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Abaixo o Amor - Ray Pereira
Abaixo o Amor - Ray Pereira
Nota da autora
Prólogo
Capítulo 1
Capítulo 2
Capítulo 3
Capítulo 4
Capítulo 5
Capítulo 6
Capítulo 7
Capítulo 8
Capítulo 9
Capítulo 10
Capítulo 11
Capítulo 12
Capítulo 13
Capítulo 14
Capítulo 15
Capítulo 16
Capítulo 17
Capítulo 18
Capítulo 19
Capítulo 20
Capítulo 21
Capítulo 22
Capítulo 23
Capítulo 24
Capítulo 25
Capítulo 26
Capítulo 27
Capítulo 28
Capítulo 29
Capítulo 30
Capítulo 31
Capítulo 32
Capítulo 33
Capítulo 34
Capítulo 35
Epílogo
Bônus
Agradecimentos
Nota da autora
O hábito da leitura me levou a viver muitas coisas, muitos mundos,
me apaixonar milhares de vezes e fazer amigos incríveis.
Escrever salvou minha vida.
Muitas vezes. Mais do que você possa imaginar.
Esse livro, em especial, me salvou.
Abaixo o amor, diferente de tantas e tantas histórias que pretendia
escrever este ano, não foi planejado. Ele só chegou.
Lembro como se fosse hoje. Na época, estava com outro livro, outros
personagens, mas não fluía.
Escrever ajuda a manter minha mente sã. Eu havia perdido minha vó
em uma luta exaustiva contra o câncer. Estava triste. Triste, por acaso, não
consegue expressar como me sentia. Faltava parte de mim.
Não conseguia ler, escrever, falar com as pessoas que eu amo.
Nada.
Para me expressar, sabia do que eu precisava.
Tinha que escrever, mas o livro não fluía.
Pensei, por meses, que havia acabado ali. Que Amizade Colorida
havia sido meu último livro e nunca mais conseguiria me conectar a outros
personagens novamente.
Foi assim, em meio a um desabafo com minha beta, Dani, que o
Valentim e a Talita surgiram em minha mente.
Essa história, particularmente, me salvou.
Me fez rir, perder o sono, ler e reler, surtar.
E o resultado final?
Bem, eu gostei. Foi uma jornada divertida, e entre surtos e medo de
que vocês odeiem a história, ela chegou.
Espero, de coração, que gostem. Que sorriam, queiram bater nos
personagens e também que morram de amor.
Enfim, é isso.
Obrigada por darem uma chance a Abaixo o amor.
Ah, e quando acabar, que tal me contar o que achou?
Vou amar saber.
Mil beijos, Ray,
Sinopse
Contar histórias de amor era uma coisa natural para Talita Gomes,
uma escritora de livros hot que, encabeçava a lista de autoras queridinhas
entre todas as leitoras do país.
O que não seria nenhum problema, caso não houvesse um pequeno
detalhe: ela não acreditava no amor.
E, por anos, conseguiu que ninguém descobrisse essa particularidade
que podia a descredibilizar perante suas leitoras, até que Valentim Fernandes,
um dos jornalistas mais notáveis da sua cidade, e de quem ela era grande
admiradora, cruzou seu caminho.
Valentim Fernandes, jornalista conceituado e dono da coluna
quinzenal mais aguardada pelos leitores do periódico mais famoso de sua
cidade, viu-se obrigado a ceder espaço em sua coluna para Talita Gomes,
uma mulher que, para ele, desmoralizava tudo aquilo que nomes consagrados
da literatura lutaram para conquistar no país: histórias que levassem o leitor à
reflexão sobre a realidade e que retratassem o amor como ele deveria ser,
simples e puro, sem a necessidade da objetificação dos prazeres da carne —
não que ele tivesse algo contra quanto à prática.
Para ela, ele era um cretino hipócrita que poderia destruir sua carreira.
Para ele, ela era, nada mais, que uma vendedora de imoralidades
literárias.
— Mamãe, acho que estou com dor de barriga. Não quero ir pra
escola amanhã — sussurrei, assim que percebi que minha mãe sairia do
quarto pequeno onde Nick e eu dormíamos.
Ela sorriu, passando a mão pelo meu cabelo.
— Desculpe, querida. — Usou o tom de voz mais calmo que podia.
Aquele que mostrava saber exatamente que eu não estava falando toda a
verdade. Ou melhor, que estava mesmo mentindo. — Não posso te deixar em
casa sozinha, você vai ter que ir.
Soltei o ar com força.
Era uma droga. Eu odiava ir para a escola no Dia dos Pais. Quase
todo mundo tinha um pai, então tinham as músicas e depois todos se
abraçavam e saíam felizes.
Menos eu.
— Tá — respondi baixinho, e eu sabia também que minha cara tinha
mudado. Era impossível não demonstrar que estava triste.
Não queria fazer birra nem nada. Sabia que mamãe sempre estava lá
por mim. Sabia o quanto ela se matava de trabalhar para conseguir garantir
que Nick e eu tivéssemos tudo o que precisávamos. Muitas vezes, não
fazendo coisas que ela gostava de fazer para ela mesma.
— Se eu ficar aqui mais um pouco e te contar uma história, você acha
que pode mudar essa carinha e colocar o sorriso mais lindo do mundo de
volta a esse rostinho lindo? — Fez uma careta divertida para mim e, mesmo
triste, eu sorri. — Acho que isso foi um sim, então.
Balancei a cabeça em afirmativa, vendo-a se sentar e pegar um livro
na cabeceira da minha cama.
Eu amava ler. Mamãe também.
Ela sempre tinha um livro nas mãos. Eu achava engraçado, porque às
vezes ela suspirava lendo. Um montão de vezes, quando eu tinha algum
pesadelo e ia para o quarto dela havia um livro aberto ao seu lado, porque
mamãe dormia lendo. Quando eu pedi a ela um livro de presente, mamãe
ficou tão, mais tão feliz.
Ela disse que agora ia ter uma melhor amiga com quem ia
compartilhar as leituras.
— Qual conto de fadas vai querer hoje? — perguntou, voltando a se
sentar ao meu lado e abrindo o livro com a história de todas as princesas que
existiam.
— Huuuum. — Pus o dedo indicador sobre a boca, pensando no
assunto. — Acho que podemos ler sobre a Ariel.
Minha mãe deu um beijo em minha testa, abrindo o livro em seguida.
Eu já conhecia aquela história. Assim como todas as outras. Todos os
dias, mamãe lia para Nick e para mim antes de dormir. Nicholas era um chato
e nunca gostava que mamãe contasse histórias de princesas, ele dizia que elas
eram chatas, então a gente sempre brigava. Mas hoje ele tinha ido dormir na
casa de um colega da sala dele, para fazer um trabalho, então eu podia
escolher minha história sem que ele ficasse brigando comigo toda hora e
dizendo que meus livros eram histórias para menininhas bobas.
Bobo era ele.
— Um dia, quando eu crescer, eu vou ter um príncipe, mamãe —
falei, suspirando, assim que ela chegou ao final da história. — Assim como a
Ariel teve o príncipe dela.
Mamãe não falou nada, depois sentou e segurou minhas mãos com
cuidado.
— Na sua idade, querida, não faz mal sonhar com alguém que possa
mudar sua vida. Mas o que a Ariel fez, ela deixou de ser ela mesma por um
cara. Na vida real, coisas assim nunca acabam bem, você entende isso?
Assenti, mesmo que não tivesse entendido bem o que ela queria dizer.
— Eu quero, meu amor, acima de tudo, que você cresça, se torne uma
mulher forte, que lute pelos seus sonhos e nunca, nunca mesmo, abra mão
deles por ninguém, tá certo? — Balancei a cabeça, mais uma vez. — Os
príncipes, os homens perfeitos, fiéis e que fazem de tudo por quem eles
amam, só existem nos livros. Na vida real, você precisa ser inteligente e se
amar sempre em primeiro lugar, Talita.
— Tá certo, mamãe — respondi, depois de alguns segundos.
— Os homens na vida real, eles mentem, meu amor. Você precisa ser
mais esperta que eles. Mais esperta que eu fui. Promete pra mim? —
Balancei a cabeça, confirmando que havia entendido.
1. Homens perfeitos não existem, só nos livros;
2. Os homens mentem;
3. Eu tinha que lutar por mim.
Acho que tinha entendido bem.
Capítulo 1
— Não que sua cara seja agradável nos demais dias da semana, mas
hoje, especialmente, você parece péssimo.
Mathias sentou na cadeira vaga da mesa ao lado da minha, girando de
forma que ficasse sentado virado em minha direção.
Fiz como ele, girando a cadeira e ficando de frente para meu amigo.
— Fiquei acordado até quase os primeiros raios de sol surgirem,
lendo a porcaria do livro — admiti.
Mesmo tendo saído de casa no horário de sempre e ido tomar café
com meu pai, meu corpo parecia ter continuado na cama, de olhos fechados e
sem a menor vontade de viver.
Ele riu.
— É, eu sabia que algum dia uma mulher ainda mandaria em você.
— O que eu não faço pra manter esse trabalho, hein? — Recostei a
cabeça no apoio da cadeira.
— Mas, se não largou a história a noite inteira, pelo menos deve ser
boa, hein? — Deu um sorriso de lado, e eu tinha certeza de que queria me
sacanear.
— Uma porcaria, como eu sabia que seria — menti.
Por pior que me custasse admitir até para mim mesmo, a história era
mesmo muito boa. A forma como a autora mostrou o quanto às mulheres
eram desvalorizadas, sem ter as opiniões levadas em consideração e deviam
buscar um casamento, de preferência com vantagens financeiras foi, no
mínimo, interessante. O que me levou a pensar que, por mais que muitas
décadas separassem o período da história da década atual, muitos dos
problemas ainda pareciam os mesmos.
Profissões em que os homens são claramente mais valorizados,
recebem salários maiores, as quais mulheres ainda são recebidas com olhares
tortos e bocas retorcidas.
O livro havia me impressionado, mas eu preferia cortar um braço — o
direito para que eu pudesse continuar a escrever, claro — a admitir isso.
— Pelo menos, ela disse que você pode dar sua opinião sincera. —
Deu de ombros, imitando meu gesto anterior e encostando a cabeça no
descanso.
Pus a mão na boca para disfarçar o bocejo. Senti quando meu celular
vibrou no bolso.
Tinha que ser ela.
Havia avisado, ainda de madrugada, sobre a finalização da leitura.
Eram quase 10h e a mulher não deu o menor sinal de vida.
“E então, o que achou?”
“Sexo demais, livro de menos. Como eu disse, basicamente um
pornô.” Digitei, batendo o indicador no braço da cadeira, enquanto o
digitando aparecia logo abaixo do nome dela.
Pior do que dizer que a porra do livro era bom, seria ter que afirmar
que aquelas cenas eróticas também eram inacreditavelmente boas.
