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HERMENÊUTICA JURÍDICA E

LINGUAGEM JURÍDICA
PROFESSOR: MARCOS ALBERTO MARTINELLI

Aulas

- Escolas de interpretação:
. Escola de exegese: Surgiu do que se denomina “trauma da Revolução Francesa de 1789”,
evento consolidado com o Código de Napoleão (Código Civil de 1804), onde os direitos
naturais passaram a serem positivados. Segundo essa escola, ao juiz não cabia nenhuma
outra função que não fosse aplicar a lei pautado na neutralidade, objetividade e
racionalidade, sempre visando apenas a escrita da lei, que deve ser a única e máxima fonte
jurídica (codicismo). O declínio dessa escola ocorreu pela ineficiência de seu processo
interpretativo: apenas a letra da lei não era mais suficiente, pois havia lacunas legais e
imperfeições na busca da vontade do legislador.
. Escola da livre investigação científica do direito: Nascida de François Gény (França, 1861
– 1959), se apresenta como um processo integrativo do direito que visa suprir as omissões
das normas, devendo o intérprete deve recorrer a livre investigação científica. Existindo dado
problema, usa-se o racional, o ideal (valores sociais) e a lei vigente para chegar-se a uma
solução.
. Escola histórica: Vinda de Friedrich Carl von Savigny (Alemanha, 1779 – 1861), diz que o
direito nasceria do “espírito do povo” (volksgeist), e teria suas origens “nas forças silenciosas
e não no arbítrio do legislador”. Para Savigny, que era contra o codicismo, “os códigos eram
a fossilização do direito”, ou seja, a codificação era o engessamento do direito, impedindo as
forças históricas e a consciência coletiva de “acompanhar” o ordenamento jurídico.
- Positivismo jurídico (juspositivismo): É a tese de que a existência e o conteúdo de uma
norma dependem de fatos sociais, e não dos seus méritos; de que apenas a lei expressa é
fonte do direito. Segundo Hans Kelsen (Tcheca, 1881 – 1973), “somente o direito posto por
seres humanos é direito positivo”. Independe de critérios como a moral, ética ou política. Já
o positivismo filosófico nasceu com Auguste Comte (França, 1798 – 1857), e defende a ideia
de que o conhecimento científico é a única forma de conhecimento verdadeiro.
- Dimensões do direito: É uma classificação dos direitos fundamentais criada por Karel Vasak
(Checoslováquia, 1929-2015).
. 1ª dimensão: Encontram-se direitos clássicos e básicos, provindos da liberdade. Entre
documentos importantes dessa dimensão, destacam-se a Magna Carta de 1215, a Declaração
de Independência dos Estados Unidos da América (1776) e a Declaração dos Direitos do
Homem e do Cidadão (1789).
. 2ª dimensão: Impulsionados pela Revolução Industrial europeia (XVIII/XIX), que gerou uma
enorme desigualdade social, foram evidenciados direitos coletivos, que visavam a ideia de
igualdade.
. 3ª dimensão: São direitos transindividuais, direitos que tratam os humanos como
inseridos em uma coletividade, tendo em vista a fraternidade. Por exemplo, o direito ao meio
ambiente, ao desenvolvimento, a comunicação e do consumidor.
. 4ª dimensão: Dimensão criada por Paulo Bonavides (Brasil, 1925 – 2020), enquadra os
direitos introduzidos pela globalização política e de direitos fundamentais, destacando-se o
direito a democracia, informação e pluralismo. Para Noberto Bobbio (Itália, 1909 – 2004),
essa dimensão decorreria dos avanços da engenharia genética.
. 5ª dimensão: Segundo Bonavides, a paz é o direito da quinta dimensão, podendo ser
chamado de “direito supremo da humanidade”.

