei n°
11.101/2005, ordeno a suspensão, pelo prazo de
180 (cento e oitenta) dias, contados da publicação
da presente decisão, de todas as ações e
execuções contra a sociedade devedora, cabendo
às recuperandas e outros meios de comunicação
institucional entre tribunais comunicá-la aos Juízos
competentes.

Tal providência advém do perigo de dano irremediável à parte


agravada, na medida em que poderá restar inviabilizado o resultado
útil do processo de recuperação judicial que tramita na origem, caso o
resultado da perícia prévia seja pelo seu deferimento.
Ora, enquanto perdurar a realização da constatação prévia,
tem-se que as requerentes estarão expostas a verdadeira corrida dos
milhares de credores para a satisfação individual de seus créditos, o
que evidentemente impactará a possível recuperação judicial.
À luz do exposto, DEFIRO em parte o pedido urgente,
confirmando a suspensão provisória da recuperação judicial até que
sobrevenha o resultado da constatação previa anteriormente

Fl. 6/7
Nº 1.0000.23.231435-1/001
determinada. Nada obstante, fica mantido o período de blindagem
concedido pelo juízo singular.
Quanto ao pedido do agravante de destituição dos
administradores judiciais designados pelo juízo singular, em virtude de
suposta incapacitação técnica para a realização do trabalho, como
está suspenso provisoriamente o processamento da recuperação
judicial e também, por consequência logica, a designação dos
administradores judiciais, tal pleito não será examinado neste
momento, mas sim quando sobrevier o resultado da constatação
prévia, caso positivo em relação a plausibilidade da recuperação
judicial.
Em face da manifestação contida no paragrafo imediatamente
anterior, fica também postergada a análise do pleito referente a
redução dos honorários dos administradores judiciais.
Intime-se a parte agravada para, no prazo de 15 (quinze) dias,
apresentar contraminuta, nos termos do art. 1.019, II, do CPC.
Após, vista à Procuradoria-Geral de Justiça.
Belo Horizonte, 19 de setembro de 2023.

DES. ALEXANDRE VICTOR DE CARVALHO


Relator

Fl. 7/7

Você também pode gostar