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Militares mamateiros atacam os serviços públicos no Brasil

O “Projeto de Nação – o Brasil em 2035”, concluído em fevereiro e divulgado dia 19 de


maio, é mais uma demonstração do desprezo dos militares pela soberania popular no
Brasil. Elaborado pelos institutos Villas Boas, Sagres e Federalistas, contou com a presença
do vice-presidente Hamilton Mourão e do chefe do Estado-Maior do Exército Brasileiro na
cerimônia de apresentação. O texto aponta para a cobrança de mensalidade nas
universidades públicas, no Sistema Único de Saúde e a exploração da Amazônia. O fim dos
serviços públicos no Brasil, de acordo com o plano, se dará mediante a manutenção dos
militares no poder até 2035.

Para que isso seja possível, o documento prevê a criação de um Centro de Governo. Trata-
se de um órgão burocrático independente da administração federal que cuidaria de
implantar as propostas sem sofrer qualquer efeito oriundo da mudança de governo
provocada pelas eleições. Na prática, é o esvaziamento da soberania popular. Qualquer
governante eleito teria tanto poder quanto a rainha da Inglaterra. Sua efetivação pode estar
em curso com o avanço da proposta de semipresidencialismo na Câmara dos Deputados.

No documento, o anticomunismo é atualizado pelo globalismo que (não duvidem!) irá exigir
uma lei de segurança nacional para combater o “inimigo interno” (aquele que era chamado
de “terrorista” durante a ditadura militar). Assim, deputados extremistas que “ideologizam” a
política e professores da rede pública que "doutrinam crianças” serão retirados de suas
funções. A autonomia universitária deve ser suplantada através da nomeação de reitores
que sejam antagônicos a essa vertente globalista/esquerdista. Os recentes cortes no
orçamento da educação mostram que os planos de precarizar para privatizar já estão em
curso. Atualmente, mais de 20 instituições federais de ensino estão sob a intervenção de
reitores que não foram escolhidos pela comunidade acadêmica.

Convém ressaltar que as universidades públicas e o SUS foram o esteio da sociedade


brasileira durante a pandemia. Enquanto Bolsonaro divulgava falsos tratamentos e atacava
a democracia com apoio dos generais mamateiros (que chegam a ganhar mais de R$ 800
mil por ano), as universidades públicas e institutos de pesquisa produziram e distribuíram
álcool em gel, vacinas, fizeram testes e um sem número de sequenciamentos genéticos
para entender as mutações do coronavírus no Brasil. O Exército, por sua vez, produzia e
distribuía a ineficaz cloroquina superfaturada para o país todo enquanto comandava,
através do general Pazuello, o morticínio de mais de 200 mil brasileiros na gestão do
Ministério da Saúde.

O projeto apresentado reflete inteiramente o que pensa o Exército Brasileiro a respeito do


Brasil nos mais diversos setores. Ou seja, é a cristalização do pensamento militar estendido
para o restante da sociedade. Jair Bolsonaro é apenas “marmita de milico”. Os generais não
têm votos e usam o capitão para manter o poder e efetivar seus planos macabros. Não foi
coincidência a tentativa de votação da PEC 206, na Câmara dos Deputados, cinco dias
após a divulgação do documento. Os militares marajás sinalizaram para os rentistas
predadores, via Congresso, que apoiam e pretendem efetivar o neoliberalismo no Brasil.

Alguns candidatos democratas, em seus discursos, tentam separar o bolsonarismo das


corporações militares. Parece que ainda não entenderam o tamanho do problema posto na
política nacional. Ou têm medo de enfrentar a dura realidade que mostra o Partido Militar
como obstáculo para a efetivação da democracia no Brasil. Não são generais bolsonaristas
que estão no governo, mas generais que usam o bolsonarismo para se manter no governo.
O problema não é um ou outro integrante das armas, mas a própria corporação que tem um
projeto próprio para subjugar todo o Brasil aos seus interesses.

A sociedade civil, como um todo, precisa enfrentar a mentalidade que impera nos comandos
das Forças Armadas. Não basta vencer o bolsonarismo nas urnas, é preciso mandar os
militares de volta aos quartéis. É urgente trabalhar pela reformulação do ensino militar, da
justiça militar e da inteligência militar que mantêm a estrutura dominante nas corporações
militares. Sem um plano consistente de defesa e a reformulação do papel das forças
armadas, o Exército brasileiro seguirá sendo o braço forte e a mão amiga da dominação
estrangeira sobre nosso país. O desafio histórico de um próximo governo democrático será
definir se seguiremos com o Brasil a serviço das forças armadas ou se finalmente
subjugaremos nossas forças armadas aos interesses do Brasil e do povo brasileiro.

Carla Teixeira - Doutoranda em História na UFMG.

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