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Conforme a informação prévia, seguem abaixo as duas questões que devem responder

para serem avaliados.

Caso não seja possível submeter no sigaa as ditas respostas (por qualquer problema
técnico) devem ser enviadas para o meu email até ao limite previsto (29/3/2019 às
23:59).
Bom trabalho.
 

Questões de prova:
1)    – Expansão, comércio e escravatura na construção do mundo atlântico.
2)    Os pilares ideológicos do mundo atlântico: religião, civilização e raça.

Componente: O Mundo Atlântico

Discente: Lauro José Cardoso

1- R: No âmbito da Expansão, comércio e escravatura na construção do mundo atlântico,


precisamos levar em consideração que, antes de tudo, o mesmo aconteceu no oceano
atlântico entre os séculos XV a XIX. Isto porque, na perspetiva de Thorton (2004), uma
boa parte dos escravizados e escravizadas eram levadas para o Novo Mundo, nesse
caso, o continente americano, através dos tráficos de escravos oriundos na sua maioria
da África ocidental, considerada como o Velho Mundo. Thorton (2004) também afirma
que o nascimento do mundo atlântico está relacionado com uma enorme migração
forçada de pessoas, dado que, os escravos africanos, transportados em navios, e em
condições péssimas, por meio do comércio de escravos, sendo que uma certa quantidade
acabou por morrer durante a viagem, acabou por se tornar, por exemplo, numa nova
configuração em que a África esteve envolvida, pelo fato de, em 1650 os africanos
representarem "a maioria dos novos colonos no mundo atlântico contemporâneo".
Sem esquecer que, ainda segundo Thorton (2004) a expansão europeia que
começou com os ibéricos desde o século XV, a partir das grandes navegações fez com
que houvesse, um intercâmbio entre os povos de todos os continentes, envolvidos no
Mundo Atlântico. Dessa forma, foram imensos e intensos os fatores que contribuíram
para as grandes trocas entre as diversas regiões do mundo. Na medida em que, tanto os
Europeus, os africanos, como os próprios nativos da América estiveram envolvidos no
estabelecimento de uma complexa rede de trocas econômicas, políticas, culturais e
biológicas, pois, obviamente, uma das principais atividades que permitiram a conexão
entre esses vários continentes foi o comércio de escravizados.
Com base nisso, Matheus Guimarães (2014) no seu artigo "História e Mundo
Atlântico: contribuições para o estudo da escravidão africana nas américas" demonstra
que o conceito de Mundo Atlântico começou a ganhar uma proporção maior no século
XX para o século XXI, como uma abordagem atlântica que tem contribuído com
importantes elementos para uma melhor compreensão da experiência escravista nas
Américas. Outro aspecto interessante, ainda na perspetiva de Guimarães (2014), após
citar David Armitage, no que tange as três formas de compreensão para essa história
atlântica, que são: a circunatlântica; a transatlântica; e a cisatlântica. Armitage apud
Guimarães (2014) realça que a primeira está relacionada com o fato do Mundo
Atlântico ser percebido como "uma zona de circulação de ideias, mercadorias, pessoas,
doenças etc." Ou seja, trata-se de uma história necessariamente diaspórica, "em que há
resquícios de heranças culturais, mas os indivíduos estão em contato direto com novas
experiências." E também, nessa história circunatlântica, devem ser considerados apenas
os aspectos culturais e identitários, mas sem perder de vista os aspectos políticos e
econômicos. Já a segunda compreensão, se baseia na ideia transatlântica, feita mediante
comparações, mediante uma história pensada em perspectiva atlântica, mas que leva em
consideração os Estados que compõe o oceano, assim como, através das várias
sociedades distintas que são pensadas a partir de um ponto comum, que é a experiência
do Atlântico. E por último, vem a terceira, que é a cisatlântica, que procura a articulação
entre o local e o global. Isto porque, é através do "pensar em especificidades regionais,
levando sempre em consideração o contexto mais amplo do Atlântico" que a economia
atlântica interferia nas relações econômicas domésticas. Por isso, a lógica de dominação
desenvolvida nos quatro cantos do oceano também necessitava da incorporação das
elites locais. Lembrando que essas três abordagens, podem ser usadas de forma
concomitante também.
Desse jeito, podemos reparar que a concepção e construção histórica do Mundo
atlântico é muito abrangente, pois consegue relacionar várias regiões e países que se
formaram durante e após o tráfico de escravos, na conexão com o oceano Atlântico. Por
exemplo, Brasil e São Tomé e Príncipe, possuem uma relação histórica curiosa, como
afirma Luís Filipe de Alencastro (2000) no seu livro "O Trato dos Viventes" ao dizer
que "Na verdade, São Tomé será no Quinhentos como o Brasil luso-africano dos
Seicentos". Ou seja, São Tomé foi uma espécie de "Laboratório Tropical" que deu certo
para as políticas ultramarinas portuguesas na época, que fez com que Portugal adotasse,
no século XVII, uma política de exploração e tráfico semelhante às ilhas atlânticas no
território brasileiro. Tanto através da plantação da cana de açúcar num regime de
monocultura, assim como através da mão de obra escrava, importada do continente
africano.
Portanto, resumidamente, o Mundo Atlântico acaba sendo, por si só, uma grande
fonte historiográfica, que nos permite perceber as dinâmicas políticas, econômicas,
sociais, culturais, biológicas e históricas que foram acontecendo a partir do século XV,
entre o Velho Mundo, principalmente, os Europeus e os Africanos da África Ocidental,
com o Novo Mundo, as Américas. Certamente, mediante os estudos dessas conexões e
intercâmbios entre diversos continentes que se deram no oceano atlântico, temos uma
larga margem para refletir e estudar, historicamente, a formação contemporânea do
continente africano, americano e o resto do mundo.

