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Carlos Biasotti

O Cão na Literatura

5a. ed.

2022
São Paulo, Brasil
O Autor

Carlos Biasotti foi advogado criminalista, presidente da


Acrimesp (Associação dos Advogados Criminalistas do Estado de
São Paulo) e membro efetivo de diversas entidades (OAB, AASP,
IASP, ADESG, UBE, IBCCrim, Sociedade Brasileira de
Criminologia, Associação Americana de Juristas, Academia Brasileira
de Direito Criminal, Academia Brasileira de Arte, Cultura e História,
etc.).

Premiado pelo Instituto dos Advogados de São Paulo, no


concurso O Melhor Arrazoado Forense, realizado em 1982, é autor de
Lições Práticas de Processo Penal, O Crime da Pedra, Tributo aos Advogados
Criminalistas, Advocacia Criminal (Teoria e Prática), Da Prova, Da Pena,
Direito Ambiental, O Cão na Literatura, etc., além de numerosos artigos
jurídicos publicados em jornais e revistas.

Juiz do Tribunal de Alçada Criminal do Estado de São Paulo


(nomeado pelo critério do quinto constitucional, classe dos
advogados), desde 30.8.1996, foi promovido, por merecimento, em
14.4.2004, ao cargo de Desembargador do Tribunal de Justiça.

Condecorações e títulos honoríficos: Colar do Mérito


Judiciário (instituído e conferido pelo Poder Judiciário do Estado
de São Paulo); medalha cívica da Ordem dos Nobres Cavaleiros de
São Paulo; medalha cultural “ Brasil 500 anos”; medalha “ Prof. Dr.
Antonio Chaves”, etc.
O Cão na Literatura
Carlos Biasotti

O Cão na Literatura

5a. ed.

2022
São Paulo, Brasil
Sumário

I. À Guisa de Prefácio..................................................................................11

II. O Cão na Poesia e na Literatura ......................................................13

III. O Cão na Poesia .........................................................................................21

IV. O Cão: Amigo do Homem e Símbolo da Fidelidade ..........32

V. Nótulas e Curiosidades .........................................................................47

VI. O Cão nos Provérbios ............................................................................58

VII. O Cão: Passagens Literárias ...............................................................61

VIII. Cães e seus Donos Famosos .................................................................77

IX. O Furto de um Cãozinho ....................................................................92

X. A Cauda do Cão: por que Cortá-la? ........................................ .102


I - À Guisa de Prefácio

A bela e singular história do cãozinho, que não arredou


as patas do lugar onde jazia o cadáver de seu dono —
trucidado, no coração da África do Sul (Zimbábue), por
indivíduos sanguinários —, foi o que me inspirou a escrever
este livro.

Não me pareceu matéria somenos isto de um exemplar


da inferior escala zoológica haver manifestado, por ato
instintivo, tal rasgo de apego ou relação de afeto, como igual
não se achara entre os sujeitos que se jactam de ter a razão
por apanágio de sua espécie: era o cão a ensinar piedade ao
bicho-homem!

Em prova de tão perturbadora verdade aduzi outros


exemplos, que a leitura de autores de boa nota me deparou.

Ao transcrever-lhes os passos que serviram à


elaboração do opúsculo, salvo a adaptação às leis ortográficas
em vigor, mantive o texto original, que aparece entre aspas.
Procurei, nesse pouco, obrar segundo o estilo do cão:
fui-lhes fiel.

O Autor
II - O Cão na Poesia e na Literatura

Caro Paulo Bomfim;


Meu querido Poeta:

Muito me penhorou sua gentileza com a remessa da Revista


da Academia (ns. 114 e 115). Tem as capas amarelas (da mesma
cor do metal nobre de seu coração!).

Atendi-lhe à sugestão: li o sermão do grande Castro Néri,


profundo e edificante como os do genial Vieira; e também a
alocução do imortal Ibrahim Nobre! Demóstenes e Cícero não
hesitariam em contá-la entre suas melhores orações!

Onde me comprazi, no entanto, foi na leitura de seu


formoso discurso de recepção do acadêmico Antônio Ermírio de
Moraes (Revista da Academia, nº 114, pp. 9-18).
Para dizer dele o mínimo, repetirei com Sêneca:“Felix qui a
tali oratore laudatur”, o que, em nosso vernáculo, soa: Feliz daquele
que é louvado por semelhante orador!

Uma coisa, porém, hei de pedir ao Príncipe dos Poetas


Brasileiros, e é que, numa de suas maviosas crônicas mensais,
publicadas na Tribuna do Direito, digne-se tratar da matéria que os
jornais do mundo todo estamparam debaixo da forma de notícia:
a bela, comovente, patética história do cão, ao pé de seu dono, a
quem acabavam de matar! A eloquência daquela imagem excede
o prodígio da palavra! Eis por que a sabedoria das nações cultua
esse animal como o símbolo da fidelidade!
14

Veja novamente, meu caro Poeta, a foto do cãozinho (que


vai aqui reproduzida em cores). Temos entre mãos um exemplo
(*)
do sublime na Imprensa!
Também me ocorre — fio que me leve à paciência — aquele
célebre lugar da Odisseia, em que o Velho Cego eternizou Argos, o
cão de Ulisses:

“Lá jazia o cão Argos (...), mas ele percebeu que Ulisses estava ali
perto e, não podendo ir até o dono, sacudiu a cauda e abaixou as duas
orelhas. E o herói enxugou furtivamente uma lágrima...” (Homero,
Odisseia, liv. XVII, p. 284; trad. G.D. Leoni).

Faz ainda ao nosso intento o inspirado poema Canto


Extremo de um Cego, de Bruno Seabra, que transcrevo em seguida,
para que o releia o Amigo:

Canto Extremo de um Cego

Bruno Seabra

Eu tinha um único amigo,


tinha um só e não mais;
vivia sempre comigo
no exílio e na desventura;
por mais feliz criatura
não me deixava jamais.

(*) Ver fotos anexas a esta.


15

Na minha infância primeira,


meus débeis passos guiou;
na pobreza, na cegueira,
meu condão amenizava;
e quando a esmola me faltava,
ele nunca me faltou.

Era o meu único afeto, na


cegueira o meu bordão;
debaixo do humilde teto,
quando a febre me prostrava,
quem dos meus males cuidava
era só ele — o meu cão.

Todo o dia de ontem chamei-o,


não latiu, não respondeu!
Já, como dantes, não veio!
Quem sabe se anda perdido,
ou de algum ferro transido,
quem sabe se não morreu?!
16

Ou quem sabe se a velhice


do cego o amedrontou?
Talvez, o ingrato... o que disse?
Chamei-te de ingrato, amigo!
Perdão! Não sei o que digo!
Quem nem já sei o que sou!

Ingrato — não! Tu não


tinhas no pelo envolto de
cão, uma dessas mesquinhas
afeições vis dos traidores,
que vão sorrir aos senhores,
nos régios palácios, não!

Ai de mim! Tão desgraçado,


que nunca mais te hei de ter!
Quem hoje ao cego acurvado
ao peso de tantos anos
quem virá, dentre os humanos,
piedosa mão lhe estender?!
17

Quem lhe há de guiar os passos,


mendigando o escasso pão?
Ou quem lhe há de abrir os braços,
quando, à míngua de alimento,
ficar na rua, ao relento?
Ninguém, ninguém... nem um cão!

Quem me vir o meu Pardinho,


por piedade, pelos céus!
Tenha dó do coitadinho,
que talvez definhe à fome,
e dê-lhe do pão que come,
uma migalha, por Deus!

Mas, se o topar moribundo


— pelo amor que a mãe lhe tem —,
diga-lhe que neste mundo,
o cego que ele guiou,
quando o seu cão lhe faltou,
morreu de fome também!

(Apud Eugênio Werneck, Antologia Brasileira, 14a. ed.,


pp. 609-610; Livraria Francisco Alves; Rio de Janeiro).
18

Como o herói de Homero, cada um enxugará aqui


furtivamente sua lágrima, senão é declamar a apóstrofe do divino
Dante:

“E se non piangi, di che pianger suoli?” (Inferno, XXXIII,


(*)
43).

Meu estimado Poeta, aqui me cerro.

Aceite, com os votos de Feliz Páscoa, o afetuoso amplexo do


menor de seus amigos.

São Paulo, 27 de março de 2002

___________________________
Carlos Biasotti

(*) E se não choras, de que (então) costumas chorar?!

Ou:

“(...) e se tamanha desventura não vale tuas lágrimas, por qual outra causa
costumas tu vertê-las?” (Dante Alighieri, A Divina Comédia, 1886, p. 586; trad.
Joaquim Pinto de Campos; Imprensa Nacional; Lisboa).
19
20
III. O Cão na Poesia

1. O Cão do Louvre (Delavigne; trad. Alexandre


Herculano)

Tu que passas, descobre-te! Ali dorme o


forte que morreu.
Dá ao mártir do Louvre algumas flores;
(*)
dá pão ao seu lebréu .
Da batalha era o dia. O canhão troa:
e o livre corre à morte, e junto dele
o seu cão vai;
a mesma bala ambos feriu; o mártir
não deploreis: o amigo seu que vive
só pranteai!
Tristonho, sobre o forte ele se inclina,
afagando-o e gemendo; e a ver se acorda
põe-se a latir;
e do seu companheiro no combate
sobre o cadáver sanguinoso o pranto
deixa cair.

(*) Lebréu — Cão amestrado na caça das lebres. Cão de fila (cf. Caldas
Aulete, Dicionário, 2a. ed.; v. lebréu).
22

Essa gleba guardando onde repousam


as cinzas dos heróis, nada o consola no
seu gemer;
e ao que o ameiga triste repelindo,
“oh, que não és meu dono!” — o cão parece
tentar dizer.

Quando sobre as grinaldas de perpétuas


o matutino alvor da aurora o orvalho faz
cintilar,
os olhos abre vívidos, e pula
para afagar seu dono, que ele pensa
há de voltar!

Quando da noite a viração as coroas


fez ranger sobre a cruz do monumento,
desanimou:
ele quisera que seu dono ouvisse;
e ladra e uiva; mas o adeus de à noite
lá lhe faltou!
O inverno chega, e a neve, com violência,
cai, branqueia, e esconde esse gelado
leito de morte:
ei-lo que solta um lúgubre gemido,
e busca, ali deitando-se, ampará-lo
do frio norte.
23

Antes que os membros lhe entorpeça o


sono, mil tentativas para erguer a campa
inúteis faz;
depois consigo diz, como ontem disse,
— “Quando acordar, por certo, há de chamar-me”.
E dorme em paz.
Mas, na alta noite, em sonhos vê trincheiras,
e seu dono entre as balas encontradas
cair ferido;
e ouve-o que o chama com sibilo usado;
e ergue-se e corre após uma vã sombra,
dando um bramido.
É ali que ele espera horas e horas.
E saudoso murmura: ali pranteia,
e morrerá.
O seu nome qual é? Todos o ignoram.
O que o sabia, o dono seu querido,
nunca o dirá!...
Tu que passas, descobre-te! Além dorme
o forte que morreu.
Dá ao mártir do Louvre algumas flores, e
esmola ao seu lebréu.

(Alexandre Herculano, Poesias, 14a. ed., pp. 227-229;


Livraria Bertrand; Lisboa).
24

2. Fiel (Guerra Junqueiro)

Na luz do seu olhar tão lânguido, tão doce,


havia o que quer que fosse
dum íntimo desgosto:

era um cão ordinário, um pobre cão vadio,

que não tinha coleira e não pagava imposto,

acostumado ao vento e acostumado ao frio,

percorria de noite os bairros da miséria

à busca dum jantar.

E ao ver surgir da luz a palidez etérea o


velho cão uivava uma canção funérea,
triste como a tristeza oceânica do mar.

Quando a chuva era grande e o frio inclemente,


ele ia abrigar-se às vezes nos portais;

e mandando-o partir, partia humildemente,


com a resignação nos olhos virginais.

Era tranquilo e, como as pombinhas mansas,


nunca ladrou dum pobre à capa esfarrapada:
E, como não mordia às tímidas crianças,
as crianças então corriam-no à pedrada.
25

Uma vez, casualmente, um mísero pintor,


um boêmio, um sonhador,
encontra na rua o solitário cão.

O artista era uma alma heroica e desgraçada,


vivendo numa escura e pobre água-furtada,
onde sobrava o gênio e onde faltava o pão.
Era desses que têm o rubro amor da glória,
o grande amor fatal,

que umas vezes conduz às pompas da vitória,

e que outras vezes leva ao quarto do hospital.

E ao ver por sobre o lodo o magro cão plebeu,

disse-lhe: — “O teu destino é quase igual ao meu:


Eu sou, como tu és, um proletário roto,

sem família, sem mãe, sem casa, sem abrigo;

e quem sabe se em ti, ó velho cão do esgoto,

eu não irei achar o meu primeiro amigo!...”


26

No Céu azul brilhava a lua etérea e calma;


(*)
e do rafeiro vil no misterioso olhar
via-se o desespero e a ânsia duma alma,
que está encarcerada, e sem poder falar.
O artista soube ler naquele olhar em brasa
a eloquente mudez dum grande coração;
e disse-lhe: — “Fiel, partamos para casa;
tu és o meu amigo, e eu sou o teu irmão”.

E viveram depois assim por largos anos,


companheiros leais, heroicos puritanos,
dividindo igualmente as privações e as dores.
Quando o artista infeliz, exausto e miserável,
sentia esmorecer o gênio inquebrantável
dos fortes lutadores;
quando até lhe acudia às vezes à lembrança
partir como uma bala a derradeira esperança,
pôr um ponto final no seu destino atroz;
nesse instante do cão os olhos bons, serenos,
murmuravam-lhe: — “Eu sofro, e a gente sofre menos,
quando se vê sofrer também alguém por nós”.

(*) Rafeiro — Diz-se de certa casta de cães próprios para guardar gado (cf.
Caldas Aulete, Dicionário, 2a. ed.; v. rafeiro).
27

Mas um dia a Fortuna, a deusa milionária,


entrou-lhe pelo quarto, e disse alegremente:

“Um gênio como tu, vivendo como um pária,


agrilhoado da fome à lúgubre corrente!

Eu devia fazer-te há muito esta surpresa,


eu devia ter vindo aqui para te buscar;

mas moravas tão alto! e digo-o com franqueza,


custava-me a subir até ao sexto andar.
Acompanha-me; a glória há de ajoelhar-te aos pés!”

E foi; e ao outro dia as bocas das Frinés


abriram para ele um riso encantador;

a glória deslumbrante iluminou-lhe a vida,

como bela alvorada esplêndida, nascida

a toques de clarim e a rufos de tambor!

