Você está na página 1de 7

ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL

PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA

MCM
Nº 70070942560 (Nº CNJ: 0304450-44.2016.8.21.7000)
2016/CÍVEL

REEXAME NECESSÁRIO. MANDADO DE


SEGURANÇA. MUNICÍPIO DO CHUÍ. SERVIDOR
PÚBLICO ESTÁVEL EXONERADO.
OBRIGATORIEDADE DA INSTAURAÇÃO DE
PROCESSO ADMINISTRATIVO. PRINCÍPIO DO
CONTRADITÓRIO E AMPLA DEFESA NÃO
OBSERVADOS PELA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA.
REINTEGRAÇÃO.
O servidor aprovado em concurso público, após adquirir
estabilidade, não pode ser sumariamente privado do
cargo que ocupa, imprescindível lhe seja oportunizado a
ampla defesa em processo administrativo.

SENTENÇA CONFIRMADA EM REEXAME


NECESSÁRIO.

TERCEIRA CÂMARA CÍVEL


REMESSA NECESSÁRIA

Nº 70070942560 (Nº CNJ: 0304450- COMARCA DE SANTA VITÓRIA DO


44.2016.8.21.7000) PALMAR

JUIZ(A) DE DIREITO APRESENTANTE

DANILO LIMA ALEGRE AUTOR

PREFEITO MUNICIPAL DO CHUI REU

DECISÃO MONOCRÁTICA
Vistos.
1. Trata-se de remessa necessária da sentença das fls. 104-106 que, nos autos
da ação de mandado de segurança ajuizada por DANILO LIMA ALEGRE em face do
PREFEITO MUNICIPAL DO CHUÍ, julgou procedente o mandamus, nos seguintes termos:
ISSO POSTO, com fundamento no art. 487, inc. I, do CPC, CONCEDO A
SEGURANÇA para declarar ilegalidade do ato administrativo que demitiu
o impetrante (Portaria nº. 039/2015) e determinar a imediata reintegração
ao cargo de motorista, confirmando a liminar concedida à fl. 29.
Deixo de condenar o réu ao pagamento dos honorários advocatícios em
face das disposições do art. 25 da Lei nº. 12.016/09 e Súmulas 105 do STJ e
512 do STF.

1
ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL
PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA

MCM
Nº 70070942560 (Nº CNJ: 0304450-44.2016.8.21.7000)
2016/CÍVEL

Igualmente, sem objeto a condenação ao pagamento das custas processuais


em face da isenção prevista no art. 5, inc. I, da Lei Estadual nº. 14.634/14.

Em razão da ausência de recurso voluntário os autos foram encaminhados ao


Ministério Público para parecer.
Às fls. 111-114, a ilustre Procuradora de Justiça, Drª Lisiane Dal Pino,
opinou pela confirmação da sentença em reexame necessário.
Vieram os autos conclusos para julgamento.
É o relatório.
2. Do cotejo dos autos verifica-se que o impetrante, servidor efetivo do
Município do Chuí no cargo de motorista desde 12 de maio de 2004 (Portaria de nomeação à
fl. 09), foi exonerado do cargo na data de 20 de março de 2015 (Portaria nº 039/2015, fl. 12),
porque não compareceu ao trabalho no ano de 2014 pelo período de cinco meses (fl. 26), em
que pese tenha recebido vencimentos nos meses de outubro e novembro de 2014, o que
configura abandono de cargo, nos termos dos artigos 148, inciso II e 151 da Lei do
Município de Santa Vitória do Palmar nº 2.662/95, recepcionada pelo Município do Chuí
através da LM nº 01/97 (vide declaração da fl. 27 e fl. 43).
Inconformado, ajuizou o presente mandado de segurança objetivando a
imediata reintegração, porquanto exonerado sem o devido conhecimento.
O Juízo singular, à fl. 29 deferiu o pedido liminar para suspender o ato
administrativo de exoneração, determinando a imediata reintegração do servidor no cargo de
motorista, mediante o restabelecimento dos respectivos vencimentos.
A autoridade apontada como coatora demonstra o cumprimento da medida
liminar, tendo reintegrado o servidor a contar de 13 de abril de 2016, consoante se verifica
da Portaria nº 069/2016 (fl. 38).
Na sequência, sobreveio sentença na qual concedida a ordem para declarar a
ilegalidade do ato administrativo que demitiu o impetrante.
Em decorrência da ausência de recurso voluntário, por força do artigo 14, §
1º da Lei nº 12.016/2009, os autos foram remetidos a este Tribunal para análise da questão
em reexame necessário.

