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LITERATURA INFANTIL NA ALFABETIZAÇÃO E NO

LETRAMENTO

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Sumário
INTRODUÇÃO................................................................................................. 3

O conceito de letramento ................................................................................. 4

O conceito de alfabetização ............................................................................ 5

A relação entre alfabetização e letramento ..................................................... 6

A relação entre literatura infantil, letramento e alfabetização .......................... 9

REFERÊNCIAS ............................................................................................. 14

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NOSSA HISTÓRIA

A nossa história inicia com a realização do sonho de um grupo de empresários,


em atender à crescente demanda de alunos para cursos de Graduação e Pós-
Graduação. Com isso foi criado a nossa instituição, como entidade oferecendo
serviços educacionais em nível superior.

A instituição tem por objetivo formar diplomados nas diferentes áreas de


conhecimento, aptos para a inserção em setores profissionais e para a participação
no desenvolvimento da sociedade brasileira, e colaborar na sua formação contínua.
Além de promover a divulgação de conhecimentos culturais, científicos e técnicos que
constituem patrimônio da humanidade e comunicar o saber através do ensino, de
publicação ou outras normas de comunicação.

A nossa missão é oferecer qualidade em conhecimento e cultura de forma


confiável e eficiente para que o aluno tenha oportunidade de construir uma base
profissional e ética. Dessa forma, conquistando o espaço de uma das instituições
modelo no país na oferta de cursos, primando sempre pela inovação tecnológica,
excelência no atendimento e valor do serviço oferecido.

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INTRODUÇÃO

Segundo Lajolo (2001, p. 66), “na tradição brasileira, literatura infantil e escola
mantiveram sempre relação de dependência mútua”. A escola, incontáveis vezes,
recorreu à literatura infantil, por meio do envolvimento provocado pelas narrativas
e/ou pelo encantamento dos versos, para difundir valores, conceitos, atitudes,
comportamentos. Em contrapartida, a escola é para os livros de literatura infantil um
entreposto, seja por meio de leituras obrigatórias ou de outras atividades
pedagógicas.

Esta histórica aliança entre a escola e a literatura infantil, hoje, manifesta-se,


por exemplo, pelo movimento do mercado editorial, com grandes tiragens de livros
destinados ao público infantil, pela divulgação junto aos professores e órgãos
governamentais que, ao “adotarem” um livro, transformam a venda no varejo em
atacado, pela profissionalização do escritor voltado para esse público. Estas são
algumas manifestações da relação escolaliteratura externas ao livro. Há ainda as
expressões internas desta aliança, lembra-nos Lajolo (2001), como o tratamento
didático dispensado aos textos que compõem os livros de língua portuguesa
utilizados, sobretudo, no ensino fundamental.

Enfim, seja como pretexto para realização de exercícios gramaticais, seja por
meio de modelos de análise literária ou para desenvolver o gosto pela leitura, não há
como secundarizar a relação entre escola e literatura infantil, sobretudo quando nos
propomos a enriquecer seu processo de letramento e alfabetizar as crianças.

É com base nesses esclarecimentos introdutórios que refletiremos,


primeiramente, a respeito dos conceitos de letramento e alfabetização, da relação
existente entre esses dois processos e, por fim, de como tornar possível a necessária
relação entre a literatura infantil e os processos de letramento e alfabetização,
enfatizando práticas pedagógicas que envolvem narrações de histórias.

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O conceito de letramento

No Brasil, é na segunda metade da década de 1980 que, no âmbito acadêmico,


se situam as primeiras formulações da palavra letramento para designar algo que
ultrapassa o processo de alfabetização. Mais do que ler e escrever, é preciso saber
responder às exigências de leitura e escrita que a sociedade nos impõe
cotidianamente. Soares (1998, p. 19) ressalta que o surgimento do termo letramento
representa uma mudança histórica nas práticas sociais: “novas demandas sociais de
uso da leitura e da escrita exigiram uma nova palavra para designá-la” (SOARES,
1998, p. 21).

Segundo a referida autora, “etimologicamente, a palavra literacy vem do latim


littera (letra), com sufixo –cy, que denota qualidade, condição, estado, fato de ser”
(SOARES, 1998, p. 17). No caso da língua portuguesa, à palavra letra, que também
se origina do latim littera, foi acrescentado o sufixo –mento, que denota o resultado
de uma ação. Assim, letramento é, segundo Soares (1998, p. 18), “[...] o resultado da
ação de ensinar ou aprender a ler e escrever: o estado ou condição que adquire um
grupo social ou um indivíduo como conseqüência de ter-se apropriado da escrita”.

