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SUMÁRIO
➢ Semiologia renal
O diagnóstico de uma enfermidade do aparelho urinário depende dos dados
subjetivos fornecidos pelo paciente, da história clínica e dos dados objetivos
obtidos por meio do exame físico e de testes laboratoriais.
Durante a anamnese, as queixas mais frequentes envolvem as alterações na
micção, no volume urinário e na cor da urina. Uma pessoa saudável urina a cada
4 a 6 h durante o dia e, normalmente, não o faz à noite, sendo que o volume
urinário diário varia entre 700 e 2.000 mℓ e a cor da urina pode variar desde o
amarelo-claro, quando diluída, até o amarelo-escuro, quando concentrada.
Dessa forma, as principais alterações são:
• Polaciúria: aumento da frequência miccional, com eliminação de pequenos
volumes de urina. Trata-se de um sintoma de irritação vesical.
• Urgência miccional: sensação de necessidade impreterível de urinar.
• Disúria: dor, ardência ou desconforto à micção.
• Nictúria: inversão do ritmo miccional, em que a diurese predomina no
período noturno. Normalmente, o indivíduo não acorda à noite para urinar,
em virtude de uma queda no ritmo de formação da urina.
• Incontinência urinária: perda involuntária de urina, que pode ocorrer após
esforços (evacuação, tosse, levantar peso).
• Retenção urinária: resulta da incapacidade de esvaziar a bexiga, mesmo
quando da produção de urina pelos rins normal.
• Oligúria: volume urinário igual ou inferior a 400 mℓ/dia.
• Poliúria: volume urinário igual ou superior a 2.500 mℓ/dia.
• Anúria: volume urinário igual ou inferior a 100 mℓ/dia.
Além disso, outras queixas frequentes são dor renal (situa-se no flanco ou na
região lombar com irradiação anterior), edema, febre e alterações na creatinina.
É importante reconhecer alguns fatores de risco cardiovascular e renal, como
doença cardiovascular familiar (homens < 55 anos e mulheres < 65 anos),
hipertensão, diabetes mellitus, resistência insulínica aumentada, obesidade,
apneia do sono e rins policísticos (doença autossômica dominante).
É válido questionar o uso de medicações, especialmente os anti-inflamatórios
não esteroides, inibidor de bomba de prótons, antibióticos, alopurinol, anti-
hipertensivos, antidiabéticos (metformina e iSGLT2), contraste iodado, derivados
do gadolínio, defensivos agrícolas e drogas recreativas.
➢ Creatinina
A creatinina é um produto residual da creatina. A transformação de creatina
em creatinina acontece no tecido muscular, no qual 1 a 2% da creatina livre se
converte espontânea e irreversivelmente em creatinina todos os dias. Logo, a
quantidade de creatinina produzida é dependente da massa muscular e não
apresenta grandes variações diárias.
A creatinina é filtrada livremente no glomérulo. Ao contrário da ureia, a
creatinina é ativamente secretada em uma pequena parcela, mas o suficiente
para superestimar a TFG. A quantidade secretada não é constante e depende
do indivíduo e da concentração plasmática desse analito, dificultando
sobremaneira a determinação de uma constante de secreção. Em termos gerais,
7 a 10% da creatinina presente na urina é secretada.
➢ Ureia
A ureia é o produto final do metabolismo nitrogenado, cuja concentração
plasmática depende de muitos fatores que afetam o metabolismo do nitrogênio,
dependente principalmente da dieta (ingesta calórica e proteica). Desse
modo, ao contrário da creatinina, a concentração plasmática de ureia pode variar
muito, sem que haja alteração do clearance da ureia.
A principal utilidade clínica da ureia parece estar na determinação em
conjunto com a creatinina. A razão ureia sérica/creatinina sérica pode indicar
estados patológicos diferentes. Em valor abaixo do esperado ela pode ser
encontrada em patologias como a necrose tubular aguda, baixa ingestão de
proteínas, condições de privação alimentar ou redução da síntese de ureia por
insuficiência hepática. A análise dessa razão elevada pode indicar processos que
levam a diminuição do fluxo sanguíneo renal, aumento na ingestão proteica, ou
sangramento gastrintestinal. Outra utilidade da ureia está na sua dosagem
urinária, que pode fornecer informação crucial no campo da nutrição e tem sido
utilizada em pacientes internados para monitoramento de dietas especiais.
