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UNIVERSIDADE FEDERAL DO ACRE-UFAC

CENTRO DE EDUCAÇÃO E LETRAS-CEL


LICENCIATURA EM LETRAS ESPANHOL

Fernanda Silva de Freitas


Pâmela Araujo Inácio

Análise Literária Comparatista


Análise das obras literárias “Os Lusíadas e Auto da Barca do Inferno”

Trabalho da disciplina:

Panorama das Literaturas Lusófonas

Prof. Me. Carlisson Morais de Oliveira

Cruzeiro do Sul-Acre
Outubro de 2022
Análise Literária Comparatista
Análise das obras literárias “Os Lusíadas e Auto da Barca do Inferno”

Resumo

Este estudo tem por objetivo analisar a forma como o Cristianismo é retratado
dentro das obras "O auto da barca " do autor Gil Vicente e "Os Lusíadas” que foi
escrito pelo autor Luís de Camões.
Neste trabalho vamos analisar a hipótese de que a obra do autor Gil Vicente, tem
um papel social, ou seja tem uma função pedagógica, onde o autor utilizar o
Cristianismo para poder realizar críticas aos costumes e hábitos da sociedade de
sua época de uma forma sátira nesta peça a moralidade e a religião andam de
mãos dadas.
Tratando-se da obra "Os Lusíadas," a hipótese que foi levantada durante a leitura
da obra , é que assim como Gil Vicente faz uso do Cristianismo, o escritor Camões
também faz menção ao mesmo, mais ao contrário do que acontece no Auto da
barca, a obra "Os Lusíadas" já se apropriar do Cristianismo para usá-lo como
justificativa para a expansão marítima, onde segundo o escritor o único objetivo da
viagem do Vasco da Gama era levar o Cristianismo adiante, até os lugares mais
distantes da terra , para que dessa forma a fé da igreja católica fosse disseminada
pelo mundo , no entanto nós sabemos que esse não era o real objetivo da expansão
marítima, onde entre os objetivos que levaram ao processo de expansão marítima
podemos destacar a busca por novas fontes de riquezas , especiarias, e
principalmente expandir os domínios europeus, e nesta obra é possível perceber
que o Cristianismo é utilizado para disfarçar todos esses fatores primordiais do
processo de expansão marítima.

Palavra Chaves: Auto da Barca. Moralidade. Satírica. Os Lusíadas. Cristianismo.


Justificativa.
1. Introdução

As obras selecionadas para compor este trabalho fazem parte do contexto histórico
do século XVI, onde os escritores eram fortemente influenciados pela cultura da
Antiguidade greco-latina. O Renascimento faz parte deste contexto, que marca o
final da chamada Idade Média, este século é considerado por muitos como o
período em que as civilizações ocidentais tiveram um grande avanço, e evoluíram,
foi a partir deste século que muita coisa começou a mudar.
Durante a Idade Média a igreja católica exercia seu domínio sobre as pessoas, no
entanto no século XVI, ocorreu a primeira reforma religiosa, que acarretou na
quebra do monopólio que a Igreja exercia sobre a sociedade na Europa.
A obra Os Lusíadas, foi escrita pelo autor Camões na época das grandes
navegações, mais ou menos entre o final do século XV e o começo do século XVI,
para registrar os grandes feitos dos portugueses durante o período de expansão
marítima, durante este período Portugal vivia uma época de grandes conquistas, era
considerado uma nação independente, e economicamente próspera. Nessa época,
a história se passa também dentro de uma sociedade que estava começando a se
concretizar por ideias teocêntricas (Deus no centro de tudo), mas ainda havia uma
grande influência do pensamento antropocêntrico (Homem no centro de todas as
coisas), no mesmo período o Humanismo tenta ir além e recoloca o Homem como
centro de tudo, mas não querendo menosprezar/rebaixar o “Deus” e sim apenas
para dar valor ao Homem.
As rotas comerciais marítimas mais cobiçadas foram abertas durante este século
pelos espanhóis e os portugueses com suas grandes caravelas.
Durante o reinado de D. João III, no ano de 1580, dois anos após D. Sebastião
falecer, Portugal passou a ficar sobre o domínio dos Espanhóis, foi neste contexto
que Gil Vicente criou a peça O auto da barca do inferno, onde os personagens
representam a sociedade do século XVI, neste contexto a literatura tinha
características de um movimento chamado Humanismo, este movimento era
bastante forte até o surgimento do Renascimento em Portugal.
A obra de Gil faz parte da Idade Média, onde os teatros medievais eram “sacro” e
profano. Os teatros medievais estavam sempre ligados á igreja , este tipo de peça
eram divididos em três modalidade: os milagres, os misteriosos e as moralidades ,
durante todo o século X a igreja valorizava muito passagem bíblica, é pregava o
moralismo , e a peça O Auto da Barca do inferno, tem esta característica moralista
pois apresenta forte críticas as pessoas que não seguem os padrões da igreja
católica, essa peça trata de um assunto bastante enfatizado pela igreja que é o
juízo final , Gil critica de forma satírica a sociedade de sua época.