Puta que pariu.
O casal não transou de primeira. Foram, de capítulos em capítulos na
porcaria de preliminares que davam ainda mais vontade de que fizessem sexo
de vez. Até eu estava torcendo para que eles se trancassem em um quarto, um
banheiro, na porcaria do telhado de qualquer instalação e chegassem aos
finalmentes.
E, cada vez que eu pensava que EU, Valentim Fernandes, apaixonado
por livros de qualidade, havia chegado ao ponto de desejar que aquelas
malditas cenas que traziam vergonha ao mundo literário finalmente
acontecessem, me sentia angustiado.
Para piorar, cada maldita palavra foi lida.
Cada uma delas.
E, caralho, se tivesse tido a chance, teria colocado a porra da cena em
prática. Pior ainda, era ter a noção de que quando meu pau resolvia se atiçar
pelas cenas, era na mulher que, agora, digitava infinitamente, que eu pensava.
Eu estava mesmo fodido.
“Tanta coisa na história e você conseguiu se ater apenas às cenas de
sexo. Sabe o que eu acho? Você estava ansioso por elas. Confesse que
gostou.”
Involuntariamente o canto esquerdo dos meus lábios se ergueu um
pouco em um meio-sorriso.
Ela não podia estar mais certa.
“Te disse. Isso nunca vai acontecer” devolvi, garantindo.
“É o que veremos.” Enviou, em seguida, uma carinha piscando.
— Tá falando com ela, né? — Mathias questionou, fazendo-me parar
a resposta no meio e olhar para ele rapidamente, apenas para vê-lo com um
enorme sorriso no rosto.
— Queria saber minhas considerações sobre a história.
Voltei os olhos para o aparelho em minhas mãos, finalizando a
mensagem e a enviando.
“Um livro foi lido. Podíamos nos encontrar para que você me
responda algumas perguntas. Afinal, uma coluna não é escrita em um dia, e
cada minuto que passa, são sessenta segundos perdidos. Lembre-se que é a
sua carreira em risco.”
Mais uma vez o digitando apareceu. Sumiu. Apareceu. Sumiu,
quando finalmente reapareceu, ela parecia mais disposta a dar uma resposta
definitiva.
— Sabe de uma coisa? — Mathias levantou-se, arrumando o blazer
que usava. Não respondi, ele falaria ainda que eu negasse. — Você, meu
amigo, está completamente fodido.
E essa era a parte ruim de ter amigos. Eles pareciam saber a verdade
sobre você, ainda que não fosse necessário o uso das palavras.
— Não sei do que está falando — menti, sentindo o aparelho vibrar
em minha mão. Olhei para a tela que agora anunciava duas mensagens e não
uma.
— Você vai trepar com ela. — Usou um tom não tão baixo, o que me
garantiu alguns olhares e um sorriso sugestivo de Marina que, com certeza,
acreditou que nossa saída para o jogo estava mais que certa e, ainda por cima,
acabaria na cama. O que, claro, se saíssemos, ia acontecer.
Devolvi a gentileza, sorrindo de volta.
— Desta vez você está enganado, Mathias — garanti. — Não vou
misturar as coisas. Vou me comportar como um maldito eunuco.
— Isso vai ser engraçado de ver. — Sorriu, dando as costas.
E deixando-me sozinho para, finalmente, saber o que aquela bruxa
que tinha adentrado meus pensamentos havia dito.
Antes de desbloquear a porcaria da tela, não pude deixar de pensar na
ironia da situação. Passaria os próximos dias lendo sobre sexo, falando sobre
sexo, e impedindo meu pau de praticar sua atividade preferida.
A vida, meus amigos, era mesmo uma tremenda filha da puta.
Capítulo 11
A pista de dança estava cheia demais, o que fez com que Mathias e eu
decidíssemos que preferíamos ficar um pouco em uma mesa. Depois de pegar
nossas bebidas, escolhemos um local mais tranquilo para observar o
movimento e avaliar quem nós levaríamos para casa.
Não que eu quisesse companhia em minha cama hoje.
Para ser sincero, meu desejo mesmo era ficar em casa e finalizar os
livros que faltavam. Claro, para finalizar logo a minha penalização e poder,
enfim, me dedicar só à minha coluna, como sempre tinha sido. Já estava perto
de acabar o penúltimo e, enfim, iria para a última história.
Além do mais, eu precisava decidir o que faria com a conversa que
havia ouvido da Talita com as amigas. Uma escritora de romance que não
acreditava no amor. Era absurda a ironia da coisa.
Se eu incluísse essa informação na matéria, possivelmente seria uma
boa chamada. Impulsionaria as vendas e leituras. Um choque, com certeza,
para todas as bookstagrans e leitoras que tanto a admiravam. Em
contrapartida, sem dúvida isso acabaria prejudicando, de alguma forma, a
maneira como as suas leitoras a viam e, embora eu não concordasse
exatamente com o tipo de livros que escrevia, não era a minha intenção
prejudicar ninguém.
No fundo, Talita era uma boa pessoa, não gostaria de causar nenhum
dano a ela.
Balancei a cabeça, tentando concentrar-me em qualquer coisa que não
fosse a mulher linda que estava construindo um tríplex em minha cabeça.
Aproveitei o momento longe do som alto e compartilhei com Mathias as
ideias que tive para a coluna e que havia também levado à Antonella que
estava pensando em como encaixar. Se em uma nova coluna mais específica,
ou se mantínhamos o Merece Destaque apenas, e ele deixaria de ser
quinzenal para se transformar em uma coluna semanal.
Daria mais trabalho, mas com certeza, depois de todas as reflexões
que tive nos últimos dias, seria impossível ignorar o que agora parecia gritar
dentro de mim.
— Olha só, quem diria que os livros de baixaria que a vendedora de
sexo te indicou iam te levar a algo que jamais supus que você fosse capaz. —
Ergui meu olhar para ele, já enviesado, sabendo que uma gracinha viria, com
certeza. — Pensar.
Rolei os olhos.
— Vai pra casa do caralho, Mathias — respondi, prendendo um
sorriso e dando uma golada em minha bebida.
— Não, sério. Só que, você sabe, né? Com todas aquelas cenas
obscenas, encontrar temas tão bons chega a ser absurdo, você não concorda?
Tinha um ar divertido ao falar.
— Cara — soltei um suspiro —, pior que essa porra não é assim. As
histórias são boas mesmo, sabe? Tem alguns plots surpreendentes e bem
desenvolvidos, abordam assuntos sérios e, sinceramente, eu me peguei bem
envolvido com algumas delas — confessei. Tinha mesmo me envolvido com
todas aquelas histórias, porcaria!
Mathias então gargalhou.
Isso não era um amigo, mas sim um tormento.
— Eu sabia que isso aconteceria — falou, quando a crise de riso
passou. — Minha irmã e uma das minhas primas são leitoras assíduas da
Talita e conhecem todos os livros que você leu. Disseram-me que a menos
que você fosse um cretino sem coração e alma, ia se render às histórias.
Quanto a ser cretino, não posso discordar, você é. Mas, debaixo dessa carcaça
de pilantra existe um ser humano que não é de todo ruim.
Balancei a cabeça em negativa.
— Quantos anos essas meninas têm, mesmo? — quis saber, curioso.
— Vinte e vinte e um. — Deu uma golada na bebida com o indicador
erguido, demonstrando que ainda tinha algo a acrescentar. — Essas porras de
histórias, meu amigo, fazem as meninas ficarem mais espertas. Elas me
contaram que uma amiga descobriu que tinha sido trocada na maternidade
por causa do tipo sanguíneo de um personagem que não batia com o dos pais.
Minha prima contou que evitou uma possível gravidez quando leu que a
mocinha engravidou porque o cara lá colocou só a cabecinha durante o rala e
rola. O ex dela garantiu que não teria problema, mas ela lembrou-se da
história no automático e recusou.
Ri, balançando a cabeça em negativa.
— É aquela máxima, não é? Informação é poder. — Mathias
concordou, enquanto dávamos mais um gole na bebida, em silêncio. No fim
das contas, Talita estava mesmo certa. — Enfim, eu preciso da sua ajuda.
Mathias me encarou, como se eu tivesse falado algo absurdo.
— Olha só, nada contra você experimentar coisas novas e tal, mas eu
não tenho nenhum interesse em ser seu cobaia, caso queira descobrir outros
aspectos sexuais.
Ergui o dedo do meio para meu amigo que riu.
— Quanto ao trabalho, porra. Queria que você me ajudasse em um
artigo. — Esfreguei o rosto com as mãos. — O cenário político atual,
sabemos que está uma merda. Pensei em você escrever uma coluna falando
sobre o assunto. Não de forma a puxar sardinha para um lado, mas levando o
leitor a compreender onde, de fato, estão os interesses políticos e tudo que
estará envolvido nas eleições do ano que vem. Acredito que, sei lá, talvez
assim o povo possa refletir melhor antes de tomar partido de algum dos lados
que só está pensando mesmo é em foder com a maior parte da população
brasileira.
— Gosto disso — falou, movendo a cabeça como se estivesse
concordando em câmera lenta.
Em seguida, Mathias começou a falar sobre como poderíamos
trabalhar a questão política de forma dinâmica. Eu não era uma pessoa
alienada quando se tratava da maioria dos assuntos, mas depois de conversar
com Mathias, parecia que um caminhão tanque havia passado por cima de
mim e me massacrado. Ele era, de fato, um dos caras mais inteligentes que eu
conhecia e sabia abordar diferentes cenários políticos como ninguém,
conseguindo, inclusive, fazer um link com desde a porra da colonização até
os governos atuais de forma que, além de compreender, você realmente
prestasse atenção no assunto e ficasse com cara de otário, querendo ouvir
mais.
No fim das contas, deu certo.
Mathias ia me ajudar com a coluna, e eu tinha certeza de que seria um
enorme sucesso.
Meus dedos digitavam frenéticos fazendo com que o som das teclas
soasse de uma forma quase ritmada.
Eu adorava esse som.
Significava, especialmente, que minha mente estava conseguindo
conectar bem as palavras e que, em breve, eu poderia finalizar mais um
trabalho saindo em busca do próximo.
Embora eu estivesse muito feliz por, na primeira parte da entrevista
com Talita, ter conseguido muitas informações e adiantado bastante a coluna,
assim como no dia que a encontrei com meu pai e depois na festa, quando
conheci suas amigas. Talita possuía muitos lados.
A menina de família, a amiga divertida, a amiga leal, a irmã que fazia
de tudo pelo irmão, a garota falante, ao mesmo tempo em que sabia respeitar
silêncios assim como conseguia ser uma boa ouvinte.
Além de tudo, ela tinha um lado sensual, mas era tão natural que
chegava a ser inocente. Havia também o lado quente.
Ela era entregue.