Era feliz. O cão

dormia na alcatifa à borda do seu leito,

e logo de manhã vinha beijar-lhe a mão,


ganindo, com um ar alegre e satisfeito.

Mas ai! o dono ingrato, o ingrato companheiro,

mergulhado em paixões, em gozos, em delícias,

já pouco tolerava as festivais carícias


do seu leal rafeiro.
28

Passou-se mais um tempo; o cão, o desgraçado,


já velho e no abandono,
muitas vezes se viu batido e castigado

pela simples razão de acompanhar seu dono.

Como andava nojento e lhe caíra o pelo,

por fim o dono até sentia nojo ao vê-lo,

e mandava fechar-lhe a porta do salão.

Meteram-no depois num frio quarto escuro,

e davam-lhe a jantar um osso branco e duro,

cuja carne servira aos dentes doutro cão.

E ele era como um roto, ignóbil assassino,

condenado à enxovia, aos ferros, às galés:

se se punha a ganir, chorando o seu destino,

os criados brutais davam-lhe pontapés.

Corroera-lhe o corpo a negra lepra infame.

Quando exibia ao sol as podridões obscenas,

pousava-lhe no dorso o causticante enxame

das moscas das gangrenas.


29

Até que um dia, enfim, sentindo-se morrer,


disse: “Não morrerei ainda sem o ver;
a seus pés quero dar meu último gemido...”

E arrastando-se quase exausto, moribundo,

meteu-se-lhe no quarto, assim como um bandido,

e o artista ao entrar viu o rafeiro imundo,


e bradou com violência:
“Ainda por aqui o sórdido animal!

É preciso acabar com tanta impertinência,


que esta besta está podre, e vai cheirando mal!”

E, pousando-lhe a mão cariciosamente,

disse-lhe com um ar de muito bom amigo:

“Ó pobre Fiel, tão velho e tão doente,

ainda que te custe anda daí comigo”.

E partiram os dois. Tudo estava deserto;

a noite era sombria; o cais ficava perto;

e o velho condenado, o pobre lazarento,

cheio de imensas mágoas,

sentia junto de si como um pressentimento


o fundo soluçar monótono das águas.
30

Compreendeu enfim! Tinha chegado à beira


da corrente. E o pintor,
agarrando uma pedra atou-lha na coleira,

friamente, cantando uma canção de amor.

E o rafeiro sublime, impassível, sereno,

lançava o grande olhar às negras trevas mudas

com aquela amargura ideal do Nazareno

recebendo na face o ósculo de Judas.

Dizia para si: “É o mesmo, pouco importa.

Cumprir o seu desejo é esse o meu dever.

Foi ele que me abriu um dia a porta,

morrerei se lhe dou com isso algum prazer”.

Depois subitamente
o artista arremessou o cão na água fria.

E ao dar-lhe o pontapé caiu-lhe na corrente


o gorro que trazia.

Era uma saudosa, adorada lembrança


outrora concedida
pela mais caprichosa criança,
que amara, como se ama uma só vez na vida.
31

E ao recolher a casa ele exclamava irado:

“E por causa do cão perdi o meu tesouro!


Andava bem melhor se o tenho envenenado!
Maldito seja o cão! Dava montanhas de ouro,
dava a riqueza, a glória, a existência, o futuro,
para ver o precioso objeto,

doce recordação daquele amor tão puro”.


E deitou-se nervoso, alucinado, inquieto.
Não podia dormir.

Ao nascer da manhã o vívido clarão

sentiu bater à porta! Ergueu-se e foi abrir.

Recuou cheio de espanto: era Fiel, o cão

que voltava arquejante, exânime, encharcado,

a tremer e a uivar, no último estertor.

Caindo-lhe da boca, ao tombar fulminado,


o gorro do pintor!

(Guerra Junqueiro, A Musa em Férias, 10a. ed.,


pp. 151-159; Lello & Irmão – Editores; Porto).
IV. O Cão: Amigo do Homem e Símbolo da Fidelidade

1. Da amizade do cão para o homem, exaltada em prosa


e verso, deu Napoleão exemplo notável:

“Napoleão contava que após um de seus grandes


combates da Itália atravessava, em terceiro ou quarto lugar,
o campo de batalha, de onde ainda não tinham podido
recolher os mortos, dizendo:

Fazia um belo luar e era profunda a solidão da noite. De súbito


um cão, saindo debaixo das vestes de um cadáver, avançou para nós e
voltou quase em seguida para o seu abrigo, latindo dolorosamente; ele
ora lambia o rosto do dono, ora atirava-se para nós: era a um tempo
pedir socorro e procurar vingança.

Fosse a disposição do momento, continuava o Imperador, fosse


o lugar, a hora, a ocasião, fosse a própria cena ou não sei quê, o certo
é que nunca, em nenhum dos meus campos de batalha, cousa alguma
me causou semelhante impressão. Detive-me involuntariamente para
contemplar o espetáculo. Esse homem, dizia eu, talvez tenha amigos,
tem-nos talvez no acampamento, na sua companhia e aqui jaz
abandonado por todos, menos pelo seu cão! Que lição a natureza nos
dava por intermédio de um animal!” (Memórias de Santa Helena,
1941, pp. 135-136; trad. Olga de Garcia).

____________________
33

2. “(...) um cão que estava ali estendido ergueu a cabeça e as orelhas:


era Argos, o cão do sofredor Ulisses, que o próprio amo havia criado;
não tivera, porém, o prazer de estar com o dono, que partira logo
para a sagrada Troia. Os jovens o levavam para caçar cabras
selvagens, gamos e lebres; mas agora, posto de lado, jazia, enquanto o
amo estava ausente, sobre um monte de estrume de muares e de bois
que estava acumulado junto das portas a fim de que os criados de
Ulisses o levassem para adubar os campos. Lá jazia o cão Argos, todo
cheio de carrapatos; mas ele percebeu que Ulisses estava ali perto e,
não podendo ir até o dono, sacudiu a cauda e abaixou as duas
orelhas. E o herói enxugou furtivamente uma lágrima, tomando
cuidado para que Eumeu não o percebesse; e disse ao porqueiro:

— Eumeu, decerto é muito estranho um cão como este jazer sobre um


monte de estrume; tem um belo corpo. Mas não sei se, além da beleza,
tinha também agilidade na corrida ou era apenas um desses cães que
os homens criam por luxo e têm como se fossem seus comensais.

— Infelizmente — respondeu Eumeu —, este cão pertencia a um


homem que morreu distante. Se ainda fosse belo como o deixou
Ulisses quando partiu para Troia, tu ficarias maravilhado de ver
sua rapidez e sua força; nenhuma fera lhe escapava na espessa
floresta, pois era excelente no ataque e na perseguição. Agora as
doenças o consomem: o dono morreu longe da pátria e as indolentes
criadas não cuidam do cão. Os servos quando não mais recebem
ordens dos patrões, já não têm vontade de cumprir os seus deveres.
Zeus, que vê ao longe, tira metade do valor ao homem que se tornou
escravo.
34

Ditas essas palavras, entrou no belo palácio e foi diretamente


à sala onde se banqueteavam os soberbos pretendentes. Entrementes
Argos, logo que, depois de vinte anos, reviu Ulisses, foi arrebatado
pela negra morte” (Homero, Odisseia, 1960, pp. 284-285; trad.
G.D. Leoni; Atena Editora; São Paulo).

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3. “Por que ler este livro com o fito de aprender a fazer amigos? Por
que não estudar a técnica do maior conquistador de amigos que o
mundo já conheceu? Quem é ele? Você pode encontrá-lo amanhã
descendo a rua. Quando estiver a uma distância de dez pés ele
começará a sacudir a cauda. Se você parar e lhe fizer mimos, ele
saltará sobre você para demontrar que o estima. E você sabe que atrás
desta demonstração de afeto não existem motivos escusos: ele não
deseja vender prédios, nem casar-se com você.

Já se deteve alguma vez para pensar que o cachorro é o


único animal que não tem que trabalhar para viver? A galinha põe
ovos, a vaca fornece leite, o canário canta. Mas o cachorro vive
exclusivamente dando-lhe apenas amor.

Quando eu tinha cinco anos de idade, meu pai comprou um


cachorrinho de pelo amarelado por cinquenta centavos. Foi a luz e a
alegria da minha meninice. Todas as tardes, depois das 16h30, ele
costumava sentar-se na frente do pátio com os seus lindos olhos muito
atentos na estrada, e, logo que ouvia a minha voz ou me avistava
lavando o meu prato de jantar na torneira da barreira, partia como
uma bala, correndo esbaforidamente para a colina e saudando-me em
saltos de alegria e latidos do mais puro entusiasmo.
35

Tippy foi o meu companheiro certo durante cinco anos. E,


numa noite trágica — nunca me esquecerei dela —, um raio o matou
a dez passos de mim. A morte de Tippy foi a tragédia da minha
meninice.

Tippy, você nunca leu um livro de psicologia. Não necessitava


fazê-lo. Sabia, por algum instinto divino, que qualquer indivíduo pode
fazer mais amigos em dois meses, do que um outro em dois anos
procurando fazer as outras pessoas interessadas nele. Permita-me que
repita isso. Você pode fazer mais amigos em dois meses, interessando-se
pelas outras pessoas, do que em dois anos, tentando conseguir o
interesse dos outros sobre você” (Dale Carnegie, Como Fazer
Amigos e Influenciar Pessoas, 32a. ed., pp. 75-76; trad. Fernando
Tude de Souza; Companhia Editora Nacional; São Paulo).

____________________

4. “Finalmente, mais tarde, meu Rex — um caso especial, entre os


cachorros de minha infância e juventude.

Rex veio para casa com dois meses de idade, em 1930. Nessa
ocasião, eu estava com meus quinze anos.

Rex era um cão policial, pastor alemão, e se tornou campeão de


todas as exposições caninas, realizadas no Brasil. Era, em verdade,
um espécime notável de sua raça e teve uma carreira triunfal.

Penso nele com saudade. Era um cão alegre, extremamente


afetuoso, cheio de coragem e resolução. Apontado como sem defeito,
impunha-se, com seu vulto singular de lobo da Floresta Negra, com
sua capa preta e seu pelo de cobre fulvo, com orelhas eretas e postura
de vigilância.
36

Rex foi criado e educado por mim. Foi meu bom confidente,
meu companheiro de estudos, até meu quarto ano de faculdade. Foi
meu amigo certo, em minhas tristezas e alegrias.

Morreu em 1936, vítima de um envenenamento acidental.


Está enterrado entre hortênsias e roseiras, num recanto sossegado
da Fazenda Santo Antônio” (Goffredo Telles Junior, A Folha
Dobrada, 1999, p. 40; Editora Nova Fronteira; Rio de
Janeiro).

____________________

5. “Um dos meus amigos escolhidos era este cão, que eu tenho aos
pés. Todas as manhãs entrava ele na cadeia, quando se abriam as
portas, e saía espontaneamente ao toque da sineta. Nunca lá quis
pernoitar. Era o instinto do seu pulmão, que o levava a respirar de
noite o ar puro, e a voltar no dia seguinte, quando a atmosfera
circulava nos corredores infectos da cadeia” (Camilo Castelo
Branco, Memórias do Cárcere, 1927, vol. I, p. 72; Parceria
Antonio Maria Pereira – Livraria Editora; Lisboa).

____________________

6. “Não, senhores; não era a deusa do Olimpo; era uma cadela


chamada Minerva, nome este que até já anda pelos cães.

Hei de deter-me a falar nesta cadelinha nas três seguintes


páginas. Neste aviso, dou aos meus colegas romancistas um bom
exemplo. Todo escritor sincero deve prevenir o seu leitor das estafas,
que lhe estão iminentes. Aos aborrecidos de episódios caninos digo eu
que saltem as três páginas.
37

Quando, em 1855, foi preso Antônio José Coutinho, e


recolhido ao segredo da Relação (do Porto), a cadelinha, que tinha
então um ano, acompanhou-o, e deitou-se gemendo à porta do
segredo. Ali passou o primeiro dia e a primeira noite; porém, como o
preso devia estar tempo indefinido ali, o guarda, a pedido dele, levou
a cadela para casa de uma família, que lhe ministrava o alimento.

Depois de dezessete dias e dezesseis noites de cárcere


incomunicável, saiu Coutinho da caverna para um quarto de malta, e
pediu licença para ter consigo a cadela. O carcereiro era humano, e
permitiu que Minerva visitasse seu amo. Era ela da inteligentíssima
raça d’água, como se diz. Amestrada por alguém, saía todos os dias à
tenda e ao açougue onde lhe confiavam os alimentos para o dono.
Coutinho cuidava da sua amiga, como quem não tinha quem tanto
lhe quisesse. Dava-lhe o mais macio do seu magro colchão, metade do
seu jantar, aquecia-lhe à noite o caldo, e de três em três dias a
ensaboava em banho de água tépida, e lhe desenriçava os velos do
pelo.

Coutinho, como é de ver, tinha muitas horas de apertura


d’alma, em que rompia em gemidos, e lágrimas lhe saltavam.
Minerva contemplava-o naquela ansiedade, erguia-se até lhe assentar
as mãos no seio, recebia ganindo brandamente os carinhos, lambia-lhe
as lágrimas.

— Muitas noites — disse-me Antônio José Coutinho — me assentei


na cama em ânsias de morrer. A cadelinha despertava ao meu
menor movimento; chegava-se para mim; e eu, abraçando-me com
ela, sentia alívio, sentia uma companhia que me chorava: e acontecia
adormecer afagando-a.
38

Subia, uma manhã, a cadela com a alcofa dos provimentos


para seu dono; e, no ato em que tinha meio corpo a dentro do gradão
principal, o chaveiro, inimigo de cães, deu-lhe com a pesada chave na
cabeça. A pobrezinha, posto que aturdida da pancada, e contorcendo-
-se no chão, susteve a alcofa na presa, e ali ficou até que seu dono a
veio buscar.

Coutinho desceu ao gradão, tomou a cadela nos braços,


convulsiva de dores, e disse apenas com os olhos embaciados de
lágrimas:

— É muita crueldade!... Que mal faria ao senhor chaveiro


este inofensivo animal!?

— São ordens — respondeu o funcionário. — Esta casa é para


cristãos, não é para cães.

O preso agasalhou Minerva, lavou-lhe repetidas vezes a


contusão. A cadelinha, ao terceiro dia, manifestou nos olhos uns
pontos nublosos; e no fim de três semanas, estava inteiramente cega.

