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CONCEITUAÇÃO DO MODELO DE GESTÃO ESCOLAR PARA

RESULTADOS DE APRENDIZAGEM

A partir do acúmulo de conhecimentos construídos no diálogo com os estados parceiros e na composição


entre o saber formalizado e os saberes da prática, elaboramos um modelo de gestão escolar que configura
um método orientador das experiências. O método será apresentado no capítulo 4 deste documento.

Por ora, este texto vai tratar dos componentes-chave para sua compreensão.

2.4.1 PRINCÍPIOS E VALORES


Cinco princípios e valores orientam e fundamentam a Gestão Escolar para Resultados de Aprendizagem.
São eles:
Figura 3 - Princípios e valores

PARTICIPAÇÃO

NECESSIDADE DE INOVAR

EQUIDADE

1. Participação

• Princípio democrático: criação coletiva e crescimento a partir da crítica.


• Engajamento dos atores da escola, da família e da comunidade.
• Reunir informações e pontos de vista diversos para tomada de decisões mais efetivas.

Entendemos que a participação, além de indispensável ao exercício da democracia, permite que as decisões
sejam mais acertadas e produzam melhores resultados, se comparadas com decisões tomadas de forma
autocrática.
Um contexto participativo abre espaço para que posições contraditórias sejam colocadas lado a lado e possam
ser analisadas, permitindo que os diferentes atores assumam uma posição criativa, produtiva e colaborativa.
A gestão será melhor e mais sustentável à medida que for capaz de considerar diferentes perspectivas
no momento de pautar suas decisões – perspectivas que incluem especialmente os estudantes e aqueles
atores que participam de modo indireto dos processos escolares: as famílias e as comunidades.

2. Altas Expectativas
e Valorização

• Definir padrão de alto desempenho por acreditar no potencial dos estudantes e equipe escolar.
O modelo de gestão orientado para resultados exige um ambiente em que todos os atores das comunidades
escolares tenham altas expectativas em relação a seu próprio desempenho e ao desempenho dos outros.
Esse ambiente potencializa a gestão, pois gera clima de confiança e valor capaz de fazer cumprir metas
pactuadas e garantir a aprendizagem de qualidade a todos os estudantes. Isso exige a adoção de estratégias que
garantam a valorização dos atores e segmentos escolares para alcançarem suas conquistas.
Da mesma forma, a criação de uma cultura de altas expectativas nas escolas é uma estratégia poderosa para a
melhoriados resultadosde aprendizagem e para a equidade. Isso porque acreditar que todos os estudantes são
capazes de aprender e atingir os níveis previstos significa direcionar esforços para que todos sejam contemplados
e incluídos – independentemente de raça, gênero, origem social, orientação sexual ou deficiência.

3. Necessidade de
inovar

• Contextos de heterogeneidade dos territórios e do perfil das escolas.


• Padrões por grupos semelhantes de escolas.
• Democratização da rede de ensino como um todo.

Respeitar a diversidadesignifica assumir, em sua potência, os contextos de heterogeneidade territorial e


de perfis das escolas. Realizar diferenciações é fundamental para que não se perca de vista que

os territórios têm nome, história, singularidades, limites e potências implicados nos desafios e resultados de
aprendizagem buscados.

A concepção de gestão para resultados não propõe que se trate caso a caso– isso seria uma estratégia ingênua
e inviável –, mas que se considere a existência de peculiaridadesquepodemser trabalhadas de forma coordenada. Por
exemplo, em grandes cidades existem territórios igualmente marcados como áreas em constante conflito, nos
quaisumagestãocomprometida e qualificada não pode prescindir de considerar essa variável para garantir os direitos
de aprendizagem de todos.

Nessa perspectiva, propomos a adoção de padrões de funcionamento para atender grupos por semelhança como
estratégia para favorecer a contextos diversos de forma justa e democrática. No método proposto, com base no
modelo de gestão para resultados, tem-se o agrupamento e o tratamento diferenciado para escolas queselocalizamem
condiçõesde maior vulnerabilidade. Para esse grupo, faz-se um esforço ampliado no suporte e acompanhamento à
gestão escolar,tendoemvistacorrigiruma situação historicamente desigual e democratizar a rede. Para isso é necessário
produzir estruturas e modos de funcionamento que considerem as diferenças capazes de gerar oportunidades
iguais para todos.

4. Respeito a
contextos diversos

• Ambiente voltado para inovação.


• Padrões de funcionamento liberam energia para a equipe escolar inovar no que importa.
A escola pode ser um campo favorável à inovaçãoe,assim,ampliarainda mais sua potência transformadora.
A inovação – que não se resume à tecnologia e seus aparatos – é produzida comtrabalho,em diálogo com saberes de
campos teóricos e técnicos, e depende da sistematização rigorosa de conhecimentose de soluções testadas na
prática.
Pode parecer, porém não se trata de algo extraordinário, mas sim de soluções produzidas cotidianamente e a partir da
reflexão coletiva sobre a prática até que, aprendendo com o que foi realizado, cada uma das consequências do que foi
realizado, sechegueao“novo”– umnovo jeito de agir, de pensar, de fazer. As condições de restrição e adversidade a que as
escolas estão sujeitas muitas vezesimpedem taisprocessos. Por isso, o modelo de Gestão Escolar para Resultados de
Aprendizagem incorpora a disseminação de padrões de funcionamento e protocolosde práticas de rotina como estratégia
para viabilizaro que pode serconsiderado inovador para a superação dos desafios pedagógicos.
Assim, contar com o suporte de ações estruturadas por meio de padrões e protocolos permite que os atores
disponham de tempo e energia necessários aos processos de criação e inovação.
Trabalhar atento à produção, imerso no propósito, cultuar a alegria no ofício, buscar o resultado a partir do trabalho, são
possíveis lições que a gestão orientadapararesultadospodelegar para aqueles que desejam transformar a educação
e inovarnabuscapela aprendizagem de todos.

5. Equidade

• Foco em situações e grupos de maior vulnerabilidade.


