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Dedicatória!
Capítulo 01
Capítulo 02
Capítulo 03
Capítulo 04
Capítulo 05
Capítulo 06
Capítulo 07
Capítulo 08
Capítulo 09
Capítulo 10
Capítulo 11
Capítulo 12
Capítulo 13
Capítulo 14
Capítulo 15
Capítulo 16
Capítulo 17
Capítulo 18
Capítulo 19
Capítulo 20
Capítulo 21
Capítulo 24
Capítulo 25
Epílogo
Redes sociais
Livros Da Série
Livros 4/5/6 Em Breve!
Sinopse
Dedico essa obra a todos vocês que apoiam o meu trabalho, que me
incentivam a melhorar a cada história escrita. Um grande beijo com muito
carinho, da sua autora Marcia Candido!
Ando pelo corredor da faculdade recebendo aqueles mesmos olhares
de sempre, olhares de desprezo, de desgosto, olhares de desdém. O
grupinho de patricinhas cochicham me olhando de cima abaixa, mas eu ergo
a minha cabeça, não devo nada a ninguém, não tenho o porquê me
envergonhar da cor da minha pele, eu sou linda e não preciso que ninguém
me diga isso, muito menos aqui nesse lugar.
Mais a diante há mais um grupo me encarando e gargalhando de se
contorcer, será que a minha roupa está suja? Eu sei que não estou feia pois
sei me arrumar muito bem, apesar de não ter roupas de marcas como
gostaria, ainda não trabalho para me sustentar e ajudar os meus pais, por
sorte eu ganhei uma bolsa nessa faculdade.
Paro no meio do corredor olhando de um lado para o outro, estão
todos olhando no celular e sorrindo de se contorcer enquanto me apontam.
Vejo de longe Vinícius entrar na sua sala de aula depois de fingir não me
ver. Corro até lá e entro na sua sala, vejo o meu namorado aos beijos com
uma loira aguada metida a rica, a mesma que ele havia jurado que tinha
terminado antes de se envolver comigo.
— O que pensa que está fazendo, Vinícius? Vai me trocar por essa
garota sem sal? É isso mesmo? Você está voltando com ela antes de
terminar comigo? — Questiono chocada e ele apenas gargalha.
— Não posso trocar você por alguém que sempre foi minha. Eu
nunca terminei com ela, Eva nunca deixou de ser minha namorada, quanto a
você, eu só queria experimentar algo diferente e ganhar uma aposta, e até
que foi legal, mas não sou muito chegado a chocolate preto, a branquinha é
a minha preferida. — Ele sorrir me olhando de cima abaixo, me deixando
sem reação.
— Você já verificou o seu e-mail, Jenny? Vinícius mandou um vídeo
muito divertido para a galera da faculdade... Você tem ótimas performances
na cama, onde você aprendeu tudo isso? Por acaso é garota de programa? A
famosa profissional da vida? — Eva fala enquanto vira o seu celular para
mim.
Vejo na tela do aparelho um vídeo meu transando com Vinícius na
sua casa, foi a primeira vez que transamos depois de três meses que
estávamos juntos, estávamos nos conhecendo e ele me pediu em namoro,
ele foi um dos poucos que me defenderam aqui dentro desse lugar, mas eu
não fazia ideia de que tudo não havia passado de um plano ardiloso para me
humilhar dessa maneira.
O ar me falta, minhas pernas tremem com todas essas pessoas rindo,
debochando de mim enquanto me apontam. Saio da sala sentindo-me zonza
ouvindo apenas uma gritaria, assovios e gargalhadas, uma verdadeira
algazarra, todos me apontando por ter um vídeo íntimo meu rodando pela
faculdade. Como pude confiar tanto em alguém que não merece? Porque ele
me iludiu dessa maneira?
— Eu não sabia que macacos faziam essas posições...
— Além de preta é vulgar...
— Vini disse que deu dinheiro a ela para eles transarem...
— Que nojo, como ele teve coragem de ficar com ela?
— O filho da mãe ganhou mesmo a aposta, não pensei que seria tão
fácil ficar com ela.
Ouço muita gente falar ao mesmo tempo, sinto o meu rosto quente
mas não é de vergonha, é raiva, decepção por passar por algo assim.
Corro até a minha sala para pegar as minhas coisas, quando entro
vejo muitas fotos minhas na cama com Vinícius coladas por todas as
paredes, mas não tinha isso aqui quando vim pôr as minhas coisas. Ele
armou para mim, ficou comigo para me humilhar. Pego as minhas coisas e
saio apressada ouvindo as pessoas me xingar, me ofender de tudo quanto é
nome, apenas corro para fora da faculdade sentindo o meu coração pequeno
e apertado, como eu iria imaginar que estava sendo vítima de uma armação
apenas por eu ser negra?
— Jennifer? Jennifer, está tudo bem? — Pergunta o processo
Cláudio enquanto passo por ele correndo.
Não paro, apenas corro enquanto ouço a sirene da faculdade trocar e
sei que é o sinal de advertência.
Passo pelo portão correndo e me choco em alguém perdendo os
sentidos em seguida.
A minha decepção é tão grande, estou aturando ofensas de racismo
nessa faculdade por semanas só para não perder a bolsa de estudos, mas
para mim já deu, não quero mais estudar, não quero nunca mais pôr os pés
em uma faculdade se for para passar por isso, meus pais vão se decepcionar
comigo mas não estou me importando, a vergonha que eles vão sentir de
mim ao saberem do que houve é que vai me machucar mais.
Meus pais são muito rígidos mas sempre quiseram o melhor para
mim, mas depois disso não faço ideia de como eles vão reagir com tudo
isso. Estou com medo e preocupada, mas vou precisar passar por isso.
— Ei? Acorda! Você está bem? — Ouço alguém me chamar com
tapas de leves pelo rosto.
Respiro fundo virando o rosto de um lado para o outro, abro os
olhos devagar e vejo um playboyzinho metido a besta me encarar confuso,
percebo que estou dentro de um carro muito luxuoso.
— Onde eu estou? O que você fez comigo? Me deixa sair daqui! Eu
quero sair daqui! — Desespero-me pois olho lá para fora e não reconheço o
lugar, não sei onde estou com esse estranho.
— Fica calma! Eu não fiz nada com você, foi você quem desmaiou
em cima de mim, derramou todo o meu café e sujou a minha roupa... Mas
isso não importa, estamos na frente de um hospital, eu vou levar você na
emergência, consegue andar sozinha? Ou eu posso levar você se preferir. —
Ele se levanta pegando a minha mão para me ajudar a sair do seu carro.
— Que hospital é esse? Onde a gente está? O que aconteceu
comigo? — Pergunto confusa ainda me sentindo zonza.
— Você desmaiou em cima de mim enquanto saía correndo da
faculdade. Agora eu é que pergunto? O que aconteceu com você? Porque
estava tão desesperada daquele jeito? — Ele abraça a minha cintura me
guiando para dentro da emergência.
Quando ele fala da faculdade eu me lembro de tudo, das
humilhações, dos xingamentos, da minha decepção ao descobrir que fui
covardemente enganada por um homem que namorou comigo apenas para
me humilhar. Meu Deus, o que eu vou fazer agora? Não posso mais voltar
para aquele lugar.
— Ei? Não precisa chorar. Me conta o que houve?
— Contar o que houve? Você estava na faculdade, você não viu o
que fizeram comigo...? Não vou mais conseguir voltar naquele lugar, eu vou
processar aquela faculdade por permitir uma ação tão cruel contra mim, e
tudo por eu ser negra? Qual é o problema de ser negra? Sou um ser humano
como todo mundo... Me solta! Você é amigo do Vinícius, não é? Ajudou ele
a me humilhar daquela maneira? — Solto-me dele nervosa voltando a
chorar de raiva, de ódio. Saio da emergência irritada.
— Eu não estudo naquela faculdade, eu já me formei. Eu estava
indo até lá para falar com o diretor a pedido do meu pai, ele é o dono da
faculdade e não fazíamos ideia de que estavam praticando racismo dentro
da nossa instituição... É lamentável, é vergonhoso e você tem todo o direito
de nos processar, mas vamos conversar com calma? Eu prometo a você que
meu pai vai ficar ciente de tudo isso e vamos tomar as devidas
providências. Qual é o seu nome? Vamos entrar para você ser atendida?
Depois conversamos com calma. — Ele se aproxima com cautela mas eu
me afasto.
— Eu não vou entrar! Eu não tenho condições de pagar uma
consulta nesse lugar, e não vou aceitar esmolas de ninguém! Eu já fui
humilhada o suficiente. — Saio dali apressada e sem rumo.
— Espera! Ei? Espera!
Ouço ele me chamar mas eu não paro, eu só quero sair daqui, quero
sumir, quero evaporar desse mundo cheio de preconceitos, cheio maldades,
de pessoas ruins. Eu odeio todo mundo. A minha bolsa!
— Merda! Como vou voltar para casa agora? Eu estou longe sem a
minha bolsa e sem os materiais...
Não importa, eu não vou voltar mais naquele lugar, mas como vou
conseguir terminar a faculdade? Já estou no meio do penúltimo ano e falta
tão pouco para me formar, maldita hora que tivemos que nos mudar, trocar
de faculdade foi uma das piores coisas que eu já fiz na vida, eu só aceitei
essa bolsa de estudos porque foi o meu pai quem conseguiu, e a bolsa é
integral, eu não tenho que pagar nenhum centavo das mensalidades, tenho
gastos apenas com os materiais e o transporte.
Ando sem rumo, pensativa, lembrando-me que transei com aquele
infeliz achando que era namorada dele, pensando que ele realmente gostava
de mim e eu me enganei, fui burra demais, fui ingênua, como não percebi
que ele só estava me usando para divertir a faculdade inteira?
Paro abruptamente quando aquele mesmo carro freia bruscamente
bem ao meu lado.
— Seu louco! Está tentando me matar de susto? — Esbravejo
irritada e ele sai do carro apressado.
— Entra no carro ou eu juro que ponho você lá dentro! Eu trouxe
você até aqui então vou te levar de volta... Por favor? Entra no carro? Eu só
estou tentando te ajudar. — Ordena irritado e seu tom de voz me assusta,
mas ele respira fundo com um olhar apreensivo tentando se acalmar.
— Eu não te conheço, não sei como fui parar dentro do seu carro e
te agradeço pela intenção em querer me ajudar, mas eu não vou entrar no
seu carro de novo, se você puder me entregar a minha bolsa, você já vai
estar me ajudando muito... Ahh... Me põe no chão! Seu louco! Me põe no
chão! — Grito para ele me soltar mas ele não o faz, ele me coloca dentro do
seu carro e fecha a porta.
— Ei! O que está fazendo com essa menina? Porque ela está
gritando? — Ouço um homem perguntar preocupado e eu aproveito para
sair do carro novamente.
— Não estou fazendo nada demais, meu senhor, ela é minha
namorada e está fazendo pirraça feito uma criança. — Dispara o infeliz
tentando me pôr novamente no carro.
— Me solta! Eu não sou sua namorada coisa nenhuma!