𝐶𝑙𝐶𝑟𝑒𝑎𝑡𝑖𝑛𝑖𝑛𝑎 + 𝐶𝑙𝑈𝑟𝑒𝑖𝑎
𝑇𝐹𝐺 =
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➢ Cistatina C
Como existem variações na produção e na secreção de creatinina, tem-se
estudado outras substâncias endógenas capazes de fornecer uma avaliação
mais precisa da TFG. Uma substância que apresenta esse potencial é a cistatina
C plasmática, uma proteína de baixo peso molecular, produzida em uma taxa
constante pelas células nucleadas.
➢ Fatores de risco
São considerados “fatores de risco” para desenvolver HA certos elementos
que tendem a aumentar a probabilidade individual ou populacional de elevar a
PA. Quando se fala em “fatores de risco”, está-se referindo especialmente à HA
primária, ou seja, aquela não relacionada com nenhuma doença renal nem de
outros sistemas capazes de elevar a pressão. Os principais fatores de risco para
o desenvolvimento de hipertensão arterial primária são:
• Idade: quanto mais elevada a idade, maior a pressão arterial.
• Gênero: mais frequente nos homens, mas se inverte após a menopausa.
• Raça/etnia: os pretos apresentam maiores níveis de pressão.
• Sal: o abuso de sal na dieta aumenta os níveis de pressão arterial.
• Hereditariedade: agregação familiar evidente (herança multigênica).
• Sedentarismo, obesidade, estresse, álcool e tabagismo.
➢ Fisiopatologia
Considerando que uma parcela dos pacientes com hipertensão essencial
pode desenvolver dano renal progressivo, propõem-se dois mecanismos
sinérgicos como causa da lesão renal:
1. Isquemia glomerular em decorrência do estreitamento progressivo da luz de
arteríolas pré-glomerulares secundário a arterioesclerose hialina e hipertrofia
da camada média desses vasos em virtude de lesão mecânica direta da
elevação sustentada da hipertensão arterial, levando à insuficiência renal por
isquemia renal.
2. Redução no número de néfrons decorrente de isquemia glomerular,
induzindo, assim, uma adaptação nos néfrons remanescentes com
vasodilatação da arteríola aferente e transmissão da hipertensão sistêmica
diretamente para os glomérulos ocasionando hipertensão intraglomerular,
hiperfiltração glomerular e esclerose glomerular.
Na hipertensão arterial secundária, o médico deve suspeitar principalmente
quando estiver diante de adultos jovens; não obesos; HAS resistente; aumento
da PA em pacientes que mantinham níveis pressóricos estáveis; HAS acelerada;
e HAS associada à hipocalemia. As causas mais comuns de HAS secundária
são: doença parenquimatosa renal, estenose de artéria renal, coarctação de
aorta, hiperaldosteronismo, feocromocitoma, síndrome de Cushing, apneia do
sono (SAHOS), hipotireoidismo e hipertireoidismo.
➢ Diagnóstico
Na avaliação do paciente com hipertensão arterial, três pontos principais
devem constituir o foco da atenção:
1. Determinar, por meio da história, exame clínico e exames complementares,
o grau de comprometimento sistêmico que a doença possa ter causado.
2. Identificar outras doenças e/ou fatores de risco para doenças
cardiovasculares que possam estar associados.
3. Identificar os elementos epidemiológicos e clínicos que caracterizam a
hipertensão como primária ou secundária, estabelecendo também os exames
necessários para afastar ou confirmar a hipótese eventual de hipertensão
secundária.
A aferição da pressão arterial pode ser feita com esfigmomanômetros,
monitorização ambulatorial da pressão arterial (MAPA) ou monitorização
residencial da pressão arterial (MRPA). A história clínica é caracterizada por
diagnóstico de hipertensão arterial sistêmica de longa data, piora progressiva e
lenta da creatinina e ureia e com proteinúria leve (geralmente < 1 g).
