Professor do Departamento de Psiquiatria Universidade Federal de São Paulo UNIFESP Introdução • Transtorno mental – Grave – Muitas vezes debilitante – Ocorre em cerca de 1% da população – Incide predominante entre 20 e 30 anos HISTÓRICO Emil Kraepelin (1856-1926) • 1896: Separou a Demência Precoce da Psicose Maníaco Depressiva • Reuniu conceitos: – Demência Precoce (Morel, 1860) – Catatonia (Kalhbaun, 1874) – Hebefrenia (Hecker, 1871) • Critérios baseados: – Sintomatologia – Etiologia – Evolução Critérios para o diagnóstico • Sintomatologia: – Distúrbios da atenção e da compreensão – Alucinações principalmente auditivas – Pensamento sonoro – Vivência de influência – Comprometimento das funções cognitivas e do julgamento, do fluxo do pensamento – Embotamento da afetividade – Mudanças do comportamento Critérios para o diagnóstico • Etiologia: – Pressupunha a existência de um quadro endógeno • Evolução: – Caracterizava-se pela evolução desfavorável e pela invalidez psíquica Eugen Bleuler (1857-1930) • 1911: reorganiza os critérios sob o nome de Esquizofrenia • Sintomas fundamentais: – Distúrbios da Associação do pensamento – Autismo – Distúrbios da Afetividade – Ambivalência • Sintomas acessórios: – Delírios – Alucinações – Alterações da personalidade, da linguagem e da escrita Eugen Bleuler • Subtipos: – Hebefrênico – Catatônico – Paranóide – Simples (Descrito por Diem) • Etiologia: – Processo fisiógeno (biológico) – Personalidade do indivíduo • Evolução: – Admite a recuperação parcial • Enfatiza o modelo heterogêneo e de etiologia multifatorial Kurt Schneider (1887-1967) • Sintomas de primeira ordem (1948): – Inserção do pensamento – Sonorização do pensamento – Alucinações auditivas (vozes que dialogam entre si, ou que acompanham as próprias ações – Vivência de influência corporal – Roubo ou subtração do pensamento – Percepção delirante – Difusão do pensamento – Vivência de influência no domínio dos sentimentos, das tendências e das vontades • Kraepelin: – Enfatiza a idade de início precoce – Deterioração progressiva – Sintomas psicóticos graves • Bleuler: – Ênfase à heterogeneidade dos sintomas – Tipos de esquizofrenia – Desorganização do pensamento e às influências da personalidade – Conceito amplo • Schneider: – Ênfase às vivências delirantes, alucinações auditivas e à perda da autonomia do eu como sendo específicos da esquizofrenia Crow,1980 Duas formas de esquizofrenia:
– Tipo I (sintomas positivos) – Tipo II (sintomas negativos)
• Alucinações • Alogia • Delírios • Embotamento afetivo • Discurso desorganizado • Abulia • Comportamento bizarro • Anedonia • Antecedente pré-morbido • Antecedente pré-mórbido bom ruim • Início agudo • Início insidioso • Sintomas psicóticos • Prejuízo no desempenho produtivos e na cognição • Cognição preservada • Má resposta ao • Boa resposta ao tratamento tratamento com • Alterações estruturais neurolépticos irreversíveis • Mecanismo neuroquimico reversível Fatores de Risco • Aumento do risco se um familiar sofre da doença • Ser solteiro • Viver em pais industrializado • Nível sócio-econômico baixo • Viver em área urbana • Consumo de substância psicoativa • Fatores pré e perinatais: – Incompatibilidade de fator Rh – Desnutrição – Infecções virais Fatores de Risco • Gênero – Sexo masculino maior risco para Esquizofrenia de inicio precoce e no adulto – Sexo feminino maior risco para Esquizofrenia de início tardio • Genética – Aumento do risco em parentes de portadores de esquizofrenia • 50% em gêmeos monozigóticos • 15% em gêmeos dizigóticos • Risco relativo para um familiar de primeiro grau é de aproximadamente 10% • A chance de um filho de pais portadores de esquizofrenia ter a doença é de quase 50% Fatores de risco • Períodos pré e perinatal – Complicações na gestação – Infecção materna – Hemorragias – Diabetes materna – Estresse Materno – Desnutrição – Incompatibilidade de fator Rh – Idade gestacional ≤ 37 semanas – Parto » Hipoxia » Traumatismos » Baixo peso ao nascer – Gravidez não desejada Fatores de risco • Desenvolvimento – Retardo no desenvolvimento neuropsicomotor – Abuso físico e sexual – Traumatismo cranioencefálico – Baixo rendimento escolar – Déficitis cognitivos • Adolescência – Uso de drogas – Dificuldade para socialização – Dificuldades afetivas e sexuais – Isolamento social Fatores de risco • Fatores biológicos – Anomalias físicas menores – Anomalias neuroanatômicas • Fatores ambientais – Urbanidade – Migração – Condição socioeconômica – Adversidade social – Eventos vitais – Etnia Fases da esquizofrenia • Fase pré-mórbida (0-13anos) – Dificuldade para ficar em pé – Andar com ≥ 1,5 anos – Falar com ≥ de 2 anos – Timidez – Poucas amizades – Dificuldades escolares – Uso de maconha Fases da esquizofrenia • Fase prodrômica (14-17 anos) – Piora no desempenho escolar – Abandono escolar – Agressividade – Isolamento social – Sintomas de depressão Fases da esquizofrenia Psicose • Fase progressiva – Delírios – Alucinações – Embotamento afetivo – Prejuízo volitivo • Fase crônica – Prejuízo no desempenho social e ocupacional Quadro Clínico Fase Aguda • Início na adolescência e adulto jovem (segunda e terceira década) • Início pode ser abrupto ou insidioso • Início insidioso: – Alterações vão ocorrendo paulatinamente – Paciente vai se tornando mais isolado – Perde o interesse e a motivação pelas atividades habituais e relações pessoais – Queda do rendimento ou abandono das atividades escolares e profissionais Quadro Clínico Fase Aguda • Início insidioso: – Aquisição de interesses bizarros – Agravamento do quadro clínico até a manifestação dos sintomas psicóticos serem mais evidentes Quadro Clínico Fase Aguda • Inicio abrupto – Ao longo de dias ou semanas há manifestação: • Angustia • Perplexidade • Vivência “que algo vai acontecer” • Insônia • Fala “desconexa” • Agitação • Agressividade Quadro Clínico Fase Aguda • Início abrupto – Sintomas psicóticos mais evidentes – Geralmente aparência desleixada – Ideias delirantes com diversos conteúdos – Alucinações principalmente auditivas – Pensamento desorganizado • Roubo, intrusão e difusão do pensamento – Percepções delirantes – Vivências de influência Quadro Clínico Fase Aguda • Início abrupto – Alterações da psicomotricidade • Lentidão • Negativismo • Outros sinais de catatonia – Alterações da afetividade • Incongruência • Hipomodulação • Embotamento • Puerilidade – Crítica prejudicada em relação ao seu estado mórbido Quadro Clínico Quadro residual • Manifestações psicopatológicas que persistem em menor ou maior grau de gravidade – Delírios – Vivências de influência – Alucinações crônicas – Prejuízo na esfera afetiva e volitiva – Diminuição da mímica – Respostas monossilábicas – Discurso pobre Quadro Clínico Quadro residual – Comportamentos inadequados – Afeto embotado – Modulação afetiva diminuída – Apatia – Perda de iniciativa – Prejuízos cognitivos • Diminuição da concentração • Diminuição da memória • Diminuição da abstração • Disfunções executivas Dimensões Psicopatológicas 1. Psicótica 1. Delírios 2. Alucinações 2. Desorganização do pensamento e conduta 1. Desorganização do pensamento 2. Afeto inapropriado 3. Distúrbio da atenção 3. Deficitária ou negativa 1. Embotamento afetivo 2. Prejuízo volitivo Dimensões Psicopatológicas • Sintomas de depressão • Sintomas de ansiedade • Declínio de funções cognitivas • Perda da capacidade de insight e abstração Quadro Clínico Subtipos • Esquizofrenia paranoide – Ideias delirantes • Perseguição • Alucinações auditivas – Não apresenta marcantes alterações • Afeto • Volição • Linguagem • Sintomas catatônicos Quadro Clínico Subtipos • Esquizofrenia hebefrênica ou desorganizada • Prejuízo do afeto • Ideias delirantes e alucinações auditivas com instabilidade • Isolamento social • Pensamento desorganizado • Prejuízo da volição • Rápido desenvolvimento de sintomas negativos Quadro Clínico Subtipos • Esquizofrenia catatônica – Proeminência de alterações psicomotores que podem alternar entre os extremos • Hipercinesia Estupor • Obediência automática negativismo • Episódios de agitação psicomotora • Estado oniroide e alucinações cênicas vívidas • Catalepsia • Flexibilidade cérea • Maneirismo • Ecolalia • Ecopraxia Etiopatogenia Etiopatogenia • Neurodesenvolvimento – Fatores genéticos e ambientais associados à esquizofrenia têm impacto sobre o neurodesenvolvimento precoce – Pode causar alterações cognitivas e socioafetivas na infância – Fenômenos de maturidade neuronal processo de reorganização sináptica cortical podem estar relacionados