Empurro-o para longe de mim mas ele me puxa pela nuca me
roubando um beijo, belisco o seu braço para ele me soltar, mas ele não o
faz, seu beijo é forte, intenso e suas mãos seguram firme a minha cintura
para não me deixar sair, mas eu não quero ir a lugar algum.
— Porque não procuram um motel para essa reconciliação? Local
público não é aconselhável. — Dispara o homem e eu me solto desse
estranho completamente ofegante. O que aconteceu aqui?
— Valeu pela dica, irmão! Nós vamos nessa. — O infeliz me põe
dentro do carro e trava a porta para eu não sair.
Estou aérea por conta desse beijo, por ele fez isso? Está tentando
brincar comigo também? Ele dá a volta no carro e entra dando a partida, ele
sai dali e eu fico aqui encarando-o ainda perplexa por ele ter me beijado.
— Para o carro! Eu quero descer! Você é um completo estranho e
ainda é louco. — Contesto evitando encará-lo, estou envergonhada e tensa
por essa situação.
Ainda estou tentando acreditar que passei por uma humilhação
como aquela, o meu pai vai me matar se desconfiar de algo como aquilo.
— Olha, eu não sou um estranho pois já me apresentei, então você
sabe exatamente quem eu sou. Quanto ao beijo, me desculpa mas se eu não
fizesse isso aquele cara ia chamar a polícia, por causa do seu escândalo ele
pensou que eu estava te sequestrando...
— E isso não é um sequestro? Você me disse que é filho do dono da
faculdade, mas não sei o seu nome, não tenho nem como te acusar de
alguma coisa... Oh meu Deus... Você é mesmo o filho do dono da
faculdade? — Contesto séria, mas me espanto a lembrar-me desse detalhe.
Ele é o filho do dono da faculdade e ele me beijou. Com toda
certeza fez isso para rir depois.
— Não seja por isso, meu nome é Bruno Stuart, filho do meio de
Olegário Stuart, o dono das universidades Stuart... E eu não estou te
sequestrando, estou preocupado com você. Me conta o que aconteceu na
faculdade? Eu preciso relatar ao meu pai o que está acontecendo e quero
ouvir a sua versão... Pode confiar em mim? Eu não tenho motivo algum
para mentir para você. — Ele divide a sua atenção entre mim e a pista.
Penso duas vezes antes de abrir a boca e ele volta a me pedir um
voto de confiança. Digo a ele o meu endereço e peço para ele me levar para
casa, mesmo com o coração apertado e receosa pois vou ter que contar aos
meus pais o que houve, antes que eles descubram por terceiros.
Decidido confiar nesse estranho e conto tudo a ele desde a minha
chegada na faculdade a poucos meses, até o acontecido de hoje, não sei se
ganharia alguma coisa processando a faculdade mas eu ameaço fazer isso,
para ele sentir o quanto estou me sentindo mal com tudo que houve, por
incrível que pareça, ele concorda comigo mas pede para antes de tomar
qualquer atitude, para eu conversar com o diretor e também com o pai dele
em uma reunião que ele vai pedir sobre essa situação.
— Eu não vou falar com o diretor! Eu já perdi as contas de quantas
vezes eu fui até a sala dele e nada foi feito, eu não sou a única negra
naquela faculdade e também não sou a única a passar por isso, e nem serei a
última. É um absurdo que ainda existam pessoas assim, perversas,
preconceituosas.
— Eu sei, eu te entendo bem e é exatamente por isso que estou te
pedindo para nos dar uma chance para resolvermos essa questão, com toda
certeza o meu pai não está ciente disso e não quero que você perca a chance
de se formar por causa da negligência do diretor, com toda certeza ele será
devidamente punido por isso. — Suas palavras parecem sinceras mas não
consigo acreditar muito.
— Por favor! Pare o carro? A minha casa não está muito longe
daqui e eu preciso de um tempo. — Suspiro fundo e fecho os olhos com
força antes de abrir.
As minhas lágrimas voltam a descer ao me lembrar daquela terrível
humilhação, não vou conseguir olhar na cara de mais ninguém naquela
faculdade depois de tudo aquilo.
— Você está visivelmente abalada, não é bom você ficar sozinha. Eu
posso ficar aqui com você? Podemos conversar um pouco mais?
— Não! Eu quero ficar sozinha.
— Mas você já está sozinha, eu estou tentando te fazer companhia
justamente para não te deixar sozinha. — Rebate.
— O que você quer comigo? Quer me humilhar também? Não basta
o que fizeram comigo naquela faculdade? Você é dono daquele lugar, como
pode permitir que algo assim aconteça? Eu nunca fiz mal a ninguém para
merecer o que me fizeram comigo, e eu não sou a única a passar por isso...
Semana passada derramaram comida em uma garota só por ela ser negra
como eu, colocaram o pé para uma menina cair de cara no chão por ela
também ser negra, a três dias trancaram um garoto no armário amarrado e
amordaçado, o deixaram lá por horas só por ele ser negro. Estamos
sofrendo perseguição nessa merda de faculdade e ninguém faz nada para
impedir isso! Você é o dono dessa faculdade e mesmo permitindo tudo isso,
quer que eu acredite que está me prestando solidariedade? Conta outra, Sr.
Stuart. — Tento abrir a porta do carro e ele freia bruscamente, parando no
acostamento.
— Eu ainda não sou o dono daquela faculdade, o dono é o meu pai
mas assim que eu assumir a vice presidência vou ficar a frente dessa parte
disciplinar, eu prometo que tudo isso vai mudar... Vou conversar com o meu
pai ainda hoje sobre o que aconteceu, isso não vai ficar impune, é uma
promessa que eu estou te fazendo!
— Não fizeram nada até agora, acha que porque você chegou tudo
vai mudar de uma hora para outra? Eu não acredito em você, nem sei se é
de verdade o filho do dono daquele lugar. — Rebato nervosa pois temo que
o que houve não seja resolvido e eu vou perder a bolsa na faculdade. Não
vou poder concluir os meus estudos.
— Eu prometo que tudo será diferente. Confesso que por termos
outras instituições de ensino para cuidarmos, meu pai pode ter
negligenciado a sua atenção em algumas delas, no entanto, eu mesmo vou
levantar esse assunto com ele e uma investigação será aberta para apurar
esse tipo de crime dentro das nossas universidades. — Seu tom firme e
inquieto chama a minha atenção.
— Vocês tem outras universidades? — Pergunto chocada.
— Sim, essa é apenas mais uma das muitas filiais espalhas pelo
Estados Unidos. Tenho mais dois irmãos, Kevin e Cristiano. Kevin é o mais
velho e acabou de assumir a presidência dos negócios da nossa família, e eu
vou assumir em breve a vice presidência e vou ajudar o meu irmão a
melhorar tudo que for necessário nas nossas redes de ensino, por isso estou
prometendo que tudo será diferente, pode confiar em mim? Não vou
descansar até cumprir a minha promessa. — Suas palavras me deixam
pensativa mas ainda insegura.
— Não te conheço de verdade, não sei se devo confiar você, mas eu
preciso pensar... Eu preciso ficar sozinha um pouco, preciso criar coragem
para contar aos meus pais que não vou mais a faculdade.
— Você não precisa deixar de ir, se quiser faltar por uma semana
apenas para dar um tempo depois do que houve, prometo que suas faltas
serão justificadas como um pedido de desculpas. Você ainda não me disse o
seu nome... Me dá o seu número para entrarmos em contato com você? —
Ele pega a minha mão de forma gentil mas eu solto a sua mão.
— Se é mesmo o filho do dono da faculdade, então você vai
encontrar o meu número de telefone, meu endereço e tudo mais que quiser
saber, a faculdade tem todos os meus dados... Agora por favor? Abra a
porta! — Pego a minha bolsa e as minhas apostilas esperançosa de que ele
não insista.
— Tudo bem, não quero chateá-la mais. Fique com o meu cartão, se
precisar de ajuda ou de qualquer coisa, é só me ligar. Não pense que estou
fazendo isso com más intenções, estou fazendo isso em nome da
universidade, está bem? — O homem ao meu lado me estende um cartão e
eu pego pondo dentro da apostila.
Ele destrava a porta do carro e eu saio batendo a porta, mas ele abre
o vidro.
— Me diz ao menos o seu primeiro nome? — Insiste me fazendo
suspirar fundo.
Ele foi gentil em me tirar daquele lugar, e espero sinceramente que
ele não seja apenas mais um querendo me oferecer ajuda para depois me
humilhar.
— Jennifer...! Meu nome é Jennifer Paiva. — Saio em seguida sem
rumo e sem pressa.
Sigo para casa pensativa e trêmula pois tenho medo da reação do
meu pai, ele é muito conservador por ser cristão, não sei o que será de mim
se um dia ele ver aquele maldito vídeo, vou conversar com ele sem entrar
em muitos detalhes, sem precisar mostrar toda aquela vergonha que eu
passei, talvez assim ele pegue leve comigo.
Não esperava que o Vinícius fosse capaz de algo como aquilo, ele
brincou comigo da pior maneira possível, fingiu gostar de mim só para
conseguir se aproximar, ganhou a minha confiança e eu acabei sendo
humilhada daquela maneira. Não vou entregar a minha confiança de mão
beijada a mais ninguém. Isso é uma promessa que faço a mim mesma.
Paro na porta de casa e respiro fundo, estou andando a horas
evitando encarar a minha família, mas a verdade é que eu preciso deles,
preciso conseguir passar por isso e sei que eles vão me apoiar, vão me
ajudar e talvez possamos voltar para o interior depois que souberem que
não quero mais estudar naquela faculdade. Espero que meu pai não surte
com isso.
Respiro fundo mais uma vez e entro em casa, vejo mamãe andando
se um lado para o outro e meu pai em pé em frente a janela de costas para
mim.
— Parece que tem alguém encrencada. — Yarim desse a escada
correndo mas para quando me ver.
— Do que você está falando? Porque eu estou encrencada? —
Pergunto confusa mas sinto o meu corpo trêmulo.
— Até que enfim você chegou, Jenny! Onde você estava até a essa
hora? Porque não veio para casa assim que saiu da faculdade...
— Janete! Suba com Yarim, eu preciso conversar com Jennifer a
sós. Eu quero ouvir da boca dela, aquelas imagens não entram na minha
cabeça. — Dispara papai ainda de costas para mim.
— Eu não vou sair daqui! Eu também quero saber da nossa filha o
porquê ela fez aquilo... Porque, Jenny? Não foi isso que sonhamos para
você, está dando um mal exemplo a sua irmã, filha. Tudo aquilo é muito
vergonhoso para uma moça como você. — Mamãe chora vindo me abraçar,
mas vejo em seus olhos a mágoa que ela está sentindo e sei que tudo isso é
culpa minha por confiar demais.
Meu peito se apertar pois acho que eles já descobriram sobre o
vídeo e não descobriram por mim.
— Mamãe...
— Saia, Janete! Eu sou o chefe dessa família, então eu vou resolver
esse problema. — Papai finalmente vira-se para mim e ele está sério como
ainda não havia visto.
— Papai, eu posso explicar, se está se referindo ao vídeo...