Contudo, o letramento é considerado um fenômeno multifacetado e, por cobrir


uma vasta gama de conhecimentos, habilidades, capacidades, valores, usos e
funções sociais, seu conceito envolve sutilezas e complexidades difíceis de serem
contempladas em uma única definição. Por isso, Mortatti (2004, p. 98) salienta que o
processo de letramento

[...] está diretamente relacionado com a língua escrita e seu lugar, suas funções
e seus usos nas sociedades letradas, ou, mais especificamente, grafocêntricas, isto
é, sociedades organizadas em torno de um sistema de escrita e em que esta,
sobretudo por meio do texto escrito e impresso, assume importância central na vida
das pessoas e em suas relações com os outros e com o mundo em que vivem.

Isso significa que, um adulto pode não saber ler e escrever, mas ser, em certa
medida, letrado. O mesmo pode ocorrer com a criança que ainda não foi alfabetizada,

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mas que tem oportunidade de folhear livros, de brincar de escrever, de ouvir histórias.
Para Soares (1998, p. 24), “[...] essa criança é ainda “analfabeta”, porque não
aprendeu a ler e a escrever, mas já penetrou no mundo do letramento, já é, de certa
forma, letrada”, como o João – personagem criado por Ruth Rocha – que apesar de
ser ainda não saber ler e escrever, aprendeu por 14745 intermédio das orientações
de sua mãe, que as placas nas esquinas indicam os nomes das ruas e facilitam a
localização das pessoas:

Em cada rua, na esquina, uma placa pequenina.

João queria saber:

- O que é aquela placa, mãe? Todas as esquinas têm.

- É o nome da rua filho (ROCHA, s/d, p. 6).

Isto quer dizer que o indivíduo letrado, “[...] é não só aquele que sabe ler e
escrever, mas aquele que usa socialmente a leitura e a escrita, pratica a leitura e a
escrita, responde adequadamente às demandas sociais de leitura e de escrita”
(SOARES, 1998, p. 39-40).

O conceito de alfabetização

Hoje, concebemos a alfabetização como um processo de aprendizagem de


habilidades necessárias aos atos de ler e escrever (SOARES, 1998). Trata-se da
aprendizagem de uma atividade cultural complexa que ocorre por meio da interação
entre o adulto letrado e a criança. Contudo, no Brasil, este conceito passou por
algumas mudanças, ao longo da história do ensino da leitura e da escrita no início do
processo de escolarização.

Na década de 1980, coincidindo com as transformações decorrentes do


processo de abertura política, os problemas da educação escolar foram duramente
criticados em nosso país. No dizer de Mortatti (2004, p. 70), “os diagnósticos e
denúncias dos problemas educacionais encontravam sua síntese na constatação do

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fracasso escolar das camadas populares, que se verificava na passagem da 1ª para
a 2ª série do ensino de 1º grau”. Nesse período, críticas contundentes foram dirigidas
aos métodos utilizados para alfabetizar.

Nesse momento, adentraram as portas das escolas, por meio de propostas


pedagógicas implantadas por órgãos governamentais, contribuições da perspectiva
construtivista, baseadas nas pesquisas realizadas por Emília Ferreiro e
colaboradores. Essa perspectiva alterou profundamente a concepção de
alfabetização, que passou a ser vista como um processo de construção da
representação da língua escrita pela criança, cujo início ocorre antes de ela 14746
ingressar na escola, desde que esteja exposta a manifestações de leitura e escrita
(FERREIRO, 1988). Foi por isso que João – o menino que aprendeu a ver – que
desde muito pequeno convivia com manifestações de leitura e escrita (Figura 2),
ingressou na escola para, por meio do ensino sistematizado, aprender a ver, ou
melhor a ler!

Esse momento corresponde ao movimento de ampliação do conceito de


alfabetização. Tal processo não mais poderia se concebido de forma restrita, como
aprendizagem da capacidade de codificar e decodificar. Ao contrário, por ser um
processo por meio do qual a criança constrói ativamente a linguagem escrita através
de interações em um ambiente rico em material escrito, conforme preconiza a
perspectiva construtivista, a alfabetização foi conceituada em sentido amplo e
contínuo. Contudo, este movimento, entre outras causas, provocou a perda da
especificidade da alfabetização, a ponto de, na atualidade, segundo Soares (2003a),
necessitarmos reinventá-la, como veremos adiante.