— Este infortúnio — disse-me Coutinho — cabia ainda nos


largos limites da desgraça que o destino me marcara. Faltava-me a
luz dos olhos da minha amiga, únicos que me viam chorar. Eu, às
vezes, apertava-a contra o meu peito com tanta angústia, que não lhe
sei dizer, nem isto lhe diria, se o não julgasse capaz de me desculpar o
coração, pela muita amizade que tem aos cães. Sentia-me redobrar
de afeição por ela, depois de cega, e ela por mim. Quando a via farejar-
-me de longe, corria logo a festejá-la, com medo que ela se magoasse em
busca de mim. Naquele tempo andavam obras de sobrado nestes
corredores; e eu, receando que ela caísse em algumas das aberturas,
39

levava-a ao colo, e ia pedir a alguma servente dos presos que ma


levasse à rua, duas vezes em cada dia. Estava cega; mas via-me chorar
pelos olhos do amor, ou adivinhava-me as lágrimas pelo soluçar da
respiração. E assim era que vinha a mim, e me trepava aos joelhos e
procurava a face, abrindo em vão as pálpebras. Cuidaria ela, e estará
talvez cuidando que o seu viver tenebroso de quatro anos é um sonho?
Esperará ver-me ainda?...

Quando me escassearam os pequenos recursos com que entrei


na cadeia, já faltava quem quisesse levar a cadelinha à rua; e tão
desvalido eu estava, que, até pelo fato de sustentar a cadela inútil, me
acusavam de tolo, e aconselhavam a mandá-la afogar.

Vi-me na dura precisão de pedir a uma compadecida família


de Cima-do-Muro que me deixasse ir a cadelinha para sua casa.
Aceitaram-ma e eu despedi-me dela às escondidas, para que me não
vissem beijá-la, e dizer-lhe as palavras, que eu julgava as últimas.
Como eu sofri as duas primeiras noites em que lhe não sentia o peso
no cobertor da minha cama!

Ao terceiro dia, Minerva, que pouco alimento aceitara, saiu da


casa de Cima-do-Muro, e veio ter sozinha à cadeia. Quando a vi
entrar no meu quarto cuidei que vinha alguém da família trazer-ma
a espairecer saudades. Ninguém vi; mas ainda assim, não acreditava
que viesse sozinha. Horas depois apareceu um criado da boa gente,
perguntando-me se a cadela estaria ali; e então soube que algumas
pessoas a viram passar na rua das Flores, e deram fé de sua cegueira,
a ponto de pedirem a outras que lhe não empecessem o caminho.
40

Mandei-a segunda e terceira vez para Cima-do-Muro; mas


nem lá comia, nem se afazia às festas da família. Afinal, os meus
companheiros e o caroável carcereiro me disseram, comovidos de
tamanha prova de amor, que a deixasse ficar, e lhe não fosse ingrato.

Aqui termina a exposição do senhor Coutinho, cortada a


intervalos por silêncios em que falavam as lágrimas” (Camilo
Castelo Branco, Memórias do Cárcere, 1927, vol. I, p. 77-78;
Parceria Antonio Maria Pereira – Livraria Editora; Lisboa).

____________________

7. “Dono morre e cão se muda para cemitério. O cachorro vira-


-lata Rambo é o mais novo hóspede do cemitério municipal de
Mamborê (482 km de Curitiba), no Paraná. Ele segue vivo, mas,
como um bom companheiro, passa horas ao lado de um dos túmulos,
o de seu antigo dono, morto há quatro meses. Devido à insistência em
permanecer no cemitério, o cachorro foi adotado pelo coveiro Sidinei
Ramos, que o alimenta todos os dias” (Agora, 5.10.2011).

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8. “Alguns cães possuem um olfato tão desenvolvido, que


reconhecem o cheiro característico do dono no meio duma multidão”
(Alexis Carrel, O Homem, esse Dersconhecido, 1a. ed., p. 268;
trad. Adolfo Casais Monteiro; Porto).
41

9. “A empatia do cão pelo homem. Teste mostra reação canina a


bocejo do dono.

Boceje perto de seu cão, e ele poderá fazer o mesmo. Embora


pareça simples, este comportamento contagioso é na verdade
admirável: somente os cães cruzam a barreira das espécies.

Um novo estudo revela que os cães bocejam mesmo quando


apenas ouvem o som do nosso bocejo, a evidência mais forte já
observada de que os cachorros são capazes de ter empatia conosco.

O bocejo contagioso também foi observado em babuínos-gelada,


macacos-urso e chimpanzés. Os humanos tendem a bocejar mais com
amigos e conhecidos, sugerindo que pegar o bocejo de alguém pode
estar ligado a sentimentos de empatia.

Da mesma maneira, alguns estudos revelaram que os cães


tendem a bocejar mais após ver pessoas familiares bocejando. Mas
não está claro se o comportamento canino está associado à empatia.

Para tirar a dúvida, cientistas da Universidade do Porto, em


Portugal, recrutaram 29 cães, todos com pelo menos seis meses de
convivência com seus donos. O estudo foi conduzido na casa onde
vivem os cachorros e na presença de uma pessoa conhecida, mas sem
nenhum contato visual com os donos.

A equipe, chefiada pela bióloga Karine Silva, gravou sons de


bocejos dos donos dos cães e de uma mulher não familiar e também
um som de controle artificial consistindo de um bocejo invertido
por computador. Para ajudar a induzir o bocejo natural, voluntários
ouviram com fones de ouvido um trecho de áudio de bocejos
previamente gravados.
42

Cada cão ouviu todos os sons em duas sessões realizadas com


um intervalo de sete dias. Durante as sessões, os pesquisadores
mediram o número de bocejos obtidos dos cães em resposta aos sons
de pessoas conhecidas e desconhecidas.

No estudo, 12 de 29 cães bocejaram durante o teste. Em média,


os caninos bocejaram com frequência cinco vezes maior quando
ouviram humanos conhecidos. Os resultados sugerem que cães têm
capacidade de sentir empatia com humanos, diz Karine.

As pessoas começaram a domesticar cães há 15 mil anos, e


desde então nós os criamos para realizar tarefas cada vez mais
complexas, de caçar a guiar cegos. Esse relacionamento estreito pode
ter promovido uma empatia entre espécies ao longo dos milênios.

Ádám Miklósi, um etologista da Universidade Eötvös Lorán


em Budapest, comenta: Usar comportamentos como indicadores só
mostrará alguma similaridade de comportanto, mas não nos dirá
se a empatia canina, seja lá o que isso for, é equivalente à empatia
humana.

Estudos anteriores mostram, por exemplo, que quando cães


parecem culpados, eles podem não estar realmente sentindo culpa”
(Sciencenow; trad. Celso Paciornik; in O Estado de S. Paulo,
13.5.2012, p. A23).

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43

10. “Ali pelos anos de l896 e 1897, havia em São Paulo um


boêmio conhecido e admirado por toda cidade. O escritor Veiga
Miranda, no livro Pássaros que Fogem, traçou-lhe magistralmente o
perfil. Era Cunegundes.

Todas as noites, depois do toque de silêncio na esplanada do


Carmo, ele atravessava vagarosamete o Largo do Rosário, parando
aqui e ali, farejando conhecidos nos grupos de rapazes. Quando não
chegava a encontrar alguém da sua amizade, entrava na Confeitaria
Castelões, atravessava por entre as mesas cheias de alegres bebedores, e
ia até o fundo. Nesse percurso, encontrava sempre algum amigo que o
saudava e gritava para o balcão:

— Garção, um chope e sanduíches para o Cunegundes!

Depois da visita à confeitaria, o boêmio descia a Ladeira de


São João e ia ao Politeama. Não pagava entrada. Não dava
satisfação aos porteiros. Lá dentro, na plateia vasta, movimentada e
alegre, aproximava-se ora de um ora de outro, sempre bem recebido e
festejado. Ali pela meia-noite terminava o espetáculo. Saía à frente
dos espectadores e ficava no passeio, diante da larga porta, a receber
cumprimentos de amigos. Quando a rua já estava deserta, ele,
aborrecido e sem sono, dirigia-se aos cafés-concerto dos bairros
elegantes. Era certo encontrá-lo no El Dorado. Em 1897, quando a
flor da boêmia paulistana fundou o cabaré do Sapo Morto,
Cunegundes foi inscrito, conta o citado cronista, como sócio fundador
e honorário.

Vivia de empadas. Distinguia, ao primeiro gole, as diversas


cervejas que disputavam o mercado. Os amigos tinham-no na conta
de glutão e frascário. E não gostava de cachorros. Só mesmo vendo
44

o ar de desprezo com que ele fitava um vira-lata, ou mesmo


um cachorro de certa importância. De madrugada os rapazes que
voltam para casa encontravam-no por aí, bêbado como um odre, a
implicar com os cocheiros, os guardas-noturnos e os varredores. A sua
noite acabava com um sururu na Rua Esperança.

Depois, eclipsava-se. Nunca ninguém soube onde norava. Isso


foi sempre um mistério. Outro dia, a propósito de não sei quê, Edgar
Leuenroth contou-me que o Cunegundes fora seu hóspede... Naquela
data, alguns rapazes mantinham um jornalzinho que se chamava
O Boi. Esse título não fora escolhido por eles. Nada mais fizeram do
que aproveitar um clichê que lhes viera à mão no acervo de velha e
desmantelada tipografia. Naturalmente, aquele título lembrava aos
paulistanos um famoso estudante, de tal alcunha, que pusera em
polvorosa a Pauliceia de 1840...

O fato é que a tipografia de O Boi estava instalada num


casebre da Rua Maria Domitila. Todas as manhãs, ao abrir a
porta, o Cunegundes entrava cambaleante, com a roupa dilacerada
pela última briga, e ia acomodar-se debaixo dos caixões de tipos,
onde dormia e roncava até tarde. Ao fechar a tipografia, à boca
da noite, ele acordava, dava compridos bocejos e, sem dizer muito
obrigado, raspava-se. Ia para a farra...

Ah! É verdade! Esquecia-me de explicar que Cunegundes não


era um homem, era um cachorro. Mas quando morreu, vítima
daquela vida desregrada, teve necrológio nos jornais e um soneto que,
durante meses, andou por aí, de mão em mão...” (Afonso Schmidt,
São Paulo de Meus Amores, 1954, pp. 57-60; Clube do Livro;
São Paulo).
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45

11. “A Marca do Zorro. Zorro, com sua máscara negra, entrou em


minha vida pela porta da simpatia.

Principiou a me acompanhar em caminhadas pela praia onde


corria atrás das gaivotas e procurava dirigir o rebanho das ondas.
Depois, nadava comigo e me esperava latindo e sacudindo o pelo
molhado.

Meio perdigueiro com pinta de dálmata, não pode ouvir


bombas ou tiros que avança. Instinto de caçador e de companheiro
leal.

Um dia em que eu voltava da praia, Zorro me acompanhou até


a porta da casa. Chamei minha mulher e fiz as apresentações.

Foi assim que passou a morar conosco e a dormir no pequeno


chalé de madeira que compramos para ele.

Pela manhã, abrimos a porta e saí para visitar conhecidos. É


uma longa peregrinação por portões e latas de lixo. Todos têm uma
guloseima para ele.

Nas temporadas é festejado pelas famílias de veranistas, e fora


delas, os moradores do Cibratel continuam a receber diariamente a
saudação de seu latido.

Ao meio-dia, costuma voltar para nossa casa. Fica sentado do


lado de fora esperando que alguém toque a campainha para avisar
sua chegada. À tarde, no calor, pede para sair e vai tomar banho de
mar. Suas corridas e seus mergulhos são o espetáculo da praia. Adora
partidas de futebol de onde às vezes sai com a bola na boca.
46

Quando o levamos a primeira vez ao veterinário, estava com


algumas mazelas de cachorro boêmio. Doutor João cuidou dele com
carinho. Quando minha mulher perguntou quanto devíamos pelo
trabalho respondeu:

— Não é nada. A senhora pega um cachorro na rua que está


doente, cuida dele e o traz aqui para uma consulta. Como poderia
cobrar alguma coisa? Deixo para cobrar de cachorrinho de madame.

A educação de Zorro faz lembrar o Rabicó, lulu cúmplice das


peraltices de minha meninice. Quando alguém que ia nos visitar
usava chapéu, Rabicó, atenciosamente o acompanhava até a porta da
rua. Caso contrário, não tomava conhecimento e se retirava para o
fundo do quintal.

Quando o Fred, o Cocker Spaniel de minha neta Mirella, vai


conosco para Itanhaém, volta sempre mais bem educado.

O exemplo de Zorro serve para animais e pessoas.

Ele é tão diferente que, todas as noites, a gata do vizinho desce


do muro para dormir em sua companhia.

Outro dia, fui saber de José Fazanella e a caseira anunciou:

— Seu José, o dono do Zorro está aí.

Com a chegada do verão, ouço no meio do barulho de trânsito


de São Paulo, um latido distante.

É meu amigo que me chama para uma corrida pela praia e


um mergulho na verdade do mar” (Paulo Bomfim, O Caminheiro,
2001, pp. 157-158; Editora Green Forest do Brasil; São Paulo).

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47

12. “Anstett, na sua História Natural Popular, narra o caso de


Gebert, cão favorito do Príncipe de Galles, ocorrido no princípio do
século XII. O príncipe tinha ido à caça sem o seu cão. Ao regressar,
ele lhe veio correndo ao encontro, rosnando de alegria, mas com o
focinho e o pescoço ensanguentados. O príncipe foi seguindo os
rastros de sangue que o levaram ao quarto onde havia deixado seu
filhinho a dormir, inocente, no berço. Chamou-o pelo nome. A
criança não respondeu. Uma dúvida atroz explodiu, fulminante
como raio, na sua alma sobressaltada. Gebert, o mastim predileto,
decerto lhe exterminara o filho! A prova se achava no sangue rubro,
quente, que lhe escorria do focinho! Imediato, ensandecido,
aproximou-se do cão e, sacando o punhal, mergulhou toda a lâmina
afiada no seu peito felpudo. Gebert, uivando tetricamente e fitando,
esgazeado, o dono enfurecido, expirou em rápidos segundos. Logo em
seguida a criança foi encontrada detrás do biombo, dormindo à
semelhança de um anjo, ao lado de um lobo preto, comprido, de
fauces hiantes, colmilhos agressivos, que o lebréu, numa luta
desigual, havia matado. O príncipe, surpreso pela dedicação
estupenda de Gebert, e, de modo simultâneo, arrependido, cheio de
dor por ter sido tão precipitado, injusto, mandou erigir-lhe vistoso
monumento. E fez mais: colocou no túmulo do fiel amigo a sua
trompa e o seu dardo, desejando desta maneira salientar que na arte
venatória ele fora um animal exímio, superamestrado.

Ah, se todos os seres tivessem a bravura e a lealdade de Gebert!


