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Reações de hipersensibilidade: o que são e quais os tipos

Introdução

Apesar de o sistema imune ser importante para defender o hospedeiro contra infecções, a
própria resposta imune pode causar lesão tecidual e doença, sendo prejudicial para o indivíduo.
Essas reações imunes prejudiciais são chamadas de reações de hipersensibilidade, que
podem ocorrer em duas situações:

1. Resposta descontrolada a antígenos estranhos, ocasionando uma lesão tecidual.

2. Resposta imune contra antígenos próprios, indicando uma falha no mecanismo de


autotolerância (ausência de resposta à antígenos próprios).

Sendo assim, doenças de hipersensibilidade são doenças causadas por respostas


imunológicas não controladas ou inadequadamente direcionadas que causam lesão aos
tecidos do hospedeiro.

Tipos de Reações de Hipersensibilidade

De acordo com o principal mecanismo imunológico responsável pela lesão tecidual e pela
doença, as reações de hipersensibilidade podem ser classificadas em:

1. Hipersensibilidade imediata (Tipo I)


2. Doenças mediadas por anticorpos (Tipo II)
3. Doenças mediadas pelo complexo imune (Tipo III)
4. Doenças mediadas por célula T (Tipo IV)

Hipersensibilidade Imediata (Tipo I)

O protótipo de uma reação de hipersensibilidade do tipo I, é uma reação alérgica. O alérgeno


se liga ao IgE, o qual irá se ligar ao mastócito estimulando a liberação de grânulos de
histamina, que serão responsáveis por todos os sintomas da hipersensibilidade do tipo
I.

Os alérgenos podem ser: alimentos, venenos de insetos, medicamentos e, também, alérgenos


respiratórios, como: ácaros, fungos, pólens e pelos.

Em pessoas atópicas, as células dendríticas reagem a esses alérgenos, apresentando-os,


através do MHC II, a um linfócito TCD4. A célula TCD4/T helper é uma célula naive, ou seja,
sem função. No entanto, quando a célula dendrítica apresenta o alérgeno, essa célula adquire
a função de produzir resposta contra o alérgeno ao ativar a função Th2. Sendo assim, essas
células irão produzir interleucinas específicas do perfil Th2 contra o antígeno (alérgeno)
específico.

Produzir uma resposta Th2 significa se ligar a um linfócito B, produzir citocinas específicas no
perfil Th2 (IL-4, IL-12) e o linfócito B será ativado e irá se transformar em um plasmócito, que
produz imunoglobulinas IgE.
Mastócitos são células ricas em receptores Fc de IgE, e sendo assim, a maioria das
imunoglobulinas IgE produzidas irão se ligar a mastócitos. Esse primeiro contato com o
antígeno se chama sensibilização, ou seja, houve apenas a produção de IgE e, por isso, não
há sintomas. No entanto, quando ocorre uma segunda exposição ao antígeno, os mastócitos
sensibilizados por IgE irão agir liberando os anticorpos e, assim, desencadeiam os sintomas
imediatos, como: prurido, urticária, angioedema, broncoespasmo, síncope, hipotensão, entre
outros.

Além disso, os mastócitos também são capazes de produzir citocinas que recrutam neutrófilos
e eosinófilos para o local da reação durante horas. Esse componente inflamatório da
hipersensibilidade imediata é chamado de reação de fase tardia (reação do tipo IV – celular),
que é responsável pela lesão tecidual devido às reações repetidas de hipersensibilidade
imediata (Figura 01).

Figura 01: sequência de eventos na hipersensibilidade imediata.


Fonte: Abbas A.K., Lichtman A.H.& POBER, J.S. – Imunologia Básica. 5ª ed. 2005.

A propensão ao desenvolvimento de resposta Th2, produção de IgE e hipersensibilidade


imediata tem uma forte base genética, sendo a principal um histórico familiar de doença
atópica. Indivíduos atópicos produzem grandes quantidades de anticorpos IgE em resposta a
antígenos que não desencadeiam essa resposta em pessoas não atópicas.