A relação entre alfabetização e letramento

Conclui-se, então, que os termos alfabetização e letramento não são


sinônimos. Tratase de processos distintos que, contudo, ocorrem de forma
indissociável e interdependente:

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[...] a alfabetização se desenvolve no contexto de e por meio de práticas sociais
de leitura e de escrita, isto é, através de atividades de letramento, e este, por sua vez,
só pode desenvolver-se no contexto da e por meio da aprendizagem das relações
fonema-grafema, isto é, em dependência da alfabetização (SOARES, 2004, p. 14).

No Brasil, tenta-se conceituar e diferenciar esses dois processos desde a


década de 1980, quando o foco da discussão era o problema da evasão escolar e da
repetência, principalmente da 1ª para a 2ª série. Todavia, segundo Soares (2004), os
censos demográficos, a mídia e a própria produção acadêmica brasileira sobre
alfabetização provocaram aproximações entre tais conceitos. Mesmo que a intenção
tenha sido de diferenciá-los, esse quadro gerou, em algumas situações, a fusão de
tais conceitos, e produziu, em determinados casos, confusão entre ambos, a ponto
de diluir a especificidade do processo de alfabetização.

Há estreita relação entre o fracasso das escolas brasileiras em ensinar a ler,


escrever e fazer uso competente dessas habilidades e a perda de especificidade do
processo de alfabetização. Quando as crianças eram alfabetizadas pelos métodos
tradicionais, valorizavase a apropriação do sistema de escrita. As crianças
precisavam, primeiramente, dominar o código escrito para, depois, ler textos, como
os contidos em livros de literatura infantil, que se diferenciavam, em forma e conteúdo,
dos presentes nas cartilhas utilizadas para alfabetizá-las.

Contudo, principalmente na década de 1980, essas práticas foram muito


criticadas e consideradas como causa da incapacidade das escolas brasileiras em
ensinar a ler e escrever. Em razão disso, as práticas pedagógicas que objetivavam a
apropriação do sistema de escrita foram colocadas em segundo plano, priorizando-
se o convívio da criança com a linguagem escrita. No entender de Soares (2004, p.
9), a causa maior para tal perda foi “[...] a mudança conceitual a respeito da
aprendizagem da língua escrita que se difundiu no Brasil a partir de meados dos anos
1980”. Ela está se referindo à implantação, em grande parte de nossas escolas –
mesmo que em nível de ideário –, da perspectiva construtivista.

Não se podem negar as contribuições que a perspectiva construtivista trouxe


para a compreensão do processo de alfabetização. No entanto, ela conduziu a
equívocos e a falsas inferências que ajudam a explicar a perda de especificidade do
processo de alfabetização, tais como: desconsiderar a necessidade de um método

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para alfabetizar; dirigir o foco para o processo de construção do sistema de escrita
pela criança, esquecendo que este se constitui de relações convencionais e
arbitrárias entre fonemas e grafemas; crer que o convívio intenso com materiais
escritos fosse suficiente para alfabetizar a criança (SOARES, 2004).

Estes equívocos e falsas inferências fizeram com que o processo de


alfabetização fosse ofuscado pelo de letramento, ou seja, ao incorporar na prática
pedagógica os usos sociais da linguagem escrita, priorizou-se o processo de
letramento em detrimento do de alfabetização, que acabou obscurecido, perdendo
sua especificidade.

Essa situação gerou uma inusitada forma de fracasso escolar, denunciado por
avaliações externas à escola, como o Sistema Nacional de Avaliação da Educação
Básica (SAEB), o Exame Nacional do Ensino Médio (ENEM) e o Programa
Internacional de Avaliação de Estudantes (PISA). Esses sistemas de avaliação
revelaram que há muitos alunos não alfabetizados ou semi-alfabetizados
matriculados em todas as séries do ensino fundamental, inclusive no ensino médio.

Diante das críticas a esse movimento que não produziu os resultados


esperados, pois as crianças continuaram sem aprender a ler e escrever, apenas tendo
sido promovidas de uma série ou ciclo a outro, iniciou-se um outro movimento, que
busca recuperar a especificidade do processo de alfabetização. Para Soares (2003b,
2004), urge reinventarmos a alfabetização, ou seja, para alfabetizar faz-se necessário
orientar as crianças na aprendizagem do sistema de escrita: “É a retomada da
aquisição do sistema alfabético e ortográfico pela criança nas suas relações com o
sistema fonológico” (SOARES, 2003a, p. 21).