• Padrões e ações afirmativas são fundamentais para a redução das desigualdades educacionais.

Conforme já mencionado, a gestão orientada para resultados investe intensos e especiais esforços para as
situações e os grupos mais vulneráveis.
A gestão precisa ser capaz de implementar ações direcionadas para reduzir as condições reprodutoras de
desigualdade, com foco em equidade, em um ambiente orientado para resultados, definido pela eficiência dos
processos e pela efetividade da aprendizagem.
Assim, o modelo de Gestão Escolar para Resultados de Aprendizagem afirma os princípios da participação, o
respeito à diversidade, as altas expectativas, a necessidade de inovar e o compromisso com a equidade,
fundamento incontornável de transformação da realidade brasileira.
O que esse modelo defende é a possibilidade de trabalhar de forma articulada e simultânea todos esses
princípios e valores, colocando de modo assertivo e declarado a responsabilidade do MEC, das secretarias
estaduais, regionais e da escola, movendo todas as competências e ações necessárias para a superação das
desigualdades com dedicação à garantia do direito à aprendizagem de todos.

Extraído do Livro Circuito de Gestão- Insituto Unibanco- Edição2019


2.4.2 DETERMINANTES DA APRENDIZAGEM

As condições de aprendizagem sãodeterminadaspor diferentes parâmetros das políticas econômica, social e


educacional nas quais estão inseridos os serviços educacionais das redes públicas de ensino, compostas por
suas escolas e atores, famílias e comunidade.

Figura 4 - Determinantes das condições de aprendizagem

CONDIÇÕES DE
APRENDIZAGEM

Um exemplo das implicações que condicionam ou impactam as condições de aprendizagem pode ser verificado
no âmbito da política econômica. O aumento da renda da família brasileira (que, em muitos casos, também está
relacionado a políticas públicas específicas) amplia sua potência econômica para garantir o direito de todos os
estudantesà escolarização e à aprendizagem. Em cenários de pobreza e de vulnerabilidades

múltiplas, as famílias enfrentam a destituição de direitos sociais básicos. Nesses contextos de exclusão, a
garantia do direito à educação ganha contornos ainda mais complexos e dramáticos. As políticas sociais de
transferência de renda, ao estabelecer condicionantes, tentam justamente assegurar que o aumento do consumo
seja acompanhado de mais acesso aos direitos sociais fundamentais – entre eles, a educação.

Do ponto de vista da política educacional, o crescimento e desenvolvimento econômico, ao possibilitar o aumento das
arrecadações, ampliam os recursos que devem ser constitucionalmente direcionados à educação pública.

No modelo de gestão escolar proposto, partimos da premissa de que as condições de aprendizagem dependem
dos parâmetros das políticas econômica, social e educacional. O esforço é para que os gestores não
subestimem essas variáveis ou que deixem de problematizar suas relações (maiores ou menores) com a
capacidade das instituiçõespúblicasde trabalharem a serviço da aprendizagemde todos. Em meio a essa ampla e
complexa problemática, é preciso ter foco para conferir sentido ao trabalho que se realiza, por meio de duas
acepções: direção e pertencimento. O foco aqui é o de compreender e dar visibilidade para a incidência da gestão
escolar sobre essas condições, otimizando a capacidadede a escolagarantiras aprendizagens.

No âmbito da escola, a aprendizagem também depende de condições relativas aos recursos humanos,
práticas pedagógicas, infraestrutura e orçamento, além do contexto sociofamiliar, econômico e etário e da
participação da comunidade, incluindo os jovens. Como vimos, compreender a condição juvenil na
contemporaneidade é um desafio para a educação, poisé um primeiro passo para entender o que motiva os jovens
a permanecer na escola.

Assim, o modelo de gestão para resultados apresenta uma lógica baseada em evidências, para que a gestão
escolar consiga harmonizar múltiplas variáveis em seu contexto, orquestrando os usos dos recursos disponíveis
sem paralisar diante das restrições e colocando a aprendizagem como o centro de todas as decisões.

Figura 5 - Escola e determinantes da aprendizagem

HUMANOS

FINANCEIRO CONDIÇÃO JUVENIL

Nesse modelo, investimos para que a gestão dos recursos, responsabilidade do gestor, seja realizada em conjunto
com as famílias e os vários atores da comunidade escolar, de modo a compartilhar as restrições e os desafios
que possam existir.
Embora a primeira consideração possa levar à necessidade de obtenção de mais recursos, é preciso refletir
sobre como os recursos existentes estão sendo usados.
Talvez deva-se partir da seguinte questão: como usar melhor os recursos disponíveis a serviço da
aprendizagem? Pode ser que, por prudência, usar bem os recursos seja necessário para que se justifique ter mais
fundosparacontinuara fazer bem o que se faz, sempre a serviço da aprendizagem.
Dada a heterogeneidade dos estados e das escolas no país, sem uma gestão consistente e focada no
enfrentamento de padrõesde desigualdade e na garantia da aprendizagem, tal como o modelo propõe, é possível
que a dinâmica educacional de exclusão continue a se repetir. Uma dinâmica pode fazer uma escola em uma área
de conflito na periferia urbana, por exemplo, ter menos probabilidade de garantir o direito à aprendizagem, se
comparada a uma escola que está em uma área pacificada e com maior acesso a direitos sociais. As escolas
rurais com seus possíveis desafios estruturais podem ser outro exemplo.
Nesse sentido, a gestão é necessária para garantir o direito à aprendizagem, sobretudo no contexto de
desigualdade estrutural em que vivemos no Brasil. Assim, o modelo de Gestão Escolar para Resultados de
Aprendizagem visa garantirque os gestores possam atuar focados e determinados para democratizar o sistema
de ensinoe reduzir as desigualdades potenciais. Para tanto, é imprescindível a tarefa de voltarmos a atenção da gestão
paraa aprendizagemde todosos estudantes.

Extraído do Livro Circuito de Gestão- Insituto Unibanco- Edição2019


2.4.3 PROCESSOS DE ROTINA DA GESTÃO ESCOLAR

Para a gestão escolar, os processos de rotina são fundamentais.