Se nenhum homem hesitasse em arriscar a própria existência em
benefício do próximo! Então não existiria tanto egoísmo, tanto
sofrimento. A guerra, essa megera famélica, fugiria aterrorizada da
face do planeta” (Fernando Jorge, Água da Fonte, 8a. ed., pp.
181-183; Novo Século Editora; Osasco, SP).
V. Nótulas e Curiosidades

1. “Cave canem. Cuidado com o cão. Inscrição frequente


à entrada das casas romanas” (Paulo Rónai, Não Perca o seu
Latim, l980, p. 40).

2. “Hominis gladium vivum. Espada viva do homem. Assim


chamou São Gregório Nazianzeno ao cão” (Arthur Rezende,
Frases e Curiosidades Latinas, 1955, p. 279; Rio de Janeiro).
49

3. Cão que ladra não morde. (Parafraseando o anexim,


escreveu Millôr Fernandes: Cão que ladra não morde...
enquanto ladra).

4. “No norte do Brasil chamam ao diabo: cão, cão do inferno”


(João Ribeiro, Curiosidades Verbais, 1a. ed., p. 33; Editora
Melhoramentos; São Paulo).

5. Adivinha:

— Por que o cão entra na igreja?


— Porque encontra a porta aberta.

6. Cão — “Peça da arma destinada a percutir, direta ou


indiretamente, a espoleta do cartucho” (Aloisio A.C. Barros
Pupin e José Carlos Gobbis Pagliuca, Armas, 2002, p 128;
Editora Juarez de Oliveira; São Paulo).
50

7. “Cortar a cauda ao cão. Alcibíades cortou a cauda a um


cão magnífico, que possuía, alegando que, enquanto os atenienses
falassem desse ato extraordinário, não pensariam em criticar a sua
conduta (Plutarco, Alcibíades, X)” (in Lello Universal, vol. I;
v. cauda).

8. “O cão é de todos os animais o mais fiel ao homem” (ib.;


v. cão) .

9. “Entre cão e lobo, ao lusco-fusco, ao anoitecer (por ser a hora


em que os cães já recolheram e os lobos ainda não começaram o seu
giro noturno)” (ib.).

10. “Tratar como um cão, tratar mal” (ib.).

11. “Levar vida de cão, passar trabalhos, sofrer privações” (ib.).

12. “Preso por ter cão e por não ter cão, ser censurado por
motivos opostos” (ib.).

13. Frase: “Isto não há cão nem gato que o não saiba”
(Francisco Ferreira dos Santos Azevedo, Dicionário Analógico
da Língua Portuguesa, p. 233).
51

14. “Preso por ter cão, preso por não ter cão — Significa este
adágio que quando se tem o propósito de perseguir ou condenar
alguém, quando a pena foi de antemão deliberada, qualquer motivo
que se invoque serve como justificativa. Foi o que, sem alusão a este
provérbio, demonstrou La Fontaine na fábula O Lobo e o Cordeiro.
O Conde d’Eu, marido da Princesa Isabel, escreveu, em carta à
Condessa de Barral, que os políticos brasileiros ora o condenavam por
se desinteressar dos negócios públicos, ora por se imiscuir neles. E dizia
ter sido preso por ter cão e por não ter cão...” (R. Magalhães Jr.,
Dicionário de Provérbios e Curiosidades, 1960, pp. 224-225;
Editora Cultrix; São Paulo).

15. “Barry” é o nome do célebre são-bernardo, “exemplar


(*)
de uma raça de grandes cães felpudos, originária dos Alpes suíços”.

Nasceu pelo ano de 1800, na fronteira da Suíça com a


Itália, no monastério de São Bernardo, de que proveio o
nome de sua raça.

Tornou-se muito conhecido por sua extraordinária


participação e emprego no resgate de pessoas perdidas nas
geleiras dos Alpes: atribuem-lhe o salvamento de para cima
de 40 pessoas.

(*) Cf. Pequeno Dicionário Brasileiro da Língua Portuguesa,11a. ed.; v. são-


-bernardo; Editora Civilização Brasileira; Rio de Janeiro.
52

Entre os casos mais notáveis de recuperação de vida


registra-se o de uma criança: jazia coberta de neve em local
inacessível às patrulhas de socorro organizadas pelos monges
de São Bernardo e, afinal, foi arrebatada por “Barry” dos
braços da morte.

Após haver escalado íngreme penedia, o singular cão,


lambendo-lhe o rosto, despertou a criança, já inconsciente
por efeito da hipotermia; ato contínuo, trasladou-a, agarrada
a seus pelos, para o pé dos monges, que a assistiram e
puseram a salvo.

A notícia deste fato assombroso correu mundo e foi


reproduzido em copiosos desenhos e cartões postais...

É voz também que, ao atravessar a cadeia dos Alpes, o


numeroso exército de Napoleão Bonaparte, graças aos
benfazejos são-bernardos, nenhuma baixa sofreu; pelo que,
os soldados do Imperador, em sinal de reconhecimento,
incumbiram-se de propagar entre as gentes a incomum
destreza e utilidade dessa raça canina.

Tendo alcançado a longevidade extrema dos de sua


espécie, morreu o incansável “Barry” em 1814, aos 14 anos de
idade, a cabeça coroada de louros.

Foi seu corpo conservado, pelo processo da taxidermia,


e acha-se exposto no Museu de História Natural de Berna
(Suíça).

A França num preito de reconhecimento e culto da


memória histórica, mandou-lhe erigir comovente estátua no
átrio do Cemitério de Animais, de Paris.
53

A “Fundação Barry”, que sobrevive de doações, é a que


mantém o canil da pousada do grande São Bernardo. O
macho de melhor linhagem que ali nasce, em cada geração,
recebe o nome emblemático de “Barry”, como a perpetuar o
lendário animal que, ao revés de certos indivíduos de
superior condição na escala zoológica, honrou sua espécie e
foi verdadeiramente útil à Humanidade.(*)

Corpo de “Barry”, o lendário cão são-bernardo


(Museu de História Natural de Berna, Suíça).

(*) Fonte desta nótula sobre o “cão herói”: http://www.seucachorro.com/barry


54

16. “O r latino era produzido pelas vibrações da ponta da língua,


assemelhando-se ao rosnar de um cão, razão pela qual os romanos o
chamaram de littera canina (Pérs. 1, 109-110): letra canina”
(Ernesto de Faria, Gramática da Língua Latina, 1995, p. 31;
Ministério da Educação e do Desporto).

17. “Em árabe a palavra cão é usada como insulto desde que, há
cerca de 1.350 anos, um cão latiu e alertou os inimigos de Maomé,
enquanto o fundador do islamismo se escondia deles numa caverna.
Ya, ibn kaib — Oh, filho do cão — é um desafio à luta, em árabe”
(Charles Berlitz, As Línguas do Mundo, 4a. ed., p. 66; trad.
Heloísa Gonçalves Barbosa; Editora Nova Fronteira; Rio de
Janeiro).

18. O cão de Giotto.“Na fachada do Campanil de Florença exarou


Giotto o seu último testamento de beleza. No mármore colorido da
famosa Torre esculpiu um cão a guardar um rebanho de ovelhas.

Dele mostrou Ruskin, certa ocasião, uma fotografia numa sala


de estudantes. Os estudantes deram vivas e o próprio Ruskin chorou”
(Moreira das Neves, Camilo tal qual, 1978, p. 108; Edições do
Tempo; Lisboa).
55

Eis o “Cão de Giotto” (1266-1336):


56

19. Zeus, o cão dos cães

(O Estado de S. Paulo, 16.9.2012, p. J7)


57

20. “O cão é o símbolo natural da fidelidade” (J.I.


Roquete, Dicionário dos Sinônimos; v. símbolo).

21. “O cão é o tipo da fidelidade” (Caldas Aulete,


Dicionário Contemporâneo; v. tipo).
VI. O Cão nos Provérbios

1. O cão velho, quando ladra dá conselho.

2. A cão mordido, todos chicoteiam.

3. À hora má não ladram cães.

4. Água e pão, comida de cão.

5. A cão fraco acodem as moscas.

6. Atrás do pobre anda um bicho e esse bicho é cão.

7. Ao derradeiro morde o cão.

8. Cães grandes nunca se mordem.

9. Cão bom nunca ladra em falso.

10. A mulher e o cão de caça, procurai-os pela praça.

11. Não acordes o cão quando ele está dormindo.

12. Os cães ladram, mas a caravana passa.

13. Preso por ter cão, preso por não o ter.

14. Pelo cão se respeita o dono.

15. Quando é velho o cão, se ladra é porque tem


razão.

16. Quem bate no cão, bate no dono.

17. Quem com cães se deita, com pulgas se levanta.

18. Quem não tem cão, caça com gato.

19. Tolo é o cão que rejeita o osso que lhe dão.

20. Segue sempre direito e deixa ladrar os cães.


59

21. Cachorro velho não ladra em vão.


(Apud Christovam Araujo, Os Bichos nos Provérbios, 1950;
pp. 32-38; Edição Ronega; Rio de Janeiro).

22. Aborrece-me como cão morto.

23. A grande cão, grande osso.

24. Cão, que muito lambe, tira sangue.

25. Mal ladra o cão, quando ladra de medo.

26. Casa, em que não há cão nem gato, é casa de velhaco.

27. Qual é o cão, tal é o dono.

28. Bole o rabo o cão, não por ti, senão pelo pão.

29. Ou para homem, ou para cão leva a tua espada na mão.

30. A cão mordido todos o mordem.

31. Nunca falta um cão, que vos ladre.


(Apud Bluteau, Vocabulário, 1712, t. V; v. cão).

32. Cão picado de cobra tem medo até de linguiça.

33. O melhor amigo do cão é o osso.

34. “Canis canem non est”. Cão não come cão; (est = edit).

35. Guarda-te de homem que não fala e de cão que não ladra.

36. “Canes timidi vehementius latrant, quam mordent”. Cães


medrosos mais ladram que mordem (apud Arthur
Rezende, Frases e Curiosidades Latinas, 1955, p. 74).

37. “Melior est canis vivus leone mortuo”. “Mais vale um cão vivo
do que um leão morto” (Bíblia Sagrada; Ecl 9,4; trad. Pe.
Antônio Pereira de Figueiredo).
60

38. “Una domus non alit duos canes”. Uma só casa não alimenta
dois cães (apud Paulo Rónai, Não Perca o seu Latim, 8a. ed.,
p. 176).

39. Cachorro só é amigo do homem porque não conhece


dinheiro.

40. “Dois cães ao mesmo osso raro estão de acordo” (Hall Caine, O
Filho Pródigo, 1926, p. 5; trad. Januário Leite; Lisboa).

41. Cachorro de muitos donos morre de fome.

42. “Roer os ossos fica bem só para cães” (Erasmo de Roterdã, “De
Pueris”, p. 144; trad. Luiz Feracine; Editora Escala; São
Paulo).

43. Frase proverbial: “Acordar o cão que está dormindo –


Inquietar, provocar alguém que está sossegado, podendo-
-nos daí advir algum mal” (cf. Caldas Aulete, Dicionário,
2a. ed.; v. acordar).
VII. O Cão: Passagens Literárias

Lido algures:

1. “Os cães preguiçosos cochilavam, conscientes de sua


inutilidade”.

2. “No silêncio da noite um cão pediu a palavra”.

3. “Feio, magro e valente como cachorro invasor”.

4. “O cão achega-se ao poste e marca o ponto”.

5. “Estar com cara de cachorro que quebrou o pote” (José Pérez,


Provérbios Brasileiros, 1961, p. 50; São Paulo).

6. “Doenças mentais caninas. Depois de profundos estudos, um


veterinário americano anunciou que muitos cães sofrem de doenças
mentais causadas pela convivência com os homens” (Folco Masucci,
O Livro que Diverte, 1953, p. 112; Edições Leia; São Paulo).

7. “É melhor ser atacado pela dúvida do que por um cão


hidrófobo” (Idem, ibidem, p. 243).

8. “O cão é um animal doméstico que leva o dono pela correia”


(Renato Taddei; apud Pitigrilli, Dicionário Antiloroteiro, 1956,
p. 32; trad. Marina Guaspari; Editora Vecchi; Rio de Janeiro).

9. “Cachorro não se engana. Ao organizar a cadeia de indícios


contra um réu, hesitei em incluir esta circunstância assinalada na
pronúncia: o crime ocorrera no sítio em que morava a vítima e o
cachorro desta não latiu. Limitei-me a acentuar: — Ora, o animal
conhecia o acusado; logo, quem entrou no sítio para matar a vítima
foi o acusado.
62

E pensei, cá comigo: os vizinhos não ficaram todo o tempo


registrando os latidos. E a falta destes poderia provir de outra causa.
O cão poderia ter saído... Desdenhei daquele procurador Cassignol, de
Anatole France, que, em idênticas circunstâncias, explicara: — O cão
não latiu contra o assassino porque o conhecia!

O réu foi condenado, e o jurado mais influente explicou-me, ao


despedir-se: Nós todos podemos nos enganar. Cachorro não se engana.
Foi o homem mesmo. E aprendi. O indício que eu considerava mais
fraco foi decisivo” (Roberto Lyra, Como Julgar, como Defender,
como Acusar, p. 154; Editora Científica Ltda.).

10. “O inglês Anthony Storr escreveu um estudo sobre o que ele


chama, tomando a expressão do próprio Churchill, o Cão Negro de
Winston Churchill. Sua tese, audaciosa e de certo modo inovadora,
consiste nesta surpreendente afirmação: a tendência maníaco-
-depressiva de Churchill levou-o a assumir a posição de liderança que
salvou o mundo do domínio nazista. Se compararmos essa tendência
com a outra, já aceita, da paranoia de Hitler, teremos de concluir que,
a certa altura, o mundo dependeu da agressividade dominadora de
um paranoico e da resistência que lhe opôs um maníaco-depressivo”
(Carlos Lacerda, O Cão Negro, 1971, p. 275; Editora Nova
Fronteira; Rio de Janeiro).

11. “A inteligênciados animais e das plantas. (...) Comecemos


pelo cão, que é um animal doméstico e amigo do homem.
63

Vai um homem por uma estrada acompanhado de um cão,


mas, em certa altura da jornada, o cão distancia-se e o homem segue
na frente, perdendo-o de vista. Logo adiante, a estrada bifurca-se e o
homem toma por um dos ramos da bifurcação. O cão não viu o
caminho tomado, mas, ao chegar à bifurcação, fareja um dos ramos
e, se pelo faro, reconhece que não foi por esse que o homem seguiu, já
não fareja o outro, segue por ele resolutamente. É evidente que essa
resolução do cão é o resultado de um raciocínio claro. Ele disse
consigo: — O meu amigo não foi por este caminho, logo seguiu pelo
outro. Isto é lógico.