Dois beijos, e eu sabia que estava viciado. O gosto dela, a sensação do
corpo quente. O som que fazia quando gemia quando eu a tocava.
Tudo isso era música aos meus ouvidos.
Uma sinfonia dos deuses e, só de me lembrar do seu corpo delgado
contra o meu, era motivo para que, lá embaixo, uma comichão tivesse início.
Porra, eu não ia conseguir respirar enquanto não a tivesse em meus
braços. E ainda faltavam algumas horas para que isso acontecesse.
Estava tão duro quando saí de sua casa que nem um banho frio daria
jeito. Precisei me aliviar, sozinho, pensando em seu gosto, em seu rosto, em
seus lábios e em como foi uma das melhores coisas que eu já fiz, dar prazer
àquela mulher.
Infelizmente, tínhamos sido interrompidos.
E agora eu contava os minutos para poder vê-la novamente.
Depois do nosso beijo, o primeiro, eu soube que não conseguiria, de
forma alguma, parar ali. Assim que cheguei em casa devorei os livros
restantes querendo, mais do que tudo, vê-la.
Não a tinha procurado antes de propósito.
Já havia passado algumas horas desde que nos beijamos pela primeira
vez e queria pensar que, na verdade, tudo aquilo foi um delírio.
Coisa de um momento regado a álcool.
Mas, não.
Assim que meus olhos caíram sobre ela, esqueci completamente a
desculpa que tinha arrumado para ir à sua casa de propósito. A blusa em sua
maior parte verde com pequenas flores brancas, bem soltinha no corpo, mas
marcando bem o contorno do sutiã combinava muito bem com o short jeans
um pouco acima das coxas já me deixaram doidos.
Senti quando minha garganta secou.
O momento exato em que soube que eu estava fodido completamente.
Eu estava atraído pela escritora, e, com certeza, precisava dela.
Não podia dizer que a conhecia como ninguém, mas gostava das
nuances que havia conhecido.
Estava disposto a conhecer ainda mais.
Desde a primeira vez que a vi, quis fazer muitas, muitas coisas com
ela. Entretanto, não podia. Afinal, ela representava muito do que eu,
decididamente, não concordava.
Conhecê-la, porém, mudou muito. Quase tudo.
Eu a compreendia.
Talita falava com propriedade e convicção sobre o que acreditava, e
ela não via nenhum motivo para que os livros eróticos não existissem. Passei
os últimos dias ponderando sobre o assunto.
Os livros que li contavam histórias de pessoas tão reais que podiam
ser meus vizinhos. Pessoas com sentimentos bons, como alegria, esperança,
confiança, empatia, compaixão, amor e também sentimentos que são
considerados ruins, ciúme, inveja, raiva, frustração. Como toda pessoa que
passa por diversos problemas e inúmeras situações, o sexo sempre fará parte
de nossas vidas. Então, por que não faria da vida dos personagens?
No fim das contas, Talita me fez perceber que, para começar, os
romances eróticos recebem esse nome por não se tratarem exatamente sobre
sexo, mas o ato sexual faz parte da vida dos dois, como faz parte das nossas.
Algo normal. Existia um envolvimento romântico entre eles, um
amadurecimento, e as cenas de sexo são apenas um bônus, era como ver a
química do casal, além dos seus conflitos.
Foi basicamente isso que acabei percebendo também nas histórias que
eu li. No fim, as cenas estavam ali, não era o ponto central da história
diferente do que eu havia pensado, inicialmente.
— O que tá fazendo? — Mathias perguntou, puxando a cadeira
giratória da mesa vaga ao lado da minha.
— Trabalhando — retruquei, sem nem olhar para ele. — Você não
devia fazer o mesmo?
— Não. Deixo isso para os fracos. — Aproximou a cadeira da minha.
— Afinal, por qual motivo personagens literários não devem transar se o
sexo faz parte das nossas vidas de forma natural? — Mathias leu a última
frase que eu havia escrito. — Como está indo a coluna?
Dei de ombros.
— Bem. No fim das contas, ambos sobreviveremos.
— Então você agora é defensor dos livros de sexo? — perguntou com
uma cara debochada.
— O nome é romance erótico — corrigi no automático.
— Ele faz a defesa da profissão da morena dele. — Mathias riu,
atraindo a atenção de alguns de nossos colegas.
Ergui o dedo do meio para ele.
— Eu acho que — rodei a cadeira, ficando de frente para o Maria fifi
do meu amigo —, sei lá, quem não gosta não lê e ponto final.
— E está mudando de opinião por algo que você chegou à conclusão,
ou quer agradar uma certa autora? — Apertou os olhos em minha direção.
— Você acha mesmo que eu mudaria de opinião para cair nas graças
de uma mulher? — Ergui uma sobrancelha.
— Isso é uma pergunta retórica, né? — Fechei o semblante para o
idiota que riu. — Ok, eu sei que não. A menos que você estivesse muito,
muito, muito a fim de pegar ela.
— Não é o caso aqui, pode ter certeza. Não sei você percebeu, mas eu
passei os últimos dias com a cara enfiada em livros e mais livros.
— E gostou bastante, pelo que andei ouvindo.
— Seu andar não está precisando de você? — Ele me ignorou,
girando a cadeira.
— Então quer dizer que, diferente do que havia contado antes, está,
realmente, interessado na Talita? — Mathias perguntou, puxando a cadeira da
mesa vaga ao lado da minha.
Era impressão minha ou as pessoas aqui tinham muito tempo vago?
Ninguém mais trabalhava nessa empresa, não? Onde estava Antonella para
dar um jeito nisso?
— Não sei do que está falando. — Ignorei, novamente.
— Eu lembro muito bem quando, aqui mesmo, você me garantiu com
todas as letras, que não estava interessado. — Ergueu a sobrancelha para
mim.
Dei de ombros.
— Não estava, mas as coisas mudam, não é?
— E esse interesse é interesse mesmo, ou ela estará à disposição daqui
a algum tempo?
Apertei os dentes com força.
Decididamente, não.
Eu sabia que nosso lance, possivelmente, seria uma coisa de uma
noite. Mas, mesmo assim, existia a ética dos amigos. Amigo não pega mulher
dos outros.
— Vai caçar em outra floresta, Mathias — respondi.
O sorriso em seu rosto se alargou.
— Então é sério mesmo, hein, jornalista? — Ironizou a palavra por
conta da forma como a Talita me chamou algumas vezes na balada. — Rolou
algo mais depois do beijo?
— Pensei que sua área fosse política, não fofoca — brinquei.
Se dizem que as mulheres são fofoqueiras, é porque elas nunca
tiveram a chance de ver um homem quando está com a língua coçando para
falar da vida alheia, ou da vida deles mesmo, quando querem.
— Seria fofoca se estivéssemos falando pelas costas de alguém, mas
estou aqui de frente com uma das partes envolvidas. Logo, isso é
compartilhamento de informações.
Balancei a cabeça em negativa.
— Nós temos química, tesão. Aquela coisa que, caralho, quando
acontecer, não resta dúvidas de que será explosivo, sabe?
— Isso significa que você será domesticado novamente?
Rolei os olhos.
— Quer dizer que nós vamos transar até a gente enjoar. Não tenho
pretensão de me envolver sério, tão cedo..
— Uma hora vai acontecer, você sabe — falou, pegando dois lápis do
meu organizador de mesa e usando como baquetas de bateria, contra minha
mesa.
— Não tenho nada contra. — Dei de ombros. — Não tenho mais vinte
anos. Não vou ser idiota de repetir o erro.
— O bom da vida é que podemos, pelo menos, cometer erros novos e
bem mais gostosos. — Eu ri.
— Eu vi você de flertes com a amiga dela. Como era mesmo o
nome... — Fingi ter esquecido.
— Pietra — completou rapidamente.
Ri, e ele me mostrou o dedo do meio ao perceber que havia caído,
exatamente como eu queria que acontecesse.
— Sabia que tinha rolado um clima... E aí?
Balançou a cabeça em negativa.
— Ela não estava muito bem. Tinha descoberto que o cara que ela
estava flertando com ela, era noivo. — Deu um giro com a cadeira. — A
garota só queria mesmo beber e afirmar, com convicção, que os homens
deviam ser, todos, enviados de tobogã direto para o quinto dos infernos.
Franzi o cenho.
— Talita comentou algo sobre isso. Infelizmente, o mundo está
recheado de idiotas assim — falei. Mathias concordou, concentrado demais
em não perder o ritmo na sua bateria de mentira. — Uma pena que a noite
não tenha sido como você imaginou.
Mathias riu, como se tivesse um segredo divertido.
— Na verdade, foi ainda melhor do que eu tinha imaginado.
— Como assim? — quis saber, apertando os olhos em sua direção.
— Peguei o número dela, e apesar de não ter mandado mensagem
ainda, só estou com essa sensação estranha.
Eu tinha certeza de que era mais do que isso, mas, quando se tratava
daquela noite, havia detalhes muito melhores com os quais me preocupar.
— Uau, não acredito que nunca tinha ouvido falar sobre este lugar —
falei, me aconchegando melhor na cama superconfortável da pousada no
meio do nada para onde Valentim havia me levado.
O lugar era simples e aconchegante. Não havia quartos luxuosos,
muito pelo contrário, todos tinham formato de cabanas triangulares e
cheiravam a mato e madeira.
Rústicos e simples, mas ao mesmo tempo lindo de morrer. A cama de
casal onde eu me deitava sem nem ao menos demonstrar preocupação em
deixar espaço para Valentim deitar também, ficava do lado esquerdo. A
colcha clara mantinha o toque hippie do ambiente e um enorme buquê de
flores — que eu já havia posto do meu lado e tido todo o cuidado para não
machucar enquanto testava o colchão — estava, agora, entre mim e a parede
em cima da cama.
Do outro lado do quarto, do lado direito, dois filtros dos sonhos de
macramê eram ligados por um cordão luminoso com bolinhas brancas. Um
tapete cinza demarcava a área de um ambiente bem estilo Pinterest. Duas
cadeiras pretas, uma pequena mesinha de centro e três pequenas gaiolas no
chão tornavam o ambiente ainda mais encantador.
— Gostou? — perguntou, parecendo ansioso.
— Isso é lindo. — Entrei, ouvindo-o dar um passo para frente
também e colocar nossas sacolas no chão. Sorri, enquanto meus olhos
vasculhavam o ambiente tentando memorizar cada detalhe porque,
certamente, ele seria narrado em alguma história. — Como você encontrou
este lugar?
Franzi o cenho em sua direção, vendo-o apoiar os joelhos na cama, se
aproximando e pondo as mãos uma de cada lado do meu rosto.
Seus olhos estavam brilhando, como se estivesse mesmo feliz por eu
ter gostado do lugar. Deu um passo em minha direção, deixando nossos
corpos bem colados.