Os exames complementares de rotina incluem: análise de urina, potássio
plasmático (não é necessário sódio), glicemia de jejum com hemoglobina
glicada, creatina (para calcular a taxa de filtração glomerular através da fórmula
CKD/EPI), perfil lipídio, ácido úrico plasmático (um grande marcador de
disfunção endotelial, pois quando elevado há menor produção de óxido nítrico e,
consequentemente, menor capacidade de vasodilatação) e eletrocardiograma
convencional. É importante solicitar os exames de creatina urinária e albumina
para avaliar os pacientes com alto risco cardiovascular e suspeita de lesão de
órgão-alvo. A taxa de filtração glomerular auxilia, portanto, na avaliação da
função renal e o risco de desenvolver doença renal crônica. No entanto, o
diagnóstico definitivo é realizado por biópsia renal.
➢ Tratamento
As mudanças de estilo de vida incluem: redução do peso corporal, dieta
saudável, abandono no uso de tabaco, redução do uso de bebidas alcoólicas e
estimulantes, exercícios físicos regulares, controle do estresse e evitar poluição
(pois a poluição aumenta o processo inflamatório) e locais com temperatura fria
(pois o frio provoca vasoconstrição). O tratamento medicamento baseia-se em:
• Diuréticos tiazídicos (DTZ): está relacionado com a diminuição do volume
extracelular (Hidroclorotiazida, Clortalidona e Indapamida).
• Inibidor do sistema renina-angiotensina (iSRA): existem duas classes de
medicamentos: bloqueadores dos receptores da angiotensina (BRA),
bloqueiam os receptores específicos da angiotensina II (receptores AT1),
impedindo que as arteríolas se contraiam (Losartana) ; e inibidores de enzima
conversora de angiotensina (iECA), que reduzem a pressão arterial em parte
através da dilatação das arteríolas impedindo a formação de angiotensina II,
uma substância química produzida no corpo que faz com que as arteríolas
se contraiam. Os principais medicamentos são: Captopril e Enalapril.
• Bloqueador do canal de Ca2+ (BCC): age reduzindo a resistência vascular
periférica decorrente do bloqueio dos canais de Ca2+ na membrana das
arteríolas. O medicamento utilizado é a Anlodipino e Felodipino.
➢ Diagnóstico
A DRD deve ser rastreada anualmente em todos os indivíduos com DM,
começando após 5 anos do início do DM nos indivíduos com DM1 ou, mais cedo,
se o indivíduo apresentar descompensação da glicemia cronicamente ou estiver
na puberdade. Para todos os pacientes portadores de DM2, a DRD deve ser
pesquisada anualmente desde o reconhecimento do diagnóstico do DM, pois
pode haver um período prévio silencioso e desconhecido da doença.
A presença de retinopatia diabética através da fundoscopia também deve
ser investigada, uma vez que há relação entre lesão retiniana e lesão renal
(microangiopatia diabética). Além disso, os exames laboratoriais essenciais são:
• Dosagem de creatinina sérica para estimar a TFG (fórmula CKD-EPI).
• Parcial de urina.
• Relação albumina/creatinina em amostra isolada de urina.
Nos casos de dúvida diagnóstica, principalmente com outras glomerulopatias
e doenças tubulointersticiais, deve-se realizar a biópsia renal, indicada quando:
(1) ocorre início súbito de perda de função renal; (2) declínio rápido da perda de
função renal; (3) sinas e sintomas sugestivos de outra doença sistêmica; e (4)
desenvolvimento súbito de síndrome nefrótica ou nefrítica.
A hiperglicemia determina hipertrofia celular por meio de mediadores de
crescimento no tecido renal. Assim, os achados histológicos característicos da
doença renal do diabetes incluem: hipertrofia renal, proliferação mesangial
(imagem B), formação de nódulos de Kimmelstiel-Wilson (em D) e glomérulos
esclerosados (em F). Além do acometimento glomerular pode ocorrer alterações
tubulointersticiais (espessamento da membrana basal tubular) e vasculares
(espessamento da camada íntima da arteríola renal).
➢ Epidemiologia
A lesão renal aguda representa um problema de saúde pública mundial com
altas taxas de morbimortalidade, além de apresentar altos custos para a saúde,
com maior tempo de internação e possibilidade de evolução para doença renal
crônica em longo prazo.