Porém, para obter resultados de aprendizagem, todos os diferentes atores da comunidade escolar devem estar a
serviço da gestão pedagógica. Nesse ideal, os estudantes estão presentes, motivados; todos aprendem, pensam
e constroem expectativas positivas para o próprio futuro; os professores realizam boas práticas de ensino e
aprendizagem; os gestores conduzem saberes no campo estratégico e cotidiano de modo a diminuir as
desigualdades.

Gestão Pedagógica
(Ensino e
Gestão de Pessoas Gestão Físico- Gestão Relacional
Aprendizagem)
Financeiro
• Alunos não faltam • Há professores • Infraestrutura • Relação entre a
equipe escolar
• Aprendem • Eles não faltam • Biblioteca
• Da equipe escolar
• Estão motivados • Bem formados e • Quadra
com os
preparados
• Pensam no • Laboratório estudantes
projeto de vida • Motivados
• Merenda • Com os pais/mães
• Professores usam • Quadro de
• Transporte • Com a Seme
boas práticas e funcionaários
bons materiais completo • Recursos • Com a
para ensinar financeiros Comunidade
• Altas expectativas • Prestação de
contas

UMA ESCOLA QUE FUNCIONA BEM

Além da gestão pedagógica, há outros três importantes processos de rotina da gestão escolar: gestão de pessoas,
físico-financeira e relacional. Em uma escola que funciona bem, esses processos atuam em sinergia para a garantia
da aprendizagem.

Assim, a escola precisa ter uma equipe preparada e engajada; deve contar com um espaço saudável, seguro e
acolhedor, que mobilize e potencialize a aprendizagem; ter controle, eficácia e transparência no uso dos recursos
financeiros; manter relações pautadas pelos princípios democráticos e inclusivos, pela ética que sustenta a
participação na vida pública e a preocupação consigo, com o outro e com o bem comum.

A gestão escolar por vezes não age com assertividade, e procura, em meio a tantas demandas, fazer tudo
simultaneamente. Nessa lógica, com frequência o foco central das ações está na escola, não no estudante e na
aprendizagem.

Para que isso não aconteça, o modelo de Gestão Escolar para Resultados de Aprendizagem contribui no
sentido de estabelecer a melhor forma de gerir as rotinas, criando condições capazes de concretizar e garantir a
passagem entre o fazer e o realizar, em direção a uma escola que funcione bem e que gere resultados efetivos, com
o direito à aprendizagem no centro do processo.

Não há direito à aprendizagem em uma sociedade tão desigual como a brasileira se a gestão não se incumbir da
democratização e do enfrentamento dos padrões de desigualdade. A qualificação dos processos de gestão é uma das
condições para a garantia desse direito.

Extraído do Livro Circuito de Gestão- Insituto Unibanco- Edição2019

2.4.4 HIERARQUIA DE PROCESSOS DE ROTINAS ESCOLARES E ORIENTAÇÃO PARA


RESULTADOS

Em uma gestão escolar orientada para resultados de aprendizagem, os processos que compõem a gestão nas
escolas não são igualmente relevantes. De acordo com essa concepção, todos os processos de rotinas de
gestão de pessoas, físico-financeira e relacional estão a serviço das rotinas pedagógicas, isto é, dos resultados de
aprendizagem.

Figura 6 - Hierarquia de processos e orientação para resultados

APRENDIZAGEM

GESTÃO PEDAGÓGICA
(ENSINO E APRENDIZAGEM)

GESTÃO GESTÃO GESTÃO


DE PESSOAS FÍSICO-FINANCEIRA RELACIONAL

RESPONSABILIZAÇÃO DA ESCOLA E PRIORIZAÇÃO DE AÇÕES A SERVIÇO DOS RESULTADOS DE


APRENDIZAGEM

O ESTUDANTE NO CENTRO DO PROCESSO DE DECISÃO E GESTÃO ESCOLAR

Os professores são o “coração” das rotinas pedagógicas. No entanto, sem o aporte qualificado dos gestores
escolares e coordenadores, certamente os educadores terão dificuldades para atuar com qualidade. A gestão
escolar, nesse sentido, precisa garantir os espaços de formação continuada e a priorização incessante do
processo educativo para resultados de aprendizagem.
A responsabilização da escola e a priorização das ações
atendem a um compromisso profissional e ético que
afirma: é preciso colocar a aprendizagem como meta
principal de todas as rotinas escolares. Uma afirmação
relativamente consensual, mas que só será efetiva
quando o estudante estiver no centro do processo de
decisão e da gestão da escola.

Tendo em vista esse pressuposto, priorizar ações a serviço dos resultados de aprendizagem demanda estudo
e apropriação de repertórios técnicos qualificados que possam sustentar e indicar os melhores caminhos ou
métodos.

O método de gestão escolar para resultados de aprendizagem foi inspirado em um referencial consagrado de
gerenciamento denominado ciclo plan, do, check, act (PDCA). O pressuposto fundamental é a integração e a
simultaneidade dos processos e das ferramentas de gestão implementadas de forma sistemática: planejamento;
execução das ações; monitoramento e avaliação de resultados; correção de rotas. Assim, são previstos
contínuos controles e melhoria de processos.

Como veremos, com a implementação dessemétodo, o desafio da gestão é produzir um bom diagnóstico, elaborar
planejamento circunscrito à realidade local, sustentado em dados e informações relevantes, agir conforme
planos e metas, monitorar as ações e corrigir rotas. O método considera determinado intervalo de tempo,
orientado e legitimado não apenas por avaliações externas de larga escala, mas por avaliações processuais e
contínuas das rotinas pedagógicas realizadas por professores e estudantes no diálogo com os gestores
escolares.

Esse percurso, quando incorporado à rotina da escola, permite a reflexão/açãopara a correção de rotas e a
superação das restriçõese adversidades em busca de melhores resultados de aprendizagem.

Cabe à gestão compreender e assumir uma dimensão técnica e qualificada com o compromisso de
transformaçãoda escola,visando a melhoria dos resultados da aprendizagem,com equidade.