— Mas é claro que estou me referindo ao vídeo! A minha filha foi
filmada como uma prostituta transando com um qualquer, um
desconhecido! Você está agindo feito uma perdida! Uma mulher indigna. —
Esbraveja furioso e suas palavras me ferem, meu pai nunca falou assim
comigo antes.
— Deixa ela se explicar, Ramiro!
— Explicar o que, Janete! A nossa filha se deixou ser gravada
fazendo sexo como se fosse uma garota de programa, isso tem explicação?
Eu conversei, orientei e neguei que ela se envolvesse com esses garotos da
faculdade, e veja no que deu a desobediência dela! A quanto tempo ela está
agindo assim? A quanto tempo você não é mais virgem, Jennifer? Nem me
responda ou a minha decepção será ainda maior. — Ele vem na minha
direção com um olhar tão severo, ele está visivelmente furioso.
Mamãe se afasta encarando-me tão decepcionada quanto ele.
— Eu sinto muito, mamãe... Eu sinto muito, papai, eu fui uma
vítima...
— Vítima? Você não parecia vítima naquele vídeo, não estava sendo
obrigada a fazer nada, fez porque quis e eu nunca tive tanta vergonha na
minha vida como tenho agora de você... Você não é a minha filha, não
aquela garotinha doce e pura que pensei que fosse, você é uma perdida! É
uma vergonha para essa família e isso não tem explicação.
— Me desculpa, papai? Vamos conversar com calma? Me deixe
explicar o que aconteceu?
— Não tem explicação que apague a vergonha que você nos
causou... A filha que eu sonhei tanto em levar no altar, para entregar ao
homem que a merecesse agora é uma perdida! Uma qualquer! O pastor da
igreja já me ligou, a filha dele de doze anos viu você na internet se
esfregando naquele moleque. Imagina o tamanho da minha vergonha? Você
não consegue imaginar ou não teria feito uma safadeza dessa! Eu não quero
mais você nessa casa! Não vou mais sustentar uma vagabunda! — Ele grita
me acertando uma bofetada e eu vou parar no chão.
— Papai...?
— Ramiro...? O que você fez? Você nunca bateu na nossa filha
antes... — Mamãe questiona espantada e eu ainda estou perplexa.
— Ela não é mais a minha filha! Ela nos envergonhou e trouxe a
desonra para a nossa família. Eu não vou mais admitir isso dentro da minha
casa! EU QUERO ELA FORA DAQUI! AGORA! — Vejo ele socar um
vaso de planta o arremessando longe.
Mesmo assustada eu me levanto do chão e abraço a minha mãe
chorando tão espantada quanto eu.
— Eu não tenho para onde ir, você não pode fazer isso comigo,
papai...? Por tudo que há de mais sagrado...? Me dá mais uma chance? Eu
não sabia que ele ia fazer aquilo ou não teria feito, eu fui enganada, papai?
— Imploro aos prantos aproximando-me dele com cautela.
Ele levanta a mão para me bater novamente, mas ao invés disso ele
me agarra pelo braço e me arrasta até a porta.
— O que vai fazer comigo, papai? Por favor...? Papai, por favor? —
Suplico mas ele não me dá ouvidos.
Papai abre a porta e me joga para fora de casa como se eu fosse algo
inútil que não serve mais. Estou arrasada, o meu coração está dilacerado
com tamanha injustiça pois ele nem me deixou explicar.
— Você não pode fazer isso com a nossa filha, Ramiro! Não precisa
tomar uma atitude tão drástica como essa. — Mamãe tenta vir até a mim
mas ele põe-se na sua frente.
— Eu perdi a minha posição na igreja por causa dela, todos vão me
ver com maus olhos por causa do que ela fez. Se você continuar
defendendo-a, você também vai embora dessa casa! Você devia ter dado
mais orientação a sua filha, devia ter conversado mais e ela não teria feito o
que fez! — Esbraveja encarando a minha mãe com desprezo. Isso me dói.
É culpa minha por ter confiado em alguém que claramente eu não
conhecia. Mamãe tenta mais uma vez vir até mas ele fecha a porta e ouço a
fechadura sendo trancada.
— Espera, papai? Me escuta por favor? Papai? Papai! Me deixa
entrar? Eu não tenho para onde ir, me deixa entrar? — Tento
desesperadamente abrir a porta mas está trancada.
— Não saia daí, filha! Eu vou tentar conversar com o seu pai... Não
vai embora, querida! — Ouço a voz aflita da minha mãe antes do silêncio se
fazer presente.
Choro e me tremo de medo, de angústia. Estou espantada, perplexa
ainda sem acreditar no que acabou de acontecer, essa situação é bizarra, eu
não esperava uma atitude tão drástica do meu pai justamente por ele ser
cristão, por eu ser sua filha. Pensei que ele ficaria ao meu lado mas ao invés
disso, está me tratando igual ou pior que aqueles racistas miseráveis.
O que vai ser de mim se ele não me deixar voltar? Para onde vou?
Não tenho muitas amigas, apenas Tauane sei que poderá me estender a mão.
— Abra a porta, papai? Me deixa entrar? Por favor me deixe entrar?
Não faz isso comigo, pelo amor de Deus? Eu estou implorando! — Agarro
a maçaneta com força tentando desesperadamente abrir a porta, no entanto,
não consigo.
Sento-me na porta de casa e choro, lamento-me profundamente por
ter confiado naquele cretino que em apenas dois meses já disse que me
amava, que ingênua que eu fui, como fui burra de acreditar em alguém
dentro daquela faculdade? Choro insistentemente pois é a única coisa que
posso fazer agora, enquanto ouço os gritos do meu pai repreendendo a
minha mãe.
— Meu Deus, o meu crime não foi assim tão grave, eu só confiei
demais na pessoa errada... Não me desampare agora, por favor? Eu não
tenho para onde ir... Me ajude, meu Deus? — Rezo em voz alta esperançosa
de que Deus ouça o meu clamor.
— NÃO INSISTA, JANETE! NÃO ME ENVERGONHE VOCÊ
TAMBÉM! EU NÃO VOU VOLTAR ATRÁS NA MINHA DECISÃO
POIS SOU UM PAIVA! — Grita aos quarto ventos para quem quiser ouvir.
Meu coração se aperta cada vez mais, aquele desgraçado arruinou a
minha vida, ele me destruiu pois estou perdendo tudo que eu tenho, e eu só
tenho a minha família. Como vou fazer agora sem eles? Para onde vou? O
que vou fazer para me sustentar? Meu Deus me ajuda?
Saio da porta de casa e paro na calçada, encaro a janela do meu
quarto desejando estar na minha cama focada nos estudos como faço todos
os dias, e como será a partir de agora se meu pai não me deixar voltar?
Apenas choro e espero como minha mãe pediu, rezando
mentalmente para que ela consiga convencê-lo a me deixar ficar. Porém,
alguns poucos minutos depois minha irmã sai de casa chorando vindo até a
mim, ela me agarra em um abraço apertado enquanto vejo minha mãe vir
atrás com uma mochila e a minha bolsa.
— Mamãe... Mamãe, me deixe ficar? Eu não tenho para onde ir...
Ela me agarra em um abraço sentido beijando o alto da minha
cabeça, eu choro assim como ela.
— Você errou, filha, errou muito mas eu não desejo esse fim para
você... Você ainda é minha filha e eu te amo, mas eu não posso ir contra o
seu pai, ou ele nos colocará todas nós na rua, e o que vamos fazer? — Seu
tom triste e magoado mostra claramente o desgosto que causei a eles.
— Me perdoa, mamãe? Eu me apaixonei pela pessoa errada e fui
enganada... Ele mentiu para mim quando disse que me amava, foi uma
armação dos garotos da faculdade para me humilhar... Eu não sabia que
estava sendo gravada, mamãe, eu juro... Eu não sabia que algo assim
poderia acontecer. — Desabo em um choro profundo e insistente, mamãe e
Yarim choram junto comigo.
— Eu acredito em você, filha, mas a nossa religião não permite que
uma moça direita fique íntima de um homem antes do casamento, eu fiz
vista grossa para esse relacionamento com aquele garoto pois acreditei que
vocês se entenderiam, pensei que fosse algo sério... Eu não posso ir contra o
seu pai mas eu vou te ajudar no que eu puder sem ele saber... Olha, eu
peguei a sua bolsa e coloquei algumas roupas na sua mochila, coloquei
também algum dinheiro para você se virar por uns dias e vou tentar
continuar te ajudando, mas seria bom que você arrumasse um lugar para
ficar, minha filha, procura alguma das suas amigas e não deixa de me dar
notícias, por favor, querida? — Me orienta entre soluços e volta a me
abraçar.
Tento não chorar mais para não deixá-la ainda pior, tudo isso é culpa
minha por ter me entregado aquele desgraçado infeliz.
— Obrigada por não me virar as costas como o papai fez, mamãe...
Eu pensei que ele fosse me apoiar e ficar do meu lado, mas me enganei. —
Volto a chorar mesmo contra a minha vontade.
— Janete! Yarim! Entrem agora mesmo se não quiserem ir com ela!
— Ouço a voz estridente de meu pai e olho em direção a casa, ele vira o
rosto para não me olhar.
— A minha vida já está desgraçada o suficiente, não quero arrastar
vocês comigo para a rua da amargura... Entrem... Eu mando notícias quando
eu puder... Eu vou sentir tanta falta de vocês. — Abraço minha mãe e minha
irmã mais uma vez.
— Eu vou sentir tanto a sua falta, Jenny... Não quero que você vá.
— Minha irmã deita a cabeça em meu ombro chorando junto comigo.
— Yarim! Janete! — Grita meu pai e elas se soltam de mim.
Mamãe sai apressada arrastando Yarim com ela, as duas entram casa
sem olhar na cara do meu pai e ele fecha a porta sem olhar na minha.
Encaro a porta fechada e tento engolir o choro, olho de um lado para
o outro tentando ter uma ideia de para onde ir agora. A quem vou pedir
ajuda? A minha vida está acabada, destruída.
Pego a mochila e a minha bolsa e limpo o meu rosto, afasto-me da
casa e tiro o meu celular da bolsa, preciso ligar para Tauane, ela será a única
pessoa capaz de me ajudar, é a única amiga sincera que eu tenho.
Ligo para minha amiga e ela atende no quarto toque.
— Jenny? Amiga eu estava mesmo querendo falar com você, queria
saber como você está depois do que houve. Você saiu da faculdade e eu não
consegui falar com você. — Seu tom parece de alívio por conseguir falar
comigo.
— Eu não estou nada bem, Tauane, estou precisando de ajuda, foi
por isso que te liguei... Amiga, eu fui expulsa de casa, os meus pais já
descobriram sobre o vídeo, meu pai ficou furioso e me colocou para fora de
casa, eu não tenho para onde ir, preciso de ajuda e não tenho mais a quem
recorrer... Por favor, me ajude? Eu posso ficar na sua casa por uns dias? —
Explico-me esperançosa e com o coração na mão.
A linha fica muda por um instante, ouço um suspiro pesado que faz
o meu peito se apertar.