. Conceitos da hermenêutica:
- Interpretação: Pode ser literal, histórica, sistemática, teleológica, restritiva, extensiva,
entre outras.
- Princípio da interpretação mais favorável ao réu: Sempre interpreta-se mais
favoravelmente ao réu, salvo exceções.
- Princípio da unidade do conhecimento: As normas jurídicas devem ser interpretadas
garantindo a coerência e a unidade do ordenamento jurídico.
- Analogia: É o uso de outra lei em situação semelhante na qual possa ser aplicada, em caso
de lacuna legal.
- Sistema jurídico: Conjunto de normas jurídicas de uma sociedade.
- Contexto histórico: Contexto da criação da norma.
- Intenção do legislador: É o objetivo em mente no legislador ao criar a norma.
- Interpretação quanto a Constituição: O entendimento da norma não pode ir contra
matéria constitucional.
. Quanto a linguagem jurídica:
- Há terminologia jurídica e técnicas de redação jurídica específicas.

- Função da linguagem jurídica: Comunicar as normas e os princípios jurídicos de forma clara


e precisa.
- Princípios da linguagem jurídica: Precisão, clareza, concisão, objetividade e coerência.

- Características principais: Terminologia específica, formalidade, objetividade, rigor,


clareza, uniformidade e conservadorismo.

. Regras da interpretação:

- Regra da interpretação conforme a Constituição: Busca assegurar que as leis


infraconstitucionais sejam interpretadas conforme a Constituição. É utilizada quando a
interpretação literal ou a aplicação prática da norma resulta em incompatibilidade com a
Constituição. É baseada no princípio da supremacia constitucional, e é importante para evitar
inconstitucionalidades.

- Regra da literalidade: Atribui ao texto da lei seu sentido literal; interpretação na letra da
lei. Parte do pressuposto de que o legislador é a fonte primária da produção de norma e que
o texto escrito da lei é a expressão máxima da vontade do legislador. Essa norma é
importante para evitar interpretações subjetivas, mas pode causar injustiças se usada de
maneira estrita.

- Regra da sistematicidade: Consiste em analisar a norma no contexto jurídico em que está


inserida. A ideia é evitar que a norma seja interpretada isoladamente, e é importante para
garantir a coerência e unidade do sistema jurídico.

- Regra da finalidade: Busca o propósito da norma para interpretá-la adequadamente; leva


em consideração a finalidade que motivou sua criação. É importante pois defende a ideia de
que toda norma foi criada com um dado objetivo, que deve ser levado em conta para evitar
desvios ou injustiças.

- Regra da unidade da norma: Estabelece que uma norma jurídica deve ser interpretada de
forma unitária e coerente. O intérprete deve considerar todos os seus elementos e partes
como um todo integrado e coeso, evitando contradições entre suas diversas disposições. Essa
regra é particularmente importante porque o objetivo da interpretação é alcançar uma
compreensão justa e equilibrada do conteúdo normativo.

- Regra da harmonização: Em caso de conflito entre duas ou mais normas, o intérprete deve
buscar uma interpretação que permita a conciliação/harmonização das mesmas, evitando a
sua contradição ou invalidação. É importante para garantir estabilidade e evitar incertezas
no sistema jurídico.

- Interpretação extensiva: É uma técnica de interpretação que consiste em ampliar o alcance


de uma norma, para abranger situações que não estão expressamente previstas em seu
texto, mas que se enquadram em sua finalidade e espírito. Geralmente é aplicada quando há
uma lacuna ou omissão na norma, ou quando a interpretação literal do texto leva a uma
solução insatisfatória ou injusta para um caso concreto.

- Interpretação restritiva: É uma técnica de interpretação que consiste em limitar o alcance


de uma norma, restringindo sua aplicação, quando a interpretação literal do texto leva a uma
solução indesejada ou injusta para o caso concreto. Essa técnica é geralmente aplicada
quando a interpretação literal da norma leva a uma solução excessivamente ampla ou
desproporcional em relação ao caso concreto.