Extraído do Livro Circuito de Gestão- Insituto Unibanco- Edição2019


2.4.5- ATORES DA EDUCAÇÃO E A APRENDIZAGEM

Não se pode subestimar a complexidade de atores envolvidos em uma agenda de transformação da educação
brasileira. Então, qual a responsabilidade dos atores da comunidade escolar e do sistema de ensino nesse
modelo?

A base é a escola e o centro é o estudante. Todavia, de acordo com o MEC, existe uma rede de interações em
distintas escalas – micro (escola), meso (redes de ensino) e macro – que deve ser considerada.

Figura 7 - Atores da educação e a aprendizagem

MEC

REDE DE EDUCAÇÃO

ESCOLA

A escola necessita de padrões de funcionamento para conseguir democratizar e inovar. Do macro para o micro, os
padrões do sistema e os parâmetros de regulação são essenciais para democratizar o sistema de ensino, pois
permitem incidir sobre os dispositivos reprodutores de desigualdade. Assim, uma agenda efetivamente
transformadora, que não se contenta com a desigualdade educacional, precisa estar focada em melhorar os
padrões. Sem isso, muito provavelmente os mais vulneráveis serão os mais prejudicados.

Para garantir uma interação positiva e uma articulação eficiente entre todas essas instâncias, é necessário
um alinhamento estratégico e tático capazde gerar e induzira corresponsabilizaçãode todos os atores, em todas as
escalas, cada qual com seu distinto papel e com seu justo e correto peso.

Todasessasinstâncias e atores integrados e alinhados trabalham nos diferentes níveis que configuram a gestão:
estratégico, tático e operacional.

É no nível estratégicoque todas as instâncias, inclusive as escolas, definem seus desafios ou mudanças a longo
prazo. Quanto maior a integração entre elas, mais concretas são as chances de sucesso.

O nível tático faz a intermediação entre os níveis estratégico e operacional e prevê resultados a médio prazo.
Nesse nível, os objetivos e metas levantados no nível estratégico começam a ser concretizados; nele, todos os
processos e recursos serão mobilizados para que as mudanças aconteçam.

Já o nível operacional, de rotina, trata da implementação,do fazer cotidiano, da realização das ações elaboradas no
nível tático. No operacional,a execução dasações devepropiciaro alcance das metas estabelecidas no nível
estratégico. Dessa forma, são realizadas as ações cotidianas de natureza pedagógica e de gestão de pessoas,
físico-financeira e relacional.

No modelo de Gestão para Resultados, todas as instâncias do sistema de ensino estão empenhadas em garantir
o direito dos estudantes de aprender, em um processo de corresponsabilização, que necessita de uma gestão
democrática, da participação das famílias e da sociedade em geral, da cooperação para o cumprimento da
função social de educar e da transparência por parte do Estado no cumprimento de seus deveres quanto à
garantia do direito à educação.

Não se pode subestimar a complexidadede atoresenvolvidos em uma agenda de transformação da educação


brasileira. Então, qual a responsabilidade dos atores da comunidade escolar e do sistema de ensino nesse
modelo?

A base é a escola e o centro é o estudante. Todavia, de acordo com o MEC, existe uma rede de interações em
distintas escalas – micro (escola), meso (redes de ensino) e macro – que deve ser considerada.

Extraído do Livro Circuito de Gestão- Insituto Unibanco- Edição2019


2.4.6 EXERCÍCIO DA AUTONOMIA A SERVIÇO DA APRENDIZAGEM

Na concepção do modelo de Gestão Escolar para Resultados de Aprendizagem, o exercício da autonomia é


imprescindível para a qualidade da educação. No entanto a autonomia, que, usualmente, é preconizada como um
ato de livre vontade no cotidiano da escola, não permite a plena garantia do direito à aprendizagem. Isto porque o
fato de não sabermos como estão acontecendo os processos de aprendizagem, em um contexto tão heterogêneo
como o brasileiro, pode significar abandono por parte de todas as instâncias envolvidas no sistema de ensino.

Abandono porque impõe de forma inconsequente a mesma carga de responsabilidade pela elevação dos
patamares de qualidade para escolas muito diferentes em termos de vulnerabilidade, de acesso a recursos e de
capital social e cultural.

É fundamental e necessário que existam sistemas regulatórios e padrões pedagógicos e administrativos,


diretrizes, parâmetros e ferramentas que facilitem e deem suporte ao cotidiano das escolas, considerando
sua autonomia e contemplando as diferenças e desigualdades instaladas.

Figura 8 - Exercício da autonomia a serviço da aprendizagem

PADRÕES
PEDAGÓGICOS EQUIDADE

PADRÕES INOVAÇÃO
REGULAÇÃO
ADMINISTRATIVOS

Desse ponto de vista, quanto mais se desenvolvem protocolos e padrões, maiores serão as chances de a gestão
escolar exercitar a autonomia.

É comum encontrarmos certa resistência ao estabelecimento de padrões. Supõe-se que a padronização


concorreria para constranger a liberdade de criação ou a inovação.

A disseminação de padrões aumenta a possibilidade de inovação e amplia a probabilidade de tratar


desigualmente os desiguais e garantira equidade – entre e dentro das próprias escolas. A autonomia exercida
sem padrõesnão produz inovação e,na prática,aumenta a desigualdade.

Extraído do Livro Circuito de Gestão- Instituto Unibanco/2019


nº 63 | jun. 2021

GESTÃO

O QUE FAZER
DIANTE DA
PERDA DE
APRENDIZAGEM?

1 2 3
>> Estudos recentes >> Melhoria do ensino >> Otimização do
estimam perdas remoto ajudará enquanto currículo e definição
dos estudantes na não for possível volta ao de prioridades podem
pandemia no Brasil presencial acelerar recuperação

U
m número crescente de estudos recentes tem confirmado um cenário
infelizmente já previsto: apesar de todos os esforços das redes e dos
educadores para manter as atividades escolares durante a pandemia,
as perdas de aprendizagem serão significativas. O mais recente deles
(“Perda de aprendizagem na pandemia”) foi divulgado agora no início de
junho pelo Instituto Unibanco e pelo Insper. De autoria de Ricardo Paes de
Barros e Laura Machado, ele teve como foco o Ensino Médio.