— Eu quero te ajudar, amiga, e vou fazer tudo que eu puder por
você, mas os meus pais também já estão sabendo do houve e eu até tentei ir
até você, mas a minha mãe não acha uma boa idéia... Também estamos
sofrendo a mesma perseguição que você e todos os negros naquela
faculdade, minha mãe teme que aprontem comigo também se continuarmos
juntas. Eu só quero que saiba que eu vou estar sempre aqui para o que você
precisar, não importa o que a minha mãe diga, eu não vou me afastar de
você... Eu tenho um dinheiro guardado e vou te ajudar a pagar um hotel ou
uma pensão por uns dias, é tudo que eu consigo fazer nesse momento...
— Tauane, eu agradeço de coração por sua intenção em querer me
ajudar, mas eu já trouxe problemas demais para minha família, não quero te
complicar com os seus pais também... Eu vou dar o meu jeito, não se
preocupe. — Meu coração dói, sangra de medo dessa situação.
— Amiga, eu não posso fazer muito por você mas pelo menos aceite
o dinheiro? Não é muito mas pode ajudar por alguns dias.
— Está bem, eu aceito o dinheiro mas eu prometo que te pago
depois... Não sei como, mas eu vou te pagar... — Minhas lágrimas voltam a
descer mesmo contra a minha vontade.
— Está bem, eu vou fazer uma transferência agora mesmo, se eu
puder te ajudar em algo mais que esteja ao meu alcance, não hesite em me
ligar, está bem? Você vai voltar a faculdade? — Seu tom carinhoso me
acalma um pouco pois sei que está sendo sincera.
— Eu não pretendo mais voltar a essa faculdades, não depois do que
me fizeram pois sei que nada vai mudar... Eu preciso ir, Tauane, eu te dou
notícias, está bem? Obrigada por me ajudar. — Fungo tentando engolir o
choro.
— Eu queria poder te ajudar mais, mas eu não posso, eu sinto
muito...
— Você já está me ajudando muito, amiga, a minha mãe também me
deu algum dinheiro, vou ver o que consigo fazer. Nós falamos depois, até
mais. — Suspiro frustrada e me despeço encerrando a ligação.
Olho de um lado para o outro tentando me decidindo em que direção
seguir, no entanto, não faço a mínima idéia de para que lado ir. Eu preciso
arrumar um trabalho para conseguir me sustentar, eu não vou poder pagar
um hotel e comprar comida por muito tempo. Meu Deus, eu nunca entrei
em um hotel ou motel, qual a diferença de um para o outro? Onde eu posso
me hospedar sem a intenção de transar com alguém?
Sigo para o centro da cidade pois preciso começar a procurar um
trabalho agora mesmo, não posso gastar o pouco dinheiro que tenho antes
de conseguir um trabalho. Paro no ponto de ônibus e me sento ainda com
uma sensação tão dolorosa dentro de mim, como o meu próprio pai foi
capaz de colocar a própria filha na rua, mesmo sabendo que eu não tenho
para onde ir? Minhas lágrimas voltam a descer mas eu seco rapidamente
quando vejo o ônibus vir.
Entro no mesmo e sigo para o centro da cidade, lá será melhor para
conseguir um bom emprego e também o meu pai não vai gostar de saber
que estou por perto, ele está me odiando, nunca vi o meu pai tão furioso, tão
magoado, acho que ele nunca será capaz de me perdoar, mas eu também
não sei se serei capaz de perdoar alguém que me virou as costas em um
momento como esse, eu o amo tanto e pensei que estaria ao meu lado, mas
ele me abandonou, também me humilhou de uma forma tão cruel.
Tento a todo custo não pensar no pesadelo que se tornou a minha
vida, foco a minha atenção nas minhas ideias para conseguir arranjar um
emprego. Abro a minha bolsa e pego um lençol para limpar o rosto, pego
também o estojo de maquiagem e me olho no espelho, estou horrível, me
maquiei para encontrar aquele infeliz na faculdade mas tudo foi um terrível
pesadelo, nunca pensei que algum dia passaria por algo assim.
Limpo o meu rosto e refaço a minha maquiagem aqui mesmo dentro
do ônibus, recebo alguns olhares curiosos e outros de nojo, mas não me
importo, já estou me acostumando a ver essas pessoas ridículas que
preferem ser preconceituosas, Deus não fez ninguém igual a ninguém,
porque eu tenho que ser como eles? Eu amo a minha cor, amo ser negra e
essas pessoas não são melhores do que eu só por serem brancas.
Desço no centro da cidade e passo em algumas lojas perguntando
sobre vagas de emprego, a maioria me dão a mesma resposta. Não! Mas eu
não vou desistir, não sou uma fracassada como muitos pensam, eu sei que
sou forte e eu vou continuar correndo atrás.
Entro em uma sorveteria e compro um picolé, andei demais e estou
morrendo de calor. Sento-me colocando a bolsa sobre a mesa e a mochila
no chão não meu lado.
— Com licença, deseja mais alguma coisa? — Pergunta um rapaz
mais ou menos na minha idade com um bloquinho de pedidos na mão.
— Não, eu vou ficar só no picolé mesmo... Mas estou precisando de
um emprego, você saberia me dizer se algum lugar por aqui está
contratando? No desespero em que estou eu aceito até limpar o chão. —
Suspiro frustrada.
— Poxa, se você tivesse aparecido ontem, você teria conseguido a
vaga de caixa, mas já foi ocupada. — Ele parece tão frustrado quanto eu.
— É uma pena mesmo, mas tudo bem, eu vou continuar tentando...
Eu vou indo, obrigada. — Lamento profundamente por não estar tendo
sorte em encontrar um emprego.
Mas não vou desistir, vou continuar tentando mas eu preciso comer
algo, eu só tomei o café da manhã mas saí de casa tão ansiosa que não comi
muito, a hora do almoço já passou e eu estou morrendo de fome. Por aqui
tudo é muito caro mas eu preciso pelo menos comer um lanche, um pão ou
algo que me ajude a permanecer de pé.
Saio da sorveteria e ando um pouco mais, vejo uma loja de roupas e
decidido entrar para tentar a sorte mais uma vez.
— Boa tarde! Eu gostaria saber se vocês estão contratando, eu estou
precisando muito trabalhar, e...
— Como é que é...? — Me interrompe uma mulher de nariz em pé
rindo na minha cara.
— Eu preciso trabalhar, senhora, estou andando o dia inteiro e...
— Me desculpa mas não estamos contratando... Eu não sei se você
percebeu, mas aqui só trabalham pessoas brancas, querida, então nunca terá
uma vaga aqui para você, é melhor você tentar uma vaga no subúrbio, lá
você encontrará pessoas do seu nível. — A mulher me olha de cima abaixo
com um olhar de desdém.
— Que cabeça a minha procurar emprego justo em uma loja como
essa, eu morreria picada por cobras peçonhentas se eu passasse mais de um
minuto ao seu lado, deve ser por isso que a sua loja está tão vazia, não é?
Com licença. — Sorrio com deboche e saio daqui deixando a mulher
chocada.
Estou cansada de abaixar a cabeça toda vez que alguém me
desrespeita, não estou nesse mundo para isso então preciso ser mais forte do
que realmente sou, mas como conseguir isso sozinha?
São oito horas da noite e eu estou um caco de tão cansada, nunca
precisei andar tanto em toda a minha vida e eu estou esgotada. Paro em uma
praça e compro um cachorro quente e um copo de guaraná, me sento e
como feito uma esfomeada pois hoje o meu almoço foi um pão com
mortadela e um copo de suco, e a minha janta será apenas esse cachorro
quente apenas para não ficar de estômago vazio.
Passo algum tempo aqui pensativa admirando algumas família
passeando, conversando e brincando enquanto eu estou longe da minha
família. Meu Deus, o que eu fiz foi assim tão grave para o meu pai tomar
uma atitude como essa? Se ele não é capaz de me perdoar e ficar ao meu
lado, quem vai ficar?
Depois de um tempo saio da praça e sigo a procura de um lugar para
dormir, procuro por uma pensão mas não encontro, parece não existir isso
por aqui, esses hotéis do centro são muito caros e eu já andei ligando para
alguns deles, apenas para não ter que ir até lá pessoalmente. Se eu tiver que
voltar para o bairro onde moro, vai ser mais um gasto com passagem pois
amanhã terei que voltar aqui outra vez. O que eu faço, meu Deus? O que eu
faço?
Não posso dormir na rua então decido procurar um hotel que seja
mais barato que os outros, eu preciso economizar o máximo que eu puder
até conseguir um emprego para me manter sozinha, sem depender de
ninguém, mas o dinheiro que eu tenho no máximo durará uma semana e eu
tenho que pagar um lugar para dormir e me alimentar para não morrer de
fome.
As dez da noite eu finalmente estou entrando em um hotel e por
sorte eles servem café da manhã incluso no valor, e isso me agradou
bastante, menos uma refeição para eu pagar pois se eu tiver um bom café da
manhã, talvez consiga aguentar até a janta. Meu Deus, que situação.
Depois de um banho bem demorado aproveitando a água quente, eu
visto uma lingerie e um blusão confortável, me jogo na cama e tento dormir
para descansar do terrível dia de hoje, mas minhas lágrimas descem no
instante em que imagens do que houve na faculdade invadem a minha
mente, seguidas pelo surto do meu pai em me pôr na rua.
Choro com a cara enterrada no travesseiro para que não me ouçam
lá de fora, choro o quanto aguento até pegar no sono, durmo desejando com
toda a minha alma sonhar com algo bonito pois a minha vida está muito
feia.
Acordo amanhã seguinte com o telefone ao lado da cama tocando,
atendo e é da recepção e a recepcionista pergunta se eu vou querer dobrar a
diária, digo que não e pergunto pelo café da manhã, ela pede para eu descer
até o salão e eu devo me apressar, pois está terminado o horário do café da
manhã. Apenas concordo.
Pego o meu celular e ele está descarregado, ótimo! Só me faltava
isso. Procuro pelo carregador na minha bolsa e não está, mamãe esqueceu
de pôr o carregador na minha bolsa e eu terei que comprar outro. Visto-me
o mais rápido que consigo e saio apressada para conseguir tomar café, eu
dormi demais e o celular não despertou porque está descarregado, mas pelo
menos eu consegui descansar bastante para a minha luta de hoje.
Entro no salão do café da manhã e sirvo-me, acomodo-me em uma
mesa distante de algumas pessoas que tem a sua atenção em mim, mas tento
não dar atenção a elas e como até me sentir satisfeita, e estava tudo uma
delícia. Termino o meu café e pego as minhas coisas saindo em seguida,
preparada para mais uma vez procurar por uma vaga de emprego, e que
Deus me ajude a encontrar algo logo.
Meus pensamentos vão nos meus pais e minha irmã, como pode de
uma hora para a outra a gente perder tudo que tem? Como pode uma pessoa
cristã fazer o que o meu pai fez? Ele só se preocupou com a sua posição na
igreja e não mediu as palavras e nem as suas atitudes. E o Vinícius? Porque
existem pessoas como ele capaz de brincar e humilhar assim uma pessoa
apenas por prazer? Se fui burra e ingênua? Sim, mas em um lugar onde
você não conhece ninguém, e alguém aparece todo atencioso quando o resto
dos colegas estão te virando a cara, você acaba confiando demais e acaba
quebrando a cara, sei que nem sempre é assim mas no meu caso, eu não dei
muita sorte.