Quanto aos textos de apoio

- Hermenêutica jurídica: É o ramo da Teoria Geral do Direito que estuda a interpretação,


para proporcionar bases racionais e seguras para a interpretação de normas, nascido no
século XIX.
- Interpretação jurídica: É explicar, esclarecer, dar o verdadeiro significado da lei; extrair da
norma tudo o que nela contém. Aplica-se ao caso concreto.
- Momentos importantes para o conhecimento: Início da escrita (4.000 a.C.), criação da
imprensa de Gutenberg (XV) e o lançamento do primeiro satélite pelos soviéticos (1957).
- Tipos de conhecimento: Empírico, científico, filosófico e religioso.
- Elementos da comunicação: Emissor, receptor, mensagem, canal e código.
- Funções da linguagem: Função referencial (técnica-argumentativa); emotiva (enfatiza o
papel do emissor); poética (forma da mensagem); fática (chamar a atenção do receptor;
testar o canal) e; conativa (apelo ou ordem; vocativo e o imperativo).
- Tipos de linguagem: Culta, familiar e popular.
- Relações paradigmáticas e sintagmáticas: Vem de Ferdinand de Saussure (Suíça, 1857 –
1923). As paradigmáticas são ideias livres a serem selecionadas, enquanto as sintagmáticas
são as escolhidas e organizadas, devendo ser a temática ser lógica (reta), sintaticamente
organizada (boa) e estilisticamente persuasiva (bonita).
- Quanto ao receptor: Operações de raciocínio: alter (outro; compreensão); ego (eu;
interpretação stricto sensu) e; alter/ego (outro/eu; crítica). “Ninguém interpreta sem antes
compreender.”
- Tipos de redação: Descrição (bases sensoriais), narração e dissertação (emissão de um
juízo).
- Qualidades para uma boa redação: Unidade (uma ideia nuclear), coerência
(encadernamento lógico dos parágrafos) e ênfase (destacar o que busca transmitir).
- Estrutura da redação: Introdução (tópico frasal), desenvolvimento (explanação da
declaração inicial, contraste, enumeração, exemplificação, causa-consequência, resposta à
interrogação, tempo e espaço) e conclusão.

Estrangeirismo

O estrangeirismo judiciário é o uso excessivo de expressões e termos estrangeiros na


linguagem utilizada por jurídica. O uso excessivo de estrangeirismos pode prejudicar a clareza
e a transparência da linguagem jurídica, criando uma barreira para aqueles que não estão
familiarizados com esses termos. Além disso, pode gerar um sentimento de elitismo. Por
essas razões, é importante que os profissionais evitem o uso desnecessário de
estrangeirismos.

Existem diversas razões pelas quais palavras estrangeiras são utilizadas na área jurídica.
Algumas dessas razões incluem:

- Tradição: Muitos termos jurídicos têm origem em outras línguas e foram incorporados ao
vocabulário jurídico ao longo dos séculos.

- Especificidade: Muitas vezes, palavras estrangeiras são utilizadas para descrever conceitos
jurídicos específicos que não têm um equivalente preciso na língua local.

- Uniformidade: Em muitos casos, o uso de palavras estrangeiras é uma forma de garantir


que termos legais sejam compreendidos de maneira uniforme em diferentes jurisdições e
países.

- Prestígio: Em algumas culturas, o uso de palavras estrangeiras pode ser considerado um


sinal de sofisticação e conhecimento especializado.

- Economia linguística: Em alguns casos, o uso de palavras estrangeiras pode permitir uma
economia de linguagem, evitando a necessidade de descrever conceitos complexos em
detalhes.
São alguns exemplos de estrangeirismos latinos:

- Habeas corpus: Direito de um indivíduo detido ou preso de comparecer perante um


tribunal ou juiz para contestar sua prisão.

- Stare decisis : Princípio de que as decisões judiciais anteriores devem ser seguidas em casos
semelhantes no futuro.