A incidência da LRA em pacientes hospitalizados é cerca de 5 a 7%, sendo
mais alta entre os pacientes críticos na UTI (1 a 25%). A despeito do avanço no
conhecimento do mecanismo fisiopatológico da LRA e de seu tratamento, a
mortalidade associada à doença ainda permanece elevada (entre 30 e 50%).
➢ Biomarcador sérico
Cerca de 98% do pool de creatinina está na forma de creatina nos músculos
esquelético, sendo metabolizada no fígado pela desidratação não enzimática e
se transformando em creatinina, a qual é liberada na circulação sanguínea e
eliminada pelos rins.
Dessa forma, devido ao fato de que alguns fatores podem impactar na
concentração sérica da creatinina, como a massa muscular, sexo e idade, a
dosagem dessa substância não é um bom marcador de função renal, mas é o
biomarcador mais disponível para avaliar a filtração glomerular. Além disso, a
elevação da creatinina é um marcador tardio para a lesão renal aguda, pois,
ainda que muita específica, é pouco sensível.
Para o estadiamento de lesão renal aguda, segundo os critérios KDIGO,
utilizam-se somente alterações da creatinina sérica e a diurese, mas não
mudanças na taxa de filtração glomerular. A LRA pode ser classificada em:
➢ Fisiopatologia
A fisiopatologia das lesões renais isquêmica e tóxica, origens mais comuns
de LRA intrínseca (renal), envolve alterações estruturais e bioquímicas que
resultam no comprometimento vascular e/ou celular. A partir dessas alterações,
ocorrem vasoconstrição, alteração da função e morte celular, descamação do
epitélio tubular e obstrução intraluminal, vazamento transtubular do filtrado
glomerular e inflamação. As principais alterações fisiopatológicas na LRA são:
• Vasoconstrição intrarrenal: causada pelo desequilíbrio entre os fatores
vasoconstritores e vasodilatadores, tanto de ação sistêmica quanto local.
Mecanismo particularmente importante na LRA por nefrotóxicos, com
ativação de hormônios vasoconstritores (angiotensina II e endotelina) e/ou
inibição de vasodilatadores (prostaglandinas e óxido nítrico).
• Lesão tubular: associada principalmente a uma redução dos níveis
intracelulares de ATP e a lesões de reperfusão.
➢ Quadro clínico
Tradicionalmente, o curso clínico da LRA subdivide-se em quatro fases:
1. Fase inicial: começa a partir do momento de exposição ao insulto, isquêmico
ou tóxico. Tem duração variável e depende do tempo de exposição ao agente
agressor. Nessa fase, o volume urinário pode estar normal ou diminuído,
porém o rim começa a perder a capacidade de excretar adequadamente os
compostos nitrogenados.
2. Fase oligúrica: quando o volume urinário é inferior a 400 mℓ/dia, podendo
durar entre 10 e 14 dias.
3. Fase poliúrica ou diurética: marcada por rápida elevação do volume
urinário, pois representa a incapacidade dos túbulos regenerados em
reabsorver sal e água (diurese > 2.500 mℓ/dia). No entanto, a excreção
urinária dos compostos nitrogenados não acompanha o aumento da
excreção de sal e água, de modo que a concentração plasmática de
creatinina e ureia continua a aumentar e os sintomas e a necessidade de
terapia renal de substituição podem persistir.
4. Fase de recuperação funcional: ocorre após vários dias de diurese normal,
com redução gradativa da ureia e creatinina.
Os sinais e sintomas dependem do grau de extensão da lesão renal aguda.
A alteração de potássio, chamada de hiperpotassemia (ou hipercalemia), é a
principal causa metabólica que leva o paciente com LRA ao óbito, devido a
toxicidade cardíaca, manifestando-se com arritmias. Além disso, podem ocorrer
alterações do balanço de cálcio (hipocalcemia), do balanço de fósforo
(hiperfosfatemia), do balanço de água e do balanço de sódio, os quais provocam
acidose metabólica, hipertensão arterial sistêmica, náusea e vômito, edema
pulmonar, ascites, asterixis (ou flapping) e encefalopatias.
➢ Diagnóstico
Para o diagnóstico de lesão renal aguda é fundamental a história e início da
insuficiência renal, com revisão de medicamentos utilizados previamente e a
identificação de presença de malignidades e outras doenças, como neoplasias,
insuficiência cardíaca ou cirrose hepática.