ao o desencadeamento da esquizofrenia – Eventos moleculares associados a processos inflamatórios e estresse oxidativo podem influenciar a maturação neural Etiopatogenia • Neurodegeneração – Anormalidades de citoarquitetura – RM estrutural: • Alargamento de sulcos corticais • Redução de substância cinzenta • Dilatação ventricular – Perda excessiva de volume cerebral após maturação completa – Progressão das alterações cerebrais estruturais com a evolução da doença Etiopatogenia • Neurotrasmissão – Dopaminérgica • Aumento da atividade dopaminérgica na área límbica – Gutamatérgica • Hipótese de receptores NMDA – Disfunção dos receptores NMDA – Importante para memória e cognição – Gabaérgica • Redução da atividade da inibição Comorbidade • Obesidade • Diabetes melito • Doenças cardiovasculares • Doenças sexualmente transmissíveis • Doença pulmonar obstrutiva crônica Tratamento Tratamento • Objetivos – Desenvolver uma aliança terapêutica e promover adesão ao tratamento – Fornecer educação e terapias ao paciente e á família – Tratar condições co-mórbidas, especialmente depressão maior, transtornos por uso de substâncias e transtorno de estresse pós-traumático • Prestar atenção às circunstâncias e ao funcionamento social do paciente • Tratamento de múltiplos profissionais Tratamento • Avaliação – Anamnese completa – Exame físico e do estado mental – Entrevistar membros da família – Realizar exames laboratoriais Tratamento
• Uso de medicamentos antipsicóticos
– Com a possível exceção da clozapina para pacientes com sintomas refratários, os antipsicóticos em geral têm eficácia semelhante no tratamento dos sintomas positivos – Antipsicóticos de segunda geração podem ter eficácia superior no tratamento da psicopatologia global, sintomas cognitivos, negativos e de humor Tratamento
• Usar associações medicamentosas:
– condições co-mórbidas: depressão maior e transtorno obsessivo-compulsivo – sintomas associados: sintomas afetivos, agitação e agressividade – Efeitos colaterais dos antispicóticos Tratamento • Psicossocial – Intervenções familiares – Oficinas protegidas – Tratamentos de busca ativa na comunidade – Treinamento de habilidades sociais – Psicoterapias – Terapia Ocupacional Curso e Prognóstico • Prognóstico mais favorável – Início tardio – Fatores precipitantes evidentes – Início agudo – Historia pré-mórbidas favoráveis – Presença de sintomas de humor – História familiar de transtorno do humor – Sistema de apoio favorável – Presença de sintomas positivos Curso e Prognóstico • Prognóstico desfavorável – Início precoce – História pré-mórbida desfavorável – Comportamento retraído – História familiar de esquizofrenia – Sistema de apoio desfavorável – Presença de sintomas negativos – Sintomas e sinais neurológicos – História de traumatismo perinatal Prognóstico • Psicopatologia e Desempenho funcional heterogênio • 20 a 50% desfecho relativamente favorável Transtorno Delirante Persistente Histórico • Kraepelin (1921) Paranóia: distúrbio mental caracterizado por um sistema delirante bem estruturado (persecutório, de grandeza, somático, de ciúmes, hipocondríaco) de início insidioso e curso crônico, na qual, não há alucinações ou comprometimento da personalidade ou volição
Parafrenia: paranóia de início mais tardio com
alucinações proeminentes Conceito • Transtorno mental que tem no delírio sua principal característica psicopatológica • Quadro delirante sistematizado com desenvolvimento progressivo • Não há alteração da consciência e nem dissociação psíquica • O delírio pode ser isolado ou composto por muitos temas, geralmente sem características bizarras • Delírio persistente com afeto congruente • As alucinações auditivas, visuais, táteis ou olfativas podem estar presentes, mas não são proeminentes • Ao longo do curso do transtorno a personalidade pode apresentar discreta deterioração Transtorno Delirante Persistente • Epidemiologia – Prevalência: 0,2 a 0,3% – 1 a 2% das internações psiquiátricas – Idade média de início de 40 anos – Mais frequente no sexo feminino Fatores de risco • Imigração • Surdez • Transtorno de personalidade paranoide e equizóide Formas clínicas • Delírio erotomaníaco – Clerambault (1921): “Psicose Passional” – Ocorre mais freqüentemente no sexo feminino – Crença