Contudo, a autora alerta para os riscos que advém desse movimento. Ele pode
ser um retrocesso se o processo de alfabetização for tratado separado do processo
de letramento. É necessário, então, recuperar a especificidade da alfabetização,
desde que se reconheça a relação de indissociabilidade e interdependência existente
entre ela e o processo de letramento. Isto quer dizer a aprendizagem da escrita deve
ser encaminhada de tal forma que as crianças aprendam a ler e a escrever em
situações que considerem as finalidades dessa linguagem e seu impacto na vida

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social, como aconteceu com o João que ao sair da escola, procurou nas placas,
letreiros de lojas e outdoors, as letras que a professora havia ensinado.

Essa forma de compreender a relação entre alfabetização e letramento é


importante, uma vez que cada um desses processos tem diferentes facetas cujas
distintas naturezas requerem metodologias de ensino diferentes. Para algumas, não
há como abrir mão de metodologias dotadas de intencionalidade e sistematização,
como é o caso, por exemplo, da consciência fonológica e fonêmica e da identificação
das relações fonema-grafema – habilidades necessárias para a codificação e
decodificação da língua escrita. Nessas situações, é imprescindível a presença do
professor organizando o ensino com objetivos claros e definidos. Para outras facetas,
além de intencionais e sistematizadas, é possível recorrer a metodologias indiretas,
subordinadas às possibilidades e motivações das crianças. É o caso da situação em
que se pretendem promover experiências variadas com a leitura e a escrita, conhecer
diferentes tipos e gêneros de material escrito e interagir com eles (SOARES, 2004).

É por isso que defendemos a necessidade de haver, na prática pedagógica


que visa à aprendizagem inicial da linguagem escrita, uma relação de equilíbrio e
complementaridade entre os processos de alfabetização e letramento.

A relação entre literatura infantil, letramento e


alfabetização

Defender a indissociabilidade entre os processos de alfabetização e letramento


significa que, ao organizar a prática pedagógica, se faz necessário dotar de
intencionalidade e sistematicidade tanto as ações que envolvem o ensino do sistema
de escrita, quanto as que pretendem mergulhar as crianças no mundo da escrita. É
nesta situação que sugerimos recorrer à literatura infantil, considerando-a não apenas
capaz de ampliar o nível de letramento das crianças e de estimulá-las a aprender a
ler e a escrever, mas, sobretudo, de revestir de ludicidade as práticas pedagógicas
que envolvem esses dois processos.

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Essa orientação coaduna com as reflexões promovidas por Maia (2007) acerca
da formação de leitores. Para ela “[...] a literatura possibilita à criança uma
apropriação lúdica do real, a convivência com um mundo ficcional, a descoberta do
prazer proporcionado pelo texto literário e a apreensão do potencial lingüístico que
esse texto expressa” (MAIA, 2007, p. 67). Isto quer dizer que a literatura infantil além
de poder transportar o leitor mirim a lugares imaginários e de lhe permitir vivenciar
situações que a vida cotidiana não lhe proporcionaria, estimula o interesse pelo texto
escrito enquanto linguagem capaz de materializar ações e pensamentos humanos.

Nessa perspectiva, a linguagem tem uma dupla importância: além de constituir


um instrumento de interação entre as crianças, é fator determinante no processo de
aprendizagem e desenvolvimento delas. Dessa forma de conceber a linguagem,
advém algumas implicações de ordem metodológica: não há necessidade de a
criança, primeiramente aprender a ler e a escrever para, somente depois de atingir
um determinado nível de apreensão do código linguístico, embrenhar-se no mundo
da escrita, mais especificamente, no mundo de encantamento e magia que
experiências significativas com a literatura podem lhe proporcionar.

Para tanto, convém envolver as crianças, desde a mais tenra idade, em


eventos de letramento: “situações em que a escrita constitui parte essencial para fazer
sentido à situação, tanto em relação à interação entre os participantes como em
relação aos processos e estratégias interpretativas” (KLEIMAN, 1995, p. 40). É o que
fez a mãe de João – personagem ao qual já nos referimos – mostrando-lhe que a rota
seguida pelo ônibus estava marcada na frente e na lateral do veículo, que nas placas
das esquinas estavam registradas os nomes das ruas para auxiliar a população a se
localizar, que os outdoors continham mensagens publicitárias.

