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O psiquismo e a

subjetividade social em
Vygotsky
Prof. Moisés de Andrade Júnior
moises.aj@gmail.com
De onde vem a noção de
subjetividade?
◦ Noção advinda da filosofia moderna, em que o sujeito do
conhecimento – ou seja, o sujeito que pensa, que filosofa – começa a
ser questionado
◦ Daí surgem reflexões sobre o ser humano, suas capacidades
pensantes, os limites de seu conhecimento, sua capacidade em
investigar a realidade e produzir verdades, etc
◦ Essas primeiras investigações sobre a subjetividade tornaram-se o
objeto por excelência da disciplina da Psicologia
◦ Neste sentido, a proposta da Psicologia Sócio-histórica é oferecer
uma teoria adequada para a constituição da subjetividade, ou seja:
como o sujeito se torna um ser pensante, dotado de linguagem e
pensamento
Luria, Leontiev e
Vygotsky
◦ A teoria da subjetividade proposta pela Psicologia Sócio-histórica
é formada pela interação entre as teorias destes três pensadores
◦ Luria afirma que a consciência e comportamento humano têm
suas bases nas condições externas da vida social, para além do
organismo biológico, nas formas sociais e históricas da existência
humana
◦ Sendo assim, a Psicologia, como disciplina da subjetividade, deve
partir do estudo do reflexo do mundo externo, material, no
mundo interno, humano
◦ Para Luria, o trabalho social – aquele realizado através da divisão
de funções – cria novos comportamentos que são independentes
dos motivos biológicos elementares
◦ Ou seja: no animal humano, o instinto, de natureza biológica, é
suplantado por outras vontades, outros motivos (sociais) para
determinar o agir
A atividade consciente
◦ Esta atividade humana, para além do instinto, é chamada de
atividade consciente, no sentido de ser produzida por uma
intencionalidade que é social e própria ao ser humano, pois é
atravessada pela linguagem
◦ Para Luria, a linguagem (simbólica) marca a diferença fundamental
entre a atividade animal e a atividade humana
◦ Isso porque enquanto a linguagem animal serve à uma comunicação
rudimentar programada pelos instintos, a linguagem humana é uma
abstração da realidade material
A atividade consciente
◦ Enquanto o animal só pode se comportar a partir de sua genética e
em função de sua experiência direta com o mundo, o ser humano
pode agir a partir do conhecimento acumulado pela história social
humana, passível de ser transmitido pela linguagem simbólica
◦ Luria coloca sua teoria sobre o comportamento humano em oposição
à:
◦ Filosofia idealista (a dualidade mente-corpo de Descartes, sendo a
consciência um atributo da alma)
◦ Filosofia evolucionista (a teoria de Darwin sobre a consciência
como fruto da evolução da espécie humana)
◦ Para Luria, a consciência advém:
A. Do uso de ferramentas pelos seres humanos
B. Do aparecimento da linguagem simbólica
C. Da atividade social do homem
O uso de ferramentas pelos
seres humanos
◦ O uso de ferramentas pelos homens não é apenas para satisfazer suas
necessidades biológicas e imediatas
◦ A satisfação de uma necessidade humana é mediatizada por atos que
antecipam o comportamento final e que estão ligados à estrutura da
atividade
◦ Ou seja: há uma intenção por trás dos atos humanos que demonstra
planejamento e um objetivo consciente, em graus de complexidade cada
vez maiores
◦ Estes atos intermediários mostram um poder de reflexão que não está
presente nos animais, como construir uma casa, cozinhar um alimento,
preparar uma armadilha para caça, etc
◦ Mas há animais que possuem rudimentos de um planejamento, e podem
construir estruturas relativamente complexas, como abelhas e castores. O
que há de específico neste planejamento por trás das intenções humanas?
