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O Ciclo do Sofrimento
Domingos Alves
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CONTEÚDO

1. Por que sofremos? Como sofremos? Como sabemos


que sofremos?

2. As Experiências Internas
A memória
As emoções
As sensações
Os pensamentos
O Estado de Humor

3. As fases Ciclo do Sofrimento explicadas.


Contexto – A situação em que nos encontramos.
A Percepção e o processo de compreensão.
As emoções – São primeiro alarme.
As sensações
Os pensamentos ruminantes

4. Exercícios práticos
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Por que sofremos?


Como sofremos?
Como sabemos que sofremos?
Para essas três perguntas a resposta é exatamente a
mesma: A Experiência Interna. Ela é que move o Ciclo
do Sofrimento.

Chamamos Experiência Interna a vivência de quatro


eventos de base que a mente utiliza para interpretar
tudo o que acontece em nosso redor, desde frio, susto
até compaixão ou desprezo por alguém:

1. Memória;
2. Emoção;
3. Sensação;
4. Pensamento.

Através deles somos capazes de não apenas perceber


o mundo através dos cinco sentidos, mas
especialmente dar significado a essas e outras
experiências com o ambiente em que estamos, o que
tecnicamente chamamos de “contexto”, porque mais
que um ambiente, no sentido de um lugar, a palavra
“contexto” aponta para o que está acontecendo no
ambiente.

A seguir explicarei resumidamente cada uma das


Experiências Internas.
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As Experiências Internas

A Memória
Guarda as experiências
vividas, quer tenham sido
agradáveis ou
desagradáveis.
Metaforicamente a memória
é comparada a um tiro de flecha, desenhando no ar
uma trajetória de modo que conseguimos saber de
onde veio o tiro. Em outras palavras, a memória nos
situa no tempo através da sensação de passado,
presente e futuro.

As emoções.
São como um despertador. Nos alertam
para aquilo que parece importante, seja
para nos ligar às pessoas, por exemplo,
através da tristeza compassiva, seja nos
alertando de um perigo iminente através do medo.

As Sensações
Podem ser simbolizadas por um choque
elétrico porque é quase impossível não a
percebermos. Uma de suas funções mais
evidentes é chamar nossa atenção para a
mensagem que a emoção traz consigo. Quando nos
sentimos alegres, com raiva, tristes, etc., é no corpo
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que essa emoção se manifesta com sensações que nos


parecem agradáveis ou desagradáveis.

Os Pensamentos
Podem ser ilustrados por um átomo
circulado por seus elétrons que surgem
dos lugares mais diversos exatamente
como os pensamentos que percorrem nossa cabeça e
surgem sem que entendamos a razão. Às vezes,
especialmente enquanto ansiosos, os pensamentos
surgem com velocidade maior que nossa razão
consegue dar conta, nos deixando confusos e ainda
mais ansiosos.

Estado de Humor
Há também uma quinta Experiência
Interna. A definição clássica de
“Eventos Internos” utiliza somente os quatro que
comentamos há pouco. Todavia, penso que não
podemos deixar de considerar o Estado de Humor
como sendo uma importante e definidora Experiência
Interna.

Representamos o Estado de Humor por um Ioiô porque


assim como as emoções, ele nos lança para cima ou
para baixo. Ele é resultado dessa confluência de
Eventos Internos e caracteriza-se pela dominância de
uma emoção. A diferença entre Emoção e Estado de
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Humor é que a ela dura alguns minutos, enquanto o


Estado de Humor pode durar dias.

Na figura ao lado
ilustramos essa
diferença. Primeiro temos
o contexto que disparou
a “Raiva”.

Contexto é tudo aquilo


que acontece em nosso
redor e provoca em nós
reações psicológicas.

Em nosso exemplo, o contexto provocou a raiva, que


assim como qualquer uma das cinco emoções
universais, dura instantes. Está representada pela
cor vinho, no vértice do ângulo. E temos também no
ângulo maior, o estado de humor irritadiço, que é
resultado da raiva. É ilustrado pela cor vermelha em
degradê, indicando que o estado vai esmaecendo com
o passar do tempo, o que pode levar horas ou dias.

Abaixo uma tabela contendo as cinco emoções


universais, e os estados de humor ligados à cada uma
delas:

Emoção Estado de humor


Melancólico
Deprimido
Tristeza Triste
Culpado
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Frustrado
Desapontado

Emoção Estado de humor


Irritado
Furioso
Raiva Nervoso
Orgulhoso
Irado
Aborrecido

Emoção Estado de humor


Ansioso
Tenso
Medo Nervoso
Assustado
Apreensivo
Pânico

Emoção Estado de humor


Irritação
Desgosto
Aversão Repugnância
Antipático
Agressivo

Emoção Estado de humor


Entusiasmo
Excitação
Alegria Amoroso
Alegre
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Orgulhoso
Contente
Adaptado de Ekman (p. s, Holmes (p.84), Greenberger e Padesky (p. 32)

Tudo isso acontece em razão e como reação interna ao


que se passa fora de nós (Contexto). É o chamado Ciclo
do Sofrimento. Veja na ilustração abaixo, como todas
essas peças se juntam e causam sofrimento.
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As fases Ciclo do Sofrimento


explicadas em uma situação.