de que um homem, geralmente de posição social mais elevada está apaixonado por ela – Pode apresentar sintoams de primeira ordem de K. Scheneider – Crença que somente ela recebe sinais inequívocos da paixão e que necessitam ser negados pela pessoa escolhida em seu delírio – Crença que o relaçionamento entre os dois é de conhecimento público - A vítima é habitualmente atormentada por cartas, presentes, telefonemas, investidas sexuais -Pode surgir comportamento violento contra o suposto amante Formas clínicas • Delírio de Ciúme (Síndrome de Othello) - Mais frequente no sexo masculino - Na forma pura, é transtorno delirante ou paranóide - Associado com alcoolismo, abuso de drogas, transtorno do humor, esquizofrenia e epilepsia - Irritabilidade e agressividade (homicídio e suicídio) - Aparece abruptamente (40 anos) – Crença de ser traído Formas Clínicas • Síndrome de Capgras (transtorno de identificação) – Capgras e Reboul-Lachaux (1923) – Raro – Desenvolvimento do delírio onde há crença que pessoas com quem mantém vinculo afetivo foram substituídas por sósias e que somente ele pode reconhecer “Delírio dos sósias” – Atribui essa substituição aos impostores – Sem comprometimento da consciência, está associado a outros transtornos delirantes, esquizofrenia, transtornos do humor, demência e etc Formas Clínicas • Síndrome de Cotard (Delírio de Negação) - Raro, - Presença de delírios niilistas de que o paciente está apodrecendo ou totalmente morto - Pode chegar a negar sua própria existência - Associado com depressão psicótica Outros transtornos psicóticos Transtorno psicótico compartilhado • Descrito em 1877 por Charles Lasègue e Jules Falret “folie à deux” – Transtorno paranoide compartilhado – Transtorno psicótico induzido – “ folie impose” – Insanidade dupla – Transtorno raro Transtorno psicótico compartilhado • Caracterizado: – Transferência de delírios de uma pessoa para outra – Pessoas de relacionamento próximo e vivem em isolamento social – Individuo que inicia com delírios (caso primário) • Manifesta doença crônica • Membro mais influente – Caso secundário • Pessoa mais sugestionável • Mais ingênuo • Mais passivo • Autoestima mais baixa Transtorno esquizofreniforme • Introduzido por Gabriel Langfelt (1895-1983) em 1939 • Grupo de pacientes com psicoses semelhantes à esquizofrenia (schizophrenia–like) • Evolução clínica significativamente melhor • Sem observação: – Inicio insidioso – Curso crônico – Autismo – Embotamento afetivo – Alterações na volição • Duração maior que 30 e menor que 180 dias • Prevalência 0,09% Transtorno psicótico breve • Diferencia-se dos outros quadros psicóticos: • Tempo de duração • Forma de instalação • Remissão • Recuperação do desempenho funcional pré-mórbido Transtorno psicótico breve • Instalação súbita da síndrome psicótica • Ausência da fase prodrômica • Frequentemente associado à um fator estressor (atualmente não é necessário para o diagnóstico • Duração entre um dia e menor que trinta dias • Prevalência de 9% dos primeiros surtos psicótico • Mais frequente no sexo feminino • Geralmente o primeiro episódio ocorre em adulto jovem (menos de trinta anos) • Transtorno psicótico breve – ≤ 30 dias • Transtorno esquizofreniforme – ≥ 30 dias e ≤ 180dias • Esquizofrenia – ≥ 180 dias Transtorno esquizoafetivo • Histórico – Kraepelin (1893) descreveu casos mistos entre “insanidade maníaco afetiva” e “demência precoce” • cases-in-between – Kurt Scheider (1930) descreu casos intermediários – Zwischn-Falle, Eugen Bleuler e Manfred Bleuler descreveram como psicoses mistas Transtorno esquizoafetivo • Histórico – Kasanin (1933) descreveu o termo “esquizoafetivo” • Publicou o artigo “ The Acute Schizoaffective Psychosis” no American Journal of Psychiatry – Descreveu nove casos de pacientes jovens – Boas condições clínicas e adaptação social – Subitamente manifestaram quadro psicótico “dramático” – Presença de sintomas afetivos e esquizofrênicos Transtorno esquizoafetivo • Quadro clínico – Sintomas clássicos de esquizofrenia e transtornos do humor – DSMV • Manifestação da síndrome psicótica em pacientes com transtorno do humor • Em algum momento foi obervado sintomas compatíveis com os critérios da esquizofrenia e houve um episódio depressivo maior ou maníaco