- Pro bono: Trabalho voluntário realizado por um advogado sem remuneração para ajudar
uma pessoa ou organização carente.

- In câmera: Procedimento em que o juiz ou tribunal se reúne em particular ou a portas


fechadas.

- Prima facie: Um caso que parece ser verdadeiro ou válido à primeira vista, mas que ainda
precisa ser provado.

- Ad hoc: Para um fim específico ou com propósito temporário, geralmente para resolver um
problema específico.

- Ad hominem: Um argumento que ataca a pessoa em vez do argumento em si.

- Amicus curiae: Uma pessoa ou organização que fornece informações adicionais ou opiniões
a um tribunal em um caso em que não é parte.

- De facto: Algo que é verdadeiro na prática ou na realidade, embora possa não ser
legalmente reconhecido.

O latinismo é uma forma de estrangeirismo amplamente utilizada na linguagem jurídica que


consiste no uso de palavras e expressões em latim. Como o latim foi a língua utilizada pelos
antigos romanos para escrever suas leis e documentos jurídicos, muitos dos termos e
expressões jurídicas utilizadas hoje em dia têm origem nessa língua.

Embora o latinismo seja predominante, existem muitas expressões em língua inglesa


utilizadas na linguagem jurídica, como:

- Due process: Garantia processual de que todos os procedimentos legais serão seguidos
antes que uma pessoa seja privada de seus direitos ou propriedades.

- Tort: Ato ilícito ou negligente que causa dano ou prejuízo a outra pessoa.

- Pro bono: Serviço legal prestado gratuitamente, geralmente em casos em que a pessoa
carente não pode pagar um advogado.

- Injunction: Ordem judicial que impede alguém de realizar determinada ação.


- Jurisdiction: A autoridade legal de um tribunal ou outro órgão governamental para lidar
com um determinado assunto ou caso.

- Lien: Direito legal de um credor de reter a posse de um bem ou propriedade de um devedor


até que a dívida seja paga.

- Precedent: Uma decisão legal anterior que é usada como base para decisões semelhantes
em casos futuros.

- Subpoena: Uma ordem judicial que exige que uma pessoa compareça a um tribunal para
testemunhar ou fornecer evidências em um processo.

- Writ: Uma ordem judicial por escrito que obriga uma pessoa ou autoridade a realizar ou
deixar de fazer algo específico.

O uso de termos em inglês na linguagem jurídica pode variar de acordo com a jurisdição e o
país.
Termos, expressões e outros:

- Axiologia: Estudo dos valores.


- Coesão textual: Correta utilização das palavras que propiciam a ligação entre frases;
colabora com a organização textual e ocorre por meio de conectivos.
- Epistemologia: Estudo do conhecimento.
- Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro (LINDB): Também conhecido como
decreto-lei 4.657/42, é uma lei que estabelece normas sobre a interpretação e aplicação das
leis no Brasil. Era conhecida como Lei de Introdução ao Código Civil (LICC), porém teve seu
nome alterado pela lei 12.376/10, e agora é chamada de Lei de Introdução às normas do
Direito Brasileiro.
- Períodos: Pré-História (~3 milhões a.C. – 4.000 a.C.); Idade Antiga/Antiguidade (4.000 a.C.
– 476 d.C.); Idade Média/Medieval (476 – 1453); Idade Moderna (1453 – 1789); Período
Contemporâneo (1789 – atualidade).
- Realismo jurídico: Diz que o direito é apenas encontrado na realidade, e não no mundo das
ideias. O realismo norte-americano entende que o direito é encontrado nas decisões
judiciais. Já para o realismo jurídico escandinavo, o direito é aquilo que as pessoas observam
em seu comportamento (efetividade das normas jurídicas).

. Bibliografia:
- SOARES, Ricardo. Hermenêutica e interpretação jurídica.
- MAXIMILIANO, Carlos. Hermenêutica e aplicação no direito.
- HENRIQUES, Antonio. Argumentação e discurso jurídico.

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