— Sou um jornalista, escritora. É minha obrigação conhecer os
melhores lugares possíveis. — Valentim passou um dedo de forma carinhosa
por meu rosto, antes de segurar meu queixo, erguendo-me um pouco em sua
direção e dando um beijo rápido em meus lábios. — Achei que você fosse
gostar daqui, especialmente já que, segundo você, período de lançamento é
bastante estressante. E, mais ainda, achei que merecíamos um lugar para
comemorar o sucesso do seu livro e de uma certa matéria maravilhosa que
um jornalista fantástico escreveu para você.
Semicerrei os olhos em sua direção.
— Você é muito convencido, Valentim — falei, vendo-o suprimir um
sorriso.
Mas ele estava certo. A matéria tinha mesmo sido um sucesso. Em
poucas horas, meu número de leituras, que ainda estava muito bom, subiu
ainda mais e o mais impressionante, emissoras locais entraram em contato
querendo marcar entrevistas comigo.
Tudo isso em menos de seis horas.
— Diria que sou um cara assertivo. — Passou as mãos por minhas
costas, prendendo-me a ele.
— Acho que está mais para convencido, mesmo — sussurrei.
Já conseguia sentir sua ereção, mesmo com o tecido de sua calça e
meu vestido mantendo uma barreira entre nós, quando senti seus lábios se
aproximarem novamente.
— Não vou brigar com você por isso. — Mordiscou meu lábio
inferior. — Com o tempo, vai me dar razão.
Meu coração parou de bater.
Ele tinha mesmo planos de passar tempo o bastante comigo para que
nós nos conhecêssemos melhor? Alguma coisa aconteceu em minha barriga,
e se não tivesse descrito tantas vezes a sensação de borboletas no estômago,
poderia dizer que era algo do tipo, entretanto, parecia muito mais com uma
manada de búfalos dançando Macarena em minha barriga.
Não. Me corrigi rápido. Isso é fome, com certeza.
Valentim aproximou-se mais e, pelo que via em seus olhos, sabia que
tinha pretensões de começar a esquentar as coisas, mas, claro, meu corpo
resolveu atrapalhar fazendo-me passar vergonha produzindo o som de RONC
em letras garrafais exatamente como em um quadrinho do Maurício de
Sousa.
Valentim roçou os lábios nos meus, afastando-se em seguida, achando
graça.
— Ok, vamos alimentar essa monstrinha antes da diversão. — Colou
nossos lábios rapidamente antes de entrelaçar nossos dedos e beijar a palma
da minha mão, fazendo-me passar as mãos por seu rosto em seguida. —
Volto já.
Levantou-se, passando pela porta. Fechei os olhos por alguns
segundos tentando absorver como as coisas estavam completamente
diferentes de dias atrás. Eu havia jurado detestar Valentim para sempre e
agora estava aqui, em uma pequena viagem não programada na Reserva
Sapiranga em Mata de São João, próximo à Praia do forte. A reserva possui
mais de 500 hectares de Mata Atlântica preservada, e por mais que tínhamos
visto basicamente o caminho para chegar ao charmoso glamping[7] do qual
nunca tinha ouvido falar, mas já tinha me garantido algumas inspirações.
Não demorou tanto assim para que ele retornasse ao quarto, mas de
mãos vazias, fiz uma careta em protesto.
— Vem comigo, quero te mostrar uma coisa. — Ergueu a mão, me
fazendo aceitá-la.
Valentim entrelaçou nossos dedos novamente e um calor gostoso
passou por meu corpo.
— Posso saber para onde vamos? — quis saber, encostando minha
cabeça em seu ombro. Ele riu.
— Só confie em mim — pediu, dando um beijo em minha testa logo
que passamos pela porta.
O sol começava a esfriar indicando que o dia estava próximo de
chegar ao fim. Nós rodeamos a cabana chegando à parte de trás e eu perdi um
pouco o ar com a cena que vi. Ok, ele tinha seu lado irritante, mas sabia ser
um fofo quando queria.
No fundo, havia uma banheira posicionada sob um pequeno deque de
madeira, algumas samambaias que davam um toque charmoso ao ambiente.
Um tapete redondo de palha com duas almofadas ficava próximo à banheira.
Vasos de barro, cestas de palha, uma cadeira branca de sol, mas, bem ao
cantinho, uma mesa de madeira continha uma enorme vastidão de alimentos.
Frutas, pães, uma jarra de suco de laranja, um bolo de chocolate com
cobertura de brigadeiro e o cheiro estava maravilhoso.
Valentim puxou a cadeira para mim, sentando-se em seguida. A
conversa estava fluindo bem. Ele me contou a história do seu trabalho, os
lugares por onde passou e mais gostou, seus hobbies.
A notícia ruim é que quanto mais eu o conhecia, mais eu gostava e
queria conhecer. A maldita frase que ele havia dito mais cedo ainda
martelava em minha cabeça, “com o tempo você vai me dar razão”. Parte de
mim queria acreditar nisso. Que, como eu, ele também queria aproveitar um
tempo comigo, da mesma forma que eu, estranhamente, queria estar mais
com ele.
— Você não pode estar falando sério. — Franzi o cenho para ele. —
Jura?
— Juro. — Ergueu as mãos para mostrar que não havia nenhum dedo
cruzado. — Eles correram atrás de mim e eu achei que viraria churrasquinho
de pele tipo o Jack Sparrow em Piratas do Caribe.
Ri, balançando a cabeça em negativa.
Valentim era divertido. Sabia fazer uma mulher rir, e caramba, isso
era um feito e tanto. Era inteligente e conseguia falar sobre os mais variados
assuntos, entretanto, diferente da maioria das pessoas, não era esnobe por
estar sempre por dentro das coisas. Admirava pessoas assim. E mais do que
tudo, gostava de como cuidava do pai e da forma como se referia à mãe.
Se tivesse a chance de conhecê-lo, mamãe diria que era o genro que
havia pedido a Deus, mas felizmente eu pouparia a nós dois dessa vergonha,
especialmente por não fazer a menor ideia de onde isso ia dar, por mais que
eu estivesse com vontade de mais.
— Alguns anos depois, eu voltei lá, mas dessa vez já não era mais um
menino doido para impressionar o chefe, era um cara que queria voltar para
casa com a integridade física em dia. — Ri. — Sua vez — pediu, apontando
o rosto em minha direção.
— Eu ouço vozes — confessei, com uma careta, tentando evitar
pensar em planos futuros que jamais aconteceriam.
— Como o cara de O sexto sentido? — perguntou, prendendo uma
risada. — Você fala com gente morta?
— Quase isso. — Rolei os olhos. — Os personagens falam comigo o
tempo inteiro. Quando eu quero dormir, especialmente. Eles não calam a
boca.
— E o que você faz? — quis saber, apertando os olhos em minha
direção.
— Me rendo — ergui a sobrancelha —, ligo o computador, e deixo
eles falarem comigo. Se ignorar, no dia seguinte já esqueci tudo.
— Tava pensando aqui... Acho que essa era a hora perfeita para eu
fugir — sussurrou, se aproximando um pouco. — De repente, uma dessas
vozes pode pedir para que você me sufoque durante a noite.
— Preferia fazer isso em um livro. Prezo pelo meu réu-primário —
falei a segunda parte mais baixo.
— Isso é uma coisa boa de saber, mas por precaução, tenho outros
planos para você esta noite. — Olhei para ele de forma estranha. — Vou te
manter acordada, a noite toda. — Arqueou a sobrancelha, uma das mãos
descendo pelas minhas pernas sobre o tecido do vestido que usava, e em
seguida suas mãos passaram a subir, mas já em contato com minha pele,
deixando um rastro quente por onde seus dedos me tocavam. — Porque eu
quero que você me deixe sem ar, mas de muitas outras formas, escritora.
Instintivamente soltei um arquejo.
— Acho esse um bom plano. — Sorri, movimentando a perna para o
lado, dando a ele mais espaço para me tocar.
Valentim mordiscou o lóbulo de minha orelha.
— Tenho uma ideia perfeita — sussurrou.
As mãos, rápidas, brincavam com a alça fina do vestido que usava,
fazendo-o escorregar por meus braços e arrepiando minha pele. Mal percebi e
a roupa já não cobria meu corpo. Valentim sorriu, admirando a lingerie
vermelha de renda que vestia. Em seguida, beijou meu ombro. Salpicou
beijos até que os lábios tocassem a linha da minha mandíbula.
— Posso saber qual? — Minha voz soou falha e rouca.
Não respondeu, passando o indicador por meu braço. Em seguida,
seus braços estavam ao redor de minhas pernas e eu estava em seus braços.
Não reclamei, podia mesmo me adaptar muito bem a isso.
Mas, diferente do que pensei, Valentim não entrou em nosso quarto.
Muito pelo contrário. Me pôs no chão no deque, próximo à banheira.
Ele sorriu em minha direção começando a retirar a camisa de forma
lenta e sensual, deixando à mostra a pele firme e os gominhos em sua barriga.
Minhas mãos pinicaram de vontade de senti-las novamente sob meu toque.
De vê-lo reagir a mim. Mordisquei o lábio enquanto o assistia remover
também a calça que vestia ficando apenas com uma cueca branca que
destacava muito bem o pau enorme que possuía. Mal podia esperar para tê-lo
em minha boca, em minha boceta, onde ele quisesse enfiá-lo, para ser sincera.
Por experiência própria, sabia que aquele pau era dos que nos faziam
ter vontade de continuar sentando incessantemente.
— Vou ficar ressecado desse jeito. — Usou um tom de zombaria que
me fez franzir o cenho em sua direção. — Com você me secando desse jeito.
Balancei a cabeça em negativa, sorrindo.
— Não tô secando você, que nem é tudo isso — devolvi, dando um
passo em sua direção —, mas não posso negar que estou ansiosa para rebolar
em seu pau novamente. Ele sim é a melhor parte que você possui. — Dei de
ombros.
— A maior, você quer dizer. — Riu, erguendo uma mão em minha
direção. Eu aceitei e, em seguida, nossos corpos estavam colados. — Mas eu
te entendo. Meu pau, há dias, só pensa em comer você também.
Ofeguei quando uma de suas mãos apertou minha bunda ao mesmo
tempo que me puxava para mais perto dele. O pau estava completamente
duro e senti-lo tão próximo me fez ter certeza de que precisava e muito sentar
naquele homem.
— Eu quero que você faça uma coisa pra mim, tudo bem? — pediu,
com a voz rouca e sexy, enquanto os dedos acariciavam a minha bunda.
— O quê? — quis saber, excitada.