Contexto – É a situação em que nos


encontramos.

Toda situação tem um contexto em que ela acontece e


todo contexto é recebido e percebido pela mente que
através das experiências internas classifica a
experiência, nos levando à reação.

Imagine-se em qualquer situação. Por exemplo,


atravessando uma rua deserta, tarde da noite. Você
está tranquilo e displicentemente absorto em seus
pensamentos. Quando de repente ouve o barulho
ameaçador do freio de um carro. Imediatamente para
assustado. Mas não havia veículo algum. Foi um carro
em alta velocidade, freando na rua paralela.
Entretanto, você percebe que suas mãos estão
trêmulas, respiração ofegante e coração acelerado. O
que houve? Sua mente o lançou no Estado de Alerta
Máximo na seguinte ordem:

1. A Percepção – É o despertar do
processo de compreensão.

Para interpretar aquele som a mente buscou na


memória, algo parecido. Acontece que há dez anos você
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foi atropelado e segundos antes da colisão o motorista


brecou produzindo um som parecido. Em milésimo de
segundos sua mente encontrou essa informação na
memória inconsciente e ativou seu sistema de defesa
(o Sistema Nervoso Simpático). Repentinamente algo
mudou dentro de você após o susto e a percepção:
Surgiu o medo, que é uma emoção.

2. As Emoções – São primeiro


alarme.

Resumindo, em resposta imediata à memória


encontrada e ao contexto, veio a emoção. O medo, cujo
objetivo é provocar uma reação de fuga ou
enfrentamento, a fim de salvar sua vida. Aqui no
exemplo, foi reação de fuga. Nesse instante, você não
está completamente consciente do que aconteceu
porque a informação ainda não chegou à Razão.
Todavia, seu corpo já está reagindo defensivamente e o
que era um pensamento distante, tornou-se
concentração. Atenção máxima. O que era um estado
de humor tranquilo, tornou-se tensão. Isso aconteceu
em milésimos de segundo.

Mas como você percebeu essa emoção? O que te deixou


em estado de alerta máximo? Neste ponto da
experiência entra aquele choquinho que comentamos
anteriormente. Ele é chamado de Sensação.
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3. As Sensações - São a percepção


física de uma emoção.

Ao mesmo tempo em que a emoção de medo foi


disparada, provocou uma reação física. Um frio no
estômago e aperto no peito que serviram para
despertar você do que quer que estivesse fazendo, a fim
de perceber e reagir ao perigo.

Segundos depois, você entendeu que era um carro


freando, na rua paralela. Essa compreensão se deu
porque as informações de
contexto/percepção/emoção/sensação/estado de
alerta, chegaram à razão e assim você compreendeu
racionalmente o ocorrido. Daí em diante sua mente foi
invadida pelos mais diversos tipos de pensamentos,
desde um “graças a Deus” aliviado, até pensamentos
acusatórios, xingando você mesmo de desastrado,
desatento, irresponsável, etc. Você está agora sob o
efeito do quarto processo do Ciclo. Os pensamentos
ruminantes. É precisamente aqui que começa o
sofrimento, representado pela cor azul na figura do
Ciclo.

4. Os Pensamentos e a Ruminação
Como temos afirmado, ao final do processo de
“Despertamento” é que surge o sofrimento.
Começamos a julgar a nós mesmos e duas horas
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depois ainda estamos pensando em como fomos e


somos imprudentes.

“Onde já se viu... andar assim tão displicente”. “O


carro poderia realmente ter passado naquela rua
e teria acontecido uma tragédia” ... “Será possível
que nunca vou aprender?”

Daí começamos a imaginar as possibilidades nefastas


das consequências:

“Eu poderia ter deixado minha esposa viúva e


filhos órfãos...ou pior... poderia ter me tornado
inválido e ficaria dando trabalho à família”.

Perceba que agora o que acontece é pura fantasia


pessimista. Esse é um processo natural que ocorre a
todos e é chamado de “Ruminação” e tem o objetivo
funcional de guardar a informação para que não
repitamos a experiência. Então, dependendo do susto
e da pessoa, o resto da noite ficará incomodada,
tomada pela imaginação, ruminando esses
pensamentos de crítica até dormir – se conseguir. E
haja Rivotril!

Uma emoção pode nos incomodar por semanas quando


assumimos um estado de humor resultante da
experiência vivida. Observe a evolução do Ciclo do
Sofrimento na figura abaixo

Dependendo da pessoa e da intensidade da


experiência, o resultado poderá ser ainda mais
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prolongado, repetindo o mesmo medo (talvez uma leve


taquicardia e pensamento confuso) todas as vezes que
você atravessar a rua porque a mente terá ficado presa
na experiência e continuará disparando alertas de
perigo sempre que o padrão da cena se repetir.