No exame físico é importante avaliar se o paciente apresenta:
• Contração de volume: indicando etiologia pré-renal.
• Presença de “drug rash”: a qual sugere nefrite intersticial aguda.
• Dedo azul: indicando êmbolo de colesterol.
• Sinais de sobrecarga volêmica: indicando síndrome cardiorrenal.
• Ascite e icterícia: doença hepática (pré-renal ou síndrome hepatorrenal).
➢ Síndrome nefrótica
A síndrome nefrótica é definida por:
1. Proteinúria (> 3,5 g/1,73m²/dia).
2. Hipoalbunemia.
3. Edema.
4. Hiperlipidemia e/ou lipidúria.
5. Hipercoagulabilidade.
➢ Classificação
Segundo a Kidney Disease: Improving Global Outcomes (KDIGO), a DRC
pode ser classificada de acordo com a taxa de filtração glomerular estimada
(eTFG), albuminúria ou pela doença de base. Com base na taxa de filtração
glomerular e na proteinúria a DRC é subdividida em estágios. Conforme mostra
a tabela abaixo, pacientes na faixa verde dificilmente tem complicações graves
e pacientes na faixa vermelha geralmente estão em diálise, para evitar outras
complicações, como eventos cardiovasculares, uma vez que são as principais
causas de mortalidade dentre os pacientes com DRC.
➢ Epidemiologia
Em países desenvolvidos, o rastreamento estima prevalência de doença
renal crônica entre 8 e 12% na população adulta, com mais de 4,5 milhões de
adultos com a doença no mundo.
No Brasil, a prevalência de DRC é em torno de 10%, sendo que a primeira
causa é a hipertensão arterial sistêmica, a segunda é o diabetes (DM2), seguido
pela glomerulonefrite crônica. Além disso, baixo nível socioeducacional e etnia
negra, pardos e indígenas são fatores de risco para desenvolvimento de DRC.
➢ Etiologia
As principais causas de doença renal crônica são:
• Diabetes mellitus (em particular, a diabetes mellitus tipo 2).
• Hipertensão arterial.
• Glomerulonefrites crônicas.
• Pielonefrite crônica/litíase renal.
• Doenças imunológicas e vasculites (como lúpus eritematoso sistêmico).
• Rins policísticos e síndrome de Alport.
• Malformações congênitas.
• Necrose cortical bilateral.
• Lesão renal aguda prolongada.
• Medicamentos (antibióticos nefrotóxicos e AINEs).
➢ Fatores de risco
Dentre os fatores de risco para o desenvolvimento da DRC, destacam-se:
• Idade: ≥ 65 anos.
• Gênero: apesar de a doença se manifestar comumente no sexo feminino, os
homens cursam mais frequentemente para estados mais avançados da DRC.
• Fatores raciais: afrodescendentes apresentam um risco maior de DRC.
• Determinantes sociais: como nível socioeconômico.
• Comorbidades: diabetes mellitus, hipertensão arterial e obesidade.
➢ Manifestações clínicas
O declínio gradual da função em pacientes com DRC é inicialmente
assintomático. No entanto, diferentes sinais e sintomas podem ser observados
com insuficiência renal avançada, incluindo sobrecarga de volume, hipercalemia,
acidose metabólica, hipertensão, anemia e distúrbios minerais e ósseos. Assim,
os principais sinais e sintomas são:
• Dificuldade para dormir.
• Cefaleia.
• Síndrome das pernas irrequietas.
• Gosto metálico da boca e lesões orais (sangramento e xerostomia).
• Dispneia (em repouso e/ou aos esforços).
• Fadiga (profunda).
• Câimbras, fraqueza muscular e convulsões.
• Desnutrição (perda de apetite, náuseas, vômitos e emagrecimento).
• Pele seca, pele cor amarelo-palha, lesões de pele e prurido.
• Noctúria e urina espumosa.
• Alterações no padrão respiratório e atrito pleural e/ou pericárdico.
• Edema pulmonar e/ou periférico.
• Olhos hiperemiados.
• “Flap” urêmico (asterixis).
• Hálito urêmico.
• “Neve urêmica” (cristalização da ureia na pele após evaporação do suor).