— Apesar de querer muito enfiar minha cara nesses seios e te chupar
com vontade só pra depois meter com força o pau em sua boceta, que já está
molhadinha para mim. — Levou a mão que estava na bunda para o meio das
minhas pernas, pressionando o indicador entre o tecido fino e minha entrada,
como se quisesse comprovar sua teoria. Valentim gemeu ao notar que estava
certo. Eu gemi, querendo que aquele contato continuasse. Ele desceu a mão
chegando até metade das minhas coxas. — Quero que você se toque pra
mim. Quero ver você se dando prazer — sussurrou em meu ouvido —, como
se estivesse em seu quarto, sozinha, pensando em mim.
Ofeguei, imaginando a cena e sentindo sua mão brincar em minhas
coxas, subindo até bem próximo da minha boceta que clamava por atenção.
Assenti, um pouco atônita, dando um passo em direção ao quarto, mas
ele segurou meu braço.
— Lá não. Aqui. — Apontou para a banheira.
Olhei ao nosso redor. Apesar de haver uma boa distância entre os
bangalôs, havia sempre o risco de alguém nos ouvir.
Nunca havia feito nada assim. Quer dizer, transar em um lugar onde
as pessoas pudessem nos descobrir, e pensar daquilo, de alguma forma, me
deixou com ainda mais tesão.
Antes que pudesse mudar de ideia, pus os pés dentro da banheira em
formato circular, sentando sobre o deque. Valentim assistia com o olhar
vidrado enquanto eu abria as pernas, tentando ser sensual o bastante, porém
morrendo de medo de parecer uma idiota.
Ele sorriu com os olhos cheios de tesão, sentando-se de frente para
mim, como se quisesse assistir melhor ao show.
— Você é perfeita demais — falou, passando os olhos lentamente por
meu corpo, fazendo-me corar. — Eu quero ver, Talita. Quero ver você se
tocando para mim — pediu, mais uma vez.
Sorri, olhando o volume em sua calça.
Uma das minhas mãos passeou pela minha cintura, lentamente, até
chegar ao seio. Fechei os olhos e o apertei com força, imaginando que eram
as suas mãos ásperas, grandes, mas ao mesmo tempo cuidadosas. Brinquei
com o bico entumescido passando as unhas em seguida e sentindo uma
sensação gostosa tomar conta do meu corpo.
Soltei um som que, ao que parece, havia sido bem recebido por
Valentim. Enquanto uma mão brincava com um seio e, em seguida, passava
para o outro, a outra mão, a direita, fazia o caminho inverso. Descia pela
cintura. Com a ponta do indicador fazia movimentos circulares pelo meu
abdômen, sentindo minha pele se arrepiar.
Meus dedos estavam trêmulos ainda, mas seguiram descendo e
encontraram o caminho para onde exatamente Valentim a queria. Ele soltou
um gemido quando minha mão entrou pela peça pequena e rendada,
brincando com a boceta. Levava o dedo até o clitóris e voltava, gostando da
sensação. Mordi o lábio, me sentindo cada vez mais excitada.
Nunca havia feito aquilo.
Sim, claro, já havia me masturbado antes. Mas não com um homem
me olhando. Me admirando.
— Fale o que você quer, Talita — pediu.
— Seu pau — respondi com a voz repleta de tesão. — Quero seu pau
entrando em mim, Valentim.
Valentim soltou o ar com força e, mesmo sem abrir os olhos, soube o
que ele estava fazendo. Também estava se tocando enquanto me observava
tocar meu corpo para ele.
Soltei um gemido enquanto fazia movimentos circulares em meu
clitóris.
— Isso. Continue assim — pediu.
Fiz o que ele queria. Continuei ali, realizando movimentos circulares
e contínuos, enquanto o ouvia ofegar, assistindo-me. Meu corpo começou a
pedir, implorar por mais.
Eu estava amando aquilo. Era bom. Uma sensação de poder. De estar
viva.
Com a mão que antes tocava os seios, comecei a, desesperada, retirar
a calcinha, enquanto a mão direita continuava os movimentos circulares.
Ergui as pernas por um momento, dando a ele uma visão mais ampla do meu
corpo já quase completamente nu enquanto removia a calcinha.
Valentim soltou o ar com força e deu um gemido em seguida.
Meus dedos deslizaram para dentro de mim. Não pude me conter.
Gemi alto movimentando os dedos.
— Continue — Valentim pediu. A voz de quem estava sofrendo uma
tortura, mas uma boa. Daquelas que não podíamos parar nem mesmo se
quiséssemos.
Meu corpo inteiro tinha encontrado um ritmo próprio. Cada vez mais
meus dedos iam mais fundo. Um, dois dedos. Arqueava o corpo tirando
minhas costas do chão frio. Podia sentir as gotas de suor se formando. Nossos
sons, nossos gemidos misturando-se em algum lugar na distância que nos
separava.
Estava tão entretida em todas as sensações do meu corpo e tentando
evitar a explosão que parecia cada vez mais perto de chegar, que não notei
que Valentim era apenas mais um mero espectador até que suas mãos
estivessem segurando com firmeza minha cintura. O olhei em sua direção e
depois para o pau ereto e já coberto pela camisinha.
— Eu ia esperar você gozar, mas que se foda. Agora eu vou comer
você, Talita. Forte. Rápido. Do jeito que você gosta. — A voz parecia
desesperada. Eu podia gozar só de ouvi-lo. — Esta noite e por quantas mais
eu quiser, você é minha, escritora. De mais ninguém, só minha.
Sabe aquele tipo de frase que tem certeza de que só gostaria dos
livros? Que se foda. Porque tudo o que eu queria, era ser dele. Ser fodida por
ele e gozar enquanto sussurrava sacanagens em meus ouvidos.
— Então me coma — pedi.
Valentim tirou a minha mão, pincelando seu pau em minha entrada.
Murmurei alguma coisa e, em seguida, ele fez o que prometeu.
Entrou com força, fazendo-me erguer o corpo com o nosso contato.
Arfei. Valentim apertou minha cintura com mais força enquanto começava
com os movimentos de vaivém.
Ele beijou meu queixo, meu pescoço. Jogou o sutiã de lado
abocanhando meus seios e as sensações eram tão boas que eu já mal sabia o
meu nome.
Só sentia que eu queria mais.
Nunca havia tido um sexo assim. Intenso demais, com alguém que se
encaixasse tão bem. Alguém que me fizesse senti-lo em cada poro do meu
corpo.
Alguém que eu desejasse tão intensamente.
Sentia a respiração presa na garganta cada vez que os dedos exerciam
mais pressão em minha cintura. Por Deus, como era bom. Eu podia sentir isso
para sempre.
De alguma forma, consegui rebolar, fazendo com que Valentim
soltasse um sonoro ruído de satisfação que me levou a repetir o movimento.
— Ah — gemeu, sussurrando em seguida. — Isso. Faça isso —
encorajou.
Repeti o movimento algumas vezes, recebendo cada vez mais
estímulos para continuar.
As estocadas foram ficando mais intensas. Pressionei a cabeça com
mais força no chão, sentindo que Valentim ia cada vez mais fundo.
Nossas respirações aceleradas provavam que ambos estávamos perto.
O mundo inteiro pareceu girar e ir mais rápido ao mesmo tempo. As
estrelas pareciam prestes a explodir no céu e se transformarem em pequenos
pontinhos brilhantes.
— Vou gozar — anunciou com a voz entrecortada.
Senti quando seu corpo tensionou e o líquido quente jorrou em mim.
Valentim soltou um som gutural e duas estocadas depois era a minha vez.
O mundo explodiu em um milhão de pedacinhos para mim, e aquele
tinha sido o melhor orgasmo da minha vida. Se a cada vez que transássemos
nós conseguíssemos melhorar eu, sinceramente, não iria querer parar com
aquilo nunca.
O corpo suado de Valentim caiu sobre o meu. Automaticamente,
minhas mãos pararam em suas costas, subindo e descendo em um vaivém
gostoso até que nossas respirações estivessem normais outra vez.
— Isso foi muito bom — comentei, brincando com os fios de cabelo
de sua nuca.
— Foi perfeito — concordou. — E eu espero que você tenha muito
fôlego ainda. Prometi que tinha planos para a noite toda e não estava
brincando. Esta vai ser uma noite que você nunca vai esquecer.
— Você é o cara mais convencido que conheço — brinquei, com a
respiração ainda ruidosa.
— Como eu disse, isso é ser assertivo.
Ele colou nossos lábios e fez exatamente o que havia prometido. Foi
assertivo mais cinco vezes naquela noite.
E eu amei cada uma delas.
Capítulo 24
Uma transa para aplacar o tesão e garantir que não repetiríamos a dose
nunca mais, rapidamente se transformou em uma viagem curta para
aproveitar um momento a sós e, enfim, em uma viagem para aproveitar o
final de semana. No fim das contas, algumas semanas havia se passado e nós
ainda costumávamos dividir bastante a cama.
Sinceramente, eu estava disposto a quanto mais tempo ela quisesse.
Torcia para que ela quisesse alguns muitos meses mais. Muitos mais, se eu
fosse bem sincero.
Ter Talita comigo era bom. Como se fosse o lugar certo a se estar.
Claro, era só sexo. Nada além disso.
Mesmo que eu gostasse de estar com ela, mesmo que meu coração
batesse mais forte quando uma mensagem dela, ou quando, não importasse
como o dia fosse péssimo, seu sorriso conseguisse colorir o meu dia de uma
forma inexplicável.
Lidar com Talita não era difícil. Entendê-la, muito menos. A falta do
seu pai acabou causando uma lacuna em sua vida e um bloqueio em seu
coração, mas ao mesmo tempo era completamente entregue às pessoas à sua
volta. Vivia com intensidade os momentos, era leal e preocupada com quem
estava ao seu redor e, além de nos darmos muito bem, nos entendíamos muito
bem na cama.
Eu confiava e me importava com ela.
Talita tinha me apoiado demais nos últimos dias, em especial. Com o
lançamento da nova coluna, compartilhou comigo muitas ideias de como
torná-la mais interativa e atrair, em especial, o público jovem para questões
importantes para eles, para a nossa cidade e para o nosso futuro.
A primeira coluna havia saído algumas semanas atrás e logo de cara
foi um enorme sucesso. A ideia era falar sobre acessibilidade, entretanto, o
veto da distribuição de absorvente e a discussão sobre a pobreza menstrual
me fez mudar de ideia.
Pesquisando sobre o tema, descobri informações alarmantes, como o
fato de muitas mulheres usarem miolo de pão por não terem acesso ao
absorvente. Como o intuito da nova coluna também era abordar políticas
públicas, era um tema necessário.
Juntamente com esclarecimentos acerca do assunto, foi lançado uma
hashtag que rapidamente atingiu os trends topics do Twitter, mobilizando
pessoas a assinarem um abaixo-assinado contra o veto da lei e, mais
importante, divulgando projetos sociais que realizavam distribuição gratuita
de materiais femininos de higiene.
O resultado foi ainda melhor do que eu imaginava. Muitas pessoas
que nunca nem haviam ouvido sobre o assunto foram procurar informações e
as doações para as ONGs aumentaram significativamente, poucas horas
depois da matéria ter sido publicada.