O cão não é só inteligente, é esperto. Não há muito tempo que


os jornais europeus narraram o seguinte fato:

À porta de um convento, todas as tardes, a certa hora, chegava


um pobre e puxava o cordão da sineta. De uma das janelas
gradeadas descia, pouco depois, uma pequena cesta. Era o jantar do
pobre, que ele comia, fazendo soar de novo a sineta para que
suspendessem a cesta. Pois bem, um cão vagabundo notou este fato
habitual e um belo dia, pouco antes da chegada do mendigo,
ergueu-se nas patas e com os dentes puxou o cordão da sineta. Algum
tempo após, desceu a cesta e ele depois de devorar rapidamente o
jantar, fez como fazia o pobre, tornou a puxar o cordão da sineta
para que suspendessem a cesta!...

Seria por simples imitação que ele tornou a puxar o cordão da


sineta? Não, foi para completar a ilusão dos frades e garantir o
jantar do dia seguinte.
64

Os cães sabem contar. Quereis a prova? Não há quem ignore


que, nas pequenas povoações do interior do Brasil, as reses para o
consumo da população não são abatidas diariamente como nas
grandes cidades, mas em determinados dias da semana, geralmente
às terças, às quintas e aos sábados. Pois bem, nesses dias e somente
nesses, os cães das proximidades afluem aos povoados para a carniça,
indo na terça ao povoado A, na quinta ao povoado B e no sábado ao
povoado C, sem se enganarem jamais. É pois evidente que eles sabem
contar.

Da perspicácia e alta inteligência dos cães, eu poderia citar mil


exemplos, mas quero generalizar, lembrando apenas as provas que
diariamente exibem os cães de pastor, os cães de caça, os cães de
guarda, os cães policiais, os cães contrabandistas, os cães aduaneiros,
os cães de guerra e esse admirável cão de São Bernardo, que é a
providência dos viajantes perdidos na neve das montanhas” (Garcia
Redondo, Conferências, 1910, pp. 123-125; Livraria Chardron;
Porto).

12. “Partiu pois Tobias, e um cão o seguiu, e ficou na primeira


pousada ao pé do rio Tigre” (Bíblia Sagrada; Tob 6,l; trad.
Antônio Pereira de Figueiredo).

13. “Nolite dare sanctum canibus”. Não deis aos cães o que
é santo (Mt 7,6).

14. “Nam cum canes funguntur officiis luporum, cuinam


praesidio pecuaria credemus?”. Se os cães fazem o ofício dos
lobos, a que guardião confiaremos os rebanhos? (Retórica a
Herênio; apud Tassilo Orpheu Spalding, Pequeno Dicionário
Jurídico de Citações Latinas, 1971, p. 81; Edição Saraiva; São
Paulo).
65

15. “(...) exemplar de um tipo de cetáceos, chamado dugongo, pois


as narinas abriam-se na parte superior do focinho. O enorme bicho
arremessara-se sobre o cão, que em vão tentou fugir para a margem.
O dono, naquele caso, nada podia fazer para salvá-lo e antes que
algum dos homens se lembrasse de armar o arco, Top já havia
desaparecido debaixo das águas, agarrado pelo dugongo. Nab, que
tinha na mão um pau ferrado, quis lançar-se ao lago para salvar o
cão.

— Não — disse o engenheiro, segurando o seu valente criado.

No entanto, debaixo da água travava-se luta inexplicável


porque naquelas condições Top não podia resistir. Todos esperavam a
morte do cão! Mas, subitamente, num círculo de espuma, reapareceu
Top. Lançado ao ar por uma força desconhecida, subiu três metros
acima da superfície do lago e tornou a cair no meio das águas
profundamente agitadas. Dentro em pouco voltou para a margem,
sem nenhum ferimento importante.

Ciro e os companheiros viram tudo, mas sem compreender. E o


que parecia mais inexplicável ainda era que a luta parecia continuar
debaixo das águas do lago. Com certeza, o dugongo emergiu de uma
onda escarlate e veio parar numa praiazinha junto do ângulo azul
do lago. Os colonos correram todos para lá. O animal já estava
morto. Era enorme. Devia medir quatro metros e meio de
comprimento e pesar cento e quarenta quilos. No pescoço, via-se
grande ferida, que parecia ter sido feita com instrumento cortante.
66

Que anfíbio teria conseguido, com tão terrível golpe, destruir


o formidável dugongo? Ninguém sabia responder” (Júlio Verne, A
Ilha Misteriosa, 1972, pp. 105-106; trad. Elisabete Gonçalves
Fernandes; Hemus; São Paulo).

16. “Chamava-se Netuno o terra-nova de Camilo: era uma


estampa soberba, um cão musculoso, forte e dedicado como todos de
sua raça. Lembro-me muito bem de o ver seguindo Camilo em
passeio pelas ruas do Porto. (...) Foi assim, de capa espanhola, com o
terra-nova aos pés,, que eu o ouvi discursar no tablado de um quintal
da rua Chã, do Porto, num comício eleitoral que patrocinava a
candidatura de Custódio José Vieira em oposição ao industrial
Joaquim Ribeiro de Faria Guimarães. Creio que foi esta a única vez
que Camilo Castelo Branco falou em público” (Alberto Pimentel,
O Romance do Romancista, 1890, pp. 218-220; Lisboa).

17. Nas Memórias do Cárcere (pág. XXXIII) há uma recordação


relativa ao terra-nova:

“Ao fundo de uma colina, sobre a qual assenta a casa de Vieira


de Castro, serpenteia uma ribeira de claras águas, que vão ajuntar-se
ao Ave. As margens penhascosas deste córrego eram o nosso passeio de
forçada predileção, que não tínhamos outro. Conosco ia Netuno, o cão
da Terra Nova, que eu dera ao meu amigo, como quem lhe dava um
dos raros seres da criação por quem mais sentidos afetos tenho
experimentado. Netuno brincava na corrente do ribeiro, e assim nos
dava horas de passatempo, quais o gênero humano não poderia
dar-nos mais divertidas de entorpecidos prazeres”.
67

O terra-nova não ficou em poder de Vieira de Castro. Diz


Camilo noutro relanço das Memórias do Cárcere:

“Um dos meus amigos escolhidos era este cão, que eu tenho aos
pés. Todas as manhãs entrava na cadeia, quando se abriam as
portas, e saía espontaneamente ao toque da sineta. Nunca lá quis
pernoitar. Era o instinto de seu pulmão, que o levava a respirar de
noite o ar puro, e a voltar no dia seguinte, quando a atmosfera
circulava nos corredores infectos da cadeia”.

Netuno ainda existia, muito velho e quebrantado, quando


Camilo residia na rua do Almada, no Porto:

O Jornal do Commercio publicou ultimamente (agosto de


1890) e o Portuguez transcreveu a seguinte notícia relativa ao
terra-nova. Não sei até onde possa garantir-se a sua autenticidade;
eu, pelo menos, desconhecia o fato.

“Em 1862, tinha Camilo Castelo Branco um cão da Terra


Nova; mansíssimo, do tamanho quase dum jumento, e que era o
enlevo e a atenção de quantos o viam, e pelo qual Alexandre
Herculano também ficou encantado.

Herculano em todas as conversas com Camilo espraiava-se em


elogios ao soberbo animal.

Camilo percebia perfeitamente que o grande historiador estava


dominado por um ardentíssimo desejo de possuir aquele gentilíssimo
animal.

Herculano não queria por modo algum privar Camilo daquele


seu companheiro, ao qual mostrava tanta afeição. Mas Camilo tanto
e tanto instou que Herculano aceitou o cão, e com ele se dirigiu para
Lisboa.
68

Ignoro quantos dias, semanas ou meses mediaram até que o


nosso Camilo escreveu uma carta a Herculano com o fim de pedir a
D. Pedro V para ele, Camilo, não sei o quê.

O que, porém, sei, é que Herculano azuou com o pedido,


respondeu de pronto a Camilo — numa carta seca e sem refolhos — que
jamais pediria fosse a quem fosse na casa real coisa alguma, quer para
si, quer para outrem.

Camilo tomou uma tal resposta muito a sério, e passados


alguns dias, ei-lo em Lisboa, e na manhã seguinte, ei-lo ainda bem
cedo em direção ao palácio da Ajuda.

E Camilo pouco depois a ver o cão, que seu fora, no parapeito


duma janela. O cão também vê Camilo, e entra logo o animal a fazer
todas as diligências para ir para o seu antigo dono.

E Camilo a passear para a direita e para a esquerda, para que


o cão não perca a vista dele.

O cão, porém, está numa fona, ladra, pula, quer com as patas
abrir a porta, mas nada consegue.

Eis porém a vendedeira de leite que aparece; e mal se abre a


porta o cão foge, e acompanha seu dono em direção a Lisboa, e depois
ao Porto” (Alberto Pimentel, O Romance do Romancista, 1890,
pp. 218-219; Lisboa).
69

18. “O Nero, o Navarro e o Black foram os últimos cães de


Camilo. Com eles saíra, ao sol de uma tarde de julho, a espairecer.
Em dado momento, o Nero, travando luta com um suíno à solta,
arrancou-lhe o rabo. A dona, que surgiu alvoroçada com os
grunhidos do animal, invectivou grosseiramente o romancista,
dizendo-lhe que tinha de pagar o porco com língua de palmo. Logo
Camilo, numa gargalhada:

— Sim, senhora: eu levo-lhe o porco e mando-lhe a língua”


(Moreira das Neves, Camilo tal qual, 1978, pp. 109-110;
Edições do Templo; Lisboa).

19. “Rubião achou um rival no coração de Quincas Borba, um cão,


um bonito cão, meio tamanho, pelo cor de chumbo, malhado de preto.
Quincas Borba levava-o para toda parte, dormiam no mesmo quarto.
De manhã, era o cão que acordava o senhor, trepando ao leito, onde
trocavam as primeiras saudações. Uma das extravagâncias do dono
foi dar-lhe o seu próprio nome; mas, explicava-o por dous bons
motivos, um doutrinário, outro particular” (Machado de Assis,
Quincas Borba, cap. V).
70

20. “(...) é fácil entender a paixão da infeliz Maria Stuart por um


pequeno spaniel, que foi seu companheiro de prisão. Levou-o consigo,
escondido sob suas vestes, para o patíbulo; quando o carrasco a
decapitou, o pequenino animal surgiu em meio àqueles trajes
ensanguentados, tomado de horror, defendendo furiosamente o
cadáver de sua dona, fazendo empalidecer seus algozes” (Piero
Scanziani, Cães, 1986, p. 14; Editora Rio Gráfica Ltda.; Rio
de Janeiro).

21. “Assim um furor o tomou, uma tarde, avistando, no


regaço de Eva, um cachorrinho mole e trôpego, que ela, com carinho e
paciência, ensinava a sugar numa febra(*) de carne fresca. À beira
da fonte descobrira o cachorrinho perdido e ganindo; e muito
mansamente o recolhera, o aquecera, o alimentara, com uma sensação
que lhe era doce, e lhe abria na espessa boca, ainda mal sabedora de
sorrir, um sorriso de maternidade. Nosso Pai venerável (Adão), com
as pupilas a reluzir, atira a garra, quer devorar o cachorro que
entrara na sua toca. Mas Eva defende o animal pequenino que treme
e que a lambe. O primeiro sentimento de Caridade, informe como a
primeira flor que brotou dos limos, aparece na terra! E, com as curtas
e roucas vozes que eram o falar de nossos Pais, Eva tenta talvez
afiançar que será útil, na caverna do homem, a amizade dum bicho...
Adão puxa o beiço trombudo. Depois, em silêncio, mansamente, corre
os dedos pelo lombo macio do cachorrinho encolhido. E este é, na
História, um momento espantoso! Eis que o Homem domestica o
Animal! Desse cachorro agasalhado no Paraíso nascerá o cão amigo,
por ele a aliança com o cavalo, depois o domínio sobre a ovelha.

(*) “fibra; ligamento, músculo; nervo (...). A carne limpa de gordura e de osso, e que é
comestível” (Caldas Aulete, Dicionário, 2a. ed.; v. febra).
71

O rebanho crescerá; o pastor o levará; o cão fiel o guardará. Eva, da


beira do seu lume, prepara os povos errantes que pastoreiam os gados”
(Eça de Queiroz, Dicionário de Milagres, 1980, pp. 310-311;
Lello & Irmão – Editores; Porto).

22. “O cão sabe ser amigo. O homem pode não valer grande coisa.
Mas se ele sabe dar valor ao seu cão – mesmo com as deficiências e
limitações da amizade do homem – ele encontra no seu cão uma
fidelidade canina. Que tolera e perdoa os defeitos humanos, esquece
muito pontapé intempestivo do seu dono, e retribui com juros altos os
relativos bens que recebe. Ninguém como o cão sabe agradecer uma
simples lata de comida, geralmente restos da mesa. Ninguém, na sua
frente, ataca o seu dono. O cão se transforma. Parece um homem
enfurecido. Vira bicho. E bota para correr o assaltante” (Orígenes
Lessa, Confissões de um Vira-Lata, 4a. ed., p. 52; Edições de
Ouro).

23. “Aí está a distância imensa que separa a ideia da imagem, a


inteligência dos sentidos, o homem do animal. O cão do relojoeiro
poderá acumular inúmeras imagens visuais e auditivas do relógio e de
todas as suas peças; nunca, porém, saberá o que é um relógio; o que
lhe constitui a razão de ser escapará sempre ao alcance de seus
conhecimentos restritos aos fenômenos da sensibilidade. Por isto, a
ciência, filha da inteligência e da ideia, é um apanágio do homem”
(Pe. Leonel Franca, O Problema de Deus, 2a. ed., p. 72; Livraria
Agir Editora; Rio de Janeiro).
72

24. “Formas elementares do divino, inclusive são observáveis na


vida animal, no cão que morre de fome junto ao túmulo do dono, ou
nas aves que se revezam para alimentar um membro cego do bando”
(Hélio Jaguaribe, Transcendência, 1993, p. 220; Topbooks
Editora; Rio de Janeiro).

25. É proibida a entrada de cães. “Uma norma é a sua


interpretação”, escreveu com letras de fogo o profundo Miguel
Reale1.

Ora, “interpretar, no sentido jurídico”, ensinou Vicente de


Azevedo, “é procurar o pensamento contido na lei, a significação das
palavras, o alcance do texto, a explicação da frase. Interpretar é
descobrir a vontade da lei” (2).

Portanto, a fim de que se não amortalhe o bom-senso,


atributo principal de quem a deve aplicar, há de interpretar-se
a lei com rigor de lógica.

Para ilustrar o ponto, Luís Recaséns Siches aduziu o


seguinte exemplo(3):

Numa estação ferroviária, na Polônia, uma tabuleta


advertia aos transeuntes: É proibida a entrada de cães.

Interpretado à letra o aviso, podia ali entrar o urso, o


boi, o cavalo, enfim toda espécie de animais, exceto o cão.

(1) Filosofia do Direito, 5a. ed., nº 214.