Hipersensibilidade Mediada por Anticorpos (Tipo II)


Na hipersensibilidade do tipo II, também conhecida como hipersensibilidade citotóxica, há
a produção de anticorpo IgG contra um antígeno específico que fica na superfície de
uma célula. Assim, IgG irá agir ativando macrófagos, ou ativando o complemento, o que irá
resultar em lise da célula-alvo e em danos teciduais, causando distúrbios funcionais e
orgânicos deletérios ao indivíduo.

Entre os distúrbios de hipersensibilidade crônica em seres humanos que são causados ou


estão associados a anticorpos antiteciduais, podemos citar: anemia hemolítica autoimune,
púrpura trombocitopênica autoimune, Síndrome de Goodpasture, Doença de Graves, miastenia
grave, pênfigo vulgar, anemia perniciosa e febre reumática (Figura 02).

Figura 02: doenças mediadas por anticorpo humano (hipersensibilidade tipo II).
Fonte: Abbas A.K., Lichtman A.H.& POBER, J.S. – Imunologia Básica. 5ª ed. 2005.

Hipersensibilidade Mediada por Complexo Imune (Tipo III)

Na hipersensibilidade do tipo III, há produção de IgG contra um antígeno específico que


está livre na corrente sanguínea, formando um complexo imune.

O baço e o fígado são órgãos que têm a função de retirar esses complexos da corrente
sanguínea, mas quando há a formação de muitos complexos, esses órgãos não conseguem
realizar sua função com eficácia. Assim, os complexos passam a se depositar em locais de
maior pressão, como rins (causando glomerulonefrite), articulações (causando artrite), vasos
menores (causando arterite), entre outros (Figura 03).

Quando há esse depósito, a IgG irá se ligar ao macrófago e neutrófilo, ativando-os, e irá ativar
o complemento que vai estimular a fagocitose ou fazer a lise da célula.

Figura 03: doenças do complexo imune (hipersensibilidade tipo III).


Fonte: Abbas A.K., Lichtman A.H.& POBER, J.S. – Imunologia Básica. 5ª ed. 2005.

Hipersensibilidade mediada por linfócitos T (Tipo IV)

Na hipersensibilidade do tipo IV, células (como linfócitos T citotóxicos, macrófagos,


eosinófilos etc.) são ativadas como agentes efetores, sem a necessidade de
anticorpos. Ou seja, são ativadas diretamente contra um antígeno. Sendo assim, não há
produção de IgG.

Além disso, as principais causas de reações de hipersensibilidade mediadas por linfócitos T


são autoimunidade e respostas exageradas ou persistentes aos antígenos ambientais.
Normalmente, essas reações são direcionadas contra antígenos celulares com distribuição
tecidual restrita, por isso as doenças autoimunes mediadas por célula T tendem a se limitar a
poucos órgãos, geralmente não sistêmicos.

Como exemplos de doenças mediadas por linfócitos T podemos citar: esclerose múltipla, artrite
reumatoide, diabetes melito tipo 1, doença de Crohn, sensibilidade de contato, infecções
crônicas, hepatite viral, doenças mediadas por superantígenos, entre outros (Figura 04).
Figura 04: doenças mediadas por células T (hipersensibilidade tipo IV).
Fonte: Abbas A.K., Lichtman A.H.& POBER, J.S. – Imunologia Básica. 5ª ed. 2005.

Considerações Importantes

Reações de hipersensibilidade são as respostas imunes que causam injúria tecidual, e as


doenças causadas por essas reações são chamadas de doenças de hipersensibilidade;