Resumindo, foi um sucesso.
Antonella queria que nós seguíssemos essa linha das ações usando as
redes sociais para chamar ainda mais atenção para os assuntos que
abordássemos. Segundo ela, traria mais visibilidade para a coluna, além de
abranger ainda mais o tema.
Tudo estava bem demais. Demais mesmo. Eu já não estava
acostumado a ter algo legal e por tanto tempo com uma única mulher. Estava
menos acostumado ainda a querer isso. A desejar estar com ela.
Em especial, pela mulher em questão ser a pessoa que fazia a porra do
meu coração bater desesperadamente rápido e minha boca ficar seca
constantemente.
E apesar de não querer nada disso, eu queria na mesma medida.
Talita tinha muitas nuances. Estava longe de ser uma mulher normal e
comum. Achava engraçado sobre como ela costumava falar normalmente das
muitas vozes que conversavam com ela em sua cabeça.
Se eu tivesse um pingo de juízo, possivelmente teria fugido enquanto
havia tempo.
Não agora.
Agora eu já estava sob o feitiço do canto da sereia.
E talvez eu estivesse mesmo me apaixonando pela garota que não
amava ninguém. Certamente essa era uma coisa que eu não queria.
Apaixonar-me por Talita estava fora de cogitação. Eu precisava parar
aquilo sem, necessariamente, parar de vê-la.
Não conseguiria parar.
Estava completamente viciado nela. Assim como era viciado em meu
trabalho, em escrever.
Suspirei, saindo do carro e caminhando em direção à casa do meu pai.
Estava prestes a gritar seu nome quando ouvi risos. E não foi a risada do meu
pai que me chamou atenção, mas da pessoa que estava com ele. A risada que
fazia a porra do meu coração acelerar.
Pé ante pé e com cuidado segui os sons até estar na cozinha. Meu pai
e Talita riam, cúmplices. As agendas da minha mãe, empilhadas na mesa, o
computador dela aberto, mas distante dos dois que viam algumas fotos
minhas de infância.
Cocei a garganta, fazendo um som alto o bastante para que eles
notassem a minha presença.
— Ei — Talita falou, levantando-se, assustada, como se tivesse
acabado de ser pega fazendo algo errado. — O que você tá fazendo aqui?
Franzi o cenho, cruzando os braços e entrando vagarosamente na
cozinha enquanto meus olhos percorriam seu corpo. Usava um short jeans no
meio das coxas e uma blusa cropped que ia de ombro a ombro com mangas
um pouco bufantes, franzido na cintura, fazendo minhas mãos formigarem de
vontade de se atracarem naquele espaço. O tecido verde com flores vermelhas
valorizava perfeitamente seu tom de pele e o destaque no colo me deixava
louco. Nem parecia que ainda ontem tínhamos dormido juntos em minha
casa. A forma como meu pau respondia à Talita era sempre imediata. Perdia
apenas para meu coração que sempre errava as batidas por ela.
— Eu é quem devia estar fazendo essa pergunta, já que estamos na
casa do meu pai. — Semicerrei os olhos em sua direção e a expressão de
culpa se tornou mais forte.
— Acho que nós nos distraímos, Tali — papai falou, com um sorriso
nada sutil no rosto.
Tali? Desde quando meu pai a chamava daquele jeito cheio de
intimidade?
— Acontece quando a companhia é agradável — Talita respondeu,
dando um sorriso daqueles sinceros que só ela sabia dar.
Eu podia ter um ataque cardíaco só por vê-la sorrir daquela forma.
— Quer sentar conosco, filho? — Apontou para uma cadeira vazia. A
mais próxima dele, claro.
Assenti, caminhando.
Podia sentir as faíscas entre mim e Talita mesmo que estivéssemos a
uma boa distância. Acho que meu coração e meu corpo nunca se
acostumariam a vê-la.
Não apenas por ela ser linda, mas por ser única.
Por, de fato, eu querê-la tão enlouquecidamente.
— Será que alguém pode me situar aqui? — perguntei, alternando o
olhar de um para o outro.
— Um velho homem não pode receber a visita de uma amiga?
Amiga? Desde quando meu pai e Talita são amigos?
— Amigos? — Olhei diretamente para Talita. Ela estava encontrando
meu pai escondido de mim?
— Seu pai me pediu ajuda há um tempo — falou, parecendo tentar
descobrir se eu estava bravo. — Estamos trabalhando no projeto do livro.
Olhei fixamente para Talita por alguns segundos, antes de encarar
meu pai.
— O seu livro? — perguntei, em um misto de felicidade e
incredulidade. Ele estava mesmo produzindo o livro e seguindo o sonho de
sua vida?
Assentiu.
— O meu livro. — Sorriu. — Na verdade, Talita veio aqui hoje me
mostrar o resultado. Vimos juntos por algum tempo, e agora paramos para
fazer um lanche.
— E me envergonhar mostrando as fotos de família — brinquei,
rolando os olhos. — Posso ver? — perguntei ao meu pai, e não seria
necessária nenhuma explicação para que ele soubesse exatamente o que eu
queria.
Foi Talita quem se moveu. Pegou o computador dela sobre a mesa,
passando o dedo no touchpad do notebook e fazendo com que a tela se
acendesse. O arquivo estava aberto, mas ela fez questão de voltar para a
primeira página, dessa forma eu poderia ver tudo.
— Seu pai e eu lemos todos os poemas e escolhemos alguns — Talita
explicou antes que eu pudesse passar para a página seguinte. — Essa é a
prova da diagramação. Queria saber se ele estava gostando de como estava
ficando tudo — explicou, enquanto virava o computador com o arquivo na
primeira página em minha direção.
Ainda não havia uma capa, e em seu lugar uma página em branco. As
páginas seguintes continham algumas informações pelas quais ela também
passou, parando na página com a sinopse fazendo com que meus olhos se
enchessem de lágrimas ao ler os primeiros indícios de uma linda história que
seria narrada nas próximas páginas.
O conceito de agenda foi mantido, além das letras cursivas como se
cada página tivesse sido escrita à mão pela minha mãe. A diagramação estava
simplesmente fantástica. As imagens nas bordas, que podiam chegar até o
meio da folha sem atrapalhar a pena, variavam entre flores delicadas, pedaços
de árvores floridas e pássaros voando por entre algumas pétalas que caíam
dos troncos.
— Está... — Parei. Não havia uma palavra que pudesse explicar como
tudo estava absurdamente perfeito.
— Sim, está. — Meu pai se aproximou pondo a mão em meu ombro.
— Ela teria amado, pai.
Não respondeu, apenas apertou a mão com um pouco mais de força,
como se estivesse concordando comigo.
Ver aquelas páginas era como se eu pudesse tê-la aqui, próxima a
mim, mais uma vez. E, no fim das contas, Talita trouxe mais uma coisa boa à
minha vida, a realização do sonho da pessoa mais importante para mim.
Talita havia recusado a carona que ofereci para que não precisasse
pegar um carro por aplicativo. Felizmente, eu nem precisei convencê-la do
contrário, já que meu pai havia deixado claro que não aceitaria uma negativa.
Eu a deixaria em casa e pronto.
A não ser pelo som baixo que saía da rádio que ela mesma havia
sintonizado, o carro estava em um silêncio sepulcral. A mulher sentada no
banco do carona parecia nervosa demais, como se fôssemos completos
estranhos.
— Você está bravo comigo, né? — perguntou, tomando coragem e
me olhando ansiosa. Sua expressão era engraçada. Como se não quisesse ter
me magoado. — Desculpe. Eu sei que devia ter te contado, com certeza você
ia querer participar desse momento com seu pai, já que sempre o incentivou,
mas ele me pediu segredo e não achei certo quebrar a confiança que ele havia
depositado em mim.
Falou tudo de vez, precisando respirar em seguida. Mantive uma
expressão séria no rosto, o que a fez soltar um pequeno resmungo.
— Estou bravo sim, Talita. — Fez uma careta abrindo a boca para,
possivelmente, se desculpar, mas continuei: — Estou muito bravo por você
não ter jogado aquele suco em mim antes. Por não ter te conhecido antes. —
A encarei, aproveitando que o sinal havia fechado. — Você ajudou meu pai a
realizar um sonho antigo. Algo que ele sempre quis fazer, mas nunca achou
possível. Nunca me ouviu o bastante para seguir seu sonho. Acredite, a
última coisa que estou, é bravo com você.
Talita sorriu, aliviada.
Eram em momentos como esses que eu acreditava que, apesar de
demonstrar pouco, ela sentia algo por mim. Que não era só sexo para ela,
como também havia deixado de ser há tempos, para mim.
— Eu pensei que você fosse ficar chateado — falou, aliviada por
saber que estava tudo bem, relaxando o corpo e dando um enorme sorriso em
seguida.
— Estou feliz. E grato — admiti. — Foi uma bela surpresa. Isso com
certeza me fez te — mordi a língua refreando, surpreso, a palavra que quase
escapou dos meus dedos — admirar mais — completei, nervoso e vendo
como seu rosto ficou tenso por alguns segundos, antes que ela soltasse um
suspiro, relaxando a expressão novamente.
— Fico feliz em saber. — Virou um pouco o rosto em minha direção
mantendo a cabeça apoiada no banco do carro.
— Obrigado por isso — falei, deixando a marcha do carro,
entrelaçando nossos dedos e levando sua mão unida à minha até meus lábios
onde depositei um beijo.
Embora tenha engolido as palavras, eu sabia exatamente o que se
passava em minha mente. Aquilo havia feito com que eu a amasse mais.
Amasse.
No fim das contas, não era tão difícil de admitir. Eu a amava. Sabia
disso. Só não tinha certeza de que Talita estava pronta para esse sentimento.
Mas tudo bem, eu sabia esperar.
Afinal, o meu amor é paciente e por ela valia a pena a espera.
Capítulo 25
Tinha dormido muito mal nas últimas noites. Ter duas colunas e uma
interativa era mais trabalhoso do que eu havia imaginado, mas também era
bom. O contato que passei a ter com pessoas que tinham histórias de vida
muito incríveis me fizeram repensar muito sobre aspectos importantes da
minha vida.
A coluna dessa semana ia falar sobre um projeto muito interessante
em que um professor havia se juntado com alguns amigos e começado um
curso de informática em uma comunidade carente do município, visando que
nos dias atuais, saber mexer com tecnologia era o que faria muita diferença
na vida das crianças.
Os computadores, todos doados e alguns que eles mesmos pagaram
para consertar. Podia parecer pouco, mas para os meninos que faziam parte
do projeto, era a coisa mais especial do mundo. Eu estava feliz por poder
escrever a matéria sobre eles.
Espreguicei-me, olhando as horas e chegando à conclusão de que
valia a pena descansar um pouco. Era hora de ir para casa.