No dia seguinte, cedo, João foi para o colégio. Quando chegaram na esquina
a mãe de João falou:

- Temos de tomar o ônibus. Será que vai demorar?

- Mas que ônibus, mamãe, nós vamos ter que tomar?

- O que vai pra sua escola.

- E como é que você sabe o que vai pra minha escola?

- Eu olho o que está escrito na placa: RIO BONITO. (ROCHA, s/d, p. 8).

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Dentre os muitos eventos de letramento, os atos de narrar e ler histórias se
constituem práticas prazerosas e significativas para as crianças, seja nos lares ou em
instituições educativas. Um dos principais objetivos da leitura ou da narração de
histórias na escola é estabelecer interação entre as crianças e a linguagem escrita,
“de modo a possibilitar uma intimidade prazerosa, uma relação afetiva com a natureza
dessa modalidade de linguagem” (MAIA, 2007, p. 95). Para tanto, o professor deve
assumir o papel de mediador entre a criança e o livro. Para a autora anteriormente
mencionada, ao lermos e narrarmos muitas histórias para as crianças estamos
oferecendo-lhes.

[...] a possibilidade de conhecer o uso real da escrita, pois é ouvindo e tentando


fazer leituras de textos com mensagens que remetem ao universo, às vezes real, às
vezes imaginário, que ela descobre a língua escrita como um sistema lingüístico
representativo da realidade. É ouvindo mensagens com contextos significativos que
a criança insere-se num processo de construção acerca da linguagem; aprendizado,
portanto, diferente do processo de simples domínio de codificação e decodificação de
sentenças descontextualizadas e tão comuns nas cartilhas (MAIA, 2007, p. 82).

Contudo, tais práticas necessitam ser previamente organizadas e planejadas.


Esse planejamento envolve, em linhas gerais, quatro momentos: conhecer a história
antes de lê-la para as crianças e estudar seu enredo; pesquisar sobre a vida do autor
(e do ilustrador); definir as estratégias e os recursos didáticos mais adequados à
história selecionada; confeccionar os recursos escolhidos.

É necessário estudar o enredo da história antes lê-la às crianças para


pesquisar o significado de alguma palavra desconhecida, verificar se a história
escolhida é adequada à faixa etária do público, conhecer o enredo, as personagens
principais, secundárias e supérfluas, o ambiente da trama (local, época, civilização),
avaliar a qualidade do texto, aprimorar o fluxo da leitura. Enfim, é essa compreensão
em profundidade do texto que garante a criação de um clima de envolvimento e
encantamento.

Ao apresentarmos para as crianças o livro da história lida ou narrada, seu autor


e ilustrador, estamos ensinando-lhes que o pensamento humano pode se tornar
matéria. As histórias são criadas pelos homens, registradas por meio da escrita e
reproduzidas em editoras. É esse registro que nos permite conhecer uma história,

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mesmo não vivendo na mesma época e no mesmo local de seu autor. Isso significa
que se Ruth Rocha tivesse somente contado para seus filhos a história do menino
que aprendeu a ver, poucas seriam as pessoas que hoje teriam acesso à mesma.
Talvez seus netos. Porém, seus filhos poderiam esquecer alguma parte ou não contar
com fidelidade a história inventada pela mãe. Enfim, a história de João poderia sofrer
alterações ou cair no esquecimento. Ao escrever a história, a autora conferiu
concretude à linguagem. Muitas crianças e adultos, independente do local onde
moram ou da época vivida, poderão conhecer a história por ela inventada, lendo o
seu livro.

O conhecimento do enredo, das personagens e do ambiente no qual se passa


a história auxilia o professor na seleção de estratégias e recursos didáticos mais
apropriados para a narração. Dohme (2010, p. 27) salienta que “estes elementos
indicarão onde estão as dificuldades para a produção de caracterizações e cenários
e quais pontos podemos explorar para dar um colorido especial” à narrativa. Além do
próprio livro, existem muitos recursos que podem auxiliar a narração de histórias.
Fantoches são os mais comuns. Existem ainda: dedoches, flanelógrafos, álbuns
seriados, teatros de sombras, aventais, TV a cabo, painéis sanfonados, cartazes,
entre outros.