2
ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL
PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA

MCM
Nº 70070942560 (Nº CNJ: 0304450-44.2016.8.21.7000)
2016/CÍVEL

Com efeito, tenho que o decisum merece ser confirmado neste grau de
jurisdição.
No caso concreto, tratando-se de servidor público nomeado e empossado no
cargo de motorista, exercendo funções a ele inerentes, a sua exoneração somente poderia
efetuar-se após a formalização de procedimento administrativo que lhe tivesse assegurado
amplo direito de defesa – o que inocorreu na espécie.
Destaco que a posse marca o início dos direitos e deveres funcionais do
servidor público, sendo que a sua anulação somente pode ser procedida mediante processo
administrativo, que assegure o direito à ampla defesa e ao contraditório ao servidor, nos
termos da Súmula nº 20 do STF, que dispõe que “é necessário processo administrativo, com
ampla defesa, para demissão de funcionário admitido por concurso.”
Modo igual, preconiza o artigo 41 da Constituição Federal:
“Art. 41. São estáveis após 3 (três) anos de efetivo exercício os servidores
nomeados para cargo de provimento efetivo em virtude de concurso público.
§1º O servidor público estável só perderá o cargo:
I – em virtude de sentença judicial transitada em julgado;
II – mediante processo administrativo em que lhe seja assegurada ampla defesa;
III – mediante procedimento de avaliação periódica de desempenho, na forma de lei
complementar, assegurada ampla defesa.
(...)”(grifei) .

De registrar-se que Lei Municipal nº 2.662/95, de Santa Vitória do Palmar,


recepcionada pelo Município do Chuí, assim prevê acerca da necessidade de instauração de
procedimento administrativo próprio para fins de exoneração de servidor público estável,
verbis:
Art. 22- O servidor estável só perderá o cargo em virtude de sentença
judicial transitada em julgado ou mediante processo administrativo em que
lhe seja assegurada ampla defesa.

Art. 160- A autoridade que tiver ciência de irregularidade no serviço


publico é obrigada a promover a sua apuração imediata, mediante
sindicância ou processo administrativo disciplinar.
Parágrafo 1º - As denuncias sobre irregularidades serão objeto de
apuração, desde que contenham a identificação e o endereço do
denunciante e sejam formuladas por escrito.

3
ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL
PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA

MCM
Nº 70070942560 (Nº CNJ: 0304450-44.2016.8.21.7000)
2016/CÍVEL

Parágrafo 2º - Quando o fato narrado, de modo evidente, não configurar


infração disciplinar ou ilícito penal, a denuncia será arquivada, por falta de
objeto.

Art. 161. As irregularidades e faltas funcionais serão apuradas por meio


de;

I- sindicância, quando não houver dados suficientes para a sua


determinação ou para apontar o servidor faltoso;
II- processo administrativo disciplinar, quando a gravidade da ação ou
omissão torne o servidor passível de demissão e cassação da aposentadoria.

Em nenhuma hipótese estou a afirmar que o impetrante não possa ser


exonerado pela Administração Municipal, se constata a irregularidade alegada pela
municipalidade – abandono de emprego. Todavia, a perda do cargo pelo servidor está
condicionada à instauração de processo administrativo, a fim de respeitar o devido processo
legal.
Em outras palavras, a exoneração deste servidor não prescinde do devido
processo legal que absorve, por exemplo, o direito de ter acesso a todas as informações
relativas ao andamento e atos do processo administrativo; ao direito de manifestar-se por
escrito no processo e ao direito de ver suas razões consideradas e enfrentadas pela
Administração – direitos estes subjacentes ao direito à ampla defesa.
Neste sentido:
PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. MANDADO DE
SEGURANÇA. SERVIDOR PÚBLICO CIVIL. DEMISSÃO. ABANDONO
DE CARGO. ANIMUS ABANDONANDI.
AUSÊNCIA. PEDIDO DE LICENÇA-MÉDICA. PRORROGAÇÃO.
1. Trata-se de Mandado de Segurança impetrado, com fundamento no art.
105, I, "b", da Constituição da República, contra ato do Ministro de
Estado da Justiça que demitiu o impetrante, Policial Rodoviário Federal,
com base nos arts. 116, III e XI, e 132, II, da Lei 8.112/1990.
2. Sustenta o impetrante, no que diz respeito aos dias que não
compareceu ao serviço, que não houve abandono de cargo, pois estava
afastado para tratamento de saúde.
3. Em se tratando de ato demissionário consistente no abandono de
emprego ou na inassiduidade ao trabalho, impõe-se averiguar o animus
específico do servidor, a fim de avaliar o seu grau de desídia.

4
ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL
PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA

MCM
Nº 70070942560 (Nº CNJ: 0304450-44.2016.8.21.7000)
2016/CÍVEL

4. O Superior Tribunal de Justiça possui entendimento firmado de que,


para se concluir pelo abandono de cargo e aplicar a pena de demissão, a
Administração Pública deve verificar o animus abandonandi do
servidor, elemento indispensável para a caracterização do mencionado
ilícito administrativo. (RMS 13.108/SP, Rel. Ministro Felix Fischer, Quinta
Turma, julgado em 2/12/2003, DJ 19/12/2003, p. 494).
5. No caso dos autos, é incontroverso que o impetrante apresentou à
Administração Pública, especificamente à Divisão de Saúde e
Assistência Social (DISAS/CGRH), três atestados médicos sucessivos,
devidamente assinados por médico credenciado, com o escopo de
justificar sua ausência ao serviço e obter prorrogação de sua licença
médica, conforme certificado pelo próprio Chefe da referida Divisão (fls.
100; 188 e 295/e-STJ).
6. Outrossim, é incontroverso que o ora impetrante compareceu a pelo
menos duas perícias médicas, designadas para os dias 14.9.2010 e
16.11.2010, conforme relatado no Parecer
022/2012/ACS/CAD/CONJUR-MJ/CGU/AGU (fls. 847-849/e-STJ).
7. Finalmente, o impetrante buscou ser diligente ao comunicar à
Coordenação de Recursos Humanos da DPRF seu comparecimento à junta
médica (fl. 430/e-STJ).
8. Nesse quadro, não se verifica o animus abandonandi, requisito
necessário à aplicação da pena de demissão.
9. No que diz respeito à não apresentação dos atestados no prazo
estabelecido no Decreto 7.003/2009, o servidor deve ser punido com a
perda da remuneração equivalente aos dias das faltas, aplicando-se o
disposto no art. 4º, §§ 4º e 5º, do referido Decreto, combinado com o art.
44, I, da Lei 8.112/91; enquanto que o não comparecimento do impetrante
às perícias designadas para 18.11.2010 e 18.1.2011 são punidas com a
pena suspensão, a teor do que dispõe o art. 130, § 1º, da Lei 8.112/91.
Incabível, contudo, a pena de demissão.
10. Segurança concedida.
(MS 18.936/DF, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, PRIMEIRA SEÇÃO,
julgado em 14/09/2016, DJe 23/09/2016)

ADMINISTRATIVO. AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM


RECURSO ESPECIAL.
SERVIDOR ESTADUAL. DEMISSÃO. ABANDONO DE CARGO.
PEDIDO DE REINTEGRAÇÃO. ARTS. 166, 168, 169 E 185 DO
CC/2002. AUSÊNCIA DE PREQUESTIONAMENTO. NÃO INDICAÇÃO
DE OFENSA AO ART. 535 DO CPC.
DIVERGÊNCIA JURISPRUDENCIAL PREJUDICADA. INVIABILIDADE
DA ANÁLISE DE DIREITO LOCAL. SÚMULA 280 DO STF. ALEGAÇÃO
DE QUE NÃO HOUVE ANIMUS ABANDONANDI NÃO COMPROVADA.
AGRAVO REGIMENTAL DESPROVIDO.
5
ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL
PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA

MCM
Nº 70070942560 (Nº CNJ: 0304450-44.2016.8.21.7000)
2016/CÍVEL

1. A questão referente aos arts. 166, IV e VII, 168, 169 e 185 do CC/02
não foi debatida pelo Tribunal de origem e, no Especial, não houve a
indicação de ofensa ao art. 535 do CPC, o que levaria ao exame de
possível omissão. Manifesta é, portanto, a ausência de prequestionamento,
o que atrai a incidência da Súmula 211 do STJ.
2. Quanto à regularidade do processo administrativo disciplinar a que foi
submetido o Servidor, a Corte de origem afastou as nulidades apontadas
concluindo que todo o trâmite administrativo deu-se em obediência às
disposições da Lei Complementar Estadual Paulista 207/79. Dest'arte, a
inversão do julgado encontra óbice na Súmula 280/STF, aplicável ao caso
por analogia.
3. De outro lado, não há dúvidas de que, para a tipificação da infração
administrativa de abandono de cargo, punível com demissão, exige para
completar-se o elemento objetivo e o elemento subjetivo.
Se um destes não resta demonstrado durante a instrução processual
disciplinar, (Servidor não faltou injustificadamente ou não tinha a intenção
de abandonar o cargo público de que estava investido) não há o que se
falar em penalidade de demissão para o mesmo.
4. Entretanto, o elemento subjetivo que caracteriza o animus
abandonandi terá de ser apreciado com cautela, não sendo suficiente a
constatação do abandono do cargo, mas a razão que levou a tal atitude e
o ônus da prova incumbe ao funcionário , é necessário que haja, quanto ao
agente, motivo de força maior ou de receio justificado de perda de um
bem mais precioso, como a liberdade, por exemplo.
5. No caso, não há nos autos notícias de que o Autor conseguiu
comprovar os problemas de saúde por ele alegados, extraindo-se,
inclusive, do documento juntado às fls. 288 que a alegação de problema
de saúde não encontra o mínimo embasamento, nada lhe servido de
fundamentação (como receitas médicas, prova de compra de medicamentos,
etc.); aliás, saliente-se que nem mesmo a prova testemunhal conseguiu
trazer alguma sustentação para a defesa policial, não havendo nenhum
depoimento que apontasse para a existência de real depressão ou outra
doença qualquer que impedisse o funcionário de desempenhar suas funções
normais.
6. Agravo Regimental desprovido.
(AgRg no AREsp 111.032/SP, Rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA
FILHO, PRIMEIRA TURMA, julgado em 21/06/2016, DJe 29/06/2016)

3. Ante o exposto, confirmo a sentença em reexame necessário.


Intimem-se.

Porto Alegre, 30 de novembro de 2016.


6
ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL
PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA

MCM
Nº 70070942560 (Nº CNJ: 0304450-44.2016.8.21.7000)
2016/CÍVEL

DES.ª MATILDE CHABAR MAIA,


Relatora.

Você também pode gostar