Não tinha falado com Talita desde que havia deixado ela e a mãe em
casa, depois da Cidade da Música, alguns dias atrás. Também não havia
respondido às suas mensagens ou atendido as ligações.
Sim. Era só sexo.
Nenhuma novidade.
A diferença era que eu acreditava que podia estar acontecendo algo a
mais. Que ela podia sentir algo por mim. Eu não correria atrás dela, se fosse
só isso que eu representava de verdade. Diversão, apenas. Foi bom, sim. Mas
não valia a pena o desgaste por algo que não daria em nada. Era exatamente
por isso que as pessoas deviam continuar praticando o sexo apenas uma vez,
evitava todo tipo de complicações.
Além do mais, saber disso era uma coisa completamente diferente de
ouvir da boca dela dizendo aos quatro ventos que não sentia nada por mim. O
mínimo entre duas pessoas que saíam juntas há algum tempo era justamente
se afeiçoarem. Achei que aconteceria da parte dela, mas me enganei.
Agora eu sabia exatamente como as mulheres se sentiam quando os
caras que prometiam ligar no dia seguinte não ligavam.
Desliguei o computador e estava arrumando minha sacola, quando
ouvi passos.
— O pessoal lá de cima precisa te dar mais trabalho, você não cansa
de vir supervisionar o meu — brinquei com Mathias, mas não obtive resposta
de imediato.
— Se as vozes falarem mais comigo, com certeza vão me internar o
mais rápido possível. — Ainda de costas, pelo seu tom de voz, era fácil notar
como estava nervosa.
Permaneci parado alguns segundos encarando o nada, tentando
controlar a droga dos meus sentimentos que pareciam confusos demais.
Com cuidado, virei-me. Perdi o ar assim que meus olhos pousaram
nela, da mesma forma que meu coração galopou no peito. Estava linda com
um vestidinho de alças finas que chegavam até metade das coxas. Tudo que
eu queria era poder tocá-la. Sentia falta de tudo nela. Dos sorrisos, das
bobagens, do sexo. De nós dois.
Meu coração doeu.
De alegria.
De tristeza.
— O que está fazendo aqui? — Minha voz saiu muito mais fria do
que pretendia. Talita formou uma linha com os lábios, parecendo sem graça.
— Você não responde às minhas mensagens. — Deu um passo para
frente, como se quisesse testar minha reação.
— Não. Não respondi.
Talita mordiscou os lábios, como se pensasse no que dizer em
seguida. Aparentemente, eu não estava seguindo o que quer que tinha
planejado. Olhou em volta, o que me levou a fazer o mesmo. Olhos curiosos
estavam à nossa volta, como se fôssemos a atração do momento.
— Eu mandei o livro para a editora — informou, mexendo os dedos
na frente do corpo, como costumava fazer quando ficava nervosa. — Pensei
muito no que você me disse e resolvi tentar.
— Fico feliz por você. — Voltei o corpo para o aparelho em minha
frente, conferindo se havia desligado corretamente, antes de encará-la mais
uma vez.
— Desculpe — falou, deixando os ombros caírem um pouco. — Não
devia ter dito aquilo.
Balancei a cabeça em negativa.
— Não precisa se desculpar, você estava certa. Foi só sexo, deixamos
isso claro logo a princípio. — Talita soltou o ar enquanto eu pegava minha
mochila e passava a alça por meu corpo, prendendo-a ao ombro.
— Não foi só sexo pra mim — falou baixo, possivelmente tentando
evitar os ouvidos curiosos dos colegas que ainda estavam na redação. — Eu
menti — deu um passo em minha direção —, eu só não queria ter que admitir
para mim, nem para ninguém que, no fim das contas, você tinha tomado um
espaço maior do que eu esperava em minha vida. Que a pessoa mais irritante
que eu conheci tinha, de alguma maneira, encontrado um espaço em meu
coração, Valentim. — Se aproximou mais um pouco. — Eu menti por medo,
medo de perceber que estava apaixonada por você.
Soltei o ar com força, notando que havia, em algum momento,
prendido a respiração em expectativa. Talita me encarava, apreensiva,
possivelmente torcendo para que eu não a rejeitasse.
— Você não tem mais medo? — quis saber.
Ela deu um sorriso daqueles que apenas ela sabia dar, fazendo meu
coração dar um salto no peito.
— Sim, tenho — aproximou-se mais um pouco —, mas agora eu
percebi, meu maior medo é de não ser sincera e me arrepender. Meu maior
medo agora, Valentim, é de não ter mais você em minha vida.
Meu corpo, certamente, tinha encontrado uma forma nova de manter-
me vivo porque o sangue já não circulava mais em minhas veias.
Sorri.
— Então temos mais uma coisa em comum, escritora. Porque eu
também não quero que você saia da minha.
Talita sorriu e no instante seguinte, estava pendurada em meu corpo,
com os braços em volta do meu pescoço. Assim que nossos lábios se
encontraram, eu soube que ali, com ela, era exatamente onde eu queria estar.
Capítulo 29
Sair da editora e chegar à sua casa foi um enorme desafio. Estava com
tanta saudade de suas mãos em meu corpo que, por mim, teríamos transado
no elevador. Nunca havia experimentado, devia ser bom.
Tínhamos que tentar um dia.
Entre os passos apressados, abrindo a porta com lábios colados como
dois adolescentes cheios de tesão, havíamos conseguido, enfim, chegar. A
roupa que usava estava jogada em algum lugar. Eu tentava arrancar do seu
corpo a camisa que já tinha os botões completamente abertos.
Ele também não queria me perder.
Senti meu coração bater mais depressa ao me dar conta do que suas
palavras significavam. Valentim não me queria apenas para sexo. Embora,
quisemos e muito transar nesse momento.
Valentim pôs as mãos por de baixo de minha bunda, erguendo-me e
caminhando comigo colada ao seu corpo. Lábios nos lábios. Minhas pernas
circundavam seu corpo e não era nada difícil sentir a ereção mesmo que ele
ainda usasse calça.
Depois de passarmos por alguns cômodos, Valentim deitou-se na
cama, posicionando-se sobre mim. Gemi, sentindo nossos corpos
friccionando-se.
Arfei, em meio a um sorriso, enquanto Valentim beijava meu pescoço
mordiscando o lóbulo, em seguida.
Adorava aquilo.
Apertei a unha em suas costas largas quando pressionou mais nossos
corpos, fazendo com que sua ereção roçasse contra minha calcinha.
― Estava com tanta saudade disso ― confessou em meu ouvido ―,
de você, dos sons encantadores que faz quando estamos juntos ― sussurrou,
mordiscando meu lóbulo. ― Eu não vejo a hora de me afundar em você
novamente e matar essa saudade que estava me sufocando.
Passei as mãos por sua nuca, brincando com alguns fios do seu
cabelo. Puxei um pouco seu rosto para trás, para olhá-lo.
― Também senti sua falta ― confessei. ― Muita.
Valentim sorriu antes de aproximar seu rosto novamente, colando
nossos lábios.
Era um beijo diferente, acompanhado de muitas sensações novas.
Saudade, medo, desespero, desejo.
Ora voraz, ora delicado.
Era brisa e furacão.
Duas pessoas dispostas a dar tudo naqueles momentos. A dar o
melhor de si um para o outro.
Não demorou para que o universo estivesse quente como o inferno.
As mãos ávidas buscavam meus seios, beijando. Mordiscando, beliscando,
lambendo.
Era tudo tão diferente do que estava habituada. Havia coração
batendo. Coração na boca. Coração quente. Havia frio na barriga. Medo,
insegurança, desconhecido.
Eu detestava o desconhecido, mas gostava dele. Valia a pena arriscar.
Nossos corpos pareciam saber exatamente o que fazer, como se
estivessem acostumados demais um ao outro. Como se estivéssemos fazendo
aquilo há uma vida inteira.
Era estranho. Mas um estranho muito bom.
Os dedos de Valentim afastaram um pouco minha calcinha, e com a
ponta dos dedos, torturava-me. Arqueava o corpo, querendo mais. Gemendo.
Implorando que ele matasse aquela louca saudade que sentia dos nossos
corpos unidos em um ritmo único.
― Valentim ― sussurrei. Ele sabia o que eu precisava.
Dele.
Cada parte, cada pequena parte do meu corpo o queria.
Não precisei pedir mais de uma vez. Ele colou nossos lábios
rapidamente, movendo o corpo um pouco para o lado e abrindo a gaveta da
mesinha de cabeceira. Não demorou para que ele tivesse vestido a camisinha
e se posicionado entre as minhas pernas.
Diferente das outras vezes, Valentim segurou minhas mãos e
entrelaçou nossos dedos. Nossos olhares se encontraram e uma coisa estranha
aconteceu em meu peito.
Uma dor. Uma paz.
Era bom.
Ele sorriu. Em seguida, investiu o corpo contra mim.
Arfei, sentindo-me preenchida por seu corpo. Como se fosse algo
certo. Como se tê-lo dentro de mim fosse a melhor coisa do mundo e sem ele
ali, as coisas perdiam um pouco do sentido.
― Porra, eu podia morar aqui pra sempre ― falou, colando nossas
testas. ― O mundo faz mais sentido quando estou aqui.
Assenti, arfando.
― Você pode continuar, então. Não me oponho, jornalista.
Ele sorriu, beijando a ponta do meu nariz.
As estocadas não tinham aquela urgência. Ferocidade. Era como se
nós precisássemos sentir mais um do outro. Como se nossos corpos
estivessem em uma incrível sintonia e soubessem como tornar a experiência
ainda mais perfeita.
Eu gostava daquilo.
Eu sentia como se o planeta Terra tivesse entrado em suspenso. De
alguma forma, o mundo e as demais milhares de pessoas existentes nele não
estivessem mais ali. Como se nenhuma delas fizesse mais sentido. A única
coisa que importava éramos nós dois.
A forma como seus olhos brilhavam ao olhar-me. A forma como meu
coração parecia reluzir quando via a expressão que estava em seu rosto.
Era intenso. Diferente e bom.
Valentim apertou ainda mais nossas mãos enquanto os movimentos
tornavam-se lentos, porém com significado.
Queríamos prolongar aquele momento.
Guardar em nossas memórias para sempre. Era especial para ele
também, tinha certeza disso.
Rebolei um pouco, da forma que sabia que ele gostava. Valentim
emitiu um gemido alto.
Valentim sorriu, mordiscando meu lábio inferior e o puxando
levemente.
Arfei, sentindo suas mãos fazerem um caminho até meus seios. Ele
beliscou o bico, fazendo-me arquear o corpo de encontro ao seu, desejando
mais proximidade. Mais daquilo que estávamos fazendo e que conseguia
deixar-me com o coração batendo em um ritmo novo.
Parte de mim sentia como se tivesse aguardado por aquilo a vida
inteira. Por aquele sentimento de encaixe perfeito.