2. Análise das obras


‘’AUTO DA BARCA DO INFERNO’’

A Obra "O AUTO DA BARCA DO INFERNO'' é mais uma das obras escritas pelo
dramaturgo português Gil Vicente, esta obra faz parte do teatro medieval. No
contexto em que esta obra foi escrita, a Igreja católica exercia um importante papel
na sociedade, a mesma era tida como exemplo de justiça e moralidade, no entanto
por meio desta história o autor critica os representantes da Igreja, no entanto ele
preserva a instituição em si.
Assim como em suas demais obras, esta peça está marcada pela presença de
traços religiosos, sabendo disso faremos uma análise sobre como o cristianismo é
retratado dentro desta obra.
Nesta peça ,o Cristianismo é visto de uma forma positiva , pois todo este texto
trata da busca ao paraíso, onde para entrar na barca do anjo que é um
personagem que faz parte do Cristianismo , é necessário que as pessoas deixem de
supervalorizar as coisas materiais , que sejam pessoas boas sem luxúria sem
arrogância e etc.
É possível destacar que nesta obra o cristianismo tem uma função pedagógica
social, e que a moralidade e a religião andam de mãos dadas, na tentativa de
conscientizar a sociedade acerca do juízo final, que é pregada pela igreja católica.
O autor utiliza o cristianismo para poder criticar cada camada da sociedade, por isso
ele trata seus personagens por tipos e não lhes dá nomes, mediante essa
informação é possível notar que a Coroa portuguesa não é alvo das críticas desta
peça.
O autor Gil Vicente, utilizou está peças para tentar mesmo que de uma forma
sátira conscientizar o ser humano a cera dos valores cristão e que as pessoas
deveriam preocupassem com a forma que vivem suas vidas na terra já que
segundo os valores do cristianismo só vai para o céu as pessoas que fizerem o bem
durante suas vidas terrenas.
Esta obra foi escrita para a rainha que era católica acreditava em todos os valores
e princípios do cristianismo , a peça retrata assim como a igreja católica que existem
dois caminhos o paraíso e o inferno, dentro da obra existem duas barcas que
representam esses dois caminhos , onde cada uma dessas barcas possuem um
capitão que está a espera das pessoas que viram .
O responsável pela barca do paraíso é um anjo, enquanto que o responsável pela
barca do inferno é o próprio Diabo, cada um está esperando pelas almas que
entraram em suas barcas.

“[...] chegamos subitamente a um rio, o qual per força havemos de


passar em um de dous batéis que naquele porto estão, scilicet, um
deles passa pera o paraíso e o outro pera o inferno: os quais batéis
tem cada um seu arrais na proa: o do paraíso um anjo, e o do inferno
um arrais infernal e um companheiro". (VICENTE, 3)

Um dos personagens que é condenado a embarcar na barca que leva ao inferno


é o Fidalgo, um homem que não se sabe se era rico ou não, mais como possuía
título de aristocrata , acredita que era superior às outras pessoas e por isso merecia
ir para a barca do Anjo, e queria ir para o paraíso porque ele acreditava ser alguém
importante, no entanto foi condenado a ir para o inferno por conta de seus pecados
pecados, tirania e luxúria.
No trecho a seguir o Fidalgo não aceita que tendo ele um título tão importante
quando estava vivo, ele não consiga embarcar na barca do anjo e quando o Diabo
lhe diz que o seu lugar será na barca que leva ao inferno ele fica surpreso e quer
saber porque, e o Diabo deixa claro para ele que foi a forma como ele viveu a vida
dele que o levou até aquela barca.

“Diabo: Já que da morte passaste, tens que passar ora o rio.