2-R: Os pilares ideológicos do mundo atlântico são: a religião, a civilização e a raça.


Comecemos por falar da religião, através de Boxer (2013), quando se refere que a
atitude da igreja face às questões raciais, acaba sendo um tema complexo, vasto e
controverso. Isto porque, ainda na concepção de Boxer (2013), a perspetiva da igreja
cristã e os ensinamentos da bíblia são vistos pelos mesmos, como válidos para todas as
épocas e lugares do mundo. Sem esquecer que, à medida que os navegadores ibéricos,
assim como, os missionários, os mercadores e homens de armas iam se espalhando pelo
globo, iam-se formando convicções e atitudes que duraram séculos, permanecendo até
hoje, entre nós. Por exemplo, o expansionismo português iniciado já no século XV e
consolidado no XVI, é pautado por uma forte e constante presença colaborativa da
Igreja Católica, que ativamente, através de seus representantes e padres, participaram
dos descobrimentos e conquistas portuguesas. Dado que, o expansionismo lusitano não
foi fruto de uma coincidência, mas sim, de uma política de expansionismo português em
conjunto com fatores sociais e históricos, que, em união de forças, produziram as
condições históricas necessárias para o crescimento do processo de expansão
ultramarina.
Para Boxer (2013), a Igreja tornou-se, por meio da instituição do Padroado Real
Português, cada vez mais presente no seio do processo expansionista, na medida em que
foi se consagrando como verdadeira parceira da Coroa Portuguesa na empresa colonial.
Tal parceria firmou-se e tomou corpo na constituição do Padroado Português, no qual os
sucessivos papas concederam ao Reino de Portugal vários benefícios e obrigações,
principalmente, em relação ao estabelecimento, a continuidade e o financiamento das
missões ultramarinas.
Podemos reparar que, Portugal e Espanha, enquanto Reinos católicos
demarcados pelos seus empreendimentos e ambições expansionistas, tinham o objetivo
de levar o Cristianismo às novas terras "descobertas". Ou seja, revelar a esses povos
percebidos como "selvagens" as verdades e a salvação do Cristianismo enquanto uma
atividade tida como atribuição conectada aos reinos católicos. Contudo, para esse feito,
qualquer Rei teria que dispor de todos os poderes, no sentido de colocar seu reino ao
serviço "divino". Logo, a expansão territorial de um país como Portugal significava,
obviamente, a expansão da Igreja e do território cristão.
Dessa forma, conforme Francisco Bethencourt (2013), num primeiro momento
as concepções de raça e do racismo foram colocadas no Ocidente, desde a crise do
império romano até o final da Idade Média. Bethencourt (2013) fala que existe uma
carga preconceituosa, com o início das invasões germânicas, recaída sobre os godos,
francos, lombardos, povos esses incluídos na categoria de “bárbaros”. Por outras
palavras, se trata de uma derivação da concepção grega, a qual taxava de bárbaros os
povos que não falavam grego e tinham hábitos diferentes, concepção essa, que fora
adensada pelos romanos. Tratava-se, se podemos assim dizer, de um racismo mais
cultural do que racial, pelo fato de ter adquirido diversos significados “étnicos”
mediante a associação entre “barbárie” e crueldade, ignorância e/ou destruição
irracional.
Na primeira parte, Bethencourt (2013), faz o realce da importância do
“universalismo” da Igreja como base teórica de um tipo de racismo longevo em termos
de vida. Ou seja, um racismo de base religiosa, baseada na concepção de que o ser ou
não ser cristão definia a fronteira entre o ego e o alter ego, pois, se trata de um quase
prelúdio da hierarquização entre continentes, construída quanto à expansão marítima
europeia. Já, numa segunda fase da sua obra "Racismos: das cruzadas ao século XX",
Bethencourt (2013) trata da “Exploração oceânica”, ou seja, da partida dos europeus
para as viagens ultramarinas no mundo atlântico. A partir daí, podemos encontrar a
construção, por meio de fontes múltiplas, da formação de um pensamento racista
relacionado com as teorias de Darwin, a expansão europeia e a hierarquização dos
povos envolvidos. Essas fontes iconográficas e imagéticas, colocavam sempre a Europa
enquanto um reino soberano, em detrimento da Ásia e África, inferiorizadas e conotadas
como passíveis de "selvageria" e "falta de conhecimento".
Portanto, podemos reparar que, existe uma relação viva entre os conceitos de
religião, raça e civilização, no sentido de colocar um determinado povo como mais
adequado e melhor em termos civilizacionais e epistemológicos. A Igreja Católica,
dentro da sua complexidade, numa determinada época, foi uma estrutura importante
para a disseminação de uma inferiorização no que tange, por exemplo, aos povos com
os fenótipos negros. Nesse caso, o racismo já serviu como uma justificação para
cimentar ainda mais, essa suposta diferença em termos de identidades e capacidades
intelectuais, em conjunto com a Igreja e o Estado. Porém, em tempos atuais, podemos
dizer que "a era da inocência já acabou", pois, contemporaneamente, questões raciais e
religiosas são discutidas com um sentido de desconstrução dessas verdades, antes vistas
como supremas e "divinas".

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