Senti meu corpo tensionando por alguns segundos.
Era como nos livros. Nós brigamos, depois nos entendemos e eu me
dei conta, pela primeira vez, que talvez ele fosse uma espécie de mocinho
para mim.
― O que foi? ― quis saber, preocupado. Certamente algo em minha
expressão havia denunciado meus pensamentos. Minha mente parecia em
choque.
― Nada. ― Balancei a cabeça em negativa por alguns segundos. ―
Não é nada. Só me beije.
E ele o fez.
Dessa vez, enquanto nossos lábios encontravam seu ritmo, algo dentro
de mim parecia ter mudado. Como se estivesse adormecido, até então.
Não tive muito tempo para prestar atenção ou tentar entender o que
acontecia. O ritmo de seu corpo se intensificou, levando-me a erguer ainda
mais o corpo, gemendo mais alto.
Valentim passou o dedo pelo meu rosto com cuidado. Os olhos
brilhando encarando os meus.
― O quê? ― perguntei, ofegante.
Ele balançou a cabeça em negativa abrindo o sorriso de lado que fez
meu coração errar uma batida.
― Gosto de te ver gozar pra mim. Você fica especialmente linda.
Sorri.
― Você é um convencido ― falei, sentindo uma de suas mãos
descerem por minha barriga, chegando ao meu clitóris.
Arfei quando começou com os movimentos circulares.
Seu olhar era intenso, como se esperasse por mim, para que
pudéssemos chegar lá juntos.
O único som do seu quarto era dos nossos gemidos e corpos se
chocando. Toquei seu nariz com a ponta do indicador, tracei a linha dos seus
lábios. Foi involuntário, mas uma parte de mim queria registrar cada
momento em minha mente como uma lembrança boa.
Meu corpo começou a sinalizar sobre o que aconteceria.
― Goze comigo, escritora ― pediu, com a voz entrecortada.
Logo em seguida, aconteceu.
Gozamos juntos.
Seu corpo caiu sobre o meu, a respiração ofegante. Beijou meu
pescoço, jogando o corpo para o lado e puxando-me para si. Minha cabeça
repousava em seu peito e meu indicador traçava desenhos em seu tórax.
― Isso foi perfeito ― falou, parecendo feliz.
Assenti.
Meu coração batendo forte demais. Meu corpo prestes a se entregar
ao cansaço por alguns segundos, sentindo-se incrível.
De alguma forma, eu sentia que ali se iniciava um novo capítulo em
minha vida.
Namorando.
Meu status atual.
Já tinha foto de namorado nas redes sociais e meu namorado era um
rendido que sempre fazia as minhas vontades.
Obrigada, Sandy. Aprendi direitinho.
Estava deitada na cama com Valentim ao meu lado, de conchinha.
Mamãe havia saído. Meu namorado ofereceu nossa companhia a ela, mas,
ainda assim, disse que queria ir só. Que precisava aprender a deixar suas
marcas para trás, se esperava que eu fizesse o mesmo.
Hoje era o dia de Valentim escolher o que veríamos, e acabamos
maratonando, mais uma vez, Loki.
Meu namorado tinha uma fixação pelo homem, sério. Não que eu
esteja reclamando, claro. Afinal podia ver o Tom Hiddleston à vontade.
Estávamos concentrados vendo Sylvie e Loki esperando pelo fim deles,
quando meu celular tocou, me assustando.
— Sério? Agora? — perguntou, fazendo uma careta quando peguei o
aparelho.
— Vida de escritor não para nunca, jornalista — brinquei, descendo a
barra de notificações e paralisando em seguida.
Era a resposta da editora.
Com medo da recusa, tentei ler o que havia no corpo sem abrir o e-
mail em si, mas não conseguia ver nada além das saudações iniciais.
— Foto de pau novamente? — perguntou, se aproximando.
— Não. — Expirei com força, levantando o rosto para olhar. — A
editora, eles responderam.
— E o que eles disseram? — Valentim correu para o meu lado na
cama, tentando ler também, mas a tela seguia da mesma forma, apenas a parte
de apresentação do e-mail visível.
— Não quero ler. — Joguei o aparelho na cama e pus as mãos no
rosto.
— Como não quer? Você está esperando essa resposta há semanas,
escritora.
Senti sua respiração se aproximar aos poucos de mim.
— Não — franzi o cenho, mesmo que ele não pudesse ver —, e se
eles não tiverem gostado? Ai, meu Deus, e se me acharem uma fraude?
Valentim riu.
— Pare com isso. — Me puxou contra seu corpo, tirando minhas
mãos do rosto e fazendo com que eu me aconchegasse a ele. — Eu tenho
certeza de que são boas notícias. Mas ainda que eles não queiram publicar
seu livro dessa vez, isso não quer dizer que você é uma fraude ou menos
talentosa. Só que, no momento, não era o tipo de livro que eles estavam
buscando.
Mordisquei a unha, encarando-o.
— É, né? — perguntei, cheia de dúvidas.
— Sim, é. Você vai ver que eu tenho razão. — Beijou minha
bochecha. — E você tem tantos leitores que, sem dúvida, isso prova que se
tem uma coisa que a minha namorada não é, é fraude.
Namorada.
Meu coração ainda não havia se acostumado a isso.
Sorri, involuntariamente.
— Tá — com medo, ergui a mão e peguei o aparelho estirado sobre a
cama —, vamos lá, então.
— Vamos — confirmou, dando um beijo em meu ombro.
Desbloqueei o aparelho, seguindo para a caixa de entrada. Soltei o ar
com força antes de clicar no e-mail não lido e passar os olhos correndo pelas
palavras, até que fizessem sentido para mim.
Com o coração quase saindo pela boca, aos poucos as palavras foram
tomando forma e, enfim, o termo aprovado para publicação quase fez com
que eu tivesse um infarto.
— Ai, meu Deus, eles vão me publicar! — gritei, me jogando sobre
ele em seguida. Os braços de Valentim me rodearam, apertando-me com
força. — Ai, meu Deus, eu não acredito nisso!!! Eles gostaram do meu livro.
— Claro que eles gostaram, você é uma escritora fantástica. —
Apertou ainda mais nossos corpos.
Meus olhos se encheram de lágrimas.
Era a realização de um sonho, de um sonho enorme e que eu nunca
pensei que daria certo.
— Viu só que vale a pena acreditar em você e nos seus sonhos? —
sussurrou em meu ouvido.
— Obrigada por acreditar em mim. — Abracei-o mais forte.
— Agora que ele já foi selecionado, será que eu poderia ler o novo
livro da minha namorada famosa? — Semicerrou os olhos em minha direção.
— Não. — Dei um beijo rápido em seus lábios. — É uma surpresa. E
eu espero que você goste.
— O quê? — perguntou, passando os lábios sobre os meus de forma
provocante. — Uma dedicatória? O agradecimento ao melhor namorado do
mundo? Vou gostar, sem dúvida.
Sorri, vendo como seus olhos brilhavam enquanto falava. Valentim
estava mesmo feliz e orgulhoso por minha conquista. Era, realmente, como
os personagens que eu amava escrever, que se envolviam com os problemas e
se alegravam com as vitórias das mulheres que amavam.
Era como o meu Valentino.
— Estou ansiosa para que você leia. — Sorri, suspirando em seguida.
— Acho que esse será um grande passo em minha carreira.
— Com certeza, será. Você vai longe, escritora. Tenho certeza de que
sim — garantiu, afastando um pouco nossos corpos para que pudesse me ver.
— Não sou mais uma vendedora de sexo? — quis saber, passando o
indicador por seu rosto.
— É, sim. Mas a minha vendedora de sexo. E se você quer mesmo
saber, acho que vender sexo tem lá suas vantagens.
Ri, sentindo um beijo em meu pescoço.
Estava ansiosa para que Valentim lesse o livro.
Eu não sabia para onde o destino estava me levando, mas, com
certeza, estava gostando muito de caminhar com ele, até esse momento.
Capítulo 30
Um ano depois
Escrever, diferente do que todo mundo pensa, não é uma tarefa solitária. Muito pelo
contrário, é uma tarefa conjunta. Nós surtamos, choramos, temos bloqueio, passamos horas
na frente do computador sem escrever uma linha e, em meio a tudo isso, sempre temos
pessoas que nos apoiam das mais diversas formas. Então, tenho muito a agradecer.
Primeiramente, à minha família, que compreendem (mesmo quando não conseguem
compreender, de fato), as horas trancada no quarto. Sem o apoio de vocês, certamente seria
impossível.
À minha beta Danielle que sempre topa minhas ideias, ouve, aconselha, nota
incoerências, passa raiva e morre de amores. Obrigada, amiga, por sempre, sempre, topar
minhas loucuras.
À Bárbara Pinheiro, que não é puxando saco, mas é como sempre digo, a melhor
revisora do mundo e, sem dúvida, uma das pessoas mais fundamentais que Deus colocou
em minha vida. Nossa amizade é um presente de Deus para mim.
Ao CLAV-BR, só posso garantir o quão afortunada eu sou por tê-las em minha
vida. Crys, Lucy, Ari, Vall e Bah (novamente), obrigada por serem família para mim,
mesmo cada uma morando em um canto deste país. Conviver com vocês é uma escola, e eu
aprendo demais todos os dias. Obrigada por tanto.
Crys e Lucy, obrigada por nesses meses de surtos, com o Valentim, por ouvirem os
medos e incertezas, pelos toques, conselhos e empenho em me ajudar a contar essa história.
Taiane e Fabi, minhas amigas queridas, obrigada por serem tão fundamentais.
Minhas conterrâneas, amigas e irmãs. Vocês são as irmãs que a vida me deu.
À Talita, Bia, Tati, Bruna e Lays. Obrigada de todo coração por tudo que fazem por
mim todos os dias. Vocês são maravilhosas! P.s: Talita, pega o Valentim que é seu! HAha
As meninas do Amores da Ray. Obrigada por estarem sempre presentes, dia após
dia, seja para rir ou chorar. Amo vocês todinhas!
E agradeço a você, querido(a) leitor(a), que chegou até o final desta história. Espero
que tenha gostado do Valentim e da Talita, e, espero também, vê-los em breve em outras
aventuras.
Mil beijos, Ray.
[1]
Orgulho e Preconceito
[2]
Apenas mais uma canção de amor – Rosa de Saron
[3]
Lâmpadas de filamento de carbono, geralmente utilizadas para varal de luzes
em casamentos.
[4]
Livro da Nana Pauvolih
[5]
Ariane Fonseca
[6]
Crys Carvalho
[7]
Glamping é uma combinação de "glamoroso" e "camping", e descreve um
estilo de camping com amenidades e, em alguns casos, serviços de estilo resort geralmente
não associados ao camping "tradicional".
[8]
Personagem do filme Minhas adoráveis ex-namoradas.