➢ Tratamento
Em geral, a ocasião ideal para iniciar o tratamento, específico e não
específico, é muito antes que haja declínio detectável da TFG e certamente antes
que a DRC esteja bem estabelecida. As intervenções não farmacológicas e
farmacológicas para atenuar a progressão da doença renal crônica envolvem:
• Aconselhamento nutricional: restrição de proteínas (0,6 – 0,8 g/Kg de
proteína/dia), fósforo, potássio e sódio (< 2 - 3 g/dia).
• Tratamento adequado da hipertensão arterial: para retardar a progressão
da DRC e não agravar a proteinúria. As diretrizes terapêuticas estabelecem
o nível de 130/80 mmHg como meta de pressão arterial para pacientes com
DRC e proteinúria. Os inibidores da ECA e os bloqueadores de receptores da
angiotensina II (BRAs) inibem a vasoconstrição das arteríolas eferentes da
microcirculação glomerular, que é induzida pela angiotensina, por isso são
drogas de escolha para controle da PA. Além disso, os bloqueadores dos
canais de cálcio (BCC) e os diuréticos tiazídicos também são indicados.
• Monitoramento da proteinúria: com restrição de proteínas na dieta e drogas
que interfiram na regulação do eixo renina-angiotensina-aldosterona.
𝑼𝒓𝒆𝒊𝒂 𝑮𝒍𝒊𝒄𝒐𝒔𝒆
𝑶𝒔𝒎𝒐𝒍𝒂𝒓𝒊𝒅𝒂𝒅𝒆 = (𝟐 𝒙 𝑵𝒂+ ) + ( )+( )
𝟔 𝟏𝟖
H2O
Na + H2O
+
Na
H2O
Na+
O uso dessa fórmula deve ser feito com cautela, pois a variação da natremia
pode ser diferente da prevista, sendo necessária a monitoração frequente do
sódio plasmático durante o tratamento. Em seguida, medidas de reversão da
etiologia da hiponatremia devem ser instituídas. Tais medidas incluem a
suspensão de substâncias medicamentosas associadas à SSIHAD, restrição à
ingestão de líquidos para 800 a 1.000 mℓ/dia, interrupção da administração de
soluções hipotônicas e da reposição hidroeletrolítica e de hormônios adrenais ou
tireoidianos, quando pertinente.
➢ Hipernatremia
A hipernatremia é definida como uma medida de sódio sérico maior do que
145 mEq/ℓ causada por um estado de deficiência de água livre em relação ao
sódio. A hipernatremia é menos frequente do que a hiponatremia porque sempre
leva a um estado hiperosmolar (falta de água no organismo com desidratação
da célula). É clinicamente mais bem tolerada do que a hiponatremia, uma vez
que os sintomas mais severos surgem quando o sódio plasmático está acima de
150 mEq/ℓ e as condutas terapêuticas são mais simples e bastante eficazes.
A hipernatremia é um achado clínico comum, com prevalência de 0,5 a 2%
em pacientes hospitalizados, principalmente decorrentes de situações
iatrogênicas, como administração de soluções hipertônicas de bicarbonato de
sódio, emprego de dietas enterais ricas em sódio ou uso de soluções de
manutenção com excesso de Na+, sendo que crianças e idosos (com restrição
de acesso à água apresentam maior susceptibilidade).
Em termos fisiológicos, a elevação da natremia e a hipertonicidade por ela
gerada desencadeiam respostas homeostáticas que produzem a ativação da
sede e a secreção de hormônio antidiurético (ADH), de forma a aumentar a água
livre corpórea. O ADH atua sobre a permeabilidade dos ductos coletores à água,
causando o aumento na absorção de água (mecanismos da sede) e a eliminação
de uma urina concentrada.
➢ Fisiologia do potássio
O potássio (K+) é o principal cátion do meio intracelular do organismo com
concentração de aproximadamente 140 mEq/ℓ e está presente em muitos
alimentos. No plasma, a concentração deste íon geralmente varia entre 3,5 e 5
mEq/ℓ, sendo que grandes desvios fora dessa faixa são incompatíveis com a
vida. Assim, a regulação da sua distribuição interna deve ser extremamente
eficiente, uma vez que pequenas mudanças no equilíbrio entre o potássio intra
e extracelular podem resultar desde quadros assintomáticos até morte súbita.