Uma vez que o Brasil ainda não realizou uma avaliação diagnóstica de
abrangência nacional, os autores projetaram possíveis efeitos do fechamento
de escolas e do ensino remoto. Os resultados dizem respeito aos alunos
matriculados atualmente no 3º ano do Ensino Médio − aqueles que estavam no
2º ano em 2020, quando as escolas suspenderam as aulas presenciais em função
da pandemia. Segundo o estudo, esses estudantes provavelmente começaram
o ano letivo de 2021 com defasagem equivalente a dez pontos em Matemática

1 - APRENDIZAGEM EM FOCO - Nº 63 - jun.2021


ESTIMATIVA DAS PERDAS DE APRENDIZAGEM
de alunos no 3º ano do Ensino Médio (em pontos na escala Saeb)

Impacto na proficiência Língua Portuguesa Matemática Perdas em 2020


Os estudantes que concluíram a
2ª série do Ensino Médio em 2020
Início do 3º ano iniciaram a 3ª série com uma
do Ensino Médio -9 -10 proficiência em Língua
Portuguesa e Matemática
entre 9 e 10 pontos abaixo do que
iriam alcançar sem a pandemia
Fim do 3º ano
do Ensino Médio (mesmo Perdas em 2021
ensino remoto de 2020) -16 -20 Caso, ao longo do ano letivo de
2021, o ensino remoto seja mantido
e não ocorra um aumento no grau
de engajamento dos estudantes,
Fim do 3º ano as perdas deverão alcançar níveis
do Ensino Médio (com adoção -11 -12 quase duas vezes mais elevados:
de medidas de mitigação*) 16 em Língua Portuguesa e
20 pontos em Matemática
*Dobrar engajamento dos estudantes no ensino remoto, adotar ensino híbrido e implementar ações de aceleração de aprendizagem
Fonte: Estudo “Perda de aprendizagem na pandemia”, Instituto Unibanco/Insper (2021)

e a nove pontos em Língua Portuguesa na escala do Saeb (Sistema de Avalição


da Educação Básica). Para se ter ideia do que isso representa, basta lembrar
que a nota dos alunos brasileiros na escala do Saeb, antes da pandemia, em
média, subia um total de 15 pontos em Matemática e de 20 pontos em Língua
Portuguesa ao longo de todo o Ensino Médio.

O estudo projeta ainda que se a realidade de 2020 for mantida, isto é, aulas
presenciais suspensas e ensino remoto com pouco engajamento (atingindo
pouco mais de um terço dos estudantes), a defasagem dos atuais concluintes
do Ensino Médio poderá totalizar 20 pontos em Matemática e 16 pontos em
Língua Portuguesa ao final do ano letivo de 2021.

Outro estudo que trabalhou com estimativas de perda foi realizado pelo Centro
de Aprendizagem em Avaliação e Resultados para o Brasil e a África Lusófona,
vinculado à Fundação Getúlio Vargas. O trabalho projetou que os alunos
dos anos finais do Ensino Fundamental (6º ao 9º ano) podem ter regredido,
em média, até quatro anos em leitura e Língua Portuguesa, tendo em vista o
desempenho no Saeb.

Outras duas pesquisas envolvendo a rede estadual de São Paulo já haviam


Queda na aprendizagem nos anos
revelado diminuição da aprendizagem depois do início da pandemia. No
iniciais do Ensino Fundamental
início do atual ano letivo, entre fevereiro e março, o Centro de Políticas Públicas
e Avaliação da Educação (CAEd) da Universidade Federal de Juiz de Fora
(MG) aplicou testes de Matemática e Língua Portuguesa a uma amostra de
alunos do 5º e do 9º ano do Ensino Fundamental e do 3º ano do Ensino Médio
em São Paulo. As questões seguiram o padrão da escala Saeb, o que permitiu -13%
comparação com as provas da última edição do próprio Saeb, em 2019. Houve Língua
piora nos três grupos avaliados, sendo que o resultado mais preocupante foi -19% Portuguesa

verificado nos anos iniciais do Ensino Fundamental (queda de 46 pontos em Matemática


Matemática, o equivalente a uma perda de aprendizagem de 19%; e de 29 em Fonte: CAEd/UFJF
Língua Portuguesa (- 13%).

2 - APRENDIZAGEM EM FOCO - Nº 63 - jun.2021


ATENÇÃO A CONTEÚDOS PRÉ-PANDEMIA
Um dos alertas que esses estudos trazem é de que será preciso em muitos
casos trabalhar na recuperação de conteúdos que já haviam sido dados
antes da pandemia.

“O aluno que está no início do 5º ano do Fundamental teve pontuação menor em


Matemática do que quando estava no 3º ano”, diz a diretora do Departamento de
Avaliação da Secretaria da Educação do Estado de São Paulo, Patrícia Monteiro,
referindo-se aos dados de São Paulo. Uma das hipóteses analisadas pela equipe
pedagógica da Secretaria é que os conhecimentos de Matemática adquiridos até
o 3º ano do Ensino Fundamental precisam ser consolidados nos anos seguintes,
e isso requer um maior número de intervenções do professor − o que acabou
prejudicado pela suspensão das aulas presenciais.
Perda entre alunos do 6º ano do EF
ao 3º ano do EM, em 2020*
A outra pesquisa que também mostrou perdas de aprendizagem na rede
estadual paulista baseou-se nas notas dos boletins escolares e de testes
padronizados de 2019 e 2020, entre outros registros administrativos. Tendo em
vista as notas médias esperadas em um ano sem pandemia, isto é, caso o ensino
presencial não tivesse sido suspenso, a pesquisa constatou queda de 72,5% da
aprendizagem entre alunos do 6º ano do Ensino Fundamental ao 3º ano do
Ensino Médio, em 2020. O estudo é resultado de parceria entre a Secretaria de
Educação paulista e o Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID). A
72,5%
*em relação as notas médias esperadas
pesquisa revelou ainda que o risco de abandono escolar durante o período de em um ano sem pandemia
Fonte: Secretaria de Educação de SP e BID
escolas fechadas mais do que quadruplicou.