O aparecimento da linguagem
humana
◦ Para Luria e também para Leontiev, o surgimento da linguagem é
dependente da construção do instrumento de trabalho – a ferramenta
◦ Ora, para usar uma ferramenta é necessária uma consciência de maneiras
de seu uso, sua utilidade – é preciso ser capaz de abstrair a ferramenta
◦ Ou seja, para pensar um objeto como uma ferramenta é preciso
transformá-lo em outra coisa na consciência. Uma lasca de pedra é uma
lasca de pedra na realidade material, mas pode ser abstraído – simbolizado
– como uma faca, ponta de lança ou flecha na consciência do indivíduo
que a maneja
◦ Essa representação da ferramenta na consciência permite também pensa-
la em outros contextos, aplica-la em outras condições imaginadas
O aparecimento da
linguagem humana
◦ A linguagem é, portanto, a produção de uma
representação de um objeto real. Para pensar nos usos
deste objeto, generalizar suas aplicações, é preciso
relacionar sua representação com a representação de
outros objetos e cenários, produzindo assim pensamento,
linguagem e memória
◦ Estes objetos agora podem ser pensados sem sua
presença física, portanto, a linguagem produz
imaginação, análise, classificação, predição, raciocínio,
criatividade, etc
◦ Este uso simbólico da ferramenta foi tão importante
para a evolução humana que até mesmo nossa biologia,
desde o uso das primeiras ferramentas, foi modificada
pelos seus resultados
O aparecimento da
linguagem humana
◦ O uso de ferramentas pelo ser humano modifica sua realidade
material e a transforma, e os indivíduos que nascem em determinada
realidade sócio-histórica (transformada pelos seus recursos materiais,
ideias, valores, conhecimento acumulado, instituições sociais, etc)
desenvolvem sua própria subjetividade a partir dela – “o homem
não nasce pronto, aprende a ser homem” – por isso, ele é sócio-
histórico
◦ A atividade humana, portanto, não busca mais se adaptar à natureza,
mas em transformá-la conforme suas necessidades, e esta ação gera
um conhecimento acumulado e um saber-fazer que se cristalizam em
seus produtos, materiais e intelectuais
A atividade social do homem
◦ A organização do ser humano em comunidades produziu
especializações de trabalho e organizações sociais que não são frutos
de uma programação genética, geridas pelos instintos, mas sim
orientadas às condições materiais em que vive e passíveis de
transformações conforme suas necessidades
◦ Para distribuir funções e organizar o trabalho social, a linguagem
precisou ser compartilhada e permitir a comunicação entre pares
◦ É esta comunicação que permitiu a acumulação, retenção e
transmissão do conhecimento, e a experiência de um indivíduo pôde
ser transmitida pela linguagem para outro indivíduo, enquanto a
transmissão deste conhecimento de geração para geração produziu a
cultura humana
A atividade social do homem
◦ Contudo, a divisão do trabalho nesses primórdios da humanidade
provocou a desigualdade econômica, já que a especialização do
trabalho produziu
a) classes sociais, com habilidades e oportunidades (materiais e intelectuais)
diferentes
b) o aparecimento da mercadoria, já que os produtos produzidos pela
comunidade especializada precisaram ser trocadas entre si
◦ O resto é, literalmente, história – as relações sociais se tornando cada
vez mais complexas e a troca de mercadorias se transformando no
comércio e no capitalismo
◦ Cada ponto na história passa então a ser considerado o padrão
natural da convivência humana, uma vez que se perde a dimensão
história da realidade social
A atividade social do
homem
◦ Há um constante enriquecimento e complexificação
dos costumes, tecnologias e saberes humanos, sem a
devida consciência história de sua evolução, através
da naturalização destas relações sociais no tempo e
no espaço (função da ideologia)
◦ Sem a consciência da relatividade destes costumes e
saberes, sua transformação ao longo do tempo e
(relativa) transicionalidade, tende-se a naturalizar as
injustiças, problemas e as classes sociais inerentes a
determinado período histórico
Vygotsky e a internalização dos
processos sociais pela psicologia
humana
◦ Vygotsky será o terceiro autor desta leitura, na medida em que
completa os saberes de Luria e Leontiev com uma teoria sobre os
mecanismo psicológicos envolvidos na internalização dos processos
sociais
◦ O que Vygotsky irá propor é que a mesma função que a ferramenta
tem para o domínio humano da natureza é a função que a linguagem
terá para que ele possa dominar os “problemas” psicológicos
◦ Como veremos a seguir, Vygotksy fará uma leitura deste problema a
partir da construção de uma hierarquia de planos genéticos na
constituição do ser humano

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