O principal regulador do potássio na célula é a bomba de Na+/K+– ATPase,
localizada na membrana celular que, às custas da energia obtida pela hidrólise
do ATP, libera 3 íons Na+ para o meio extracelular e captura 2 íons K+ para o
meio intracelular. Esta enzima é modulada por diferentes fatores, incluindo
hormônio tireoidiano, catecolaminas, insulina e drogas como os digitálicos.
A excreção do potássio ocorre basicamente pelo rim (90%), sendo pequena
a quantidade eliminada pelas fezes (5 a 10 mEq/dia) e pelo suor (até́ 10
mEq/dia). Apenas nos casos em que a taxa de filtração glomerular (TFG) está
substancialmente comprometida (menor que 30%), a eliminação fecal ganha
maior importância. Algumas funções do potássio no organismo são:
• Potencial de membrana celular em repouso.
• Propagação potencial de ação neuronal, muscular e cardíaco.
• Secreção e ação hormonal (mineralocorticoide).
• Tônus vascular e controle de pressão arterial.
• Motilidade digestiva.
• Homeostase ácido-básico, concentração urinária e balanço de fluidos.
No rim, o potássio é filtrado livremente pelo glomérulo e reabsorvido ao longo
do túbulo contorcido proximal (65 – 70%) e da alça ascendente espessa de Henle
(25%), pelos cotransportadores de Na+/K+/Cl-. Já na alça descendente da alça
de Henle ocorre secreção de K+ por transporte passivo como resposta a
adaptações na ingesta de potássio. Deste modo, menos de 10% da carga filtrada
chega ao início do túbulo distal, principal local no ajuste fino da homeostase do
potássio, pois nos segmentos mais distais ocorre a reabsorção e secreção de
potássio. A aldosterona e o potássio plasmático são os principais determinantes
da secreção deste íon nesta região do néfron, por meio da bomba de Na+/K+–
ATPase. Os fatores que influenciam a distribuição interna do K+ são:
• Estimulam a bomba de Na+/K+–ATPase diminuindo o K+ sérico: insulina,
catecolaminas (estímulo β-adrenérgico), aldosterona, alcalose e anabolismo.
➢ Hipocalemia
A hipocalemia é a diminuição do K+ sérico < 3,5 mEq/ℓ, sendo que esse
distúrbio pode ser transitório, quando há um influxo celular de potássio, ou
persistentes, quando ocorre uma ingesta inadequada ou perdas excessivas de
K+. Para o diagnóstico de hipocalemia é necessária uma avaliação clínica da
volemia e avaliação laboratorial da ausência ou presença de distúrbios ácido-
básico ou da pesquisa de eletrólitos urinários.
A prevalência de hipocalemia é variável conforme a população estudada. Os
pacientes com função renal normal e sem uso de medicamentes raramente
desenvolvem hipocalemia. Contudo, é comum nos pacientes hipertensos em uso
de diuréticos tiazídicos. Essa alteração na relação K+ intracelular/extracelular
compromete o potencial de repouso das células, principalmente nos tecidos
vulneráveis (leito cardiovascular, sistema nervoso periférico, músculos e rins).
A hipocalemia verdadeira se associa a grande déficit corporal de K +. No
entanto, as principais causas de hipocalemia podem ser classificadas em:
• Pseudo-hipocalemia: decorrem da captação de K+ pelas células no sangue
em pacientes com leucemias agudas após a coleta de amostra sanguínea,
principalmente quando o sangue é estocado em temperatura ambiente, o
qual favorece a atividade da bomba Na+/K+–ATPase.
• Redistribuição de K+: como apenas 2% do K+ está no extracelular, pequenas
redistribuições desse íon podem gerar hipocalemia. As principais causas de
captação de K+ são: insulina, alcalose metabólica, agonistas β-adrenérgicos
e catecolaminas. É válido lembrar que o aumento do pH em 0,1 determina a
redução de K+ em 0,4 mEq/ℓ.
• Perdas extra-renais de K+: envolvem as perdas digestivas, como diarreia,
sucção por sonda nasogástrica, vômitos (perda de ácidos) e hipovolemia
(ativação secundária do sistema renina-angiotensina-aldosterona com
secreção de K+), e as perdas por sudorese excessiva (menos frequente).