(2) Apostilas de Direito Judiciário Penal, 1952, vol. I, p. 56.

(3) Nova Filosofia de Interpretação do Direito, 1975, p. 165; México.


73

A dar-se o caso que um cego, acompanhado de seu cão-


-guia, pretendesse galgar as escadas da plataforma, estariam
ambos impedidos de fazê-lo: um, por ser cão; outro, porque,
sem a luz dos olhos e a companhia de seu destro e fiel amigo,
ficava impossibilitado de locomover-se com desembaraço.

Em suma, nisto de interpretação de regra jurídica,


ordem escrita ou passagem literária, será força atender
sempre ao espírito da lei, ou vero sentido da frase, como o
aconselhava a parêmia sublime do Apóstolo: A letra mata, o
espírito porém vivifica(4).

26. Enquanto admirava tudo aquilo, quase fraturei as


pernas, ao cair para trás. Foi o caso que, à esquerda da
entrada, a breve trecho da guarita do porteiro, avistei, pintado
na parede e preso por uma corrente, um canzarrão; por cima,
em letras capitulares, a advertência: Cuidado com o cão!
(Petrônio, Satíricon, cap. XXIX).

27. Guarda compartilhada de animais de estimação. O Tribunal


de Justiça do Estado de São Paulo, por decisão a mais de um
respeito notável, deferiu, num caso de separação judicial,
antecipação de tutela e atribuiu aos cônjuges a guarda comum
de certo cão.

Conforme cláusula decisória, “Rody” — este, o nome do


animal do litígio — permanecerá, em semanas alternadas, na
posse de cada um de seus donos.

(4) “Littera enim occidit, spiritus autem vivificat” (II Cor. 3,6).
74

“O animal em disputa pelas partes” — exarou o douto


relator do acórdão — “não pode ser considerado como coisa, objeto
de partilha, e ser relegado a uma decisão que divide entre as partes o
patrimônio comum. Como senciente”, afastado da primitiva
convivência, “deve merecer igual e adequada consideração”.

A solução alvitrada, sobre acolher, com raro aviso, a


pretensão da agravante, ressalvando-lhe os direitos e
interesses, tomou ainda na justa conta os do próprio cão.
Atendeu, em suma, ao preceito da Constituição Federal que
veda as práticas que “submetam os animais a crueldade” (art. 225,
§ 1º, nª VII).

Puseram selo ao interessante julgado as palavras do


benemérito Alberto Schweitzer: “Quando o homem aprender a
respeitar até o menor ser da Criação, animal ou vegetal, ninguém
precisará ensiná-lo a amar seu semelhante”. (TJSP; AI nº 2117890-
04.2015.8.26.0000-SP; 10a. Câm. de Direito Privado; rel.
Carlos Alberto Garbi; j. 28.7.2015).

28 “O cão destemeroso, afeito a dependurar-se no focinho dos


barbatões ferozes (5), tinha o rabo entre as pernas, pegado na barriga”
(José Américo de Almeida, A Bagaceira, 13a. ed., p. 16; Livraria
José Olympio Editora).

29. “O mais desgraçado dos homens é o que não tem sequer por si
o olhar compadecido de um cão” (Napoleão Mendes de Almeida,
Dicionário de Questões Vernáculas, 1981, p. 296; Editora
Caminho Suave Ltda.).
________________________
(5) Barbatão – (Bras.) Rês que, criando-se nos matos, se tornou bravia (cf.
Pequeno Dicionário Brasileiro da Língua Portuguesa, 11a. ed.; v. barbatão; Editora
Civilização Brasileira; Rio de Janeiro).
75

30. “E quando, unicamente por causa da diversidade de línguas, os


homens não podem comunicar uns aos outros o que pensam, de nada
serve para associá-los a mais pura semelhança de natureza. Tanto
assim, que em tal caso o homem está melhor em companhia de seu
próprio cão que de homem estranho” (Santo Agostinho, Cidade de
Deus, 1989, 2a. Parte, p. 389; trad. Oscar Paes Leme; Editora
Vozes).

31. “(...), ao passar, hoje, por uma pequena vivenda rústica,


perguntei a um risonho e varonil ancião, que se encontrava na
varanda, abraçado à mulher, soltando densas baforadas do seu
comprido cachimbo bávaro:

— O senhor conhece, por acaso, a Felicidade?


— Se conheço a Felicidade? Pois se ela é minha! Quer uma
prova?
— Sim.
— Felicidade, ó Felicidade!
Uma bela cadelinha de raça, de pelos encaracolados, apareceu
veloz, correndo” (Fernando Jorge, Água da Fonte, 8a. ed., p. 113;
Novo Século Editora; Osasco, SP).

32. “Se eu tivesse medo, comprava um cão” (José Feliciano de


Castilho, Questões do Dia, nº 2, p. 12).
76

33. “De súbito, surgiu no pátio, de um corredor escuro, um cão. Um


cão trivial e sorna, qua arrastava atrás de si uma velha lata vazia, de
marmelada, amarrada por mão gaiata à sua cauda” (Léo Vaz, O
Professor Jeremias, 1949, p. 219; Edição Saraiva, São Paulo).
77

34. “É interessante como as pessoas se ligam em metáforas. Vi em


algum lugar que só nós humanos podemos entendê-las. Não sei não...
dizem que os cães não têm imaginação, mas é muito interessante ver-
se um cachorro brincando com uma bolinha de borracha. Se ele não
soubesse o imaginário objeto, provavelmente destruiria aquela coisa.
Espantalhos afastam os pássaros... Blimunda e Baltazar têm para
mim um encanto todo especial. Significam aquela mística ligação
entre casal que vive junto há bastante tempo, assemelhando-se então,
não só fisicamente, mas nos trejeitos e comportamento em geral.
Aliás, isso não vale somente para os homens, eu percorria um parque
em que um visitante aleijado puxava cachorrinho que fingia mancar
da pata traseira esquerda, à maneira do dono” (Paulo Sérgio Leite
Fernandes, Fabulações de um Velho Criminalista, 2011, p. 42;
Letras do Pensamento Editora Ltda.; São Paulo).

VIII. Cães e seus Donos Famosos

1. “Argos”, de Ulisses:

“Estas eram as palavras que trocavam. No entanto, um cão


que estava ali estendido ergueu a cabeça e as orelhas: era Argos, o cão
do sofredor Ulisses, que o próprio amo havia criado; não tivera,
porém, o prazer de estar com o dono, que partira logo para a sagrada
Troia” (Homero, Odisseia, 1960, liv. XVII, p. 284; trad. G.D.
Leoni; Atena Editora; São Paulo).
78

2. “Quincas Borba” – Nome do cão da personagem


homônima do célebre romance de Machado de Assis: Quincas
Borba (cap. V).

3. “Baleia”, de Fabiano e sinhá Vitória, personagens de


Vidas Secas, de Graciliano Ramos:

“O menino mais velho e a cachorra Baleia iam atrás”


(Graciliano Ramos, Vidas Secas, 56a. ed., p. 9; Record; Rio de
Janeiro).

4. “Rex”, de Goffredo Telles Junior, professor emérito da


Universidade de São Paulo:

“Tínhamos nossos cachorros. A princípio só eram dois: o


Maxixe e o Malandro. Depois, vieram os outros: Togo, Violeta, Jiki,
Gritsko. Finalmente, mais tarde meu Rex — um caso especial, entre
os cachorros de minha infância e juventude” (Goffredo Telles
Junior, A Folha Dobrada, 1999, p. 40; Editora Nova Fronteira;
Rio de Janeiro).

5. “Tobby”, de Salomão Ésper:

“Jornalista, advogado graduado pela Faculdade de Direito do


Largo de São de Francisco, em São Paulo, ama e produz poemas,
sonetos e poesias. É viúvo, pai de três filhos e avô de três netos, vive
em confortável residência no bairro da Aclimação, em São Paulo,
juntamente com a funcionária Nelci e seu cachorro Tobby, um maltês
que faz a alegria da família” (Pedro Paulo Filho, Adeus,
Tribunais!, 2011, p. 343; Editora Mizuno; Leme, SP).
79

6. “Top”, de Ciro Smith, personagem de A Ilha Misteriosa,


de Júlio Verne:

“Era realmente Top, magnífico anglo-normando que tinha das duas


raças cruzadas a rapidez e o bom olfato. Era o cão do engenheiro Ciro
Smith” (Júlio Verne, A Ilha Misteriosa, 1972, p. 50; trad.
Elisabete Gonçalves Fernandes; Hemus; São Paulo).

7. “Netuno” , de Camilo Castelo Branco:

“Chamava-se Netuno o terra-nova de Camilo: era uma


estampa soberba, um cão musculoso, forte como todos os da sua
raça” (Alberto Pimentel, O Romance do Romancista, 1890,
pp. 218-219; Lisboa).

“(...) cães extraordinários. Tinha-os vivos e de fôlego, e alguns


com nomes que ficaram nos seus livros e nas suas cartas. Eram o
Tigre, o Navarro, o Nero, o Black e o Martírio, seu incomparável
confidente de sete anos” (Moreira das Neves, Camilo tal qual,
1978, p. 108; Edições do Templo; Lisboa).

8. “Tigre”, de Alexandre Herculano:

“Camilo Castelo Branco deu ao autor da História de Portugal


um cão dos Alpes, legítimo. Chamava-se Tigre, e era formoso e
soberbo animal” (Bulhão Pato, Memórias, 1894, t. II, p. 208;
Tipografia da Academia Real das Ciências; Lisboa).
80

9. “Éolo”, nome do cão do eminente jurista cearense


Clóvis Beviláqua (1859–1944):

“Não houve em casa de Clóvis uma festa de aniversário do cão


Éolo? Sim. O cachorro era muito estimado. Morreu e foi enterrado no
quintal da Rua Aristides Lobo, 209” (Carlos Xavier Paes
Barreto, Clóvis Beviláqua e suas Atividades, 1960, p. 215;
Editora Aurora; Rio de Janeiro).

10. “Buck”, do Juiz Miller, personagem de As Vozes da


Floresta, de Jack London:

“Mas Buck não era cão caseiro, nem de canil. Todo aquele reino
lhe pertencia. Mergulhava no tanque de natação ou saía para caçar
com os filhos do Juiz; escoltava Mollie e Alice, filhas do Juiz, em
longos passeios à hora do crepúsculo ou de manhã cedo; nas noites de
inverno, deixava-se ficar aos pés do Juiz, diante do fogo crepitante da
lareira da biblioteca; carregava nas costas os netinhos do Juiz, ou
rolava com eles pela grama, e vigiava seus passos em arriscadas
aventuras junto à fonte, no terreno do estábulo e mesmo mais além,
onde se encontravam os haras e os canteiros de morangos” (Jack
London, As Vozes da Floresta, 1986, pp. 9-10; trad. Luiz
Roberto de Godoi Vidal; Clube do Livro; São Paulo).

11. “Joli”, cãozinho de João Nariz, personagem de O


Garimpeiro do Rio das Garças, de Monteiro Lobato:

“Joli sem demora percebeu que o diamante estava oculto sob o chapéu
de um dos bandidos. Ergueu-o com os dentes, e João Nariz,
deslumbrado, viu no chão o seu tesouro maravilhoso” (Monteiro
Lobato, O Garimpeiro do Rio das Garças, 1925, p. 36; Editora
Monteiro Lobato; São Paulo).
81

12. “Tilô”, cão do livro O Pássaro Azul, de Maurice


Maeterlinck:

“E esse aqui é Tilô. Bom dia, Tilô, bom dia! Ah, você brigou
um bocado na floresta, hein?” (Maurice Maeterlinck, O Pássaro
Azul, 1962, p. 239; trad. Carlos Drummond de Andrade;
Editora Delta; Rio de Janeiro).

13. “Toy”, cachorro “pointer” inglês do “Vovô Triste”,


personagem da crônica “Um cão, outro cão”, de Carlos
Drummond de Andrade:

“O senhor achou, o senhor viu em algum lugar o meu Toy?


Diga logo, estou tão ansioso!” (Carlos Drummond de Andrade,
Boca de Luar, 1984, p. 43; Círculo do Livro; São Paulo).

14. “Zorro”, nome do cão de Paulo Bomfim (“Príncipe dos


Poetas Brasileiros”):

“Zorro, com sua máscara negra, entrou em minha vida pela


porta da simpatia.

Principiou a me acompanhar em caminhadas pela praia onde


corria atrás de gaivotas e procurava dirigir o rebanho das ondas.
Depois nadava comigo e me esperava latindo e sacudindo o pelo
molhado” (Paulo Bomfim, O Caminheiro, 2001, p. 157; Editora
Green Forest do Brasil; São Paulo).
82

15. “Jo-Fi”, de Freud.

Era esse o nome do cão que o “pai da psicanálise”


mantinha em seu consultório, para benefício próprio e
gáudio dos pacientes.

Mercê dos atributos da imparcialidade, retidão e


discernimento — de que parece o dotara a natureza —, era
tido o animal na conta de verdadeiro árbitro, ou juiz.

Fazendo as vezes de sineta ou bedel escolar, era “Jo-Fi”


quem avisava o psicanalista que a sessão já chegara ao termo:
levantava-se do lugar onde jazia — sempre junto do paciente
— e, todo solícito e garboso, tomava para a porta da saída,
com meneios de quem se despede da visita.

Como a alma sensitiva do cão sabia calcular, com tanta


presteza e exatidão, o tempo das sessões, é ponto que talvez
nem Freud explique!

(Fonte da notícia: O Livro dos Cães, p. 15; Editora


Abril).

“Jo-Fi”, o obsequioso cão de Freud


83

16. “Rin Tin Tin”.

O mais famoso entre os cães policiais de que há


memória, nasceu “Rin Tin Tin” na França.

Após ter vivido nas garras da miséria, abandonado e


obscuro, adotou-o um cabo do Exército norte-americano,
que o levou para Los Angeles.

Pelo ano de 1922, atropelado pela roda da fortuna,


“tornou-se a maior estrela da Warner Bros”.

Em 10 anos, foi o protagonista de 26 filmes.

E, o que é mais: em seu carro de triunfo, reservou lugar


para a própria companhia cinematográfica, salvando-a de
falência iminente.

(Fonte da notícia: Ibidem, p. 18).


84

17. “Urian”, do cardeal Wolsey.

No século XVI, o cardeal Wolsey foi a Roma para


impetrar à Santa Sé a anulação do casamento do rei Henrique
VIII, da Inglaterra, com a rainha Catarina de Aragão.
(*)
Levou consigo seu galgo , de nome “Urian”.

Quando o cardeal se ajoelhava para beijar os pés do


papa (Clemente VII), o cão — que vira na cerimônia forma
de ataque —, abocanhou o Sumo Pontífice, que lhe fulminou
excomunhão.