Respiro fundo e sigo direção contraria da que eu fui ontem
procurando emprego, espero sinceramente ter mais sorte hoje.
Amanhã vai fazer uma semana que estou andando sem parar e ainda
não consegui um trabalho para me sustentar, muitas pessoas não quiseram
me contratar por eu ser negra, e isso era visível na maneira como me
olhavam, nem precisavam dizer nada. Outra simplesmente pegaram o meu
contato com a promessa de ligar depois, porém, até agora ninguém me
ligou. Em outros lugares também não tive sorte pois sempre me diziam que
a vaga já havia sido preenchida, fazer o que? Eu preciso continuar tentando
pois o dinheiro está acabando.
Dessa vez estou andando pelo bairro onde meus pais moram, já
rodei tudo por aqui mas também não consegui nada, muitos me apontam
pelo vídeo que aquele canalha colocou na internet para acabar de vez com a
minha vida. Eu liguei, ameacei processá-lo se ele não tirasse o vídeo da
internet, contei aos pais dele sobre o que ele fez, e mesmo me olhando torto,
ele obrigaram Vinícius a retirar o vídeo, mas parece que todos já viram pois
todos comentam.
Não tenho mais o que fazer nesse lugar, mas para onde eu vou
agora? O dinheiro que eu tenho não dá mais para pagar um hotel, onde vou
dormir hoje? E amanhã e depois? Esfrego as mãos no rosto e paro em um
ponto de ônibus, passo longos minutos aqui tentando pensar em uma saída,
mas assim como todos esses dias, não consigo pensar em nada.
O ônibus vem e eu dou sinal, subo no mesmo instante em que ouço
alguém me chamar.
— Jennifer!
Olho para os lados mas não vejo ninguém, entro no ônibus e pago a
minha passagem, o ônibus sai em seguida mesmo eu ouvindo um carro
buzinar. Sento-me no banco da janela pensativa sobre onde vou conseguir
dormir hoje, não consigo pensar em nada pois nem dinheiro para alugar um
albergue eu não tenho, se eu tivesse descoberto esse lugar antes eu não teria
gastado tanto com hotel, de todo jeito iria faltar o dinheiro da comida mas
pelo menos eu teria uma cama quentinha para dormir.
Pedi uma vaga de garçonete em um restaurante hoje e também
ficaram de me ligar, vou rezar o quanto eu aguentar para conseguir qualquer
coisa para fazer, mas sei que o salário que devem pagar naquele restaurante
deve ser muito bom, mas teria que ter dois empregos para conseguir pagar
um aluguel, me sustentar e pagar a faculdade em outro lugar, pois naquela
eu não ponho mais os pés.
Depois de alguns longos minutos eu finalmente desço no centro da
cidade, porque eu voltei para cá? Simples! Meu pai não quer me ver nunca
mais então não posso ficar tão perto dele, além do más, a praça do centro é
bem menos perigosa que a praça perto da casa dos meus pais, e talvez hoje
tenha que dormir na rua é quero estar em um lugar bem movimento, assim
não corro o risco de ser maltratada, roubada ou estuprada com tanta
facilidade, com pessoas por perto eu posso gritar por socorro e rezar para
que não me virem as costas também.
Sigo até a praça e sento-me no primeiro banco que vejo, ponho a
minha mochila ao meu lado e seguro a minha bolsa no colo, olho de um
lado para o outro mais uma vez me dando conta da minha devasta solidão.
Tentei ver a minha irmã na escola dela por duas vezes mas o papai está
buscando ela pessoalmente, tentei ligar para casa mas na maioria das vezes
era ele quem atendia então eu desligava, ainda não pude ver a minha mãe
depois do houve e eu estou me sentindo tão mal por isso, estou literalmente
sozinha nessa vida e não sei mais o que fazer.
As pessoas me humilham, me julgam e me apontam, me maltratam e
eu não tenho ninguém por mim, que sentido há em fazer parte desse mundo
quando tudo está indo de mal a pior? Mas minhas condições, o que me resta
para desgraçar a minha vida de vez?
Estou presa nos meus pensamentos quando sinto alguém arrancar a
minha bolsa da minha mão, e correr para longe de mim.
— MINHA BOLSA! LEVARAM A MINHA BOLSA! LADRÃO!
LADRÃO! — Pego a minha mochila correndo atrás do infeliz.
Alguns rapazes vêem o meu desespero e correm atrás do garoto,
paro de correr quando sinto que estou sem fôlego. Infeliz miserável! Levou
o meu celular e o pouco dinheiro que ainda me restava, nem um cachorro
quente vou conseguir comprar hoje.
Choro de raiva, de ódio desejando matar alguém, por sorte eu havia
colocado os documentos na mochila depois de tirá-los para mostrar no
restaurante, mas o pouco dinheiro que eu tinha para conseguir comer hoje
eu acabei de perder. Já vi que essa praça não é tão segura o quanto pensei,
mas para onde vou agora?
Saio novamente da praça ainda chorando de raiva, mas ouço alguém
me chamar.
— Ei! Morena! — Olho para trás e vejo vir na minha direção os
garotos que correram atrás do ladrão. — Olha, infelizmente o pivete
conseguiu fugir, sinto muito mas a sua bolsa já era. — Ele toma fôlego
cansado por ter corrido.
— Tudo bem, muito obrigada pela intenção em me ajudar.
Obrigada. — Agradeço limpando o rosto e saio em seguida.
Ando sem rumo sem saber para onde ir, nem dinheiro para voltar
para o meu bairro e pedir mais dinheiro a minha mãe, eu não tenho, perdi
também o meu celular e não tenho como ligar para ninguém, o número de
Tauane era novo e eu ainda não havia memorizado, se eu ligar para casa
novamente o meu pai não vai me deixar falar com a minha mãe, nunca dou
sorte dela atender ao telefone pois acho que ele já espera que eu ligue
pedindo para voltar, mas eu não vou voltar, mesmo que eu continue
passando fome, mesmo que eu durma na rua e seja assaltada novamente eu
não volto para casa, meu pai me jogou na rua para eu passar por tudo isso,
então eu não volto mais para aquela casa, não com o coração tão ferido
como está agora.
Não gosto de guardar mágoa de ninguém mas hoje eu tenho motivos
de sobra para isso, talvez um dia isso passe, no entanto, sinto que não
acontecerá tão cedo e não estou me importando com isso. Não posso passar
a vida inteira me desculpando por algo que eu não esperava que
acontecesse, ele nem quis me ouvir, o meu pai me virou as costas e ainda
ameaçou minha mãe caso ela me ajudasse. Eu estou literalmente perdida, se
eu procurar por ela e ele a maltratar por minha culpa, vou me sentir ainda
pior.
Paro em um ponto de ônibus algumas quadras depois da praça, me
sento e fico aqui perdida em pensamentos, desnorteada sem saber o que
fazer. Já está escurecendo e o frio está chegando junto à escuridão da noite,
onde posso ir para me esconder do frio? Onde posso dormir sem ser atacada
novamente? Estou morrendo de fome, estou com a garganta seca de tanta
sede.
Vejo um barzinho do outro lado da rua e decidido ir até lá pedir um
copo d'água, não é a primeira vez que faço isso hoje, e pedir não é um
crime, preciso tentar sobreviver da maneira que dê.
Atravesso a rua e entro no bar, vejo um homem de meia idade atrás
do balcão e sigo até ele.
— Com licença, senhor! Eu estou morrendo se sede mas não tenho
dinheiro para comprar água, eu acabei de ser assaltada, seria possível o
senhor me dá um copo d'água? Pode ser da torneira mesmo, não tem
problema. — Peço com o coração apertado por viver uma situação como
essa.
— Espera um minuto!
O homem me olha de cima abaixo me analisando e sai em seguida,
porque ele me olhou assim? Com que intensão ele me olhou assim? Suspiro
fundo e tento não ver maldade em todo mundo, eu estou péssima, estou um
caco e deve ser por isso que ele me olhou daquele jeito, devo estar
parecendo uma moradora de rua pedindo água.
— Aqui está a água!
O homem coloca um copo grande de água sobre o balcão e parece
gelada, bebo com gosto até a última gota, meu estômago até dói pelo tanto
de água que bebi de uma só vez, não parei nem para respirar.
— A moça está com problema? Eu não te conheço de algum
lugar...? Você tem onde ficar? Eu tenho um quartinho em cima do bar e
talvez você goste de ficar nele. — Sugere o homem novamente me
analisando.
Como ele pode me conhecer de algum lugar? Eu nunca o vi mais
gordo. E com que intensão ele está querendo me ajudar?
— Me desculpe, mas, eu não o conheço. Onde o senhor pode ter me
visto? — Pergunto curiosa.
— Talvez de um vídeo na internet, o seu rosto não é muito comum,
não tem como esquecer... Olha, se estiver mesmo com problemas, eu posso
te dar comida e uma boa grana se você quiser ficar. — Ele sorrir de lado e
eu me afasto espantada com a sua sugestão.
— Obrigada pela água, com licença.
Pego a minha mochila e saio dali apressada, o homem me chama
mas eu corro sem olhar para trás, estou sendo vista como uma garota de
programa, uma prostituta como o meu pai mesmo me chamou. Quero
chorar para me desabafar mas eu já chorei tanto, que não consigo mais
deixar uma única lágrima cair, estou arruinada, a minha vida está mesmo
destruída.
Quantas pessoas mais viram aquele vídeo? A cidade inteira? O
mundo todo? Esfrego as mãos no rosto me sentindo zonza, para um pouco
apenas para tomar fôlego e volto a caminhar, quando dou por mim estou na
frente da rodoviária de Cleveland e sei que lá dentro tem banheiros
gratuitos e ela fica aberta a noite toda. Vou tentar a sorte, posso me encostar
em qualquer lugar e dormir um pouco também, assim o faço.
Entro na rodoviária e procuro pelo banheiro público, entro no
mesmo e a primeira coisa que faço e me lavar da maneira que dá, molhando
uma blusa e passando no corpo. Depois de me higienizar eu troco de roupa
e visto um casaco pois está frio, coloco o capuz para não ser reconhecida
caso mais alguém por aí tenha visto aquele maldito vídeo.
Saio do banheiro a procura de uma poltrona confortável para me
sentar um pouco e descansar, não sei se vão me deixar dormir aqui ou se
vão me pôr para fora, mas vou ficando por aqui até eu puder. E assim o
faço, passo tanto tempo sentada que pego no sono sonhando com a comida
deliciosa da minha mãe, como eu fui perder tudo isso?
Tento apenas dormir o máximo que eu conseguir, mesmo que não
me deixem passar a noite toda aqui, se eu conseguir descansar já vai me
ajudar muito.
Acordo com um alvoroço de gente conversando e me sento
esfregando os olhos, são quatro horas da manhã e já tem muita gente
chegando e saindo da cidade. Está muito frio, ainda estou com muito sono,
sede e fome, porém, levanto-me e vou ao banheiro lavar o rosto e tentar
melhorar a minha aparência.