 Reações de hipersensibilidade podem surgir devido a respostas exageradas ou


anormais a antígenos estranhos ou antígenos próprios;
 As reações de hipersensibilidade são classificadas de acordo com o mecanismo de
lesão tecidual;
 A hipersensibilidade imediata (tipo I) é causada pela produção de anticorpo IgE contra
antígenos ambientais ou alérgenos, sensibilização dos mastócitos pela IgE e
degranulação na exposição subsequente ao alérgeno;
 A hipersensibilidade mediada por anticorpos (tipo II) contra antígenos celulares e
teciduais podem causar lesão tecidual e doença. Os anticorpos IgM e IgG promovem a
fagocitose das células que se ligam, induzindo inflamação e podem interferir nas
funções das células;
 A hipersensibilidade mediada por complexo imune (tipo III) ocorre quando os
anticorpos se ligam aos antígenos circulantes para formar os complexos, que irão se
depositar em diversos locais;
 A hipersensibilidade mediada por célula T (tipo IV) resulta de inflamação causada por
citocinas produzidas por células T.
 Definição
 Por definição, uma reação de hipersensibilidade é caracterizada por um distúrbio
causado por uma resposta imune excessiva ou inapropriada. Os antígenos podem ser
exógenos, tendo uma resposta imune descontrolada contra determinado antígeno. Ou
a reação de hipersensibilidade pode ser contra as próprias estruturas, caracterizando
um quadro autoimunidade.
 Tipos de reações de hipersensibilidade
 Tipo I
 Os principais componentes celulares envolvidos são: células TH2, anticorpos IgE,
mastócitos e eosinófilos.
 Entendendo o que acontece
 Considerando que um indivíduo seja alérgico a frutos do mar, à exemplo o camarão,
porém nunca teve o primeiro contato. Ao se fazer o contato o tempo para o indivíduo
apresentar os primeiros sintomas será maior, entretanto, apenas neste primeiro
contato. Devido que o indivíduo não está sensibilizado para tal componente alérgico
(camarão). Entretanto, após a sensibilização, essa reação é exacerbada, pois já
existem anticorpos IgE que se ligam aos mastócitos. Envolve células TH2, que
produzem IL-4, Il-5, IL-10, Interferon Gama. A IL-4 faz a troca de classe para IgE, IL-5
ativa eosinófilo. A resposta TH2 também está envolvida em infecções por helmintos.
Mastócitos estão presentes em vários tecidos. Já os eosinófilos consistem em um tipo
celular envolvido contra parasitas helmintos, mas também em reações de
hipersensibilidade.
 O mastócito tem receptores para região FC de IgE. O alérgeno interage com esse
anticorpo, isto dá uma sinalização para o receptor FC, que estimula esse mastócito e,
com isso, ele vai degranular. O mastócito pode liberar histamina, que causa
vasoconstrição, broncoconstrição e prurido. Existem formas de inibir a degranulação de
mastócito para tratamento.
 Alguns exemplos de síndromes clínicas relacionadas com hipersensibilidade tipo
I: rinite alérgica, anafilaxia, alergias alimentares, constrição brônquica.
 Rinite alérgica: Alérgenos transportados pelo ar. Causam edema local, secreção nasal
de muco e obstrução das vias aéreas.
 Alergia a alimentos: amendoim, arroz, ovos. Mastócitos localizados no trato
gastrointestinal. Degranulação dos mastócitos liberando mediadores químicos irá
causar a contração da musculatura lisa, vasodilatação, vômito e diarreia. Aumento da
permeabilidade das mucosas.
 Dermatite atópica (eczema): frequente em crianças. Lesões inflamatórias da pele
induzidas por citocinas liberadas pelos mastócitos. Recrutamento de eosinófilos.
Erupções da pele são eritematosas e contêm pus.
 . Asma: mastócitos localizados nas submucosas das vias aéreas inferiores. Pólen,
poeira, substâncias químicas, antígenos virais. Há um aumento de muco, constrição
brônquica e dificuldade na respiração. Na asma tem-se uma resposta aguda, o
mastócito libera as citocinas, recrutam outras células do sistema imune, levando a uma
inflamação que pode gerar uma obstrução de vias aéreas.
 Tipo II
 É tida mediada por anticorpos, principalmente IgM e IgG, contra antígenos da
superfície celular ou da matriz extracelular.
 Esta reação ocorre através da ação dos anticorpos contra antígenos presentes na
matriz extracelular, interstício, etc. Se o anticorpo se liga a um antígeno na superfície
de uma célula ou da matriz extracelular pode ativar o sistema complemento,
responsável pela lise celular, anafilaxia, recrutamento de células inflamatórias e a
opsonização.
 O antígeno está presente na superfície de uma célula ou na matriz extracelular. O
anticorpo IgG da imagem está ligado ao antígeno. Células que possuem receptores
para a região FC podem estar sendo ativadas no local. Pode ativar o sistema
complemento que possui fatores solúveis. Há um recrutamento mediado por
complemento ou receptor de FC e ativação de leucócitos, opsonização e fagocitose de
células, causando anormalidades na função celular.
 Alguns exemplos de síndromes clínicas relacionadas com hipersensibilidade tipo
II