FIDALGO: Mas não há outro navio?
Diabo: Não, senhor, porque fretaste este aqui quando
expiraste e já me deste o sinal.
FIDALGO: Como assim? Quando foi tal?
Diabo: Quando na vida gozaste. ( VICENTE, p.9).”
Acerca destas pessoas como o Fidalgo a Igreja prega que essas pessoas não
podem ir para o céu pois não fizeram nada que seja bom aos olhos Deus, pelo
contrário se sentem superiores às outras pessoas, não procuravam viver de acordo
com o que é pregado pelos valores cristão.
No decorrer da história a grande maioria dos personagens são condenados por
seus pecados , a embarcarem na barca do Diabo , entretanto sabemos que o
Cristianismo é a religião fundada por Jesus Cristo, e seus princípios são moralistas,
levando em consideração isso não é estranho que o personagem chamado por Gil
Vicente de Parvo tenha embarcado na barca do anjo , já que ele era tolo e ingênuo,
diferente dos outros personagens que enganaram, mentiram , roubaram, e
pregavam um falso moralismo.
Por fim representando com mais vigor o Cristianismo dentro desta obra temos os
personagens retratados como cavaleiros, que são os homens que lutavam nas
cruzadas que era batalhas realizadas a mando da igreja, os cavalos carregavam
alguns símbolos do Cristianismo como as armas e uma cruz, os cavaleiros
representam as pessoas que morreram por Cristo que são as que merecem ir para
o paraíso.
Na citação a seguir é possível compreender que os cavaleiros era bem vistos por
Deus, afinal o anjo já estava esperando por eles, o anjo revela que por terem
perdido suas vidas em batalhas lutando em favor de Cristo, eles terão seus pecados
perdoados.

"ANJO: Ó cavaleiros de Deus! a vós estou esperando, que morrestes


pelejando por Cristo, Senhor dos céus, sois livres de todo mal, santos
por certo sem falha que quem morre em tal batalha merece paz
eternal". ( VICENTE p.107).

Os cavaleiros morreram por Cristo e foram para o céu enquanto que as outras
pessoas que faziam o mal , eram arrogantes, mentirosas, entre outras coisas,
foram para o inferno , isso é o puro fundamento do Cristianismo, e com este fato o
autor deixa claro que o Cristianismo é utilizado como um forte apelo moral nesta
obra, como uma forma de tentar conscientizar as pessoas que seus atos em vida é
que vai decidir para onde cada alma vai seguir no dia do juízo final.
A sociedade, que estava sendo tão criticada nesta peça, infelizmente riam de toda a
história sem se reconhecerem dentro da obra ou não se davam conta que toda a
peça na verdade se tratava de críticas ao modo de vida deles e desta forma eram
entretidos com seus próprios erros pois não conseguiam se reconhecerem dentro
da obra.

“Os Lusíadas"

Os Lusíadas, de Camões, é uma epopeia que retrata as viagens dos


portugueses, suas conquistas marítimas, a construção de um novo mundo sendo
guiado pela ajuda do divino, Deus, na obra a uma grande influência da fé cristã. Em
toda a narrativa os navegantes cultuam suas crenças divinas, mesmo as vezes
sendo consideradas de formas indiretas, além disso, o cristianismo dentro da
epopeia diferente do “Auto da barca do Inferno”, é colocado como um oriente
religioso, Deus seria o orientador dentro do discurso, aquele que os guiaram ao
novo mundo, o ser ao qual todos depositavam suas forças. Lembrando também que
além de Deus, a presença de deuses mitológicos, eles sendo considerados pagãos,
afirmando então os aspectos entre a mitologia profana e mitologia judaico-cristã.
É possível observar em primeira instância, que os portugueses na obra estavam
buscando enfatizar seus feitos heroicos, conquistas e também a forma como o ser
humano dominava sobre a natureza, eles tinham de início uma visão
antropocêntrica (o homem no centro de tudo), isso no período de grande opulência
até o século XVI, o mesmo período em que a fé cristã estava ganhando grande
influência. Em contraposição destaca-se a questão do que pode ser chamado de
ecletismo religioso, sendo então a justaposição de argumentos acerca de doutrinas
diversas, ou seja, a divisão do pensamento antropocêntrico e teocêntrico ( Deus
acima de tudo).
Ao início da obra e da navegação de Vasco Da Gama, começa com um concílio
dos deuses, onde eles se juntam para discutir o futuro do Oriente. Na estrofe
abaixo, a palavra “concílio” apresenta o cristianismo através dela, caracterizando-se
como “reunião de prelados católicos", dessa forma o cristianismo está presente de
forma indireta e a partir do uso de pseudônimos.
“Quando os deuses do Olimpo luminoso
Onde o governo está da humana gente
Se juntaram em concílio glorioso
Sobre as cousas futuras do Oriente
Pisando o cristalino céu fermoso(...)
(Canto I-estrofe 20)

Partindo então para o Canto III, o príncipe fundador de Portugal consegue


acabar com cinco dos reis mouros durante a batalha de Ourique, isso depois que
ele viu a imagem de Cristo em meio a luta.