Vale destacar que o problema não é restrito ao Brasil. O Banco Mundial,


Aumento no percentual de
em relatório lançado neste ano, estimou que haveria em toda a América
crianças de 10 anos de idade com
Latina aumento no percentual de crianças de 10 anos de idade com graves graves dificuldades de leitura
dificuldades de leitura. Para o Brasil, esse crescimento seria de 50% (nível
pré-pandemia) para 70%. Estudos em países desenvolvidos também têm
registrado perdas, mas, como as escolas do Brasil e da América Latina
permaneceram mais tempo fechadas e por atenderem alunos mais 70%
atual
vulneráveis, as perdas na região tendem a ser muito maiores.
(veja nesta reportagem um resumo desses estudos) 50%
pré-pandemia
O QUE FAZER?
Fonte: Banco Mundial
Diante da constatação de que as perdas, como estimadas, serão significativas,
a grande questão é o que pode ser feito para mitigá-las. E, no caso do Ensino
Médio, há ainda um elemento adicional: as redes estaduais já estavam diante
do enorme desafio de implementar o novo Ensino Médio.

Para Patrícia Monteiro, da Secretaria da Educação do Estado de São Paulo, um


dos primeiros passos é justamente obter um diagnóstico do problema, para
definir estratégias a serem adotadas.

O estudo do Instituto Unibanco e do Insper indica que seria possível reduzir


em até 40% as perdas de aprendizagem dos concluintes neste ano. Para isso,
seria necessário pelo menos dobrar o alcance do ensino remoto verificado em
2020, implementar o ensino híbrido no segundo semestre (aulas presenciais
e remotas) e adotar ações de aceleração de aprendizagem, priorizando temas
essenciais no currículo. Há também a esperança de que o avanço da vacinação,

3 - APRENDIZAGEM EM FOCO - Nº 63 - jun.2021


especialmente no caso dos professores, facilite o retorno com segurança às
aulas presenciais ao longo do segundo semestre.

A ampliação do ensino remoto nas redes enquanto ainda não for possível a
volta segura ao presencial precisará enfrentar o problema da falta de acesso à
internet entre os jovens mais vulneráveis. Em 2020, de acordo com a pesquisa
Pnad-Covid do IBGE, o grau de engajamento dos alunos de Ensino Médio
das redes estaduais ficou em 36%. Ou seja, considerando a carga horária
ideal de 25 horas-aula por semana, os estudantes, em média, cumpriram
apenas 36% disso. Segundo Paes de Barros, no mínimo é preciso dobrar o
engajamento, pois os alunos aprenderão mais à medida que dedicarem mais
tempo aos estudos.

O especialista sugere também que as redes de ensino façam uma transição


para o ensino híbrido já no segundo semestre letivo de 2021, caso as condições
sanitárias permitam tal mudança. Desse modo, observou ele, os estudantes
seriam beneficiados pelo ensino presencial, o que, por si só, já é apontado como PARA SABER MAIS
• Agindo agora para proteger o
fator de aumento da aprendizagem.
capital humano de nossas crianças
(relatório), Banco Mundial (2021):
Por fim, o estudo destaca a importância de ações de recuperação e aceleração bit.ly/relatorioBIDpandemia
da aprendizagem. Inclusive com a otimização dos currículos, isto é, com • Estudo sobre estimativa da perda
a definição de conteúdos, habilidades e competências que deverão ser de aprendizado na rede estadual
priorizados pelos professores no atual período, tendo em vista que as redes de paulista, FGV EESP Clear/Fundação
Lemann/SEE-SP (2021):
ensino não têm como dar conta de toda a matéria prevista, em meio às atuais bit.ly/estudoFGVLemann
condições de funcionamento na pandemia.
• O impacto da pandemia na educação –
Avaliação amostral da aprendizagem
Para implementar programas de aceleração da aprendizagem no ensino dos estudantes, CAEd/UFJF/SEE-SP
médio, as redes terão um desafio a mais: historicamente, o país desenvolveu (2021): bit.ly/estudoCAEd-SEESP
programas de aceleração voltados para o Ensino Fundamental, especialmente • Perda de aprendizagem na pandemia,
para as séries iniciais. Um caminho para superar isso seria adaptar estratégias Instituto Unibanco/Insper (2021):
bit.ly/2RgqqSW
já testadas nos anos finais do Ensino Fundamental. Os estados também terão
muito a ganhar se adotarem uma postura colaborativa, compartilhando boas • The Impacts of Remote Learning
in Secondary Education: Evidence
experiências e casos de sucesso para que mais redes de ensino consigram from Brazil during the Pandemic,
mitigar as perdas de aprendizagem. BID/Universidade de Zurique/SEE-SP
(2021): bit.ly/estudoBID-SEESP

“A sociedade brasileira, não porque quis, mas em função da pande-


mia, em função da suspensão das aulas, contraiu uma nova dívida
social, uma nova dívida educacional”, diz o superintendente do Instituto
Unibanco, Ricardo Henriques. “Essa nova dívida se adicionou à nossa enor-
me dívida histórica derivada da desigualdade social e do racismo estrutural.
Assim, o Brasil nunca viveu um desafio do tamanho que a gente está vivendo
agora para lidar com a educação.”

Aprendizagem em Foco é uma publicação quinzenal produzida pelo Instituto Unibanco.