Até ontem eu estava dormindo em uma cama macia de hotel, o hotel
mais barato que encontrei mas foi de grande serventia, mas hoje é a
primeira de muitas noites que passarei dormindo sentada em algum lugar
que não seja uma cama macia, isso se eu não conseguir logo um emprego e
eu espero ser chamada logo, mas até eu receber o meu primeiro salário vou
ter que dormir assim, vagando por aí tentando seguir em frente, mas não sei
até quando sou capaz de aguentar tudo isso. Não sou tão forte o quanto
tento parecer.
Volto para a mesma poltrona onde dormi e me sento novamente, fico
aqui atenta as pessoas que entram e sai enquanto espero o dia clarear, não
vou conseguir dormir de novo com tanta gente chegando e saindo desse
lugar, mas graças a Deus eu consegui dormir tranquila sem me preocupar
que alguém me ataque novamente, se levassem a minha mochila pelo
menos os documentos estão no bolso da minha jaqueta, e eu vou precisar
muito deles para ser contratada.
Quando o dia finalmente amanhece e eu vejo que o sol já saiu, eu
saio novamente sem rumo e paro em uma praça para ficar um pouquinho no
sol, é a mesma praça onde fui assaltada, mas hoje não tenho nada de valor
para levarem, mas me dou conta de um detalhe.
— Como vão entrar em contato comigo para falar de emprego se
levaram o meu celular...? Eu não acredito nisso.
Mais uma vez estou frustrada e me sentindo derrotada, eu perdi a
guerra e todas as batalhas, não seria melhor desistir de tudo?
— Meu Deus, dai-me forças? Eu não quero desistir pois não sou
assim, tu conheces a minha vida mais do que eu mesma, então me ajude a
aguentar um pouco mais? Me ajude a sobreviver? Se eu pequei por confiar
demais, peço que me perdoe...? Mas por favor...? Por tudo que há de mais
sagrado, meu Deus...? Me ajude a sair dessa situação...? Eu estou
suplicando, me ajude? Eu estou tão desesperada que temo fazer uma
besteira e eu não quero isso, pois sei que não vais me perdoar. — Sinto as
minhas lágrimas voltarem a aparecer e a angústia em meu peito voltar a
crescer.
Me sinto mal por pensar em fazer um besteira, mas na hora do
desespero a gente não pensa nas consequências e eu preciso ser forte.
DIA SEGUINTE...
UM MÊS DEPOIS...
— Sei que você está cansado da viagem, meu filho, mas eu preciso
saber como andam as disciplinas nas nossas instituições, há algum
problema grave para ser reportado? Eu vou precisar ir a alguma delas? —
Questiona papai assim que entro na sala da presidência. Meu irmão também
está atento a mim e sei que nenhum deles vão gostar de tudo que eu tenho
para contar.
— Infelizmente sim, papai! Três das nossas filiais estão passando
pelo mesmo problema da Matriz, e pior, estamos sendo processados e
Fernando Belmonte não nos informou nada! Ele está negligenciando atos de
fraudes com os gabaritos das provas semestrais, favorecendo alunos que
pagam para serem aprovados, há também atos de preconceitos contra uma
turma espacial e tudo mais que o senhor possa imaginar, a nossa unidade
está uma verdadeira bagunça! Uma vergonha para o nome da nossa família.
Eu já o denunciei ao conselho e você terá que ir até Nova York! — Jogo
uma pasta com os relatórios sobre a mesa e vou até o bar. Sirvo-me uma
dose tripla de uísque.
— Eu não esperava que as coisas estivessem tão sérias... Não vou
poder viajar agora, o seu casamento é em três dias e eu preciso estar aqui.
— Argumenta pensativo e eu no lugar dele estaria preocupado.
— Você citou três unidades com problemas, Bruno, quais são as
outras? — Kevin abre os relatórios analisando-os.
— Los Angeles e Detroit! Nessas duas o problema não é tão grave
mas ainda assim, é sério. Precisamos de gente de confiança e é isso que está
nos faltando. — Me sento à frente da sua mesa enquanto ele está atento aos
documentos.
— Você tem toda razão, filho, precisamos de mais gente de
confiança e eu vou correr atrás disso assim que passar o seu casamento.
Você está fazendo um excelente trabalhando e eu estou orgulhoso de você,
sei que vou poder ficar tranquilo depois que deixar de vez o comando dos
nossos negócios nas mãos de vocês... Agora só falta fazer Cristiano tomar
juízo, ele viajou a quase um mês e ainda não deu sinal de vida, estou
preocupado. — Encaro meu pai e vejo realmente o quanto ele parece
angustiado em relação ao meu irmão.
Mas se for para ele atrapalhar a minha vida e continuar ofendendo
Jenny, eu prefiro que ele continue onde está.
— Eu vou te acompanhar na viagem, papai, ainda falta visitar as
filiais da...
— Não, Bruno! Você não pode ir comigo, e a sua lua de mel? Você
já fez o bastante, quando vocês voltarem da viagem você continua de onde
parou. — Papai também se serve de uma dose de uísque e eu me levanto.
— Eu não quero parar o meu trabalho, papai, e Jennifer também não
vai poder viajar, ela está na semana de provas e não quer faltar, não quer ter
regalias por se casar comigo, ela é bastante comprometida com os estudos,
é esforçada pois quer se formar como prometeu a si mesma... Dá gosto vê-
la estudando... Jenny é a única mulher que já mereceu a minha confiança, o
meu carrinho. — Sorrio ao me lembrar dela.
Já tem quase duas semanas que não nos vemos e nos falamos apenas
por telefone, eu estou com saudades dela, a gente saiu bastante antes das
minhas viagens, nos divertimos bastante e eu estou me apegando a ela mais
do que eu gostaria.
— Não adianta negar, irmãozinho. Você está se apaixonando pela
sua noiva e ela por você... Você conseguiu! Vai se casar depois de provar a
todos o quanto é responsável, o seu desempenho e comprometimento com o
trabalho está agradando não só ao nosso pai, mas a todos do conselho. —
Dispara Kevin me deixando pensativo, mas também orgulhoso de mim
mesmo por mostrar a todos que eu sou capaz.
Mas ele tem razão, estou me apaixonando pela minha noiva e isso
está me assustando, não estava nos meus planos me apaixonar por ela mas
essa mulher me deixa louco, o seu jeito espontâneo, a sua força de vontade,
o seu caráter, aqueles lábios que a cada dia mexem mais comigo, aquele
maldito sorriso que não me deixa dormir antes de ouvir a sua voz. Suspiro
fundo. Estou ferrado! Estou literalmente ferrado!
— Essa menina tem grande influência nessa sua mudança, Bruno,
você não se prendia a ninguém mas se prendeu a ela quando decidiu ajudá-
la... Eu gostei da sua ideia de pôr Jennifer como porta voz dos
acontecimentos na universidade, isso deu super certo e você devia fazer isso
nas outras unidades. Todos a estão respeitando, estão até mesmo temendo a
Jennifer por ela ter contato direto com os Stuart, e isso mesmo sem saberem
que vocês vão se casar. — Pelo seu tom de voz vejo claramente o quanto
ele parece orgulhoso de mim, e isso me deixa feliz.
— Eu só fiz isso na intenção de deixá-la segura, papai, não só a ela,
mas os outros alunos que sofrem perseguição também, isso vai inibir atos
desrespeitosos dentro da nossa universidade, isso tem que acabar e como
está me dando carta branca para agir, eu vou sim integrar esse método em
todas as nossas unidades de ensino. Podemos também premiar o aluno que
ficar responsável por essa fiscalização, o que acha? — Sugiro empolgado e
recebo aquele seu olhar de admiração.
Meu peito se enche de uma felicidade tão grande quando ele me
olha assim, pois sei que está orgulhoso de mim, sei que está aprovando as
minhas ideias, sei que está confiando e acreditando em mim, está
valorizando as minhas decisões.
— Faça isso, filho! Eu assino em baixo nessa sua decisão. Você e
seu irmão vão se tornar uma excelente dupla trabalhando juntos. — Ele
abraça-me pelos ombros e admira o meu irmão na sua mesa atento a nós.
Sorrio abertamente por fazer parte de grandes melhorias nas nossas
instituições, e sei que a mamãe e Jennifer também vão se orgulhar de mim.
— Eu preciso ir agora, papai, estou exausto e louco para descansar
da viagem, eu nem fui em casa ainda, vim direto para o escritório. — Pego
a minha mochila sobre a cadeira ansioso para sair daqui e descansar um
pouco.
— Vai sim, filho, a sua noiva está sentindo a sua falta.
— Como assim, papai? Ela disse alguma coisa? — Indago surpreso.
— A sua mãe foi vê-la ontem, parece que ela estava com muita
cólica, coisa de mulheres e ela parecia mal, sua mãe deu folga a ela e
passou para vê-la, ela estava dormindo agarrada ao seu travesseiro, dormia
com um sorriso no rosto e quando acordou perguntou quando você voltava,
se iria demorar. — Conta atento a mim como se me analisasse.
— É perfeitamente normal, papai, ainda estamos nos conhecendo e
nos apegamos um ao outro. Mas decidimos dar um passo de cada vez já que
estamos correndo tanto com o casamento. — Desabafo pensativo e tentando
não confessar que tudo isso não passa de um acordo entre mim e ela.
— Eu entendo, filho, mas após o casamento vocês vão ter que dar
um passo a mais na vida de vocês, um passo íntimo, se é que me entende.
— Eu sei, papai, quanto a isso você não tem que se preocupar, as
coisas estão progredindo bastante entre a gente, consumar o meu casamento
não será algo tão difícil, se é que me entende. — Minto e rezo mentalmente
para ele esquecer esse assunto.
Eu e Jennifer estamos sim nos dando bem, mas acho que para ela
não acontecerá nada entre nós além de amizade, e ela dizer que sente
saudade é apenas parte do nosso acordo. Dormimos juntos algumas vezes
quando Kevin dormiu lá em casa com a esposa e também quando dormimos
na casa dos meu pais, mas não aconteceu nada demais, apenas dormimos e
ela fez uma barreira de travesseiros entre nós, não teve como não sorrir por
isso mas depois me senti frustrado.
Não vou negar que queria acordar com ela em meus braços, mas não
aconteceu então vida que segue.
Despeço-me do meu pai e meu irmão e saio em seguida para evitar
mais perguntas, desço os quinze andares com os olhos pregando de sono,
estou exausto, cansado e louco para dormir um pouco mais que apenas
cinco horas de sono. Nas minhas viagens eu me reuni com os professores e
reitores das universidades pelo menos três vezes na semana, os dias que eu
tinha para relaxar eu me afundava no trabalho para preparar um relatório
descente para apresentar a meu pai e meu irmão.
Também cheguei a conversar com muitos alunos que assim que
souberam da minha presença na universidade, vieram espontaneamente me
abordar sobre o que estava acontecendo, alguns alunos preferiram conversar
comigo fora da universidade por medo e receios de sofrerem uma punição
por parte do reitor, ou até mesmo dos professores que estão acobertando
esses atos abomináveis, e foi lamentável tudo que ouvi, mas vamos
solucionar todos esses problemas e eu vou estar à frente de tudo.