Tal episódio — para alguns, simples lenda — teria


concorrido para a fundação da Igreja anglicana.

(Fonte da notícia: Ibidem, p. 28).

18. “Pickles”.

A galeria dos cães célebres perpetua a memória deste


ditoso vira-lata.

Foi ele quem, pelos idos de 1966, encontrou a Taça


Jules Rimet, feita de ouro e prata, furtada em Londres.

Enquanto passeava com o seu dono, farejou — guiado


pelo instinto — um pacote colocado na via pública, onde
estava o precioso troféu de 3,8 kg.

Graças a “Pickles”, pôde a copa ser entregue ao Brasil,


em 1970, pela conquista do tricampeonato mundial de
futebol, no México.

(*) Galgo – “Cão pernalto e esguio, próprio para a caça de lebres” (cf. Pequeno
Dicionário Basileiro da Língua Portuguesa, 11a. ed.; v. galgo).
85

Essa mesma taça, no entanto, foi objeto de furto no


Rio de Janeiro em 1983, e nunca mais recuperada. Corre voz
entre o povo que os larápios a derreteram, para mais
facilmente vendê-la a infames receptadores.

(Fonte da notícia: Ibidem, p. 24).


86

19. “Paxá”, de Fuad Zegaib (Dinho). Restaurante Dinho’s.

20. “Blimunda” e “Baltazar Sete Sóis”, de Paulo Sérgio


Leite Fernandes, decano e espelho dos advogados
criminalistas do Estado de São Paulo, além de consagrado
escritor (Na Defesa das Prerrogativas do Advogado, Aborto e
Infanticídio, Caranguejo-Rei, Dolores, etc.):

“Enquanto escrevo, um casal de cães, atento, passeia nas


proximidades. Chamam-se Blimunda e Baltazar Sete Sóis, em
homenagem a Saramago (Memorial do Convento)” (Paulo Sérgio
Leite Fernandes, Fabulações de um Velho Criminalista, 2011,
p. 41; Letras do Pensamento Editora Ltda.; São Paulo).

21. “Chuvisco”, do veterano jornalista José Paulo de


Andrade, que há mais de três décadas apresenta, pela Rádio
Bandeirantes, o Jornal Gente, com Salomão Ésper e Joelmir
Beting(*) (trio de ouro do Rádio brasileiro). Diariamente, em
seu programa radiofônico O Pulo do Gato, enriquece com
informações e boa dose de alegria as manhãs paulistas e
brasileiras, o que lhe tem assegurado invulgar e merecida
notoriedade. Isto já por 38 anos! Tem José Paulo de Andrade,
não há negar, sete fôlegos, como o “gato” que vive à sua
sombra, em harmonia com o cão “Chuvisco”.

(*) A quem substituiu, “mortis causa”, Rafael Colombo.


87

22. “Feijão”, de Luiz Trozzi (Gijo), “O Rei da Linguiça


Calabresa”.

Bem familiar lhe haverá de ser o dito:“Do tempo em que se


amarrava cachorro com linguiça”, como a indicar idade muito
afastada, ou “do tempo do Onça”, “em priscas eras”, “no tempo em
que Berta fiava”, “no tempo de Maria Castanha”, “no tempo dos
Afonsinhos”, “velho como a Sé de Braga”, “velho como a serra”. “No
interior do Ceará é corrente a expressão: Velho como a serpe
(serpente), ou seja, velho como Adão e Eva” (R. Magalhães Jr.,
Dicionário de Provérbios e Curiosidades, 1960, p. 281; Editora
Cultrix; São Paulo); “do tempo em que o cavalo de Troia era ainda
potrinho”, etc.

Luiz Trozzi (Gijo), “O Rei da Linguiça Calabresa”

“Feijão”, cachorro que vive regaladamente ao pé de seu


dono (Gijo), parece desmentir o anexim: “Cão mordido de cobra
tem medo até de linguiça”!
88

23. “Bauzer”, labrador de João Lara Mesquita, ex-diretor


da Rádio Eldorado e “jornalista que sobreviveu a naufrágio na
Antártida” (cf. O Estado de S. Paulo, 17.4. 2012).

24. “Ganimedes”, cão de Emília, personagem do conto


Linha reta e linha curva, de Machado de Assis:

“Eu sei o que é aquela moça! Ora trata-me de modo que eu vou
ao sétimo céu; ora é tal a sua indiferença que me atira ao inferno.
Hoje um sorriso, amanhã um gesto de desdém. Ralha-me de não
visitá-la; vou visitá-la, ocupa-se tanto de mim como de Ganimedes;
Ganimedes é o nome de um cãozinho felpudo que eu lhe dei.
Importa-se tanto comigo como com o cachorro... É de propósito. É um
enigma aquela moça” (Machado de Assis, Contos Fluminenses,
p. 255; H. Garnier, Livreiro-Editor; Rio de Janeiro).

25. “Nina”, cadelinha de estimação de Alfredo T. Abe,


diretor-presidente da Millennium Editora Ltda.

26. “Monty”, da rainha Elisabete II, da Inglaterra:

“O cão corgi da Rainha Elizabeth que apareceu ao lado dela e


de James Bond na abertura dos Jogos Olímpicos morreu, informou o
Palácio de Buckinghan. Monty, que tinha 13 anos, deixa dois corgis
no palácio” (Metro/São Paulo, 10.9.2012, p. 13).
89

27. “Russo”, cão de Hugo Chávez, presidente da


Venezuela.

“O presidente russo, Vladimir Putin, presenteou o venezuelano


Hugo Chávez com um cachorro terrier negro. O cão, que receberá o
nome de Russo, foi descrito pelo líder bolivariano como muito
bonitinho. Chávez prometeu retribuir o presente de Putin com outro
animal. Estou aqui com o cachorro que ele me mandou. Estamos
treinando-o, contou Chávez à TV estatal. É um cão muito
bonitinho. Eu o chamarei de Russo e darei a Putin uma capivara.

Os dois líderes têm uma boa relação e uma série de acordos nos
setores de petróleo e armas. A raça da nova mascote de Chávez foi
desenvolvida na Rússia para guardar prisões do regime soviético e
ficou conhecida como cachorro de Stálin, em referência ao ex-ditador.
A prática é comum. O próprio Putin foi presenteado em janeiro com
um cão akita pelo então primeiro-ministro japonês, Koichiro Gemba”
(cf. O Estado de S. Paulo, 29.9.2012, p. 25).

28. “Pipoca”, estimada cadelinha de Reinaldo Azevedo,


jornalista e apresentador de programa radiofônico.

29. “Cunegundes”, nome do cão, personagem de um conto de


Veiga Miranda (Pássaros que Fogem, 1908, p. 179).

30. “Capeto”, cão do Fantasma, famigerado herói dos


quadrinhos.
90

31. “Bruno”, famoso e benemérito cão da Polícia Civil do


Estado de São Paulo:
91

32. “Nana”, cachorrinha de Saulo Ramos (1929–2013),


advogado, Consultor Geral da República, Ministro da Justiça
e escritor:

“Passei a mão na cabeça da minha cachorrinha, Nana,


deitada ao meu lado, parecendo querer ajudar-me na cura,
transmitindo seu amor sem palavras. Ela era a festa da casa.
Adorava minha mulher. Toda manhã nos recebia aos pulos,
querendo alcançar o colo com incrível agilidade. O mais
impressionante era seu olhar de ternura expressa com impressionante
lealdade em seus grandes e brilhantes olhos negros. Era a alegria de
meu combalido coração. Dias depois, ela morreu” (Saulo Ramos,
Código da Vida, 2007, p. 179; Editora Planeta; São Paulo).

33. “Bidu”, gracioso cãozinho de tirinhas de jornal e


revistas; criação imortal de Mauricio de Sousa, desenhista,
escritor e membro da Academia Paulista de Letras.
92

34. “Tippy”, de Dale Carnegie:

“A morte de Tippy foi a tragédia da minha meninice” (Dale


Carnegie, Como Fazer Amigos e Influenciar Pessoas, 32a. ed.,
p. 76; trad. Fernando Tude de Souza; Companhia Editora
Nacional; São Paulo).

IX. O Furto de um Cãozinho

Também o cão, que é um semovente — i.e., “coisa animada


que se move por si mesma e é suscetível de afastar-se de determinado
lugar” (Antônio Houaiss, Dicionário, 1a. ed.; v. semovente) —,
pode ser objeto material de furto. A esse respeito já se
consolidou a jurisprudência dos Tribunais (cf. Rev. Forense,
vol. 267, pp. 327-328).

A 5a. Câmara de Direito Criminal do Tribunal de


Justiça do Estado de São Paulo julgou, certa vez, um caso de
furto de cão. Eis o voto do relator:
PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO

QUINTA CÂMARA – SEÇÃO CRIMINAL

Apelação Criminal nº 993.08.034520-1


Comarca: Santos
Apelantes: SNH e Ministério Público
Apelados: Os mesmos

Voto nº 10.384
Relator

– Não merece crítica senão louvor e


confirmação a sentença que condena por
furto simples o sujeito que, após deitar a
mão ao cão do vizinho que perambulava
pela redondeza, pretende vendê-lo a
terceiro, mas intervém a Polícia e frustra-
lhe a transação irregular (art. 155 do Cód.
Penal) .
94

– De nada valem os protestos de inocência


do réu, se o conjunto probatório o
incrimina implacavelmente. Aliás, em
pontos de furto, deve receber-se com
reserva e cautela a versão exculpatória
do réu, gatuno contumaz, que sabia
conjugar o verbo “rapio” em todos os
seus tempos (art. 155 do Cód. Penal).

–“A terapêutica penal consiste numa regra de


razoabilidade para efetiva reintegração social
(do infrator), que não se consolida com
severidade em excesso e muito menos num
apego primário à letra fria da lei (...)”
(Marco Antônio Ferreira Lima,
Procurador de Justiça).
– Na apuração da autoria de crime
adotavam os romanos o judicioso
critério: “Cui prodest scelus, is fecit”.
Aquele a quem o crime aproveita, esse o
cometeu. É a lógica a melhor das provas .
– O decurso do tempo apaga a memória
do fato punível e a necessidade do
exemplo desaparece (Abel do Vale; apud
Ribeiro Pontes, Código Penal Brasileiro,
8a. ed., p. 154).
– Decretada a extinção da punibilidade do
apelante pela prescrição da pretensão
punitiva estatal, já nenhuma outra
matéria poderá ser objeto de exame ou
deliberação.
95

1. Da r. sentença que proferiu o MM. Juízo de Direito da


2a. Vara Criminal da Comarca de Santos, condenando
SNH à pena de 4 meses e 20 dias de reclusão, no regime
aberto, e 3 dias-multa, por infração do art. 155, “caput”, do
Código Penal, interpuseram recurso de Apelação para este
Egrégio Tribunal, no intuito de reformá-la, a ré e o ilustre
representante do Ministério Público.

a) A ré, nas razões de apelação elaboradas por


esforçado e competente patrono, alega que a prova dos
autos, frágil e insegura, não autorizava a edição do decreto
condenatório; por isso, espera que a colenda Câmara a
absolva e mande em paz (fls. 182 /184);

b) A douta Promotoria de Justiça, em esmerada e


substanciosa peça jurídica, teve para si que a r. decisão
apelada, em tudo louvável, equivocara-se porém quanto à
dosimetria da pena, que reduziu em 2/3, em obséquio ao
arrependimento posterior.

De igual passo, não rendera homenagem cabal ao


Direito ao determinar a substituição da pena privativa de
liberdade por restritiva de direitos, fixado o regime aberto.

Pleiteia, por isso, à colenda Câmara tenha a bem


prover-lhe o recurso para a emenda da pena aplicada (fls.
166/169).

As partes responderam aos recursos (fls. 178/179 e


186/189).
96

A ilustrada Procuradoria-Geral de Justiça, em


percuciente e criterioso parecer do Dr. Marco Antônio
Ferreira Lima, opina pelo improvimento dos recursos
(fls. 195/197).

É o relatório.

2. A Justiça Pública demandou a ré na esfera criminal


porque, pelas 8h30 do dia 1.2.2004, na Rua Santos Dumont,
em Santos, subtraiu para si um cão da raça “poodle”,
pertencente a MMSS.

Instaurada a persecução criminal, transcorreu o


processo em forma legal; ao cabo, a r. sentença de fls.
158/161 decretou a condenação da ré que, inconformada,
comparece perante esta augusta Corte de Justiça,
reclamando absolvição.

3. A materialidade e a autoria do fato imputado à ré não


podem ser infirmadas sem imprudência, pois assentaram em
base probatória firme e incontroversa.

Deveras, ouvida na fase do inquérito policial, declarou


que, certa feita, como visse na rua um cãozinho a
perambular sem dono, deliberou tomá-lo para si. Ao chegar
a casa, advertiu-a uma amiga de que o animal pertencia à
vizinha, que o perdera; isto não obstante, a ré vendeu-o a um
desconhecido (fl. 9).
97

Isto mesmo narrou à digna Magistrada que a


interrogou; pôs timbre, porém, em afirmar que acreditava
tivesse alguém abandonado o animal, daqui por que o
recolheu (fls. 80/82).

O argumento, no entanto, não releva a criminalidade


de seu ato.

4. À vista de sua confissão “coram judice”, a autoria do fato


criminoso imputado à ré não consente dúvida.

Em verdade: efetuada em Juízo, tem a confissão alto


valor na aferição da autoria. É que, no geral sentir dos
doutores, ninguém afirma contra si fato que não seja
verdadeiro.

Este foi sempre o ensinamento da Doutrina:

“A confissão judicial, por presumir-se livre dos vícios de


inteligência e vontade, tem um valor absoluto, servindo como
base condenatória, ainda que seja o único elemento
incriminador” (Camargo Aranha, Da Prova no Processo
Penal, 3a. ed., p. 92).
98

Por esta mesma craveira têm decidido nossos


Tribunais:

“A confissão judicial tem valor absoluto e, ainda que seja o


único elemento de prova, serve como base à condenação, só
podendo ser recusada em circunstâncias especialíssimas, ou
seja, naquelas em que se lhe evidencie a insinceridade, ou
quando tiver prova veemente em contrário” (Rev. Tribs., vol.
744, p. 573; rel. Nélson Fonseca).

Além da confissão da ré, servem a incriminá-la as


declarações da vítima (fl. 8) e os testemunhos de JFS e JMF.

Com efeito, inquirido na instrução criminal, informou


JF ter visto a ré com o animalzinho de M, no instante
mesmo em que o pretendia vender a terceiro. Avisou a dona
do cachorro e pôde frustrar a transação (fl. 94).

Pelo mesmo teor, o depoimento de F: declarou ter


ouvido à ré que subtraíra o cão “para vender, pois precisava de
dinheiro” (fl. 105).