“A matutina luz, serena e fria,


As Estrelas do Polo já apartava
Quando na cruz o Filho de Maria
Amostrando-se a Afonso, o animava
Ele, adorando Quem lhe aparecia
Na Fé todo inflamado, assim gritava
— ‘Aos Infiéis, Senhor, aos Infiéis
E não a mim, que creio o que podeis!
(Canto III-estrofe 45)

O “filho de Maria”, seria então Jesus Cristo, relacionando-se com a fé do príncipe


de Portugal, Cristo foi precursor de uma batalha vitoriosa aos portugueses, é
perceptível a presença da força divina sobre a luta entre os lusos e os mouros.
Então, a viagem expansionista dos portugueses é posta como sendo definida em
espiritual e universal, assim, o caráter espiritual está devidamente interligado com o
cristianismo, já que a fé comprova o manifesto espiritual dos lusos. Exemplo é a
citação da segunda estrofe do Canto I, na mesma a palavra “fé” muda totalmente o
significado de "império", tornando-o referência do Império de Cristo.

“E também as memórias gloriosas


Daqueles Reis que foram dilatando
A fé, o Império e as Terras víciosas
De África e Ásia andaram
devastadas.”

Contudo, na questão universal, os lusos portugueses ganharam o título de


universal por conta de seus grandes feitos heroicos, são considerados como o povo
de Deus dentro da narrativa, mostrando assim que eles foram os escolhidos por
Deus devido a constância humildade e a exaltação da fé.
No entanto, o cristianismo dentro de “Os Lusíadas” é de caráter justificativo e a
presença de Deus e dos deuses, é usada apenas como pressuposto para o
fortalecimento do fim do pensamento antropocêntrico do século XVI, levando em
consideração que os portugueses eram um povo que exaltavam a fé cristã os deus-
mitológico são utilizados nesta obra apenas como um recurso literário.
Os portugueses, diferente dos Holandês por exemplo, eles queriam conquistar
novas rotas marítimas, mas também tinha o objetivo de expandir o Cristianismo,
pois desta forma seria mais fácil manter o domínio das novas terras que fossem
encontrando em suas viagens.
3. Biografia dos autores das obras

Biografia do autor Gil Vicente

Gil Vicente nasceu em Portugal, em Guimarães, no ano de 1465 e possivelmente


morreu em 1536, em Évora, Portugal , é considerado o "Criador do Teatro
Português."

Biografia do autor Luís Vaz de Camões

Luís de Camões nasceu em 1524 e faleceu em 1580, era um poeta português.


Autor do poema Os Lusíadas.

4. Conclusão:

A Partir da análise comparatista das Obras “Os Lusíadas” e o “Auto da Barca do


Inferno”, é possível destacar que a Religião é algo muito importante desde os
tempos antigos o Cristianismo já exercia forte influência sobre as pessoas.
Com tudo devemos enfatizar que a forma como cada obra se refere ao
Cristianismo e seus valores , mesmo estando inseridas em contextos históricos
sociais parecidos é totalmente diferente, enquanto para Camões o Cristianismo é
visto como algo que ele utilizou para justificar a viagem dos portugueses, e todos as
coisas que eles destruíram pelo caminho , dando assim nesta obra uma função
política para o Cristianismo, Gil já traz em sua obra o Cristianismo como algo
pedagógico que pode ser utilizado para educar a sociedade de uma forma moralista
para que mudem seus comportamentos e possam a vim a serem salvos no dia do
juízo final, tal como prega os valores e princípios do Cristianismo.
Por fim são obras de contextos históricos parecidos, mas que são bastante
diferentes, os autores apresentam formas diferentes para se expressarem e
contextualizar suas respectivas sociedades.
Referências:

https://www.ebiografia.com/gil_vicente/

https://www.ebiografia.com/luis_camoes/

CAMÕES, Luís de. Os Lusíadas. Introdução e notas de Alexei Bueno. 3 ed., rev. e
atual. Rio de Janeiro: Nova
Fronteira, 2018.

VICENTE, Gil. Auto da Barca do Inferno. Tradução para o português moderno Ivo
Barroso. São Paulo: SESI-
SP Editora, 2014.

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