Saí do prédio e sigo direto para casa, estou indo de táxi pois mandei
que pegassem o meu carro no estacionamento do aeroporto, afinal, eu não
sabia quanto tempo passaria nessa viagem. Poucos minutos depois estou
descendo do táxi nos portões de casa, pago o taxista e entro pelo portão
cumprimentando os meus seguranças, e um deles me segue até a entrada da
casa enquanto relata tudo sobre a segurança enquanto estive fora, e parece
que está tudo em ordem.
Entro em casa me deparando com Jennifer em cima de uma escada
pendurando um quadro coma a nossa foto na parede. Aproximo-me atento e
paro atrás dela admirado as suas belas pernas, a sua bunda redondinha nesse
shortinho curto, a sua cintura bem desenhada, e... Merda! Se controla,
Bruno!
— O que está fazendo, Jenny?
— Ahhh!
Ela grita pelo susto e se desequilibra, Jennifer cai da escada
dobrável mas amparo-a em meus braços. Ela abraça o meu pescoço
ofegante mas abre aquele seu sorriso encantador.
— Oi, estranho...? Você me assustou...
Ela ainda ofega e eu afasto-me da escada admirando o nosso quadro
que ela pendurou na parede.
— Ahm... A sua mãe está começando a desconfiar da gente, ela
perguntou por que não há fotos nossas pela casa já que estamos nos
conhecendo, e obviamente vamos nos casar. Eu também tive que correr para
o seu quarto quando ela veio me ver e eu acabei dormindo na sua cama,
espero que não se incomode por isso. — Ela fica envergonha e eu sorrio.
— Está tudo bem, não se preocupe com isso. — Ando pela sala com
ela ainda no colo e ela parece não se incomodar com isso.
— Tem mais uma coisa! A sua mãe disse que teremos que ficar na
mansão até o casamento, isso a partir de hoje.
— Não me surpreendo, eu já esperava por isso pois com Kevin e
Teresa foi igual, eles também se casaram na mansão a cinco anos atrás. —
Ponho ela no chão e vejo que ela fica pensativa.
— A sua família e amigos vão estar todos presente, por mais que
não seja um casamento de verdade, eu não terei ninguém da minha família
aqui comigo e isso me incomoda. — Suas palavras são sentidas, tristes
exatamente como quando a conheci.
— O nosso casamento vai ser de verdade, Jennifer, pelo menos para
todos a nossa volta sim, pois você carregará o meu nome, viverá comigo e
terá todos os direitos de uma esposa. Apenas quando estivermos a sós longe
de todos, não precisaremos nos preocuparmos em fingir nada. — Sento-me
no sofá exausto e louco por um banho.
— Essa é mais uma questão que está me preocupando, Bruno, a sua
cunhada e sua mãe estão estranhando o fato de não nos verem mais íntimos,
eu me justifiquei dizendo que sou tímida em relação a expressar atos
íntimos na frente de pessoas, e mesmo depois daquele maldito vídeo elas
acreditaram em mim, mas um ano é muito tempo para fingirmos, não sei se
vamos conseguir passar por isso.
— Relaxa! Vai dar tudo certo. Podemos simular algumas pequenas
brigas para justificar a falta de intimidade, mas nada que seja muito
exagerado, não podemos dar a entender que podemos nos divorciarmos
agora, ou eles realmente vão descobrir o nosso acordo... Por falar em
acordo, o que achou da casa nova? Terminou de decorar? Conseguiu falar
com a sua mãe como você pretendia fazer? — Indago curioso e ela para na
minha frente de braços cruzados.
— Ainda não, Tauane entregou o meu número novo a ela mas até
agora ela não me ligou. Com certeza o meu pai não deixou ela ligar... Eu
pedi para minha amiga não dizer nada sobre o casamento, ou o meu pai iria
ficar sabendo com certeza... Não quero ser humilhada por ele novamente,
pois com certeza ele jogaria na minha cara que estou me casando por
interesse, só pelo fato de você ser rico e eu uma pobretona morta de fome.
— Ela força um sorriso e limpa o rosto discretamente. Sei que ela ainda
sofre muito pelo abandono dos pais, mas ela tem disfarçado bem.
— Em um momento assim a gente dispensa as palavras, tudo que
pode nos confortar é um simples abraço. — Levanto-me de braços abertos
para ela.
Suas lágrimas voltam a cair mas ela vem para os meus braços.
Jennifer me abraça tão apertado que eu retribuo acariciando as suas costas.
Ficamos em silêncio mas ouço ela fungar, sei que a dor por perder a sua
família dessa maneira ainda é muito grande, estão todos vivos mas é como
se não estivessem. Ela está sendo literalmente ignorada pela família e isso é
muito triste.
— Não fica assim...? Te ver triste me deixa muito mal, as vezes até
me sinto um canalha achando que estou me aproveitando da situação para
você me ajudar. Não é a minha intensão me aproveitar de você, eu só pensei
que poderíamos nos ajudar. — Aperto ela contra o meu peito e ouço ela
soltar uma respiração pesada.
— Você não me obrigou a nada, você me fez uma proposta e eu
aceitei, então não tem que ficar se sentindo mal por isso... Você está me
ajudando muito então é justo que eu te ajude também. — Ela ergue o rosto
para me encarar.
Apesar da tristeza em seus olhos, eles ainda brilham de forma
inexplicável. Toco o seu rosto admirando esses lábios fartos aqui de
pertinho, a minha vontade de beijá-la me domina e me faz ofegar, me faz
desejá-la como um louco insano e não sei até quando vou conseguir me
controlar.
— Jenny...
Aperto-a em meus braços sentindo o quanto ela está tensa, mas ela
também prende a sua atenção na minha boca me deixando ainda mais
confuso, será que ela sente algo por mim? Ela vai me rejeitar se eu a beijar?
— Meu Deus, se beijem logo! — Assusto-me com a voz da minha
mãe, Jennifer se solta de mim abruptamente.
— Sra. Naomi...? Não imaginei que viesse nos buscar. — Jennifer
está mais sem graça que eu.
— Eu não acredito que você ainda não se beijaram, vocês vão se
casar em três dias e como vão consumar o casamento se ainda nem se
beijaram? — Dispara mamãe me fazendo engolir em seco.
— Meu Deus, mamãe! Você tem cada uma... Mas é claro que nós já
nos beijamos, estamos mais íntimos do que você pensa... Jennifer é muito
tímida e não gosto de vê-la sem jeito por eu beijá-la em público... Já
estamos ensaiando a nossa lua de mel, não é, princesa? — Trago Jennifer
para os meus braços ainda sem jeito. Mamãe ainda parece desconfiada.
— Por falar em lua de mel, ainda não me conformo por vocês não
quererem viajar, mas, entendo o lado de vocês já que ambos estão
comprometidos com o trabalho e os estudos. — Ela olha de mim para
Jennifer e para em frente ao retrato que ela pendurou na parede. — No
entanto, estou mais tranquila por terem aceito passar o final de semana na
casa de campo, vocês precisam de um tempo a sós para a noite de núpcias.
Eu já mandei prepararem a casa para vocês.
Encaro Jennifer e ela parece espantada ao ouvir a palavra núpcias,
sussurro para ela relaxar e ela soltar uma respiração pesada.
— Muito obrigada por toda essa atenção que está tendo conosco,
Sra. Naomi, e mais uma vez obrigada por me aceitar tão bem. Eu sinto
muito pela confusão que tiveram com Cristiano por minha causa. Ainda
estou me sentindo culpada por ele ter ido embora brigado com vocês. —
Surpreendo-me com as suas palavras, eu não imaginava que ela se
preocupava tanto com isso.
— Você não tem que se sentir culpada, querida, as coisas estão
finalmente voltando ao normal com Cristiano. Ele me ligou hoje de
amanhã, ele está chegando para o casamento de vocês. Cristiano parece
arrependido pelo que fez e que quer se desculpar. — Mamãe aproxima-se
pegando as mãos de Jennifer com carrinho.
— Eu espero realmente que ele esteja arrependido, mamãe, porque
eu não vou aceitar que ele desrespeite Jenny mais uma vez, eu não vou ficar
de braços cruzados de novo, fiz isso uma vez por respeito a você e meu pai,
mas a minha noiva também merece ser respeitada. — Alerto-a sério.
— Não se preocupe, filho, ele não vai desrespeitar a sua noiva
novamente, eu também não vou ficar quieta se ele passar dos limites outra
vez, ele é meu filho e eu o amo tanto quanto amo você e Kevin, mas vocês
dois nunca me deram o trabalho que Cristiano está me dando agora, ele
sabe o quanto está me deixando triste com esse comportamento. — Seu tom
é apreensivo pois ela sabe que não vou perdoar o meu irmão se ele aprontar
de novo.
— Eu espero mesmo que ele se comporte, mamãe, agora eu preciso
descansar um pouco, eu estou exausto. — Afasto-me delas e pego a minha
mochila seguindo para as escadas.
— Eu sei que está cansado, filho, mas não durma demais, eu vou
ficar esperando vocês para o jantar. Eu resolvi passar por aqui apenas para
avisá-los pessoalmente, ouviram? Então não deixem de ir. — Mamãe pega a
sua bolsa e vai em direção a porta.
— Não se preocupe, estaremos lá!
Subo as escadas ansioso por um banho bem relaxante, e assim o
faço, coloco o meu celular para carregar e programo o alarme para despertar
as seis, eu me arrumo rápido então vai dar para descansar bastante.
Agora são três da tarde então faço como planejei, tomei um bom
banho e me jogo na cama apagando em seguida, na terça feira eu volto a
viajar para visitar mais algumas das nossas instituições, e já vou colocar em
prática o método de fiscalização nas unidades, agora que tenho carta branca
para fazer isso eu não vou perder tempo. Vou ser um homem de negócios
como o meu pai quer.
É fim de tarde e o sol já está se pondo, hoje é o grande dia e não tem
como evitar ficar nervoso, afinal eu vou me casar. Ando pela sala já
arrumado e sentindo as minhas mãos trêmulas, porque estou tão nervoso se
ela só será minha esposa no papel? Não vou poder tocá-la, não vou poder
consumar o nosso casamento pois tudo não passa de um acordo. Estou
tentando ser apenas seu amigo, mas não sei fazer isso sem desejá-la.
— Bruno!
Saio das minhas aflições com meu irmão parado mais a diante, ele
está arrumado e parece tranquilo.
— Cristiano! Eu já soube que você conversou com Jenny numa boa
e se desculpou, isso a deixou mais tranquila pois mesmo você errando com
ela, Jenny se sentia culpada por você ter viajado evitando falar com os
nossos pais... Ela é uma mulher incrível e não merecia aquilo. — Encaro-o
fixamente e ele abaixa a cabeça.