A alegação da Defesa, de que a apelante recolheu o


animal “pietatis causa” (fl. 183), não procede, com a devida
vênia.

Ao deitar-lhe mão, não o fizera a ré por impulso


generoso, como alegou, senão por desmarcada cupidez, pois
que se propunha já vendê-lo a desconhecido, a despeito da
advertência de que era a vizinha sua proprietária.
99

Amparada a tão sólido conjunto de provas


incriminadoras, a condenação da ré passava por inferência
lógica necessária e ainda justa.

Cai a lanço a jurisprudência dos Tribunais:

“O que marca o ladrão é a ação sub-reptícia, é a atuação


clandestina e cautelosa. Não se pode exigir, em tais casos, a
prova testemunhal completa” (Rev. Forense, vol. 122, p.
266; rel. Mário Matos; apud Mohamed Amaro, Código
Penal na Expressão dos Tribunais , 1a. ed., p. 675).

5. Pelo que toca ao recurso da Acusação, tenho-o por


improcedente, sem embargo das esmeradas razões que
encerra e que muito acreditam seu subscritor; não me
persuadiram da erronia ou injustiça da sentença apelada.

Fixada com louvável critério, e substituída por medida


alternativa, a pena está correta e não autoriza modificação;
outro tanto, em relação ao regime prisional (aberto),
estipulado à ré segundo as circunstâncias do caso, a
personalidade da agente e o espírito da lei.

A terapêutica penal — observou, em frase lapidar o


preclaro subscritor do parecer da Procuradoria Geral de
Justiça —, “a terapêutica penal consiste numa regra de
razoabilidade para efetiva reintegração social (do infrator) que não
se consolida com severidade em excesso e muito menos num apego
primário à letra fria da lei (...)”
(fl. 197).
100

Enfim, proferida após análise de espaço da prova dos


autos, com estrita observância do Direito e à luz da razão
lógica, a r. sentença condenatória merece confirmada pelos
próprios fundamentos que lhe deu o distinto e culto Juiz Dr.
Alexandre Coelho.

6. Nada obstante porém o acerto e juridicidade da r.


sentença, não é possível executar a pena imposta à ré, porque
extinta sua punibilidade.

Deveras, dispõe o art. 109, nº VI, do Código Penal que a


pena inferior a 1 ano prescreve em 2.

Ora, da data do recebimento da denúncia — 19.8.04 (fl.


38) — até à da prolação da sentença — 28.11.07 (fl. 162) —
decorreu lapso de tempo superior a 3 anos, suficiente ao
reconhecimento da prescrição.

É força, pelo conseguinte, decretar a extinção da


punibilidade da ré pela prescrição retroativa da pretensão
punitiva estatal.

Com efeito, na expressão clássica de Abel do Vale, o


decurso do tempo apaga a memória do fato punível e a
necessidade do exemplo desaparece (apud Ribeiro Pontes,
Código Penal Brasileiro, 8a. ed., p. 154).
101

Vem aqui a ponto o ven. acórdão deste Egrégio


Tribunal, transcrito por sua ementa:

“A extinção da punibilidade pela prescrição da pretensão


punitiva precede e afasta qualquer outra questão. Por isso,
depois do seu reconhecimento, não há que se emitir juízo
sobre qualquer outra matéria, preliminar ou de mérito”
(RJDTACrimSP, vol. 11, p. 121; rel. S.C. Garcia).

7. Pelo exposto, nego provimento aos recursos e, de


ofício, julgo extinta a punibilidade da ré pela prescrição
retroativa da pretensão punitiva estatal, com fundamento no
art. 107, nº IV, primeira figura, combinado com o art. 109,
nº VI, do Código Penal.

São Paulo, 22 de agosto de 2008


Des. Carlos Biasotti
Relator
X. A Cauda do Cão: por que Cortá-la?!

É reação de pena, e muita vez de indignação, a daquele que


vê um cachorro sem rabo porque lho cortaram.

Mas o motivo qual seria da amputação desse apêndice


posterior que a Natureza deu aos cães, não só para primor de sua
anatomia, cobrindo-lhes a “regio pudendalis” (1), senão ainda para

(1) “Regio pudendalis” , i.e., região pudenda; as partes pudendas; as


vergonhas. “Pudendo — relativo aos órgãos genitais externos” (Pedro A. Pinto,
Dicionário de Termos Médicos, 1926, p. 475; Livraria Francisco Alves; Rio de
Janeiro).

A despeito da licença do brocardo — “Não há palavra má, se a puserem


em seu lugar” —, empreguei ali atrás uma locução latina; fi-lo em obséquio à
memória do elegante cronista forense Plínio Barreto, que sentenciou: “O
latim ainda não morreu porque fizeram dele o cofre onde se guardam os mistérios do
céu e as torpezas da terra” (Vida Forense, 1922, p. 134).

Aos que não são forasteiros em Direito Penal decerto lembrarão


sempre aqueles passos do incomparável Nélson Hungria, e de seus largos
latins, ao tratar do homicídio passional por adultério:

“Em face do novo Código, os uxoricidas passionais não terão favor algum,
salvo quando pratiquem o crime em exaltação emocional, ante a evidência da
infidelidade da esposa. O marido que surpreende a mulher e o tertius em flagrante ou
in ipsis rebus venereis (quer solus cum sola in eodem lecto, quer solus cum sola in
solitudine) e, num desvairo de cólera, elimina a vida de uma ou de outro, ou de ambos,
pode, sem dúvida alguma, invocar o § 1º do art. 121; mas aquele que, por simples
ciúme ou meras suspeitas, repete o gesto bárbaro e estúpido de Otelo, terá de sofrer a
pena inteira dos homicidas vulgares” (Comentários ao Código Penal, 1981, vol. V,
pp. 162-163; Editora Forense; Rio de Janeiro).

Vem a ponto reproduzir aqui o escólio do Prof. Damásio E. de Jesus:

“Abolitio criminis. O art. 240 do Código Penal foi revogado pelo art. 5º
da Lei nº 11.106, de 28 de março de 2005. Em face disso, já não existe o crime
de adultério em nossa legislação penal” (Código Penal Anotado, 18a. ed., p. 812;
Editora Saraiva).
103

defendê-los contra a malícia dos homens ou as insídias e riscos de


que ninguém sobre a face da terra — nem mesmo o cão — se julga
inteiramente seguro?!

Aqui, um instrumento pérfuro-cortante; ali, um ferro


pontiagudo; acolá, uma haste acerada; além, o ferrão das abelhas,
o aguilhão dos escorpiões, ou um jato de água fervendo... Como,
diante de tão implacáveis ofendículos ou agentes nocivos, poderá
acautelar-se o pobre animal, se lhe tiverem amputado a cauda?!

Numa palavra: assentaria em bons fundamentos a prática


da mutilação da cauda dos cães?!

Querem alguns que, “com a amputação, diminui-se a frequência


de lesões, por vezes graves, na cauda dos cães de caça e de utilidade”
(Piero Scanziani, Cães, 1986, p. 14; Editora Rio Gráfica Ltda.; Rio
de Janeiro).

No entanto, a injúria feita ao sujeito passivo (a terminologia é


jurídica) da traição à fé conjugal — e que, “ipso facto”, passa a pertencer à
atormentada confraria de São Cornélio (“transeat”) —, essa ainda tem foros de
cidade na ordem penal (art. 140 do Cód. Penal).

As razões — verdadeira exposição de motivos — são o sentimento de


honra de cada um, como se lê em Matias Aires, um de nossos escritores
clássicos:“Acabando tudo com a morte, só a desonra não acaba; porque o labéu ainda
vive mais do que quem o padece; por mais insensível que esteja um cadáver na
sepultura (permita-se a hipérbole) lá parece que a lembrança de uma infâmia, que
existe na memória dos que ficam, lhe está animando as cinzas, para o fazer capaz de
aflição e sentimento: terrível qualidade, cujos efeitos, ou cujo mal, não se acaba, ainda
depois que acaba quem o tem; sendo a única desgraça que se imprime na alma, como
um caráter imortal! A morte não serve de limite à desonra, porque esta vai seguindo a
posteridade como uma herança bárbara e infeliz” (Reflexões sobre a Vaidade dos
Homens, 1752, p. 42).

Não seja pedra de escândalo isto de vir o tema do adultério à uma


com o ensaio sobre o cão: mera coincidência! Em todo o caso, não parecerá
absurdo virem juntas as insígnias da fidelidade (cão) e da infidelidade
(adultério).“Extrema tangunt se”!
104

Mas, ainda que tradicional naquelas raças em que se


admite, a caudatomia (secção cirúrgica ou amputação da cauda)
é, ao aviso dos expertos, processo doloroso, atroz e de efeito
antiestético; por isso, constitui ponto de viva controvérsia entre
veterinários e cinófilos.

Tal prática, por implicar mutilação de animal doméstico e


tratamento cruel, configura o ilícito penal definido e punido pelo
art. 32 da Lei nº 9.605/98 (Lei do Meio Ambiente) e art. 64 da Lei das
Contravenções Penais.

“Esse preceito” — adverte o consagrado jurista José Duarte


— “tem uma função educativa, porque vai habituando os indivíduos a
coibir as suas expansões de malignidade contra os irracionais e, com
a abstenção, oferecem exemplo aos mais jovens, que formam os seus
sentimentos sob melhores influências” (Comentários à Lei das
Contravenções Penais, 1944, p. 575; Editora Forense; Rio de
Janeiro).

Por fim, o abanar da cauda é o “modo de rir” dos cães, na


frase original do venerando Machado de Assis (2). Ora, a decepar-
-se-lhe a cauda, como poderá o simpático animal externar sua
alegria?!

(2) Dom Casmurro, 1969, p. 198; Círculo do Livro; São Paulo.


Trabalhos Jurídicos e Literários de
Carlos Biasotti

1. A Sustentação Oral nos Tribunais: Teoria e Prática;


2. Adauto Suannes: Brasão da Magistratura Paulista;
3. Advocacia: Grandezas e Misérias;
4. Antecedentes Criminais (Doutrina e Jurisprudência);
5. Apartes e Respostas Originais;
6. Apelação em Liberdade (Doutrina e Jurisprudência);
7. Apropriação Indébita (Doutrina e Jurisprudência);
8. Arma de Fogo (Doutrina e Jurisprudência);
9. Cartas do Juiz Eliézer Rosa (1a. Parte);
10. Citação do Réu (Doutrina e Jurisprudência);
11. Crime Continuado (Doutrina e Jurisprudência);
12. Crimes contra a Honra (Doutrina e Jurisprudência);
13. Crimes de Trânsito (Doutrina e Jurisprudência);
14. Da Confissão do Réu (Doutrina e Jurisprudência);
15. Da Presunção de Inocência (Doutrina e
Jurisprudência);
16. Da Prisão (Doutrina e Jurisprudência);
17. Da Prova (Doutrina e Jurisprudência);
18. Da Vírgula (Doutrina, Casos Notáveis, Curiosidades,
etc.);
19. Denúncia (Doutrina e Jurisprudência);
20. Direito Ambiental (Doutrina e Jurisprudência);
21. Direito de Autor (Doutrina e Jurisprudência);
22. Direito de Defesa (Doutrina e Jurisprudência);
23. Do Roubo (Doutrina e Jurisprudência);
24. Estelionato (Doutrina e Jurisprudência);
25. Furto (Doutrina e Jurisprudência);
26. “Habeas Corpus” (Doutrina e Jurisprudência);
27. Legítima Defesa (Doutrina e Jurisprudência);
28. Liberdade Provisória (Doutrina e Jurisprudência);
29. Mandado de Segurança (Doutrina e Jurisprudência);
30. O Cão na Literatura;
31. O Crime da Pedra (Defesa Criminal em Verso);
32. O Crime de Extorsão e a Tentativa (Doutrina e
Jurisprudência);
33. O Erro. O Erro Judiciário. O Erro na Literatura
(Lapsos e Enganos);
34. O Silêncio do Réu. Interpretação (Doutrina e
Jurisprudência);
35. Os 80 Anos do Príncipe dos Poetas Brasileiros;
36. Princípio da Insignificância (Doutrina e
Jurisprudência);
37. “Quousque tandem abutere, Catilina, patientia nostra?”;
38. Tópicos de Gramática (Verbos abundantes no
particípio; pronúncias e construções viciosas;
fraseologia latina, etc.);
39. Tóxicos (Doutrina e Jurisprudência);
40. Tribunal do Júri (Doutrina e Jurisprudência);
41. Absolvição do Réu (Doutrina e Jurisprudência);
42. Tributo aos Advogados Criminalistas (Coletânea de
Escritos Jurídicos); Millennium Editora Ltda.;
43. Advocacia Criminal (Teoria e Prática); Millennium
Editora Ltda.;
44. Cartas do Juiz Eliézer Rosa (2a. Parte);
45. Contravenções Penais (Doutrina e Jurispudência);
46. Crimes contra os Costumes (Doutrina e
Jurispudência);
47. Revisão Criminal (Doutrina e Jurispudência);
48. Nélson Hungria (Súmula da Vida e da Obra).
49. Ação Penal (Doutrina e Jurisprudência);
50. Crimes de Falsidade (Doutrina e
Jurisprudência);
51. Álibi (Doutrina e Jurisprudência);
52. Da Sentença (Doutrina e Jurispudência);
53. Fraseologia Latina;
54. Da Pena (Doutrina e Jurisprudência);
55. Ilícito Civil e Ilícito Penal (Doutrina e Jurisprudência);
56. Regime Prisional (Doutrina e Jurisprudência);
57. Alimentos (Doutrina e Jurisprudência);
58. Estado de Necessidade (Doutrina e Jurisprudência);
59. Receptação (Doutrina e Jurisprudência);
60. Inquérito Policial. Indiciamento (Doutrina e
Jurisprudência);
61. A Palavra da Vítima e seu Valor em Juízo;
62. A Linguagem do Advogado;
63. Memorando aos Colegas da Advocacia e da
Magistratura;
64. Código de Defesa do Consumidor (Casos Especiais em
Matéria Criminal);
65. Crime de Dano (Doutrina e Jurisprudência);
66. Nulidade Processual (Doutrina e Jurisprudência);
67. Da Coação no Direito Penal (Doutrina e
Jurisprudência);
68. Violação de Domicílio (Doutrina e Jurisprudência);
69. Indenização (Doutrina e Jurisprudência);
70. Desistência Voluntária (Doutrina e Jurisprudência);
71. A Embriaguez e o Direito Penal (Doutrina e
Jurisprudência);
72. Embargos de Declaração (Doutrina e Jurisprudência);
73. A Estrada Real do Direito.
http://www.scribd.com/Biasotti
O Cão na Literatura Carlos Biasotti

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