Tem como objetivo adensar as discussões sobre o contexto educacional brasileiro, a partir
de pesquisas, estudos e experiências nacionais e internacionais.
Para fazer algum comentário, envie um e-mail para: instituto.unibanco@institutounibanco.org.br
Para ler as edições anteriores, acesse: bit.ly/aprendizagem-foco
Produção editorial: Redação Demétrio Weber; Edição Antônio Gois e Fabiana Hiromi;
Projeto gráfico e diagramação Estúdio Kanno; Edição de arte Fernanda Aoki

4 - APRENDIZAGEM EM FOCO - Nº 63 - jun.2021


nº 85 | fev. 2023

GESTÃO

RECOMPOR
APRENDIZAGEM
AINDA É DESAFIO
EM 2023

1 2 3
>> Efeitos da pandemia >> É preciso reconectar >> Identificar lacunas e
podem ser duradouros sem alunos a trajetórias engajar estudantes são
ações de recomposição afetadas pelo estratégias fundamentais
distanciamento

P
assados quase três anos do início da pandemia de Covid-19, as
perdas de aprendizagem são uma das consequências mais visíveis
do prolongado período de ensino remoto sobre o desenvolvimento
dos estudantes, e seus impactos continuam visíveis nas escolas neste ano
letivo de 2023.

O que é observado pelos educadores cotidianamente foi identificado também


por uma série de estudos e pesquisas. Um dos últimos, divulgado em dezem-
bro de 2022, foi uma nota técnica produzida e elaborada pelo Laboratório de
Pesquisa em Oportunidades Educacionais da Universidade Federal do Rio
de Janeiro (UFRJ). O documento faz uma revisão da literatura atualizada,
nacional e internacional, sobre o tema e, dentre outros pontos, destaca que
as perdas de aprendizagem ocorreram no mundo inteiro e de forma mais

1 - APRENDIZAGEM EM FOCO - Nº 85 - fev.2023


acentuada nos países em desenvolvimento. “No Brasil, estudos identificaram
perdas médias estimadas entre 4 a 10 meses de aprendizagem, sendo maior
em matemática e entre crianças mais novas”, destaca a Nota.

RECOMPOSIÇÃO X RECUPERAÇÃO
Diante desse cenário, o termo “recomposição das aprendizagens” passou a “No Brasil, estudos
figurar com frequência nos debates educacionais e diversas ações vêm sendo identificaram perdas
desenvolvidas nas redes de ensino com esse foco. Embora ainda haja uma médias estimadas
confusão entre os conceitos, recomposição e recuperação da aprendizagem entre 4 a 10 meses de
não são sinônimos. aprendizagem, sendo maior
em matemática e entre
“No contexto educativo, quando a gente fala de recuperação, estamos falando crianças mais novas.”
de um movimento organizado para atender às necessidades dos nossos Nota técnica produzida e elaborada
estudantes que tiveram a oportunidade de aprender com recursos materiais, pelo Laboratório de Pesquisa em
Oportunidades Educacionais da UFRJ
com formas pensadas especificamente para isso e que, no entanto, não foram
suficientes, não conseguiram consolidar aquilo que era esperado. E aí a gente
realiza a recuperação, que é um processo mais pontual, mais focado naquela
necessidade daquele estudante e damos aí uma nova oportunidade de ele
aprender”, explica a especialista do Instituto Reúna, Cristiane Chica, durante
webinário sobre o tema promovido em setembro de 2022 pelo Consed, em
parceria com o Instituto Unibanco e o Reúna.

E complementa: “Hoje estamos vivendo um processo de dois anos de afas-


tamento desses estudantes de aulas presenciais. Portanto, dizer que vamos
fazer um processo de recuperação com eles não seria justo. A recomposição
traz ideia de reconstruir, de reorganizar, restaurar um caminho, reconectar
o estudante a uma trajetória cognitiva que foi afetada pelo distanciamento.
A recomposição necessita de uma ação mais aprofundada, mais articulada,
sistêmica, que engloba diferentes estratégias”, esclarece.

Em termos práticos, as ações de recomposição das aprendizagens demandam “Hoje estamos vivendo
num primeiro momento a sensibilização de toda a equipe pedagógica e o um processo de 2 anos
acolhimento dos estudantes, com o objetivo de se criar uma corresponsabili- de afastamento desses
zação mútua no processo. Uma vez estabelecido esse comprometimento de estudantes de aulas
todos, o passo seguinte é a avaliação diagnóstica, para entender em que pé presenciais. Portanto,
está a turma, quais as lacunas de aprendizagem e quais serão as habilidades dizer que vamos fazer um
essenciais trabalhadas (processo de priorização curricular). A realização desse processo de recuperação
diagnóstico bem como o planejamento de como se dará a recomposição exi- com eles não seria justo”
gem ainda formação docente para que os professores consigam definir tanto Cristiane Chica, especialista do
quais as melhores estratégias de avaliação como também quais as práticas Instituto Reúna
pedagógicas mais adequadas.

Diferentemente das avaliações somativas, realizadas ao fim de um ciclo (como


as conhecidas provas bimestrais feitas pelos alunos nas escolas), as avaliações
realizadas ao longo do processo, chamadas de formativas, podem seguir tanto
o formato tradicional (testes de múltipla escolha ou questões abertas) como se
dar por meio de observação e registro em sala de aula, de rodas de conversa
ou de portfólios produzidos pelos estudantes, entre outras formas. A escolha
depende de qual o objetivo de aprendizagem e qual a melhor forma de verifi-
car, produzir evidências de que o aluno efetivamente aprendeu.

O mesmo vale para a definição de quais ações e práticas pedagógicas serão


utilizadas na recomposição, que deve se dar considerando quais as melhores

2 - APRENDIZAGEM EM FOCO - Nº 85 - fev.2023


ESTRATÉGIAS QUE INTEGRAM A RECOMPOSIÇÃO DAS APRENDIZAGENS

1 Acolhimento dos estudantes 4 Avaliação diagnóstica e inicial


Para sentirem que faz sentido Para mapear as lacunas de
estar na escola e que são aprendizagem
responsáveis pelo processo de
aprendizagem Avaliação formativa e processual
5
Para elaborar o planejamento e
2 Priorização curricular realizar intervenções pedagógicas
Com a priorização de habilidades
fundamentais a serem Material didático apropriado
desenvolvidas pelos estudantes 6 Elaborado especificamente no
contexto da iniciativa e respeitando
3 Adaptação de práticas a autonomia do professor
pedagógicas
Visando ao Formação
7
engajamento e Para preparar os docentes para o
desenvolvimento acolhimento dos estudantes,
dos jovens definição das ações e dos materiais

Fonte: Instituto Reúna

estratégias para desenvolver aquela competência ou conteúdo. Como no con-


texto pós-pandemia as lacunas de aprendizagem estão presentes em turmas
ou mesmo séries inteiras, muitos professores veem as metodologias ativas
como o melhor caminho para recomposição, pois privilegiam o protagonismo
dos alunos e estimulam o debate, a reflexão e a construção coletiva de conhe-
cimento. A aprendizagem por projetos, por desafios ou entre pares/times são
algumas das estratégias possíveis.