➢ Diagnóstico
Assim como ocorre em outras condições, uma anamnese e exame físico
adequados podem auxiliar no diagnóstico de algum distúrbio ácido-básico como:
• Alcalose metabólica: vômitos.
• Acidose metabólica: diabetes, diarreia e hipotensão.
• Alcalose respiratória: taquipneia e doença hepática.
• Acidose respiratória: tabagismo e doença pulmonar obstrutiva crônica.
A gasometria arterial ou venosa é o exame mais importante para o correto
diagnóstico de DAB (valores de referência na tabela abaixo).
PARÂMETRO VALORES DE REFERÊNCIA
pH 7,35 a 7,45
pO2 (mmHg) 80 a 100
pCO2 (mmHg) 35 a 45
Bicarbonato (mEq/L) 22 a 26
Saturação de O2 > 92%
➢ Alcalose respiratória
A alcalose respiratória é caracterizada pelo aumento do pH (pH > 7,45) e
redução da pCO2 (pCO2 < 35 mmHg). Nessa condição, ocorre maior excreção
do CO2 produzido nos tecidos, levando à redução do CO2 e, consequentemente,
aumento do pH. Em virtude disso, a resposta compensatória renal promove uma
redução da concentração de HCO3- plasmático, isto é, ocorre aumento da
excreção de HCO3- e maior retenção de íons H+, com o objetivo de tentar
reestabelecer o equilíbrio ácido-básico.
Esta hiperventilação pode ser secundária a aumento do drive inspiratório
(voluntário, ansiedade, febre, hemorragia subaracnoide, meningite, tumores
cerebrais, intoxicação por medicamentos ou drogas), doenças respiratórias
(asma, pneumonia, edema pulmonar) ou devido à hipóxia tecidual (altitudes
elevadas, cardiopatias cianóticas, anemia severa, choque séptico, gravidez).
Os sintomas produzidos pela alcalose respiratória estão relacionados ao
aumento da irritabilidade do sistema nervoso periférico e central com vários
sintomas de acometimento neurológico (alteração da consciência, parestesias,
espasmo carpopedal, vertigens, entre outros). Além disso, a alcalose respiratória
pode levar a diminuição do fluxo sanguíneo cerebral e arritmias cardíacas. Um
sinal clínico importante é a taquipneia.
No tratamento da hiperventilação primária, deve-se fazer o paciente respirar
dentro de um saco de papel, melhorando a hipocapnia.
➢ Acidose metabólica
A acidose metabólica é caracterizada pela diminuição do pH (pH < 7,35) e
redução do HCO3- (HCO3- < 22 mEq/ℓ). Nessa condição, ocorre uma resposta
compensatória pulmonar, com respiração mais rápida e profunda, visto que o
organismo tenta liberar o excesso de CO2 produzido nos tecidos, levando a
redução do pCO2 (pCO2 < 35 mmHg) e aumento do pH, com o objetivo de tentar
reestabelecer o equilíbrio ácido-básico.
Para a investigação etiológica da acidose metabólica, é importante o
conhecimento de alguns dados laboratoriais como sódio, potássio, cloro, fósforo,
albumina, lactato, glicemia e cetoácidos. O primeiro passo é o cálculo do ânion
gap (AG). O ânion gap indica a diferença entre as concentrações séricas de
cátions (Na+ e K+) e ânions (Cl- e HCO3-). Pelo fato de não poder haver nenhuma
diferença efetiva (pelo princípio da neutralidade elétrica), essa medida reflete os
chamados íons “não mensuráveis”. Normalmente esta diferença ou gap é
representada pela porção ionizada dos ácidos fracos (A-), principalmente a
albumina, e em menor proporção, o fósforo, sulfato e outros ânions.
Por causa da baixa concentração de K+ no meio extracelular, esse íon
frequentemente é omitido dos cálculos de ânion gap. Por isso, na prática, o ânion
gap pode ser calculado com a seguinte fórmula:
𝑨𝑮 = (𝑵𝒂+ ) − (𝑪𝒍− + 𝑯𝑪𝑶−
𝟑)