Assim é que funciona o Ciclo de Sofrimento. E nosso


caminho nesta fase da Terapia é lhe ajudar a perceber
e lidar com ele de forma a não ser atraído para o centro
do Ciclo (seta cinza), girando nele sem parar.
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Concluindo

Todo o nosso sofrimento é ocasionado pela má leitura


que as experiências internas (emoções, pensamentos,
sensações, memória e estado de humor) nos levam a
fazer do contexto.

Tentamos muitas vezes dominar as experiências


internas na busca de sentir alívio. Algumas vezes nos
sentimos com medo, outras vezes ansiosos, ou com
pensamentos que nos acusam e causam muito
incômodo.

Tentamos inutilmente dominá-los porque não sabemos


que isso é o mesmo que tentar segurar um touro pelos
chifres. A estratégia de controle somente torna o
animal mais enfurecido.

Do mesmo modo acontece com as experiências


internas que, a exemplo do bicho feroz, o melhor
mesmo é deixar passar. Mas esse é um assunto que
comentaremos em breve na terapia.

Neste breve texto objetivamos explicar a experiência


interna. No próximo livreto compreenderemos como
tudo isso funciona na mente, causando o sofrimento
que sentimos.

Para encerrar faremos dois exercícios. O primeiro


ajudará a compreender a diferença entre cada
experiência interna e o segundo é uma análise de si
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mesmo que te ajudará a se perceber no Ciclo de


Sofrimento.
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Práticas da semana
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Prática #1
Distinguindo Contexto (situações), Estados de
Humor e Pensamentos

Esse exercício ajudará a distinguir melhor seus


pensamentos, estados de humor e situações. Escreva
na linha à direita se o item da coluna à esquerda é
um pensamento, estado de humor ou Contexto.

Contexto
(situação), Estado
de humor ou
Pensamento?

1. Nervoso Estado de humor


2. Em casa Contexto
3. Não vou conseguir fazer Pensamento
isso.
4. Triste.
5. Falando com um amigo ao
telefone.
6. Irritado.
7. Dirigindo meu carro.
8. Eu sempre vou me sentir
assim.
9. No trabalho.
10. Estou enlouquecendo.
11. Bravo.
12. Eu não presto.
13. 4:00 da manhã.
14. Algo terrível vai acontecer.
15. As coisas nunca dão certo.
16. Desanimado.
17. Eu não vou superar isso.
18. Sentado em um
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restaurante.
19. Estou fora de controle.
20. Sou um fracasso.
12. Falando ao telefone com
minha mãe.
22. Ela está sendo injusta.
23. Deprimido.
24. Sou um perdedor.
25. Culpado.
26. Na casa de meu filho.
27. Estou tendo um ataque
cardíaco.
28. Levaram vantagem sobre
mim.
29. Deitado na cama, tentando
dormir.
30. Isso não vai funcionar.
31. Vergonha.
22. Vou perder tudo que tenho.
23. Apavorado.
Adaptado de A Mente Vencendo o Humor, de Dennis Greenberger e Christine A.
Padesky. © 1995 Guílford Press.
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Prática #2
O Ciclo do sofrimento em sua
vida
As seguintes perguntas ajudarão você a identificar
como esses cinco componentes estão agindo na origem
de seus problemas:

1. Mudanças ambientais/Situações de vida:

a. Ultimamente, tenho experimentado alguma


mudança?

b. Quais foram os eventos mais estressantes para


mim no último ano?

c. Nos últimos 3 anos?

d. Nos últimos 5 anos?

e. Na minha infância?

f. Estou passando por quaisquer dificuldades


duradouras ou atuais (incluindo ser discriminado
ou molestado por outros)?
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2. Reações físicas:
a. Tenho quaisquer sintomas físicos que me
incomodam, tais como mudanças em nível de
energia, apetite e sono, bem como sintomas
específicos, tais como flutuações no ritmo
cardíaco, dores de estômago, sudorese, tontura,
dificuldades respiratórias ou dor?

3. Humor.
Que palavras isoladas descrevem meus estados de
humor atualmente:

Deprimido Triste Inseguro


Ansioso Constrangido Orgulhoso
Zangado Excitado Furioso
Culpado Apavorado Em pânico
Envergonhado Irritado Frustrado
Irado Nervoso Outros:
Assustado Aborrecido _________________
Feliz Magoado _________________
Amoroso Alegre _________________
Humilhado Desapontado _________________

4. Comportamento:
Que coisas eu faço que gostaria de mudar ou melhorar:
a. No trabalho?

b. Em casa?

c. Com amigos?

d. Em mim mesmo?
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e. Evito situações ou pessoas quando poderia ser


vantajoso para mim estar envolvido?

5. Pensamentos:
Quando tenho estados de humor fortes, quais
pensamentos tenho:

a. A respeito de minha própria pessoa?

b. Sobre outras pessoas?

c. Sobre meu futuro?

d. Quais pensamentos interferem na realização de


coisas que eu gostaria de fazer ou acho que
deveria fazer?

e. Quais imagens ou lembranças me vêm à mente?


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Muito importante.
Não esqueça de trazer este livreto para a próxima
sessão.

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