Enfim, são muitas as possibilidades de enriquecer as práticas de leitura e


narração de histórias, tendo em vista que por meio delas, se planejadas e
intencionais, estamos promovendo o processo de letramento das crianças e
estimulando-as a aprender a ler e escrever. E, se ao final da história, as crianças
manifestarem o desejo de ouvi-la novamente, é sinal de que houve encantamento, de
que ações e pensamentos humanos – materializados em escrita – foram transmitidos
para outras gerações, de que uma das finalidades dessa complexa forma de
linguagem – transmissão de cultura – de forma prazerosa, se efetivou.

Para que tais práticas possibilitem a ampliação do nível de letramento das


crianças, tão importante quanto os atos de ler e narrar histórias, são os diálogos
estabelecidos com as crianças após a leitura ou narrativa. Rego (1990, p. 54) destaca
a importância de incentivar a criança a falar sobre o texto lido: “É muito importante
que surjam perguntas e comentários por parte das crianças, para que a história não
se transforme num ritual didático alheio aos verdadeiros interesses delas”.

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Por isso, o clima instalado após a leitura deve favorecer o diálogo e permitir
que as crianças façam comentários. Segundo Maia (2007, p. 83), “o diálogo e os
comentários sobre as leituras realizadas são necessários para que haja troca de
informações, confronto de opiniões, comunhão de idéias, exposição de valores e,
consequentemente, desenvolvimento dos sujeitos envolvidos no processo”. O
importante salienta Kleiman (1995), é que o conteúdo desses diálogos estenda-se a
outros contextos, aproximando a história às experiências das crianças e permitindo-
lhes fazer inferências.

Experiências significativas com a linguagem escrita proporcionadas por meio


de narrações de histórias cuidadosamente planejadas permitem que as crianças
desenvolvam capacidades essenciais para a aprendizagem da leitura e da escrita,
estimulando-as a embrenhar-se no mundo da escrita.

Ouvir histórias constitui-se em um momento de muita exigência para a criança:


atenção, concentração, antecipações, formulação de hipóteses sobre a natureza da
linguagem escrita. São ações que colaboram para a compreensão dos processos e
relações estabelecidas no sistema de representação da língua (MAIA, 2007, p. 107).

A vontade de aprender a ler e escrever muitas vezes manifesta-se nos


momentos de narração de histórias quando a criança se aproxima do professor, olha
desejosa para o livro e diz: “posso ler também?”. E então, de posse do livro, começa
a folheá-lo, a admirar as ilustrações, a correr os pequenos dedos sob as letras e a
“ler” a história contada pela professora. Até que, por meio de práticas pedagógicas
intencionais e sistematizadas, parafraseando Ruth Rocha, ela aprende a ver, ou
melhor, a ler a palavra, a desvendar o mundo, como ocorreu com João – o menino
que aprendeu a ver, quer dizer, a ler.

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REFERÊNCIAS
DOHME, Vânia. Técnicas de contar histórias. Petrópolis: Vozes, 2010.

FERREIRO, Emília. Reflexões sobre alfabetização. São Paulo: Cortez, Autores


Associados, 1988.

KLEIMAN, Ângela. Os significados do letramento. Campinas: Mercado de


Letras, 1995

LAJOLO, Marisa. Do mundo da leitura para a leitura do mundo. São Paulo:


Ática, 2001

MAIA, Joseane. Literatura na formação de leitores e professores. São Paulo:


Paulinas, 2007.

MORTATTI, Maria do Rosário Longo. Educação e letramento. São Paulo:


UNESP, 2004.

REGO, Lúcia Lins Browne. Literatura infantil: uma nova perspectiva de


alfabetização na pré-escola. São Paulo: FTD, 1990.

ROCHA, Ruth. O menino que aprendeu a ver. São Paulo: Quinteto Editorial,
s/d.

SOARES, Magda. Letramento: um tema em três gêneros. Belo Horizonte:


CEALE/Autêntica, 1998.

. A reinvenção da alfabetização. Presença pedagógica. Belo Horizonte: n. 52,


p. 15- 21, jul./ago., 2003a.

Letramento e escolarização. In: RIBEIRO, Vera Masagão (Org.). Letramento


no Brasil: reflexões a partir do INAF. São Paulo: Global, 2003b. p. 89-113

Letramento e alfabetização: as muitas facetas. Revista Brasileira de Educação.


São Paulo: n. 25, p. 5-17, jan./abr. 2004

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