— Eu sei, eu precisei ser rejeitado e humilhado por uma garota para
reconhecer o meu erro... Eu fiquei em Londres por quase um mês com a
Cindy, ela brincou comigo, ficou com um cara na minha frente e eu perdi a
cabeça, falei um monte para ela e ouvi mais um monte. Ela nunca deu valor
ao que eu sentia por ela... Eu desrespeitei a sua mulher para defendê-la e ela
ainda me chamou de moleque mimado na frente de um monte de gente, foi
decepcionante, ninguém nunca me tratou daquele jeito então pensei em tudo
que Jenny passou. Eu fui um canalha, reconheço. — Desabafa olhando nos
meus olhos e vejo o seu arrependimento.
— Porque não veio falar comigo quando chegou ontem? Eu posso
realmente confiar em você? Eu tenho o meu irmão de volta? — Aproximo-
me dele lhe estendendo a mão, ele pega com um aperto forte.
— Sim! Você pode confiar em mim, eu serei o mesmo de antes, eu
prometo! Não vou mudar por ninguém novamente, isso é uma promessa! —
Suas palavras são sinceras em um tom confiante.
Puxo-o para um abraço apertado e ele retribui no mesmo instante,
vejo mais a diante a minha mãe emocionada por ver os seus filhos se
entendendo.
— Hoje é um dos dias mais felizes da minha vida, descobri que
finalmente vou ser vovó, estou casando mais um filho e estou vendo a
minha ovelha desgarrada de volta ao lar... Eu amo vocês igualmente, meus
filhos. Quando um de vocês se afastam é como se tirassem uma parte de
mim. — Ela vem nos abraçar toda chorosa e nós sorrimos.
— Ninguém vai nos afastar outra vez, mamãe, eu não vou permitir.
— Admiro Cristiano com a nossa mãe, o nosso caçula está de volta.
— E então, noivo? Está preparado? Está chegando a hora, a sua
noiva já está pronta e o papai já subiu para buscá-la. — Kevin aproxima-se
me abraçando pelos ombros, lembrando-me do meu nervosismo.
— Ela já está pronta? Então vamos para cerimônia, tenho que
esperar por ela no altar e não aqui. — Saio arrastando meu irmão e o
mesmo gargalha.
— Eu nunca te visto tão ansioso em toda a minha vida, meu irmão
vai se casar, vai formar família assim como eu estou fazendo... Ainda não
acredito que Teresa está grávida, vamos ter o nosso primeiro filho depois de
cinco anos de casados. — Indaga empolgado e eu estou realmente feliz com
essa novidade.
— Obrigado por me dar um sobrinho, estou muito feliz com o meu
novo posto... Parabéns mais uma vez, papai! — Sorrio abertamente mas ele
ergue uma sobrancelha.
— Espero que você e Jenny não demorem muito para dar um neto a
nossa mãe, ela vai estragar o meu filho se não tiver outro neto para
competir. — Solta espontaneamente e sorrimos.
— É a cara dela fazer isso, mas sinto muito em te informar,
irmãozinho, mas eu Jenny também não estamos com pressa de termos
filhos, ela ainda está na faculdade e eu estou na minha melhor fase do
trabalho, então vamos curtir o casamento por alguns anos como você e
Teresa fizeram. — Rebato sorridente.
Se não estava nos meus planos me casar, ter filhos então não faz o
menor sentido, ainda mais em um casamento de fachada onde a minha
futura esposa só quer a minha amizade, então que assim seja.
Seguimos para cerimônia no jardim dos fundos da casa, a decoração
está incrível. Estão aqui apenas duzentas pessoas que consistente entre
poucos amigos, familiares e alguns acionistas das nossas instituições e suas
famílias. Jennifer ficou apavorada quando soube que teria tanta gente no
nosso casamento, ela está receosas de que mais alguém tenha a mesma
reação que Cristiano teve ao conhecê-la. Mas sei que isso não vai acontecer.
Entro na cerimônia de braços com a minha mãe, Kevin com a sua
esposa Teresa e me surpreendo por Cristiano entrar com Tauane, a amiga de
Jenny, uma negra muito bonita também, mas o que ele está fazendo de
braços dados com ela? Espero que ele não apronte nenhuma estupidez, ou
dessa vez Jennifer não perdoará nenhum de nós, errar uma vez é humano,
mas insistir no erro é burrice e ele sabe disso.
Ao som de violinos os músicos tocam a marcha nupcial, papai surge
de braços dados com ela e eles param na entrada do tapete, a música muda
para hallelujah também ao som de violinos. A minha total atenção está
presa nela, ela está linda, ela sorrir abertamente para mim mesmo eu vendo
a distância o quanto ela parece nervosa, mas o seu sorriso é doce, meigo
fazendo evaporar o ar dos meus pulmões, me deixando boquiaberto.
— Respira, meu filho! Ou você vai desmaiar. — Ouço mamãe ao
meu lado e eu finalmente solto uma respiração pesada.
Me sinto um bobo, um idiota que nunca viu uma mulher tão linda,
estou babando pela minha noiva e acho que todos estão percebendo isso.
Merda! Tento me recompor enquanto ela vem caminhando com o meu pai,
os dois aproximam-se e papai me entrega a mão dela.
— Sei que ainda estão se conhecendo e espero que continuem assim
após o casamento, pois temos que conhecer quem está ao nosso lado todos
os dias. Mas o principal vocês já tem, amor e carinho um pelo outro e isso é
nítido em seus olhos. — Ele olha de mim para Jennifer e vice versa. — Sei
que não estão fazendo isso apenas por obrigação, filho, sei que estão
levando isso a diante porque se gostam então desejo que sejam felizes. —
Papai me abraça e beija o rosto se Jennifer.
— Obrigado, papai! Eu vou seguir os seus conselhos.
Suspiro fundo e guio Jennifer até o padre. Seus olhos estão presos
em mim assim como os meus estão presos nela, ela está mais linda que
imaginei, superou as minhas expectativas.
— Queridos amigos! Estamos aqui hoje para unir em matrimônio,
Jennifer Spencer Paiva e Bruno Felleng Stuart! É de livre e espontânea
vontade que o faz? — Pergunta o padre.
— Sim!
Respondemos juntos e o padre dá início a cerimônia.
Até que a festa foi divertida, tivemos a atenção de tanta gente que
por um momento até me esqueci da falta que os meus pais me fazem,
esqueci um pouco a tristeza que sinto por esse abandono.
Estamos no carro a caminho da tal casa de campo e eu espero que
seja um lugar legal, apenas os meus sogros sabem para onde estamos indo
para não corrermos o risco de recebermos visitas em um momento
improprio, ninguém merece receber visitas durante a lua de mel, mas como
decidimos ficar na cidade, tudo é provável.
Já estamos na estrada a mais de uma hora e eu estou morta de sono,
estou exausta depois de ficar tanto tempo em pé fingindo ser uma esposa
apaixonada ao lado de Bruno. Meu marido, meu Deus, eu me casei de
verdade mas não posso viver esse casamento, mesmo estando apaixonada
por meu marido, eu estou apaixonada por ele.
Eu prometi a mim mesma não confiar em mais ninguém, e eu
quebrei a minha própria regra ao meu apaixonar por Bruno Stuart. Ele tem
sido tão atencioso, gentil. Saímos muito e nos divertimos bastante, ele me
apresentou aos seus amigos e eu pensei que seria vergonhoso, pensei que
eles tivessem visto o meu vídeo na internet mas parece que não, eles são
muito ocupados e não perdem tempo pesquisando vídeo na internet, Bruno
só viu o vídeo porque eu falei sobre isso e ele também investigou na
universidade.
— Ei? Acorde, esposa! Estamos chegando... Jenny?
Ouço a sua voz suave mas não abro os olhos, estou com muito sono
e não quero acordar. Sonho com o meu próprio casamento, o meu
casamento com ele, Bruno estava tão lindo me esperando no altar, eu
desejei com toda a minha alma que tudo isso fosse de verdade, nunca
encontrei um homem que me tratasse como ele me trata, com gentileza,
com carinho pois sei que ele tem carinho por mim, pelo menos isso.
Ele me beijou duas vezes hoje, foi um beijo tão bom, tão intenso que
ainda sinto os seus lábios nos meus, ainda sinto o gosto perfeito do seu
beijo.
— Foi exatamente assim que imaginei entrar com você em casa,
mas na minha imaginação você estava acordada. — Ouço seu tom risonho e
abraço o seu pescoço acomodado o meu rosto no seu pescoço.
Seu perfume é tão bom, na verdade é maravilhoso, até peguei a
mania de cheirar as suas camisas quando ele não está em casa, espero que
Agnes não abra a boca depois que flagrou fazendo isso, até dormir agarrada
ao seu travesseiro eu já fiz, mas fiz sem me dar conta, quando acordei eu já
estava abraçada ao seu travesseiro, sentindo o seu perfume invadir as
minhas narinas.
Sinto quando ele me põe na cama mas estou com tanto sono que
nem me importo em me trocar, durmo assim mesma sem nem ao menos lhe
dar boa noite, eu só quero dormir.
Está tarde, já perdi a noção do tempo aqui jogada nesse buraco e até
agora ninguém veio me procurar, será que ele está chateado comigo o
bastante para não se importar com o meu sumiço? Quanto tempo mais vou
ter que ficar aqui joga?
— Eu não entendo, ela sumiu já faz muito tempo, ela deve estar
perdida em algum lugar, mas onde? Nós já procuramos por todos os
lugares. — Ouço a sua voz bem distante e ele parece realmente aflito.
— Podemos procurar de novo, senhor, sua esposa não saiu
propriedade, ela tem que estar por aqui em algum lugar, podemos ter
deixado passar alguma coisa. — Ouço outra voz também distante.
Tento chamar por ele mas a minha voz simplesmente não sai, tento
me sentar mas me sinto fraca demais, estou aqui desde de manhã e já é
tarde.
— JENNY! JENNY! Droga! Onde ela está? Onde a minha mulher
está! Vamos dar uma última volta na propriedade, se não a encontrarmos eu
chamo a polícia para registrar o desaparecimento dela. — Seu tom é firme e
autoritário.
— Sim, senhor! Nós vamos para o lado oeste e...
— Sr. Stuart! Aqui! Ela está no buraco! A sua esposa está no
buraco! — Ouço agora uma voz mais próxima mas eu não consigo abrir os
olhos.
— Jennifer? Jenny você está me ouvindo...? Eu vou descer, peguem
uma escada ou qualquer coisa para eu subir com ela. Agora! — Sua voz é
alterada e logo sinto o meu corpo sendo embalado. — Jennifer? O que
aconteceu? Como você veio parar aqui...? Ei? Fala comigo, vai? Jenny? —
Sinto ele acariciar o meu rosto e me esforço para abrir os olhos.
— Bruno... O meu pé... Dói muito...
Sussurro fechando os olhos novamente, a dor no meu pé é tão
intensa que sinto que não vou aguentar.
— O seu pé está muito inchado, pode ter quebrado... Vamos voltar
para cidade, vou levar você ao médico... Jennifer? Jennifer...? — Sua voz
entra na minha mente como um eco mas eu apago em seguida.
Ele veio atrás de mim, o meu marido veio atrás de mim.
Fim!
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Livros 4/5/6 Em Breve!