“COMO NOMEAR O NADA”


Na Escola Estadual Manuel Loureiro, situada no município de João Monle-
vade (MG) e que atende cerca de 1.200 estudantes dos Ensinos Fundamental
e Médio, o trabalho com a recomposição de aprendizagem tem sido contínuo
desde a pandemia. A coordenadora pedagógica (especialista na nomenclatura
da rede mineira) do Ensino Médio da escola, Marisa Bueno de Bellis, também
faz questão de frisar que “a escola tem um histórico de gestão pedagógica.
Trabalhamos muito com essa ideia de sequência didática de projeto, a ques-
tão da continuidade. O monitoramento que a gestão faz desse processo [de
aprendizagem] é muito profundo”, ressalta. A formação docente na Manuel
Loureiro é contínua e faz parte da rotina: os professores se reúnem todas às
quartas-feiras, ocasião em que discutem teoria, mas também compartilham e
debatem práticas de sala de aula.

Em 2022, por exemplo, a equipe percebeu que as turmas do 2º ano do Ensino


Médio estavam entre as que apresentavam as maiores perdas de aprendizagem,
especialmente em Matemática. O diretor da escola, Joel dos Santos Pereira,
destaca que o desafio inicial foi identificar qual componente seria trabalhado
na recomposição. “Como eu nomeio o nada, aquilo que o sujeito não sabe, o mo-
mento em que ele parou? O aluno não sabe nada, mas esse nada é tão abstrato,
tão vago, tão aberto... É preciso identificar o que ele realmente não sabe. Uma
pequena habilidade não consolidada é diferencial para que o aluno possa com-
preender o restante do processo e garantir uma aprendizagem melhor”.

3 - APRENDIZAGEM EM FOCO - Nº 85 - fev.2023


Para dar conta disso, toda uma sistemática de avaliação foi desenvolvida:
uma primeira avaliação era realizada e, na semana seguinte, os resultados
eram compartilhados e analisados com os alunos. Na semana seguinte, uma
nova avaliação era aplicada com os pontos que os estudantes tinham apresen-
tado mais dificuldade, seguida novamente por análise. “Até chegar no ponto
de identificar a partir de qual ponto eles não conseguiam avançar e que eles
precisavam aprender”, explica a especialista. “Entender o que o sujeito sabe
até não é difícil, mas nomear o que ele não sabe é uma questão para profissio-
nal de educação mesmo. Não é brincadeira”, enfatiza.

Essa sistemática levou à seguinte conclusão: “Os meninos não conseguiam


aprender álgebra, que é a base do Ensino Médio, porque não reconheciam
o zero como um elemento algébrico. Não tinham passado por essa etapa de PARA SABER MAIS
entender que o zero é virtual”, conta Marisa. “E aí fizemos a recomposição da • Fortalecimento da Aprendizagem
aprendizagem pareada com o que era conteúdo daquela série, mas trabalhan- para a recomposição das
do esse entendimento do zero até os meninos compreenderem a sua função aprendizagens no Novo Ensino
Médio, Instituto Reúna/Instituto
dentro da Matemática”.
Unibanco: bit.ly/Fortalecimento_
Reuna_IU
A especialista destaca que a pactuação entre professores e estudantes no • Impactos da pandemia na educação
início do processo foi decisiva para o êxito das ações: “O jovem precisa enten- brasileira, Laboratório de Pesquisa
der em qual processo ele está inserido, por que precisa retomar ou aprender em Oportunidades Educacionais
– UFRJ/ d3e/Fundação Lemann
certas coisas. Como foi uma coisa de comum acordo [a recomposição], eles
(dez/2022): bit.ly/NT_Impactos-D3e
aceitaram de verdade estudar. Tiveram montantes de problemas e de objetos
• Ensino Médio na Prática -
de estudo para debater em grupo, para resolver, para ir ao quadro apresentar
Recomposição das Aprendizagens
solução. Tivemos um planejamento maciço também de conteúdo e organiza- (webinário), Consed/Instituto
ção didática de trabalho em grupo. Por isso, eu acredito que tenha sido uma Unibanco/ Instituto Reúna
experiência muito feliz. Isso fortalece muito essa relação de vínculo”, diz. (set/2022): bit.ly/webinarioConsed_
Recomposicao

O resultado é que depois de dois bimestres, a avaliação mostrou que em três


das quatro turmas em que a recomposição foi realizada a proficiência me-
lhorou e os estudantes conseguiram avançar. Agora em 2023, a percepção é
de que as turmas que estão ingressando no 3º ano estão chegando mais bem
preparadas do que as turmas do ano passado.

O desempenho da escola nas avaliações oficiais também é um indicativo


da assertividade do trabalho pedagógico. “Mesmo com a pandemia, con-
seguimos avançar na proficiência em Língua Portuguesa e Matemática nas
avaliações externas e ter crescimento no Ideb tanto nos anos finais do Ensino
Fundamental como no Ensino Médio”, comemora o diretor.

Confira a Coleção sobre Recomposição da Aprendizagem


no Observatório de Educação

Aprendizagem em Foco é uma publicação quinzenal produzida pelo Instituto Unibanco.


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de pesquisas, estudos e experiências nacionais e internacionais.
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4 - APRENDIZAGEM EM FOCO - Nº 85 - fev.2023

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