O claustrofóbico e sufocante "The Whale" aprisiona seu público em um corpo
em que ele não quer estar Estreando em 2022 nos Estados Unidos e chegando aos cinemas brasileiros em 2023, The Whale (ou A Baleia, como título adaptado para o Brasil) é o mais recente filme de um dos mestres do drama perturbador, Darren Aronofsky. Conhecido por filmes de drama que desafiam a resistência e a passividade dos espectadores diante de uma árdua jornada dos protagonistas, como Cisne Negro e Mãe!, Darren Aronofsky não falha em mais uma vez deixar desconfortável espectadores que normalmente apenas sentam em uma sala de cinema para assistir um filme colorido à moda filmes de heróis. O filme retrata a figura de Charlie, interpretado pelo ator Brendan Fraser, que ganhou o Oscar de Melhor Ator por essa performance, um cidadão estadunidense obeso e condenado à morte devido seu estado de saúde, desdobrando ao longo da trama uma sequência de inesperadas camadas de obstáculos impostos por uma sociedade engessada e preconceituosa que cada vez mais revela-se diante de sua aversão pelo protagonista e de tudo o que ele representa ou é. Preso em um corpo que já não mais consegue existir se não pela ajuda de outra pessoa, Charlie, que carece até mesmo de sobrenome, é um homem homossexual que anseia pela oportunidade de conseguir reconectar-se com sua filha biológica, Ellie, que não possui nenhuma intenção de incluir seu pai em sua caótica e precária vida. Não obstante, um fanático cristão despenca em sua rotina por um infortúnio acaso e acaba tendo seu passado questionado enquanto tenta, de maneira repulsiva, catequizar Charlie de sua própria orientação sexual e de todo o amor que lhe resta antes de afundar em uma espiral profunda de depressão. O longa metragem de 1h57min encapsula o espectador em sua passividade para a própria perspectiva de Charlie, onde Aronofsky faz decisões inteligentes de plano para a filmagem, limitando todas as cenas para um quadrado sufocante e aplicando um zoom incômodo e provocante em todos os momentos que Charlie está em cena, tornando a experiência cada vez mais claustrofóbica em uma ilusão de que o corpo do protagonista está cada vez maior, cada vez mais suprimido e cada vez mais ocupando espaço na tela que não lhe dá outra opção a não ser cravar seus olhos nele. O ator Brendan Fraser não dá o braço a torcer pela própria bizarrice das decisões cinematográficas feitas pelo diretor, entregando uma performance igualmente absurda em suas nuances da realidade. Dando a vida ao personagem Charlie, que está em seus últimos dias de vida após o falecimento de seu ex-marido, Brendan dá uma forma sólida ao personagem depressivo e compulsivo que possui uma constante incapacidade de se impor. A submissão do personagem é o ponto principal de sua trajetória e é sem dúvidas um dos elementos mais revoltantes do filme, se não o mais revoltante, que faz o espectador querer levantar-se da cadeira de cinema tanto quanto os próprios personagens do filme já o bem fazem. O diretor embarca assim em uma jornada de praticamente arrancar a hipocrisia e a repulsa dos demais, apesar de poucos personagens incluídos na trama além de Charlie, indivíduos que entram em interação com o protagonista. A agoniante sequência de rejeição que Charlie recebe por diversas esferas do que é previsto como o ato final de sua vida tem seu impacto acentuado quando todas as decisões visuais também provocam o espectador a ter repulsa pelo personagem em sua total submissão. Impactante e repulsivo, The Whale mostra a importância do cinema como uma arte a provocar a sua audiência, trazendo elementos que forçam o espectador a sair de sua cúmplice passividade ao sofrimento do protagonista e exercitar seus próprios medos, preconceitos e atos do que podem entender como compaixão. É uma grande questão para seus espectadores do porquê de sentir pena, ao invés de realmente querer aplicar uma mudança efetiva, sendo quase duas horas de cutucadas na ferida que tiram o público da zona de conforto de filmes coloridos e colocam no colo da reflexão de uma realidade azeda, fosca e acinzentada que pode existir em qualquer canto do globo.