Fonte: https://pt.slideshare.net/labimuno/auto-imunidade
Imagem 1: Miastenia Gravis. Nesta doença, tem-se a formação de anticorpos que se
ligam aos receptores de acetilcolina, atuando dessa forma como um antagonista da
acetilcolina e inibindo sua ação.
 Tipo III
 Mediada por imunocomplexos que se depositarão em determinados locais.
 Os Imunocomplexos podem se formar na circulação e subsequentemente se
depositaram nos tecidos, em particular nos vasos sanguíneos, causando lesão. Por
exemplo: no Lúpus Eritematoso Sistêmico existe a formação de muitos
imunocomplexos contra antígenos próprios que podem se depositar em glomérulos
renais, vasos de pequeno calibre e iniciar uma reação inflamatória. Pode ativar o
sistema complemento causando lesão tecidual, pois irá produzir fatores quimiotáticos
e/ou anafiláticos. Se caso esses imunocomplexos forem depositados nos glomérulos
renais, terá uma nefrite, nas articulações uma artrite.

Fo
nte: ABBAS, A.K.; LICHTMAN, A.H.; PILLAI, S. Imunologia Celular e Molecular. 8ᵃ
Edição. Elsevier, 2015 (livro-texto)
Imagem 2: Visualização dos imunocomplexos na luz de um vaso sanguíneo, sua
deposição pode causar danos no endotélio.
 Alguns exemplos de síndromes clínicas relacionadas com hipersensibilidade
tipo III
 Lúpus eritematoso sistêmico: têm-se anticorpos contra DNA e nucleoproteínas. Esses
complexos se depositam em vasos, nos rins, articulações, causando complicações
graves, como nefrite, artrite e vasculite.
 Glomerulonefrite pós-estreptocócica: antígenos da parede celular de Streptococcus
podem promover a formação de imunocomplexos na parede dos glomérulos, levando à
glomerulonefrite. Em resumo, a reação de hipersensibilidade de tipo III promove a
formação de imunocomplexos, que se depositam e predispõem reações inflamatórias.
 Tipo IV
 É também chamada de tardia. Mediada por linfócitos T, envolvendo mecanismos
efetores de células TCD4 e células TCD8. Mediada tanto por células TCD8 quanto
células TCD4, podendo levar a uma inflamação mediada por ativação de macrófagos e
citocinas.
 A reação de hipersensibilidade do tipo IV é mediada por linfócitos T (CD4 ou CD8).
Pode ser dividida em dois estágios: o de sensibilização e o de produção.
 Estágio de sensibilização: o antígeno injetado subcutaneamente é processado por
células apresentadoras de antígenos locais, como as células de Langerhans na pele.
Após essa fase, as células T reconhecem o complexo peptídeo-MHC em APCs e se
diferenciam em células TH1.
 Estágio de produção: as APCs também ativam as células TH1, que liberam citocinas,
responsáveis por recrutar e ativar macrófagos e outras células inflamatórias. O
infiltrado de células inflamatórias resulta no acúmulo de plasma e dano tecidual local. O
estágio de produção não é tão rápido, podendo demorar de 48h a 72h.

Fo
nte: ABBAS, A.K.; LICHTMAN, A.H.; PILLAI, S. Imunologia Celular e Molecular. 8ᵃ
Edição. Elsevier, 2015 (livro-texto)
Imagem 3: As células T podem causar lesão e doença por meio de dois mecanismos:
reações de hipersensibilidade tardia, que podem ser desencadenadas por células T
CD4+ e TCD8+ e nas quais a lesão tecidual é causada por macrófagos ativados e
células inflamatórias, e por destruição direta de células alvo, que é mediada por células
TCD8+.

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